Lar Católico: a Igreja e a função pedagógica da imprensa 1 · suplementos e editoriais podem...
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Lar Católico: a Igreja e a função pedagógica da imprensa1
Luiza Quinet Ramos Perez 2
Christina Ferraz Musse 3
Universidade Federal de Juiz de Fora
RESUMO
Este artigo tem por objetivo analisar o conteúdo do jornal Lar Católico que era
publicado em Juiz de Fora, cidade da Zona da Mata Mineira. Teve circulação nacional
durante o período compreendido entre 1912 e 1986. Baseando-se no estudo de edições
do ano de 1964, analisou-se o impresso em um específico recorte de tempo. Além disso,
foi utilizado o método de pesquisa oral, com o intuito de aprofundar os conhecimentos
sobre o contexto histórico e o leitor que utilizava o veículo durante o primeiro ano do
golpe militar. Foram revisitados o cenário da época, a ideologia e informações técnicas
do jornal. O Lar Católico era um jornal de referência, cujo objetivo era ser um guia para
famílias cristãs. Foi um dos periódicos de cunho religioso que circulou durante mais
tempo no Brasil. Isso revela sua importância para os estudos de história do jornalismo.
PALAVRAS-CHAVE: jornalismo; história; imprensa especializada; Lar Católico.
Introdução
Em uma análise mais profunda dos jornais impressos no Brasil, é possível
verificar, desde 1820, a presença de padres no cargo de redator de vários periódicos.
Segundo a jornalista Marialva Barbosa, alguns jornais mineiros que eram feitos por
esses representantes do clero eram: O Paraibuna, Cidadão Livre, O Echo do Serro,
Athleta Sabaraense, Pregoeiro Constitucional, O Guarda Nacional Mineiro, entre
outros. A partir de um número tão expressivo de jornais feitos por religiosos, é possível
perceber a grande importância que a Igreja tinha na formação da sociedade. Esse
impactante número de periódicos indica que o clero possuía um papel central na
produção de impressos no Brasil. Pode-se notar também que os impressos analisados
1Trabalho submetido ao III Encontro Regional Sudeste de História da Mídia no GT de História da Mídia Impressa
2Bolsista de iniciação científica do projeto “Memórias da Imprensa de Juiz de Fora”, estudante de graduação do 3º
período de Jornalismo na Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail:[email protected] 3Jornalista, mestre e doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ. Professora da UFJF no curso de Jornalismo e no
Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Coordenadora do projeto “Memórias da Imprensa de Juiz de Fora”.
E-mail: [email protected]
por Barbosa circulavam por um curto período de tempo, o que era comum naquele
período de imprensa artesanal, mostrando mais uma vez a expressão que o Lar Católico,
que circulou por mais de 70 anos, possuía no cenário brasileiro.
Os jornais eram um meio interessante que os sacerdotes usavam para chegar aos
seus fiéis e ensinar-lhes, dessa forma, os pilares da Igreja Católica. Para a população
leitora, o jornal era um veículo de fácil acesso, porém dirigido para uma elite. O Lar
Católico não era feito para a massa, a população em geral, mas para formadores de
opinião. Isso quer dizer que os leitores do periódico exerciam influência, já que
possuíam mais informações sobre os assuntos tratados no jornal. Portanto, os padres
faziam jornais em prol da Igreja e da doutrina que queriam disseminar.
No recorte de tempo estudado pelo artigo, que vai de 1964 e 1986, com um
maior foco no período da ditadura militar, havia uma “ameaça comunista” contra o ideal
pregado no catolicismo. Além disso, o movimento comunista era contra as práticas
religiosas capazes de dificultarem a sua expansão. Tendo em vista um oponente às suas
ideias, a Igreja Católica tentou difundir os próprios valores e crenças através, também,
de jornais presentes no cotidiano dos brasileiros. A imprensa cristã que ia de encontro
aos princípios do comunismo e de instituições laicas era chamada de “boa imprensa”,
dando a entender que essa era a que deveria ser seguida. Vale ressaltar que o uso dos
jornais não era a única estratégia utilizada para tal difusão (LUCENA, 2011, p. 11).
Portanto, acreditou-se que os meios de comunicação seriam um lugar adequado
para disseminar o ideário da Igreja Católica frente ao posicionamento laico. Segundo a
socióloga Zaira Ary:
A Igreja Católica foi por mim encarada como uma instituição
produtora de símbolos, de valores e de normatizações estritas, visando
a assujeitar a consciência e a ação de seus adeptos aos limites morais
impostos por sua doutrina, apesar também de levar em conta as
possíveis adaptações espaciais e temporais e as transgressões das suas
normas prescritas, reavaliadas e perdoadas, [...](ARY, 2000, p.18).
