Língua Portuguesa e Literaturas de Língua Portuguesa | Ciências ...
Língua Portuguesa - Almanaque02
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Ano 1Número 2Agosto/Setembro2005
Na ponta do lápisAlmanaque do Programa Escrevendo o Futuro
IniciativaFundação Itaú Social
RealizaçãoCentro de Estudos e Pesquisas em Educação
Cultura e Ação Comunitária – Cenpec
CoordenaçãoSonia Madi
Equipe de ediçãoLuiz Henrique Gurgel (edição de texto e
consultoria)Maria Aparecida Laginestra
Regina Andrade Clara
Leitura críticaAnna Helena AltenfelderMaria Estela BergaminMarta Wolak Grosbaum
RevisãoSimone Zaccarias
Edição de arteEva Paraguassú de Arruda Câmara
José Ramos NétoCamilo de Arruda Câmara Ramos
IlustraçõesSuppa
Criss de Paulo
ColaboradoresEdileuza Alves Santana, Elizamar de Castro Trajano
do Nascimento, Ivani Alencar, Maria AntonietaRizzotti Oliveira, Marina Brant de Carvalho Martins,
Tathyane Fernandes Tudda.
Fontes consultadasO lugar mítico da memória – Cláudia Cerqueira do
Rosário (Morpheus, 2002)São Paulo de Piratininga: de pouso de tropas a
metrópole – O Estado de São Paulo(Terceiro Nome, 2003)
Se bem me lembro – Memórias – Anna HelenaAltenfelder e Regina Andrade Clara (2004)
Portos de Passagem – João Wanderley Geraldi(Martins Fontes, 1991)
Revista da Folha – SP-450 – Edição Especial(25/01/2004)
Amigos da Escola – Com vocês as Artes – A arte é
de todos (Cenpec)Propaganda brasileira – Francisco Gracioso e
J.Roberto Whitaker Penteado (São Paulo: MauroIvan Marketing Editorial, 2004)
Convite à Filosofia – Marilena Chauí (São Paulo,Ática, 1994)
AgradecimentosMemorial da Propaganda do Mercado Central de
Fortaleza – CEEscola superior de Propaganda e Marketing ESPM
Contato com a redaçãoRua Dante Carraro,68 – São Paulo – SP
CEP 05422-060 – Telefone: 0800-7719310E-mail: [email protected]
SUMÁRIO
ENTREVISTA
“Uma experiência humanizadora”,com a professora Ecléa Bosi
2
RECADO DO LEITOR4
QUESTÃO DE GÊNERO
Ana Lima escreve sobre o texto de memórias
5
PÁGINA LITERÁRIA“Uma definitiva presença”,
texto de Bartolomeu Campos de Queirós6
ESPECIAL
“Crianças escutam memórias eaprendem história”Conceição Cabrini
8
ONDE ESTÁ O FUTURO“Crianças do Brasil mantêm viva nossa
memória”10
DE OLHO NA PRÁTICA12
REPORTAGEM
“Lembranças que viram história”14
TIRANDO DE LETRA16
HISTÓRIA DE ALMANAQUE
“Foi assim”18
O QUE VEM POR AÍ19
TEXTO VENCEDOR
“Da lamparina à luz elétrica”
20
COISAS DE ALMANAQUE
21
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Reter e guardar o tempoEm recente artigo publicado na revista
científica Nature, uma das mais prestigiadasdo mundo, cientistas norte-americanos divul-garam que para cada lembrança específicade um ser humano, é possível que exista umneurônio responsável por ela. Como cadaum de nós tem bilhões dessas minúsculascélulas no cérebro, talvez isso explique nos-sa capacidade de armazenar uma infinidadede lembranças.
E o tema principal da segunda edição doNa ponta do lápis é a criação de textos dememória. Crianças de todo o Brasil recolhe-ram histórias, descobriram antigas novidadese as mantiveram vivas por meio dos textosque elaboraram. Dessa maneira, fizeram aqui-lo que é a própria definição de memória, se-gundo a professora Marilena Chauí: “a capa-cidade humana de reter e guardar o tempoque se foi para salvá-lo da perda total”.
Propondo aos professores o trabalho comesse gênero de texto, o Programa Escreven-do o Futuro quer aliar práticas de ensino daescrita a ações que estimulem a cidadania ea identidade com o local em que se vive. “Éuma ação humanizadora”, nos disse EcléaBosi, professora do Instituto de Psicologia daUniversidade de São Paulo e especialista emnarrativas de memória, em entrevista espe-cial publicada nesta edição. Outro convida-do que trata do tema é o escritor BartolomeuCampos Queirós, que escreveu história ex-clusiva para a Página Literária, seção das maisapreciadas por nossos leitores.
E para os professores que desejarem tra-balhar com seus alunos esse gênero de tex-to, as seções De olho na Prática e Tirandode Letra trazem indicações e orientações deespecialistas com base nas produções dosestudantes para o Programa Escrevendo oFuturo.
Também queremos agradecer às dezenasde cartas recebidas, parabenizando-nos pelolançamento do almanaque e indicando novosconteúdos que serão pensados pela equipe.Esse intercâmbio com os leitores é a razãode ser da publicação. Continuem enviandosuas sugestões, impressões e experiências.
A todos um bom trabalho e boa leitura.
Uma Mensagemdo Cenpec
1
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
A valorização da memóriacomo ferramenta de trabalho nãopropõe a volta a um passado crista-lizado e acabado, muito menosconstitui uma tentativa de priorizarcostumes, tradições e valores deoutros tempos.
A articulação do passado e dopresente por meio da memória desujeitos anônimos, protagonistas deum mundo que nos diz respeito, pre-tende criar um diálogo em que cos-tumes e valores que fazem parte denossa história sejam reconhecidoscomo integrantes da trajetória pes-soal de cada um. Trata-se de viverem um espaço de pertencimento, desentir-se enraizado, apropriando-seda herança das gerações anteriores,de modo a reelaborá-la.
É um olhar diferente sobre nossarealidade, relacionado a um passa-do que nos diz respeito, e que per-mite destacar tempos distintos e cul-turas diversas convivendo, muitasvezes, no mesmo espaço. São mani-festações vivas, de raízes profundas,diretamente ligadas aos múltiplosmodos de ser hoje.
Maria Alice Setubal
Presidente do Cenpec – Centro de
Estudos e Pesquisas em Educação Culturae Ação Comunitária
AS CRIANÇAS ESTÃO PRATICANDO A VERDADEIRA CULTURA QUE É A INSERÇÃO DO PASSADO NO PRESENTE.
ENTREVISTA
2
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
“Uma experiência humanizadora”Assim a professora Ecléa Bosi, do Instituto de Psicologia da USP, define as atividades decrianças com histórias e memórias de idosos. Ela é autora, entre outros, de Memória esociedade: lembranças de velhos, um dos mais importantes trabalhos sobre o gênero,incluído pelo Ministério da Educação entre as cem obras sobre o Brasil que devem comporas Bibliotecas Escolares Públicas. Desde menina sempre gostou de ler e escutar histórias.Traduziu autores como Leopardi, Ungaretti, Garcia Lorca e Rosalia de Castro. Ela chama
atenção para o compromisso que se assume com alguémquando escutamos e registramos sua história de vida: “oescutador torna-se responsável eticamente pela narrativa epelo narrador, não pode abandoná-lo”. Atualmente coordenao programa Universidade Aberta à Terceira Idade, na mesmaUSP. Em sua sala, no Instituto de Psicologia, recebeu nossaequipe para a entrevista.
ECLÉA BOSI
Como foi seu envolvimento com apesquisa de memória?
Quando eu era criança haviauma invasão menor da mídia den-tro das casas, pouca televisão. Agrande distração da criança, alémdas brincadeiras de rua, era escutarhistórias dos pais e avós. Caminhá-vamos muito em São Paulo. Eu mo-rava perto da rua Oscar Freire e es-tudava nos Campos Elíseos, ia e vol-tava a pé. Nessas caminhadas, meuscompanheirinhos pediam que eucontasse histórias, para abreviar otempo. Quando escrevi Memória esociedade: lembranças de velhos,uma tese defendida em 1978, co-meçou em toda parte uma onda depesquisas sobre memória e esses pes-quisadores diziam haver se inspira-do nesse trabalho. Penso que a ins-piração veio para mim e para os ou-tros pesquisadores da necessidadede um encontro com o passado maispróximo de nosso tempo.
Como pensar a história a partir damemória de velhos?
A memória de velhos é diferen-te da história oficial. Os depoimen-tos são cheios de lacunas, diferentesda história que se lê nos livros. Vocêouve um depoimento de alguém queassistiu a um desastre, a narrativa
grande em São Paulo, que só essanarrativa ingênua de uma pessoa ile-trada, embora sábia como dona Ri-zoleta, pudesse dar idéia do que te-nha sido.
Qual a função social damemória? De que forma otrabalho com a memória podecolaborar para o enfrentamentodos problemas atuais?
