Lírica camoniana

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A Lírica Disciplina de Português Profª: Helena Maria Coutinho

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A Lírica

Disciplina de PortuguêsProfª: Helena Maria Coutinho

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Capa da primeira edição das Rimas de Camões, 1595

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Página da edição de 1616 das Rimas, com

o início do poema Cabellos d'ouro...

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Rimas é a designação da obra lírica de Camões, à semelhança da que sempre se deu à poesia de Petrarca. Nela confluem três correntes líricas: a da poesia peninsular, constituída por vilancetes, cantigas, esparsas, endechas, cartas, trovas e outras longas composições (são poemas em redondilha); a corrente italiana, realizada em sonetos, canções, composições em oitava-rima e sextinas (são poemas da medida nova ou decassílabos); a corrente greco-latina é composta por éclogas e elegias. Há ainda as sátiras e as cartas moldadas em metro tradicional.

Rimas

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Em vida, Camões viu apenas publicadas uma ode a apresentar Garcia de Orta em Colóquios dos Simples e Drogas (1563), o soneto "Vós, ninfas da gangética espessura ", a elegia "Depois que Magalhães teve tecida ", ambos dedicados a D. Leonis Pereira, insertos no livro de Magalhães Gândavo: História da Província de Santa Cruz (1576). Diogo de Couto informa-nos na Década VIII que encontrou Camões em Moçambique "vivendo de amigos", trabalhando em "suas Lusíadas" e no seu Parnaso - "livro de muita doutrina e filosofia" que lhe foi roubado e "nunca mais - refere o historiador - dei fé dele". O desaparecimento do Parnaso deu lugar à incorporação de poesias em Rimas que certamente não lhe pertencem. A primeira edição data de 1595, feita por F. Rodrigues Lobo Soropita.

Rimas

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Manifestam-se no lirismo camoniano dois tipos de estilo: o estilo engenhoso, na tradição do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, presente em quase todas as redondilhas e em alguns sonetos, que se fundamenta na coisificação das palavras e das realidades sensíveis e manifesta subtileza e imaginação; o estilo clássico em que as palavras pretendem captar uma realidade externa ou interna, com existência independente das mesmas.

A temática é variada, podendo afirmar-se que gravita à volta de três eixos: o galanteio amoroso, mais ou menos circunstancial, os temas psicológicos quase sempre analisando a paixão amorosa e os temas filosóficos, como a desarmonia entre o Merecimento e o Destino, o direito à felicidade e a impossibilidade de a alcançar, a justiça aparente e a justiça transcendente.

São temas comuns aos bons escritores renascentistas, mas o tom em que Camões os trata é pessoal, nele transparecendo a aliança entre a meditação e a experiência.

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Delimitação Cronológica

A lírica camoniana insere-se na chamada época clássica da literatura portuguesa (1526, regresso de Sá de Miranda da sua

viagem a Itália – inícios do século XIX).

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Contexto político-social

Dentro do contexto histórico clássico, devem salientar-se alguns aspectos:

• O período do Renascimento, que introduz a literatura clássica na Europa, é marcado por alterações políticas e sociais muito significativas.

• De forma geral, a sociedade agrária feudal foi substituída, progressivamente, por uma sociedade mercantil moderna, substituindo-se a burguesia à nobreza como grupo impulsionador da actividade económica.

• Assistiu-se a uma série de progressos técnicos e científicos (invenção da Imprensa, por exemplo). O conhecimento científico foi impulsionado pelos Descobrimentos portugueses e espanhóis, pelo contacto com outras civilizações.

• Os novos conhecimentos estendiam a curiosidade e a intervenção do Homem para fora dos limites transmitidos pela cultura escolástica medieval e pela tradição religiosa.

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Renascimento

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O século XVI representou uma grande viragem no pensamento humano.

Há três conceitos que caracterizam esta mudança: Humanismo Renascimento Classicismo

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Humanismo

Até ao século XVI, a Humanidade vivia na chamada Idade Média, regulada pelas ideias do teocentrismo, quer dizer, Deus era o centro do pensamento humano. Surge, então, o Humanismo que, como o próprio nome indica, coloca o Homem no centro das atenções, dando lugar ao antropocentrismo, que se opõe ao teocentrismo.

