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TRANSTORNO DA PERSONALIDADE OBSESSIVO-COMPULSIVA

Pedro J. Gouvêa

Objetivos do Curso

Apresentar o conceito de Personalidade e Transtorno da Personalidade;

Apresentar as características básicas do TPOC relacionando-o ao contexto sócio-cultural atual;

Explicar o modelo cognitivo-comportamental do TPOC;

Compreender a importância do diagnóstico diferencial;

Apresentar as propostas de intervenção para o TPOC;

Bibliografia

ABREU, P. R.; PRADA, C. G. Transtorno de ansiedade obsessivo-compulsivo (TOC) e transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo (TPOC): um diagnóstico analítico-comportamental. In: Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva v.6, n.2. São Paulo, 2004.

APA. DSM-IV-TR: Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed, 2002.

BECK, A. T.; FREEMAN, A.; DAVIS, D. D. e col. Terapia cognitiva dos transtornos da personalidade. Porto Alegre: Artmed, 2005.

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CABALLO, V. E. Manual de transtornos da personalidade: Descrição, avaliação e tratamento. São Paulo: Santos, 2008.

SOUSA, A. C. A. Transtorno de personalidade borderline sob uma perspectiva analítico-funcional. In: Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva v.5, n.2. São Paulo, 2003.

YOUNG, J. E. Terapia cognitiva para transtornos da personalidade: uma abordagem focada no esquema. Porto Alegre: Artmed, 2003.

Texto

1. Personalidade e Transtorno da Personalidade

Para falarmos de um transtorno da personalidade, seja ele qual for, é de grande

importância e utilidade que se conceitue de forma precisa o que significa essa expressão dentro

de um referencial teórico específico. Aqui, usaremos o enfoque cognitivo-comportamental para

conceitualizar os fenômenos relacionados a personalidade e as suas alterações patológicas, ou

seja, aquilo que habitualmente chamamos de transtorno da personalidade.

De acordo com Beck et al. (2005), personalidade seria um conjunto de estratégias

filogeneticamente determinadas que serviriam a sobrevivência e a reprodução da espécie. Essas

estratégias, portanto, teriam uma natureza genética, sendo selecionadas pelo ambiente natural ao

longo dos tempos pela sua função de adaptação a este ambiente. Entretanto, por uma série de

razões, podemos observar que algumas ou diversas dessas estratégias se apresentam de uma

forma exagerada e inflexível, se tornando assim desadaptativas, constituindo aquilo que

chamamos de transtorno.

Contudo, a personalidade não se constitui apenas de componentes herdados, mas

também de componentes aprendidos na história pessoal de cada indivíduo. Beck et al. (2005),

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enfatiza que o processamento de informações, incluindo os processos afetivos, são fenômenos

que antecedem a manifestação das estratégias citadas. Isso significa que a maneira como o

indivíduo processa ou avalia as demandas específicas de uma situação precede e desencadeia

uma determinada estratégia, seja ela adaptativa ou não.

A maneira pessoal de avaliar uma determinada situação, entretanto, não é aleatória. Ela

depende, em grande parte, das crenças básicas do indivíduo, que por sua vez estão inseridas e

organizadas em estruturas mais ou menos estáveis, chamadas de esquemas, que selecionam e

sintetizam os dados fornecidos. Beck et al. (2005), consideram os esquemas as unidades

fundamentais da personalidade, pois deles se originam as emoções e os comportamentos

problemáticos.

Ao observarmos padrões específicos de comportamento habitualmente rotulados de

´´retraído´´, ´´arrogante´´ ou ´´sociável´´, podemos entender que tais padrões são expressões

públicas das estruturas básicas (esquemas) do indivíduo, o que permite que possamos identificar

traços de personalidade específicos e seus significados subjacentes. Em outras palavras, um

conjunto de comportamentos públicos aos quais habitualmente atribuímos diferentes significados

como ´´tímido´´ ou ´´sociável´´ representam estratégias interpessoais desenvolvidas a partir da

interação entre disposição inata e influências ambientais.

