Literatura infantojuvenil se renova e consagra clássicos e novos autores

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SALVADOR SÁBADO 12/3/2011 8 2 O MISTÉRIO DO CADERNINHO PRETO / RUTH ROCHA Editora Salamandra / 87 pági- nas / R$ 26,30 O RATO DO CAMPO E O RATO DA CIDADE / RUTH ROCHA Editora Salamandra / 29 pá- ginas/ R$ 31 MERCADO EDITORIAL Maior parte dos nomes que dominam a produção editorial no segmento surgiu nos anos 1970 e teve como influência a obra de Monteiro Lobato Literatura infantojuvenil se renova e consagra clássicos e novos autores VERENA PARANHOS Ana Maria Machado, Ruth Ro- cha, Lygia Bojunga, Angela-La- go, Maria José Dupré, Bartolo- meu Campos Queiroz, Marina Colasanti, José Paulo Paes, Sô- nia Robatto, Gláucia Lemos, Ra- chel Queiroz, Ziraldo. Dificil- mente uma criança consegue memorizar todos esses nomes, mas provavelmente já leu his- tórias criadas ou recontadas por esses autores da literatura in- fantojuvenil. Em comum, eles têm o fato de terem se tornado conhecidos e premiados pelo trabalho desen- volvido na literatura destinada a crianças e adolescentes. Para Elizabeth Serra, secretá- ria-geral da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), a geração de escritores infan- tojuvenis que surgiu nos anos 1970, e se mantém até hoje entre os melhores do gênero, ainda é bastante influenciada pela obra de Monteiro Lobato, autor que, segundo ela, conti- nua sendo grande referência pa- ra este gênero literário, apesar de toda a polêmica gerada pelo parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) ao conside- rar em 2010 o livro Caçadas de Pedrinho como racista. Por outro lado, a literatura infantojuvenil também tem se renovado e revelado nos últi- mos anos nomes como Roger Melo e Bia Hetzel, ganhadores do Jabuti (2002 e 1995, res- pectivamente), que, segundo Elizabeth, têm desenvolvido tra- balhos de qualidade. Embora conquiste fatias cada vez mais grossas do mercado editorial, este gênero, para al- guns, ainda é marginalizado. “A literatura infantojuvenil repre- senta uma minoria”, defende Elizabeth Serra. Boom No Brasil, a literatura voltada para o público infantojuvenil aparece no final do século 19 e início do século 20 e cresce acen- tuadamente entre as décadas de 1920 a 1945, mostrando o culto aos heróis nacionais, con- tos de origem folclórica, a va- lorização do espaço rural e as aventuras das crianças, tendo como destaque a obra de Mon- teiro Lobato. Mas só nos 1970 aconteceu um boom na literatura infan- tojuvenil, período em que a nar- rativa abrandou o caráter didá- tico-pedagógico e produzi- ram-se obras diversificadas: modernos contos de fadas, de ficção científica, narrativas de cunho social e policial. A revista Recreio, lançada em 1969 pela Editora Abril, desem- penhou importante papel no período por lançar autores hoje consagrados como Ana Maria Machado, Ruth Rocha, Joel Ru- fino dos Santos, Ziraldo, entre outros. Por trás da publicação estava Sonia Robatto, que es- creveu mais de 400 histórias in- fantis publicadas em revistas, fascículos e livros, como criado- ra e editora da Recreio em sua primeira fase. Grandes premiados A Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) é o bra- ço brasileiro da International Board on Book for Young People (IBBY), instituição sem fins lu- crativos, que promove a litera- tura para jovens e crianças em mais de 70 países. A FNLIJ, entre outras atividades, é responsável no Brasil por indicar, a cada dois anos, nomes para concorrerem ao Prêmio Hans Christian An- dersen, considerado o pequeno Nobel de Literatura. As brasi- leiras Lygia Bojunga (1982) e Ana Maria Machado (2000) são as únicas latino-americanas lau- readas pelo prêmio mais impor- tante da literatura infantojuve- nil mundial, que leva o nome do poeta e escritor dinamarquês de histórias infantis. Lygia Bojunga coleciona ain- da os prêmios Jabuti (1973), o mais importante do Brasil, con- cedido pela Câmara Brasileira do Livro, e ALMA (Astrid Lindgren Memorial