Juliao Sarmento, Um contador de bocados de histórias, Visao, 23 Março 2000

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  • 7/28/2019 Juliao Sarmento, Um contador de bocados de histrias, Visao, 23 Maro 2000

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    RUTH ROSENGARTEN

    Evez de encarar a obra de JulioSarmento com um olhar de dis-tncia histrica, a exposio agora patente no Centro de Alie Moderna, com o ttulo Flashback , salientaaspectos de continuidade entre vriasreas das suas obras menos conhecidase do seu trabalho mais recente, excluindo a maior parte das pinturas dos anos80. O trabalho que fiz nos anos 70 - osfilmes, as instalaes, as fotografias tem sido quase desconhecido em Portugal, afirma o artista. A mostra incluitambm algumas reconstrues do trabalho desaparecido em 1981 num incndio no seu atelier.Nascido em Lisboa em 1948, Sarmento exps na que foi talvez a nicaverdadeira vanguardista neste pas nosanos 70, Alternativa Zero. Comissariada por Ernesto de Sousa, a exposioinclua nomes que se tornaram sonantes ( H e l e n ~ Almeida, Graa PereiraCoutinho, Alvaro Lapa, Fernando Calhau, ngelo de Sousa, Leonel Moura),sendo uma incurso aventurosa e experimental na ideia de que a arte notanto um produto esttico como umprocesso, um processo com conotaespolticas e sociais.O autor foi um dos primeiros, no con-122

    texto nacional, a entender o funcionamento do mercado de arte internacionale a importncia de expor fora do Pas. Oque lhe granjeou o rtulo ambguo deambicioso. A voz suave e o discursoarticulado contribuem para fazer dele oeptome do artista profissional contemporneo.Para alm de importantes exposiesantolgicas na Casa Serralves, em1992, e na Fundao Calouste Gulbenkian, em 1993, realizou mostras individuais em certames to prestigiantes como IVAM, em Valncia; Haus derKunst, em Munique; Witte de WithCenter, em Roterdo; o VanAbbemuseum, em Eindhoven, e London Projects, em Londres.A obra de Julio Sarmento esteve sempre profundamente marcada pelo cinema. Comeou a fazer filmes nos anos 70,percorridos de um erotismo heterossexual claro e, por vezes, perturbador. Asua obra fotogrfica, as suas pinturas,instalaes e esculturas mais recentesevidenciam fascnio pelo erotismo fetichista do voyeurismo cinematogrfico.No fundo, o que eu pretendo ser umaespcie de contador de histrias de umamanei ra subversiva, diz Sarmento.Conto histrias que no existem. Nemexistem para mim. No tm um princpio, nem um meio, nem um fim. Sou um

    contador de bocados de histrias. E dasentirmos, em todas as suas obras - independentemente da diversidade dosmeios utilizados e das transformaesestilsticas e discursivas sofridas - quequalquer coisa se esconde.Corpos idealizadosNo tenho musas. Quando estou atrabalhar com a Patrcia Aparcio, elapode ser uma musa meditica, mas no uma musa para mim, afirma. A suaprimeira mulher, Helena Vasconcelos,era no s a modelo constante como acmplice. A actual, Isabel, aparece nasprimeiras White Paintings e depois houtras mulheres como modelo.Mas a essas mulheres so-lhes retiradas as caractersticas pessoais que as possam identificar, as marcas fisionmicas da forma mais violenta -lhes tirada a cabea, ou os traos faciais individuais, demodo a ficar apenas uma espcie de corpo idealizado.Sinto sempre que me falta fazer coisas. Mas nunca olho para trs. No meutrabalho e na minha vida, s consigoolhar para a frente. Portanto, h umolhar retrospectivo meu sobre as coisas,que interessante. Mas no fundo, a nica funo que isso tem despertar-mepara aquilo que posso fazer no futuro.Amanh e depois. _

    VISO 23 de Maro de 2000