Leodegário A. de Azevedo Filho - Brasil - 500 Anos de Língua Portuguesa (2)

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BRASIL 500 ANOS DE LNGUA PORTUGUESA (Congresso internacional) Apoio especfico para esta publicao CNPQ FAPERJ MINISTRIO DA CULTURA AlphagraficsPinheiro/So Paulo ABF/SBLL/UERJ

EDITORA GORA DA ILHA

Ficha catalogrfica FILHO, Leodegrio A. de Azevedo Brasil 500 anos de Lngua Portuguesa / Leodegrio A. de Azevedo 372 pginas Editora gora Lingstica e Filho (organizador) Rio de Janeiro, junho de 2000 da Ilha - ISBN 86854 Filologia CDD -410.412

COPYRIGHT: Leodegrio A. de Azevedo Filho. TEL.: (0 XX 21) 522-5155 BRASIL 500 ANOS DE LNGUA PORTUGUESA Rio de Janeiro, junho de 2000 Magnfico Reitor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Antnio Celso Alves Pereira Presidente da Academia Brasileira de Filologia e da Sociedade Brasileira de Lngua e Literatura Leodegrio A. de Azevedo Filho Diretor do Instituto de Letras Cludio Cezar Henriques COMISSO EDITORIAL lvaro de S Ams Coelho da Silva Marina Machado Rodrigues Editor: Paulo Frana EDITORA GORA DA ILHA TEL.FAX: 0XX 21 - 393-4212 [email protected]

Sumrio PARTE I CONFERNCIAS...................................................................... .................13 Lngua, poesia e msica em Ceclia Meireles...................................15 Albano Martins (Universidade Fernando Pessoa, Portugal) Questes de globalizao e lusofonia.................................................. 21 Anna Hatherly (Universidade de Lisboa, Portugal) D. Francisco Manuel de Melo no Teatro da Lngua Portuguesa.......33 Evelina Verdelho (Universidade de Coimbra, Portugal) Da construo lingstica da identidade. Um estudo de caso...............61 Joo Nuno Paixo Corra Cardoso (Universidade de Coimbra, Portugal) Sintaxe camoniana: Na qual quando imagina. ...................................73

Jorge Morais Barbosa (Universidade de Coimbra, Portugal) Os estudos vicentinos: balano e perspectivas..................................... .81 Jos Augusto Cardoso Bernardes (Universidade de Coimbra, Portugal) Emdefesa da Lngua Portuguesa..................................................... ....91 Leodegrio A. de Azevedo Filho (UERJ e UFRJ) A Lusitania liberata ou A Restaurao portuguesa em imagens .....95 Lilian Pestre de Almeida (Universidade Independente, Lisboa) A Lngua Espanhola e a sua funo na obra catequtica no Brasil.....111 Nicols Extremera Tapia (Universidade de Granada) O primitivismo literrio de influncia brasileira na poesia de Angola.......................................................................... ..........................133 Salvato Trigo (Universidade Fernando Pessoa)

O lxico arcaico na histria da Lngua Portuguesa...........................143 Telmo Verdelho (Universidade de Aveiro, Portugal) Traduo literria e comunicao cultural: o Portugus do Brasil em Espanha......................................................................... .........................149 Xos Manuel Dasilva Fernndez (Universidade de Vigo, Espanha)

BRASIL PARTE II

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COMUNICAES ESPECIAIS...................................167 Anlise contrastiva da variedade da Lngua Portuguesa no Brasil e em Portugal..................................................................... .....................169 Alessandra Dias Gervasoni (Universidade de Assis, SP) Jos de Alencar e a lngua nacional................................................. ...177 Ana Lcia de Sousa Henriques (UERJ) Duarte Nunes do Lio e a saudade do latim.......................................18 5 Antnio Martins de Araujo (ABF e UFRJ) Lngua e Histria do Brasil seiscentista em um manuscrito lusitano ................................................................................ .................................197 Carla da Penha Bernardo (UFRJ) Os utenslios de cozinha: portugus europeu do sc. XVI em confronto com o portugus do Brasil no sc. atual............................................. .207 Celina Mrcia Abbade (UNEB/PPGL - UNBa) uma Lngua Portuguesa, com certeza............................................217 Cladio Cezar Henriques (ABF e UERJ) Qual a lngua brasileira Darclia Simes (UERJ) A defesa da f no plpito transdisciplinar.......................................... ..227 Geysa Silva (UFJF) A indeterminao do sujeito no falar culto do Rio de Janeiro...........235 Hilma Ranauro (ABF e UFF) As linguagens de Fernando Pessoa e Manoel de Barros................251 a se aprender na escola?.......................221

Isaac Newton Almeida Ramos Edio diplomtica de Gregrio de Matos Guerra..............................261 Jos Pereira da Silva (ABF e UERJ) Os sufixos tupitybaoutba identificados com o sufixo portugusal...267 Lus Csar Saraiva Feij (ABF e UERJ) A Lngua Portuguesa no Brasil: papel dos gramticos na sua implantao (participao em mesa-redonda)...................................................... ..271 Manuel Pinto Ribeiro (ABF e UERJ) Clarice Lispector e Maria Gabriela Ilansol: tentativas de descrever sutilezas ou como dobrar a lngua................................................. .......281 Maria de Lourdes Soares (UFRJ) Um olhar sobre O memorial do convento - Saramago, primeiro Prmio Nobel da Lngua Portuguesa........................................................ ........293 Marina Machado Rodrigues (UERJ e ABF) Tupinismos, africanismos, asiaticismos e o Dicionrio Houaiss de Lngua Portuguesa................................................................. .............303 Mauro Vilar (ABF e IAH) Confrontos entre o Tupi antigo e a Lngua Portuguesa....................317 Nataniel dos Santos Gomes (UFRJ e SUAM)

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A lngua literria do Brasil no sculo XX e sua formao.................329 Paulo Silva de Arajo (ABF e Unesa) A Lngua Portuguesa no Brasil: papel dos gramticos na sua implantao (participao em mesa-redonda)...................................................... ..341 Walmrio Macedo (ABF e USU) Lngua culta e lngua literria....................................................... .....347 Walmrio Macedo (ABF e USU) PARTE III COMUNICAES LIVRES (Resumos).........................353 Isoglossas do portugus........................................................... ............355 Afrnio da Silva Garcia (UERJ-FFP) O contorno semntico-sinttico dos adjetivos em O coruja de Alusio de Azevedo...................................................................... ........................355 Afrnio da Silva Garcia (UERJ-FFP) Intertextualidade como caracterstica da lngua literria machadiana ................................................................................ .................................355 Alexandre Marcelo Matos (UFJF) A cidade na obra de Lima Barreto e Almada Negreiros.....................356 ngela Maria Thereza Lopes (UniverCidade Univers. de S)

As figuras femininas em A gerao da utopia de Pepetela...............356 Assuno Maria Sousa e Silva (UFRJ) O sociolingista Mrio de Andrade e o problema da lngua brasileira ................................................................................ .................................357 Carlos Alexandre Victorio Gonalves (UFRJ) Histria externa do portugus do Brasil............................................3

57 Castelar de Carvalho (ABF e UFRJ) Dilogo entre tradies: uma leitura de A cartomante de Machado de Assis........................................................................... ............................357 Ceclia de Macedo Garcez (UFJF) O fim de Arsnio Goddard de Joo do Rio: o destino de um voluntarioso Cludio de S Capuano (UFRJ e CMRJ)...............................................35 8 Os caminhos da memria. Esquecer e lembrar. Uma leitura de Ba de ossos de Pedro Nava............................................................. ..................358 Cristina Ribeiro Villaa (UFJF) Texturas da narrativa de Autran Dourado......................................... ..359 Irene Jeanete L. Gilberto (Univers. Catlica de Santos) Neologismos formados por emprstimos na Lngua Portuguesa escrita contempornea do Brasil........................................................... ...........359 Isabel Aparecida S. Stamato (PG- FCL UNESP)

O portugus do Brasil: a lngua de Alencar .......................................35 9 Jorge Marques (UFRJ e CMRJ)

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A trajetria da Lngua Portuguesa na Amaznia colonial................360 Jos Ribamar Bessa (UERJ) A produtividade de alguns processos formadores de palavra na constituio do vocabulrio de pescadores artesanais.................................360 Ktia Carlos Alves/ Nelson Carlos Tavares Junior/Vanessa Sant Anna Tavares (UFRJ) Murilo Mendes e as rasuras na religiosidade....................................3 61 Mara Conceio Vieira de Oliveira (UFJF) A defesa da Lngua Portuguesa e do imprio lusitano nos primeiros gramticos e em Antnio Ferreira.................................................... ..361 Mrcia Maria de Arruda Franco (UFOP CNPq)

Jeitinho brasileiro. A expresso idiomtica no portugus do Brasil: uma contribuio para o lxico da lngua............................................361 Maria Auxiliadora Fonseca Leal (FALE UFMG)

As duas faces da cidade na prosa ficcional de Joo do Rio................362 Maringela Monsores Furtado Capuano (UERJ) A reinveno do infinito: mundos imaginados e imaginrios emA idade do serrote, de Murilo Mendes.................................................... ..........363 Maria Perla Arajo Morais (UFMG) A onomstica indgena no portugus do Brasil: confrontos lingsticos e intertnicos.................................................................... .....................363 Maria Vicentina de Paula do Amaral Dick (USP) A linguagem do poder e o poder da linguagem: Lima Barreto e a Lngua Portuguesa...................................................................... .......................364 Maurcio Pedro da Silva (USP) O (no) lugar de Portugal na formao de Murilo Mendes................364 Patrcia Riberto Lopes (UFJF) O duplo destronizado e a devorao simblica a antropofagia como reviso cannica em um conto de Rubem Fonseca..............................364

Petra Cristina Augusto (UFJF) Fatores externos na formao do lxico portugus da Amrica: os elementos indgenas e afro-negros........................................................... 365 Ruy Magalhes de Arajo (UERJ- FFP) Entre o segredo da Jurema e a perdida muiraquit: uma busca da identidade nacional........................................................................ ...............365 Tatiana Alves Soares (UFRJ) A linguagem literria machadiana e a reescritura da tradio........366 Terezinha Vnia Zimbro da Silva (UFJF) PARTE IV MINICURSOS...................................................................... ....................367 1 - Edio crtica da lrica de Cames , com as participaes de lvaro de S (ABF); Marina Machado Rodrigues (UERJ) e Xos Manuel Dasilva Fernndez (Universidade de Vigo, Espanha).....................369

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A O corpus minimum (Xos Manuel Dasilva Fernndez) Lrica de Cames: problemas afetos autoria e reconstituio textual Tentativas anteriores de estabelecimento de um corpus lrico camoniano - Metodologia concebida por Emmanuel Pereira Filho Os critrios empregados por Leodegrio A. de Azevedo Filho A crtica textual: ferramenta fundamental para o estabelecimento crtico dos textos O corpus minimum camoniano, segundo edio crtica de Leodegrio A. de Azevedo Filho. B O corpus addititium (Marina Machado Rodrigues) Conceito de corpus addititium - Critrios propostos por Leodegrio A. de Azevedo Filho Aplicao dos critrios aos textos excludos. 2 - Unidade do portugus literrio no mundo lusofnico de Portugal, Brasil e naes africanas de Lngua Portuguesa , com as participaes de Pedro Lyra (UFRJ); Carmen Lcia Tind Secco (UFRJ) e Nadi Paulo Ferreira (UERJ).