É aqui que reside a nova afirmação do pensamento humano, pois o Humanismo acredita nas capacidades do Homem, procurando conhecer cada vez mais e melhor o próprio Homem e tudo o que o rodeia. Não se trata, no entanto, de uma rejeição de Deus, mas sim de uma valorização do próprio Homem, reabilitando o seu conhecimento, as suas experiências, as suas capacidades, o seu espírito. Para que a dignificação do Homem pudesse ser feita, era necessário incutir na Humanidade valores diferentes dos que se viviam durante a Idade Média e que a conduzissem a um caminho mais elevado, mais perfeito.

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Renascimento

O termo Renascimento designa o período em que surgiu uma nova concepção de Homem e de Natureza, assim como um renovado entusiasmo pela cultura clássica. Caracteriza-se por um conjunto de ideias que o Homem dos séculos XV e XVI transportou da cultura greco-latina para as adaptar aos seus dias. O Homem procurou reabilitar a sua condição, olhando para os valores adoptados na Antiguidade Clássica, vendo-os como um bom exemplo para viver e aplicar à sua sociedade. Como sempre acontece, a nova forma de pensar reflectiu-se em todas as artes, como a pintura ou a escultura e a literatura não ficou indiferente a estes conceitos. Por isso, é que alguns escritores humanistas procuraram nestes séculos voltar a adoptar formas da literatura da Antiguidade.

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Classicismo

Desponta nos meados do século XV, desabrochando em força a partir do século XVI, embora durante muitos anos coexistam a arte medieval e a arte clássica. Introduzem-se novas formas, novas espécies, novos géneros. Uma vez que a razão impera sobre o sentimento e porque os valores universais se sobrepõem aos individuais, o Classicismo abandona o sentimento e a inspiração. Este movimento procura, sobretudo, a harmonia, a simplicidade, o equilíbrio, a precisão, o sentido das proporções em qualquer realização artística, na literatura como na música, na pintura como na arquitectura.

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Humanismo> Renascimento> Classicismo

O Renascimento é a aceitação definitiva das formas em que a arte e a história, a literatura e a filosofia greco-latinas se tinham expresso, e a assimilação do espírito pagão que as animava.

O Humanismo é um movimento cultural em que a par do estudo e imitação da antiga cultura greco-latina se procurava desenvolver as capacidades humanas de forma a inverter os papéis até aí existentes, considerando-se a si mesmo eixo do mundo, dono exclusivo do seu destino, sujeito apenas às leis da Natureza.

O Classicismo é um movimento estético em que se procura imitar primeiramente a Itália e depois a Antiguidade, no uso da mitologia, na criação de certas formas poéticas fixas e na introdução de géneros literários e das suas regras.

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Influências na obra de Camões

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Influência tradicional vs Influência clássica ou renascentista

Em Luís de Camões, a tradição do lirismo peninsular coexistiu com a estética clássica renascentista e o maneirismo que marcaram o seu tempo. Juntamente com a poesia de sabor trovadoresco, surge uma poesia cujos modelos formais e temática ("medida nova") revelam a cultura humanística e clássica do autor, que soube encontrar em Platão, Petrarca ou Dante um mentor ou um mestre para o caminho que trilhou e explorou com sabedoria, com entusiasmo e com a paixão do seu temperamento.

Na poesia camoniana são, então, bem visíveis duas influências / correntes distintas:

A influência / corrente tradicional

A influência / corrente clássica

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CORRENTE TRADICIONALNa poesia de influência tradicional, é evidente o aproveitamento da temática da poesia trovadoresca e das formas palacianas.

Temas Saudade, sofrimento amoroso, a beleza da mulher, o contacto com a natureza, a donzela que vai à fonte, o ambiente Pastoril, o ambiente O ambiente cortesão com as suas "cousas de folgar" e as suas futilidades, o humor

VersoMedida velha uso do verso de 5 sílabas métricas (redondilha menor) e de 7 (redondilha maior).

Variedade estrófica As formas poéticas mais frequentes são as da poesia palaciana do século anterior: os vilancetes, as cantigas, as esparsas, as endechas e as trovas.

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CANTIGAA cantiga constitui uma composição medieval galego-portuguesa de tema religioso ou profano, destinada a ser cantada.Formalmente, corresponde a uma composição poética composta por um mote1 de quatro ou cinco versos e por uma ou várias glosas2 de oito, nove ou dez versos, que repetem no final pelo menos o último verso do mote.

Verdes são os campos,De cor de limão:Assim são os olhosDo meu coração.

