Oficina de Matemática, Música e Jornal em sala de aula Prof. Paulo Guimarães 12 6.
JORNAL NA SALA DE AULA: INSTRUMENTO DIDÁTICO … · quando o jornal aparece nas atividades de sala...
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JORNAL NA SALA DE AULA: INSTRUMENTO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO PARA A
PRODUÇÃO ESCRITA NAS SÉRIES INICIAIS
Érica Fernanda Zavadovski Kalinovski, (IC), Unespar – Câmpus de Campo Mourão, [email protected]
Adriana Delmira Mendes Polato, (OR), Unespar – Câmpus de Campo Mourão, [email protected] Neil Armstrong Franco de Oliveira, (CO-OR), UEM, [email protected]
RESUMO: Nesse trabalho, realizamos uma pesquisa-ação em um 5º ano das séries iniciais do Ensino Fundamental de escola municipal de Campo Mourão - PR. Com isso, objetivamos contribuir com o desenvolvimento e aperfeiçoamento das capacidades linguísticas e discursivas dos alunos, a partir do trabalho com gêneros do discurso jornalístico nas práticas de ensino e aprendizagem da língua. Visamos a elaboração de um jornal escolar temático impresso, por meio da produção textual escrita de cinco gêneros que compõe o campo jornalístico: notícia; entrevista; artigo de opinião; editorial e crônica, por intermédio de situações reais do uso da linguagem. Para tanto, levamos aos alunos à compreensão dos gêneros em estudo, possível por meio da elaboração de material didático de apoio. Em seguida, a partir da concepção de escrita como trabalho, delineada por Fiad e Mayrink-Sabinson (2004) e Sercundes (2011) e da perspectiva sociointeracionista de linguagem, que insere os gêneros nos diversos contextos de interação social, considerando a importância do campo de onde emergem (BAKHTIN, 2003), propusemos práticas de escrita de textos que foram publicados em forma de jornal escolar temático impresso. Para efetivação das etapas de revisão/correção e reescrita do texto, respaldamo-nos nos trabalhos de Ruiz (2013), Serafini (1995), Gasparotto e Menegassi (2013). Palavras-chave: Gêneros jornalísticos. Séries iniciais. Produção textual escrita. INTRODUÇÃO
A partir das contribuições advindas dos postulados do Círculo de Bakhtin sobre a interação
verbo-social e dos subsídios da Linguística acerca da utilização dos gêneros do discurso no processo
de ensino e aprendizagem da Língua Portuguesa (LP), de maneira especial, nas séries iniciais da
segunda etapa da Educação Básica, realizamos uma pesquisa-ação propondo a produção textual escrita
– concebida como trabalho, conforme Fiad e Mayrink-Sabinson (2004) e Sercundes (2011) –, de
gêneros do campo jornalístico em um 5º ano do Ensino Fundamental de escola que se localiza no
município de Campo Mourão - PR, de forma que conduzíssemos os alunos a práticas efetivas e reais
de linguagem.
Diante disso, a abordagem que efetuamos, apoiou-se no estudo dos gêneros discursivos, com
base na concepção dialógica da linguagem de Bakhtin (2003), de forma que buscássemos integrar
diversos gêneros presentes na sociedade, ao ambiente escolar e, fornecer o exercício de uma prática
educativa de LP, já na segunda etapa da Educação Básica, de maneira mais eficaz e significativa para
os próximos anos escolares, bem como para a vida dos alunos.
Com a proposta de produção de um jornal escolar temático impresso, por estudantes de um 5º
ano, tivemos a intenção de proporcionar a eles o contato com textos que não se restringem ao ambiente
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institucional de ensino e que possibilitam o conhecimento e trabalho a partir de situações reais do uso
da linguagem, além de subsidiarem a ampliação de capacidades cognitivas importantes para o seu
desenvolvimento, como as competências crítica e reflexiva, se realizado de maneira sistematizada e
deliberada, assim como conduzir ao aprimoramento dos processos linguísticos e discursivos e,
sobretudo, da produção de textos escritos.