Depoimentos que você colhe nãosão para serem arquivados. Todo de-poimento existe para transformar a ci-
dade em que ele floresceu.Escutar uma narrativa
desencadeia em você,ouvinte, compro-misso com o nar-rador. Mais ainda,um compromissocom a própria ci-dade em que anarrativa floresceu.Você é responsá-vel. Por exemplo,no meu caso, euentrevisto pessoasmuito idosas esensíveis às trans-
formações urbanas.Isso desencadeia um
compromisso com oplano diretor da cidade. Em
uma pesquisa que fiz, verifiquei, porexemplo, que a maioria dos idososacidentados na seção de ortopediado Hospital das Clínicas de São Pau-lo não era um caso de médico, mascaso de advogado, por causa dascalçadas da cidade, das casas po-pulares mal construídas...
dessa testemunha é uma narrativaem que há susto, emoção. Ainda quenão seja perfeitamente objetiva, trazalguma coisa profundamente verda-deira: a emoção que o desastre de-sencadeou e que atravessa a narrati-va. Em 1910, o cometa Halley atra-vessou o céu de São Paulo. Entrevis-tei pessoas da época e ouvi manei-ras diferentes de falar da passagemdo cometa. Qual a verdadeira? Nãonos cabe dizer. Uma das entrevista-das, a dona Rizoleta, me disse “Ah!O cometa Halley. Eu vi sim, foi no
dia em que o Papa morreu e a terratremeu.” Sabe-se que nem o Papatinha morrido, nem a terra tremido.Acontece que nenhuma outra nar-rativa mostra a emoção que se sen-tiu, pessoas se atiraram do viadutoachando que era o fim do mundo,houve uma convulsão social tão
“
Escutar umanarrativa desencadeia
em você, ouvinte,compromisso com o
narrador. Mais ainda, umcompromisso com a
própria cidade em que anarrativa floresceu. Você
é responsável.
“
OS DEPOIMENTOS NÃO SÃO MOTIVOS DE NOSTALGIA, MAS DE LUTA PARA QUEM MERECE ESCUTÁ-LOS.
3
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
sobre a sua vida, para ela é um atode amizade; e o escutador tem queresponder a esse ato de amizadecom outro ato de amizade. Ele se tor-na responsável eticamente pela nar-rativa e é um pesquisador diferentedos outros porque também se tornaresponsável pelo narrador e nãopode abandoná-lo, ele tem de visi-
Ecléa Bosi e o marido AlfredoBosi
Entre as obras de Ecléa Bosi estão Velhos amigos, O tempo vivoda memória e Memória e sociedade.
tá-lo. Estamos recebendo um alentoda pessoa, as horas, seu tempo devida, ela está nos dando uma coisapreciosíssima. Somos tão responsá-veis por ela quanto um amigo é res-ponsável pelo outro.
No Programa Escrevendo o Futuroas crianças são pesquisadores damemória e, orientadas por seusprofessores, procuram os idososem suas comunidades, ouvemsuas histórias e as reescrevem.Que importância a senhora vênisso? Como avalia esse tipo detrabalho?
Eu acho que as crianças estãopraticando a verdadeira cultura queé a inserção do passado no presen-te, as pesquisas das crianças são
Fazer com que acriança procure o tioidoso, o avô, o velhode asilo que ninguémmais visita e que se
sente banido,é uma experiência
humanizadora.
“
“
Todas as entrevistas edepoimentos são aproveitados?Que critérios a senhora usa paraselecionar os melhoresdepoimentos?
Não, nem todos são aproveita-dos. Ou por falhas técnicas ou aci-dentes biográficos do idoso, que nãopode continuar. Não existe umanarrativa que seja completa. Emcerto momento o ouvinte párae o narrador pára, mas a his-tória continua tanto na ca-beça do ouvinte como nacabeça do narrador. A his-tória se completa em nósmesmos e para você regis-trar uma história de vidaseria preciso um escutadorinfinito. Todos os depoi-mentos são bons e mere-cem o mesmo respeito.Eles não são motivos denostalgia, mas de luta paraquem merece escutá-los.
Que sugestões e conselhos asenhora daria aos professoresque estão trabalhando o gêneromemórias?
Essa pergunta me foi feita tantase tantas vezes, que eu escrevi no li-vro O tempo vivo da memória umcapítulo sobre isso. O estudioso damemória deve ser uma pessoa pre-parada para isso, não basta que co-nheça metodologia de pesquisa. Eleprecisa compreender o depoimentocomo um trabalho do idoso, ele nãopode registrar sem que o idoso te-nha conhecimento da narrativa. Pormais simples que seja, esse idoso temo direito de reler aquilo que falou ever se está de acordo. É uma ques-tão ética. Entre todos os conselhosde método que eu dou, o mais im-portante é a responsabilidade pelooutro, porque dada a natureza dapessoa idosa que faz o depoimento
mais humanizadoras. Eu me lembrode uma pesquisa maravilhosa feitapela atriz Lélia Abramo (1911 –2003). Ela trabalhou na Secretariade Cultura de São Paulo com a pre-feita Luiza Erundina. Foi às escolaspúblicas municipais e pediu que ascrianças falassem sobre seus avós.Eu li as produções. Esse trabalho
mostra o cerne do problema socialdo idoso, embora contado por
crianças muito novas. É umasituação que se reproduz nos
lares. Deseja-se que o ido-so ajude a lavar louça, a to-mar conta dos pequenos,faça trabalhos por vezespesados. Mas se ele quiserdar um conselho para umadolescente sobre compor-tamento, a escola, a educa-ção e o uso do tempo doneto, ele é convidado a secalar. Do idoso se deseja obraço servil, mas não o con-
selho. Ele tem experiência,tem memória, discernimento
e tudo o que é necessário paradar um conselho. Por isso fazercom que a criança procure o tioidoso, o avô, o velho de asilo queninguém mais visita e que se sentebanido, é uma experiência huma-nizadora. Embora se fale muitodos direitos da terceira idade, oque acontece é que nós vivemos naépoca do descartável, do consumoe tal época não é favorável ao ofe-recimento da memória, da expe-riência. Fazer com que a criançase volte precocemente para a his-tória oral contada pelos mais velhosé uma experiência das mais impor-tantes. É uma valorização públicado idoso.
Entrevistadores: Luiz HenriqueGurgel, Maria Antonieta deOliveira e Cida Laginestra.
E A SUA CARTA? DO QUE VAI FALAR?
4
– de
– p +sa
– p+ r ( )
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
RESPOSTA NA PÁGINA 21.
Gerando frutos“Desde que conheci o material pe-dagógico do Programa Escreven-do o Futuro, aprendi uma nova me-todologia nas aulas de produçãotextual. Leciono na 5a e 6a séries edesenvolvo um trabalho com tex-tos narrativos, em que as históriasproduzidas em sala de aula serão or-ganizadas para a edição do nossoprimeiro livro de histórias infantis.”
Aucielly de Sousa MeloPombal (PB)
Carta Enigmática
Para evitar o calote,
inventaram o selo
Na Inglaterra, antes dacriação dos selos, osmensageiros que levavam ascorrespondências em longasviagens a cavalo ou carroçadeveriam ser pagos pelosque recebiam as mensagens.Muitas vezes os destinatáriosnegavam-se a pagá-los. Comos selos garantia-se opagamento antecipado.
Cartas trazem opinião e novos leitores
Os leitores que preencheram e enviaramas cartas-resposta à redação elegerama seção Página Literáriacomo a melhor da publi-cação. Em seguida fica-ram Questão de Gêneroe Tirando de Letra.
Os educadores tam-bém indicaram profes-sores amigos que, a par-tir de agora, passarão areceber as novas ediçõesdo almanaque. Se vocêtambém deseja opinar, fa-zer comentários e indicaroutro professor para rece-ber o Na ponta do lápis,basta preencher acarta-resposta,encartada nestaedição, dobrar, colar epôr no correio, sem precisarpagar a postagem.
ESCREVA PARA NÓS:
RUA DANTE CARRARO, 68
CEP 05422-060
SÃO PAULO-SP
Primeiro selo postal, emitido na
Inglaterra em 6 de maio de
1840, todo preto, com o valor
de 1 penny e a efígie da rainha
Vitória.
?VOCÊSAB AI
Mestres e aprendizes“Vocês nos deixaram muito comque pensar. Nos deram, também, atarefa de colaboradores. Vocês jáimaginaram os aprendizes ensinan-do com os mestres? É bárbaro! Sin-to-me honrada de ter sido convida-da a dar sugestões no almanaque.Estou à vontade para sugerir e ofarei com carinho.”
Silvia Modesto de OliveiraCamocim (CE)
A experiência dos alunos“O almanaque vai orientar os pro-fessores no trabalho com a escritaem sala de aula. Todas as seçõessão interessantes, mas sugiro umaseção em que os alunos participan-tes do concurso pudessem relatarsuas experiências na elaboração detexto.”
Irandir Gomes PaivaFortaleza (CE)
Viagem pelo conhecimento“Quando fui convidada a represen-tar os professores de meu municí-pio no lançamento do Programa Es-crevendo o Futuro, nem imaginavaque naquele momento começariauma “nova viagem” em minha vidacomo educadora. O programa meproporcionou e continua proporcio-nando uma viagem pelo caminho doconhecimento e como dizem meusalunos: “Uma viagem só de ida...”
Juliana Barbosa CassimiroSão Roque (SP)
N + – rinho
– v+ h
RECADO DO LEITOR
TRAZER DE NOVO AO CORAÇÃO ALGO QUE TENHA FICADO ESQUECIDO EM ALGUM LUGAR DA MEMÓRIA.
Questão de Gênero
5
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Ana Lima*
Etimologicamente, ‘recordar’ vem de re + cordis (coração),significando, literalmente, “trazer de novo ao coração algo que,devido à ação do tempo, tenha ficado esquecido em algumlugar da memória”. Podemos dizer que, em linhas gerais, éexatamente essa a função de um texto do gênero Memórias.
Um texto de memórias objetiva resgatar um passado, a partir daslembranças de pessoas que, de fato, viveram esse passado. Ele repre-senta o resultado de um encontro, no qual as experiências de uma gera-ção anterior são evocadas e repassadas para uma outra, dando assimcontinuidade ao fio da História, que é de ambas; porque a história decada indivíduo traz em si a memória do grupo social ao qual pertence.
