Liberdade religiosa e construção de uma esfera pública...

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1 Anais do Congresso ANPTECRE, v. 05, 2015, p. 01- 01 Liberdade religiosa e construção de uma esfera pública laica no Brasil do século XIX: o debate entre ultramontanos e liberais, no período imperial. Ana Rosa Cloclet da Silva Pós-doutora em História pela USP. Docente do Programa de Mestrado em Ciências da Religião da PUC-Campinas. ([email protected]) ST 09 – Tradições religiosas, espaço público e política Resumo: No Brasil, a tomada de consciência acerca da identidade específica da Igreja em relação ao Estado e a consequente convicção da necessidade de reforçar a sua institucionalização em bases cada vez mais universal - ligada à Santa Sé - e menos nacional, ocorreu, sobretudo, a partir de meados do século XIX, sob padrões ultramontanos. Foi então que Bispos, padres e leigos debateram modelos alternativos de relacionamento entre Igreja e Estado, pautados na apropriação adaptada dos princípios normativos defendidos pela episteme liberal no campo político-religioso. Tais princípios desdobraram-se em diferentes modelos de secularização - a tradição regalista, o "modelo intransigente romano" e a vertente que propugnou o modelo de Estado laico no Brasil, defendendo a mais irrestrita "liberdade de consciência" -, os quais conviveram e confrontaram diferentes concepções acerca do tema da “liberdade religiosa". Focando a historicidade comportada pela apropriação das doutrinas e pelas práticas institucionalizadas que estruturam o campo religioso, a presente comunicação busca problematizar os elementos que moldaram a configuração institucional da Igreja católica no Brasil, no decorrer do período imperial. Para tanto, analisa a polêmica que então polarizou representantes do “catolicismo ultramontano” e os paladinos do pensamento liberal, buscando situar o contexto histórico mediante o qual foram instituídas as condições constitucionais da liberdade religiosa e da autonomização das instituições sociais e políticas em relação à religião no Brasil, engendrando as condições concretas para a constituição de uma esfera pública laica. Sob tal perspectiva, a pesquisa se alia a formulações acadêmicas que, analisando outros contextos latinoamericanos, concordam que as dissidências religiosas observadas no decorrer dos respectivos processos de secularização – genericamente designadas como anticlericalismo – não Anais do V Congresso da ANPTECRE “Religião, Direitos Humanos e Laicidade” ISSN:2175-9685 Licenciado sob uma Licença Creative Commons

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1 Anais do Congresso ANPTECRE, v. 05, 2015, p. 01- 01

Liberdade religiosa e construção de uma esfera pública laica no Brasil do século XIX: o debate entre ultramontanos e liberais, no período imperial.

Ana Rosa Cloclet da Silva

Pós-doutora em História pela USP. Docente do Programa de Mestrado em Ciências da Religião da PUC-Campinas.

([email protected]) ST 09 – Tradições religiosas, espaço público e política

Resumo: No Brasil, a tomada de consciência acerca da identidade específica da Igreja em relação ao Estado e a consequente convicção da necessidade de reforçar a sua institucionalização em bases cada vez mais universal - ligada à Santa Sé - e menos nacional, ocorreu, sobretudo, a partir de meados do século XIX, sob padrões ultramontanos. Foi então que Bispos, padres e leigos debateram modelos alternativos de relacionamento entre Igreja e Estado, pautados na apropriação adaptada dos princípios normativos defendidos pela episteme liberal no campo político-religioso. Tais princípios desdobraram-se em diferentes modelos de secularização - a tradição regalista, o "modelo intransigente romano" e a vertente que propugnou o modelo de Estado laico no Brasil, defendendo a mais irrestrita "liberdade de consciência" -, os quais conviveram e confrontaram diferentes concepções acerca do tema da “liberdade religiosa". Focando a historicidade comportada pela apropriação das doutrinas e pelas práticas institucionalizadas que estruturam o campo religioso, a presente comunicação busca problematizar os elementos que moldaram a configuração institucional da Igreja católica no Brasil, no decorrer do período imperial. Para tanto, analisa a polêmica que então polarizou representantes do “catolicismo ultramontano” e os paladinos do pensamento liberal, buscando situar o contexto histórico mediante o qual foram instituídas as condições constitucionais da liberdade religiosa e da autonomização das instituições sociais e políticas em relação à religião no Brasil, engendrando as condições concretas para a constituição de uma esfera pública laica. Sob tal perspectiva, a pesquisa se alia a formulações acadêmicas que, analisando outros contextos latinoamericanos, concordam que as dissidências religiosas observadas no decorrer dos respectivos processos de secularização – genericamente designadas como anticlericalismo – não

