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h ipertext o Jornal da Famecos/ PUCRS. Porto Alegre, novembro-dezembro de 2007 – Ano 9 – Nº 60 Hiper denunciou em 2004 fraudes no Detran gaúcho Reportagem exclusiva de Belisa Figueiró, então aluna da Famecos, hoje jornalista em São Paulo, ques- tionava o alto índice de reprovação, a indicar uma indústria do exame, além da estranha licitação em que todos os examinadores no Estado eram de Santa Maria. Na época, ninguém contestou a matéria. Três anos depois, estoura o escândalo que causou prejuízos superiores a R$ 40 milhões, segundo a Polícia Federal, com envolvimento da alta cúpula do Detran. PÁGINA 3 Matéria de capa na edição de maio de 2004 do jornal-escola da Famecos ESPORTES RADICAIS Como uma grande aventura, a segunda edição dos Jogos Radicais ocupou pistas, quadras e parques da Capital PÁGINAS 10 E 11 Pedro Revillion/ Hiper Leituras para crianças enfermas vence Fato Literário Premiada na Feira do Livro a emocionante experiência das alunas da Faculdade de Letras da PUCRS PÁGINA 6 HUMANISMO CELEBRAÇÃO Os 100 anos de Niemeyer Fernanda Fell/ Hiper PÁGINA 2

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hipertextoJornal da Famecos/ PUCRS. Porto Alegre, novembro-dezembro de 2007 – Ano 9 – Nº 60

Hiper denunciou em 2004 fraudes no Detran gaúchoReportagem exclusiva de Belisa Figueiró, então aluna da Famecos, hoje jornalista em São Paulo, ques-tionava o alto índice de reprovação, a indicar uma indústria do exame, além da estranha licitação em que todos os examinadores no Estado

eram de Santa Maria. Na época, ninguém contestou a matéria. Três anos depois, estoura o escândalo que causou prejuízos superiores a R$ 40 milhões, segundo a Polícia Federal, com envolvimento da alta cúpula do Detran.

PágiNa 3 Matéria de capa na edição de maio de 2004 do jornal-escola da Famecos

EsportEsradicais

Como uma grande aventura, a segunda

edição dos Jogos Radicais ocupou pistas, quadras e

parques da Capital

Páginas 10 e 11

Pedro Revillion/ Hiper

Leituraspara crianças enfermas venceFato Literário

Premiada na Feira do Livroa emocionante experiênciadas alunas da Faculdadede Letras da PUCRS

PágiNa 6

Humanismo

celebração

Os 100 anosde Niemeyer

Fernanda Fell/ Hiper

PágiNa 2

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Porto Alegre, novembro-dezembro 20072 abertura hipertexto

Jornal mensal da Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).Avenida Ipiranga 6681, Jardim Botânico, Porto Alegre, RS, Brasil.E-mail: [email protected]: http:// www.pucrs.br/ famecos/ hiper-texto/ 045/ index.phpReitor: Ir. Joaquim ClotetVice-reitor: Ir. Evilázio TeixeiraDiretora da Famecos: Mágda CunhaCoordenadora/ Jornalismo: Cristiane

FingerProdução dos Laboratórios de Jornalismo Gráfico e de Fotografia.Professores Responsáveis:Tibério Vargas Ramos e Ivone Cassol (redação e edição), Celso Schröder (arte e editoração eletrônica) e Elson Sempé Pedroso (fotojor-nalismo).ESTAGIÁRIOS:Gerente de produção: Thais SilveiraEditora: Lidiana de MoraesEditora de Fotografia: Fernanda Fell

Editor de Arte: Bruno Gazola de PaoliEditora de Texto: Camila SchaedlerRepórteres: Ariane Jorej, Bernhard Frie-drich Schlee, Bruna Ostermann, Bruna Weis Scirea, Bruno Gazola de Paoli, Cássia Sírio de Oliveira, Camila Alves Schaedler, Camila Rinaldi, Clarissa Leite Caum, Fernando Rotta Weigert, Guilherme Zauith, Helena Wilhelm Eilers, Igor Elias Carrasco, Jamille Callai, Luciana Birck, Maurício Círio, Natasha Cen-tenaro, Patrícia Lima, Rafael Lopes Codonho, Raiza Ismério Roznieski, Tatiana Feldens,

Thiago Oliveira, Vinícius Roratto Carvalho, Yara Tropea.Repórteres Fotográficos: Andressa Vargas Griffante, Camila Domingues, Daniela Curtis do Lago, Fernanda Faria Correa, Fernando Sá Correa, Gabriel Pozzobom Silveira, Gabriela M de Oliveira, Ingrid Guerra , Jaqueline O. Sordi, Jessica Tarantino de Carvalho, Karo-line Sana Denardin, Laís Cerutti Scortegagna, Lucas Soares Costanzi, Pedro de Oliveira, Raissa Genro, Tamara Carvalho e Vinicius Roratto Carvalho.