Award) (2004), cria- do em 2002 pelo governo sueco em homenagem à autora de livros infantis. Ana Maria Ma- chado, além do Jabuti de 1978 e diversos outros prêmios inter- nacionais, desde 2003 ocupa a cadeira 1 da Academia Brasileira de Letras. Outro grande nome das pu- blicações brasileiras é Ruth Ro- cha, ganhadora do Jabuti de 2002, com mais de 130 títulos no Brasil e 20 no exterior. Reprodução Ilustração de Igor Machado para O velho do mar Maria Emília e Miguel, em O mistério do caderninho preto Ilustração de Rogério Coelho: O rato do campo e o rato da cidade O VELHO DO MAR / ANA MARIA MACHADO Editora Moderna/ 47 páginas / R$ 23,60 Variedade temática e opções de escolha A literatura infantojuvenil con- temporânea reúne narrativas que abordam diversas temáti- cas e formatos, facilmente aces- síveis nas prateleiras de livrarias e bibliotecas em publicações de novos e consagrados autores. A escritora e jornalista Ana Maria Machado afirma que a partir dos anos 1970 “desen- volvemos uma literatura infantil de excelente qualidade, o que proporciona muito o que esco- lher”. E completa dizendo que a variedade temática para crian- ças e jovens que conhecemos “não é de hoje. Monteiro Lobato já falava de temas ‘sérios’, por exemplo, em A Chave do Ta- manho, a mais contundente obra contra guerras que já se escreveu para crianças”. A série Sete Mares, lançada recentemente pela editora Mo- derna, é uma das opções de textos de qualidade disponíveis no mercado. A coletânea apre- senta histórias da tradição po- pular de diversas origens, como grega, brasileira e oriental, re- contadas por Ana Maria Macha- do. No livro O Velho do Mar, por exemplo, a autora reconta, de sua maneira, um conto popular russo e em Pescador de Nau- frágios, a história de um pes- cador irlandês. Desde 2009, a editora Sala- mandra vem reeditando toda a obra de Ruth Rocha, com novos formatos e ilustrações, compon- do a Biblioteca Ruth Rocha. O Rato do Campo e o Rato da Ci- dade é uma das recontagens re- lançadas. Já O Mistério do Ca- derninho Preto é uma aposta da autora em alcançar o público jovem, com uma mistura de his- tórias engraçadas e mistério. De acordo com o escritor Ro- gério Andrade Barbosa os textos juvenis “têm a vantagem de po- derem abordar temas mais com- plexos como tortura, prostitui- ção e pedofilia”. Traduções Para Elizabeth Serra, uma con- quista dos últimos 15 anos é o resgate de traduções, realizadas por muitos desses grandes au- tores nacionais. “Nossas crian- ças têm que ter acesso aos clás- sicos, que ficaram por muito tempo esquecidos”, afirma a es- pecialista da FNLIJ. Para Elizabeth Serra, uma conquista dos últimos 15 anos é a tradução de clássicos Mercado de livros infantojuvenis registra crescimento nos últimos anos Segundo a pesquisa Produção e Vendas do Setor 2010, relativa ao ano de 2009, foram lançados 5,8 mil títulos de literatura in- fantojuvenil e relançados 9,5 mil, totalizando mais de 40 mi- lhões de exemplares colocados à venda. A mesma pesquisa re- velou um crescimento de apro- ximadamente 37% de exempla- res publicados em relação ao ano anterior. Para Ana Maria Machado, o mercado editorial infantojuve- nil brasileiro vem crescendo não de agora, mas desde o boom da década de 1970, influenciado principalmente pelo maior aces- so à escola e à diminuição do analfabetismo. “É um dos segmentos mais fortes do mercado, com aumen- to no número de editoras vol- tadas para este público e de tí- tulos”, afirma o escritor Rogério Andrade Barbosa. Para ele, o Governo Federal é um dos fo- mentadores deste segmento, ao comprar livros infantojuvenis para escolas e bibliotecas. Ruth Rocha, que iniciou carreira na década de 1970, publicou seus primeiros textos na Revista Recreio “Desenvolvemos uma literatura infantil de excelente qualidade” ANA MARIA MACHADO, escritora PESCADOR DE NAUFRÁGIOS / ANA MARIA MACHADO Editora Moderna / 47 páginas / R$ 29,50 Rejane Carneiro / Ag. A TARDE / 3.8.2005 Patrícia Moreira / Ag. A TARDE / 12.8.2010