Na primeira edição do ano de 1967, o jornal Lar Católico definia-se como um
formador da opinião pública do Brasil e em perfeita consonância com a doutrina
católica, atuante, moderno e profundo no noticiário (LAR CATÓLICO, 1967). A partir
dessa auto definição, é possível perceber que a tendência do impresso era dialogar com
a sociedade sobre temas que fossem de interesse coletivo, formando, com isso, um laço
com o público leitor. Tal meta deveria ser atingida sem que o jornal esquecesse seu
principal pilar: a defesa do mundo baseada na doutrina cristã.
O Lar Católico, além de informar acontecimentos pertinentes à Igreja, também
instruía seu leitor. Tentava formar um “bom cristão”, influenciando no modo de agir e
pensar do seu alvo. O impresso, que era publicado semanalmente, estava presente na
rotina daqueles que acompanhavam o mesmo. Por isso, acabava alcançando seu
objetivo: difundir a base católica nos lares de famílias.
Lar Católico, o jornal que divulgou a fé por 70 anos
A partir de estudos de exemplares do jornal Lar Católico, no recorte temporal
que abrange desde o ano de 1964 até o de 1985, foi possível recolher alguns dados
técnicos do periódico. É importante ressaltar que informações como número de páginas,
suplementos e editoriais podem variar de acordo com o período analisado.
O jornal, fundado em 7 de janeiro de 1912, pelo padre Venâncio Café, que hoje
dá nome a uma famosa rua de Juiz de Fora, a Padre Café, era publicado pelos
missionários do Verbo Divino, uma congregação cristã que, segundo os próprios
membros, em sua página na internet, tem como objetivo “proclamar a palavra de Deus”:
Como missionários do Verbo Divino consideramos que a nossa
obrigação é proclamar a palavra de Deus a todas as pessoas e suscitar
novas comunidades do Povo de Deus. A nossa vida e trabalho se
caracteriza pelos projetos missionários que temos acentuado a
diversidade e a universalidade (VERBO DIVINO, 2013).
O jornal, portanto, era um veículo utilizado pela congregação para proclamar a
palavra de Deus a uma grande quantidade de fiéis. O editor-chefe era o padre Edmundo
Leschnhak. Alguns colaboradores do jornal foram: padre Henrique Alla, Roberto Vicent
Themudo Lessa, Maria Madalena Ribeiro de Oliveira, Maria da Conceição Ribeiro de
Oliveira, Raya Júnior, padre José Fernandes de Oliveira (Zezinho), padre Tadeu
(Dadeus), Antônio Carlos de Assis Moreira, padre Sisnando, Beatriz A. Horta Barbosa.
Isto é, escreviam no jornal padres e leigos. É necessário destacar que o corpo de
colaboradores também variava de acordo com o período analisado. A gráfica, Esdeva
Empresa Gráfica Ltda. e a redação responsável pelo impresso ficavam localizadas na
Rua Halfeld, número 1179, no centro da cidade de Juiz de Fora.
(Lar Católico, 18 de Julho de 1980, p. 1)
O periódico tinha formato standard, com cerca de 55 centímetros de
comprimento por 29,7 centímetros de largura. O jornal continha, geralmente, oito
páginas, e foi aumentando com o decorrer do tempo. Ou seja, esse número variava
conforme o jornal ia atualizando seu conteúdo. Possuía imagens, fotos e ilustrações,
mas era impresso em preto e branco. A periodicidade de sua distribuição era semanal, e
o Lar Católico era entregue nas casas de seus assinantes, ou enviado pelos correios. A
partir dos assinantes, outros cidadãos também poderiam ler o jornal, ou seja, o jornal
também era compartilhado com outros leitores pelos assinantes:
O interessante é que os redatores revelam que o jornal possui mais de
160 mil leitores no Brasil. O número de leitores não corresponde ao
número de assinantes, pois se sabe que apenas uma assinatura pode
gerar mais de um leitor (LUCENA, 2011, p. 84).