Para tanto, procedemos a um trabalho de incursão na série mencionada, de modo a,
inicialmente, levar a compreensão dos alunos acerca de alguns gêneros discursivos do campo
jornalístico (notícia; entrevista; artigo de opinião; editorial e crônica), os quais compuseram o material
didático que elaboramos para aplicação dos conteúdos, e como forma de preparo dos estudantes para
posterior desempenho das etapas que constituem o processo de produção textual, composta por
planejamento, escrita/execução, revisão/correção e reescrita, para que alcançássemos nossa intenção a
partir da construção de um jornal escolar (por meio dos enunciados supracitados). O foco recaiu nos
processos de revisão/correção e rescrita do texto e, sobre isso, pautamo-nos, especialmente, nos
estudos de Ruiz (2013) e Gasparotto e Menegassi (2013).
Para a efetivação da pesquisa, conforme propomos, foi realizada a publicação dos 13 textos
produzidos por 12 duplas e um trio, em forma de folheto impresso. Embora o número de impressões
tenha sido limitado, as produções não se voltaram apenas à professora mas, além dela, a outros
indivíduos, seja da família dos educandos, amigos ou vizinhos que, da mesma maneira, puderam
visualizar os posicionamentos e informações transmitidas em relação ao tema selecionado pelos alunos
para a construção do jornal, o qual teve como temática a Copa do Mundo de futebol no Brasil, assunto
que estava em vigor no momento da execução do trabalho.
Para melhor entendimento do tema em estudo, este trabalho ficou organizado da seguinte
forma: na primeira parte, intitulada “Gêneros discursivos: o campo jornalístico na produção de textos
escritos”, abordamos acerca da concepção dos gêneros na perspectiva bakhtiniana e, assim, arrolamos
sobre as dificuldades e limitações dos professores em relação a inserção dos gêneros discursivos no
interior da escola de maneira adequada, bem como tratamos, especificamente, da importância do
trabalho com gêneros do campo jornalístico nas séries inicias, tendo em vista à produção escrita, e os
cuidados necessários para sua aplicação. No interior desse item, elencamos algumas seções,
evidenciando os procedimentos que adotamos e que nos permitiu efetivar essa intervenção teórico-
metodológica em um 5º ano. Portanto, no primeiro, denominado “Intervenção didático-pedagógica:
produção de material didático de apoio e incursão em sala de aula” demonstramos a elaboração do
material de apoio e nossa intervenção a partir dele. Posteriormente, discorremos sobre as “Etapas da
produção textual escrita”, enfatizando como desenvolvemos a incursão em cada uma delas, citando
exemplos a partir dos próprios textos dos alunos, assim como, as formas mais adequadas de efetuar
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essa prática. Finalmente, concluímos com a “Publicação dos textos dos alunos em forma de folheto
impresso”, caracterizando alguns, a fim de comprovarmos a relevância da prática educativa de LP
ancorada em situações reais do uso da linguagem.
GÊNEROS DISCURSIVOS: O CAMPO JORNALÍSTICO NA PRODUÇÃO DE TEXTOS
ESCRITOS
Atualmente, referir-se a gêneros discursivos no interior da escola, não se trata mais de uma
novidade, pois nas próprias propostas pedagógicas curriculares (apoiadas em documentos norteadores
da educação brasileira e estadual), os gêneros já aparecem como um dos conteúdos a serem abordados
na disciplina de LP, seja para leitura, seja para produção de textos, tanto oriais, quanto escritos, seja
para a análise linguística. O que merece atenção, no entanto, são os procedimentos utilizados pelos
professores em suas práticas em sala de aula, uma vez que eles
na verdade, não têm se apropriado dos fundamentos teóricos do novo modelo de ensino; apesar de dizerem ou acreditarem que trabalham conforme essa orientação, deixam de considerar os chamados fatores de textualidade, os quais configuram o texto como uma unidade semântico-interacional (SUASSUNA, 2006, p. 76, grifos da autora).