Apresentao Realizou-se, no perodo de 26 a 30 de julho de 1999, o Congresso Internacional-Brasil: 500 Anos de Lngua Portuguesa, no Instituto de Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 1 Participao de professores estrangeiros

Participaram do Congresso os seguintes professores vindos do exterior: 1.1 -Prof. Dr. Eugenio Coseriu, da Universidade de Tbingen, Alemanha, que falou sobre Lngua Portuguesa e exemplaridade brasileira ; 1.2 -Prof. Dr. Fernando Alves Cristvo, da Universidade de Lisboa, Portugal, que falou sobre Unidade e diversidade da Lngua Portuguesa na hora da globalizao ; 1.3 -Prof. Dr. Telmo Verdelho, da Universidade de Aveiro, Portugal, que falou sobre O portugus quinhentista ; 1.4 -Prof Dr Evelina Verdelho, da Universidade de Coimbra, Portugal, que falou sobre O portugus quinhentista ; 1.5 -Prof. Dr. Jorge Morais Barbosa, da Universidade de Coimbra, Portugal, que falou sobre O portugus quinhentista ; 1.6 -Prof. Dr. Jos Carlos Seabra Pereira, da Universidade de Coimbra, que falou sobre A redescoberta do Brasil pelo imaginrio neo-romntico ; 1.7 -Prof. Dr. Nicols Extremera Tapia, da Universidade de Granada, Espanha, foi debatedor em mesa-redonda que tratou do tema proposto pela conferencista Yonne Leite, do Museu Nacional e da UFRJ, sobre As lnguas indgenas brasileiras e a Grammatica da lingoa mais falada na costa do Brasil, do Padre Jos de Anchieta. Em outra sesso, j como conferencista, exps as suas

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concluses sobre recente investigao feita em torno da lngua dos catecismos usadas no Brasil quinhentista; 1.8 -Prof. Dr. Jos Augusto Cardoso Bernardes, da Universidade de Coimbra, Portugal, que falou sobre Os estudos vicentinos: balano e perspectivas ; 1.9 -Prof Dr Anna Hatterly, da Universidade de Lisboa, que falou sobre A questo da lusofonia ; 1.10 -Prof. Dr. Xos Manuel Dasilva Fernndez, da Universidade de Vigo, Galiza, que falou sobre Traduo literria e comunicao cultural: o portugus do Brasil na Espanha ; 1.11 -Prof. Dr. Albano Martins, da Universidade Fernando Pessoa, Porto, Portugal, que falou sobre a Lngua, poesia e msica em Ceclia Meireles ; 1.12 -Prof. Dr. Salvato Trigo, da Universidade Fernando Pessoa, Porto, Portugal, que falou sobre O portugus em frica ; 1.13 -Prof. Dr. Joo Nuno Paixo Corra Cardoso, da Universidade de Coimbra, Portugal, que falou sobre A construo lingstica da identidade 2 Participao de professores brasileiros Em seguida, relacionaremos a participao de professores brasileiros, indicando temas de conferncias e mesas-redondas: 2.1 - Conferncia sobre a Lngua histrica portuguesa e exemplaridade brasileira com as participaes de Cilene da Cunha Pereira (ABF e UFRJ), Castelar de Carvalho (ABF e UFRJ) e Evanildo Bechara (ABF e UERJ); 2.2 - Conferncia sobre As lnguas indgenas brasileiras e a Grammatica da lingoa mais usada na costa do Brasil, do padre Jos de Anchieta , de Yonne Leite (do Museu Nacional e da UFRJ), com a participao de Ricardo Cavaliere (ABF e UFF); 2.3 - Mesa-Redonda sobre A contribuio das lnguas indgenas e africanas para o enriquecimento do lxico do portugus do Brasil com as participaes de Horcio Rolim de Freitas (ABF e UERJ), Lus Csar Saraiva Feij (ABF e UERJ) e Mauro Vilar (IAH); 2.4 -Conferncias sobre A Lngua Portuguesa no Brasil: papel dos gramticos na sua implantao com as participaes de Evanildo Bechara (ABF e UERJ), Manuel Pinto Ribeiro (ABF e UERJ) e Walmrio Macedo (ABF e USU);

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2.5 -Mesa-Redonda sobre A formao da lngua literria no Brasil com as participaes de Domcio Proena Filho (ABF e UFF), Gilberto Mendona Teles (ABF e PUC) e Ildsio Tavares (UFBa); 2.6 - Conferncia sobre Traduo literria e comunicao cultural: o portugus do Brasil na Espanha , com as participaes de Helena Ferreira (UFRJ), Maria Lcia Arago (UFRJ), Ivany Lessa Baptista de Oliveira (SBLL) e Maria Leny H.S. de Almeida (UERJ); 2.7 - Mesa-Redonda sobre O portugus do Brasil - sua implantao e sua oficializao como lngua nacional , com as participaes de Cladio Cezar Henriques (ABF e UERJ), Andr Valente (UERJ), Jos Carlos Azeredo (UERJ) e Darclia Simes (UERJ); 2.8 - Conferncia sobre Palavra de poeta Cabo Verde e Angola proferida pela escritora e jornalista Denira Rozrio; 2.9 - Conferncia sobre Escrevendo ainda em Latim no sc.XVII e defendendo Portugal por imagem , proferida por Llian Pestre de Almeida (Lisboa, Portugal); 2.10 - Conferncia sobre Unidade e diversidade da Lngua Portuguesa na hora da globalizao , com as participaes de Eneida Monteiro Bonfim (ABF e PUC); Horcio Rolim de Freitas (ABF e UERJ) e Rosalvo do Vale (ABF e UFF); 2.11 -Mesa-Redonda sobre A lngua literria moderna com as participaes de Dalma Nascimento (UFRJ); Marcus Accioly (UFPe) e Pedro Lyra (UFRJ); 2.12 -Conferncia sobre Em defesa da Lngua Portuguesa , por Leodegrio A. de Azevedo Filho. Minicursos 1 - Edio crtica da lrica de Cames , com as participaesde lvaro de S (ABF); Marina rigues (UERJ) e Xos Manuel Dasilva Fernndez (Universidade de Vigo, Espanha); 2 - Unidade do portugus literrio no mundo lusofnico de Portugal, Brasil e Naes Africanas de Lngua Portuguesa , com as participaes de Pedro Lyra (UFRJ); Carmen Lcia Tind Secco (UFRJ) e Nadi Paulo Ferreira (UERJ). Em sntese, o Congresso ps em discusso, de um lado, o problema do transplante e da implantao do portugus como lngua nacional do Brasil, analisando o uso da lngua geral no sc. XVI e o gradativo triunfo da Lngua Portuguesa atravs do bilingismo

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do sc. XVII e da sua definitiva implantao no sc. XVIII. A partir do sc. XIX, a elite intelectual brasileira assumiu como dela a Lngua Portuguesa, surgindo ento vrias polmicas entre portugueses e brasileiros. Conclusivamente, a lngua a mesma enquanto sistema, apresentando naturais variaes de norma e uso, no apenas entre Portugal e Brasil, mas em todo o mundo lusofnico. De outro lado, o Congresso analisou a formao da lngua literria no Brasil, desde o sc. XVI, quando a obra de Anchieta se incluiu dentro dos postulados da esttica jesutica, recebendo os influxos ideolgicos do Conclio de Trento, em sua expresso pr-barroca. No sc. XVII, com Gregrio de Matos e Vieira, o Barroco atingiu a sua plenitude, estendendo-se ainda pelo sc. XVIII, em que floresceu o Arcadismo com os poetas do grupo mineiro. No sc. XIX, a lngua literria do Brasil estava plenamente constituda, como se pode ver nas obras literrias dos romnticos, realistas e simbolistas. Afinal, no sc. XX, a partir da Semana de Arte Moderna de 22, a literatura brasileira tornou-se uma das mais expressivas do mundo lusofnico. Com a publicao das Atas do Congresso, que sero enviadas aos rgos patrocinadores, melhor se poder avaliar a qualificao cientfica das conferncias proferidas e dos temas discutidos em mesas-redondas e em sesses de Comunicaes livres. Em anexo, remetemos ainda a programao das sesses de Comunicaes, indicando os nomes dos participantes e os temas das mesmas, com a observao de que tambm sero selecionadas e inseridas nas Atas, ampliando-se assim os benefcios culturais do Congresso Internacional Brasil: 500 Anos de Lngua Portuguesa. Por fim, de acordo com o Regulamento do Congresso, por todos aprovado, aqui se publicam apenas os textos entregues Comisso Organizadora, com disquetes, dentro do prazo estabelecido. Leodegrio A. de Azevedo Filho Presidente

Parte I Conferncias

Lngua, poesia e msica em Ceclia Meireles Albano Martins .............................. palavras, que estranha potncia, a vossa! Ceclia Meireles, Romanceiro da Inconfidncia H um poema de Ceclia Meireles que me persegue h cinqenta anos. Vem no seu livro Viagem, de 1939, e os seus quatro primeiros versos dizem assim: Pus o meu sonho num navio e o navio em cima do mar; -depois, abri o mar com as mos, para o meu sonho naufragar. Porque me persegue ele, o poema? No sei. Tenho-o no ouvido, onde ressoa em surdina, e sei, isso sim, que l ir continuar, fazendo companhia a outros que ali um dia tambm entraram, para no mais sair. Este, por exemplo: Senhora, partem to tristes meus olhos por vs, meu bem, que nunca to tristes vistes outros nenhuns por ningum. Ao seu poema chamou Ceclia Cano . Este, cujo mote acabo de evocar, uma cantiga , e o seu autor, Joo Roiz de

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Castelo Branco, um dos poetas recolhidos por Garcia de Resende no seu Cancioneiro Geral, l por alturas de Quinhentos, quando a Lngua Portuguesa atravessava os mares, levada no bojo das naus dos navios , como o sonho de Ceclia. Mas se a este, por vontade do poeta, o engoliram as ondas entreabertas por suas mos, a lngua, essa, aportou aqui triunfante, bebeu o sumo dos frutos tropicais, mergulhou razes no hmus estuante de seiva, tornouse vaga msica , abriu as vogais, suavizou as consoantes, fez-se imperatriz na toada dolente do chorinho, congonha no bule dos dias iguais, vinho anestesiante das noites clidas do luar sertanejo, grito de Ipiranga, rosa e ametista. dessa vaga msica , dessa suavidade, desse vinho perturbante, do perfume dessa rosa e do brilho dessa ametista que feita a poesia de Ceclia, que so feitas as suas canes ttulo de um sem nmero de poemas avulsos e de um emblemtico livro seu. E esta palavra cano , a que os tempos da demanda petrarquista haviam de emprestar novas feies, novos ritmos, novos contedos e respirao mais dilatada, logo remete para as origens da lngua literria, para a jubilosa atmosfera das flores do verde pino ou para as ondas do mar de Vigo , a que o poeta de Mar Absoluto sempre se manter ligado pelo ritmo escandido dos seus versos brandos. Cano, e canto, e msica interligados num novelo de rimas, de ritmos e de sons, ora vindos do corpo redondo dos alades, ora do afilado perfil das flautas, ora dos cravos e das clarinetas que por ali andam urdindo a sua teia sonora, num compasso de valsa lenta e suavssimos adgios. essa a lngua primeva de Ceclia: a dos Cancioneiros. Os medievais, os das cantigas de amigo e de amor, e o de Garcia de Resende. Mas tambm a do romanceiro popular portugus, como claramente deixam perceber o seu Romanceiro da Inconfidncia e alguns romances ou rimances que tambm escreveu e avulsamente publicou. Volto ao poema. Para dizer que sei, afinal, donde vem o seu fascnio. Vem do ritmo, do seu compasso lento, das cesuras e, tambm, dos seus timbres voclicos. Diz Amorim de Carvalho, no seu Tratado de Versificao Portuguesa, que o octosslabo (e octosslabos so os versos do poema de Ceclia) tem uma toada prpria lnguida, mole, vagarosa e dolente ; que os seus acentos rtmicos recaem, umas vezes, na 4 e 8 slabas; outras, na 2, 4, 6 e 8, caso em que o seu andamento se torna mais vagaroso. No conheceu Amorim de Carvalho o poema de Ceclia. Conhecendo-o, teria emendado a