Anais do V Congresso da ANPTECRE “Religião, Direitos Humanos e Laicidade”

ISSN:2175-9685

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deixaram de ser movimentos profundamente religiosos, por disputarem uma mesma "carga simbólica do sagrado", nenhuma dela pondo em questão "a importância da religião para a preservação da ordem social e frequentemente da Igreja como agente civilizatório". Sendo assim, do ponto de vista teórico as formulações do sociólogo Pierre Bourdieu resguardam plena atualidade ao situarem, no decorrer de um processo de racionalização e moralização da religião – tal qual o vivenciado mediante a reforma católica em moldes ultramontanos, observada no Brasil da segunda metade do XIX – as disputas internas ao próprio campo religioso cristão.

Palavras-chave: Mínimo de 3 e máximo de 5 palavras chave

Introdução

Nas últimas décadas, as sociedades ocidentais observam o estabelecimento de um campo

religioso pluralista, marcado pela flagrante explosão de doutrinas, grupos, filosofias, novas

religiões e formas de religiosidade, com poderosa influência sobre a esfera política, inclusive

partidária. Na interpretação de alguns autores, tal fenômeno responde aos profundos impactos da

reconhecida falência das instituições laicas (em particular do próprio Estado) em cumprirem

satisfatoriamente suas funções econômicas e sociais clássicas (SANTOS, 2009, p. 3), atestando a

descrença de considerável parcela da população no sistema simbólico da cultura capitalista de

nosso tempo. Em contrapartida, a atual experiência da transcendência se revela profundamente

influenciada pelos aspectos valorativos e comportamentais das sociedades contemporâneas -

marcadas pelo ethos hedonista, hiperconsumista e individualista (HARVEY, 2003) -, situando-se

num nível mais cotidiano e privado da existência, viabilizando-se pela disseminação de formas

menos institucionalizadas e mais secularizadas de religião, que estaria na base da legitimidade

assumida pelos trânsitos religiosos entre indivíduos e grupos na contemporaneidade.(PIERUCCI,

1998).

No caso brasileiro, tal contexto se expressa nos resultados do Censo de 2010, divulgados

em 2012, os quais revelam "a intensificação do trânsito religioso, da provisoriedade da adesão e a

dinâmica da privatização da prática religiosa", ao lado de uma inédita perda de centralidade do

catolicismo, que passa a se firmar como “religião da maioria dos brasileiros”, mas não mais a

“religião dos brasileiros”. (TEIXEIRA; MENEZES, 2013).

Mediante esta complexidade instaurada na configuração do campo religioso ocidental,

pesquisadores de diferentes áreas são levados a indagar acerca das implicações teóricas e

conceituais acarretadas por esta incômoda, porém evidente, convivência de novas formas de

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religião e religiosidade (indicando experiências individuais e coletivas de (re)ligação com o

sagrado) com o fenômeno da secularização, concebido como aquela progressiva autonomização

das esferas sociais em relação à religião (DOBBELAERE, 1981).

Preocupados com a construção de seus respectivos objetos de pesquisa, tais estudiosos

estabelecem uma indagação sistemática e documentada acerca destas dimensões constitutivas da

realidade, conferindo centralidade analítica às relações reversivas entre política e religião, nos

marcos da modernidade ocidental. Assim, na crítica a uma modernidade essencialmente

racionalista, reconhece-se a importância da religião (e das representações e práticas encantadas

do mundo) como ingrediente fundamental na modelagem institucional dos Estados nacionais

modernos (MARDONES, 1994), de tal forma que, do ponto de vista de suas manifestações

concretas, o fenômeno da secularização não significou o desaparecimento da religião confrontada

com a racionalidade, senão sua adaptação e reformulação em novos termos. (HERVIEU-LÉGER,

2004, p. 37).

Para o caso brasileiro, a flagrante divergência do quadro histórico atual com a tradicional

herança do catolicismo colonial e imperial, que tendeu a perpetuar-se a despeito das marcadas

transformações inauguradas pelo período republicano (NEGRÃO, 2008, p. 266), justifica o

empenho em situar as relações historicamente estabelecidas entre Estado e Igreja católica no país,

a fim de compreendermos suas reconfigurações recentes e, particularmente, a "natureza do

pluralismo religioso que passou a caracterizar a fisionomia da sociedade brasileira no século

XX".(CIARALLO, 2011, p. 89).