Hipertexto Apoio cultural: Zero Hora. Impressão: Pioneiro, Caxias do Sul. Tiragem 5.000

Mesmo próximo ao fim do ano, ainda há tempo para novas crises apare-cerem para atormentar os governos. O escândalo do Detran veio à tona para salientar uma dúvida que é cada vez mais constante na cabeça dos brasileiros: é possível acreditar em al-guém?

Não bastava a falta de certeza quanto ao destino do dinheiro que a popula-ção gasta em taxas, juros e impostos, agora é necessá-rio ficar com o pé atrás na hora de tirar uma simples carteira de motorista.

A sociedade gosta de demarcar a vida através de marcos como o primeiro passo, a primeira palavra, a primeira comunhão, o baile de debutantes e, chegando os 18 anos, a maioridade, finalmente somos consi-derados responsáveis para dirigir.

Um fato tão importante, quase um rito de passagem, fazia com que o valor exor-bitante a ser pago, princi-palmente para os padrões brasileiros, fosse encarado como um investimento ou um prêmio. Era assim pelo menos até ser descoberto que, mais uma vez, o povo estava sendo enganado.

Sorte daqueles que ti-rarão a licença daqui para frente, ao menos é o es-perado. No entanto, por enquanto, mesmo um mês depois da descoberta do esquema do Detran gaúcho, as tabelas de preços dos serviços para a primeira habilitação continuam in-tactas, marcando os mais de R$ 800. Resta aguardar as cenas dos próximos ca-pítulos.

Por Lidiana de Moraes, editora

EDITORIAL

A fraudedo Detran

Por Lidiana de Moraes

“Não é o ângulo reto que me atrai. Nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual”. As palavras dignas de um poeta foram ditas por um arquiteto, Oscar Niemeyer. Mas, quando é realizada uma retros-pectiva do trabalho deste gênio da arquitetura, fica claro que, para ele, traçar linhas curvas é tão natural quanto era escrever para Drummond e Quintana.

O começo dessa trajetória aconteceu no escritório do ar-quiteto e urbanista Lucio Costa. Neste período, o presidente Getú-lio Vargas via na arquitetura um meio de transformar o Brasil em um país industrializado. Então, enquanto as potências mundiais ocupavam-se com o desenvolvi-mento de tecnologias bélicas, o investimento brasileiro em obras arquitetônicas o colocava na vanguarda.

Niemeyer era um admira-dor dos padrões criados por Le Cobursier. Porém, enquanto o franco-suíço trabalhava com as linhas retas, o discípulo criou uma nova forma de criar com o con-creto. “O trabalho de Niemeyer com o concreto armado abriu um campo inexplorado dentro da arquitetura. A ‘pedra líquida’ nas mãos de Niemeyer assume de vez a forma curva, que havia sido experimentada timidamente no século XX”, explicou o arquiteto e professor da Feevale, Juliano Vasconcellos.

Nascido no dia 15 de dezem-bro de 1907, na antiga capital do Brasil, Rio de Janeiro, Niemeyer fez o que para muitos era impos-sível: construir a nova capital do país nos cinco anos de mandato do presidente Juscelino Kubits-chek. No entanto, a carreira do arquiteto é marcada por inúmeras obras que fizeram com que ele

fosse considerado uma das 100 pessoas mais geniais do mundo, entre elas, a Pampulha, a sede das Nações Unidas em Nova York, o Ibirapuera em São Paulo e o Museu de Arte Contemporâ-nea de Niterói. Para o professor da UFRGS, Günter Weimer, o sucesso do arquiteto tem expli-cação: “A verdade é que ninguém conseguiu como ele responder de forma tão concreta às aspirações de inovação que estavam sendo promovidas pela elite do poder ou delas dependentes”.