O jornal continha vários suplementos. Um suplemento, de acordo com a
professora e mestre em Comunicação, Carmen Carvalho, tem a função de dividir as
informações contidas no veículo de forma que o público tenha facilidade de encontrar o
que procura naquele momento específico (CARVALHO, 2007). Os suplementos que o
impresso possuía eram: Vocacional, Estrêla das Missões (mensal) e Lar Católico. O
Vocacional tinha foco em orientações relacionadas à Igreja Católica; o Estrêla das
Missões descrevia atos missionários realizados pela comunidade; e o suplemento com
nome igual ao do periódico dialogava com os assinantes e com os ideais cristãos,
orientando a família leitora em diversas situações, fossem elas cotidianas ou religiosas.
A partir das informações descritas, é possível afirmar que o jornal seguia o
carisma proposto pelos missionários do Verbo Divino, orientando a família cristã de
maneira ativa, contando com um grupo grande de colaboradores e uma grande
quantidade de informação que levava “luz” a essas casas.
O Lar Católico frente ao golpe
Segundo o sociólogo Pedro Ribeiro de Oliveira, o catolicismo foi a religião
oficial amparada pelo Estado brasileiro graças ao regime de Padroado. Já em 1890, o
Estado é separado da Igreja pela República, quando a mesma Igreja sofre uma profunda
reestruturação, que a fez igualmente ou até mais forte que antes. Com o governo de
Getúlio Vargas, em 1931, Estado e Igreja se reconciliam e esta se torna a guardiã da
ordem moral, utilizando também a educação para esse fim:
Em suas escolas forma pessoas respeitadoras da ordem social, e é
atendida pelo Estado, que protege por lei a família nos moldes
católicos e seus valores morais. Símbolo desse pacto de mútua
colaboração é a imagem do Cristo Redentor, inaugurada em 1931, no
ponto mais alto da então capital da República (OLIVEIRA, 2014).
No período de tempo enfocado por este artigo, o tema abordado será o golpe
militar de 1964, que inaugurou o período ditatorial no Brasil. Para a professora Christa
Berger, o golpe foi vivido, testemunhado, apoiado pelos donos de jornais e contados
pela imprensa (BERGER, 2005, p. 60). Assim como a imprensa nacional, o jornal Lar
Católico, principalmente por sua ideologia, conservadora como a maior parte da Igreja,
apoiou o golpe. Mas, como explica Pedro Oliveira, um novo setor surgiu na Igreja
durante o governo de Juscelino Kubitschek, minoritário, que incomodava as classes
dominantes, pois para elas, a religião não devia contestar a ordem. Essa pequena parcela
enfrentava grande oposição:
Àquela corrente opunha-se a corrente majoritária da Igreja, cujo
envolvimento político era somente em favor da estabilidade da família
(combater o divórcio, era sua grande bandeira) e não por reformas
sociais. Este setor preparou o clima para o golpe de 1964 com o
“Terço em Família” e a “Marcha da Família com Deus pela
Liberdade”. Este setor deu total apoio ao golpe, enquanto o outro se
opôs o quanto pôde (OLIVEIRA, 2014).
Enquanto a parcela majoritária da Igreja era a favor do golpe, assim como o
impresso aqui analisado, o comunismo sofria a mesma retaliação por parte de tal
instituição. É possível verificar esse comportamento na edição do dia 24 de maio de
1964, que continha a seguinte ilustração, que mostra que as reformas pensadas pelo
governo de João Goulart poderiam ter levado o Brasil a uma guerra civil:
(Lar Católico, 24 de maio de 1964)
A partir de tal imagem, é possível perceber que o jornal consegue demonstrar
seu ponto de vista. Sabendo de sua credibilidade, a Igreja utiliza, também, o meio
impresso para disseminar sua palavra. Para isso, utilizam os jornais em uma tentativa de
atingir e influenciar cada vez mais pessoas. A imprensa católica deve, portanto, adotar
as seguintes tarefas:
A imprensa católica deveria contribuir com a restauração social
efetivando as seguintes tarefas: divulgar a doutrina social da Igreja,
informar sobre as atividades dos inimigos e sobre os meios de
combate já experimentados nas diversas regiões, propor sugestões e
alertar contra os comunistas (DIAS, 1993, p. 109).
Apesar da importância da imprensa católica, o sociólogo Pedro Oliveira acredita
que os programas católicos nas rádios, a existência de escolas e obras sociais como
pregações, catequese, associações beneficentes, associações pias e, principalmente, a
Ação Católica são de muito maior importância que os jornais propriamente ditos. Além
disso, o meio mais intenso de cconhecer a ideologia católica é, certamente, a própria
atividade religiosa (OLIVEIRA, 2014).
