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LEITURA DA LITERATURA INFANTO - JUVENIL: contribuições para a promoção

da igualdade étnico - racial em ambientes educativos.

Autor: Rosane Aparecida Gulgielmin1

Orientadora: Dra. Níncia Cecília Ribas Borges Teixeira2

Resumo

O presente artigo visa apresentar o trabalho prático de letramento literário, desenvolvido no Colégio Estadual Professora Izabel Fonseca Siqueira – Ensino Fundamental e Médio de Reserva do Iguaçu-PR, realizado com alunos de 5ª série (6º ano) do Ensino Fundamental em 2011, conforme o referencial teórico sugerido pelo professor Rildo Cosson em seu livro Letramento Literário: teoria e prática (2006). O comprometimento, aqui exposto, mostra que se pode começar o trabalho de escolarização da literatura por meio da sequência básica (a motivação, introdução, leitura, interpretação), para que a proximidade do educando com a literatura seja uma procura contínua de acepção própria ou figurada para o texto literário e assim, despertar o educando para o prazer desta leitura. Além disso, como os estudantes têm pouco, ou nenhum, conhecimento sobre a cultura negra como elemento essencial na formação da identidade nacional, as práticas metodológicas para o ensinamento do letramento literário, iniciando com os contos africanos, cooperam para o prazer pela leitura literária e em defesa da igualdade; contra o racismo, a discriminação e o preconceito racial que reinam na sociedade. O objetivo principal foi incentivar os alunos sobre a importância de nossas raízes afro-brasileiras, por meio de contos africanos como forma de comunicação e expressão, contribuindo para a construção de valores, interagindo e integrando escola e comunidade, levando o aluno a observar, perceber, descobrir e refletir sobre o mundo. Enfim, a organização do ensino sistemático e constante com os contos africanos desempenhará importante estratégia didática, tanto para a promoção da igualdade das relações étnico-raciais na escola, como sendo o gênero textual que contribuirá para despertar o prazer pela leitura literária.

1 Especialista em Educação Especial: Formação Generalista com Ênfase em Deficiência Auditiva; Especialista em

Psicopedagogia Institucional; Especialista em Língua Portuguesa: Teoria e Prática. Graduada em Letras–Literatura pela Unicentro; Professora no Colégio Estadual Profª Izabel F. Siqueira – EFM/Reserva do Iguaçu-PR. 2 Orientadora do presente trabalho; Professora do Curso de Letras da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO) e pós-doutora em Ciência da Literatura (UFRJ). Doutora em Letras pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2005); Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Londrina..

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Palavras-chave: Letramento Literário. Prazer pela Leitura. Relações Étnico-Raciais.

Sequência básica. Leitura Literária.

1 INTRODUÇÃO

A questão da falta de interesse da maioria dos educandos pela leitura literária,

e a busca por caminhos alternativos para tornar essa leitura mais prazerosa e eficaz

são barreiras encontradas nas aulas de Língua Portuguesa no Colégio Estadual

Professora Izabel Fonseca Siqueira, município de Reserva do Iguaçu, em todas as

séries, tanto no Ensino Fundamental como no Ensino Médio.

Diante disso, desenvolveu-se na escola uma intervenção pedagógica em

2011, com a 5ª série (6º ano) do Ensino Fundamental, com o propósito de realizar a

leitura literária por meio de novas metodologias de ensino, a fim de mostrar aos

educandos que ler não é apenas decifrar sinais e assim, ajudá-los a encontrar o

verdadeiro prazer pela leitura. Pretendeu-se, também, com este trabalho mostrar

como a prática diária do docente pode ser instrumento mediador diante da

problemática de incluir o negro no processo político e sociocultural, recuperando sua

história e, portanto, reconhecendo seu merecimento.

Após várias situações vivenciadas de racismo, preconceito e discriminação

racial no cotidiano escolar, notou-se a necessidade de um diálogo a respeito dessa

temática afro-brasileira/africana em sala de aula, para a promoção da igualdade

étnico-racial no recinto escolar.

Optou-se, então, partindo dos contos africanos, iniciar o trabalho com uma

nova proposta metodológica para o ensino da leitura literária e promover a igualdade

racial/étnica no ambiente escolar. Para que isso acontecesse foi imprescindível

desenvolver a ação da leitura por prazer e assim dar início para a valorização às

diversidades étnicas e culturais, tornando possível afastar, minimizar o preconceito

racial. Foram de extrema importância as ações intensas, comprometidas com o

enfrentamento do desafio contemporâneo trazendo para a sala de aula o universo

cultural africano e afro-brasileiro, para que os alunos vivenciassem a questão da

temática étnico-racial e percebessem que são sujeitos históricos e que fazem parte

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de determinados grupos.

O mundo africano possibilita à criança afro-brasileira um referencial positivo,

pois é rico de valores e tradições. Pode-se identificar nas narrativas africanas o

modo de vida africano, sua religiosidade, as atividades desenvolvidas nas

comunidades, as relações entre as pessoas e familiares, a culinária, a música e até

as vestimentas usadas nos cerimoniais.

Surgiu, assim, a necessidade de construir referenciais positivos de ser

afrodescendente, pensando sobre atitudes preconceituosas, buscando o respeito à

diversidade e à promoção da igualdade de oportunidades. Essa proposta, diante da

Lei 10639/03, mostra a importância de apontar nos textos aspectos de preconceito,

pretendendo valorizar as relações étnico-raciais e extinguir o pensamento de que

existe raça superiorior.

Os professores devem tornar as aulas produtivas e prazerosas ao educando,

para que este aumente sua capacidade de leitura da maneira esperada e saiba

posicionar-se frente à leitura realizada. Para isso acontecer o ideal é realizar um

trabalho diferenciado das metodologias tradicionais que estão nos estabelecimentos

de ensino. Os procedimentos de ensino tradicionais qualificam, tratam a literatura

com ênfase no estudo fragmentado de obras; usam o texto literário para pretexto do

trabalho com gramática e para o exercício da reescrita; estudam a periodização

literária, isso tudo sem nenhum significado para os educandos; em suma, os textos

literários estudados em sala de aula são limitados, são os modelos apresentados

pelo livro didático.

Sabe-se de longa data que as estratégias e os métodos levados para a sala

de aula como: resumos, questionários, fichas de leitura, provas, entre outros, não

motivam os leitores à leitura literária, mas causam o desprazer pela leitura.

A proposta de letramento literário, segundo Rildo Cosson (2006), é uma das

mais importantes de ensino de literatura que em seu livro: “Letramento Literário:

teoria e prática” revela duas sequências a serem trabalhadas, às quais intitula de

sequência básica (ensino fundamental) e expandida (ensino médio).

Segundo Cosson (2006, p.23) a literatura deve ser ensinada na escola:

[...] devemos compreender que o letramento literário é uma prática social e, como tal, responsabilidade da escola. A questão a ser enfrentada não é se a escola deve ou não escolarizar a literatura, como bem nos alerta Magda

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Soares, mas sim como fazer essa escolarização sem descaracterizá-la, sem transformá-la em um simulacro de si mesma que mais nega do que confirma seu poder de humanização.

Neste panorama, o comprometimento, aqui exposto, mostra que se pode

começar o trabalho de escolarização da literatura através da sequência básica e

depois compor outra, para que a proximidade do educando com a literatura seja uma

procura contínua do sentido em que uma palavra é empregada (acepção própria ou

figurada para o texto literário).

O aluno da Educação Básica precisa ser despertado para o prazer pelo texto

literário, tendo em vista a pouca leitura literária que a escola proporciona. Além

disso, tem-se pouco, ou nenhum, conhecimento sobre a cultura negra como

elemento essencial na formação da identidade nacional. Dessa forma, torna-se

necessárias mudanças de estratégias para mudar esta realidade.