O que precisa, antes de mais nada, é que os docentes tenham domínio e conhecimento
suficientes para desempenhar um bom trabalho no que diz respeito à utilização de gêneros na escola,
mas, apesar de alguns professores pedagogos admitirem a falta do trabalho com gêneros discursivos
no contexto escolar, ainda carecem de adequações a teorias advindas de correntes linguísticas mais
modernas, principalmente quando tentam efetivá-las na prática e, por outro lado, parte deles “ainda
estão muito presos à noção de tipologia” (HILA, 2009, p. 4), o que dificulta ainda mais, a inserção dos
enunciados no trabalho pedagógico.
A saber, os postulados bakhtinianos enfatizam que a linguagem se efetiva a partir dos diversos
modos de comunicação humana, intercambiada pela interação social e, além disso, ela caracteriza-se,
entre outros fatores, por ser um fenômeno ideológico-histórico e social. Neste sentido, a comunicação
verbal, exercida por todos os sujeitos nos vários contextos da sociedade, só é possível por meio de
algum gênero discursivo, que pode se constituir tanto de forma oral, quanto escrita. Nessa perspectiva,
os gêneros do discurso são “formas relativamente estáveis e normativas de enunciado” (BAKHTIN,
2003, p. 286) e, diante disso, não apresentam uma forma fixa, mas podem ser modificados de acordo
com sua condição de uso, e ainda assim, conservam características comuns, as quais possibilitam
diferenciar um gênero do outro.
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Para Assumpção e Kieslich (2009, p. 2), a variedade de textos que circulam socialmente é
imensa e, saber lê-los e compreendê-los é imprescindível, todavia “isso requer leitores autônomos e
competentes que não apenas decodifiquem textos, mas que estabeleçam relações estruturais e
contextuais para compreender e ampliar os sentidos dos diferentes textos”. Com isso, o processo de
ensino e aprendizagem de LP respaldado em uma diversidade textual tem condições de contribuir,
expressivamente, para a consolidação de um maior domínio acerca dos mais variados gêneros
presentes na sociedade e, consequentemente, a adaptação a sua condição discursiva, de modo que
Quanto mais dominamos os gêneros tanto mais livremente os empregamos, tanto mais plena e nitidamente descobrindo nelas a nossa individualidade (onde é possível e necessário), refletimos de modo mais flexível e sutil a situação singular da comunicação; em suma, realizamos de modo mais acabado o nosso livre projeto de discurso (BAKHTIN, 2003, p. 285).
Isso se torna extremamente importante no sentido de termos a possibilidade concreta de
atuarmos enquanto participantes ativos da sociedade em que estamos inseridos, de forma a nos
posicionar diante determinadas circunstâncias e, assim, não agir passivamente.
Quando gêneros do campo jornalístico são incorporados às ações educacionais podem, da
mesma maneira, se tornarem relevantes objetos e instrumentos semiotizados de concretização do dizer,
porém, é necessário cautela, tendo em vista que as ideologias e influências que circundam os jornais e
as informações presentes nesse domínio discursivo, são evidentes, já que
a notícia de um fato não chega diretamente ao leitor através do jornal/revista. É preciso que o estudante conheça o percurso da informação, que se estende entre o fato e a versão que a imprensa leva o leitor (ouvinte, espectador, no caso do jornalismo radiofônico e televisivo) e os meios de comunicação que ela usa como suporte (FARIA, 2009, p. 14, grifos da autora).
Por essa razão, os textos que circulam nesse veículo demandam certo cuidado, haja vista que
podem apresentar interesses de diversas ordens em suas composições. Contudo, se o docente tiver
clareza e desenvolver uma prática sistematizada e deliberada, é possível que contribua de modo
significativo para o ensino e aprendizagem de seus alunos.