De acordo com esse ponto de vista, podemos compreender certas características

comportamentais como, por exemplo, ´´dependência´´ e ´´autonomia´´, como funcionalmente

relacionadas aos esquemas básicos, e não atribuídas a impulsos inatos, como afirmam as teorias

motivacionais da personalidade.

Seguindo essa linha de pensamento, podemos identificar a variável essencial para a

compreensão e abordagem clínica dos transtornos da personalidade: os esquemas. O modelo

cognitivo considera que estes esquemas são responsáveis por delinear certas tendências na

maneira de processar e avaliar as experiências pelo indivíduo. No que se refere às

psicopatologias, essas tendências no processamento de experiências assume um viés

sistematicamente disfuncional, que por sua vez se originam nas crenças mais profundas do

indivíduo, também disfuncionais.

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Dentro de uma visão comportamental, a personalidade é vista como um conjunto de

respostas funcionalmente unificado, que são expressas através do repertório comportamental de

cada um, e é multideterminada (Skinner, 1998). As unidades funcionais da personalidade e suas

variáveis de controle (estímulos discriminativos e consequências) são essenciais neste modelo. O

autor considera três nível de seleção do comportamento como constituintes daquilo que

chamamos de personalidade: filogenético, ontogenético e cultural.

Quando falamos em personalidade, estamos nos referindo a uma tendência consistente

a se comportar de uma dada maneira em diversas situações. Essa tendência, por sua vez, é

produto de uma história passada de reforçamento do sujeito, e refere-se aos três níveis de seleção

do comportamento citados. O nível cultural, por exemplo, promove e reforça determinados

padrões comportamentais que são úteis para prever como os indivíduos irão se comportar e

facilitar a manutenção do funcionamento da sociedade. Contudo, indivíduos que, por diversas

razões, não apresentam esses padrões, podem ser considerados como tendo um transtorno da

personalidade do ponto de vista da cultura.

Portanto, podemos concluir que a personalidade é aprendida, ou seja, aprendemos

quais comportamentos são eficazes para obter reforçadores em determinadas circunstâncias

(Skinner, 1953).

2. Características Básicas do Transtorno

Até aqui foi apresentada uma visão inicial do que consideramos como personalidade e

transtorno da personalidade. Serão abordados agora, aspectos relevantes de um destes

transtornos: o transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva (TPOC).

Inicialmente, é importante contextualizar o aparecimento de um determinado fenômeno

para que possamos compreendê-lo melhor. Atualmente, vivemos em uma sociedade que valoriza

e reforça excessivamente padrões de comportamento voltados à produtividade, dedicação e

resultados de curto prazo. Segundo Caballo (2008), qualidades como o perfeccionismo,

detalhismo, organização e competência são altamente valorizadas no contexto profissional,

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favorecendo rapidamente a ascensão do indivíduo no trabalho. Essas características são

compatíveis com um estilo de personalidade obsessivo-compulsiva, e parecem ser mais comuns

em sociedades desenvolvidas como a nossa em função dos resultados que produzem.

O DSM-IV-TR (APA, 2002), define o TPOC como ´´um padrão global de preocupação

com a ordem, o perfeccionismo e o controle mental e interpessoal, à custa da flexibilidade, da

espontaneidade e da eficiência, que se manifesta no início da idade adulta e se apresenta em uma

série de contextos, indicados por, no mínimo, quatro dos seguintes critérios:

1. Preocupação com os detalhes, normas, listas, ordem, organização ou horários, até o

ponto de perder de vista o objetivo principal da atividade.

2. Perfeccionismo que interfere na finalização da tarefa.

3. Dedicação excessiva ao trabalho e à produtividade com exclusão das atividades de

lazer e as amizades (não explicado por uma necessidade econômica óbvia).

4. Reticência em delegar tarefas ou trabalhar com outros a menos que se submetam

exatamente à sua forma de fazer as coisas.

5. Mostra rigidez e obstinação.

6. Inflexibilidade em relação a temas de moral, ética ou valores.

7. Incapacidade para desfazer-se de objetos gastos ou inúteis, mesmo que não tenham

valor sentimental.