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afirmao, ou t-la-ia completado, ao menos, acrescentando que a norma por si enunciada pode admitir desvios, aceitar variantes. Repare-se no segundo verso: e o navio em cima do mar . Aqui, as tnicas dominantes so a 3, 5 e 8 slabas. E h, no mesmo poema, um verso este: colore as areias desertas em que eles, os acentos rtmicos, recaem na 2, na 5 e na 8 slabas. Donde se infere que o maior vagar e dolncia do octosslabo podem tambm resultar da sua maior variedade rtmica. Como naquele verso nem sfico nem herico de Camilo Pessanha aridez de sucessivos desertos , cuja acentuao (com as tnicas dominantes na 3 e 7 slabas) se furta visivelmente s normas estabelecidas pelos tratadistas para o verso decassilbico. Veja-se como, com tais acentos, ambos os versos ondulam. O de Ceclia: lo rei ser co re ( as a as de ( tas ) ( -/ -/ -/ ) O de Pessanha: dez ssi ser ari de suce vos de (tos) ( -/ -/ -/ ) No primeiro, o ritmo imbico volve-se em dactlico por excelncia. E tambm dactlico, no essencial, o verso de Camilo Pessanha, onde a introduo do pon IV no segundo p ( -) parece dilatar ad infinitum a extenso (a aridez) dos sucessivos desertos . E esta a prova mais uma, e prova bastante de que, em matria de poesia, so os poetas quem, em definitivo, estabelece as normas, no os tratadistas. Mas falei dos timbres. que tambm eles concorrem decisivamente para a msica apetecida que os versos engendram. A os temos: a tnica final do primeiro verso, que contm a vogal fechada i ( Pus o meu sonho num navio ) ecoa duas vezes no segundo ( e o navio em cima do mar ) e tambm no terceiro ( depois, abri o mar com as mos ). As rimas em i (neste caso, internas) so, como sabido, uma constante nas cantigas de amigo ( Ai flores, ai flores do verde pino, / se sabedes novas do meu amigo... ; Ondas do mar de

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Vigo, / se vistes meu amigo... ), onde alternam, como tambm sabido e notrio, com as rimas em a. A as temos, na primeira quadra do poema de Ceclia, onde o substantivo mar, do final do segundo verso, entra em consonncia com o infinito naufragar, do quarto. E, como se tal no bastasse, o mar do segundo verso recuperado no terceiro, numa espcie de leixa-pren, e a sua vogal repercute-se, como um eco, na palavra gua , sempre sabiamente colocada a meio dos versos ( debaixo da guavai morrendo ; praia lisa, guas ordenadas ), l onde o tom sobe ou se encrespa, como a crista duma onda, que logo se quebra, desamparada, nas areias desertas . E de leixa-pren poderamos falar ainda a propsito de navio e sonho, que so, juntamente com mar, as palavras-chave da semntica do poema. Navio e sonho que, em repetidas variaes sobre o mesmo tema, como leit-motiv ou em jeito de estribilho, reaparecero em outros, vrios, momentos do poema. Antes que o navio chegue ao fundo e o sonho desaparea . As rimas em i e em a, dizamos. E so elas que de novo irrompem em pontos fulcrais do poema. As primeiras, nesta quadra, situada a meio: O vento vem vindo de longe, a noite se curva de frio; debaixo da gua vai morrendo meu sonho, dentro de um navio. As segundas, no seu remate: Depois tudo estar perfeito: praia lisa, guas ordenadas, meus olhos secos como pedras e as minhas duas mos quebradas. Entre parnteses, faria notar que so as rimas em i que do o timbre mais saliente cantiga de Joo Roiz de Castelo Branco atrs aludida, e as rimas em a as mais constantes no romanceiro popular portugus. Quem no se lembra do incio da Nau Catrineta ?: L vem a nau catrineta, que tem muito que contar. Ouvi agora, senhores, uma histria de pasmar.

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Poesia em mi, em si, em f e em l, isto , poesia e msica harmonizadas na escrita rendilhada de Ceclia Meireles. Msica de clavicrdio, instrumento antigo, e de harpa elica ( O vento vem vindo de longe, / a noite se curva de frio... note-se a exploso das fricativas, a sugerir o continuado sussurro da aragem). Ou, se preferirem, a lngua elevada sua mais alta expresso musical. Ter sido a conscincia de tais valores os valores musicais da lngua -, tanto como a da sua irresistvel energia comunicativa, que levou Ceclia a escrever, no Romance LIII ou das palavras areas , do seu Romanceiro da Inconfidncia: ................................. palavras, que estranha potncia a vossa! Todo o sentido da vida principia vossa porta; o mel do amor cristaliza seu perfume em vossa rosa; sois o sonho e sois a audcia... Palavras. Sonho e rosa. Uma rosa de slabas areas , perfumadas. Uma cano. Todo o canto e toda a msica no timbre de algumas vogais. Do i, sobretudo. Porque em i que o mel do amor cristaliza . Porque l, no amor, que o sentido da vida principia . E eis como, deste modo, a frase do Gnesis Ao princpio era o verbo ganha novo significado. Este: ao princpio era o i. O i de Ceclia. O i de poesia. E, enfim, o i de Brasil.

Questes de globalizao e lusofonia Ana Hatherly, da Universidade Nova de Lisboa. Em primeiro lugar, desejo expressar a minha satisfao por me encontrar mais uma vez nesta cidade maravilhosa que sempre me encantou e onde sempre fui tratada com tanto carinho. Agradeo ao meu querido amigo Leodegrio de Azevedo Filho e aos organizadores deste Congresso o convite para estar aqui convosco. Apesar de a Lingstica no ser a rea da minha especialidade, esta no a primeira vez que me encontro no meio de mestres da Lingstica: lembro-me bem de ter participado no 1 Congresso de Lingstica que, em 1979, se realizou em Joo Pessoa, e que foi para mim um Encontro a muitos ttulos memorvel. Vinte anos depois, aqui estou, novamente num Congresso de Lingstica, mas como sou apenas escritora e professora de literatura, vo-me perdoar se, no meu pequeno texto, eu ficar dentro do meu terreno, tanto mais que a literatura, que uma das reas privilegiadas de funcionamento duma lngua, me permite abordar a questo da lusofonia, que aonde eu quero chegar. Recentemente, no passado ms de Junho, estive em Varsvia, para participar no 66 Congresso do P.E.N. Club Internacional, que este ano se realizou na Polnia. O tema do Congresso era Farewell to the XXth Century uma despedida do sculo mas o sub-tema que mais se debatia era o problema da globalizao, que, sendo na origem, de ordem econmica na Europa, mas tambm em todo o mundo, se projecta duramente na rea da cultura. O conceito de global village prenunciado por Marshall Macluhan h mais de duas dcadas, comea agora a tomar forma de um modo generalizado. Devo dizer que alm de ser membro da direco do P.E.N.

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500 ANOS DE LNGUA PORTUGUESA muito que tambm sou membro da direco direitos lingsticos no P.E.N. Club Internacional, ligao com as questes lingsticas tem do meu interesse.

Club Portugus, h do pelouro para os e por isso a minha sido uma das reas

Voltando ao Congresso de Varsvia, o que preocupava os congressistas do P.E.N Club, europeus, americanos do norte e do sul, africanos e asiticos, uma vez que se tratava de uma representao de intelectuais de todo o mundo, o que os preocupava estava equacionado nos dois temas que foram propostos para debate e eram os seguintes: 1 - Quais os efeitos da globalizao ante a singularidade do escritor? 2 - Qual o papel do escritor no prximo milnio? Estes dois temas j haviam sido discutidos num Encontro Internacional de Escritores do P.E.N. que se realizara em Bled, na Yugoslvia, no ms de Maio. O que se passou em Varsvia, foi, portanto, um prolongamento desse debate. Eu no estive nesse encontro de Bled, mas li atentamente as Actas e, quando chegou minha vez de entrar no debate em Varsvia, apresentei um texto de que vos darei aqui uma breve smula. Assim, voltando questo inicial da globalizao que tanto preocupa os intelectuais, especialmente os de pases de lnguas minoritrias que, em geral, correspondem a economias deficitrias ou em desenvolvimento, o que se pde concluir destes debates foi que o processo de globalizao, que agora ameaa as erradamente chamadas pequenas literaturas nacionais , que representam por vezes, culturas longamente individualizadas, esse processo h muito que tem estado em discusso porque, agora como antes, o que verdadeiramente est em questo o problema da sobrevivncia: sobrevivncia duma individualidade, sobrevivncia duma ideia de cultura, sobrevivncia do todo um mundo de expresso e criatividade prpria, num contexto em que o domnio duma fora econmica, a que agora chamamos globalizao, uma velha ameaa. O que mudou que essa ameaa atinge agora mesmo pases e culturas secularmente importantes que, hoje em dia, em termos de nmeros de falantes, se encontram de repente no nmero das lnguas minoritrias, como exemplo, a Alemanha. Quanto necessidade de afirmao de singularidade por parte do escritor, agora mais do que nunca confrontado com o processo de globalizao, esse confronto estende-se agudamente s litera

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turas e s culturas nacionais, e a das em lnguas minoritrias, confrontadas com os padres de consumo das reas culturalmente dominantes. Perante esta situao que, na Europa e no mundo, diz respeito a um grande nmero de pases com culturas tradicionais com sculos de existncia, quesurgiram vrias perturbantes perguntas, como por exemplo: 1) - Poder acaso o romntico conceito de escritor como out-sider, ou a defesa de uma cultura marginal, sobreviver num mundo dominado pelo processo de globalizao, a qual, para citar uma definio oferecida pela Internet, que aqui traduzo, um meio para se atingir altos nveis de produtividade, eficincia e segurana, penetrando as foras do mercado e os ciclos econmicos escala mundial ? 2) - Poder acaso o velho conceito de literatura como mercadoria espiritual (ou Ropicapnefma segundo lhe chamou Joo de Barros no sculo XVI) poder acaso esse velho conceito sobreviver num mundo dominado pelos interesses econmicos que fazem dos assuntos culturais uma indstria como qualquer outra? 3) - Qual o lugar do talento individual num contexto que tende a nivelar as diferenas, tantas vezes pelo baixo, submetendo tudo aos padres ditados pelos valores das sociedades antes dominantes e suas dominantes lnguas? A estas prementes questes as tentativas de resposta geraram logo debates, que aqui no tenho tempo de relatar, mas que poderemos aqui re-iniciar, se for vosso desejo.O que posso informar que, dos importantes debates que ocorreram tanto em Bled como em Varsvia, uma das principais concluses a que se chegou foi que, curiosamente, ou talvez significativamente, aquilo a que o processo de globalizao em curso tem dado origem, nos pases e nas culturas de lnguas minoritrias mais atentos, uma intensificao das diferenas culturais, literrias e lingsticas que reafirmam ou pelo menos tentam reafirmar uma diferenciao, surgindo essa diferenciao como a resposta natural ameaa da normalizao, da standardizao, do nivelamento das culturas personalizadas, que pem em perigo a diversidade, que uma regra natural do processo de sobrevivncia. Quando, nesse debate internacional, chegou a minha vez de falar, o exemplo que eu dei, como no podia deixar do ser, foi precisamente o da lusofonia.