Estado, Igreja e Intolerância Religiosa no Brasil do XIX

Para efeitos da discussão ora proposta, vale lembrar que a longa tradição regalista luso-

brasileira, defensora da continuidade do direito do “padroado” - que tornou a administração

eclesiástica parte da burocracia régia - teve consequências duradouras para a posterior relação

entre Igreja e Estado no Brasil. Dentre elas, colaborou para enfraquecer o caráter institucional da

Igreja na América portuguesa, pois, o que havia era "uma jurisdição espiritual distinta – porém

não separada – da secular”, não existindo “ ‘sujeito Igreja’ capaz de estabelecer objetivos

próprios, e estratégias para alcançá-los, com independência da coroa”.(DI STEFANO, 2012, p.

209).

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Como contrapartida, fundida ao Estado a Igreja Católica preservara seu monopólio na

produção, gestão e veiculação do capital religioso junto à sociedade brasileira, o que era

garantido pela Constituição de 1824, cujo Art. 5o. reconhecia a religião católica como a oficial e

mantinha a Igreja subordinada ao Estado. Às outras religiões era franqueada a liberdade de culto

doméstico ou particular, desde que não erigissem templos públicos.(NOGUEIRA, 2001, p. 80)

Simultaneamente, a independência assistiu à ascensão de clérigos às principais esferas de

representação política, incluindo o Parlamento brasileiro. Da mesma forma, o poder público

precisou recorrer ao sistema de documentação e controle de informações sobre a população local,

monopolizado pelos representantes da Igreja, bem como à sua infraestrutura de pessoal e

edifícios, permanecendo os padres como responsáveis pelos registros civis e as sedes paroquiais

como espaços para a realização das primeiras experiências eleitorais no Brasil

independente.(SOUZA, 2010)

Dessa forma, demandou-se ainda um bom tempo para que o clero fosse substituído por

um corpo de funcionários civis laicos para desempenhar não só as tradicionais atividades

exercidas pela Igreja na área eleitoral, como também as funções cartoriais: registro civil,

casamento, óbitos, registros de imóveis etc. Tudo isso, gerando um quadro propício ao

recrudescimento do pensamento católico em nível da política nacional, o que se estendia aos

leigos, dado que o artigo 95 da Constituição de 1824 excluía da condição de cidadãos "hábeis

para a serem nomeados deputados" todos aqueles que não atendessem ao critério censitário -

"quatrocentos mil réis de renda líquida" -, ou que "não professassem a religião do

Estado".(NOGUEIRA, p. 92)

Em função deste quadro histórico, a tomada de consciência acerca da identidade

específica da Igreja em relação ao Estado e a consequente convicção da necessidade de reforçar a

sua institucionalização em base cada vez mais universal e menos nacional, ocorreu tardiamente -

a partir de meados do século XIX - e sob padrões ultramontanos. Foi então que Bispos, padres e

leigos debateram modelos alternativos de vivência e conduta social, propugnando concepções

conflitantes acerca dos modelos de relacionamento entre Igreja e Estado.

No âmbito das discussões travadas em nível das esferas políticas, religiosas, educacionais

e na imprensa, este processo específico da secularização das instituições esgarçou combinações

variadas entre catolicismo e liberalismo, acenando com a apropriação adaptada de três grandes

princípios normativos defendidos pela episteme liberal no campo político-religioso:

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o de que os assuntos e convicções religiosas diziam respeito às esferas privadas dos grupos e

indivíduos; a neutralidade do Estado diante das disputas pela veracidade das questões religiosas;

e a separação entre Igreja e Estado, no sentido da autonomia institucional de um domínio em

relação ao outro”.(SOUZA, 2010, p. 324)

Tais princípios desdobraram-se em diferentes modelos de secularização, cada qual

orientando-se por diferentes concepções acerca da ideia de liberdade e indicando a inexistência

de uma postura monolítica da Igreja e seus representantes, tanto em termos dos assuntos

temporais, quanto dos de natureza religiosa.

Se durante o período da hegemonia liberal-regalista - que dominou a “cena política

eclesiástica nacional de 1827 até mais ou menos 1837” (SANTIROCCHI, 2010) - houve um

franco incentivo de seus representantes quanto à vinda de imigrantes estrangeiros - conforme

ilustrado pelo padre Feijó, que em diferentes ocasiões sugeriu "que os irmãos morávios fossem

convidados para educar os índios brasileiros" (GOUVÊA, 2005, p. 48-67) -, na segunda metade

do XIX, os representantes do clero ultramontano lançaram não apenas críticas internas ao

regalismo, mas opuseram-se a toda e qualquer tendência associada ao liberalismo anticlerical, à

maçonaria e ao pensamento filosófico científico, que eram contrários aos princípios da Igreja

Romana.