8. Adoção de um estilo avaro nos gastos com si mesmo e com os demais.´´

O obsessivo-compulsivo é essencialmente um indivíduo vulnerável à apreciação

negativa de sua imagem pelos outros. Adotam um estilo de comportamento inflexível

excessivamente perfeccionista que não deixa espaço para o erro, conseqüentemente evitando a

crítica e a avaliação negativa. Esses indivíduos não aceitam e podem ficar extremamente

indignados quando taxados de irresponsáveis ou incompetentes. Entretanto, é improvável que

isso aconteça.

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Caballo (2008) relata que o indivíduo com TPOC tem fortes valores que dirigem

muitas de suas ações, e se apegam rigidamente a princípios morais, éticos e comunitários que

julgam serem corretos. Segundo o autor ´´pode ser o ecologista, o vizinho anti-ruído, o motorista

que respeita e faz respeitar as normas de trânsito. É provável que muitas das queixas recebidas

dos órgãos de proteção ao consumidor sejam devidas a esse estilo de comportamento.´´ (p. 231)

O estilo obsessivo-compulsivo é caracterizado basicamente por três aspectos. O

primeiro refere-se ao padrão extremamente rígido de pensamento, traduzido por uma atenção

intensa e centrada em detalhes específicos de uma situação específica. Isso impede que estes

sujeitos consigam perceber os aspectos mais globais de determinados eventos, como por

exemplo, o campo das relações interpessoais.

O segundo aspecto diz respeito a forma de atividade, ou seja, o indivíduo com TPOC

absorve-se intensamente em tarefas rotineiras ou atividades técnicas, tendo raros momentos de

relaxamento. Segundo Caballo (2008), ´´ até mesmo quando estão de férias, planejam um

programa completo para cada dia, a fim de não perder tempo. Se forem impedidos de seguir esse

programa, incomodam-se por isso, e não por deixar de desfrutar algo agradável.´´

O terceiro aspecto relaciona-se à perda da realidade, ou seja, estes indivíduos tem

preocupações com coisas absolutamente improváveis de ocorrerem, e por vezes, tais

preocupações são tão intensas e sistematizadas que chegam quase a ser delirantes. Além disso,

tem uma elevada autodisciplina, são regidos pelo intelecto e não pelas emoções, e costumam ser

reservados e pouco afetivos.

Para Caballo (2008), no plano comportamental, o sujeito obsessivo-compulsivo é

caracterizado por um comportamento sistemático, estruturado, estabelecendo relações formais e

distantes. Por exemplo, seu comportamento é amplamente dirigido por normas sociais

consideradas corretas, e tendem a ser intolerantes com aqueles que as transgridem. No plano

cognitivo, seu estilo de pensamento é marcado por uma carência de imaginação, e por ser

excessivamente rígido e dogmático. No plano emocional, apresentam ansiedade e tensão

crônicas, medo do fracasso (especialmente profissional e financeiro), além de um controle

excessivo da expressão emocional, levando freqüentemente estes indivíduos a sofrer sérios

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sintomas psicossomáticos. Isso os leva à uma maior vulnerabilidade a desenvolver doenças

cardiovasculares, enxaquecas, úlceras e problemas neuromusculares.

No que se refere à epidemiologia, o DSM-IV-TR (APA, 2002) indica uma prevalência

de 1% na população geral do TPOC, e uma média de 5% entre aqueles que buscam serviços de

saúde mental. Este sistema nosológico de classificação também afirma que o TPOC é bastante

comum na atualidade entre as pessoas da cultura ocidental, e é mais comum em homens do que

em mulheres, em uma proporção de 2 por 1. Seu curso é relativamente estável ao longo do

tempo, e tende a se agravar com o passar do tempo.

Em relação a etiologia do TPOC, parecem haver fortes indícios de que este seja instalado

e mantido predominantemente por influências ambientais, existindo poucas evidências de fatores

genéticos no seu desenvolvimento (Millon e Everly, 1994 apud Caballo, 2008). Dentre os fatores

ambientas mais relevantes segundo os autores, destaca-se o supercontrole parental, que se

expressa por atitudes de firmeza, repressão, inflexibilidade, e por vezes punição por parte do

cuidador para com a criança, criando desde cedo um senso de responsabilidade acentuado nesta.