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Como todos sabem, sendo a Lngua Portuguesa uma lngua minoritria na Europa, escala mundial uma lngua com um importante nmero de falantes, mas isso s acontece no conjunto da lusofonia, que se caracteriza, precisamente, pela afirmao duma convivncia apoiada numa diferenciao harmoniosa. Esse o prodgio (talvez momentneo) que se verifica no mundo da Lngua Portuguesa, e que evidencia a enorme ductibilidade dum idioma em que diferentes culturas se apoiam para se afirmarem individualmente, constituindo uma experincia multicultural em que as diferenas, at agora, tm sido uma vantagem, e no uma desvantagem. Esse o prodgio da lusofonia que, perante a ameaa de globalizao, consegue manter uma forma de coexistncia das diferenas num harmonioso plural, num todo sinfnico, em que o talento individual e as culturas individuais contribuem umas para as outras sem se contradizerem. E se, como j tem sido dito, a literatura surge como o local da plenitude da lngua, e no a literatura da lusofonia, explorando na simultaneidade o mundo da diferena, no seu conjunto ser uma ilustrativa manifestao do alcance da criatividade individual num conjunto de pluralidades. E ento pergunto: 1) No ser acaso tarefa do pensamento criador tentar a exploraodo mundo da diferena? 2) A criatividade, a todos os nveis, no ser acaso a expresso duma procura da secreta relao que existe entre o homem e o mundo, destinada a promover imaginativamente a compreenso do outro? O exemplo da lusofonia surge, assim, como algo que se atinge atravs duma compreenso da unidade superior da lngua portuguesa, que poder transformar-se em uma ponte eterna sobre a corrente dos sculos, como tem sido uma ponte sobre a vastido do oceano. 1 Dois exemplos recentes da harmoniosa expresso da lusofonia: para alm da arreigada competncia e dedicao com que no Brasil se estudam os autores portugueses, quero assinalar aqui a recentssima edio da Antologia da poesia portuguesa contempornea, organizada por Alberto da Costa e Silva e Alexei Bueno, que inclui dezenas de poetas.2 Tambm recentemente, em Maio, mas em Portugal, realizouse em Sintra a II Festa da Lngua Portuguesa, um encontro de

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poetas da lusofonia, vindos de Angola, Brasil, Cabo Verde, GuinBissau, Moambique, Portugal e So Tom e Prncipe. 3 Da participao desses poetas surgiu uma Antologia intitulada Vozes poticas da Lusofonia4 que uma verdadeira sinfonia de vozes em que as diferenas constituem a sua riqueza, a sua beleza, a sua fora individual enriquecida pela convivncia. Para ilustrar esta afirmao vou ler alguns dos poemas includos nessa Antologia, que merece um estudo atento porque o que ela exemplifica uma amostragem de talentos individuais que independem da origem dos seus autores. Desta coletnea de talentos e vozes individuais est excludo o folklore, a explorao mais ou menos primria de realidades culturais distintas. O que a domina o mundo da lngua ao servio da expresso individual ainda que no esteja isenta de ideologia. O que importa que cada um se sentiu livre para se exprimir e para utilizar uma lngua comum como veculo de afirmao personalizada. Consideremos, portanto, alguns exemplos da criatividade lusofnica numa feliz convivncia dentro do mbito da poesia contempornea. Homo angolensis Mastiga a prpria desgraa com ela improvisa uma farra precisa de uma boa maka como do ar para respirar acha o mundo demasiado pequeno pr seu corao ri toa fornica por disciplina revolucionria jura que um dia ser potncia gosta de funje todos os sbados e foge do trabalho na segunda mas fica limo quando lhe querem abusar Angola: Joo Melo, p.17

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O nmero quatro O nmero quatro feito coisa ou a coisa pelo quatro quadrada, seja espao, quadrpede, mesa, est racional em suas patas; est plantada, margem e acima de tudo o que tentar abal-la, imvel ao vento, terremotos, no mar mar ou no mar ressaca. S o tempo que ama o mpar instvel pode contra essa coisa ao pass-la: mas a roda, criatura do tempo, uma coisa em quatro, desgastada. Brasil: Joo Cabral de Melo Neto, p. 78 Ser tigre O tigre ignora a liberdade do salto, como se uma mola o compelisse a pular. Entre o cio e a cpula, o tigre no ama. Ele busca a fmea como quem procura comida. Sem tempo na alma, no presente que o tigre existe. Nenhuma voz lhe fala da morte. O tigre, j velho, dorme e passa. Cabo Verde: Armnio Vieira, p.116

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Imerecimento Adormeo Na luz dos teus olhos vejo Veneza que no conheo Ondulo num crculo de ondas de levitao Confesso: no mereo a ternura da gndola acariciando as guas onda a onda Guin-Bissau: Tony Tcheka, p. 133 O nosso medo Agora a memria vasculha os quatro cantos da cidade e encasacados os ex-amigos rastejam emaranhados nas razes subterrneas do seu medo e geis as suas mos embraiam reluzentes besoiros que dilaceram as estradas bebendo sequiosos o sangue dos ventos. Vasculha as ruas de ponta a ponta a memria

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laboriosa como um insecto e se h mais do que eu digo tambm o meu medo encasacado instiga-me ao segredo. Moambique: Jos Craveirinha, p.157 L no gua Grande L no gua Grande a caminho da roa negritas batem que batem co a roupa na pedra. Batem e cantam modinhas da terra. Cantam e riem em riso de mofa histrias contadas, arrastadas pelo vento. Riem alto de rijo, com a roupa na pedra e pem de branco a roupa lavada. As crianas brincam e a gua canta. Brincam na gua felizes... Velam no capim um negrito pequenino. E os gemidos cantados das negritas l do rio ficam mudos l na hora do regresso... Jazem quedos no regresso para a roa. S. Tom e Prncipe: Alda do Esprito Santo, p. 239 O sal da lngua Escuta, escuta: tenho ainda uma coisa a dizer. No importante, eu sei, no vai salvar o mundo, no mudar a vida de ningum - mas quem

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hoje capaz de salvar o mundo ou apenas mudar o sentido da vida a algum? Escuta-me, no te demoro. coisa pouca, como a chuvinha que vem vindo devagar. So trs, quatro palavras, pouco mais. Palavras que te quero confiar. Para que no se extinga o seu lume o seu lume breve. Palavras que muito amei, que talvez ame ainda. Elas so a casa, o sal da lngua. Portugal: Eugnio de Andrade, p. 195 A fala Sou de uma Europa de periferia na minha lngua h o estilo manuelino cada verso uma outra geografia aqui vai-se a Cames e um destino. Velas veleiro vento. E o que se ouvia era sempre na fala o mar e o signo. Gramtica de sal e maresia na minha lngua h um marulhar contnuo. H nela o som do sul o tom da viagem. O azul. O fogo de Santelmo e a tromba de gua. E tambm sol. E tamb sombra. Versna minha lngua a outra margem. Os smbolos os ritmos os sinais. E Europa que no mais Mestre no mais. Portugal: Manuel Alegre, p. 209

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Estou aqui Brasil terra maravilhosa onde cresce a fruta mais gostosa Quero comer quero beber gua de coco quero provar fruta de caj caju capua goiaba abacate abacaxi aruas aracs jo cambois mamo mangava macuj mangar maracuj mapurunga mandacar pitomba pitanga piqui anans umbu mandacaru oitituruba genipapo As roms rubicundas, quando abertas vista agrados so; lngua ofertas*

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Ah! H um mundo na lngua! *Manoel Botelho de Oliveira, in A ilha da Mar (1705). Notas 1 Cf. Leodegrio A. de Azevedo Filho, A lngua, portuguesa e a unidade do Brasil, Rio de Janeiro, Academia Brasileira de Filologia,1999, 2 Esta Antologia foi publicada no Rio do Janeiro, pela Editora Nova Aguilar, em 1999. 3 Infelizmente no foram includos poetas da sia nem da Oceania, onde se destaca Xanana Gusmo, de Timor, cuja poesia regularmente de antologias e recitais em Portugal. 4 Organizao do Instituto Cames, de Lisboa, Edio da Cmara Municipal de Sintra, Maio de 1999

D. Francisco Manuel de Melo no Teatro da Lngua Portuguesa Evelina Verdelho, da Universidade de Coimbra. Entre os numerosos estudos realizados sobre a personalidade e a obra valiosa, vasta e diversificada, em portugus e espanhol, de D. Francisco Manuel de Melo, contam-se alguns que incidem sobre a sua linguagem, designadamente trabalhos acadmicos que trouxeram contributos para o conhecimento do seu estilo. Essa constitui, todavia, uma rea de investigao ainda muito em aberto, a solicitar novos estudos de vria ordem. Refiro a propsito que na Universidade de Coimbra est a desenvolver-se um projecto de investigao que tem em vista organizar o corpus lexical das obras em Lngua Portuguesa do Polgrafo, tanto quanto possvel com base em edies fidedignas. Neste ensejo proponho-me focar algumas facetas deste autor manifestadas perante o idioma portugus, as quais adoptando expresso modelada pelo universo teatral, imagem do que se verificou com o prprio D. Francisco Manuel de Melo, nomeadamente no soneto Mundo he Comedia (As Musas portuguesas, p. 6), e com outros autores de Seiscentos poderei etiquetar de espectador, crtico e actor no teatro da Lngua Portuguesa. Nas suas obras, quer no discurso de autor, quer nas falas de figuras ou personagens, D. Francisco Manuel de Melo faz no raras referncias a aspectos e materiais da Lngua Portuguesa. De quando em quando, como que interrompe o fio da narrao ou da reflexo, e detm-se em vocbulos, assinalando o significado ou o uso, s vezes apontando o que se verificava no portugus de pocas anteriores, ou em outras lnguas. Entre outros casos, de que um levantamento exaustivo propiciar certamente informaes com interesse no mbito da histria da lngua, destaco que assim procede com vocbulos que designam categorias sociais, como dama,