Recorrendo às alternativas para tornar o ato de ler prazeroso e constante,

almejando um ambiente que incita o respeito à diversidade, realizou-se a produção

de um Caderno Pedagógico “Janela para o mundo: leitura literária do conto

africano”, que principiou com os contos africanos e depois com outros textos de

vários gêneros discursivos, tornando a produção didático-pedagógica uma

experiência positiva. A intenção alcançada com a implementação do projeto em sala

de aula foi a alteração nas práticas pedagógicas do ensino de leitura literária,

despertando o prazer por esta leitura, combatendo o racismo3, a discriminação4 e o

preconceito racial5.

A implementação pedagógica incentivou os educandos sobre a importância

de nossas raízes afro-brasileiras, por meio de contos africanos como forma de

comunicação e expressão, contribuindo para a construção de valores, interagindo e

integrando escola e comunidade, levando o aluno a observar, perceber, descobrir e

refletir sobre o mundo.

3 Racismo - conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma hierarquia entre as raças e/ou etnias.

4 Discriminação racial - prática discriminadora fundamentada em princípios preconceituosos.

5 Preconceito Racial - conceito negativo prévio com relação a uma determinada raça. Fonte Caderno de Metodologia –

Saberes e Fazeres/Modos de Sentir, volume 2, 2006.

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1.1 CONTO AFRICANO NA SALA DE AULA

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar as pessoas precisam aprender; e, se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar!” Nelson Mandela

Inicialmente, o que se percebe nas escolas é um estudo fracionado e

estereotipado quando se trata da pluralidade cultural. O negro sendo ligado à

música, ao tambor, à dança e à comida. Representa que o povo negro, não produz

literatura, e se produz, ainda não está inserida no currículo.

A literatura africana não é conhecida pela grande maioria da população, que

muitas vezes, prejulga, agrega às narrativas ao candomblé (religião africana), por

algumas mostrarem os orixás nos seus textos. A literatura africana é ampla e

importante, então, torna-se imprescindível quebrar o modelo de que somente o

patrimônio europeu deve prevalecer e que as culturas das classes que pertencem à

minoria, só sejam levadas em consideração no horizonte folclórico. Para tanto, deve-

se procurar meios de conhecer a diversidade do povo africano e, socializá-la na sala

de aula, tendo o propósito de despertar no educando a autoestima em ser

afrodescendente. Uma das possibilidades iniciais para tentar acabar com o racismo,

a discriminação e o preconceito racial são os contos africanos, os quais manifestam

um mundo desconhecido, formado de reis, príncipes, orixás e homens fortes que

combateram pela liberdade.

A literatura africana refere-se ao cotidiano, ao trabalho, à guerra e ao amor.

Neles os negros não estão representados como escravos, passivos e fracos que

suportaram o cativeiro forçado pelos brancos. São representados como homens

fortes, soberanos de sua vontade, filhos da divindade que se juntam de forma

organizada, para apresentar ou sustentar argumentos em prol dos ideais que

acreditam.

Os contos africanos dão valor à leitura como fonte de formação, informação e

aproximação ao mundo da literatura africana. Esses contos e seu universo mágico

contribuem para a formação de leitores através da promoção da leitura, passaporte

para o prazer da leitura literária.

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Nessa perspectiva, nota-se a vital importância em ponderar elementos para

construção de um referencial positivo de ser afrodescendente, reflexionando sobre

atos preconceituosos e provocando à crença na liberdade, no respeito, na paciência,

na aceitação e na apreciação de tradições e valores. Para isso acontecer o

fundamental realizou-se: a intervenção pedagógica que contemplou a diversidade

cultural, garantindo a construção de valores de respeito mútuo e de convivência

agradável entre as pessoas..

Cavalleiro (2006, p.69) menciona que o preconceito, às vezes, começa nos

lares onde as ligações constituídas manifestam por meio de práticas e discursos à

concepção de diferença a partir de uma visão negativa, errônea do outro. Não

adianta apenas trazer personagens negras e abordagens sobre o preconceito. É

imprescindível a atenção no modo como são trabalhados o texto e a ilustração.

Para trabalhar com diversidade étnico-racial, o professor precisa ser

cuidadoso com os materiais: expor ilustrações positivas de personagens negros;

buscar obras onde habitem reis, rainhas negras, deuses africanos; todas as

conversações realizadas durante a leitura devem elevar a autoestima dos (as)

alunos (as) negros (as); que representem, sem estereótipos, a população negra

brasileira.

A cultura brasileira não seria a mesma sem a participação dos negros, que

vieram da África e foram escravizados. Por isso, apresentar elementos da cultura

desse continente na sala de aula, por meio dos contos, é essencial para que as

crianças admitam, identifiquem, reconheçam a contribuição africana para o Brasil.

A população brasileira é culturalmente afro-brasileira e por isso, amparar,

defender, apoiar e dar valor ao (a) estudante negro (a) não representa mera

bondade, mas inquietação com a própria identidade dos brasileiros que têm base

africana.

Este trabalho tem como base a aprovação e a implementação da Lei 10.639

de 09/01/2003, que dimensiona o ensino de História da África e Cultura Afro-

brasileira no currículo escolar, tornando-o obrigatório na Educação Básica;

fundamentado pelo Parecer do CNE/CP003 (BRASIL, 2004), que principiou vastos

debates sobre a identidade da cultura afro-brasileira, como o combate à

discriminação racial no espaço escolar em seus diferentes níveis de ensino. Essas

políticas públicas escolhidas pelo Governo Federal têm o propósito de retratar-se e

admitir às desigualdades raciais e sociais experimentadas pelos negros e negras.

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A Lei Federal, citada acima, que modifica a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional determinadas pela Lei nº 9394/96, ao tornar obrigatório o ensino

sobre História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nas instituições de Ensino

Fundamental e Médio, garante o direito à igualdade de condições de vida e de

cidadania, assim como assegura igual direito às histórias e culturas que formam a

nação brasileira, além do direito de aproximação às diferentes fontes da cultura

nacional a todos os brasileiros. Cumprir a Lei é compromisso da sociedade.

Esses documentos certificam que as relações étnico-raciais sejam tratadas

em todos os sistemas de ensino, a partir de um estudo que mostre, eleve o valor da

diversidade em nosso país (SANTOS, 2005, p.68).

Para pôr essa lei em prática, a leitura literária deve questionar sobre a

maneira como são tratados os negros e seus descendentes nos contos e outros

gêneros textuais, uma vez que é claro, nítido o racismo, a discriminação e o

preconceito racial.

Nessa perspectiva, o compromisso aqui levantado é de que realizando a

leitura de contos africanos e de outros gêneros textuais, o professor possa

desenvolver uma prática pedagógica que correlacione com os anelos da Lei

10.639/03.

Em resumo, a organização do ensino sistemático e constante com os contos

africanos desempenhará importante estratégia didática, tanto para a promoção da

igualdade das relações étnico-raciais na escola, como sendo o gênero textual que

contribuirá para despertar o prazer pela leitura literária.

Embora se saiba que seja impossível uma escola igual para todos, acredita-

se que seja possível a (re) construção de uma instituição de ensino que reconheça

que os educandos são diferentes, que possuem uma cultura diversa e que repense

o currículo, a partir da realidade existente dentro de uma lógica de igualdade e de

direitos sociais.

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1.2 LEITURA LITERÁRIA

Por meio da leitura, pode-se conhecer mundos antes nunca imaginados;

alcança-se ao final de cada parágrafo, página, cada obra, muita experiência.