Outra variável etiológica importante é o comportamento compulsivo aprendido. Ou seja,

a criança para evitar punições ou represálias do cuidador, se submete às suas exigências,

tornando-se excessivamente submissa. Tal comportamento é mantido por um sistema de

reforçamento negativo. Outra forma de aprendizado do comportamento compulsivo, é a

modelação, onde a criança observa e tende a reproduzir padrões perfeccionistas, ordenados,

detalhistas, etc. dos cuidadores, e incorporá-los ao seu repertório. A combinação destas

contingências acaba produzindo uma dificuldade no desenvolvimento de um comportamento

autônomo, medo de não ser aprovada, e preocupações em evitar punições.

Por fim, temos a aprendizagem de responsabilidades, que se dá através da transmissão de

regras à criança como ´´devemos cumprir estritamente nossas obrigações´´, ´´devemos nos

comportar de maneira construtiva´´, ´´devemos ser ordenados e educados´´, ´´é irresponsável

participar de brincadeiras frívolas e agir impulsivamente´´, e ´´devemos ser organizados,

pontuais e meticulosos´´. Muitas vezes, essas regras são introjetadas rigidamente pela criança,

ocasionando sentimentos de culpa e ansiedade quando não são seguidas.

3. O modelo cognitivo-comportamental do TPOC

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O modelo cognitivo aqui apresentado para o TPOC será predominantemente baseado nas

investigações de Beck et al. (2005) e Young (2003), tentando-se estabelecer uma ponte com o

modelo comportamental baseado nos pressupostos do behaviorismo radical de Skinner.

Segundo Beck et al. (2005), os esquemas que predominam nestes indivíduos são:

´´Preciso evitar erros a qualquer custo´´; ´´Existe um caminho/resposta/comportamento certo em

cada situação´´; ´´Erros são intoleráveis´´. Para lidar com tais esquemas, estes sujeitos acabam

desenvolvendo estratégias cognitivas subjacentes do tipo: ´´Preciso ser cuidadoso e meticuloso´´;

´´Devo prestar atenção aos detalhes´´; ´´Preciso perceber os erros imediatamente para que eles

possam ser corrigidos; e ´´cometer um erro é merecer críticas´´. Todas estas estratégias tem a

função de evitar erros a todo custo e controlar o ambiente (tanto externo quanto privado).

Uma distorção cognitiva típica destes indivíduos é o pensamento dicotômico. Por

exemplo, a crença ´´qualquer desvio do que é certo, automaticamente está errado´´ reflete isso.

No plano interpessoal, as conseqüências desta forma rígida de pensar traz dificuldades

significativas, visto que em grande parte dos relacionamentos sociais, há uma presença freqüente

de emoções e situações ambíguas, coisas que o obsessivo-compulsivo tende a evitar ou controlar

sistematicamente.

Outra distorção cognitiva freqüente neste transtorno, segundo Beck et al. (2005), é o

pensamento mágico, que se expressa por meio de crenças como ´´podemos evitar desastres/erros,

se nos preocuparmos com eles´´. Eles tendem a catastrofizar mudanças em geral, acreditando que

o único meio de não entrar em contato com a preguiça ou a irresponsabilidade é a sua

compulsividade.

O perfil cognitivo para o TPOC pode ser assim descrito:

Visão de si mesmo:

• Responsável

• Confiável

• Meticuloso

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• Competente

Visão dos outros:

• Irresponsáveis

• Casuais

• Incompetentes

• Ociosos

Pricipais crenças:

• ´´Eu sei o que é melhor´´

• ´´Os detalhes são cruciais´´

• ´´As pessoas deveriam fazer melhor, se esforçar mais´´

Principais estratégias:

• Aplicar regras

• Perfeccionismo

• Avaliar, controlar, organizar, criticar, punir

O modelo de Young (2003) é baseado no seu sistema conceitual e aplicado de

psicoterapia: a terapia focada em esquemas. Esse modelo se caracteriza por ser uma expansão da

terapia cognitiva de curto prazo desenvolvida por Beck, e é especialmente utilizada para o

tratamento dos transtornos da personalidade.