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dona, senhora e fidalgo, em A Visita das fontes, em interveno da Fonte Velha, onde est notado que s ( ) Damas e Senhoras ( ) antigamente chamavam Donas (p. 118), e na Epanfora poltica, onde se l: Viuia por estes tempos em Lisboa hum dos nobres do Reino, de aquella ordem a quem os Portuguezes chamo: Fidalgos, com mais digna recordao que as outras nases de Espanha, sendolhes a todas vniuersal este nome, no ha muito trocado ao de Caualleiros (p. 8) (veja-se no final indicao das obras e edies citadas). Tambm palavras relativas ao comportamento lhe merecem nota, como despejo, compostura, descompostura, e outras. Na Carta de guia de casados depara-se-nos o seguinte trecho: Faz grande dano a maldita palavra que se nos pegou de Castela, a que chamam despejo, de que muitas [mulheres] se prezam. E certo que em bom Portugus, despejo descompostura (p. 140). Em A Visita das fontes, pela voz de duas figuras, Apolo e o Soldado, regista-se que ao saber misturar o despejo e a compostura, dando o seu a seu dono chamam bizarria (p. 59). Em casos como os dos vocbulos acima mencionados, em que as referncias extralingusticas constituam, no sculo XVII, matria sensvel, designadamente sob o ponto de vista moral, poltico e social, as observaes metalingusticas surgem geralmente associadas a observaes de outra natureza. Por vezes o escritor apresenta sries mais ou menos extensas de termos e de expresses, da linguagem comum e de linguagens especiais, sendo notrio que essa apresentao tem muito que ver com o comprazimento que D. Francisco Manuel de Melo encontrava nos prprios materiais lingusticos reunidos. o que sucede em Os Relgios falantes, onde aparecem, em fala do Relgio da Aldeia, os seguintes modos de dizer em que entra o vocbulo hora: em boa hora, em m hora, ide com as horas ms, vinde com as horas boas, a hora muito fermosa, nas horas de Deus, logo nessas horas, as horas perentrias, as horas sucessivas , so horas, a que horas, a desoras, fora de horas (p. 27). Em A Visita das fontes, o Polgrafo, em fala da Fonte Velha, expe no escassos termos relativos arte militar, que alis lhe deveriam ser familiares, pois prestou servio na carreira das armas durante largos anos. Veja-se: ( ) combis, brechas, aproxes, vveres, avanadas e castrametanes ( ), cornas, hornaveques, crubeques, golas, francos, lisieres, barbacs e falsas-bragas ( ) esquadres, serras, grandes fundos, grandes frontes, quadrados de

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gente e de terreno, dobretes, cruzes, cubos e prolongados ( ), arreueres, marechais-da-estala, caporal, corneta, drago, furriis, quartis-mestres, gro-preboste (p. 58). Muitos destes termos so estrangeirismos, comentando-se, aps o seu registo, ainda pela boca da Fonte Velha, que aqueles so proferidos ( ) com milhares de vozes estrangeiras que nossos pecados, alm dos costumes estrangeiros, nos trouxeram terra para sua maior corruo que defesa (pp. 58-59). Sublinho que uma compilao extraordinria de materiais lingusticos oferecida pelas Metforas, ou Feira de anexins. Nessa obra o autor apresenta, atravs de dilogos, um avultado contingente de metforas, jogos de palavras, ditos e provrbios. Segundo as palavras de Alexandre Herculano, a Feira de anexins ( ) seria quasi um manual para os escriptores dramaticos, principalmente do genero comico, que quizessem fazer falar as suas personagens com phrase conveniente, e com as graas e toque proprio da nossa lingua portugueza e do verdadeiro estylo dramatico ( ) (apud ob. cit., p.V). Conforme se v pelo que acima fica relevado, as obras de D. Francisco Manuel de Melo mostram-no como observador minucioso da Lngua Portuguesa, sensvel a aspectos como a sua riqueza, variedade, mudana e pureza, a convocar o leitor para as particularidades e preciosidades que nela detecta e colecciona, enfim, como um espectador do espectculo do idioma. O emprego da Lngua Portuguesa na escrita cuidada, por parte de poetas e prosadores, que D. Francisco Manuel de Melo menciona, objecto de alguns comentrios no Hospital das letras. A encontramos, por exemplo, a seguinte opinio expressa pela voz de Lpsio, a propsito das obras de Francisco Rodrigues Lobo: As de prosa tm perfeitssima sade; no h para que lhes pr mo, porque foi claro, engenhoso, elegante, grande corteso e no menor jardineiro da Lngua Portuguesa que tosou, poliu e cultivou como bom filho e grato repblico (p. 72). Situao semelhante verificase em algumas das missivas que subscreveu, nomeadamente nas que correspondem a solicitaes de apreciao de composies poticas. Nelas est patente que o Polgrafo analisou, a par da satisfao de requisitos especficos da Retrica e Potica, a ortografia, a pontuao e at a letra com que as composies lhe foram apresentadas. Leiam-se, por exemplo, as cartas n 109 e n 565 do volume Cartas familiares em que h alguns anos foi reunida e publicada a sua copiosa correspondncia. Naquela Sentenceando um

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certmen potico D. Francisco Manuel de Melo afirma: De muitas consideraes pende a averiguao da preferncia entre Poemas contenciosos. Parece-me se podem reducir a quatro circunstncias. A primeira: que sejam em tudo conformes ao assunto. A segunda: que guardem decoro aos sujeitos propostos. A terceira: que se apropriem ao dialtico da lngua em que se escrevem. A quarta: que observem boa ortografia (pp. 143-144). Na carta n 565 Tornando a um amigo poeta um livro de versos que lhe havia dado a ver avisa: Esta noite (e tarde) recebo os quadernos, e poderei logo dar deles alguma razo. A letra boa mas pouco castigada, e eu proluxssimo nestas meudezas. L se achar V. M. coalhado de pontos e vrgulas (pp. 539-540). Os comentrios metalingusticos de D. Francisco Manuel de Melo avultam particularmente em torno da realizao da Lngua Portuguesa na conversao. Alis, com o Polgrafo o discurso oral referenciado (e valorizado) como meio privilegiado de recolha e transmisso de certos saberes saberes tradicionais, de senso comum, de experincias de vida o que est indiciado nos seus textos, designadamente nos aplogos, por expresses como: dezia minha av (Visita, p. 37), Dezia um amo (Visita, p. 37), disseram os antigos (Visita, p. 46), disseram as nossas velhas (Carta, p. 140). Estas expresses ocorrem to frequentemente nos escritos do autor que ganham foro de trao caracterstico do seu estilo, tal como, por exemplo, os adgios. Em A Vista das fontes, numa interveno da Fonte Nova, que de resto suscita o aplauso de outro interlocutor do dilogo, Apolo, preconiza-se que as pessoas se exprimam com simplicidade e naturalidade, e censura-se a fala arrebicada que perde em clareza o que presume em subtilezas e requintes, quando aquela figura diz: No h cousa como um falar desabotoado, de sorte que as pessoas digam tudo quanto lhes faz mister sem pedir outras regras que as que lhe d a Natureza de mo comum com a necessidade, ocasio e compostura, que a todos em seu modo pertence. Mas, andar falando como quem bebe por pcaro penado ou como a histria do Calcinha, que no haveis de dizer sim nem no, um maldito costume (p. 109; trecho comentado por Giacinto Manuppella, em nota da sua edio do aplogo, pp. 576-577). Alis, a fala enfatuada, (pseudo)erudita e obscura dos poetas cultos, e a dos gramticos que se preocupavam com questes pequeninas e irrelevantes, nomeadamente certos pormenores de etimologia, so alvo de crtica em O Fidalgo aprendiz (atravs da elocuo do Mestre das Tro

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vas e dos comentrios que lhe faz D. Gil Cogominho), e, mais desenvolvida e explicitamente, na Visita. Nesta obra l-se: Pelo mesmo caso que os gramticos de contino desentranham os idiomas e fazem a varrela, e muitas varrelas, linguagem, so de contnuo os que pior falam, escrevem e conversam ( ) (p. 110; cf. tambm pp. 109 e 111). Em relao Lngua Portuguesa realizada na conversao, so sobremaneira interessantes as observaes registadas na Carta e na Visita sobre modos de tratamento, em particular os que se cumprem atravs das formas pronominais tu, vs, ele, ela, e de senhor e senhora, dom (ou) dona, merc, senhoria e excelncia. Na primeira obra, D. Francisco Manuel de Melo considera o tratamento entre marido e mulher, aconselhando alguns usos, desaconselhando outros. Veja-se: O Tu Castelhano e por mais que eles o achem carinhoso, como l dizem, palavra muito de praa e que ao mais no deve de quebrar a menagem da cmara para fora. O Vs Francs, que com um Vous receberam a mesma Rainha Sab, se c tornara. Tenho-o por demasiado vulgar. O Ele e Ela, um Ouve Senhor, Que diz Senhora, termo bem Portugus, assaz honesto e bem soante (Carta, p. 177). E continua, no esquecendo certamente a apropriao abusiva a despeito de disposies legais que regulavam o seu emprego das frmulas que menciona, por pessoas que no tinham elevado estatuto social: As Senhorias e Excelncias, a quem pertencem, gravidade induzem; mas parece um certo modo de esquivana tratar um homem sua mulher como que se o no fora. Fiquem-se para os Prncipes e Reis as Altezas e Majestades ( ) (ibidem). Na segunda obra, pela voz de Apolo, descrita pormenorizadamente a maneira como, segundo os ditames da galanteria, as damas e os seus servidores se tratavam em trs pontos ou circunstncias (que o autor no seu jeito de se deter em certas palavras explica serem tambm chamadas momentos, partes, ou ocasies, informando ainda depois que partes usado com outro significado, isto , inimigos (Visita, pp. 122 e 126). Essas circunstncias so: a conversao em lugares pblicos diante dos Reis; entre as damas que passeiam em coche e os galantes que se colocam ao lado; na cabea de motes, complexa composio potica, entretecida de perguntas e respostas. Alm disso, Apolo indica a forma de tratamento entre as damas e os seus noivos, especialmente segundo a lei do Pao, quando se acordava o casamento (Visita, pp. 122-127). Qualidades e principalmente imperfeies da prtica

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conversacional so apontadas por D. Francisco Manuel de Melo na Carta, ao expor orientaes para a vida familiar, e na Visita, ao caracterizar e caricaturar alguns tipos da sociedade portuguesa seiscentista, como letrados, militares, fidalgos, gramticos. Neste aplogo, o autor no desaproveita a oportunidade de deixar um reparo ao desvario da gente vulgar diante de palavras como porco e asno, que evitavam proferir e que no ouviam sem nojo e melindre (p. 42) considerando de caminho, por meio de Apolo, que os abusos por certo os de linguagem esto no vulgo introduzidos e se vo j nele metendo como a unha pela carne. Porque abusos e povo so como unha com carne (p. 43). Entre as qualidades da elocuo advogadas pelo Polgrafo contase, no que concerne as mulheres discretas, falar ( ) o necessrio, brando, a tempo, com tom que baste para ser ouvida da pessoa a quem fala e no das outras (Carta, p. 139). Entre as imperfeies verberadas, ainda em relao s mulheres, inclui-se falar sempre, e falar alto, nomeadamente nas igrejas (ibidem), e, no caso dos homens, a utilizao de certas expresses perifrsticas para fazer referncia s esposas. Veja-se: A cousa com que mais atentado sou uns que do em nomearem as mulheres por circunlquios, chamando-lhes ora a minha velha, a minha companheira, a minha hspeda, a minha obrigao, a me dos meus filhos, e cousas assi que, em qualquer tom que sejam ditas, parecem pouco graves e, a meu juzo, indignas de se acharem na boca de nenhum sisudo. A mulher de que o homem se preza e o homem de que a mulher se honra, por que no ho-de ser por seus nomes nomeados? Digo delas para eles outro tanto (Carta, pp. 176-177). Por quanto fica salientado, D. Francisco Manuel de Melo diferenciase do tipo do gramatico, ou seja, daqueles gramticos do seu tempo que, segundo declara na Visita pela voz da Fonte Velha, se enredavam a discutir Sobre se um tu ou um eu ( ) vem de Grcia ou de Palestina, sem que nisso v ou venha cousa alga (p. 109). Poder dizer-se que o Polgrafo se manifesta como um crtico do desempenho da Lngua Portuguesa, pois que usa de saber e sensibilidade para apreciar e julgar a prtica do idioma, opinando como deve ou no deve realizar-se, especialmente na conversao, em famlia e entre pessoas de qualidade. Tendo por base uma slida e ampla formao, adquirida nos livros e apurada nos crculos aristocrticos onde nasceu e se fez espelho de fidalguia e cortesania, com os seus comentrios, os seus reparos e as suas orientaes, configura uma arte de bem falar, em que no s a correcta e infor