É esse resgate das lembranças de pessoas mais velhas passadas conti-nuamente às gerações mais novas, por meio de palavras e
gestos, que liga os moradores de um lugar. O fato deentender que a história de alguém mais velho é nossaprópria história desperta um sentimento de pertencera determinado lugar e a certa época, e ajuda a au-mentar a percepção de um passado que foi realmentevivido e não está morto nem enterrado.
Alguém que almeje escrever um texto de memórias tem uma árduatarefa pela frente: identificar pessoa(s) que possa(m) realmente contri-buir para a elaboração do texto, com suas lembranças; realizar umaentrevista com essa(s) pessoa(s); selecionar e organizar as informaçõesrelevantes coletadas e, finalmente, escrever o texto.
Não podemos contudo esquecer que a entrevista éum gênero da modalidade oral da língua, e, se foi gra-vada, certamente apresentará várias marcas da oralida-de. O escritor de memórias deve estar ciente disso, eseu trabalho será transformar aquele texto oral emtexto escrito. Além disso, precisa atentar para al-gumas características específicas desse gênero, quedevem ser atendidas. O escritor, por exemplo, deve assumir a voz dapessoa entrevistada, ou seja, o texto deve ser em primeira pessoa. Nãose trata de um simples reconto do que ouviu na entrevista, e sim de umareinterpretação, que deve resultar em um texto de natureza literária,narrativo em sua maior parte.
Ademais, em nenhum momento se pode perder de vistaque há um leitor curioso para conhecer o passado, demodo que o texto deve ser escrito com criatividade, detal maneira que esse leitor se sinta envolvido por ele.
Alguns elementos normalmente presentes nos textos dememórias são as comparações entre passado e pre-
sente, a presença de palavras e expressões quetransportam o leitor para uma certa época dopassado (“antigamente”, “naquele tempo”, etc.),
referência a objetos, lugares e modos de vida dopassado, descrições (se couberem) de lugares ou pessoas e explicaçãodo sentido de certas expressões antigas ou de palavras em desuso.
Enfim, cabe ao escritor das memórias posicionar-secomo um pesquisador que busca recuperar a memória co-letiva de sua cidade, e, por meio do seu texto, possibilitarque os leitores “tragam para o coração” um passado que,mesmo não tendo sido vivido por eles, foi decisivo para quesejam o que são atualmente.
* Professora do Departamento de Letrasda Universidade Federal de Pernambuco
“No contexto mítico, recordar sig-nifica resgatar um momento ori-ginário e torná-lo eterno em con-traposição à nossa experiênciaordinária do tempo como algo quepassa, que escoa e que se perde.A recordação, como resgate dotempo, confere imortalidade àqui-lo que ordinariamente estaria per-dido de modo irrecuperável semesta re-atualização.”
Cláudia Cerqueira do Rosário (trechode O lugar mítico da memória,
publicado na revista Morpheus, 2002)
Digna de uma deusa
Protetora das artes e da história,musa da poesia épica, Mnemosyneera a deusa da memória para osgregos, a que conferia imortalida-de aos mortais. Ela dava aos poe-tas o poder de voltar ao passadoe de lembrá-lo para a coletivida-de. O humano que tivesse regis-trado em obras a fisionomia, osgestos, os feitos e as palavras nun-ca seria esquecido, pois ao tornar-se memorável não morreria jamais.
O gênero Memórias
UMA LUZ MANSA DE LUAR, CAPAZ DE ALVEJAR MEU DESEJO OBSCURO DE APRENDER.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Página LITERÁRIA
Uma definitiva presençaEla entrava na escola abraçando os nossos
cadernos “Avante”. (A sala tinha cheiro de rou-pa lavada. Tudo limpo como água de mina e omundo ficava mudo para escutá-la. Sobre a suamesa pousava uma jarra sempre com flores domato que os alunos colhiam pelo caminho). Aoabraçar os cadernos era como se a professorame apertasse sobre seu coração, me perdoan-do, com antecedência, os meus erros e acer-tos. Eu ainda não lia ou escrevia de “carreiri-nha”. Mas seu olhar foi o meu primeiro livro! Elame acariciava com seus olhos e derramava so-bre mim uma luz mansa de luar, capaz de alve-jar meu desejo obscuro de aprender. Seus olhosme permitiam a liberdade. Sua presença inteirame trazia uma paz azul e uma certeza de que ofuturo era possível.
É que Dona Maria Campos levava nossascomposições, ditados, cópias, para corrigir emcasa. Eu morria de inveja do meu caderno porsaber que ele conhecia onde a professora vivia.Seu lápis, metade azul e metade vermelho, bor-dava em nossos trabalhos as notas que iam de 0a 10. E trazia sempre uma observação: “muitobom”, “parabéns”, “ótimo”, “mais atenção”, “épreciso estudar mais”. Eu recebia meu cadernocom o coração descontrolado. Parecia que umaborboleta tinha vindo morar em meu peito. Ti-nha medo de não corresponder aos seus ensi-namentos. Não queria que a professora dei-xasse de me amar.
E como Dona Maria Campos sabia! Paratudo ela tinha uma resposta ou uma outra per-gunta na ponta da língua. Dava aulas como seestivesse recitando uma poesia feita de água,névoa ou nuvem. Eu achava minha professoramais bonita que os poemas. E não era difícildecorar os versos e repeti-los depois, no escu-ro do meu quarto. Guardava tudo de cor semesforço.
E quando ela pegava no giz branco e passa-va o ponto, no quadro negro, eu mordia a pon-ta da língua esforçando-me para imitar a suaescrita. Ela fazia as letras tão bonitas que nãome bastava apenas copiar: eu desejava apren-der também a sua letra. E como me emociona-va aqueles “as” redondinhos, aqueles “emes”como cobrinhas, aqueles “eles” como orelha decoelho espantado.
Em meus momentos de calma eu enchiapáginas e outras páginas com seu nome, o nomede minha mãe, de meu pai, de minha escola.Era minha maneira de ter sempre a Dona Ma-ria Campos ao meu lado.
E quando escolhido para passar o ditado noquadro, para os colegas corrigirem o deles, maiseu caprichava na letra.
O difícil era o quadro não ter linha, poisseguir em linha reta, sem estrada, dependia tam-bém do olhar. Mas para alegrar a professora todadificuldade era pouca. Se ela me elogiava eu
6
Nas lembranças do premiado escritor BartolomeuCampos de Queirós, ficou marcada a figura daprofessora que lia histórias para ele e seus colegasnuma escola do interior de Minas Gerais. O escritor aos sete anos
Bartolomeu Campos de Queirós
5
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
baixava a cabeça. Por fora muita vergonha epor dentro um herói.
Nas horas de leitura em voz alta eu nãomedia esforços. Cada menino lia um pedaço.E a professora escolhia alternado. Ninguémsabia sua hora. Eu acompanhava as linhas dolivro com o dedo. Cheio de medo e desejoesperava minha vez. Lia devagar cada palavra,obedecendo a pontuação,controlando o fôlego. DonaMaria Campos dizia que nasvírgulas a gente respiravae no ponto final dava umaparadinha.
Mas o melhor era quan-do ela nos mandava guardaros objetos. A gente fechavao caderno, guardava o lá-pis e a borracha dentro doestojo e esperava com osbraços cruzados sobre a car-teira. Assim, ela continuavamais um pedaço da histó-ria. Parecia com a Sant’Anada capela com o livro nocolo. Eu não acreditava quepodia existir outro céu além da nossa sala deaula.
Ficava intrigado como num livro tão peque-no cabia tanta história, tanta viagem, tanto en-
7
FICAVA INTRIGADO COMO NUM LIVRO TÃO PEQUENO CABIA TANTA HISTÓRIA, TANTA VIAGEM, TANTO ENCANTO.
canto. O mundo ficava maior e minha vontadeera não morrer nunca para conhecer o mundointeiro e saber muito, como a professora sabia.O livro me abria caminhos, me ensinava a es-colher o destino.
Eu pedia o livro emprestado, depois queDona Maria terminava. Levava para casa ebrincava de escola com meus irmãos menores.
Assentava com o livro, compose de professor, e lia paraeles. Era difícil guardar tan-ta beleza só para mim.Não sei se gostavam da lei-tura ou se imaginavam, umdia, serem alunos da minhaescola.
Meu pai, assentado naescada da casa, prestavaatenção na minha leitura,de maneira despistada.De noite, antes de dormir,curioso, ele queria que euadiantasse um pouco maisda história. Mas eu nãocontava. Sabia que imaginarfazia parte da leitura.
Bartolomeu Campos de Queirós é escritor.Recebeu os prêmios Jabuti, APCA,
Bienal de São Paulo, Fundação do Livro Infantil eJuvenil entre outros.
Mas para alegrara professora toda
dificuldade era pouca.Se ela me elogiava
eu baixava a cabeça.Por fora muitavergonha e por
dentro um herói. ”
“
ESPECIAL
Crianças escutam memórias eaprendem história
Lendo os textos de memó-rias elaborados pelos alunosque participaram do Prêmio Es-crevendo o Futuro em 2004nos damos conta de que em-bora esse projeto tenha comoprincipal objetivo colaborarcom os professores no ensinoda escrita, ele faz mais do queisso: penetra em outras áreasde conhecimento e constróiconceitos também de História.
Isso acontece principal-mente nas oficinas propostasno fascículo Se bem me lem-bro (Kit Itaú de Criação de Tex-to) em que os alunos aprende-
O RELATO ORAL É TAMBÉM UMA FONTE HISTÓRICA.