A terapia do esquema parece ser uma excelente alternativa para o manejo de pacientes

difíceis, com problemas crônicos e resistentes às intervenções habituais da terapia cognitiva.

Resumidamente, aqui entende-se os transtornos da personalidade como sendo resultado de três

características: rigidez, evitação e dificuldades interpessoais de longo prazo.

A teoria que da sustentação à terapia do esquema de Young parte de cinco construtos

básicos relacionados aos fenômenos mais profundos da vida mental. São eles:

1. Esquemas Iniciais Desadaptativos

2. Domínios de um Esquema

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3. Manutenção de um Esquema

4. Evitação do Esquema

5. Compensação do Esquema

Como o objetivo aqui não é aprofundar nenhum deles e sim apresentar o modelo

cognitivo para o TPOC, será discutido a seguir de que forma essas variáveis podem estar

presentes na personalidade obsessivo-compulsiva.

Os esquemas iniciais desadaptativos (EIDs) são definidos como ´´temas extremamente

estáveis e duradouros que se desenvolvem durante a infância, são elaborados ao longo da vida e

são disfuncionais em grau significativo´´ (Young, 2003, p. 15). Os EIDs possuem algumas

características básicas como: são autoperpetuadores, são aceitos como algo natural e fortemente

verdadeiro, são ligados a altos níveis de afeto, constituem o fundamento do autoconceito, dentre

outras.

Como observado em sua prática clínica, Young identificou diversos EIDs e agrupou-os

no que chamou de Domínios de Esquemas. O critério utilizado por ele para agrupar determinado

EID em um mesmo domínio foi a semelhança de tema. Os Domínios de Esquemas então são

grupos de EIDs com temas semelhantes, e correspondem as necessidades desenvolvimentais

básicas da criança.

No caso de indivíduos com TPOC, o domínio denominado Supervigilância e Inibição

parece prevalecer de maneira consistente. Esse domínio incorpora quatro EIDs que comumente

são encontrados nesses sujeitos: Negativismo/Pessimismo, Inibição Emocional, Padrões

Inflexíveis e Caráter Punitivo.

Em relação à manutenção do esquema (processos pelos quais os EIDs são reforçados) os

sujeitos com TPOC utilizam consistentemente distorções cognitivas como supergeneralização,

magnificação, minimização e abstração seletiva. Todas com a função de confirmar o esquema e

descartar evidências contraditórias. Outra forma de manutenção do esquema é obtida através de

padrões autoderrotistas de comportamento (que podem ter sido adaptativos no passado) como

por exemplo, o sujeito com um estilo obsessivo-compulsivo assume consistentemente

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responsabilidades e tarefas excessivas no trabalho, o que produz um certo conforto e

familiaridade por reforçar visão de si como responsável.

A evitação do esquema constitui uma importante fonte de perpetuação do mesmo. É

utilizada com o objetivo de evitar o afeto desagradável relacionado ao esquema. Os mecanismos

de evitação podem se dar no nível cognitivo (evitação de pensamentos e imagens que possam

ativar o esquema), afetivo (evitação de sentimentos eliciados pelo esquema) e comportamental

(evitação de situações ou eventos que possam ativar o esquema).

Por fim, a compensação do esquema refere-se a adoção de padrões cognitivos ou

comportamentais que parecem ser o oposto do que inicialmente se esperava a partir da

identificação de determinado EID. Esse processo revela uma incapacidade de reconhecer a

vulnerabilidade subjacente e, portanto, deixa o paciente despreparado para a dor emocional se

compensação do esquema falhar e o esquema irromper (Young, 2003). Esse mecanismo é pouco

comum em sujeitos com TPOC pela natureza de suas características.

O modelo comportamental envolvendo o TPOC sugere que os comportamentos

perfeccionistas destes indivíduos teriam sido selecionados em sua maior parte por reforçamento

positivo. Entretanto, como estes indivíduos apresentam padrões elevados de ansiedade, com o

tempo, seu comportamento tenderia a ficar sob controle de contingências aversivas. Guilhardi e

Queiroz (2001), ressaltam que, através do controle aversivo, as culturas conseguem assegurar

que seus membros se sintam responsáveis pelos seus atos.