Assim como o jornal Lar Católico tinha por objetivo disseminar a doutrina
cristã, a rede de colégio Jesuítas, conhecida mundialmente por suas raízes católicas,
compartilha o mesmo objetivo. Inclusive, na cidade origem do impresso, existe um
tradicional colégio dessa rede. Os colégios, como afirmou o sociólogo Pedro Oliveira,
têm grande importância na formação cristã e na interiorização da palavra divina.
Os colégios realizam a função substantiva de educar com uma
finalidade específica: colaborar com o processo de evangelização da
Igreja por meio da educação. A função imediata da escola
(transmissão da cultura) é realizada em um ambiente animado pelo
espírito evangélico de liberdade e caridade (JESUÍTAS BRASIL,
2014).
Portanto, é possível perceber a pluralidade de formas que a Igreja Católica
possuía para disseminar sua palavra.
Conteúdo do impresso
Orientações direcionadas à família católica, informações da Igreja de todo o
mundo e conteúdo opinativo preenchido de ideologia católica sobre obras que
circulavam na época, além de conselhos para aqueles que procuravam um caminho
guiado pela disciplina cristã: esses eram alguns princípios adotados na concepção do
jornal. Em épocas específicas, como o dia das mães e o dos pais, o impresso trazia uma
edição especial voltada para tais datas, ressaltando a importância de figuras cotidianas
da família, que, nessas datas, de acordo com a ideologia cristã, mereciam uma atenção
especial. Vale explicar que o jornal não era dividido por editorias, era feita apenas uma
organização por títulos de páginas.
O mais importante conteúdo abordado é o da Página de Orientação Familiar
que corresponde à página 3 do jornal analisado. Tanto que, uma parte da mesma, cujo
nome era Intercâmbio com os Leitores variava de acordo com a edição do jornal. Nela,
os assinantes enviavam dúvidas e dilemas que enfrentavam, tentando encontrar, com a
ajuda do jornal, formas de viver de acordo com a ideologia católica. O papel do jornal
era, portanto, auxiliá-las, dando o conforto que as pessoas procuravam através do
mesmo. O Lar Católico demonstrava, com isso, um importante papel, trazendo
tranquilidade e paz de espírito para os leitores. A família tinha o periódico como grande
conselheiro, isso devido à sua forte influência no cenário nacional. As cartas enviadas
pelos leitores nessa sessão do impresso vinham com pseudônimos, ou seja, a pessoa não
era exposta dentro da comunidade. Um exemplo desse intercâmbio é uma mulher que,
em sua carta, pede para ser publicada sob o pseudônimo escolhido: “Desesperada” (LAR
CATÓLICO, 1964). Em seu desespero, ela pede para o jornal aconselhá-la em um caso
amoroso. A mulher pensava em cometer suicídio, já que não encontrava razão para
manter-se nesse sofrimento. Segundo ela, “Da minha parte, fiquei arrasada e nem
consigo pensar em outro namorado. Dou tanto valor a êste namorado que até pensei em
suicidar-me... mas que resultaria para mim? Apenas o inferno. Mande-me uma palavra
de conforto” (DESESPERADA, 1964, p. 3).
(Lar Católico, 5 de janeiro de 1964, p. 3)
Em resposta, a colaboradora Maria Madalena Ribeiro de Oliveira, responsável
pela sessão em questão, afirma que o rapaz mostra que não possui as qualidades
necessárias para fazê-la feliz. E que, de quando em vez, deve-se fazer uma revisão de
vida para purificar nossa visão das coisas. Além de, segundo Deus, realizar a única
coisa que importa: a nossa santidade, a nossa verdadeira realização (LAR CATÓLICO,
1964, p. 3). A partir da resposta da colaboradora, é possível perceber o caráter de
conselheiro que o jornal possuía. O mesmo prezava muito pela valorização da vida e da
família.
Já Frei Nilton, um homem que respondia por tal pseudônimo e por isso, não é
possível afirmar se o mesmo era um padre, elogiava a tão benemérita e cristã atividade
do periódico. Afirma que todos nós deveríamos aprender e tirar o maior fervor em fazer
o bem ao próximo. Ele parabeniza a responsável por essa interação, afirmando:
Muitas vêzes, quando leio a Página de Orientação Familiar, páro para
refletir no grande bem que ela faz às almas. Sua missão é sacerdotal,
eu diria. Deus a abençoe e a M.C. [colaboradora do jornal] em tão
benemérita e cristã atividade (FREI NILTON, 12 de janeiro de1964,
p. 3).