Sabe-se que apenas ler e escrever não são o bastante para atender as

imposições que a sociedade institui. É imprescindível saber fazer uso do ler e

escrever. Isto é, a leitura e a escrita devem ser uma prática social ao contrário de

apenas codificação. Para Magda Soares (2006, p.24), “[...] uma inferência que se

pode tirar do conceito de letramento é que um indivíduo pode não saber ler e

escrever, isto é, ser analfabeto, mas ser, de certa forma, letrado”.

Segundo a autora, um analfabeto pode se tornar um indivíduo letrado, a partir

do instante em que assume o compromisso com a leitura e a escrita em seu dia-a-

dia. Ler é muito mais que decodificação de signos, precisa acontecer à interação

social em que texto e leitor são peças chaves no processo de construção de sentido.

Segundo Soares (2006, p.51), a escola tem a obrigação de constituir leitores

capazes, competentes para a extensa variedade de textos disseminados em nossa

sociedade e, portanto, explanar diversas capacidades de leituras, como a de ler um

texto informativo ou jornalístico, um manual de instrução, um texto publicitário, uma

charge, um poema, uma prosa literária, entre outros.

Na atualidade, questiona-se a respeito das obras a serem escolhidas pelos

estabelecimentos de ensino. Esse debate vai do cânone às obras contemporâneas,

também por aquela que fala a favor da pluralidade e a diversidade de autores,

gêneros e obras. Sabe-se que o cânone é um legado cultural que necessita ser

trabalhado, no entanto, não se deve omitir obras que por alguma razão permanecem

à margem desse cânone, e que são expressivas quanto seu merecimento literário.

Cosson (2006, p.33) aponta como obras contemporâneas, àquelas escritas e

publicadas na época atual e como obras atuais as que têm sentido “agora”, não

interessando a época de publicação ou produção. A atualidade do trabalho literário

auxilia no interesse de leitura pelos alunos.

Em geral, a leitura de texto literário é utilizada como pretexto para alguma

“coisa”. A grande maioria dos professores trabalha com textos fragmentados,

seguidos de questionários, cujas respostas estão antecipadamente respondidas,

tornando inviáveis os questionamentos a respeito das várias impressões amparadas

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pelo texto; normalmente, seguem o roteiro do livro didático, ficando o estudante sem

fazer indagações sobre a obra do autor; o texto é colocado em função da gramática,

e não a serviço do texto; a maioria dos alunos leem para fazer avaliações, atividades

que valem nota. Essas atitudes são responsáveis pela recusa dos estudantes aos

textos literários, uma vez que não veem sentido em algo que é voltado apenas à

obtenção de nota. Com isso, afasta-se a leitura de sua função: possibilidade de

descobrir saberes indiscutíveis, de mostrar a abundância de suas impressões

poéticas, a vastidão de valores que se desabrocham ao diálogo com o leitor. Os

professores com práticas adequadas contribuem para a formação do prazer pela

leitura literatura, que é direito de todo e qualquer cidadão. Cosson salienta que, no

Ensino Fundamental, a literatura “engloba qualquer texto escrito que apresente

parentesco com a história da literatura” (2006, p.21).

Conforme Solé (1998, p.48), é necessário ir ao texto para buscar respostas,

para escutá-lo, para ter certeza, para compreender melhor, para buscar

incentivação, para criar outros textos e também para relaxar. Geralmente, o aluno

que não lê, declara que ler é maçante, chato e aborrecedor; que prefere a rede

mundial de computadores (internet), passeios e conversas; reclama que os livros

têm pouca imagem, suas letras são muito pequenas e/ou possuem muitas páginas.

Todos esses são empecilhos que cooperam para o atraso na prática de leitura

literária e para o ensino-aprendizagem da literatura.

Fundamentando-se em várias leituras, especialmente Rildo Cosson (2006),

infere-se que as atividades pedagógicas com textos literários devem tornar extensivo

o conhecimento dos alunos, deixando de lado a aplicação do estudo da gramática a

partir da leitura de fragmentos de uma obra literária e não se limitando em análises

descontextualizadas, em que o ponto de vista teórico e histórico são considerados

como mais importantes.

O professor deve desprender-se dessa prática ultrapassada, tradicional que

pode ser uma das causas pelo insucesso na formação de leitores prazerosos pela

leitura literária. O insucesso de não despertar o prazer pela leitura literária pode ser

atribuído ao fato de o texto literário não ser exposto de uma maneira encantadora.

Para Soares (2006, p.43), a partir da investigação no âmbito dos estudos

sobre letramento, é absolutamente necessário à escolarização da literatura; só

assim acontecerá às mudanças nas atividades escolares apresentadas aos

educandos.

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Neste sentido, o incentivo daquele que ensina e não fica amarrado apenas à

prática tradicional de ensino da leitura literária faz a diferença, pois esse valoriza o

ensino de Literatura. Com a recusa em ler textos literários, segundo Cosson “[...] a

Literatura passa a ser os filmes, as novelas, entre outros produtos culturais, com a

justificativa de que como a imagem e a voz estão tão evidentes nos dias atuais, a

leitura e a escrita perdem sua razão de existirem.” (2006, p.22)

O teórico (2006, p.20) assegura que a literatura só se mantém na escola por

força da tradição e do adormecimento curricular. O professor que organiza

exercícios descontextualizados da existência efetiva do educando, dá ênfase às

discussões de que o Ensino de Literatura esteja presente em sala, apenas para

preencher as exigências dos parâmetros curriculares, e não por sua missão

humanizadora, que para Candido:

[...] humanização é o processo que confirma que no homem aqueles traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor. A Literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante (1972, p.804).

Maria da Glória Bordini e Vera Teixeira de Aguiar (1988, p.40) justificam que

para garantir a continuidade do ato positivo referente ao livro, é inevitável que o

hábito não seja algo infligido e que a leitura esteja próxima da realidade do leitor,

suscitando perguntas expressivas para sua vida social. O ensino, nesse sentido,

deve conduzir o educando a formar seu comentário crítico a respeito de um texto,

desempenhando um papel essencial, na formação intelectual do aluno e na

formação de cidadão do mundo.

Cosson afirma que a literatura “[...] serve tanto para ensinar a ler e escrever,

quanto formar culturalmente o indivíduo (2006, p.20)”. Uma vez que o aluno sai dos

recintos escolares não tendo prazer pela leitura, certamente não será portador dessa

prática na sua vida. Como declara o autor, “a leitura fora da escola está fortemente

condicionada pela maneira como ela nos ensinou a ler” (2006, p.26). Dessa forma, é

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importantíssimo que o ensino da leitura literatura seja oferecido através de diferentes

textos, próximos de sua realidade histórico-social, para dispor percursos a fim de

que ele possa formar sua identidade, enquanto leitor, além de transformar-se num

sujeito “agindo sobre o mundo para transformá-lo e, para, por meio de sua ação,

afirmar sua liberdade e fugir à alienação”, como assegura Chiappini (2005, p.109).

Para Cosson, “[...] somente quando o processo de exploração se efetiva é

que podemos dizer que a leitura literária foi realmente alcançada com êxito” (2006,

p.29). É responsabilidade do professor dispor de subsídios para que o contato do

aluno com a literatura seja uma procura frequente de sentidos para o texto literário,

para o aluno e para a sociedade em que todos estão integrados, inseridos.

O professor e a instituição escolar são grandes intermediários das leituras

literárias, já que ambos exercem influência nas escolhas dos educandos. Aprender a

ler e ter prazer em ler textos literários precisam ser ações constantes, que não

necessariamente comecem na escola, mas que podem e devem evoluir, crescer,

prolongar-se no ambiente escolar.

Para incutir no aluno o prazer pela leitura literária, não é necessário substituir

os textos lidos, mas apenas uma mudança de olhar. Assim, trabalhando com textos

literários clássicos ou não, o professor pode fomentar modificações no olhar do leitor

e trocar a prática de leitura monóloga pela da compreensão ativa de bases

dialógicas (BAKHTIN, 1997, p. 99).