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Matéria sobre o mercado editorial infantojuvenil brasileiroCaderno 2+, Jornal A Tarde, 7 de maio de 2011

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SALVADOR SÁBADO 12/3/20118 2

O MISTÉRIO DO CADERNINHO PRETO /

RUTH ROCHA

Editora Salamandra / 87 pági-nas / R$ 26,30

O RATO DO CAMPO E O RATO DA CIDADE /

RUTH ROCHA

Editora Salamandra / 29 pá-ginas/ R$ 31

MERCADO EDITORIAL Maior parte dos nomes que dominam a produção editorial nosegmento surgiu nos anos 1970 e teve como influência a obra de Monteiro Lobato

Literatura infantojuvenil se renova econsagra clássicos e novos autores

VERENA PARANHOS

Ana Maria Machado, Ruth Ro-cha, Lygia Bojunga, Angela-La-go, Maria José Dupré, Bartolo-meu Campos Queiroz, MarinaColasanti, José Paulo Paes, Sô-nia Robatto, Gláucia Lemos, Ra-chel Queiroz, Ziraldo. Dificil-mente uma criança conseguememorizar todos esses nomes,mas provavelmente já leu his-tórias criadas ou recontadas poresses autores da literatura in-fantojuvenil.

Em comum, eles têm o fato deterem se tornado conhecidos epremiados pelo trabalho desen-volvido na literatura destinada acrianças e adolescentes.

Para Elizabeth Serra, secretá-ria-geral da Fundação NacionaldoLivroInfantileJuvenil (FNLIJ),a geração de escritores infan-tojuvenis que surgiu nos anos1970, e se mantém até hojeentre os melhores do gênero,ainda é bastante influenciadapela obra de Monteiro Lobato,autor que, segundo ela, conti-nua sendo grande referência pa-ra este gênero literário, apesarde toda a polêmica gerada peloparecer do Conselho Nacionalde Educação (CNE) ao conside-rar em 2010 o livro Caçadas dePedrinho como racista.

Por outro lado, a literaturainfantojuvenil também tem serenovado e revelado nos últi-mos anos nomes como RogerMelo e Bia Hetzel, ganhadoresdo Jabuti (2002 e 1995, res-pectivamente), que, segundoElizabeth, têm desenvolvido tra-balhos de qualidade.

Embora conquiste fatias cadavez mais grossas do mercadoeditorial, este gênero, para al-guns, ainda é marginalizado. “Aliteratura infantojuvenil repre-senta uma minoria”, defendeElizabeth Serra.

BoomNo Brasil, a literatura voltadapara o público infantojuvenilaparece no final do século 19 einício do século 20 e cresce acen-tuadamente entre as décadasde 1920 a 1945, mostrando oculto aos heróis nacionais, con-tos de origem folclórica, a va-lorização do espaço rural e asaventuras das crianças, tendocomo destaque a obra de Mon-teiro Lobato.

Mas só nos 1970 aconteceuum boom na literatura infan-tojuvenil, período em que a nar-rativa abrandou o caráter didá-tico-pedagógico e produzi-ram-se obras diversificadas:modernos contos de fadas, deficção científica, narrativas decunho social e policial.

A revista Recreio, lançada em1969 pela Editora Abril, desem-penhou importante papel noperíodo por lançar autores hojeconsagrados como Ana MariaMachado, Ruth Rocha, Joel Ru-fino dos Santos, Ziraldo, entreoutros. Por trás da publicaçãoestava Sonia Robatto, que es-creveu mais de 400 histórias in-fantis publicadas em revistas,fascículos e livros, como criado-ra e editora da Recreio em suaprimeira fase.

Grandes premiadosA Fundação Nacional do LivroInfantil e Juvenil (FNLIJ) é o bra-ço brasileiro da InternationalBoard on Book for Young People(IBBY), instituição sem fins lu-crativos, que promove a litera-tura para jovens e crianças emmais de 70 países. A FNLIJ, entreoutras atividades, é responsávelno Brasil por indicar, a cada doisanos, nomes para concorreremao Prêmio Hans Christian An-dersen, considerado o pequenoNobel de Literatura. As brasi-leiras Lygia Bojunga (1982) eAna Maria Machado (2000) sãoas únicas latino-americanas lau-readas pelo prêmio mais impor-tante da literatura infantojuve-nil mundial, que leva o nome dopoeta e escritor dinamarquês dehistórias infantis.

Lygia Bojunga coleciona ain-da os prêmios Jabuti (1973), omais importante do Brasil, con-cedido pela Câmara BrasileiradoLivro,eALMA(AstridLindgrenMemorial Award) (2004), cria-do em 2002 pelo governo suecoem homenagem à autora delivros infantis. Ana Maria Ma-chado, além do Jabuti de 1978e diversos outros prêmios inter-nacionais, desde 2003 ocupa acadeira1daAcademiaBrasileirade Letras.