Campo, que te estendesCom verdura bela;Ovelhas, que nelaVosso pasto tendes,De ervas vos mantendesQue traz o Verão,E eu das lembrançasDo meu coração.

Gados que pasceisCom contentamento,Vosso mantimentoNão no entendereis;Isso que comeisNão são ervas, não:São graças dos olhosDo meu coração..

Cantiga

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Os bons vi sempre passar No mundo graves tormentos; E, para mais me espantar, Os maus vi sempre nadar Em mar de contentamentos. Cuidando alcançar assim O bem tão mal ordenado, Fui mau, mas fui castigado Assi que só pera mim Anda o mundo concertado.

Esparsa

ESPARSATrova de cariz triste e melancólico generalizada na Península Ibérica a partir do século XV que não é precedida nem de glosa nem de mote, constituída por uma única estrofe de redondilha maior, com oito a dezasseis versos.

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Descalça vai pera a fonteLianor pela verdura;Vai fermosa, e não segura.

Leva na cabeça o pote,O testo nas mãos de prata,Cinta de fina escarlata,Sainho de chamalote;Traz a vasquinha de cote,Mais branca que a neve pura.Vai fermosa, e não segura.

Descobre a touca a garganta,Cabelos de ouro entrançado,Fita de cor de encarnado,Tão linda que o mundo espanta.Chove nela graça tanta,Que dá graça à fermosura.Vai fermosa, e não segura.

Vilancete

VILANCETEEtimologicamente, vilancete quer dizer "cantiguinha vilã" e o termo surge pela primeira vez no Cancioneiro Geral. Esta composição poética nasce de um mote pequeno (de dois ou três versos), popular ou alheio, e desenvolve-se nas voltas. Distingue-se da cantiga pelo facto de o mote não ser repetido textualmente e o metro utilizado é o tradicional, de 5 ou 7 sílabas métricas.

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Aquela cativa Que me tem cativo, Porque nela vivo Já não quer que viva. Eu nunca vi rosa Em suaves molhos, Que para meus olhos Fosse mais formosa. (...) Uma graça viva, Que neles lhe mora, Para ser senhora De quem é cativa. Pretos os cabelos, Onde o povo vão Perde opinião Que os louros são belos. (…) Presença serena Que a tormenta amansa; Nela, enfim, descansa Toda minha pena. Esta é a cativa Que me tem cativo, E, pois nela vivo, É força que viva.

Endecha

ENDECHAComposição lírica proveniente do Cancioneiro Geral que exprime sentimentos tristes e plangentes, aspecto que, entre nós, nem sempre foi observado. Constituída por quadras, caracteriza-se pela utilização da redondilha menor ou pelo verso de 6 sílabas.

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Que diabo há tão danado Que não tema a cutilada Dos fios secos da espada Do fero Miguel armado?Pois se tanto um golpe seu Soa na infernal cadeia, Do que o demónio arreceia Como não fugirei eu? Com razão lhe fugiria, Se contra ele e contra tudo,Não tivesse um forte escudo Só em Vossa Senhoria. Portanto, Senhor, proveja, Pois me tem ao remo atado, Que, antes que seja embarcado,Eu desembargado seja.

Trovas

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CORRENTE CLÁSSICA OU RENASCENTISTANa poesia com influência clássica e renascentista, fruto das novas ideias trazidas, de Itália, por Sá de Miranda e António Ferreira, verifica-se um alargamento dos temas e a colocação do ser humano no centro de todas as preocupações.

TemasO Amor platónico, a saudade, o destino, a beleza suprema, a mudança, o desconcerto do mundo, o elogio dos heróis, os ensinamentos morais, sociais e filosóficos, a mulher vista à luz do petrarquismo e do dantismo, a sensualidade, a experiência da vida.

A nível formal:Verso

Medida nova - o verso é o da medida nova, com o uso do verso decassílabo heróico (de acentuação nas 6.ª e 10.ª sílabas) ou sáfico (nas 4.ª, 8.ª e 10.ª), ou ainda, com o uso (menos frequente) do verso hexassílabo.

Variedade estróficaAs formas poéticas mais frequentes são o soneto, a canção, a sextina, a écloga, a elegia e a ode.

Dolce stil nuovo (Doce estilo novo)

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PETRARQUISMO

O Petrarquismo caracteriza-se por uma retoma da temática amorosa, dos recursos estilísticos e do vocabulário utilizados por Petrarca.