Conforme pesquisa realizada por Viana e Silva (2000), verificou-se que grande parte dos
professores não utiliza o jornal em suas ações pedagógicas e
quando o jornal aparece nas atividades de sala de aula é, geralmente, para recortes de palavras com a finalidade de fixar noções de gramática, ou como fonte de pesquisa em recomendações vagas, padronizadas: “procurem em jornais ou revistas”, ou ainda em uso familiarizado pelo aluno: recortes de gravuras, notícias, reportagens, etc., para ilustrar e apresentar trabalhos individuais ou em grupo ao professor e, mais raramente, ao grupo classe. [...] Em regra, constituem-se como atividades mecânicas (VIANA; SANTOS, 2000, p. 81).
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Igualmente, Suassuna (2006) considera que, quando há escrita, fica geralmente restrita ao
professor, com a finalidade de atribuição de nota; a produção dos textos dos alunos não representa
uma função social (como deveria), mas simplesmente, uma forma de promoção dos alunos de um
nível ou ano escolar a outro, limitando a língua, ainda, a um sistema e conjunto de regras e normas
gramaticais.
Essa prática é comum em grande parte do trabalho docente, e não apenas na disciplina de LP.
Assim, o ensino e aprendizagem continuam perpassados por um viés tradicionalista que não conduz a
um ensino significativo. Sabemos que é importante considerar aspectos gramaticais e normativos nas
aulas de LP, no entanto, o que não pode acontecer é reduzir o ensino da língua a isso (e menos ainda
de maneira descontextualizada), não levando em conta outras questões importantes na construção de
um texto, como estilo, conteúdo, argumentos, situação discursiva, interlocutores, finalidades, suportes,
meios de circulação, etc.
Assim, demonstraremos a seguir, os procedimentos que adotamos para desenvolvermos nossa
prática em 5º ano do Ensino Fundamental, de modo a superar essa forma equivocada da abordagem do
ensino e aprendizagem de LP.
Intervenção didático-pedagógica: produção de material didático de apoio e incursão em sala de aula
Quando decidimos trabalhar com gêneros do campo jornalístico em sala de aula, com uma
turma de 5º ano, tivemos de pensar, primeiramente, na elaboração de um material que pudesse nos
nortear nesse processo de aplicação dos conteúdos e atividades. Assim, desenvolvemos um material
didático de apoio, que objetivou a reflexão sobre o campo jornalístico e sobre cada um dos gêneros
selecionados (notícia, entrevista, artigo de opinião, editorial e crônica), dando ênfase a suas funções
sociais, a suas formas composicionais, a seu estilo verbal e a seu conteúdo temático.
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Imagem 01:Turma de 5º ano com ênfase ao material didático de apoio Foto: Arquivo da pesquisadora iniciante, 2014
Em vista disso, nosso propósito foi apresentar, mesmo que de forma sucinta e de modo geral,
as principais informações que contribuíssem para o entendimento dos alunos acerca do jornal.
Portanto, o material foi organizado da seguinte maneira:
Imagem 02: Recorte do material didático de apoio Fonte: Material didático produzido para incursão pela pesquisadora iniciante
Assim, para iniciar, fizemos uma discussão em torno da história do jornalismo em nosso país,
com ênfase nas influências que sempre existiram e que hoje se manifestam permanentemente nesse
veículo de imprensa. Também apresentamos alguns textos que compõe o jornal, com ênfase nos quais
adotamos para nossa pesquisa.
Posteriormente, demonstramos os 5 gêneros que escolhemos para desenvolver a pesquisa e,
fizemos uma breve caracterização de cada um deles. Em todos, destacamos exemplos dos textos que
foram retirados de veículos de imprensa impressos e eletrônicos que circulam na região.