Segundo Solé (1998, p.49), para que alguém se torne um leitor autônomo e

competente é inevitável que aceite amparo e apoio de um mediador cultural que

utilize estratégias no momento da leitura e apresente uma variedade de leitura aos

alunos.

Por isso, o emprego de estratégias leva gradualmente à interiorização e ao

uso autônomo, permitindo ao aluno acionar os conhecimentos prévios sobre o

assunto e, desse modo, construir a interpretação do texto no percorrer da leitura.

Assim, perceberá a importância da leitura e sentirá prazer pela mesma.

As metodologias devem cooperar para a geração de leitores competentes e

as aulas devem ser programadas de acordo com as necessidades dos educandos. É

importante compreender que instruir requer saber planear, o que torna necessário

observar às necessidades e às características de aprendizagem dos alunos, os

propósitos educacionais e a obrigação do professor com o ensino.

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Sendo assim, “ [...] em sala de aula, diante dos alunos, o professor tem de

fabricar os malabarismos mais escabrosos a fim de desempenhar o seu papel de

orientador de leitura” (SILVA, 2005, p.11).

De acordo com Pennac (2008, p.13), “[...] o verbo ler não suporta imperativo”.

A leitura deve ser ensinada, mediada, partilhada e nunca forçada, obrigada. Não há

como transmitir, ensinar o aluno o prazer pela leitura sem mostrar a ele a relação

desse ato.

O verbo ler não suporta o imperativo. É uma aversão que compartilha com outros: o verbo amar… o verbo sonhar… É evidente que se pode sempre tentar. Vejamos: “Ama-me!” “Sonha!” “Lê!”“. “Lê, já te disse, ordeno-te que leias!” - Vai para o teu quarto e lê! Resultado? Nada. Ele adormeceu sobre o livro (…). - Ele acha que as descrições são demasiado longas. Temos de compreendê-lo, estamos no século do audiovisual, evidentemente, os autores do século XIX tinham de descrever tudo… - Mas isso não é razão para o deixarmos saltar metade das páginas! (p.11-12)

Assim, o leitor imerge no texto em busca do sentido do texto. Isso é o que

assegura Roland Barthes (2006, p.30), quando compara o leitor a uma aranha: “[...]

o texto se faz, se trabalha através de um entrelaçamento perpétuo; perdido neste

tecido - nessa textura -, o sujeito se desfaz nele, qual uma aranha que se dissolve

ela mesma nas secreções construtivas de sua teia”.

Dessa maneira, o ponto máximo de alcance e grandeza da leitura é a

imaginação do leitor. Ele constrói as imagens sobre o que está lendo. Por isso a

leitura se manifesta como uma atividade extremamente prazerosa. Através dela,

além de obter mais conhecimentos e cultura, experimenta-se novas experiências

que levam à reflexão e à apreensão da realidade. O indivíduo quando impelido pelo

desejo de desvendar, pela vontade de crescer, muda continuamente, transformando-

se a cada dia; também fica competente para entender até as entrelinhas daquilo que

escuta e enxerga, no sistema em que está integrado. Assim sendo, tem expandida

sua visão de mundo e seu horizonte de expectativas. Desse modo, a leitura

representa-se influente e indispensável meio para chegar à liberdade absoluta para

a sobrevivência do homem.

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Há, entretanto, um requisito para que a leitura seja de fato prazerosa e válida:

o anseio, a vontade daquele que é leitor. Retomando Pennac (2008, p.13), "o verbo

ler não suporta o imperativo", no instante que a leitura é transformada em obrigação,

ela passa a ser uma carga enfadonha, incômoda, pura chateação. Para causar o

desejo e propiciar o prazer da leitura, o autor diz que o leitor tem direito de escolher

o que quer ler, o que reler, o de ler em qualquer lugar e até o de não ler. Acatado

esses direitos, o leitor passa a respeitar e valorizar a leitura.

A forma como se trabalha com a leitura na escola é um conjunto,

consequência de toda bagagem cultural de vida. Assim sendo, as etapas seguidas

pelo professor no processo do trabalho com a leitura é importantíssimo. Partindo

disso, torna-se necessário planejar bem as aulas, para que o aluno compreenda o

desejo do professor ao optar por determinada atividade. No instante que isso ocorre,

o trabalho com a leitura assume um propósito e fica significativa ao educando e ao

professor.

Percebe-se neste estudo, que a leitura literária pode ser programada,

ensinada, estimulada, trabalhando-se com estratégias de compreensão leitora.

Nesse sentido, Solé (1998, p.47) diz que os professores precisam oferecer aos seus

alunos diversos modos de se ler um texto, que coadjuvem a percepção do texto que

lhe é apresentado, apreciando com reflexão sobre a construção do sentido do texto

pelo leitor, as estratégias (ferramentas empregadas que colaboram na compreensão

dos textos) utilizadas, o contexto, o conhecimento prévio do leitor e os diferentes e

diversificados gêneros textuais.

Cosson (2006, p.12) com o objetivo de buscar uma nova abordagem para a

leitura do texto literário, sugere o uso da expressão letramento literário, que equivale

ao “processo de letramento que se faz via textos literários e compreende não

apenas uma dimensão diferenciada do uso da escrita, mas também e, sobretudo,

uma forma de assegurar seu efetivo domínio”.

O letramento literário é primordial no processo educativo, exatamente para ir

além da leitura. Na escola, a leitura literária tem o papel de ajudar o aluno a ler

melhor, porque tem e entrega as ferramentas necessárias para conhecer e articular

com competência o mundo da linguagem e da leitura.

Com a intenção de realizar o letramento literário, Cosson sistematiza as

atividades de aulas de literatura em duas sequências, a básica e a expandida. Este

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artigo lançará mão apenas da sequência básica mostrando as quatro etapas:

motivação, introdução, leitura e interpretação.

O teórico sustenta que o processo de letramento literário não é semelhante à

leitura literária por fruição, indiscutivelmente, essa depende daquela. Ele afirma que

a literatura precisa ser ensinada nos estabelecimentos de ensino:

[...] devemos compreender que o letramento literário é uma prática social e, como tal, responsabilidade da escola. A questão a ser enfrentada não é se a escola deve ou não escolarizar a literatura, como bem nos alerta Magda Soares, mas sim como fazer essa escolarização sem descaracterizá-la, sem transformá-la em um simulacro de si mesma que mais nega do que confirma seu poder de humanização (COSSON,2006, p.23).

Sabe-se que as aulas de literatura sendo mais atrativas, estimulantes e

interessantes motivarão os educandos. Eles precisam de oportunidades para que

haja conversação entre leitor e texto, aproximando as questões relativas aos

saberes e experiências que acontecem como os alunos. Para alcançar tal desígnio,

o professor necessita conhecer e pôr em prática, adequar novas metodologias que

tornem as aulas mais cheias de energia, com mudanças constantes, enfim, devem

dinamizar as aulas de literatura.

Conforme Rildo Cosson, as metodologias podem ser aplicadas pelo educador

segundo às necessidades da escola ou de salas de aulas específicas. Afinal, se não

houver tempo suficiente para o emprego de um método na sua totalidade, ou se os

instrumentos de que se tem acesso não forem o bastante, acredita-se que com o

conhecimento de diversas proposições o educador faça uso daquilo que for mais útil

para seus intentos, tratando-se do desenvolvimento de leitura.