A poética petrarquista influencia a Europa, transformando-se num exemplo de perfeição formal e da nova sensibilidade poética.

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PETRARQUISMO

A nível temático, o amor é visto como um serviço que transporta o enamorado a um estado de elevação. O amor pode não só provocar, no jovem apaixonado, o gosto na dor amorosa, como também conduzi-lo à luta entre a razão e o desejo ou à perturbação emocional perante a amada. O amor pode ainda provocar uma análise introspectiva sobretudo sobre os paradoxos do sentimento amoroso, levando o enamorado a caminhadas melancólicas por entre serras e campos desertos, entre outros tópicos.

Quanto à forma, Petrarca introduz inovações métricas (hendecassílabo), principalmente nos sonetos e canções. Para além disso, procura impor, nas suas poesias, uma linguagem e um estilo simples, mas sem vulgarismo e fingimentos. O soneto e a canção tinham já sido cultivados na poesia da escola siciliana e no dolce stil nuovo, mas é Petrarca que projecta essas formas poéticas para um elevado nível de perfeição.

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PETRARQUISMO

Um dos poetas que mais influenciou Camões na sua poesia foi o poeta e humanista italiano Petrarca.

O petrarquismo é uma atitude tomada pelo poeta perante a mulher amada: esta é vista como fonte de perfeição moral, despertando nele uma espécie de amor platónico. A mulher é idealizada, bela, imaculada, perfeita, e faz sofrer porque está longe, por isso, o poeta desabafa as suas mágoas à solidão da natureza, que se torna o reflexo dos estados de alma do poeta e sua confidente. A influência petrarquista faz com que o poeta busque o isolamento e a antecipação do sofrimento. Para demonstrar o seu estado de sofrimento, o poeta utiliza um certo verbalismo e erudição, nomeadamente: as frases exclamativas abundantes, as personificações, as antíteses, as apóstrofes, as subtilezas, as comparações, etc..

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PETRARQUISMO

O Retrato da amada

Laura, o ideal de amor espiritualvs

Vénus, o ideal de amor sensual

Laura e Petrarca

As Contradições do amor

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PETRARQUISMO

A NaturezaLocus Amoenus (Lugar ameno)

Expressão latina que significa "lugar ameno". O locus amoenus consiste numa descrição da paisagem ideal, em ambiente de tranquilidade, bucólico ou pastoril.

Verifica-se a recorrência a elementos da natureza, como árvores, fontes, pássaros e todos os elementos sensoriais a eles associados, tais como o perfume das flores, o cromatismo da paisagem, o canto das aves.

O tema do locus amoenus é ainda escolhido para as descrições do retorno do homem à natureza, à felicidade e ao Paraíso perdido.

Na literatura portuguesa, podemos encontrar alguns exemplares deste tipo, como por exemplo no soneto de Camões, "A formosura desta fresca serra".

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DANTISMOReferências a tormentos do Inferno.

A poesia Camoniana relacionada com a tristeza, desagrado, dor, infortúnio do poeta, saudade, amor não correspondido, entre outros, é de inspiração em Dante - poeta italiano do séc XIII e XIV.

Se por um lado no dantismo a mulher deixa de ser a companheira humana, e se transforma no “ser angélico que sublima e apura a alma dos amantes”, por outro lado, na descrição do Inferno, o dramatismo dos suplícios e os queixumes dos amantes condenados permitiram que o termo “dantesco” seja sinónimo de horrível e que o dantismo signifique a concepção do amor relacionada com a visão extra terrena daqueles que sofrem nas profundezas do Inferno por terem amado.

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PLATONISMOAmor platónico ou amor de contemplação.O poder transformador do amor;

Busca do amor platónico (elevado, espiritual):

Os autores clássicos buscavam um amor idealizado, espiritualizado e racional, que se aproximava da verdade absoluta.

Assim, o amor é visto de uma forma distante, em que, muitas vezes, o ser amado não tem conhecimento de sua situação e o desejo é aplacado pelo juízo.

A filosofia de Platão exerceu grande influência sobre o ocidente e sofreu influências das ideias cristãs que imperavam na época.

Mundo inteligível das ideias puras e suprema perfeição é nele que reside a suprema beleza, a suprema bondade e a suprema ideiaMundo sensível é o mundo em que habitamos efémero é o reflexo do mundo inteligível ao qual o Homem aspira – realidade modelo, eterna

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Eu cantarei de amor tão docemente,Por uns termos em si tão concertados,Que dois mil acidentes namoradosFaça sentir ao peito que não sente.