8
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
�
� ram o procedimento de entre-vista e, de porte dessa ferra-menta, provocaram a memó-ria de idosos. Estes, sentindo-se provocados, evocaram suasexperiências e fizeram emer-gir pessoas, lugares, sons, chei-ros que impregnaram suasmemórias ao longo da vida. Fa-laram de sua infância, de comoera a vida antigamente, descre-veram a cidade onde morarame aquela na qual residem atu-almente, as mudanças ocorri-das, compararam o presenteao passado. A partir desses re-latos as crianças escreveram
A vida não éa que a gente viveu,
e sim a que agente recorda,
e como recordapara contá-la.
Gabriel Garcia Márquez – Viver para contar
A Professora Conceição Cabrini analisa as atividades vivenciadaspelos alunos e os textos produzidos nas oficinas sobre o gênero Memórias,
destacando os conceitos históricos presentes
Conceição Cabrini*
Para saber mais sobreo tema memória e
história
HALBWACHS, Maurice. A me-mória coletiva. São Paulo: Vérti-ce, 1990.
FERREIRA, Jerusa Pires. Arma-dilhas da memória. Cotia, SP:Ateliê Editorial, 2003.
ZUMTHOR, Paul. Tradição e es-quecimento. São Paulo: Huci-tec, 1997.
BOSI, Ecléa. Velhos amigos.São Paulo: Companhia das Le-trinhas, 2003.
tórias recriadas não são espe-lhos dos relatos ouvidos: elasindicam as possíveis mudançaspermeadas pelas novas expe-riências do viver cotidiano.
Esses relatos também se tor-naram tema de conversa entreas crianças e seus familiares,vizinhos e amigos. Nesses diá-logos, puderam perceber queas reminiscências não perten-ciam apenas aos entrevistados,mas foram construídas coleti-vamente no dia-a-dia das pes-soas que viviam num mesmolugar. É por isso que se podedizer que a memória de um in-divíduo é constituída na me-mória coletiva.
Muitas vezes os relatoseram complementados e ques-tionados nas conversas infor-mais e o professor podia cha-mar a atenção para o fato deque quem relata selecionauma parte da experiência vivi-da, dá importância maior a de-terminados acontecimentos,enquanto outros são esqueci-dos. Além disso, o narrador, aorecuperar suas lembranças,atribui um novo significado aosacontecimentos, o que possi-bilita às pessoas construíremuma nova representação dosfatos. Cada ouvinte, por suavez, traduz essas lembrançasem uma nova versão do epi-sódio relatado.
Todos esses aspectos cola-boraram para que os alunos
textos como se fossem os en-trevistados, tornando-se assimprodutores de memórias dolugar onde vivem.
Recolher memórias propi-ciou aos alunos a oportunida-de de compreender que o re-lato oral é também uma fontehistórica. Eles também foramem busca de outras fontes, pro-curaram objetos antigos, foto-grafias, cartas, registros, osquais entenderam e valoriza-ram como importantes docu-mentos históricos.
Formação dopensamento
históricoValendo-se desses procedi-
mentos, os alunos puderamlocalizar fatos significativos erefletir sobre o tempo da vidadas pessoas que contaramsuas memórias. As entrevistaspossibilitaram aos alunos, porexemplo, verificar se a divisãodo trabalho, as relações depoder e o modo de vida (par-ticipação do homem, da mu-lher, da criança e dos idososnas atividades de sobrevivên-cia, os responsáveis pela to-mada de decisão na família,assim como a forma de mora-dia e de religiosidade) muda-ram ou permaneceram inalte-rados na sucessão de gera-ções. Com isso, tiveram a basepara desenvolver as noçõesimprescindíveis na formaçãodo pensamento histórico: gru-po social, tempo e espaço, do-minação e resistência, perma-nência e mudança, semelhan-ça e diferença.
Os textos trouxeram remi-niscências do passado e os alu-nos puderam perceber que hápráticas antigas ainda comunsem seu cotidiano. Com issoestabeleceram um elo de liga-ção entre o passado e o pre-sente e aprenderam os concei-tos de permanência e mudan-ça histórica. Entretanto, as his-
O DISCURSO HISTÓRICO É UMA VERDADE E NÃO A VERDADE.
9
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
O ensino de História
No início do século XIX, na França, a História era
dominada pela Literatura e pela Filosofia.
A pesquisa histórica estava a cargo dos intelectuais
contrários à República, que se preocupavam em
contar a sucessão dos reis.
No Brasil a introdução do ensino de História no currículo
escolar teve como marco o século XIX após a
Independência. Literatura e História a partir de então
tornam-se disciplinas independentes, pois a segunda
teria como incumbência explicar a formação da nação
brasileira que se iniciava em 1822. Em 1837 torna-se
disciplina obrigatória, seguindo o modelo francês.
compreendessem que os epi-sódios contados não são osacontecimentos em sua totali-dade e colocassem em ques-tão o conceito de “realidade”.Essa reflexão permite apresen-tar o conceito de verdade naexplicação histórica, a qualtem como alimento a memó-ria e seus registros e uma ex-plicação de que a “realidade”é feita de recortes. O discursohistórico é uma verdade e nãoa verdade.
Retomando a frase de Gar-cia Márquez citada no iníciodeste texto: a realidade é o quecontamos dela – a verdade ésempre uma versão do real.
E nesse eterno contínuo estáa vida, ou seja, a história.
* Doutora em semiótica e ciênciada comunicação. Autora da
publicação Ensino revisão urgente(EDUC) e de livros didáticos.
Crianças do Brasil mONDE ESTÁ O FUTURO
Mãos à obra!O que seus alunos sabem
das histórias
de vida da comunidade?
Valorizam a experiência das pessoas
mais velhas para conhecerem melhor
o lugar onde vivem?
O que as crianças podem descobrir
e contar?
Aproveite as orientações propostas no
fascículo Se bem me lembro... do Kit Itaú
criação de texto - 2004, para planejar
uma viagem “naquele tempo“ com sua turma.
Depois de reviver as lembranças do passado,
convide seus alunos a escreverem as
memórias de um dos moradores entrevistados.
Professor, escreva-nos contando
sua experiência.
Com base em entrevistas comgente da própria comunidade,crianças recontam históriasde vida restituindo o diálogoentre passado e presente.
Eles mal passaram dos dez anosde idade. São alunas e alunos dequarta e quinta séries que escreve-ram textos com histórias e sensaçõesas mais distantes de suas experiên-cias de vida.
Foi durante as oficinas do Pro-grama Escrevendo o Futuro que osalunos participantes entrevistarampessoas de suas próprias localidades,revelando e mantendo vivas histó-rias de brasileiros.
As crianças perceberam e sele-cionaram situações significativas docotidiano dos entrevistados e das co-munidades, trazendo detalhes paraa narrativa que passariam desper-cebidos a um ouvinte desatento. Navoz de cada entrevistado, encontra-ram a reconstrução de um tempo eo sentimento de pertencimento auma comunidade.
Meninos e meninas assumiram aposição de pesquisadores e transfor-maram o que ouviram em narrativasde memórias.
A pé era mais
rápido que de trem
“Na Várzea Grande ficavama antiga estação ferroviária e o‘rabicho’ – espécie de trilho espeonde o trem manobrava para cosubir a serra. A demora na subidserra da Várzea Grande era tantaalgumas pessoas preferiam subie depois pegar o trem novamentAluna: Justine Prinstrop, 11 anos, 5a
Cidade: Gramado – RSEntrevistada: Selmida Fischer, 90 an
NA VOZ DE CADA ENTREVISTADO, ENCONTRARAM A RECONSTRUÇÃO DE UM TEMPO, DE UM LUGAR.
Anos Dourados
“Vó Lydia contava quequando mudou paraGoiânia, tudo era diferente.As casas, as ruas, as praças.Na avenida Goiás, aspessoas costumavam
ficar sentadas conversando, enquantoesperavam a jardineira (ônibus).Tudo era calmo e as pessoas,mais amigas. Nos finais de semanaos pais levavam os filhos para brincarno Jóquei Clube. E nos salões doGrande Hotel realizavam-seas grandes festividades.”Aluna: Letícia Aparecida R. Silvério, 10 anos, 4a sérieCidade: Goiânia – GO - Entrevistada: Lydia Barbosade Freitas Oliveira, 80 anos
Do trem a liturina
“Na época não tinhacarro, era carroçapuxada por bois ecavalos; as mercadoriasvinham no trem ou naliturina, um veículo
que andava nos trilhos.”Aluno: Kassiopéia Sousa Coelho,11 anos, 5a sérieCidade: Guajará-Mirim – ROEntrevistada: AdelaideLeite Carvalho, 83 anos
Dezoito horas
andando na mata
“Na época que cheguei emFeijó, não havia transporteterrestre, apenas oscomboios que transportavamborracha e
mercadorias para osseringueiros. Vim a pé,depois de caminhar18 horas por varadouroscheios de lama e perigo, pois passava próximoàs aldeias dos Kaxinawás e os Kalinas.”Aluno: Hiago Briner Barroso da Silva,11 anos, 4a série - Cidade: Feijó – ACEntrevistada: Dolores Fernandes Barroso, 86 anos
“A narração da própria vida é otestemunho mais eloqüente dosmodos que a pessoa tem de lembrar.”
(Ecléa Bosi)
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NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
A arte de fazer
carroça
“Aprendi com o amigo Zé,já falecido. Ele usava otronco do ipê amarelo,uma árvore típica docerrado, para o
varal da carroça ficar mais firmee mais leve, pois é onde arreia o cavalo.Para o banco usava o pinho, porquesegundo ele ‘afofa o banco’.”Aluno: Amâncio José de Lima Neto, 10 anos,4a série – Cidade: Três Lagoas – MSEntrevistado: Manuel José de Souza, 91 anos
mantêm viva nossa memória
O DIÁLOGO ENTRE O PASSADO E O PRESENTE.