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Além disso, ao longo de cada seção do material, também elencamos algumas atividades, cuja
intenção foi verificar se o entendimento dos alunos estava sendo efetivado e, além disso, prepará-los
para atividades futuras mais elaboradas, como a produção dos textos.
Imagem 03: Recorte do material didático de apoio Fonte: Material didático produzido para incursão pela pesquisadora iniciante
Essa se refere a uma atividade proposta em relação ao gênero notícia, que devia ser respondida
de forma geral, bem como a partir do exemplo de notícia apresentado no material, mas todas as
atividades tiveram o mesmo propósito, fazer os alunos exercitarem o que compreenderam acerca do
enunciado e de sua forma típica em estudo.
Uma vez feita a explicação dos conteúdos referentes a cada gênero abordado, desde sua
composição, estilo, conteúdo até sua finalidade, além de ter demonstrado exemplos reais a partir de
jornais e blogs que foram a base para o planejamento e posterior produção de seus textos, levamos os
alunos a conhecerem cada texto que eles deveriam, em seguida, escrever, isso porque conforme aponta
Geraldi (2011, p. 25), é preciso “aprender o que é um gênero discursivo e as suas formas de circulação
[...] para depois produzir um texto”.
Após esse momento, convidamos Diego Reis Pereira, assessor de imprensa da Prefeitura
Municipal de Campo Mourão – PR, a fim de elucidar cada um dos gêneros em estudo aos alunos, de
maneira mais concreta, uma vez que ele já vem, há um bom tempo, desenvolvendo trabalhos voltados
ao jornalismo e comunicação, o que permitiu que os alunos indagassem o que não havia ficado claro
na primeira ocasião e, assim, refletissem, de forma mais significativa, acerca de cada gênero.
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Imagem 04: Diego Reis Pereira elucidado os gêneros em estudo Foto: Arquivo da pesquisadora iniciante, 2014
Como trabalhamos com um jornal temático, foi preciso selecionar um assunto em comum a
ser tratado em todos os textos. Dentre algumas sugestões dadas pelos próprios estudantes, foi
escolhido o tema: Copa do Mundo de futebol no Brasil, o qual estava em vigor no momento das
produções.
A partir disso, pudemos iniciar o trabalho posterior com a escrita inicial dos textos, que contou
com a imprescindível mediação docente, pois, para Menegassi (2003, p. 55), frequentemente, “a
participação do professor no processo de produção de textos em situação de ensino é restrita a dois
momentos estanques: a entrega do comando ao aluno e a avaliação da redação produzida”, ou seja, “o
professor não é um produtor de textos. É um avaliador dos textos produzidos pelos alunos”, e isso
afasta-o cada vez mais da produção e, por vezes, do seu real papel enquanto sujeito capaz de mediar
uma prática educativa mais eficaz.
A fim de ultrapassarmos essa visão reduzida do exercício de produção de textos,
compreendemos a necessidade de que todos aqueles que estivessem envolvidos nesse processo,
considerassem a escrita de textos como um trabalho, que, conforme defende Sercundes (2011, p 97),
requer mais do que um simples dom e inspiração, ou uma consequência de algo, como mera atribuição
de nota por parte do professor ao aluno, mas as propostas devem ter “como ponto de partida a
variedade linguística dos alunos, o contato com a leitura para se chegar à literatura, o estudo da
gramática com base na produção do aluno, para que ele a reescreva e chegue a um texto publicável”.
Portanto, considerar a escrita como trabalho é, nas palavras de Sercundes (2011, p. 92),
entender que “todas as atividades realizadas fazem parte de um processo contínuo de aprendizagem” e
que, em função disso, o texto está em constante processo de construção e a qualquer momento é
passível de modificações. Ademais, sob essa perspectiva, o processo de produção de textos escritos é
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composto por algumas etapas como planejamento, execução, reescrita e a revisão/correção, abordados
em trabalhos de Fiad e Mayrink-Sabinson (2004), Antunes (2003).