Farei que amor a todos avivente,Pintando mil segredos delicados,Brandas iras, suspiros magoados,Temerosa ousadia e pena ausente.

Também, Senhora, do desprezo honestoDe vossa vista branda e rigorosa,Contentar-me-ei dizendo a menor parte.

Porém, pera cantar de vosso gestoA composição alta e milagrosaAqui falta saber, engenho e arte.

Soneto

O soneto português quinhentista segue as regras do modelo italiano de duas quadras e dois tercetos: consta de 14 decassílabos ordenados em quatro estâncias, sendo elas duas quadras, trabalhadas no esquema rítmico ABBA-ABBA, precedendo dois tercetos que, na sua forma mais perfeita, também estão sujeitos ao esquema rítmico CDC-DCD, embora sejam igualmente muito comuns os tercetos com as três rimas que seguem o esquema CDE-CDE.

O desenvolvimento da ideia (do tema) está sempre subordinado à obrigatoriedade da rima das estrofes e termina numa nítida pausa final de cada estância. Por norma, toda a composição do soneto termina em beleza por um verso que encerra um pensamento elevado numa cadência.

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Oh! quem me ali disseraQue de amor tão profundoO fim pudesse ver inda algũa hora!(…)Sem me poder ficar mais que a lembrança,Que sempre estará firme,Até o derradeiro despedir-me. (…) Mas quem terá, Senhora,Palavras com que igualeCom vossa fermosura minha pena?Que em doce voz de fora,(…) Canção, não digas mais; e se teus versosÀ pena vêm pequenos,Não queiram de ti mais, que dirás menos.

Canção

Canção

Obra poética destinada a ser cantada; forma poética, de origem provençal, constituída por uma série de estrofes heterométricas e rematadas por uma estrofe mais curta, que se converteu, segundo o modelo de Petrarca, na mais ilustre manifestação do lirismo amoroso da literatura renascentista.

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(Excerto da elegia VI) Se quando contemplamos as secretasCausas por que o mundo se sustenta,O revolver dos céus e dos planetas;E se quando à memória se apresentaEste curso do Sol, que é tão medidoQue um ponto só não mingua nem se aumenta;Aquele efeito, tarde conhecido,Da Lua, em ser mudável tão constante,Que minguar e crecer é seu partido; (…) Esta Potência, enfim, que tudo manda,Esta Causa das causas, revestidaFoi desta nossa carne miseranda.Do amor e da justiça compelida,Polos erros da gente, em mãos da gente(Como se Deus não fosse) perde a vida.

Elegia

Termo de origem grega (elegeía - "lamentação", "canto lúgubre") que designa uma composição poética lírica, em tom melancólico e terno.

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À Lua Detém um pouco, Musa, o largo prantoQue Amor te abre do peito;E, vestida de rico e ledo manto,Dêmos honra e respeitoÀquela cujo objeitoTodo o Mundo alumia,Trocando a noite escura em claro dia. Ó Délia, que, apesar da névoa grossa,Co'os teus raios de prata(…) Onde lamenta e chora desventuras. Por ti guarda o sítio fresco de ÍlioSuas sombras fermosas;Para ti, Erimanto e o lindo EpílioAs mais purpúreas rosas;E as drogas cheirosasDeste nosso OrienteGuarda a Felice Arábia mais contente. (…)

Ode

Por ode entende-se toda a composição poética que se relacione com o género lírico e que, cronologicamente, se liga a uma origem na poesia clássica grega. O seu significado poderá, simplesmente, ser traduzido por "canção", levando a concluir que a ode, de início, seria um poema destinado ao acompanhamento musical, como forma de canto, individual ou em grupo - coro, canto coral.

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Esquema SínteseCorrente tradicional Corrente renascentista

( a influência dos temas da poesia trovadoresca e das formas de poesia palaciana)

( a influência greco - latina e italiana)

Os temas: - A saudade.- O sofrimento amoroso.- O tema da donzela quevai á fonte.- O ambiente Pastoril.- O ambiente Cortesão.- O humorismo.

- O Petrarquismo.- O amor platónico.- A sensualidade.- A beleza divinal.- A saudade.- O destino.- A mudança.- O desconcerto do mundo.