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Ir de cambiteiro para a festa
“A festa de Reis era a mais animadade todas. Vinham pessoas da cidadee dos engenhos vizinhos a pé, acavalo ou de cambiteiro – umpequeno trem, que servia paratransportar a cana para a usinaCruangí.”Aluno: Pedro Severino daSilva, 17 anos, 5a sérieCidade: Timbaú – PEEntrevistado: Severino
Correia de Souza, 51 anos
Cinema sempipoca e com
bolo de fubá
“(...) no cinemamontado pelafamília Zampronha,na frente da vendinha de ferragens,não sei o que era melhor, se a telade pano molhado para nãoincendiar com o calor do refletorque ficava atrás dela, se oachocolatado e o bolo de fubáservido nos intervalos.“Aluna: Moniele Cristinados Santos, 11 anos,5a série - Cidade:Nova Granada – SPEntrevistado:Cezar Monteiro,86 anos
ecialonseguirda daa queir a péte.”a série
nos
Jeri, antes dos turistas
“Lembro-me de tudo como se fosse hoje. Aqui nãoexistia turista, nem eletricidade. À noite fazíamosfogueira para assar peixes e em volta da fogueiracantávamos e ouvíamos dos amigos históriassobre a lenda da Pedra Furada, do Serrotee da Pedra do Jacaré. Jericoacoaraera conhecida como Serrote.”Aluno: Juverlan Araújo Cunha, 11 anos,5a série - Cidade: Jijoca deJericoacoara – CEEntrevistado: AntônioBelarmino de Souza,83 anos
Os dengo-dengo
de Santa Catarina
“Os habitantes eram,curiosamente, chamados de‘dengo-dengo’ porque na igreja matriztinha um sino que fazia um barulhoparecido com dengo-dengo-dengo.Até hoje as pessoas maisantigas nos chamam assim.”
Aluna: Isabela Caroline dos Santos, 9 anos,4a série - Cidade: Navegantes – SCEntrevistada: Adélia de Souza Fernandes,89 anos
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NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Fogão a lenha, café no bule
“Onde eu morava, tinha uma cozinha demadeira, um fogão a lenha com chaminé,sempre aceso, com bule de café quentinhosobre a chapa. Que saudades tenho do barulhodos carros de boi passando pelas ruas de terra.Às vezes, vinham carregados do nosso ‘ouroverde’, o café, que até hoje impera na nossa cidade.”
Aluno: Guilherme A.Chagas Silva, 12 anos,5a sérieCidade: Itamogi – MGEntrevistado: Vitor Pedroda Silva, 70 anos
A IMPORTÂNCIA DA MEMÓRIA PARA A CONSTITUIÇÃO DO SENTIMENTO DE PERTENCIMENTO.
De olho na prática
Memórias versus memória...1 - O gênero Memórias...
a - explora o ambiente em que o aluno vive.
b - traz uma abordagem nostágica da cidade.
c - ajuda o indivíduo a planejar mudanças na cidade onde vive.
d - é um meio de articular o passado ao presente – a história de cadaindivíduo traz em si a memória do grupo social a que pertence.
2 - Resgatar as lembranças das pessoas mais velhas relaciona-das ao lugar onde vivem é muito importante para:a - conhecer suas opiniões.
b - constituir o sentimento de pertencer ao lugar onde vive.
c - saber com exatidão os acontecimentos ocorridos no lugar.
d - respeitar todas as informações dos mais velhos.
3 - No trabalho com Memórias, o aluno será colocado no lu-gar do pesquisador que busca recuperar a memória coleti-va de sua cidade, por meio de:a - entrevista.
b - pesquisa de livros.
c - observação de objetos contemporâneos.
d - visita aos pontos turísticos da cidade.
4 - Para marcar um “tempo de relembrar”, que é o tempo dasmemórias, o autor usa:a - os verbos no futuro.
b - os verbos no pretérito perfeito, imperfeito e algumas palavras eexpressões.
c - a descrição do espaço.
d - a evocação dos sentimentos e impressões.
5 - Os autores evocam emoções, sentimentos e sensações quan-do discorrem sobre o tempo passado. Esse recurso é utili-zado para:a - convencer o leitor de sua opinião.
b - escrever reportagem sobre a cidade.
c - mobilizar, enredar e atrair o leitor.
d - revelar os costumes da época.
6 - Ao escreverem memórias, os autores recorrem...a - aos recursos de linguagem poética: rimas, aliterações e metáforas.
b - à ordenação de fatos ao longo do tempo.
c - à descrição de um acontecimento que presenciaram.
d - à comparação entre o tempo antigo e o atual, evidenciando asdiferenças e mudanças ocorridas.
Confira o resultado na página 21.
Um dos grandes desafios que o professorenfrenta em sua prática é ajudar seus alunos a
escreverem textos de qualidade. O primeiropasso para o êxito desse trabalho é conhecer
bem o gênero que se vai ensinar.Por isso, propomos um desafio: o que você sabe
sobre o gênero Memórias?
No tempo de dantesEm 1929, um bonde trafega pelarua Catumbi, no bairro do Belém,em São Paulo (SP), quando um ele-fante fugido de um circo apareceno meio da pista. Para espantar obicho, o motorneiro aumenta a ve-locidade e toca forte a campainha.Sentindo-se ameaçado, o elefan-te mete a tromba no bonde, bate acabeça na lataria e desmaia. A par-tir de então a palavra “trombada”passou a ser usada como sinôni-mo de acidente, colisões.
Você conhece palavras, expres-sões que marcam o tempo passa-do? Você pode imaginar o quesignificam? Então dê a “definição”das palavras abaixo. Não vale con-sultar o dicionário.
Faz-se a luz
Até 1829 não havia ilu-minação de rua emSão Paulo. Nesse ano22 lampiões, alimenta-dos a óleo de peixe oumamona, são afixadosnas paredes das residên-cias mais centrais – cabiaaos moradores das casasonde estavam instaladosconservá-los e acendê-los. Até então, ninguémsaía à noite, a não ser emlua cheia. Quem convida-va os amigos para jantar,hábito disseminado naépoca, marcava a refei-ção para as cinco horas,porque aos últimos rai-os de solo povo tinhade se recolher.
Resposta na página 21
ALMANAQUÊS...
DantesRamonaCoretoJanotaPracinha
OitãoTramelaCeroulaAnágua
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NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Por o carro na frente dos
burros
Em 1872 a Companhia Carris deFerro inaugurou o primeiro sistemade transporte coletivo de São Paulo(SP): bondes puxados por burros.Esses veículos, quando em declive,desciam a ladeira seguidos pelosburros, enquanto os condutoresequilibravam o veículo no breque.
�
NO LUGAR DO ENTREVISTADO, A CRIANÇA ASSUME A VOZ DE QUEM CONTA A HISTÓRIA.
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Um dedo de prosa
Em sala de aula, antes de propor o
trabalho de produção de texto para seus
alunos, o professor precisa conhecer bem
o gênero e também ter clareza da
situação de produção. Para levar a cabo
esse trabalho, é preciso que o professor
compartilhe-o com sua turma no decorrer
das oficinas:
� Por que estamos escrevendo este
texto? Com que finalidade?
� Para quem vamos escrever? Quem
serão nossos leitores?
� Conhecemos bem o assunto ou
precisamos buscar mais informações?
� Vamos produzir um texto do gênero...
Ao pé da letraE você, já trabalhou com o gênero Memória
com sua turma?
Leu para os alunos textos que contam histórias
do passado, organizou exposição de fotos,
documentos, objetos antigos? Pesquisou fatos
interessantes do lugar? Entrevistou antigos
moradores? Criou atividades interessantes?
E na hora da escrita, convidou seus alunos a se
colocarem no lugar do entrevistado e retomou
com eles a situação de produção?
Escreva-nos contando sua experiência.
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� Por que esse é o mais adequado ao
nosso objetivo?
� Quais as características próprias
desse gênero?
� Onde o texto vai circular? Em que
portador será publicado?
Fazendo o teste da página 12, você ativou seus conhecimentos sobre o gênero Memó-rias. É hora de colocá-los em prática. Leia alguns trechos escritos pelos alunos e descu-bra por que se distanciam dos critérios de avaliação apresentados no fascículo de Me-mórias do kit Itaú de Criação de Textos.TEXTO 1
Título: O lugar onde eu moro
“(...) O lugar onde moro é muito
legal, a minha vida é só brincar.
Quando eu era pequena todo
mundo gostava de mim principal-
mente o meu pai e minha mãe.
Agora tenho 10 anos e estou fican-
do grande, moro com minha famí-
lia no sítio. Tenho muitos amigos.
Gosto de brincar de correr e de
jogar bola com eles. (...)”
TEXTO 2
Título: O lugar onde vivo
“(...) Moro numa cidade pequena.
Antigamente esse lugar era mais
tranqüilo e as pessoas não ficavam
preocupadas com os assaltos. Todo
mundo se conhecia e não tinha
violência. As ruas eram de terra e
as crianças podiam brincar de
amarelinha, mãe-da-rua, pular cor-
da sem medo. Os mais velhos sen-
tem saudade do lugar. (...)”
TEXTO 3
Título: Samambaia do Leste
“(...) Moro em um povoado chama-
do Samambaia do Leste que foi fun-
dado por um alemão chamado Dr.