É indispensável que o professor seja um leitor de literatura e a compreenda

como um fenômeno artístico, linguístico e histórico-social com base na liberdade de

criação e na fantasia. Destaca-se, aqui, que nada deve reprimir, dificultar, impedir a

leitura do texto literário em si, pois em sala de aula é necessário dar preferência à

construção de sentidos que o estudante pode realizar através de sua leitura. Tzvetan

Todorov afirma que,

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[...] em regra geral, o leitor não profissional tanto hoje quanto ontem, lê essas obras [literárias] não para melhor dominar um método de ensino, tampouco para retirar informações sobre as sociedades a partir das quais foram criadas, mas para nelas encontrar um sentido que lhe permita compreender melhor o homem e o mundo, para nelas descobrir uma beleza que enriquece sua existência; ao fazê-lo, ele compreende melhor a si mesmo (2009, p.32).

Cosson torna claro que o termo letramento aplicado à literatura conserva a

ideia de um leitor que unicamente decifra o texto, a obra, mas também enxerga as

leituras realizadas como indispensável à sua formação.

A estratégia do teórico, a sequência básica e a expandida, são sustentadas

em três perspectivas: a da técnica da oficina, em razão à sua ludicidade e a

propriedade de aprender fazendo; a da técnica do andaime, uma metáfora sobre a

ideia da troca de conhecimentos entre professor e educando; e a última perspectiva,

a técnica do portfólio, que permite às anotações e à coordenação das atividades,

dos exercícios.

O autor assegura que as oficinas (p.122) podem ser empregadas como

motivação (acróstico, mudança na história, feira literária, entre outras) ao final da

leitura ou no momento que o docente desejar realizar algo variado em aula de aula.

Como ficou claro no decorrer do texto, é considerável evidenciar que a

escolha, aceitação de uma metodologia de ensino não limita o trabalho do docente,

mas o orienta de maneira que possa adequá-la, ajustá-la para a aula e assim seja

útil, apropriado, vantajoso à fruição da literatura.

Segundo as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006, p.55),

letramento literário é “[...] o estado ou condição de quem não apenas é capaz de ler

poesia ou drama, mas dele se apropria efetivamente por meio da experiência

estética, fruindo-o”. A partir dessa afirmação, vê-se a relevância do letramento

literário para a apropriação do texto, o que torna oportuno a construção de sentido

para o texto e, por conseguinte uma consciência crítica, autônoma e humanizada.

Observa-se, assim, que é por meio da leitura dos textos literários que o

educando irá formar-se enquanto leitor e pela intervenção do professor, o estudante

terá a competência de pôr em prática a leitura proficiente do texto literário e saberá

que a leitura não é um ato solitário.

Alguns professores julgam a leitura em sala de aula uma perca de tempo, por

pensarem que o ato de ler se limita à decodificação do material linguístico do texto;

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porém, “sabe-se, pelas pesquisas recentes, que é durante a interação que o leitor

mais inexperiente compreende o texto: não é durante a leitura silenciosa, nem

durante a leitura em voz alta, mas durante a conversa sobre aspectos relevantes do

texto” (KLEIMAN, 2007, p.24).

1.3 DIVERSIDADE

A escola é um lugar em que a diversidade cultural deve ser garantida e assim

todos tenham assegurado o direito de aprender e aumentar seus conhecimentos,

sem serem estimulados a tomar como próprios costumes, convicções e

comportamentos que lhes são contrários. Ela é o espaço ideal para a formação de

uma sociedade dinâmica, igualitária e multirracial, além de ser criadora de ensejos

para a ascensão social, pelo caráter formativo.

No currículo escolar, uma das intenções claras é instigar os educandos a

serem cidadãos críticos e participativos de uma sociedade democrática. Para

realizar esse objetivo, as instituições de ensino necessitam organizar-se de maneira

a levar em consideração os conhecimentos adquiridos das crianças, para que eles

não vejam a cultura a qual fazem parte rejeitada ou descriminada.

É necessário incluir nos currículos do Ensino Fundamental, práticas e

metodologias que tornem possível formar um sentimento de identificação,

recuperando a herança africana e sua influência na formação do Brasil.

Segundo Cavalleiro (2006, p.70), a educação brasileira torna pública a falta

de consideração quanto às relações raciais no planejamento das escolas, o que não

permite o favorecimento das relações respeitáveis e de igualdade entre os que

fazem parte do cotidiano escolar. Nesse sentido, o silêncio sobre o preconceito,

racismo e a discriminação racial nas instituições de ensino coopera para que as

diferenças entre os negros e brancos sejam percebidas como desigualdades

naturais, isso faz com que os negros afigurem-se como seres de pouco valor,

inferiores a outros em categoria ou dignidade.

Tais propostas demonstram o desejo de identificar nos textos literários

relações de racismo, discriminação e preconceito racial, mostrando nas atividades a

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valorização nas relações étnico-raciais, levando em conta à diversidade cultural

como um patrimônio de um povo, e denunciando o erro da suposta superioridade de

uma raça sobre outra.

Segundo Santomé (1995, p.71), quando se estuda os conteúdos que são

expostos minuciosamente no currículo das instituições de ensino, verifica-se que

aquilo que é enfatizado faz parte da cultura de nações preponderantes. As culturas

ou vozes das minorias geralmente são negadas, discriminadas ou silenciadas.

O processo educativo pode ser o viés para o resgate da autoestima e da

autonomia, pois o estabelecimento de ensino é o ponto de encontro e de choque das

diferenças, podendo ser o local para se conseguir diminuir e/ou impedir o processo

de exclusão social. Para isso é preciso caminhar em direção à construção de uma

educação multicultural.

Presume-se que os educandos ao refletirem sobre essa temática,

desenvolvam um juízo crítico sobre as ideologias que estão no seio da sociedade.

Espera-se que daqui a alguns anos a nova geração não permita a presença do

racismo, da discriminação e do preconceito racial no país. Trabalhar com as

diversidades e diferenças presentes em sala de aula é um grande desafio para os

educadores.

Rocha (2007, p.69) evidencia que, a instituição escolar deve estabelecer

como base, estratégias de ação para atuar de forma pedagógica com temas

subentendidos no âmbito escolar como a discriminação racial. Para tanto, é

necessário a reflexão de toda a comunidade escolar para que a escola não seja um

espaço excludente, mas integrador e inclusivo.

2 DESENVOLVIMENTO

O encaminhamento metodológico deste trabalho prático de letramento literário

realizou-se no Colégio Estadual Profª Izabel F. Siqueira – Ensino Fundamental e

Médio de Reserva do Iguaçu-PR, segundo o referencial teórico proposto pelo

professor Rildo Cosson em seu livro Letramento Literário: teoria e prática (2006).

Foram necessárias 28 aulas para a realização da intervenção pedagógica.

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A metodologia utilizada com os 25 (vinte e cinco) alunos da 5ª série (6º ano)

do Ensino Fundamental, turno matutino, foi a proposta de escolarização da literatura

empregando a sequência básica. “[...] a sequência não é algo intocável”. (COSSON,

2006, p.72).

Após conversação com os professores, dessa turma, sobre os objetivos da

implementação pedagógica a serem desenvolvidos, vários docentes aceitaram a

ideia de trabalharmos interdisciplinarmente. Os parceiros foram das disciplinas de

História, Geografia, Arte, Ensino Religioso, Inglês e Ciências. Os conteúdos

determinados foram todos relacionados com a África: história da África, clima,

localização geográfica, países e mapas, a colonização, costumes, idioma, religião,

dança, música, descendentes, riqueza e influência da cultura, culinária, escravidão,

etc. Essa parceria aumentou o conhecimento dos educandos, além de colaborar

com a promoção da igualdade das relações étnico-raciais.

A seguir, descrevem-se as etapas desenvolvidas a partir dos contos africanos,

as quais constam no Caderno Pedagógico.