O verso: medida velha - uso do verso de5 sílabas métricas - redondilhamenor - e de 7 - redondilhamaior.

medida nova - uso do verso de 10 sílabas métricas – decasíilabo - de acentuação nas 6ª e 10ª sílabas (heróico) ou nas 4ª, 8ª ou 10ª sílabas ( sáfico).

A variedadeEstrófica:

- o vilancete,- a cantiga- a esparsa,- a trova- a endecha.

- o soneto,- a canção,- a écloga,- a elegia,- a ode.

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Como poeta de transição, Camões revela a influência tradicional e a

influência clássica na sua obra poética. A influência tradicional está

presente nos temas e nas formas poéticas de cariz peninsular. Esta

influência é também chamada de Medida Velha.

A influência clássica revela-se na importação dos temas e formas

poéticas que se cultivavam em Itália. Esta influência é, também,

denominada Medida Nova.

Em Síntese:

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Os Temas da Lírica Camoniana

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Cantando o amor sublime ou a relação mais fútil, o poeta soube, como

poucos, definir-se e definir a alma humana, oferecendo-nos a sua experiência

de vida ou o mundo no seu desconcerto, com os seus problemas sociais e

morais e a eterna questão do mal que aflige a Humanidade.

Os temas da sua lírica são vastos e variados, indo da análise da sua vida

interior à caracterização da realidade do seu tempo ou à busca do

dimensionamento do homem universal.

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TEMÁTICASO AmorO Retrato da AmadaA SaudadeA NaturezaA MudançaO Desconcerto do Mundo...

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Amor lei do universo, princípio da existência e força espiritualContradições do AmorTemperamento ardente e apaixonado do poeta.Transformação do amador na coisa amadaAmor platónico: sentimento de adoração do objecto amado, que leva à contemplação; amor espiritualizado, Amor físico: sentimento que deseja a posse física do objecto amado.A poesia amorosa camoniana é dramática, dilacerada em contradições, entre o amor físico/sensual e o amor platónico/puro/espiritual.

O Amor

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A Mulher• A mulher petrarquista: ideal de beleza - cabelos de ouro, pele branca, sorriso longínquo, gesto suave, pensar maduro, alegria saudosa, algo de incorpóreo. É uma espécie de deusa que aparece em visões ao poeta e contamina a natureza, embelezando-a. O protótipo da mulher petrarquista é Laura, a musa inspiradora dePetrarca.

• A mulher carnal: contornos físicos bem definidos e atraentes que despertam o desejo e a volúpia dos sentidos. É Vénus.

A poesia de Camões é inovadora em relação aos poetas do Renascimento italiano, pela representação da sensualidade da mulher, simbolizada por Vénus.

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A Saudade a saudade da mulher petrarquista (inacessível) a saudade da mulher carnal que não corresponde ou que morreu a saudade da pátria ausente: o exílio a saudade de Jerusalém: a terra é lugar de exílio, o homem sente-se exilado do Paraíso

O sentimento doloroso inspira o poeta a escrever.

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A Natureza

Associada à poesia amorosa. A Natureza pode ser confidente, cenário ou estar personificada. Pode ser harmoniosa, serena, luminosa – locus amoenus.

personificação da naturezameio de engrandecimento das graças da amadaparticipação da natureza nos estados de espírito do poeta

Page 44: Lírica camoniana

A Mudança• a mudança reversível da Natureza /a mudança irreversível do homem•o passado que já não volta e o presente do poeta.• a mudança da própria mudança: mudança imprevista• a mudança como algo negativo (pessimismo e morte)

Page 45: Lírica camoniana

O Desconcerto do Mundo. as injustiças sociais constatadas pelo poeta;. os cataclismos naturais e desconcertantes. a morte sempre no horizonte e sem explicações lógicas. o fracasso do sonho e dos projectos.

Soluções:- a prática da justiça social- desistência da ambição descontrolada- a áurea mediania- o estudo

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Vida, Morte e Deus

• as injustiças sociais , constatadas pelo poeta• os cataclismos naturais e desconcertantes:•morte sempre no horizonte e sem explicações lógicas;•o fracasso dos sonhos e dos projectos•O desconcerto do mundo

Page 47: Lírica camoniana

• responsável pela infelicidade do poeta, causa de tormentos. “ Fatum” (fado, fatal, fatalidade)

O Destino

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Versificação

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Análise Formal

Este poema é um soneto, ou seja, uma forma fixa de composição poética. É composto de duas estrofes de quatro versos (quartetos ou quadras) e duas estrofes de três versos (tercetos).