Alberto Fritz no ano de 1956. Ele
foi um batalhador por Samambaia
do Leste, criando inclusive a coo-
perativa Companhia do Café Alto
Noroeste (CCAN). Anos depois, em
sua homenagem, a cidade passou
a se chamar Alberlândia. (...)”
Se você não conseguir recuperar na memória os critérios de avaliação, leia as observações eidentifique nos lembretes quais correspondem a cada texto analisado.
Confira o resultado na página 21.
Se bem me lembro...NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
não traz indíciosda realização de entrevistacom uma pessoamais velha.
Assemelha-sea um relato histórico.
não trazinformações quepermitam ao leitoridentificar a cidade.
foge ao tema,pois não ressalta aspectosdo lugar onde vive.
foca o relatode uma criança enão evidencia a entrevistacom uma pessoa maisvelha da comunidade.
não traz marcastemporais ou expressõesque indiquem umpassado distante.
relata experiênciasvivenciadas no presente.
as informaçõesda história da cidade nãoincluem as experiênciasvividas por pessoas maisvelhas da comunidade.
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NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Igreja matriz de Campos Novos Paulista
Escola reunida para a leitura dos textos
A MEMÓRIA DE CAMPOS NOVOS PASSOU A FAZER PARTE DA VIDA DELAS.
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NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Lembranças que viram históriasAlunos da pequena Campos Novos Paulista encontram a história da
cidade nas memórias de antigos moradores, transformando relatos em textos efortalecendo a identidade com o lugar.
Luiz Henrique Gurgel
A luz acabava às 10da noite. Pouco antes,um apito soava pela ci-dade avisando que ogerador seria desligadoe tudo ficaria às escu-ras. As pessoas corriamaos lares para não ca-minhar na escuridãoou, dependendo danoite, sob a luz do luar.Dentro das casas, velase lampiões eram acesose, no terceiro e últimosinal, a luz era cortada.Histórias como essas,de décadas passadas,impressionaram as cri-anças de Campos No-vos Paulista, cidade de5 mil habitantes no ex-tremo oeste do Estadode São Paulo. Alunos de5ª série da Escola Esta-dual Professor Theodo-rico Oliveira entrevistaram an-tigos moradores, ouviram ashistórias e transformaram emtextos a memória afetiva da ci-dade, para participar do Prê-
mio Escrevendo o Futuro.
Antiga estância climática,localizada entre os rios do Pei-xe e Paranapanema, CamposNovos Paulista viveu seu apo-
geu com o Hotel Climático, fe-chado em 1999, que desde osanos de 1960 atraía visitantesde várias partes do Brasil, mo-tivo de orgulho entre os habi-tantes da cidade. Até hoje, aslembranças relacionadas aohotel estão presentes na me-mória coletiva. Também mar-ca essa memória o antigo ge-
Professoras Onélia eAfria contaramhistórias de CamposNovos
rador que forneciaenergia à cidade e queregulava as atividadesde seus moradores.Hoje ele se encontraexposto em praça pú-blica, como um marcoda história sentimentaldo lugar, monumento àmáquina que ilumina-va Campos Novos.
Para as entrevistas,tarefas que os alunosdeviam realizar emuma das oficinas, fo-ram escolhidas as pro-fessoras aposentadasOnélia Magdalena deJoão, de 79 anos, eAfria Bertoncini Man-zano, de 68 anos, quehaviam lecionado noProfessor Theodoricodesde sua fundação.Também foi entrevista-
do o atual diretor da escola, oprofessor Alcir Magdalena Gi-ovani, de 51 anos. “Eu fiqueimorrendo de medo de algumagozação, dos entrevistados sesentirem mal. Mas desde o iní-cio tratamos do respeito paracom essas pessoas, tanto queos alunos selecionaram as per-guntas da turma, fizeram um
REPORTAGEM
Igreja matriz de Campos Novos Paulista
Escola reunida para a leitura dos textos
OS ESTUDANTES TRANSFORMARAM EM TEXTOS A MEMÓRIA AFETIVA DA CIDADE.
15
Toda comunidade
participou
Ao decidir participar do Prêmio,a professora Silvana Barbosa,envolveu seus alunos, as famíli-as, a escola e outras pessoas dacomunidade em um projeto deleitura e escrita, no qual os alu-nos deveriam fazer várias ofici-nas até chegar à produção dotexto final. Ela não imaginavamobilizar tanta gente. “Quandofalei sobre o prêmio e conteitodo o processo, os pais já fica-ram animados”. Em uma dasprimeiras oficinas, a professorapediu fotos e objetos relaciona-dos à história de Campos No-vos Paulista e às lembrançasdas pessoas entrevistadas. Osalunos se mobilizaram e, alémde fotos, trouxeram utensílios einstrumentos de trabalho: penei-ras de fibras trançadas, enxa-das, arados, máquinas de cos-tura, ferros de passar roupa àbrasa, caldeirões e até uma má-quina para debulhar milho.O apoio foi tanto que a turma
decidiu montar umaexposição na
escola.
Gerador que fornecia luz à cidade. No detalhe, placa do “marco histórico”
Professora Silvana Barbosa
funcionava”, disse Silvana,sobre o gerador que operouaté 1961. O hotel tambémdespertou curiosidade: “ascrianças queriam saber comofuncionava, por que as pes-soas vinham para cá”. A mo-bilização de todos para co-nhecer o passado local con-tribuiu para a valorização dahistória e da memória da ci-dade e para a construção daidentidade cidadã dos alunos.
No final do projeto, duran-te a escolha do texto que seriaenviado ao Prêmio, a escolafez festa e reuniu pais, alunos,professores e depoentes parauma audição coletiva. O resul-tado final surpreendeu a pro-fessora: “Foi importante podertrabalhar com eles dessa for-ma, poder conversar com cadaum, conviver com eles fora dasala. Isso me ajudou, porquemesmo aqueles alunos quenão escreviam nada no finaldas oficinas estavam escreven-do. Eu achava que não ia con-seguir. No final, eles vinham,conversavam, falavam de simesmos. Isso os ajudou a sesoltarem.”
As antigas novidades, nãoimaginadas pelas crianças, re-forçaram os laços com a comu-nidade e sua história. Para aentrevistada Onélia, “a memó-ria de Campos Novos passoua fazer parte da vida delas”.
roteiro e no dia organizaramum café com bolo e bolachapara os entrevistados”, expli-cou Silvana Barbosa, professo-ra que estimulou os alunos aparticiparem do Prêmio. Ashistórias envolveram os estu-dantes. Terminadas as ques-tões do roteiro prévio, elescontinuaram a perguntar.“Nossa cidade é tão pequenae os pais não contam as histó-rias para os filhos, eles não co-nheciam a história de CamposNovos”, queixou-se Silvana. Aentrevistada Afria também fi-cou admirada: “É impressio-nante o interesse dessas crian-ças. Parecia que queriam cap-tar no ar as palavras da gente”.
Identidade ememória
Histórias do gerador quefornecia energia elétrica e eradesligado à noite; o antigo ho-tel que recebia muitos turis-tas, agora abandonado e emruínas; os namoros escondi-dos atrás da igreja, entre ou-tras histórias, foram temas dostextos. Antes da redação final,as crianças fizeram um tour
pela cidade, visitando os pon-tos citados pelos entrevista-dos. “Eu mesma não conhe-cia, nem meus alunos. Nós játínhamos visto o gerador, masninguém havia falado como
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Superando obstáculos
DONA FAUSTINA NOS CONTAGIOU DESDE O PRIMEIRO MOMENTO.
TIRANDO DE LETRA
Quando li na revista NovaEscola o quadro que falava doPrêmio Escrevendo o Futuro, fi-quei interessada em participar.Queria encontrar respostas parareverter a situação de minha tur-ma de 5ª série: um grupo de alu-nos com inúmeras dificuldadesem leitura e produção de texto.
Contei aos alunos que haviafeito a inscrição no Prêmio Es-
crevendo o Futuro. Mostrei omaterial e expliquei à turmacada gênero textual. Depois deuma longa conversa, optamospor “memórias”. Propus a pri-meira oficina. Começava assimum novo jeito de trabalhar. Mes-mo com novos alunos chegan-do e outros faltando (para aju-dar os pais na roça ou na maré)as oficinas iam fluindo. Eu insis-tia para que não faltassem.
Pedi aos alunos que escolhes-sem um dos depoimentos colhi-dos na pesquisa e, com base nes-ses dados, se colocassem no lu-gar do entrevistado e escrevessemo primeiro texto de memórias.
Dando continuidade ao tra-balho, lemos o texto da ZéliaGattai (solicitei ajuda de algumaspessoas para reproduzir os tex-tos que foram entregues aos alu-nos). Também estudamos, nostextos de memória – os que es-tão ao final do fascículo Se bem
me lembro... – o uso dos verbosno pretérito perfeito e imperfei-to e as expressões que indicamo tempo e a comparação entreacontecimentos do passado e dopresente.
Contei à turma que há outrasformas de registrar as memórias.Perguntei se assistiram ao filmeTitanic, cujo roteiro foi elabora-do a partir do relato de memóriasde uma velha senhora. Como os
alunos desconheciam a históriae a escola não dispunha de ví-deo, levei-os até minha casa,para uma sessão de cinema im-provisada.
E assim foram acontecendo asoficinas. Mimeografei algumasdicas com o objetivo de prepa-
Com poucos recursos e muita força de vontade, professora do Pará conta comoenvolveu e motivou seus alunos a pesquisarem e produzirem textos de memórias.
16
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Dona Faustina da SilvaRosário, 71 anos.
“Faustinhas” escrevendo suasmemórias.
Maria do Socorro Braga Reis*
rar o grupo para a entrevista. Semrecursos para as gravações, divi-di com os alunos a responsabili-dade de anotar as respostas dosentrevistados.