Na Unidade I do Caderno Pedagógico, a motivação aconteceu de forma

lúdica, nela incitou-se o estudante para a leitura ofertada; diminuiu-se a distância

entre o leitor e a obra; estudou-se o tema do livro e a estrutura do texto; instigou-se

a curiosidade; preparou-se o leitor para receber o texto literário. A motivação

(27/09/11) foi realizada pela entrega de uma cópia do poema “Brancos, pretos,

amarelos” de I.L.Peretz/Trad: Tatiana Belinky. Os alunos foram convidados a

fazerem a leitura do poema (leitura silenciosa e depois em voz alta). Sugeriu-se que

cada fila lesse uma estrofe e depois vários prontificaram-se e cada aluno leu um

verso. Vários declamaram o poema. Discutiu-se o assunto/tema. Fizeram

comentários. Todos receberam o xerox da capa do livro “Menina Bonita do Laço de

Fita” (Ana Maria Machado, 2002) e indagou-se: Quem será esta garota? Que idade

ela tem? O que será que gosta de fazer? Quais suas características físicas? Qual

será o assunto/tema do livro? Com quem cada um se parece? Todos são iguais? Por

que as pessoas são diferentes? Todos deram respostas pertinentes aos

questionamentos. Foram necessárias duas aulas (contraturno), porque os

educandos empolgaram-se no momento da declamação do poema. Duração: 02

aulas.

Dia 28/09/11 (contraturno). Houve um breve relato sobre a autora Ana Maria

Machado; assistiram o livro eletrônico do Projeto “A Cor da Cultura”, a história da

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“Menina Bonita do Laço de Fita” (4min64s). Durante a apresentação, em

determinados momentos, aconteceram interrupções, e imagens do vídeo foram

fixadas na tela da televisão multimídia, para que pudessem tecer comentários (a

beleza da menina, sua cor, suas atividades). Após o vídeo, ocorreram as reflexões

(comparações, observações e análise entre o poema e o vídeo-livro), como por

exemplo: Ela é parecida com a mãe? Por quê? Há em sua família pessoas com o

mesmo tom de pele da menina da história? Todos os presentes em sala

responderam as questões. Atividades: criação de ilustrações referentes ao poema.

Alguns grupos recontaram a história utilizando fantoches. Também receberam a

história “Menina Bonita do Laço de Fita” separada por parágrafos para que

ilustrassem em casa. Duração: 02 aulas.

No contraturno (29/09/11), os educandos reuniram-se em duplas para

receberem imagens e fotos de afrodescendentes para que relatassem

(supostamente) as características físicas, psicológicas, profissão, idade e

escolaridade. Depois de realizada a atividade: apresentou-se a verdadeira

identidade das pessoas (nome, profissão, escolaridade, idade). Debateu-se sobre os

supostos enganos. Ficaram admirados pela grande quantidade de enganos e

compreenderam que não se deve julgar ninguém pela aparência ou cor de pele. A

seguir, realizou-se um passeio à Vila Copel no parque da Vila A (8 quilômetros

distante do colégio) para conhecerem o local. Três educandos já conheciam.

Duração: 01 aula (sem contar o passeio).

Iniciou-se a segunda etapa: a unidade II do caderno pedagógico, a introdução

(30/09/11-contraturno). O primeiro passo foi a entrega da obra/coletânea

selecionada: “Meus Contos Africanos,” seleção de Nelson Rolihlahla Mandela, 2009

(só há três obras na biblioteca do estabelecimento de ensino) e todos manusearam

rapidamente para aguçar a curiosidade e encontrar, na coletânea (p. 78), o conto “A

Vingança da Lebre,” que Phyllis Savory recontou. Apresentaram-se aos educandos

às informações básicas sobre o autor e a obra selecionada, sem muitos detalhes

biográficos (apresentação de um vídeo (curtíssimo) na televisão multimídia sobre

Nelson Mandela e Savory; comentários referentes ao vídeo e explicações; justificou-

se a razão da escolha do conto e sua importância, a fim de diminuir a sensação de

imposição da leitura; não foi apresentada a síntese da obra. Após a explanação

(rápida) sobre o que é prefácio, orelha, capa e contracapa, ocorreu à localização

(sempre mostrando no livro); as três obras foram recolhidas e distribui-se a cópia

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(xerox) da capa, contracapa, prefácio e orelhas, já que essas informações são

importantes para a compreensão, bem como os pontos de vista diferentes que

proporcionaram elementos para os debates que surgiram. Finalizada a explicação,

realizou-se a leitura coletiva dos elementos pré-textuais; instigou-se a curiosidade,

impressões presentes e o levantamento de hipóteses, estimulando-os a confirmá-las

ou rebatê-las depois de terminada a leitura integral do conto (explicando às razões

da primeira impressão). No momento de socialização os alunos compartilharam os

conhecimentos construídos através da indagação oral: Logo depois, aconteceu a

distribuição, em forma de um pequeno livro, do conto “A vingança da Lebre.” Os

alunos levaram a atividade para casa, a fim de realizaram a leitura e ilustrá-lo. A

proposta foi de que cada aluno, na unidade IV, trouxesse a atividade concluída.

Duração: 01 aula.

Unidade III (03/10 e 4/10/11), no contraturno: leitura propriamente dita. Cada

educando recebeu uma cópia do texto “Será que a minha cor vai sujar a água?”

retirado do livro “Xixi na Cama” de Drumond Amorim, 1979, para a realização da

leitura silenciosa (com o propósito de levá-lo a experimentar a leitura e não só ouvi-

la pelo professor) em sala de aula. A seguir, vários alunos pediram ajuda quando

encontraram dificuldade (compreensão de vocabulário, estrutura composicional,

ritmo da leitura, interação com o texto ou de partes do texto) na leitura e o auxílio

superou os obstáculos encontrados. Em seguida, realizou-se a leitura coletiva (cada

aluno lia um parágrafo) e posteriormente foram realizadas as indagações orais a

respeito das “impressões” sobre o texto, isso para identificar se os mesmos

perceberam qual é o tema (assunto). Esse foi o momento de conversação com a

classe. A principal dúvida entre eles era a diferença entre racismo, preconceito e

discriminação racial. Esclarecido, de uma forma clara e simples, após explicações e

exemplos reais, acontecidos na comunidade, discutiu-se um pouco mais sobre o

assunto. Dois alunos afrodescendentes contaram que já foram discriminados pela

cor da pele e classe social na própria escola. Após os relatos a atividade proposta

foi o caça- palavras com palavras pejorativas (ofensivas, humilhantes) que estão no

texto e referem-se ao garoto (personagem principal). Ninguém deixou de realizar a

tarefa, encontrando todos os vocábulos. Outra atividade individual solicitada foi a

criação de acrósticos (relembrar o que é acróstico com exemplos no quadro), sendo

o tema racismo, discriminação e preconceito racial (já explicado e exemplificado

anteriormente). Um apoio utilizado pelos alunos foram os dicionários. Questões para

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conversação sobre o texto (sentados e em círculo). A participação de todos os

alunos foi surpreendente, todos responderam. Alguns educandos perguntaram se

poderiam dramatizar o texto “Será que a minha cor vai sujar a água?” e a resposta

foi positiva; concordaram em apresentá-la numa data a ser combinada. Duração

duas aulas.

Chega-se ao momento do intervalo de leitura (unidade IV - 05/10/11). Ao

iniciar a aula os educandos mostraram o conto ilustrado “A vingança da lebre”

(exposição do trabalho no saguão). Conversação, indagação superficial (sondagem)

sobre o conto. Os estudantes contaram a história. A partir disso, os educandos

receberam o passo a passo de como fazer uma dobradura de coelho e outra de boi

(animais que aparecem no conto). Iniciou-se esta tarefa em sala de aula com a

devida explicação e levaram-na para terminar em casa. Duração: 01 aula.