Riggs e Foa (1999) afirmam que, no caso do TOC, as compulsões tem o objetivo não

somente de evitar a ansiedade relacionada às obsessões, mas também de evitar ou reduzir o

sofrimento ou evitar alguma situação temida. Deste modo, os comportamentos recorrentes no

TPOC também poderiam ser considerados compulsões, visto que sua função está voltada,

sobretudo, para a esquiva dos estímulos aversivos e o conseqüente alívio da ansiedade. Os

autores concluem que a função das esquivas encontradas na classe de respostas relacionadas às

sugeridas compulsões no TPOC se mostra semelhante à função das esquivas compulsivas

encontradas no TOC.

Dessa forma, aparentemente, falar dos comportamentos no TOC é diferente do que

falar nos comportamentos no TPOC. Entretanto, esta diferença se daria em relação à topografia

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(forma) comportamental atual dos dois transtornos, mas, de acordo com a linha de pensamento

aqui desenvolvida, a dinâmica das variáveis de controle dos comportamentos obsessivos e

compulsivos se mostra bastante similar. Em função disso, hipotetiza-se que, se ocorresse um

aumento substancial dos eventos estressores na vida de um sujeito com TPOC, aumentariam as

chances do aparecimento de obsessões até então descartadas no diagnóstico formal do fenômeno.

4. Diagnóstico diferencial

O TPOC é um quadro que pode ser facilmente confundido com outros transtornos

semelhantes ou estar sobreposto a eles, sendo difícil a sua distinção. Por isso a importância do

diagnóstico diferencial.

Em relação aos transtornos do eixo I, é comum haver confusões entre o TPOC, e o

transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) em função de algumas características aparentemente

semelhantes. Entretanto, há uma diferença de base que distingue os transtornos. No TOC, há a

presença de verdadeiras obsessões ou pensamentos intrusivos interpretados como inconvenientes

e comportamentos ritualísticos manifestos, pouco freqüentes no TPOC (Caballo, 2008).

Embora possa existir a presença do TOC associado ao TPOC no mesmo indivíduo, as

pesquisas mostram (Gruenberg, 1993; Skodol, 1993 apud Caballo, 2008) que na grande maioria

dos casos, os sujeitos com TOC não atenderão aos critérios diagnósticos para TPOC. Além disso,

foram encontrados outros transtornos do eixo II mais freqüentemente associados ao TOC, como

o transtorno da personalidade esquiva e o dependente.

No eixo II, o TPOC compartilha algumas características com outros transtornos como o

transtorno da personalidade narcisista (TPN). Este também apresenta um perfeccionismo

acentuado e a crença de que os outros não são capazes de fazer as coisas tão bem quanto eles.

Entretanto, no TPN, há um déficit na capacidade de autocrítica (excessivamente presente no

TPOC), e há a idéia de que os seus atos ou o seu próprio eu atingiram a perfeição, coisa que o

obsessivo-compulsivo pensa jamais poder alcançar (Beck et al., 2005).

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O transtorno da personalidade anti-social (TPAS) apresenta uma falta de generosidade

com os demais também característica do TPOC e do TPN, entretanto, no TPAS e no TPN há

uma autogratificação e satisfação dos próprios desejos, ausente no TPOC. Os sujeitos com TPOC

tendem a ser avarentos consigo mesmos e com os outros (Beck et al., 2005).

Beck et al. (2005) e Caballo (2008) relatam também que o TPOC apresenta uma

semelhança com o transtorno da personalidade esquizóide (TPEZ), como uma aparente

formalidade nas relações interpessoais e um isolamento social. Contudo, as causas subjacentes

para isso diferem. No TPEZ, há uma ausência básica da capacidade de intimidade, enquanto que

no TPOC, o indivíduo sente-se desconfortável com as emoções e dedica-se excessivamente ao

trabalho.