O Lar Católico, por sua vez, agradeceu as palavras tão generosas e também as
pessoas que, como Frei Nilton, se dedicam de corpo e alma à salvação do mundo e
aprovam o trabalho do jornal (LAR CATÓLICO, 1964).
Ainda na mesma página da sessão citada anteriormente, existiam os testes de
personalidade chamados: Um Teste para Você. Nesses, os leitores respondiam, de
acordo com sua subjetividade, e depois olhavam as respostas em páginas seguintes.
Após lê-las, o assinante fazia uma auto análise e podia ver se estava seguindo bem os
ideais propostos pela Igreja. Um exemplo de teste é o encontrado no ano de 1964, no
qual o leitor pode conferir se é um rapaz direito:
Você talvez goste de considerar-se um rapaz direito, que apenas quer
divertir-se. É possível, porém, que os outros não tenham essa mesma
opinião a seu respeito. Responda honestamente às seguintes perguntas
e verá o que podem pensar de você (LAR CATÓLICO, 1964, p. 3).
Outro viés usado para evangelização eram histórias em quadrinhos com teor
bíblico. Em toda edição do ano analisado, 1964, havia tais ilustrações, que contavam os
fatos de forma simplificada e didática. Dessa forma, o jornal atingia também um público
mais jovem, como crianças, que se sentiam atraídas pelo conteúdo com uma linguagem
não tão elaborada, como a usada nas reportagens. Na época, era comum que as pessoas
só se tornassem cientes dessas histórias por meio da Bíblia ou pelas leituras realizadas
na missa, maneiras menos atraentes e mais complexas do que as criadas pelo impresso.
Alguns exemplos encontrados no jornal são as histórias de personagens da Bíblia como:
de Moisés, presente na edição de 05 de janeiro de 1964, e de Elias, que tinha uma parte
contida no periódico de 29 de março de 64, e de Isabel, em 10 de maio de 1964.
O impresso também possuía uma sessão que procurava orientar seus leitores em
escolhas associadas ao setor cultural, como avaliações críticas de livros e filmes. Em
relação ao cinema, havia imagens de filmes da época, predominantemente estrangeiros,
com pequenos comentários aconselhando o leitor se o mesmo deveria assistir à
produção cinematográfica. Já na questão literária, existia um direcionamento acerca da
leitura dos fiéis. Tal sessão recebia o nome de: Livros: posso ler ou não?. Pode-se
perceber, com isso, que o Lar Católico instruía seu leitor até mesmo em um âmbito
cultural.
Mostrando também uma maior interação entre leitor e jornal, o mesmo
organizava e divulgava viagens chamadas, pelo próprio veículo, de peregrinações, para
a Europa, onde seriam visitadas diversas localidades ricas em conteúdo cristão e
católico. As informações sobre tais viagens eram organizadas e exibidas em tabelas,
divididas por colunas horizontais. As colunas eram catalogadas de acordo com a data de
saída e também pelo tempo de permanência. As localidades eram discriminadas logo
depois desse enunciado. O valor da viagem também era informado em tal tabela. Dessa
forma, os fiéis que almejavam expandir seus conhecimentos sobre a fé e conhecer novas
culturas identificadas com o catolicismo poderiam, através do Lar Católico, realizar um
desejo.
(Lar Católico, 18 de Julho de 1980)
Além de divulgar peregrinações, o jornal também trazia notícias do exterior. Em
uma sessão chamada Instantâneos, havia pequenas informações sobre o que se passava
em cidades estrangeiras e até mesmo em outras cidades do Brasil. Na edição do dia 29
de março de 1964, as cidades que receberam destaque foram: Vaticano (cidade italiana
que é, até hoje, sede do catolicismo), Roma, Boston, Nova Iorque, São Paulo e Rio de
Janeiro. Outra sessão que também abordava esse tema era a chamada Do Brasil e do
mundo. Dessa forma, é possível perceber que havia a procura de saber como outras
cidades de maioria católica se comportavam. Traziam, também, novidades para o leitor
acerca de outras culturas, sempre sob o ponto de vista religioso conservador.