Etapas da produção textual escrita
Da mesma maneira que nos propõe Fiad e Mayrink-Sabinson (2004), Sercundes (2011),
Gasparotto e Menegassi (2013) e tantos outros estudiosos, ratificamos a produção de textos como
trabalho. Embora reconheçamos que “considerar a escrita como trabalho é um grande desafio que deve
levar o professor a uma prática pedagógica voltada para o desenvolvimento das competências e
habilidades linguísticas de seu aluno” (GASPAROTTO e MENEGASSI, 2013, p. 30), acreditamos na
possibilidade de superar a visão e as práticas docentes de escrita convencionais e tradicionalistas.
Nesta perspectiva, é imprescindível admitir as etapas que contemplam o processo de produção
textual escrita: planejamento, escrita/execução, revisão/correção e reescrita. Vale ressaltar que embora
tenhamos realizado todos esses passos na incursão desenvolvida em turma de 5º ano, destinamos
especial enfoque nos processos de revisão/correção e reescrita, pois, notamos que parte dos alunos
apresentou dificuldades para acatar os apontamentos de revisão/correção do professor. As dificuldades
tanto dizem respeito à apropriação dos gêneros, quanto dizem respeito ao atendimento às questões
linguísticas, discursivas e textuais.
Portanto, quando finalizamos as explicações acerca dos cinco gêneros abordados, iniciamos o
processo de planejamento, que ocorreu por meio da leitura de diferentes textos jornalísticos
(especialmente notícias, artigos de opinião, editoriais), que tratavam sobre a temática Copa do Mundo
de futebol no Brasil, selecionada pelos alunos para compor seus textos (notícia, entrevista, artigo de
opinião, editorial e crônica), para que eles tivessem argumentos e informações suficientes para
escreverem seus textos. Procedemos a essa etapa, por considerarmos “um texto escrito como resultado
de um trabalho consciente, deliberado, planejado, repensado” (FIAD e MAYRINK-SABINSON,
2004, p. 63).
Todavia, a fase de planejamento ainda não é difundida em grande parte do trabalho docente,
tendo em vista que, normalmente, os alunos “começam a escrever assim que recebem o tema a ser
desenvolvido, ou esperam a inspiração surgir de algum lugar, mordendo a caneta e olhando para cima”
(SERAFINI, 1995, p. 23). Para a autora, planejar é mais do que “adiar o momento de escrever o
texto”, mas deve ser entendido como o período em que se evidenciará as características do tema, os
esclarecimentos a seu respeito e, além do mais, pode agir como uma forma de evitar possíveis erros ou
inadequações futuras. Efetivamos esse momento da escrita, portanto, por ponderarmos ser “muito mais
fácil escrever uma redação quando se determina exatamente o que fazer” (p. 26).
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Após o momento de planejar o escrito, obter informações e ampliar os conhecimentos do
assunto a ser tratado, foi possível, então, proceder/executar a escrita. Para Serafini (1995), quando se
começa a pensar nos possíveis argumentos do texto, é preciso registrar o que pensamos, assim, pela
primeira vez. Esse processo, não está desvinculado do planejamento, pois, ao passo que se executa, é
possível (e necessário) continuar planejando.
No que diz respeito à revisão/correção, Fiad e Mayrink-Sabinson (2004) aludem que ela pode
ser considerada como a “pós-escritura” do texto e, neste sentido, o professor precisa agir como um
coprodutor do enunciado, tendo em vista que ele deve ser o principal mediador do processo de
correção das inadequações dos textos dos alunos. Diante disso,
ao ler e revisar o texto do aluno, o professor imediatamente contribui para que algumas lacunas deixadas pelos produtores sejam preenchidas, por meio das inferências que faz, enquanto leitor, e de seus apontamentos, no papel de revisor (MONTERANI e MENEGASSI, 2011, p. 5).