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mada realizao da lngua, mas tambm a urbanidade, as convenincias de ordem social e at a moral, esto implicadas, sendo a boa conversao um dos predicados principais de quem pretendesse atingir o ideal do corteso discreto (caracterizado pelo Prof. Jos G. Herculano de Carvalho, com fundamento na anlise da Corte na aldeia de Francisco Rodrigues Lobo, no estudo Um Tipo literrio e humano do Barroco: o corteso discreto, Coimbra, 1963). de notar que, embora em vrias referncias e aluses, o modo como se exprimem as pessoas da Corte e de Lisboa aparea encarecido, em A Visita das fontes Apolo pronuncia-se pela superioridade da linguagem falada em Coimbra, ao afirmar: ( ) os Gregos dividiram seu idioma em quatro classes, das quais era mais sublime, regular e concertada a lngua dos ticos, por cair em seu distrito a Universidade de Atenas que lhe deu nome, e ao mundo todo: como se c, entre vs, dissssemos se falava mais elegante em Coimbra que em outra parte, no mentiramos, sendo ali o corao e alma das cincias que se ensinam e aprendem (p. 110). Como sabido, D. Francisco Manuel de Melo escreveu sobre matrias variadas, em diversos gneros de textos. Relanceando de corrida a sua obra, a tal respeito releva-se que, em Lngua Portuguesa, em prosa, registou factos relativos Histria em epanforas e relaes (algumas destas concernem o Brasil); que exps ensinamentos e crticas sobre costumes do tempo, em escritos de pendor pedaggico e moralizante; que tratou de mltiplos negcios pessoais e alheios, em abundante correspondncia; que elaborou discursos de circunstncia para sesses acadmicas. Em verso, alm de textos de carcter teatral, comps, entre outras formas poticas, cartas, glogas, romances, sonetos. O que importa aqui salientar que D. Francisco Manuel de Melo, em conformidade com os preceitos retricos e poticos em que foi instrudo, procurou em todos seus escritos acomodar sempre o estilo com a matria, como se declara na dedicatria aos leitores da edio de 1651 da Carta de guia de casados (p. 87), assinada pelo impressor Paulo Craesbeeck, a cujo contedo porventura no ter sido estranho o Polgrafo. No faltam de resto referncias do escritor a vrios estilos em que modalizou a sua expresso. Assim, no Prlogo do Escritrio avarento afirma que, requerendo a matria de que ia tratar um estilo excelente da sua pena j muito alheo, usou deste nosso modo familiar, amigo e inteligvel (p. 70), e de comum eloquncia (p. 71). No Hospital das letras , depois de mencionar a Carta de guia de casados

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entre as obras que elaborara, observa que se acha agora to bem com estilo corriqueiro, e que faz propsitos de no tornar ao [estilo] majestoso (p. 99). Ora, o estilo desse aplogo descansado estilo, segundo as palavras da respectiva dedicatria (p. 87) distingue-se do das Epanforas, em cuja escrita eloquente se empenhou, como se deduz de vrios passos (cf. por exemplo, pp. 354 e 481; veja-se o estudo da Prof. Maria Luclia Gonalves Pires, Epanfora trgica: viver e escrever histria , in Xadrez de palavras, Lisboa, 1996, pp. 173-185), e com nenhum deles se identifica o das oraes acadmicas, espessas de elegncias e ornatos de linguagem. Encontra-se tambm uma paleta variada de estilos, no volume das suas cartas, em que o familiar se cruza com o solene, o mesmo se podendo dizer de composies em verso que integram as Musas portuguesas, ora graves, ora jocosas. Alguns editores e comentadores da farsa O Fidalgo aprendiz consideraram que a fala da figura nuclear, D. Gil Cogominho, integra formas lingusticas populares, e que com elas D. Francisco Manuel de Melo ter pretendido sublinhar o perfil rstico da figura. Em rigor, a maior parte das formas que foram distinguidas sob tal perspectiva pertencem ao fundo comum lingustico portugus seiscentista, sendo idnticas a outras que se detectam no prprio discurso do autor, tal como documentado pelo manuscrito autgrafo de A Visita das fontes, e no so caractersticas ou exclusivas da linguagem das pessoas iletradas do povo. Algumas outras, todavia, podem ser classificadas de populares em tal acepo, como, por exemplo, -ints - e -home - ( pp. 59 e 86). Em Os relgios falantes, o Relgio da Cidade apresenta na sua fala depois (p. 11), enquanto na do seu interlocutor aldeo vemos despois -(ibidem), e -samos -, em vez de -somos -(p.13). Perante estes e outros elementos semelhantes poder admitir-se que D. Francisco Manuel de Melo teve em vista modalizar a linguagem das figuras ou personagens que tomam voz nas suas obras, em consonncia com os estatutos sociais e culturais que lhes atribuiu, mas ser necessrio, para se avanarem asseres precisas sobre este ponto, dispor-se de estudos minuciosos da linguagem do escritor, que colham fundamentao dos raros autgrafos que dele nos chegaram, onde as formas lingusticas se mostrem tal como saram da sua mo, e no eventualmente alteradas por interferncia de copistas, tipgrafos ou editores. Como quer que seja, pode dizer-se que o Polgrafo, ao pr em

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cena o nosso idioma sob as mscaras dos vrios estilos e, certamente, de vrios registos scio-culturais, perante a Lngua Portuguesa, alm de procedimentos de espectador e crtico, teve ainda o de actor. Alis, a metfora das mscaras serve para aludir ao facto de a linguagem de D. Francisco Manuel de Melo, em muitos passos, e em diversos planos, no se oferecer com transparncia fruio imediata do leitor no fillogo dos nossos dias, em consequncia de mudanas que o tempo trouxe ao idioma e s suas referncias, e de concepes e tcnicas literrias do autor, ao gosto de Seiscentos. Alis, j em vida, segundo uma vez mais a dedicatria do impressor de 1561 da Carta de guia de casados, foi - reprendido de misterioso (ou talvez de escuro) -(p. 87). Desde logo a (orto)grafia seiscentista, com que os textos foram transmitidos por manuscritos e impressos, motiva dificuldades de interpretao, de que destaco as que concernem o valor fnico de grafemas actualmente desusados, o valor semntico-estilstico das maisculas, e as funes da pontuao. O significado preciso de muitos dos vocbulos que ocorrem nas suas obras hoje de problemtica apreenso, havendo numerosos termos que, empregados ou no por outros autores, no recebem esclarecimento de dicionrios ou vocabulrios antigos, em que no tiveram entrada ou foram insuficientemente tratados. Alm disso, interessando-se o Polgrafo por uma arte potica -rara e requintada -, dirigida a leitores no vulgares como exps, detida e fundamentadamente, a Prof. Maria Luclia Gonalves Pires, em As Ideias literrias de D. Francisco Manuel de Melo , in Xadrez de palavras, Lisboa, 1996, pp. 41-52 cultivou com assiduidade processos de estilo, como elaboradas metforas e subtis jogos de palavras, que conferem alguma opacidade sua expresso. Esperemos que D. Francisco Manuel de Melo, graas leitura persistente e acurada da sua obra, no venha a ser uma personagem esquecida, a assistir na obscuridade do -vesturio - a -tramias - do teatro da nossa lngua. At porque, alm de se nos apresentar como espectador, crtico e actor do espectculo do idioma, nele alcanou o estatuto de autoridade. Este, porm, tem de ficar como tema para outra visita s suas letras.

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Notas bibliogrficas Obras e edies citadas de D. Francisco Manuel de Melo Carta de guia de casados. Quadros cronolgicos, Introduo, bibliografia selectiva, fixao do texto e notas de Pedro Serra. Braga-Coimbra, Angelus Novus, 1996. Cartas familiares. Prefcio e notas de Maria da Conceio Morais Sarmento. Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1981. Epanforas de vria histria portuguesa (Epanfora poltica, Epanfora trgica, Epanfora amorosa , Epanfora blica, Epanfora triunfante). Introduo e apndice documental por Joel Serro. Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, s. d. (reproduo fac-similada da ed. de 1660). Escritrio avarento. In Os relgios falantes e Escritrio avarento. Edio crtica de Maria Judite Fernandes de Miranda. Coimbra, 1968. Separata da Revista da Universidade de Coimbra, vols. XX-XXI. Ocupa as pp. 69-117. Feira dos anexins. Edio dirigida e revista por Inocncio Francisco da Silva. Lisboa, Livraria A. M. Pereira, 1875. O Fidalgo aprendiz. Texto estabelecido, introduo e notas de Antnio Corra de Oliveira. 2 edio, Lisboa, Livraria Clssica Editora, 1958. Hospital das letras. In Jean Coloms, Le Dialogue Hospital das letras de D. Francisco Manuel de Melo. Texte tabli d aprs l dition princeps et les manuscrits, variantes et notes par . Paris, Fundao Calouste Gulbenkian, Centro Cultural Portugus, 1970. Metforas, ou Feira de anexins. Ver Feira dos anexins. As Musas portuguesas (ou As Segundas trs musas do Melodino). In Obras mtricas. Lyon, Horacio Boessat e George Remeus, 1665. Com paginao prpria. Os relgios falantes. In Aplogos dialogais, vol. I, Introduo, fixao do texto e notas de Pedro Serra. Braga, Angelus Novus, 1998, pp. 1-31. A visita das fontes. In Aplogos dialogais, vol. I, Introduo, fixao do texto e notas de Pedro Serra. Braga, Angelus Novus, 1998, pp. 33-127. Tambm reenviamos para nota da edio preparada por Giacinto Manuppella, Coimbra, Por Ordem da Universidade, 1962.

Diversidade e unidade da lngua na hora da globalizao Fernando Alves Cristvo, da Universidade Clssica de Lisboa. O tema que me foi proposto, relativo unidade e diversidade da Lngua Portuguesa, aceitei-o de muito bom grado, pois a esta e outras questes afins tenho dedicado boa parte do meu percurso acadmico. Proponho-me trat-lo reflectindo sobre a incidncia nas lnguas, dos fenmenos culturais e sociais que no nosso sculo condicionaram e condicionam a Lngua Portuguesa, nomeadamente o modernssimo fenmeno da globalizao. Todos sabemos como foi necessrio no Brasil, desde Jos de Alencar e Carlos de Laert, em especial, reivindicarem contra Castilho, Pinheiro Chagas e Camilo, a existncia de uma norma brasileira, de um estilo prprio. Felizmente que tudo se esclareceu fazendo-se justia tanto diversidade como unidade da lngua pois no se tratam de duas dinmicas alternativas, mas complementares. Na convergncia destas duas realidades se tem vivido e continua a viver nos nossos dias, porque a Lngua Portuguesa no tem um dono mas vrios condminos que a usam como sua. Lapidarmente afirmou Celso Cunha, a este propsito: Chegase assim evidncia de que para a gerao actual de brasileiros, de cabo-verdianos, angolanos, etc, o portugus uma lngua to prpria, exactamente to prpria, como para os portugueses. E em certos pontos, por razes lingusticamente justificveis, na Romnica nova, a lngua se manteve mais estvel do que na antiga Metrpole 1 . Mas, para se chegar a esta situao de estabilidade tranquila, largo e difcil caminho foi necessrio percorrer.