Além do legado como arqui-teto, Niemeyer fez barulho por causa de seu viés político. Comu-nista assumido, chegou a filiar-se ao PCdoB e, por muitas vezes, foi alvo de piadas por ter construído obras que de algum modo po-deriam ser vistas como grandes homenagens ao poder capitalista. Mesmo com essa dualidade, o co-munismo sempre esteve presente: “Observando hoje toda a sua obra, percebe-se que a preocupação do arquiteto na realidade sempre foi a de atuar como um representan-te notável desta ideologia, mais no discurso do que exatamente na prática do projeto”, explicou Vasconcellos.

Ironicamente, em 1963, Nie-meyer foi nomeado membro honorário do Instituto Americano de Arquitetos dos Estados Unidos e ganhou o Prêmio Lênin da Paz, concedido pela União Soviética.

Aos 100 anos, não é possível calcular quantos projetos me-moráveis ele ainda criará para a humanidade, mas o mestre da arquitetura ainda promete, como disse o diretor cultural do Instituto de Arquitetura Brasilei-ra, Ubyrajara Gilioli: “Apesar de centenário e de quase não poder ver, como Beethoven que perdeu a audição, Oscar continua traba-lhando e, seguramente, aprontan-do novas surpresas para o espanto de todos nós”.

100 anos do mestre das linhas curvasCELEBRAçãO

Oscar Niemeyer comemora centenário de vida neste dia 15 de dezembro

Evaristo Sá/AFP

Ao desenhar Brasília, Niemeyer produziu esculturas em concreto

Vanderlei Almeida/AFP

Oscar Niemeyer com Fidel Castro. Ele se mantém fiel às origens de esquerda

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Porto Alegre, novembro-dezembro 2007 3políciahipertexto

Por Patrícia Lima

O alto custo para tirar a car-teira de motorista no Rio Grande do Sul e as reprovações nesses exames alertaram a Polícia Fe-deral (PF), o Ministério Público e a Receita Federal, que investi-garam, nos últimos quatro anos, o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), usando gram-pos telefônicos e a análise do sis-tema financeiro. As investigações indicaram a existência de uma organização, composta por 12 pes-soas, que superfaturava serviços Detran, utilizando fundações de apoio universitário e empresas de consultoria. Os recursos desvia-dos, desde 2002, são calculados em R$ 40 milhões.

A elevação no índice de repro-vações no exame, o alto custo da Carteira Nacional de Habitação e a estranha terceirização do serviço para Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência (Fatec), ligada à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), foram denunciados há três anos pelo jornal Hipertexto, na edição de maio de 2004. A reportagem de Belisa Figueiró fazia referência à reprovação nas provas práticas do Detran que atingiam o índice de 39%. Na época, Hipertexto entrou em contato com a direção da Fatec e da UFSM, para saber sobre a realização das provas e o surgimento da parceria com o Detran, mas não obteve sucesso (ver box).

A fraude teve início quando o Detran contratou a Fatec, de San-ta Maria, para realizar as provas de aptidão dos candidatos a obter ou renovar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Ilegalmente, a Fatec teria terceirizado a ela-boração dos testes para outras

empresas e o escritório de advo-cacia, Consultoria Pensant. As contratações dos serviços foram feitos sem licitação. Os serviços eram prestados com a utilização da estrutura física e de pesquisa-dores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

A PF descobriu que as três empresas terceirizadas respon-sáveis por aplicar as provas nos candidatos à motorista cobravam a mais do Detran do que o estabe-lecido em contrato, pelos serviços. Estima-se que o valor da fraude seja em torno de R$ 40 milhões. O dinheiro resultante do super-faturamento era repassado aos diretores do Detran e enviado por malas, em cédulas, ou então por meio de empréstimos bancários simulados, conforme depoimen-tos recolhidos pela PF.

O diretor do Detran, Flávio Vaz Netto, e o ex-diretor, Carlos Ubiratan dos Santos, além de outras 12 pessoas envolvidas, de Porto Alegre, Canoas e Santa Ma-ria, foram presas e respondem por crimes como formação de quadri-lha, fraude em licitações, tráfico de influência, sonegação fiscal, estelionato, peculato e corrupção ativa e passiva.

Nesta primeira fase da Ope-ração Rodin, a PF já reuniu 16 volumes com 3,9 mil páginas, das quais 1,4 mil se referem apenas a interceptações telefônicas. A Justiça Federal seqüestrou 80 imóveis de propriedade dos inves-tigados, além de bloquear contas bancárias e realizar buscas nos documentos e computadores dos acusados.