Assim, do lado ultramontano, tal movimento derivou uma mescla de intolerância,

coragem, caridade e espírito apologético, gerando indignação entre liberais, regalistas e maçons,

dada a recusa da inflexibilidade doutrinal dos defensores da subordinação da Igreja nacional à

Cúria Romana. Como bem conclui Gilson Ciarallo, enquanto para os liberais do final do século a

“noção de liberdade, incluindo a religiosa” era vista “como sinal de desenvolvimento e

progresso”, para o “tradicionalismo católico” essa mesma liberdade estava associada ao

“‘vendaval das liberdades modernas’ que começava a açoitar o Brasil”.(CIARALLO, 2011, p.

93)

Em função disso, o cenário político do século XIX "foi praticamente tomado pelo

confronto nem sempre pacífico entre catolicismo romano e protestantismo, embora surgissem

nele outras manifestações religiosas que iriam, algumas delas, tornar-se significativas na

República" (MENDONÇA, 2003, p. 144-163). Já durante a primeira metade do XIX, uma das

principais polêmicas veiculada pela imprensa reflete a crítica de padres ultramontanos ao

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protestantismo de missão ou conversão , como era o caso dos metodistas, primeiros a se

estabelecerem no Brasil. Derivado das experiências que este movimento observou com a

expansão do sudoeste dos Estados Unidos, os metodistas pregavam uma prática religiosa

informal, realizando suas reuniões ao “ar livre, com seus pregadores leigos e itinerantes e sua

teologia simples e emotiva", não exigindo "lugares sagrados, nem ministros formados e nem

aparato litúrgico". (MENDONÇA, 1995, p. 56).

No Brasil, os metodistas foram acusados por representantes do clero ultramontano por,

supostamente, não professarem uma verdadeira religião e pelo fato de seus representantes não

terem a legitimidade na “produção, reprodução, conservação e difusão dos bens de

salvação"(BOURDIEU, 1996). Afinal, conforme acusava Luis Gonçalves dos Santos - o Padre

Perereca -, ferrenho polemista contra os projetos liberais (SOUZA, 2010, p. 29), seus "chamados

Ministros não são Sacerdotes, não têm caráter de Ordem Sacra, não receberam o poder de redimir

os pecados, nem de os declarar redimidos; portanto tudo quanto fazem a este respeito é

impostura, profanação, e impiedade”.

As condições da liberdade religiosa

Para nosso interesses, interessa frisar que, por ambas as vertentes do clero brasileiro -

portadores de projetos distintos de reforma clerical e propugnadores de diferentes modelos de

secularização - o tema da liberdade religiosa foi protelado, em lugar de uma marcada

intolerância, que dividiu o campo religioso católico no período imperial. A polarização deste

campo assumiria configurações específicas a partir de meados do século XIX, quando o clero

conservador - responsável pela “implementação da reforma eclesiástica que vingou, enquanto

falhara aquela de cunho liberal-regalista”-, passou a modelar a reforma dos Seminários, os rumos

da reforma clerical e o posterior processo de separação institucional entre Igreja e Estado no

Brasil, oficializada com o fim do Padroado pela Constituição de 1891.

A nosso ver, foi justamente a tônica ultramontana assumida pela reforma clerical no

Brasil oitocentista que, se por um lado garantiu o processo de institucionalização e delimitação

dos Direitos da Igreja - dotando o discurso religioso de autonomia e independência -, por outro,

suscitou a mais intensa oposição de clérigos e leigos que passaram a defender uma terceira via de

secularização - distinta do modelo regalista e do "intransigente romano" -, apoiada no princípio

da liberdade religiosa e da neutralidade do Estado neste sentido. Opondo-se ao movimento

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conhecido como a "romanização" da Igreja Católica, tal tendência postulava "a mais radical

ruptura entre a figura do cidadão e a do crente", compreendendo que Igreja e Estado constituíam

não apenas entidades diferentes, mas deveriam ser "absolutamente independentes entre si",

cabendo ao poder temporal garantir a completa "liberdade de consciência" conjugada a "paridade

de oportunidades para todos os grupos" religiosos. (DI STEFANO, 2008, 169)

Notamos assim que, dado o teor das disputas instaladas no campo religioso brasileiro,

durante todo o século XIX, não eram claros os rumos assumidos pela reforma da Igreja e,

tampouco, as possibilidades abertas pela Carta Constitucional de 1891, que consagrava o caráter

do Estado como “instituição jurídica secularizada”, estipulando em seu Art. 72, parágrafo 3o.,

que: “Todos os indivíduos e confissões religiosas” poderiam, desde então, “exercer pública e

livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições

do direito comum”. (BALEEIRO, 2001, p. 97)

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