Colher as memórias não foifácil, pois as pessoas escolhidaspelo grupo não queriam se des-locar até a escola. Depois de al-gum esforço conseguimos entre-vistar três pessoas: o Sr. NestorGato, de 73 anos, a Sra. JoanaMecena, de 65 anos, e a Sra.Faustina, de 71 anos.
O primeiro entrevistado – Sr.Nestor Gato – brincava muito,contava piadas, não era o quequeríamos. Dona Joana só con-tava fatos do presente, emborahouvesse bastante insistência porparte das crianças. Já Dona Faus-tina (Tia Fausta como é conheci-da) nos contagiou desde o pri-meiro momento, quando come-çou a falar do bairro de NovaOlinda.
De volta à sala de aula, orga-nizamos todas as informações.Pedi aos alunos que se colocas-sem no lugar da entrevistada eassim todos viraram “Faustinhas”,escrevendo suas memórias.
Passei o domingo corrigindoos textos. Notei que alguns ain-da apresentavam dificuldades emempregar os tempos verbais. Fizas intervenções necessárias e, naseqüência das oficinas, fui per-cebendo o avanço dos alunos(participando mais das aulas, secolocando no lugar de pesquisa-dores, assumindo a preocupaçãode revisar até mesmo os peque-nos textos). Na atividade final dereescrita do texto, constatei oquanto eles aprenderam.
* Semifinalista em 2004,Augusto Corrêa, PA.
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NAQUELES TEMPOS A VIDA PASSAVA DEVAGAR.
Ontem alegria, hoje solidão
Naqueles tempos a vida passava devagar,era um sossego, tudo era tranqüilo, tínhamosa alegria, aliás alegria era comum.
Levantávamos cedo para encher água na cabeceira, depoisíamos lavar as roupas e tomar banho no rio.
O carro não vinha até aqui, ficava na parada ZéCastor. Para ir até Bragança ou tinha que andar muitoou ir a pano (canoa) atravessar as maresias.
Notícias eram tão distantes de nós, a não ser as dopovoado: uma mulher que paria, uma moça que fugia.Os anos passavam devagar e nós aproveitávamos o luar, asbrincadeiras de roda, lembranças do bombaqueiro, sapatinhobranco, brincadeira do anel, tudo girava em torno da alegria.
A comida era farta, muito peixe, caranguejo, ostra,siri. Podíamos escolher do tamanho desejado. A vidacorria livre, sem grandes barulhos, a não ser os músicos doSereno, que nos faziam correr pulando numa grande dança.
A maré enchia, a maré vazava e nós sempre tomandobanho no rio, às vezes ouvíamos um ralho, um cipó queteimava em nos marcar.
Como era simples viver sem correrias, ouvindo ospássaros, os gritos da Matinta-Pereira. Os grandesmorcegos rasga-mortalha faziam-nos tremer de medo nasnoites escuras.
Em Nova Olinda era assim. Hoje com a chegada doônibus as coisas não são as mesmas, a energia elétricatransformou as pessoas, nem se brinca mais, todos assistemà televisão, é uma correria das motos e os meninos estãocada vez mais malcriados. A alegria deu lugar à solidão.Somos ainda uma comunidade pequena, no entanto existemtantas mudanças que parece que o tempo é outro. Não seconversa mais, todos estão ocupados demais em suas casas.Da minha porta sentada fico pensando, por que tantasmudanças? Isso era para ser exclusividade dos camaleões.Sem netos para alegrar os meus dias, sinto-me cada vezmais só, solitária com as minhas lembranças.
O título sugestivoconvida à leitura.
Expressões everbos nopretéritoimperfeitomarcamo tempopassado,tempo derelembrar.
Adjetivos eadvérbiosenriquecema descrição.
O autor evocaemoções esentimentosdo tempovivido, queenvolvemo leitor.
A comparaçãodo tempoantigo como atualevidenciadiferenças emudançasocorridasno lugar.
Experiênciasrelatadas naprimeira pessoado plural mostramo sentimento depertença àcomunidade.A primeira pessoado singular traz avoz e marca ahistória pessoaldo entrevistado.
Lembranças de um tempo e lugar, de acontecimentostestemunhados pela entrevistada Dona Fausta e recriados
Roseane Pinheiro do Rosário, 11 anos, 5a série, semifinalista em 2004.E.M. André Alves, Augusto Correa (PA)
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NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Análise do textoPARA O ÊXITO DESTE TRABALHO,
A PROFa MARIA DO SOCORRO NÃO SE INTIMIDOU:
BUSCOU SAÍDAS E SUPEROU MUITOS OBSTÁCULOS. TANTA
DEDICAÇÃO TROUXE RESULTADO: O TEXTO DE SUA ALUNA
ROSEANE PINHEIRO DO ROSÁRIO FOI SELECIONADO
ENTRE OS SEMIFINALISTAS EM 2004.
Fazemos dois convites: o primeiro a ler e se emocionar com a narrativa e, depois, aacompanhar a análise detalhada do texto.
pela aluna Roseane em “Ontem alegria, hoje solidão.”
ARANHAS E CARANGUEJOS ERAM PARTIDOS RIVAIS DA ÉPOCA.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
HISTÓRIA DE ALMANAQUE
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Foi assim...
Era uma manhã fria do mês de agosto. Abri a janela do
meu quarto e olhei para uma quaresmeira da praça. Lembrei-
me da minha infância, quando havia muitos prédios que com o
passar do tempo foram demolidos. Não ouvíamos músicas pela televisão, nem
pelo rádio. Havia um coreto no largo da praça onde, aos sábados e domin-
gos, lindas músicas eram tocadas. Os casais iam lá “trocar olhares” (naquela
época era namorar). Quantos olhares troquei. Os ciprestes da praça eram
cortados em formato de instrumentos musicais. Havia um canteiro de flores
com as iniciais J.S., do Prefeito José Sureti e com o nome da cidade Nova
Resende, destruído pela rivalidade política. Aranhas e Caranguejos eram
partidos políticos rivais da época. Um banquinho era o símbolo da vitória
política: quando colocado do lado de cima da praça, vitória dos Aranhas;
do lado debaixo, vitória dos Caranguejos.
Recordo-me do dia da inauguração da luz. Era uma manhã ensolarada.
Um morador antigo, o Quincas Neto, ficou encarregado de hospedar em
sua casa a banda da Ventania, vinda da cidade vizinha com o mesmo nome.
A banda executava as canções, quando os políticos da situação, os Ara-
nhas, resolveram subir até a rua dos políticos derrotados, os Caranguejos,
para a inauguração da Casa da Luz.
Naquela época a cidade era dividida mais ou menos ao meio: da casa do
senhor Rosendo Gonçalves de Rezende para cima, eram eleitores e políticos
dos Caranguejos. Dali para baixo, dos Aranhas.
Recordo-me como se fosse hoje, apesar de esse fato ter ocorrido há mais
ou menos 75 anos. A banda, junto com os Aranhas, percorria um pequeno
trajeto até a Casa da Luz. Quando iam se aproximando, a banda foi
interrompida por um grito do senhor João Gaspar (caranguejo) que estava
acompanhado por outros amigos.
— Daqui para cima não passam!
Nesta hora o senhor Tonico Araújo respondeu:
— A banda da Ventania não passa, mas eu passo!
Dona Zota, uma moradora da cidade, vendo a confusão, tentou
impedir. Quando o primeiro tiro foi disparado, acertou a perna dela.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
O que vem por aí
DE REPENTE, O SINO DA IGREJA MATRIZ SOOU E VOLTEI AOS DIAS ATUAIS.
Capacitação de professores
Já começaram as ações de formação presencial
de professores e técnicos das secretarias estadu-
ais de educação para o Programa Escrevendo o
Futuro. Ceará e Pernambuco foram os primeiros
Estados a realizar os cursos, ocorridos na primeira
quinzena de junho. Em agosto, acontecem ações
em Santa Catarina, Pará e Goiás. Capacitações em
outros Estados também estão sendo programadas.
No mês de setembro ocorrem encontros de avali-
ação no Ceará e Pernambuco com os professores
que participaram da ação em junho. O site na in-
ternet da Comunidade Virtual Escrevendo o Futuro
traz notícias atualizadas com as datas, locais e in-
formações sobre as ações de formação.
Mais uma conquista: Top Social ADVB – 2005
O Programa Escrevendo o Futuro, iniciativa da Fundação Itaú Social, recebeu
em 22 de junho o Prêmio Top Social – 2005 da ADVB (Associação dos Dirigen-
tes de Vendas e Marketing do Brasil).
Dos 232 projetos inscritos, 31 foram premiados. Essa premiação reconhece e
divulga práticas de ações socialmente responsáveis desenvolvidas pelas or-
ganizações do terceiro setor.
Virtualmente unidosNa segunda quinzena de agostoentra no ar a Comunidade VirtualEscrevendo o Futuro, nova frentede comunicação na internet comprofessores do Brasil. Podem secadastrar todos que participaramdo Programa Escrevendo o Futu-ro. Troca de experiências, plane-jamento de ações para o dia-a-dia da sala de aula; bate-papo emtempo real com professores detodo o país; acesso a textos, in-formações e links sobre práticasde ensino da Língua Portuguesa;notícias sobre projetos e eventoseducacionais; indicações de li-vros e filmes estarão disponíveis24 horas por dia. O endereço éwww.escrevendoofuturo.org.br
Beatriz Cristina B. Cardoso tem 10 anos e participou do Programa Escrevendo o Futuro em 2004, sendo orientada por suaprofessora Eneida Evangelista Silva Pereira na 4a série da E.E. Padre Luiz Moreno, em Nova Rezende – MG.