Outro grande nome das pu-blicações brasileiras é Ruth Ro-cha, ganhadora do Jabuti de2002, com mais de 130 títulosno Brasil e 20 no exterior.

Reprodução

Ilustração deIgor Machadopara O velhodo mar

Maria Emília e Miguel, em O mistério do caderninho preto Ilustração de Rogério Coelho: O rato do campo e o rato da cidade

O VELHO DO MAR / ANA MARIA MACHADO

Editora Moderna/ 47 páginas /R$ 23,60

Variedade temática e opções de escolhaA literatura infantojuvenil con-temporânea reúne narrativasque abordam diversas temáti-cas e formatos, facilmente aces-síveis nas prateleiras de livrariase bibliotecas em publicações denovos e consagrados autores.

A escritora e jornalista AnaMaria Machado afirma que apartir dos anos 1970 “desen-volvemos uma literatura infantilde excelente qualidade, o queproporciona muito o que esco-lher”. E completa dizendo que avariedade temática para crian-ças e jovens que conhecemos“nãoédehoje.MonteiroLobatojá falava de temas ‘sérios’, porexemplo, em A Chave do Ta-manho, a mais contundente

obra contra guerras que já seescreveu para crianças”.

A série Sete Mares, lançadarecentemente pela editora Mo-derna, é uma das opções detextos de qualidade disponíveis

no mercado. A coletânea apre-senta histórias da tradição po-pular de diversas origens, comogrega, brasileira e oriental, re-contadas por Ana Maria Macha-do. No livro O Velho do Mar, porexemplo, a autora reconta, desua maneira, um conto popularrusso e em Pescador de Nau-frágios, a história de um pes-cador irlandês.

Desde 2009, a editora Sala-mandra vem reeditando toda aobra de Ruth Rocha, com novosformatos e ilustrações, compon-do a Biblioteca Ruth Rocha. ORato do Campo e o Rato da Ci-dade é uma das recontagens re-lançadas. Já O Mistério do Ca-derninho Preto é uma aposta da

autora em alcançar o públicojovem, com uma mistura de his-tórias engraçadas e mistério.

De acordo com o escritor Ro-gérioAndradeBarbosaostextosjuvenis “têm a vantagem de po-deremabordartemasmaiscom-plexos como tortura, prostitui-ção e pedofilia”.

TraduçõesPara Elizabeth Serra, uma con-quista dos últimos 15 anos é oresgate de traduções, realizadaspor muitos desses grandes au-tores nacionais. “Nossas crian-ças têm que ter acesso aos clás-sicos, que ficaram por muitotempo esquecidos”, afirma a es-pecialista da FNLIJ.

Para ElizabethSerra, umaconquista dosúltimos 15 anosé a traduçãode clássicos

Mercado de livrosinfantojuvenisregistra crescimentonos últimos anos

Segundo a pesquisa Produção eVendas do Setor 2010, relativaao ano de 2009, foram lançados5,8 mil títulos de literatura in-fantojuvenil e relançados 9,5mil, totalizando mais de 40 mi-lhões de exemplares colocadosà venda. A mesma pesquisa re-velou um crescimento de apro-ximadamente 37% de exempla-res publicados em relação aoano anterior.

Para Ana Maria Machado, omercado editorial infantojuve-nil brasileiro vem crescendo nãode agora, mas desde o boom dadécada de 1970, influenciadoprincipalmente pelo maior aces-so à escola e à diminuição doanalfabetismo.

“É um dos segmentos maisfortes do mercado, com aumen-to no número de editoras vol-tadas para este público e de tí-tulos”, afirma o escritor RogérioAndrade Barbosa. Para ele, oGoverno Federal é um dos fo-mentadores deste segmento,ao comprar livros infantojuvenispara escolas e bibliotecas.

Ruth Rocha, queiniciou carreira nadécada de 1970,publicou seusprimeiros textosna Revista Recreio

“Desenvolvemosuma literaturainfantil deexcelentequalidade”ANA MARIA MACHADO, escritora

PESCADOR DE NAUFRÁGIOS / ANA MARIA

MACHADO

Editora Moderna / 47 páginas /R$ 29,50

Rejane Carneiro / Ag. A TARDE / 3.8.2005 Patrícia Moreira / Ag. A TARDE / 12.8.2010