Há algumas maneiras de proceder essa revisão/correção, nós utilizamos, em primeira
instância, a revisão coletiva, a partir de dois textos produzidos pelos discentes que não foram
identificados, mas que deram base para realizarmos a revisão das principais inadequações referentes à
linguagem e ao conteúdo, pois, conforme Fiad e Mayrink-Sabinson (2004) é importante que os
próprios alunos sejam revisores de seus textos e o de seus colegas. Mesmo tendo feito a revisão
coletiva, destinamos ainda, um momento para revisão mais restrita às duplas e ao trio, em forma de
indicações no próprio texto e diálogo com eles. Nesta, adotamos a correção textual-interativa, a qual
nos propõe Ruiz (2013, p. 47). Para a autora, esse tipo de correção, é executado a partir de
comentários mais longos do que os que se fazem na mensagem, razão pela qual são escritos em sequência ao texto do aluno [...]. Tais comentários realizam-se na forma de pequenos “bilhetes” [...] que, muitas vezes, dada sua extensão, estruturação e temática, mais parecem verdadeiras cartas.
Assim, realizamos essa etapa da produção escrita com comentários e questionamentos
direcionados aos produtores do texto, indicando a palavra ou frase que estava inadequada.
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Imagem 05: correção textual-interativa Fonte: Artigo de opinião produzido por alunos de 5º ano
Conforme revisam Gasparotto e Menegassi (2013), a correção textual-interativa, consiste,
portanto, no estabelecimento de um diálogo entre o professor e o autor do texto (no caso, o(s)
aluno(s)), de modo que o estudante não se prenda às correções do docente, mas procure atender seus
próprios objetivos enquanto autor. O modo que parece ser mais significativo nesse processo, é a
realização de apontamentos pelo docente após ou ao lado do texto, tecendo comentários que tratem das
inadequações das produções textuais quando, a partir disso, ambos têm a possibilidade de conversar
por intermédio de bilhetes no interior do próprio texto do aluno, podendo dialogar “em um movimento
interativo, o qual evidencia a atitude responsiva que as tarefas de produção e coprodução textual
requerem (MOTERANI; MENEGASSI, 2011, p. 6).
Por meio dessa prática, foi possível, portanto, solicitar aos alunos que reescrevessem seus
textos, levando em consideração as ponderações e elucidações discorridas em sala.
Em nossa intervenção, procedemos a essa fase de modo a procurar despertar nos alunos a
percepção dos elementos que não condiziam com o gênero, seja em questão de conteúdo, estilo,
função ou estrutura. Vemos esse momento como o processo que resulta, de fato, em sentido ao
processo de escrita, principalmente quando a entendemos como trabalho. Diante disso, ao realizar o
processo de reescrita de seu texto
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o estudante fica ciente de que é um usuário da língua escrita, porque a todo momento terá de rever a própria produção, fazer novas versões do que escreveu, e acabará incorporando outras possibilidades que a língua oferece de se transmitir a mesma mensagem, aproximando-se, pois, [...] da variedade padrão. O estudo da norma culta não será visto somente como um conjunto de regras que devem ser decoradas para as provas e que causam nos alunos a sensação de que não se está ensinando nem falando a língua portuguesa (SERCUNDES, 2011, p 97).
Reconhecemos que tivemos um curto período para sua aplicação, logo, ao propormos aos
alunos a produção de alguns gêneros jornalísticos, eles tiveram dificuldades no momento de proceder
às etapas que envolvem a produção de textos, principalmente, na revisão e reescrita. Vejamos um
artigo de opinião produzido por três alunos que, em sua versão primeira, não contemplou exatamente o
gênero proposto e, mesmo com a revisão e reescrita, ainda permaneceu apresentando algumas
inadequações:
Imagem 06: Escrita e reescrita, respectivamente, de artigo de opinião Fonte: Artigo de opinião produzido por alunos de 5º ano
É certo, que nem todos os alunos enfrentaram dificuldades intransponíveis para executar a
produção textual escrita. Certamente, alguns apresentaram maiores dificuldades que outros, mas isso
não significa que uns têm maior capacidade em detrimento aos demais, até mesmo porque, conforme
Vygotsky (2001), o desenvolvimento humano não ocorre de forma linear. Diante disso, é aceitável que
nem todos os educandos escrevam com total clareza, de imediato, e que nem todos possam ter se
apropriado dos gêneros trabalhados conforme esperávamos. Da mesma forma, as dificuldades
enfrentadas para acatar os apontamentos revisivos variaram bastante de grupo para grupo.