Seu texto foi escrito a partir da entrevista com dona Edite Sales, de 84 anos e moradora à praça Santa Rita, em Nova Rezende.
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As pessoas tentavam se salvar como podiam: mães protegendo seus filhos,
pessoas gritando, músicos se enroscando nos instrumentos. O tocador de bum-
bo tinha dificuldade para correr com seu instrumento. Naquele desespero,
falou aos berros:
— Desgraçado, vai para um lado, que eu vou para o outro.
O bumbo rolou rua abaixo, como se atendesse às ordens do dono.
Papai nos colocou para dentro de casa e eu escutava o zumbido das balas.
De repente, o sino da igreja Matriz soou e voltei aos dias atuais. Tenho
84 anos e faço um pedido: zelem por essa praça que foi e sempre será a sala
de visitas de nossa querida Nova Resende.
Texto vencedor do prêmio Escrevendo o Futuro em 2004
A LUA BRILHANTE ILUMINAVA A SINGELA CASA DE PAU-A PIQUE
Texto escrito por Tarine Silva Ribeiro, de 10 anos, aluna da 4a série daE.E.Professora Joanita B.B. Carvalho, São João de Iracema (SP),
a partir de entrevista com Valdenice Cabral Minales Satin, de 51 anos.
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Da lamparina à energia elétrica
O sítio da vovó Valdenice fica em São João de Iracema, num lugar muitobonito e, o melhor de tudo , é que é pertinho da cidade. É para lá que eu vou aosfinais de semana. No sábado passado, eu resolvi ir ao sítio à noite. Eu já tinhaatravessado a porteira quando, de repente, a luz se apagou..., mas pernas pra te
quero! Ao perceber que eu tinha medo de escuro, vovó caiu na risada e resolveu me contar sobre asua infância, onde apenas uma lamparina e a lua brilhante iluminavam a singela casa de pau-apique onde morava com sua família. “ O escuro não me amedrontava, só incomodava um pouco nahora de ir na privada que ficava afastada da casa: eu tinha receio de cair no buraco.”
Eu nasci e fui criada na nossa pequena e sossegada São João de Iracema, mais precisamenteonde o Judas perdeu as botas, na calorenta região Noroeste do Estado de São Paulo. Antigamente,nossa cidade era conhecida como os “Os Poços”, devido aos boiadeiros que aqui passavam paraabastecerem-se de água e refrescarem-se do calor do sertão agreste.
Na vila, a criançada só cuidava de duas coisas: brincar e aprender. Eu nunca mais conseguime esquecer do dia em que a ranzinza da professora me colocou ajoelhada em cima dos grãos demilho e me deu dois tapas na orelha. Que dureza era estudar naquela época!
Nas ruas de terra esburacadas eu me sentia livre e feliz. Divertia-me jogando terra em quempassava, depois caía na gargalhada. Como naqueles tempos todo mundo era amigo de todo mundo,as caras feias eram raras. Quando eu sentia o cheiro bom da comida feita por mamães no fogão àlenha, ia correndo para casa encher a barriga. Que delícia!
O tempo foi passando devagar, pois aqui até o vento sopra lentamente... A vila foi virandocidade e as casas de pau-a pique foram sendo derrubadas e substituídas pelas de tijolos. Os moradoresfaziam mutirão para ajudar. Em 1966, eu já estava com meus doze anos, quando a cidadeacordou diferente: para meu espanto e de toda população a energia elétrica havia chegado! Foi umalvoroço, era o fim das lamparinas! Mais do que depressa o meu pai Ezequiel fechou a barbeariae foi o primeiro morador da cidade a ir até Fernandópolis comprar um liquidificador e umatelevisão. A casa dos meus pais tornou-se a novidade do momento e ficou movimentadíssima: todahora os vizinhos queriam usar o liquidificador para bater sucos e assistir à televisão.
A danada da televisão era em branco e preto e só pegava um único canal. Quando ela resolviasair do ar o pessoal ficava vendo listras por um tempão, nem colocar bombril na antena resolvia.Meu pai faleceu bem velhinho e em homenagem ao morador antigo, o nome Ezequiel PintoCabral foi colocado na rua onde eu passei a minha infância, bem em frente àpraça da igreja matriz. ”Encho-me de saudade toda vez que passo por essa rua”.
Após abrir o seu coração vovó emocionada me disse:_ ”É, minha neta. Apesar de ser do tempo da lamparina, eu jamais poderia
esquecer as recordações que ficaram na minha mente até hoje”.Nós sorrimos e ficamos abraçadas por um longo tempo. Desde
então, perdi o medo do escuro e percebi que apesar da minha cidade sersimples e pequena no tamanho, com seus um mil oitocentos e cinqüenta habitantes,ela é grande no meu coração e inesquecível na mente dos moradores.
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NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
RESPOSTAS
Há quem diga que o primeiro anúncio feito no país foi escrito por Pero Vaz de Caminha em1500. Sem utilizar imagens, a carta que enviou ao rei de Portugal exaltava as qualidades denossa terra – águas, florestas e animais sem fim –, omitindo desvantagens: os donos daterra não queriam entregar o patrimônio e, ainda por cima, boa parte deles era de canibais.Mas a propaganda funcionou e os portugueses resolveram ocupar o Brasil.
Do mero anúncio à moderna propaganda que seduz consumidores, dita modas, costumes eidéias, a publicidade brasileira é considerada uma das melhores do mundo. Na ponta dolápis selecionou alguns anúncios, reclames e propagandas que apresentam a evolução dessetipo de comunicação no Brasil.
COISAS DE ALMANAQUE
A alma do negócio desde 1500
CARTA ENIGMÁTICA (p.4)Nosso passado é nossa história. (Borges)
MEMÓRIAS VERSUS MEMÓRIA... (p.12)Resposta: 1-d , 2-b, 3-a, 4-b, 5-c, 6-d
PÁG. 13:Texto 1 – , , e
Texto 2 – e
Texto 3 – , e
ALMANAQUÊS (p.12)DANTES: antes, antigamente.RAMONA: marca de grampo para prender cabe-los.CORETO: pavilhão erigido em praças ou jardinspúblicos, para concertos musicais.JANOTA: pessoa bem vestida, elegante.PRACINHA: soldado da Força Expedicionária Bra-sileira que lutou na Itália na II Guerra Mundial.OITÃO: alvenaria, construção.TRAMELA: peça que gira ao redor de um pregopara fechar porta, porteira.CEROULA: tipo de cueca.ANÁGUA: espécie de saia íntima que as mulhe-res usavam sob o vestido.
No início do rádio no Brasil, os programasaceitavam qualquer anunciante. Nadécada de 1930, no Programa de AdemarCasé, o compositor Nássara bolou textopara um laboratório farmacêutico. Olocutor, de voz empostada, apresentava oreclame: “Um casal de noivos brigou. Eele, arrependido, quis fazer as pazes e seaconselhou com a sogra, pois a noivaestava irredutível. Sugerido um presente,comprou-lhe jóia caríssima. Não fez efeito.Deu-lhe um casaco de peles. Não fezefeito. Então, lembrou-se de dar a ela umvidro de Manon Purgativo... Ahhh! Fezefeito!!! Manon Purgativo, à venda emtodas as farmácias e drogarias”.
Em 1919, a máquina de escrever eraequipamento de última geração nosescritórios. No Brasil, até o começo dadécada de 1990 ainda eram comuns.A revolução causada pelo computadoras transformou, do dia para a noite, empeças de museu. Crianças de umaescola paulistana que viram umamáquina de escrever elétrica recostadanum canto da secretaria espantaram-secom a novidade: “Veja, um computadorsem tela que já vem com impressora”.
Nos anos de 1940, enquanto boaparte do mundo estava em guerra, apropaganda ajudava a criar hábitosnovos como o uso de creme dental.
Em tempos de ditadura militar (1972), a propaganda não podia ficar atrás:usava imagens e slogans que agradavam ao regime político.
Do final do século 19 até as primeirasdécadas do 20, farmácia ainda seescrevia com “ph” e os remédioseram preparados no próprioestabelecimento.
Em 1865, a Viação Rio Grandeapresentava seus serviços com odesenho de uma bela e confortávelcarruagem para atravessar a serraentre São Paulo e Santos, no litoral.
O ator Carlos Moreno é recordistamundial: primeiro garoto-propagandado planeta a trabalhar para umamesma marca durante vinte e cincoanos seguidos, entre o final dos anosde 1970 até a década de 1990.
Iniciativa Apoio Parceria Realização
AÇÕES DE FUTUROAÇÕES DE FUTUROAÇÕES DE FUTUROEm 2005, o Programa Escrevendo o Futuro
amplia as atividades de formação para profissionais deeducação.
ComunidadeVirtual
Portal na internetexclusivo para os25 mil professoresde todo o Brasilque participam doprograma. Além dasinformações e dicassobre o ensino dalíngua, educadorespoderão conversar etrocar experiênciasem tempo real.
Formação de Educadores
Informe-se pelo telefone: 0800 – 7719310Ou acesse as páginas
www.fundacaoitausocial.org.brwww.cenpec.org.br
Conselho Nacional deSecretarias de Educação
Ministério de Educação
AlmanaqueNa ponta do lápis
Um almanaque cominformações sobre oprograma, gêneros detextos trabalhados comos estudantes, análisede especialistas e
entrevistas.
Programa de oficinas e cursosministrados pelo Brasil por formadores doCenpec, em parceria com as secretarias
estaduais de educação, sobre o ensino delíngua portuguesa com gêneros de textos.