(Lar Católico, 29 de março de 1964, p. 2)
Outra parte estudada do impresso, uma página que trazia diversão para o
assinante, foi a Decifra-me ou te devoro. Essa sessão traz um entretenimento para com o
leitor. De forma descontraída, o mesmo encontrava palavras cruzadas, quadrinhos e
outros jogos para seu lazer. Desse modo, o fiel mantinha-se preso ao periódico, que se
mostrava bem diversificado por apresentar diferentes formas de interação.
Além das contribuições feitas pelos assinantes, a publicidade também era uma
fonte monetária que mantinha o jornal. Nas décadas de 1960 e 1970, pode-se notar uma
escassez nos anúncios exibidos pelo impresso. Tal fato culminou na década de 1980
quando a publicidade de produtos em suas páginas era cada vez menor. Tanto que, na
edição dos 70 anos do Lar Católico, o editor do jornal teve que comunicar-se com os
leitores:
Na edição comemorativa dos 70 anos do Lar Católico , o editor-chefe,
Pe. Edmundo Leschnhak, adverte que o semanário depende muito dos
assinantes, já que não podem contar com publicidade. Segundo ele, “é
a publicidade que sustenta os meios de comunicação social. Com ela,
não sabemos por que não (sic) podemos contar.” (LUCENA, 2011, p.
83).
Pouco tempo depois o editor teve que fazer outro apelo e o jornal começou a
fazer uma forte campanha em busca de novos assinantes para manter-se vivo
(LUCENA, 2011). A partir disso, pode-se notar que o impresso desejava atrair
anunciantes para conseguir manter sua trajetória. A publicidade era importante forma de
renda para o jornal, sem a mesma ele encontrava muitas dificuldades para circular. Por
isso a preocupação com tal assunto e os apelos feitos pelo padre Edmundo Leschnhak.
Seguem abaixo algumas imagens de publicidades exibidas pelo periódico. A primeira é
a do fortificante Capivarol, cujo slogan era: “Fraqueza geral? Tome Capivarol!”, a
segunda traz a do açúcar Pérola e por fim, a terceira anuncia uma editora cujo nome é
Edições Paulinas.
(Lar Católico, 13 de dezembro de 1964)
(Lar Católico, 6 de julho de 1986)
(Lar Católico, 10 de agosto de 1986)
A partir do conteúdo visitado e analisado, é possível ver as formas que a Igreja
encontrava para transmitir sua palavra. Em todas as partes do Lar Católico, é possível
ver a doutrina cristã presente e passando seus ensinamentos. Podemos dizer que o jornal
tinha uma função educativa ou pedagógica junto aos seus leitores, preservando a família
com um ensinamento cristão.
Considerações finais
A partir desse artigo pode-se notar a importância do jornal Lar Católico no
cenário brasileiro. O veículo foi, de acordo com os estudos realizados, um dos jornais
regidos pela doutrina católica, que por mais tempo circulou no Brasil, assim como um
dos que atraiu mais leitores, cerca de 160 mil em determinado período de tempo. Há de
se ressaltar também que o veículo era distribuído em sua cidade de origem, Juiz de Fora,
mas atingia alcance nacional graças, também, ao esforço dos assinantes em enviá-lo
para o restante do país. O impresso era referência para aquela família que tinha
orientação religiosa baseada no catolicismo, guiava e influenciava sua vida.
Revisitou-se o catolicismo e seus modos de disseminar informações e participar
da vida dos fiéis, chegando-se à conclusão de que os jornais eram uma interessante
forma de interação entre clero e leigos, apesar de não ser o único meio de se chegar aos
últimos. Como foi visto, colégios, associações beneficentes e pregações são também
caminhos que a Igreja utilizava para doutrinar seus fiéis e introduzi-los o ideário
católico.
O recorte de tempo analisado neste artigo foi, principalmente, o período após o
Golpe Militar de 1964 até 1985. Pôde-se verificar a importância da Igreja no processo,
além de observar como o Lar Católico se comportou durante o período, mantendo sua
posição de acordo com a corrente majoritária da Igreja, conservadora.
A partir do conteúdo do impresso, foi possível notar sua função pedagógica. Ou
seja, o principal objetivo do jornal era orientar seus leitores. O mesmo durou até o ano
de 1986 e, supõe-se, que o Lar Católico fechou por falta de recursos. Atualmente, é
possível dizer que a Igreja Católica continua disseminando sua palavra por meios de
comunicação. Um exemplo são as redes televisivas como a Rede Vida e a Canção Nova,
que também tem por objetivo auxiliar os fiéis.
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