Publicação dos textos dos alunos em forma de folheto impresso
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Quando propomos a alunos de um 5º ano das séries iniciais que produzissem gêneros que
circulam no campo jornalístico, tivemos a intenção de levar as produções para além do ambiente
escolar e, especialmente superar a noção de que os textos eram escritos para a professora. Destarte,
solicitamos que elaborassem um jornal escolar com base em todos os procedimentos que
contemplassem a produção textual escrita como trabalho. Para isso, utilizamos diversos veículos de
imprensa (impresso e eletrônico) da região, que serviram como base para leitura e estudo dos gêneros,
conduzindo os alunos a escrita de seus próprios enunciados.
Assim, a publicação dos textos foi concretizada e, mesmo que em forma de folheto impresso e
em número limitado, foi de extrema relevância, haja vista que, isso contribui para que a escrita passe a
ser concebida como trabalho, que requer atenção, que é um processo e, portanto, está em constante
construção e não deve agir somente como fonte de obtenção de nota abonada pelo professor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante dos estudos que realizamos e a partir dos pressupostos apresentados nesse percurso
investigativo, consideramos a necessidade de desenvolver trabalhos que deem sentido ao ensino e
aprendizagem de LP, especialmente de produção de textos escritos, nas séries inicias, e que
ultrapassem a visão tradicionalista do ensino da língua.
Diante da existência de textos orais e escritos, para esse estudo, abordamos os escritos, sendo
que, a partir de procedimentos teórico-metodológicos, propomos a elaboração de um jornal escolar por
alunos de um 5º ano, que se torna ainda mais relevante, quando se considera as etapas que contemplam
no processo de produção textual escrita: planejamento, escrita/execução, revisão/correção e reescrita,
com ênfase à importância da mediação do professor em todos essas etapas e sua realização de forma
integrada.
Ademais, ainda que os alunos tenham enfrentando algumas dificuldades à execução desses
procedimentos (normalmente, decorrentes da falta de trabalhos adequados com os gêneros discursivos
na escola, com o trabalho de produção textual escrita, que ainda se baseia em práticas de escrita como
dom ou consequência). Outra problemática apresentada é decorrente do próprio desenvolvimento do
trabalho e diz respeito ao pouco tempo dedicado ao projeto, que por sua natureza processual e pelo
número de gêneros exigiria maior tempo de execução. Ainda sim, apontamos que este trabalho
contribuiu para que os estudantes (e a professora) compreendessem que a língua se concretiza
socialmente, e como tal, não deve ser abstraída dessa condição.
Por fim, o trabalho com os gêneros jornalísticos no interior da escola não deve servir a
transformar os alunos em “jornalistas mirins”, mas contribuir para o aprimoramento de capacidades
linguísticas e discursivas importantes para o seu desenvolvimento, sobretudo, no processo de produção
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textual escrita, quando o aluno tem a oportunidade de refletir sobre a adequação do seu texto aos
objetivos interacionais de um projeto de escrita de jornal, em que revisão e reescrita atendem a esse
projeto, ao mesmo tempo em que desperta no aluno a responsabilidade que a autoria exige, fazendo
adquirir habilidades a serem utilizadas na escrita de outros textos.
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VYGOTSKY, L. S. Psicologia pedagógica. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2001.