A identificação do TPOC, segundo Beck et al. (2005) não é difícil por parte do terapeuta

por algumas razões. A primeira razão é que provavelmente o compulsivo irá demonstrar sinais

de rigidez ou indecisão na hora de marcar a sessão já no primeiro contato telefônico. Essa

indecisão, por sua vez, tem sua raiz no medo de cometer um erro, e não no medo de desagradar

ou incomodar o terapeuta. A segunda razão indica que já no primeiro encontro, é possível

identificar alguns padrões característicos do quadro, como um comportamento excessivamente

formal, pouco caloroso e pouco expressivo emocionalmente por parte do paciente. Além disso, é

provável que o mesmo manifeste padrões típicos como um esforço excessivo para se expressar

corretamente, ruminar muito sobre cada tópico, buscando a todo momento se convencer de que

abordará todos os detalhes do assunto em questão.

Como um processo inverso, é possível que o paciente apresente um discurso lento e

hesitante em função da sua ansiedade e exigência elevada em se expressar corretamente, levando

a uma latência no responder inadequada. O conteúdo da sua fala é predominantemente

constituído de fatos e idéias concretas e racionais, dificilmente se prendendo a sentimentos ou

preferências. Como exposto anteriormente, isso representa um mecanismo de esquiva das

emoções, que para o obsessivo-compulsivo são desconfortáveis e inconvenientes.

A terceira razão consiste em eventos históricos e atuais típicos de sujeitos com TPOC.

Como por exemplo, indivíduos criados em ambientes familiares rígidos e controladores, não

possuir relacionamentos sociais íntimos, trabalhar em uma profissão técnica, orientada para

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detalhes e não se dedicar a muitas atividades de lazer são fortes indicadores da presença do

TPOC.

Para finalizar, Beck et al. (2005) consideram que a maneira mais simples e prática de

diagnosticar um TPOC é perguntar ao paciente, diretamente, sem rodeios e sem nenhuma crítica,

se os critérios diagnósticos do DSM-IV-TR aplicam-se a ele. Na maioria dos casos, o paciente

admitirá que apresenta tais critérios sem dificuldade, mesmo não percebendo a relação entre

estes e os problemas que o levaram a procurar terapia.

5. Tratamento

A terapia cognitivo-comportamental (TCC) para o TPOC envolve inicialmente uma

psicoeducação sobre o transtorno e sobre a estrutura básica do processo clínico, assim como

o estabelecimentos de objetivos específicos. Feito isso, estabelece-se as prioridades do

tratamento com base nestes objetivos, delineando as áreas-problema a serem inicialmente

trabalhadas (Beck et al., 2005).

Concluída esta fase, o terapeuta pode começar a busca pela identificação de

pensamentos automáticos, crenças subjacentes e esquemas relacionados aos problemas. Isso

pode ser feitos através das técnicas socráticas da terapia cognitiva padrão, enfatizando

constantemente para o paciente a relação de influência recíproca entre cognição, afeto e

comportamento, preferencialmente utilizando exemplos práticos para facilitar a compreensão

do modelo.

Como tarefa de casa, o terapeuta pode pedir ao paciente um registro de pensamentos

disfuncionais (RPD) como forma de automonitoramento. O RPD permite a identificação, por

parte do paciente, das variáveis que afetam o seu comportamento ou, em outras palavras,

permite a realização da análise funcional do comportamento. Essa estratégia é chave para o

processo, pois além de aumentar o autoconhecimento do paciente, é a partir dela que será

formulado um plano de tratamento.

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Um exemplo de RPD de um obsessivo-compulsivo poderia ser: Em uma

circunstância de fazer alguma tarefa do trabalho, o paciente sente-se ansioso e pensa: ´´Não

quero fazer isso, porque não serei capaz de fazer perfeitamente´´. Isso produz como

conseqüência procrastinação da tarefa e aumento da preocupação. Note que o elemento chave

a ser trabalhado neste exemplo é o perfeccionismo. A crença subjacente neste caso, foi

identificada como: ´´Preciso evitar erros para ter valor´´ (Beck et al., 2005).