A partir das informações agregadas nas etapas precedentes, os educandos

fizeram a dedução de uma informação a partir de outra, isto é, momento em que o

sentido do texto principia a sua construção. O ponto de partida da aula da unidade V,

dia 06/10/11, foi o momento da interpretação (interior que abrange a decifração e o

momento exterior que é a materialização da interpretação), parte mais considerável

do método, instante da formação do sentido do texto. Isso acontece na ocasião que

o aluno teve o ensejo de principiar a compreensão da obra até chegar à

concretização da interpretação, como processo de construção do sentido. Antes da

próxima tarefa exibiram suas dobraduras. A próxima atividade foi responder às

questões orais referentes ao texto. Duração: 01 aula.

A primeira atividade da aula do dia 07/10/12 (contraturno) foi relembrar o que

é quadra popular e paródia (exemplos no quadro de giz). Foram entregues o xerox

de algumas quadrinhas para que fizessem paródia delas e de outras que eles

soubessem (assunto/tema: racismo, discriminação e preconceito racial). Comprovou-

se que realizaram o exercício de maneira correta ao lerem suas quadras em voz

alta. Todos os educandos apresentaram e elas foram expostas no saguão, após

correção. Teve o momento da conversação descontraída para o lançamento da ideia

da Roda do Conto Africano (explicação do objetivo, compartilhar sugestões, escolha

do lanche, local, data, horário). Decidiram que nesse dia, no Parque da Copel, seria

levado um baú repleto de contos africanos e de outros gêneros textuais: crônica,

poesia, charge, cartum, música, propaganda, notícia entre outros. Explicou-se que

nos encontros, após a conversação sobre o conto escolhido, trocam-se opiniões,

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ideias. Definiram-se as datas dos encontros e que seriam no contraturno. Tarefa:

averiguação referente ao conto “A vingança da Lebre.” Duração: 1 aula.

A unidade VI foi a Roda do Conto Africano (10/10 e 11/10/11 – contraturno). O

micro-ônibus da Prefeitura Municipal de Reserva do Iguaçu transportou a todos até o

Parque da Vila Copel. Chegando lá, realizou-se a Roda do Conto Africano (contos

fotocopiados já se encontravam no baú). Um aluno tirou do baú um conto (curto)

para leitura do professor em voz alta. Foi oportunizado após a leitura um momento

para discussão (participação geral). Outra ação: leitura do conto “A Vingança da

Lebre”, em voz alta pela professora. Cada aluno trouxe seu conto ilustrado. Teceram

comentários positivos sobre a leitura e suas colocações foram surpreendentes.

Falaram de suas impressões, das ideias concebidas antes da leitura do texto e da

confirmação ou não das hipóteses levantadas. Dramatizaram os contos utilizando

máscaras Realizaram de forma satisfatória a tarefa (alguns modificaram o desfecho,

outros dramatizaram apenas a parte de que mais gostaram e outros colocaram mais

personagens). Solicitou-se aos alunos que escolhessem qual opção de registro seria

a mais apropriada: quadras, poesias, acrósticos, poemas cinéticos (apresentação de

modelos de poemas cinéticos para relembrá-los), tiras e/ou HQ. Estas produções

farão parte de uma coletânea a ser apresentada para a comunidade escolar no

término da implementação do projeto. Último trabalho do dia: dramatização do texto

“Será que a minha cor vai sujar a água?” e das outras histórias inventadas para

apresentação com os fantoches. Duração: duas aulas. As brincadeiras, o lanche e

dramatizações do texto “Será que a minha cor vai sujar a água?” resultaram em mais

duas aulas e meia. Em todas as atividades propostas houve a participação total dos

educandos.

A unidade VII (13/10 e 14/10/11 - contraturno) – Momento da motivação:

Distribuição de fotocópias de figuras de animais para que os alunos brinquem do

jogo da memória (vencedores receberam um gibi). Exibição do filme “João e o Pé

de Feijão” (com personagens humanas). Distribuição de um quebra-cabeça para

cada educando montar (foram expostos no mural e na parede da sala). Em seguida,

cada um recebeu um cartum (fotocópia colorida) para que observasse

detalhadamente a imagem (um lobo correndo atrás de uma ovelha preta e as outras

que eram brancas ficaram só observando, não fugiram). Provocou-se a reflexão

através de questionamentos sobre João e o Pé de Feijão, o cartum e o conto “A

Vingança da Lebre”. Duração: 2 aulas.

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Nesta etapa, a unidade VIII (17/10/11 - contraturno), o conto escolhido foi “A

tartaruga e o gigante.” Apresentou-se a obra fisicamente. Na televisão multimídia

viram um brevíssimo relato sobre o escritor e da ilustradora da obra. No laboratório

de informática deram asas à imaginação: cada um digitou seu texto abaixo das

imagens. Imprimiram e colaram no caderno. Distribuíram-se fotocópias de carta e

história enigmática para decifrarem (tema: discriminação racial). Duração: 01aula.

Na data de 18/10/12, distribuiu-se uma cópia, na íntegra, do poema “Irene no

Céu” (Manuel Bandeira). Conversação rápida sobre o autor do poema. Leitura

silenciosa realizada pelos alunos. Dramatização da poesia pelos alunos. Entregou-se

para cada educando a cópia do conto “A tartaruga e o Gigante” e o professor fez a

leitura em voz alta. Em seguida, cada aluno que se prontificou leu um parágrafo.

Conversação oral sobre os contos “A tartaruga e a Lebre”, “João e o Pé de Feijão” e

o poema “Irene no Céu.” Atividade entregue para realizar em casa: confecção de

dedoches (referentes aos personagens dos contos e poemas). Duração: 01 aula.

No pátio do colégio (embaixo das árvores), ao lado da biblioteca, realizaram-

se as atividades. Comentários, indagações, questionamentos, externalizações sobre

as obras “Irene no Céu”, “João e o Pé de Feijão”, “A tartaruga e o Gigante”

aconteceram nesta unidade X (19/10/11 – contraturno). Outra atividade: conversação

sobre a lenda do Saci-Pererê. Inicialização do brinquedo cantado “O Saci-Pererê” e

Samba Lelê. Tarefas para casa: a) ilustração de uma cena do conto, uma do vídeo

(conto) e outra do poema (depois de pronto explicar aos colegas porque a cena é

merecedora de ser reproduzida); b) registrar o resultado da externalização da leitura:

produção de paródias de quadras (versinhos), poesias; produção de acrósticos.

Duração: 01 aula.

As ações da unidade XI aconteceram no dia 20/10/11, no contraturno, no

Parque da Vila Copel – Roda do Conto Africano. Um aluno dirigiu-se até o baú e

escolheu o conto “A princesa, o fogo e a chuva”, retirado do livro: “O príncipe

medroso e outros contos africanos” (p.27) de Anna Soler- Pont. Tradução de Luis

Reyes Gil. Apresentação da obra aos alunos: título, capa, contracapa, orelha,

imagens. Comentário rápido sobre a autora, o ilustrador e o tradutor. Ativou-se o

conhecimento prévio, estabeleceram-se previsões sobre o tema e criaram-se

expectativas; questionamento oral, provocações (não leram o conto). Desenharam e

expressaram o sentido literal do texto (espera-se que essa ilustração mude de foco

após a leitura e discussão do conto). Distribuição de uma cópia do conto para cada

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aluno (leitura silenciosa pelos alunos e o professor em voz alta). No momento da

discussão alguns alunos constataram e outros refutaram as hipóteses levantadas

antes da leitura. Aconteceu a reflexão, externalização e compartilhamento das

interpretações. Analisou-se os desenhos; comparações. Duração 02 aulas (sem

contar as brincadeiras e o tempo para o lanche).