Amor é fogo que arde sem se ver;É ferida que dói e não se sente;É um contentamento descontente;É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;É solitário andar por entre a gente;É nunca contentar-se de contente;É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;É servir a quem vence, o vencedor;É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favorNos corações humanos amizade,se tão contrário a si é o mesmo Amor?

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Análise FormalO esquema rimático (ou de rimas) mostra com que regularidade as rimas se distribuem ao longo do poema. O esquema é: ABBA //ABBA//CDC// DCD.

Amor é fogo que arde sem se ver;É ferida que dói e não se sente;É um contentamento descontente;É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;É solitário andar por entre a gente;É nunca contentar-se de contente;É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;É servir a quem vence, o vencedor;É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favorNos corações humanos amizade,se tão contrário a si é o mesmo Amor?

ABBA

ABBA

CDC

DCD

A classificação das rimas:A rima é emparelhada (versos 2 e 3; 6 e 7) e interpolada (versos 1, 4, 5 e 8) nas quadras.Nos tercetos a rima é cruzada.

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Análise FormalClassificação da rima riqueza / pobreza

Classificação da rimaToante / Consoante

Amor é fogo que arde sem se ver;É ferida que dói e não se sente;É um contentamento descontente;É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;É solitário andar por entre a gente;É nunca contentar-se de contente;É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;É servir a quem vence, o vencedor;É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favorNos corações humanos amizade,se tão contrário a si é o mesmo Amor?

verboverboadjectivoverbo

verbonomeadjectivoverbo

nomeadjectivonome

nomenomenome

Rima Pobre – as palavras que rimam pertencem à mesma classe gramatical.

Rima Rica – as palavras que rimam pertencem a classes gramaticais diferentes.

Rima Consoante – neste soneto as rimas são todas consoantes. (a correspondência de sons é feita com vogais e consoantes).

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Análise FormalMétricaMétrica é a medida dos versos que compõem o poema.Para medir o verso é preciso fazer a escansão (acto de escandir, ou seja, fazer a contagem das sílabas poéticas.

Como fazer a escansão:

1. Verificar qual é a sílaba tónica da última palavra do verso e desprezar as demais.

Quando uma palavra terminar com vogal e a seguinte também se iniciar com vogal, é possível que elas se unam, mas só nas seguintes condições:quando as duas vogais forem iguais (crase): fo / ssees / pe / ci / alou quando as duas vogais forem diferentes e átonas (elisão): fo/ ssea/ ssim

A/mor/ é/ fo/go/ que ar/de /sem /se /ver;É ferida que dói e não se sen(te);É um contentamento desconten(te);É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;É solitário andar por entre a gen(te);É nunca contentar-se de conten(te);É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vonta(de);É servir a quem vence, o vencedor;É ter com quem nos mata lealda(de).

Mas como causar pode seu favorNos corações humanos amiza(de),se tão contrário a si é o mesmo Amor?

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Aná

lise

Form

al A/mor/ é/ fo/go/ que ar/de /sem /se /ver;

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

É/ fe/ri/da/ que /dói /e /não /se /sen(te);

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

É /um /con/ten/ta/men/to /des/con/ten(te);

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

É /dor /que / de/sa/ti/na /sem /do/er;

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

É um não querer mais que bem querer;É solitário andar por entre a gen(te);É nunca contentar-se de conten(te);É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vonta(de);É servir a quem vence, o vencedor;É ter com quem nos mata lealda(de).

Mas como causar pode seu favorNos corações humanos amiza(de),se tão contrário a si é o mesmo Amor?

O verso tem 10 sílabas métricaVERSO DECASSILÁBICO

Page 54: Lírica camoniana
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Aná

lise

Form

al

É/ que/rer /es/tar/ pre/so/ por /von/ta(de);

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É /ser/vir/ a /quem/ ven/ce, o/ ven/ce/dor;

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

É /ter/ com /quem /nos /ma/ta/ le/al/da(de).

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Mas/ co/mo /cau/sar /po/de /seu /fa/vor

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Nos /co/ra/ções /hu/ma/nos /a/mi/za/(de),

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Se/ tão /con/trá/rio a/ si/ é o/ mês/mo A/mor?

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

O verso tem 10 sílabas métrica

VERSO DECASSILÁBICO

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Fim

Disciplina de PortuguêsProfª: Helena Maria Coutinho