Em síntese, o objetivo geral da TCC para o TPOC é auxiliar o paciente a modificar as

suas crenças subjacentes disfuncionais e, consequentemente, modificar as emoções e os

comportamentos problemáticos provocados por tais crenças (Beck et al., 2005). O

estabelecimento de uma relação terapêutica empática e afetiva pode ser uma tarefa difícil

para o terapeuta que lida com esses pacientes em função da sua rigidez e o desconforto com

as emoções. Isso indica que o formato da terapia com esses sujeitos deve ser mais

estruturado, objetivo e focado em problemas do que o habitual. A ênfase do processo deve

recair mais sobre os aspectos racionais e factuais do que emocionais na terapia com o TPOC.

Pacientes com TPOC frequentemente evocam reações emocionais desconfortáveis no

terapeuta como tédio, raiva ou frustração. Isso ocorre porque os comportamentos típicos

destes indivíduos tendem a ocorrer também na interação terapêutica e podem se tornar

obstáculos ao sucesso da terapia caso o terapeuta não tenha habilidades adequadas para

manejá-los. Beck et al. (2005) dão como exemplo um paciente com TPOC que não

demonstra qualquer manifestação afetiva, apegando-se excessivamente aos fatos em

detrimento de suas emoções, o que pode levar o terapeuta a julgamentos arbitrários deste

paciente como ´´chato´´ ou ´´seco´´. O autor destaca que essas reações provocadas no

terapeuta pelo paciente (chamadas de contratransferência para o modelo psicodinâmico) são

importantes fontes de avaliação e intervenção para as dificuldades que este enfrenta no seu

ambiente natural e devem ser utilizadas como ferramenta clínica.

Algumas estratégias específicas de intervenção podem ser bastante úteis com

pacientes que apresentam um padrão de personalidade obsessivo-compulsivo. Dentre elas, as

técnicas de relaxamento, por ajudarem o paciente a manejar estados de tensão e ansiedade.

Apesar desses sujeitos considerarem frequentemente uma ´´perda de tempo´´ o uso de tais

técnicas no início, posteriormente acabam percebendo os benefícios que elas trazem.

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Uma outra estratégia eficaz com esses indivíduos são os experimentos

comportamentais. A principal vantagem desta técnica é que o paciente pode confrontar

empiricamente os seus pressupostos disfuncionais através de experimentos programados pelo

terapeuta em conjunto com o paciente, visando reavaliar as distorções em seu pensamento.

Técnicas cognitivas como a parada de pensamento e a distração podem ser úteis para

auxiliar o paciente a lidar de maneira adaptativa com as suas preocupações e ruminações

crônicas. De acordo com Caballo (2008), uma das limitações mais comuns a esse tipo de

paciente é a sua incapacidade para dar prioridade a tarefas importantes em detrimento de

outras menos importantes e a sua má distribuição do tempo.

Para lidar com esse problema Rice (1998, apud Caballo, 2008) sugere a estratégia de

manipulação eficaz do tempo, que consiste em ordenar em uma lista as atividades que devem

ser realizadas da mais importante e urgente para a menos importante e urgente. Isso

produziria como consequência uma economia do tempo que poderia ser despendido a outros

tipos de atividade que não relacionadas ao trabalho.

Outras estratégias úteis são: aprender a delegar tarefas a outras pessoas (produzindo

como consequência menos sobrecarga de trabalho para o indivíduo com TPOC); evitar

revisar a mesma tarefa constantemente (ocasionando um dispêndio de tempo excessivo e

desnecessário, diminuindo a eficácia) e; dedicar mais tempo ao lazer a ao descanso (buscar

outros reforçadores fora do âmbito profissional).

Para finalizar, Caballo (2008) faz um resumo das principais estratégias cognitivo-

comportamentais utilizadas no tratamento do TPOC:

Aumento da eficácia.

Manipulação do tempo e solução de problemas.

Modificação do pensamento dicotômico.

Treinamento em relaxamento.

Detenção do pensamento para o controle dos pensamentos obsessivos.

Programação de atividades.

Treinamento em auto-instruções.

Modificação das suposições subjacentes.

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Aumento da empatia.