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Inmeras foram as dificuldades, porque inmeros foram os perigos e ameaas do exterior, mas todas vencidas, contribuindo at para o seu enriquecimento. E porque a histria no para, novos desafios esto a ser enfrentados pela lngu portuguesa e pelas culturas que nela se processam, sendo o mais recente o da globalizao. Permitam-me, pois, algumas consideraes preliminares que mais claramente ponham em evidncia como, tanto a diversidade lingustico cultural, como a unidade so indissociveis e complementares, ora postulando as diversidades, a importncia da unidade, ora exigindo a unidade, a autenticidade das diversidades. O nosso sculo, agora a chegar ao termo, conheceu quatro grandes dinmicas no modo de considerar as lnguas e de as ensinar e aprender: a dinmica do romantismo herdada sobretudo de Humboldt e que se intensificou por meio do nacionalismo poltico, a ponto de chegar at aos nossos dias at aos anos 50, apesar dos progressos da lingustica, da doutrinao de Saussure e das novas perspectivas da psicologia e da sociologia;a dinmica internacionalista e imperialista que conviveu com a mentalidade anterior e chegou at ao fim da dcada de 60; a dinmmultilingustica e multicultural que na Europa teve a sua expresso mais significativa quando a restruturao desencadeada pelo plano Marshall, aps a 2 Grande Guerra Mundial, atraiu milhes de emigrantes da Europa do sul e dos pases da bacia mediterrnica para os pases industrializados; a dinmica da globalizao que se processa em nossos dias e que no s condiciona as comunicaes e a economia, mas tambm interfere na cultura, nas religies, nos costumes e, tambm, nas polticas lingusticas. Na etapa nacionalista, em que muitos de ns fomos formados, as lnguas eram estudadas como a expresso dos povos, diversificadas como eles, patrimnio que era preciso zelosamente defender e enriquecer segundo o lema de Du Bellay. Assim, era necessrio combater duas espcies de desvios e erros, os herdados da tradio de sculos anteriores que alatinaram e helenizaram as lnguas, sobretudo a ortografia, complicando-a (sculos XV e XVI) ou a vestiram espanhola e francesa (sculos XVII e XVIII). A essa tarefa se entregaram os puristas e suas sociedades combatendo por igual os estrangeirismos, ento, sobretudo galicismos, e o que julgavam serem erros e corruptelas .

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Ao mesmo tempo, multiplicavam-se os apelos leitura dos clssicos como modelos a seguir fielmente. Quanto s relaes com as outras lnguas, eram entendidas dentro de um quadro de prestgio: o latim e o grego para a erudio, o Direito e a medicina; o francs para a cultura; o alemo para a filosofia etc.. Deste modo, as lnguas no se expandiam, mas vigiavamse zelosamente, apenas sendo permitidas algumas liberdades controladas. Nas etapas internacionalistas, os pases com colnias ou aspiraes a t-las, impunham em todo o seu espao de soberania a lngua oficial, proibindo que se falassem as lnguas tnicas ou, dentro do territrio metropolitano, combatendo as lnguas regionais. Em simultneo, e com o apoio de grandes meios financeiros, foram criadas instituies destinadas a propagar no estrangeiro, ou trazer at ao pas os estrangeiros para dar a conhecer a lngua, cultura, instituies etc, no se poupando em oferecimento de livros, revistas, conferncias, cursos anuais e de frias etc.. Assim surgiram o British Council, a Alliance Franaise, o Instituto de Alta Cultura e outros institutos e centros culturais. Percebeu-se ento que, por honestas e louvveis razes de dilogo entre culturas, ou por ousada propaganda com objectivos de hegemonia poltica ou de facilitao comercial, a expanso da lngua nas colnias ou no estrangeiro era um veculo privilegiado para coisas to diversas como o dilogo, a hegemonia, a expanso dominadora, segundo o velho aforismo colonial de que a lngua ea a melhor companheira do imprio. Na etapa do multilingusmo e multiculturalismo que aquela em que, desde algumas dcadas vivemos, o ensino e aprendizagem das lnguas, de um modo geral, pedeu a sua hybris de domnio e expanso, democratizou-se, passou da propaganda ao dilogo entre iguais, tendo-se as instituies que vinham da etapa anterior, transformado em foruns de dilogo, no melhor sentido da palavra. que, entretanto, quer nos Estados Unidos quer na Europa, a conjuntura scio-poltica alterou-se profundamente: as correntes migratrias procurando trabalho, realizando negcios, promovendo peregrinaes, alteraram a composio tnica dos pases. Milhes de trabalhadores fixaram residncia nos pases industrializados e de um dia para o outro esses pases monolngues ou de dbil variedade de expresso lingustica viram-se multilingues e multiculturais, com as inevitveis consequncias, tanto no plano das

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relaes socias como nos da educao, cultura e ensino das lnguas. Os governos tiveram de perceber que a unidade nacional no devia ser entendida maneira napolenica do centralismo lingustico e cultural, mas que deviam respeitar e fomentar o ensino das lnguas dos seus emigrantes e aceitarem as suas culturas em suas variadas expresses: no vesturio, na alimentao, nos costumes, na frequncia de sinagogas, mesquitas e outros templos que era urgente construir. Por outras palavras, chegaram concluso de que a paz e a harmonia sociais, bem como o rendimento do trabalho, melhor se conseguiriam com o multilinguismo e o multiculturalismo. Que se os trabalhadores estrangeiros vivessem no pas de acolhimento como no seu meio cultural, o benefcio seria de todos. Tambm, em consequncia, passaram a interrogar-se seramente sobre que sentido tinham agora o centralismo lingustico, o purismo baseado em conceitos de correco e vernaculidade,os erros e corruptelas de linguagem, a luta contra os estrangeirismos? Para alm disso, e em simultneo com esta invaso pacfica das multides de emigrantes, outra exploso comunicativa aconteceu, favorecendo os ignorantes contra os eruditos: a exploso comunicativa da televiso impondo uma linguagem simplificada. Com ela, a escola tradicional passou a sofrer a concorrncia daquela que George Friedmann apelidou de escola paralela , ateleviso. lentido da escr ita sucedeu o imediatismo e a evidncia da imagem, e o saber deixou de ser hierarquizado e segundo valores para se tornar num verdadeiro mosaico de realidades desintegradas, como o multilnguismo, o multiculturalismo ou os quadros de Picasso. Sobre a etapa recente da globalizao, diametralmente opostas so as suas interpretaes. Para os herdeiros do capitalismo triunfante, ela permitir resolver alguns problemas de mbito geral, antes insoluveis. Para os deserdados do marxismo e do arruinado imprio sovitico ela representa a chegada do apocalipse de todas as abominaes. Para os que entre ambos os grupos se interrogam sobre o futuro do Homem no milnio que chega e sobre o papel mediador a desempenhar pelas culturas ela sobretudo, um desafio ambivalente, porque tudo est a ser reformulado. Ser a globalizao aquilo que o ttulo do estudo de Ignacio

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Ramonet sugere, uma Geopoltica do caos2 ou dela poder resultar algum cosmos benfico? Demorei-me algum tempo no esboo deste cenrio porque entend-lo e t-lo em conta essencial para se compreender como se pe hoje o problema das polticas lingusticas e culturais relativas diversidade e unidade da lngua. Polticas que no pertence s aos governos actualizar nas relaes externas, nos sistemas e programas escolares, mas tambm s instituies nomeadamente Universidade e aos professores. Porque bvio que importa defender agora, ainda mais do que no passado, a diversidade. Diversidade essa que exprime mundividncia dos falantes em situaes concretas, herdeiros de um patrimnio cultural que a lngua materna guarda, exprime e transmite como sistema modelizador primrio, base de outros sistemas modelizadores que acompanham a vida individual e colectiva, como bem o observou Iuris Lotterman. Diversidade que na Lngua Portuguesa comeou a esboarse muito cedo dando origem a variantes, sobretudo na fase da sua expanso intercontinental. J o nosso primeiro gramtico Ferno de Oliveira observa em 1536 variantes no vocabulrio, porque os da Beira tm umas falas e os do Alentejo outras, e os homens da Estremadura so diferentes dos de Entre Douro e Minho, porque assim como os tempos, assim tambm as terras criam diversas condies e conceitos 3 . Se tal acontecia no interior do pas, na fase arcaica da lngua, como demonstrou Lindley Cintra, com a aventura dos mares maiores propores essa diversidade atingiu. Assim aconteceram as grandes variantes de carcter nacional - portuguesa, galega e brasileira -, e previsivelmente podero acontecer as dos pases africanos que foram antigas colnias portuguesas. Da que defender e enriquecer as diversidades o mesmo que salvaguardar a prpria autenticidade de cada pas e da sua cultura, ou das suas culturas, e que no caso do Brasil se compatibiliza em cerca de 170 lnguas indgenas, as lnguas brasileiras autctones identificadoras de mais de 180 regies indgenas com uma populao de 220.000 ndios 4 . E, do mesmo modo, os crioulos que resultaram da expanso colonial, desde o sculo XVI. O reconhecimento destas diferenas chegou mesmo ao pon

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to de uma especulao excessiva a propsito de uma possvel lngua brasileira a partir de contributos do tupi e das lnguas africanas. Suposies estas cujas ambiguidades vieram a ser desfeitas pela primeira grande gerao universitria de linguisticos brasileiros, como o notou objectivamente Paul Teyssier (Mattoso Cmaca, Serafim da Silva Neto, Silvio Elia, Gladstone Chaves de Melo, Celso Cunha, Nelson Rossi). E no s por estes, tambm por outros antes e depois deles. Associando-me, por isso, homenagem que este congresso presta a Barbosa Lima Sobrinho, por ocasio dos seus 102 anos, torno aqui presente a sua opinio sobre o assunto, exposta na obra A Lngua Portuguesa e a Unidade do Brasil, publicada em 1958 e que dentro em breve o Professor Leodegrio de Azevedo Filho analisar com a agudeza e o brilho a que nos habituou. So afirmaes do ilustre escritor e acadmico: H que pensar num idioma que no seja monoplio de portugueses e brasileiros ( ) o termo idioma, claro, aqui tem o sentido de lngua, que apenas uma, por fora da unidade de todos os seus morfemas gramaticais. Mas, dentro dessa unidade morfolgica, existe a diversidade de pronncia e de sintaxe, alm da riqueza tambm diversificada do lxico. Por isso mesmo, nenhuma nao do mundo lusofnico pode ter a prtenso pueril de querer ditar normas e usos lingusticos s demais. No caso, o que todas as naes devem fazer proceder ao conhecimento das diferenas sempre em busca de uma unidade superior. At porque a norma culta da lngua comum estar sempre onde houver maior desenvolvimento de cultura e civilizao como hoje ningum ignora. Em outras palavras, todas as naes do mundo lusofnico famal a mesma lngua, mas cada um a seu modo 5 . Segundo o mesmo Paul Teyssier a adopo de mtodos cientficos conduziu estes e outros filsofos a uma reviso crtica dessas ideias recebidas e no devidamente comprovadas, embora, obviamente, confirmassem as citadas influncias. E desse modo, a adoptarem um posicionamento de grande correco e objectividade cientfica: Plus gnrale les philologues de lEcole brsilienne ont adopt sur la question de la langue des positions modrs. Ils sont la fois attachs lriginalit linquistique du Brsil et lunit de la langue portugaise. Une spcifit brsilienne linterieur du portugais, voil, ensomme ce quils revendiquent 6 . Segundo Jean-Michel Massa, algo de semelhante se poderdizer do portugus em frica, e mbora numa situao muito inst