Na próxima etapa do trabalho, dia 21/10/11 – contraturno, realizou-se uma

sondagem para saber se já assistiram ao filme “A princesa e o sapo”. Todos

confirmaram que assistiram quando cursavam a 4ª série. Teceram-se comentários

sobre a animação que apresenta a primeira heroína negra da Disney Feature

Animation. Foram entregues cópias de quatro cenas do filme “A princesa e o sapo”,

a cada aluno, para que colorissem e registrassem por escrito um ou dois parágrafos

abaixo de cada cena. Duração: 01 aula.

Em 25/10/2011 - contraturno: Interpretação e o compartilhamento da

interpretação referente ao filme “A princesa e o sapo” e também o conto “A princesa,

o fogo e a chuva”. A produção escrita realizou-se através das paródias de quadras e

poesias; poemas cinéticos e acrósticos. Correção de produções anteriores. Duração:

01 aula. 28 /10/11 - contraturno: Continuação das produções e correções. Duração:

01 aula. 01/11/11: Apresentação com os dedoches das histórias referentes aos

personagens dos contos e poemas estudados. Correção das atividades anteriores.

Duração: 01 aula. 03/11/2011: conversação sobre a organização da coletânea

(produção final). A decisão foi a seguinte: os textos serão digitados nos

computadores do laboratório de informática pelos próprios alunos e com auxílio do

funcionário responsável. Ficou decidido que haverá exposição e apresentações dos

trabalhos no Pavilhão da Igreja Católica e os professores parceiros colaborarão na

decoração, na confecção dos convites e nas apresentações dos trabalhos de seus

alunos (dança, música, documentário, desenhos, vestimentas, etc). A comunidade

será convidada para apreciar os trabalhos e a coletânea (110 páginas). Duração: 01

aula. 08/11/11 – Início da digitalização das produções (paródias: quadras e poesias;

acrósticos, poemas cinéticos). 10/11/11- continuação da digitalização das produções.

Duração: 02 aulas.

Momento da exposição: realizou-se dia 25/11/11, com início às 14 horas, no

Pavilhão da Igreja Católica. No espaço estavam expostos os trabalhos manuais, as

vestimentas, as três coletâneas, cartazes com explicações; os educandos

declamaram suas poesias; apresentação do documentário e das danças. O

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resultado foi um sucesso. Compareceram muitos pais, alunos e a comunidade em

geral. Notou-se que o trabalho realizado em parceria com os professores de outras

áreas surtiu efeito positivo. Foram três horas de apresentações. O comentário dos

professores foi que os educandos durante a implementação participaram mais de

suas aulas: faziam comentários, questionavam, mostravam curiosidade sobre os

assuntos tratados em sala de aula.

Os professores inscritos nos Grupos de Trabalho em Rede - GTR fizeram

parte deste trabalho, pois juntamente com eles, durante a implementação, pode-se

socializar o projeto e a produção (material didático/caderno pedagógico), que ficou

disponibilizado por meio do ambiente virtual de aprendizagem (e-escola). As

intervenções dos professores, sugestões e incentivo relacionados ao assunto

abordado estimularam o debate e a interação dos integrantes do GTR.

Para que fosse possível alcançar os resultados positivos esperados, foi

necessário anotar cada aula no diário, sendo ele utilizado para que a Equipe

Pedagógica da escola e o Professor Orientador da IES (Unicentro) pudessem

acompanhar as ações durante o processo de Implementação do Projeto na Escola.

O máximo de empenho foi alcançado no registro das questões apresentadas, pois

foi avalizado pela equipe pedagógica e apresentado à orientadora em cada uma das

orientações, a fim de subsidiá-las.

Percebeu-se que a riqueza e o arrebatamento provocado pelos contos

formaram o caminho para a implementação deste projeto de afirmação da cultura

negra em toda escola, na proposta pedagógica do colégio em 2012.

Observou-se através do interesse e participação dos educandos, nas diversas

atividades, que o projeto despertou o prazer pela leitura literária, além de fazê-los

refletir sobre procedimentos preconceituosos, promovendo a crença na liberdade, no

respeito e no apreço pelas tradições e valores alheios.

3. CONCLUSÃO

As atividades detalhadas neste artigo estão contidas no caderno pedagógico,

que foi fruto do comprometimento e participação nos estudos propiciados pela

política de formação continuada para professores da SEED (Secretaria Estadual de

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Educação - PR), o Programa de Desenvolvimento Educacional do Paraná (PDE) -

Turma 2010. A elaboração do caderno pedagógico ocasionou questionamentos e

com seus apontamentos, possibilitou a elaboração de um material com capacidade

de auxiliar o aluno e o professor.

O Caderno Pedagógico foi claro e organizado quanto à sua proposta de

ensino, oferecendo aos alunos um ensino dinâmico, inovador e assim, enfim, a

prática foi efetivada. Os alunos puderam perceber prazer e aprendizado na prática

da leitura literária e também começaram a adotar atitudes de combate ao racismo,

discriminações e preconceito racial.

Após uma avaliação de todo o trabalho desenvolvido, verificou-se que não

houve descompasso entre teoria e prática. O planejamento baseado na metodologia

de Rildo Cosson (sequência básica) deu resultado, alcançaram-se os objetivos

propostos. Percebeu-se, na medida em que se desenvolviam as etapas, o quanto os

educandos estavam gostando das atividades e demonstravam interesse pela leitura.

Os educandos mostraram-se conscientes da necessidade da promoção da

igualdade das relações étnico-raciais no ambiente escolar e fora dele.

Demonstraram por meio de suas conversações e interpretações que foram além da

decodificação. Isso prova que o papel do professor na formação do indivíduo e no

desenvolvimento da cidadania é factível.

Os professores, parceiros nesta jornada, constataram mudanças no

comportamento dos alunos. Eles ficaram mais curiosos e participativos em sala de

aula e o interesse pelos conteúdos aumentou. O envolvimento desta turma com as

disciplinas parceiras, durante a implementação pedagógica, surtiu efeito positivo:

notas melhoraram e diminuíram consideravelmente as brigas, deboches e a

discriminação. Observou-se que apenas quatro alunos não demonstraram interesse

em ler, após o término da implementação pedagógica.

A proposta deste projeto continuará nos anos subsequentes, pois contribuiu

de maneira fundamental para o aprendizado dos educandos. Acredita-se que o

trabalho interdisciplinar, ativo e objetivo, promoveu a construção do conhecimento

pela parceria, desafio, reflexão e interação criativa.

O comprometimento, aqui exposto, mostra que se pode começar o trabalho

de escolarização da literatura através da sequência básica, para que a proximidade

do educando com a literatura seja uma procura contínua de acepção própria ou

figurada para o texto literário.

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A metodologia aqui exposta não deve ser considerada como a única forma de

se trabalhar com leitura literatura, mas ela cooperou para o alcance dos resultados.

Constatou-se por meio das observações, durante as aulas, que houve contribuição

pedagógica, onde os resultados foram consistentes e produtivos.

Em resumo, a organização do ensino sistemático e constante com os contos

africanos desempenhou importante estratégia didática, tanto para a promoção da

igualdade das relações étnico-raciais na escola, como sendo o gênero textual que

contribuiu para despertar o prazer pela leitura literária. Novos conceitos foram

edificados por meio da propagação de outras ideias e conhecimentos, que foram

capazes de estimular comportamentos favoráveis à convivência e ao respeito, à

igualdade nas relações entre as crianças.

Espera-se que o presente trabalho sirva de subsídio para os docentes de

Língua Portuguesa, no sentido de contribuir com a prática do ensino da leitura

literária em sala de aula.

4. REFERÊNCIAS

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