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vel e de acentuado plurilinguismo. Porque, En Afrique, depuis lindpendence, une nouvelle phase est engage. Les portugais staient empans dune partie de lAfrique, les Africains se sont empars du portugais 7 . No Brasil ainda, a situao de ambiguidade relativamente Lngua Portuguesa, quanto sua designao no sistema escolar que persistiu at aos anos 80, viria a ser completamente eliminada pelo relatrio da Comisso formada por Antnio Houaiss, Celso Cunha, Celso Luft, Fbio Lucas, Joo Vanderley Geraldi, e presidida por bgar Renult, que assim dirimiu a questo: Podemos adoptar a pespectiva de que no Brasil se pratica uma variedade da Lngua Portuguesa, vencida a etapa em que se procurou insinuar o designativo lngua brasileira ou brasileiro , para aquela que serve de meio de comunicao e expresso em nosso pas ( ) Torna-se consensual que, nos documentos ou textos expositivos quando se empregam lngua nacional , lngua materna , lngua ptria ou lngua verncula , Lngua Portuguesa, na sua variedade brasileira, que tais expresses se reportam, salvo entendimento contrrio, decorrentedo contexto. ( ) Recomendao: Ser de toda a convenincia que os diplomas legais que tratam do nosso idioma oficial se refiram expressamente Lngua Portuguesa ou portugus, fazendo constar essas denominaes nos programas de ensino de todos os graus admitidos em nosso sistema educacional 8 . Se o problema da salvaguarda da diversidade se identificou, em certa poca, com a reivindicao da independncia, no s poltica, mas tambm cultural e, nos nossos dias, atingiu o ponto do equilbrio entre diversidade e unidade entendendo-as como complementares, com a novssima globalizao, uma nova luta preciso empreender, a do reforo e da eficcia da unidade. E por duas razes fundamentais: Porque num mundo em que tudo se intercomunica e interactiva, a unidade prpria de uma lngua de cultura falada e escrita em vrios continentes e apta a exprimir tanto o pensamennto abstracto como a expresso potica, como as situaes triviais do dia a dia, tem a melhor garantia de eficcia nesse tipo de relacionamento e de resistncia. A globalizao no seria inevitvelmente um mal, poder transformar-se num bem, tal como a fora do vento que os marinheiros aproveitaram navegando bulina. E tambm porque, paradoxalmente, e ao contrrio do que aconteceu no passado, ser na unidade e fora da lusofonia que

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poder estar a estabilidade e futuro da diversidade. Sem o seu apoio, as vrias diversidades ficariam merc da poderosa fora neo-colonialista globalizante da actual lngua franca, o ingls. Em face dela, as lnguas de grande expresso internacional podero representar alternativas de uso e santurios de preservao de valores culturais. Para tanto, precisam de ser unas e sustentadas pelos pases que as partilham. Entre elas o portugus, lngua de base da lusofonia, s ter possibilidade de sucesso, se todos os seus integrantes responsveis o fizerem, pois se situa entre a quinta, inclusiv, at stima posio inclusiv 9. Obviamente que a unidade da lngua se faz enquanto lngua de cultura, no sobre a lngua oral, mas sobre a escrita, lngua de feio universalista (oferecida) aos seus milhes de usurios, cada um dos quais pode preservar, ao mesmo tempo, usos nacionais, regionais, setoriais, profissionais 10. Antnio Houais explica essa dimenso cultural da lngua comparandoa com uma pirmide em que ele ocupa o pice, pelo quase igual teor de sua culturalizao grfica se entendeu entre si de um modo quase comum ou mesmo comum: nesse nvel, a lngua de cultura portuguesa universal para todos os que a aprenderam como lngua de cultura, isto , transmitida pelo aprendizado escolar: nessa pirmide, sobe-se de milhares de dialectos locais para um certo tipo de linguagem sem cor local e, de certo modo, sem cor temporal, pois a culturalizao acumula o lxico e as regras gramaticais do passado no lxico e regras gramaticais do presente ( ) numa fonia, que, nos nosso caso, a lusofonia 11. As vantagens em se promover e defender esta unidade lusfona que, obviamente, admite vrias normas cultas, que dispensam outros argumentos. Mas no s na actualidade o problema foi encarecido pelos brasileiros. J no princpio deste sculo alguns intelectuais tinham chamado a ateno quer para a importncia da lngua como fronteira cultural, quer para a sua relevncia como fronteira poltica, decisiva para os interesses nacionais. Soube este ltimo aspecto, o seu grande defensor no Brasil foi Silvio Romero que em plena poca anti lusista proferiu em, Julho de 1902, uma memorvel confncia intitulada O elemento portugus .

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Nela preconizava a intensificao e preferncia pela colonizao portuguesa moderna como a mais acertada medida no s para obstar s tendncias separatistas de alguns ncleos de colonos, nemeadamente em So Paulo e no Rio Grande do Sul, mas tambm para fortalcer o sentimento da unidade nacional face s cobias dos vrios imperialismos reinantes, nomeadamente da Inglaterra e da Alemanha. Cobias essas voltadas no s para a frica e as regies centrais da sia, mas tambm para a Amrica Latina, especialmente apetentes do Amazonas, do Madeira, do Purs e do Acre. O que surpreendente nesta apologia de uma nova colonizao portuguesa a coragem de se demarcar do ambiente dominante anti lusista, e a previso, de tipo proftico, dos acontecimentos que se comeariam a realizar cerca de vinte e cinco anos depois,ligando intimamente a colonizao lusitana lngua e cultura de Portugal como revitalizadoras do orgulho nacional brasileiro. Chegou mesmo como veremos, a prevr a organizao das potncias em blocos de poder aglotinados pela lngua comum que usaram, e a unio lusfona como uma soluo para lhes faze face. Antes de Fernando Pessoa, Silvio Romero foi um dos pimeiros tericos da construo da lusofonia. Previses estas que contrastaram com o citado ambiente reinante e triunfante do anti-lusismo. Com efeito, lembrana das crticas galhofeiras de Ramalho Ortigo e Ea nas Farpas, e de Camilo no Cancioneiro alegre, tinha-se juntado a onda de indignao patritica contra o acolhimento e imponidade concedida pela fora naval portuguesa fundada na baa de Guanabara aos conspiradores derrotados na Revolta da Armada de 1894. A indignao foi to grande que provocou o corte de relaes diplomticas entre Portugal e o Brasil e levava ao auge as stiras e chacotas de Raul Pompeia na literatura, no teatro e na caricatura. Mesmo depois da interveno de Slvio Romero continuou a mar de hostilidade e desentendimentos acompanhada por medidas drsticas contra os monpolios de portugueses na imprensa, nas pescas etc.. Basta ler As Razes da Inconfidncia de Antnio Torres, para desde a primeira pgina, se poder avaliar o nvel de degradao das relaes luso-brasileiras. Foi no meio deste torvelinho de paixes exacerbadas que a

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voz de Silvio Romero se levantou. Para o notvel crtico, socilogo, folclorista e historiador literrio, a lngua era um factor decisivo na identidade brasileira: Bastaria o facto extraordinrio, nico, inaprecivel, transcendente, da lngua para marcar ao portugus o lugar que ele ocupa em nossa vida, em nossas lutas, em nossas aspiraes; bastaria a lngua para definirmos e extremar-nos de quaisquer concorrentes estranhos que porventura sonhem embaraar-nos em nossa marcha. Ela s por si na era presente serve para individualizar a nacionalidade 12. Dentro da mesma lgica Romero anteviu que no desenrolar do xadrez mundial jogado pelas naes se caminhava no sentido de se agruparem em grandes blocos de poder e influncia levados pelo que ento se julgava a maior fora social - a raa -, e aglutinados pela fora da lngua: Esse movimento unitrio e centrpeto das raas, formando grandes todos homogneos entre si, e diferenciados uns dos outros, que h-de poupar humanidade a monotonia asfixiante do cosmopolitismo avassalador, que facilmene triunfaria de pequenos povos isolados. Uma das ideias mais ousadas, atribudas creio que a Cecil Rhodes, a de uma imensa federao de gentes que falam a lngua inglesa, e verdadeiramente um pensamento genial. Inglaterra, Esccia, Estados Unidos, tudo isto unido, aliado, federado,vem a ser alguma coisa de indito, de nunca visto nos anaes do homem.E mais admirvel ser o quadro se nos lembrarmos que nele devero entrar a ndia e o Egipto, transformados pelo gnio britnico. de assombrar 13. Sendo esta a dinmica prevista e temida da anglofonia, lgica se tornou tambm a previso - desejo de que os povos de Lngua Portuguesa se organizassem, mesmo num tempo em que as independncias africanas em geral e as das colnias portuguesas em particular eram imprevisveis:

Sim, meus senhores: no isto uma utopia, nem um sonho a aliana do Brasil e Portugal, como no ser um delrio ver nofuturo o imprio portugus d frica unido ao imprio portugus da Amrica, estimulados pelo esprito da pequena terra da Europa que foi o bero de ambos. S assim, quando estamos a assistir difuso do elemento anglo - saxnico por todos os continentes, do elemento eslavo por toda a Europa oriental e por toda a sia do norte e do centro, e do

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elemento francs nessa ltima parte do mundo e pelo corao adentro de frica; s assim, qu ndo at o Japo se aparelha para as peripcias do futuro e de esperar que a China venha a fazer o mesmo; s assim, s pela unio, que se manter no porvir longnquo a famosa lngua de Vieira e Herculano 14. E, em geito de grand finale retrico, o tambm grande orador rematou a sua conferencia com esta exortao entusistica: Ns devemos tambm esforar-nos para que esta lngua, grandloqua e sonorosa, seja tambm perptua, seja eterna em nossas almas, para que nunca mais desaparea das plagas de Guanabara, nem de toda esta imensa e amada terra que vai do Amazonas ao Prata 15. Outro sonhador do futuro de Lngua Portuguesa, para me limitar a dois grandes vultos do mundo luso-brasileiro, foi Fernando Pessoa que, por volta, provavelmente de 1931, no Livro do Desassossego deixou expresso: no tenho sentimento nenhum poltico ou social. Tenho porm num sentido, um alto sentimento patritico, minha ptria a Lngua Portuguesa 16. No pode esta afirmao ser diluda como hiperblica ou de exaltao simples, mas deve entender-se como definio a um tempo simblica e literal do seu pensamento sobre a Lngua Portuguesa. E por razes que no cessam de lhe confirmar a inteno e o sentido, medida que foram sendo publicados inditos seus reforando afirmaes sobre o significado de um quinto imprio cultural fundado na lngua. Em 1934, no prefcio obra de Augusto Ferreira Gomes, intitulada O Quinto Imprio explica Pessoa a cronologia dos imprios e como tm sido interpretados, contrapondo-lhes a sua, em que o portugus se afirma como o Quinto, por vir na ordem de uma sucesso no de imprios materiais mas espirituais. O Quinto Imprio de Pessoa , simultneamente, espiritual e temporal, sendo a Lngua Portuguesa a constituinte essencial desse imprio, antecipando as modernas concepes da lusofonia. Identificando as traves mestras desse edifcio imperial, assim as enumera: uma lngua apta, rica, gramaticalmente completa e fortemente nacional, e o aparecimento de homens de gnio literrio escrevendo nessa lngua e ilustrando-a. Assim, alguns tpicos avultam nessa construo: a) A capacidade da Lngua Portuguesa, pela sua riqueza e plasticidade, servir de ptria comum;

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b) A existncia de um p