Além da ação fraudulenta em um departamento que, em 1998, se tornou uma autarquia justa-mente para evitar as irregulari-dades na concessão de carteiras

que, até aquele ano, era atribuição da Polícia Civil, o escândalo da Operação Rodin atingiu as bases do governo de Yeda Crusius. En-tre os acusados da fraude estão personagens ligados aos partidos aliados do governo, como o dire-tor-presidente do Detran, Flavio Vaz Netto, o ex-diretor-presidente do órgão e atual diretor financeiro do Trensurb, Carlos Ubiratan dos Santos (ambos eram do Diretório Estadual do PP), o empresário Lair Antonio Ferst (integrante do Diretório Estadual do PSDB e um dos coordenadores da campanha de Yeda Crusius), e o ex-diretor-geral da Assembléia Legislativa, Antonio Dorneu Maciel, da exe-cutiva estadual do PP e então diretor da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). José Fernandes, dono da Consultoria Pensant, que já foi ligado ao PDT, também figurou entre os detidos e continua sendo investigado.

A prisão dos acusados, espe-cialmente de Carlos Ubiratan, respingou também no deputado federal José Otávio Germano (PP), uma vez que o ex-diretor do Detran-RS ocupou o cargo na gestão de Germano na Secre-taria de Segurança. A luta pelo controle político-administrativo do Detran já havia provocado o primeiro rompimento no governo de Yeda Crusius, resultando na demissão, em abril deste ano, do então secretário de Segurança, Enio Bacci. O escândalo também acabou relevando a existência de funcionário-fantasma (pessoas nomeadas em órgãos públicos que não trabalhavam) e outras irregu-laridades ainda não confirmadas. Velhas práticas ainda distantes da promessa da governadora de implantar no Estado um novo jeito de governar.

Veja trecho inicial da reportagem de Belisa Fi-gueiró, escrita em maio de 2004:

As últimas estatísticas do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) revelam que o índice de reprovação nas provas práticas para a obten-ção da Carteira Nacional de Habilitação, tanto para duas quanto para quatro rodas, aumentou. Os números cor-respondentes aos reprovados em veículos de quatro rodas subiram de 29% em 1997 para 39% neste primeiro trimestre de 2004 no Rio Grande do Sul. Segundo a coordenadoria de estatística do órgão, o rigor do novo Código de Trânsito é a principal causa, mas as auto-escolas afirmam que o fator emocional é mais deci-sivo, enquanto os candidatos apontam o próprio desprepa-ro como os principais moti-vos. Já a Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência (Fatec), responsável pela aplicação das provas, preferiu se calar e negou-se a dar entrevista sobre o assunto.

Durante uma semana, o Hipertexto entrou em contato com a Fatec, que é vinculada

à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e fisca-lizada pelo Detran. Primeiro falamos com os examinado-res, depois com o responsável por eles, em seguida com o coordenador do ‘projeto’, e dias depois com uma das administradoras da funda-ção. Somente após quatro dias de tentativas, fomos informados que “apenas o chefe de gabinete do reitor da UFSM, o professor Isaias Salin Farret, poderia dar al-guma informação à imprensa sobre o funcionamento e a organização da instituição”. Procuramos entrevistá-lo ao longo dos três dias seguintes, mas as contínuas reuniões e falta de tempo desse profes-sor para atender aos quatro telefonemas ou responder aos dois e-mails enviados, nos impediram de expor nesta reportagem a versão da Fatec sobre a realização das provas, o surgimento repentino da parceria com a Universidade e o Detran desde 1°de julho de 2003, e a destinação dos re-cursos financeiros reembolsa-dos nos 8.300 exames teóricos e 20.300 exames práticos que são realizados mensalmente pela fundação.

OPERAçãO RODIN

Três anos depois,Polícia Federalconfirma fraudeno Detran/RS

Jornal-escola da Famecos correu na frente da imprensa gaúcha e divulgou uma ponta do golpe em 2004

Índice de reprovaçãonas provas era de 39%

Reportagem de Belisa Figueiró publicada em maio de 2004

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Porto Alegre, novembro-dezembro 20074 nacional hipertexto

Por Igor Carrasco

A representação política no Brasil está organizada em sistema bicameral: Senado e Câmara dos Deputados. Neste sistema, os senadores representam os estados, en-quanto os deputados representam o povo. Sendo assim, a proporção de deputados va-ria conforme o perfil demográfico de cada unidade federativa, aferido por medição oficial do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Censo. Ao menos na teoria. Há um limite para a variação de parlamentares por estado. No máximo 70 e, no mínimo, oito deputados por unidade federativa, o que acaba gerando algumas disparidades. Por exemplo, atualmente o estado de Roraima possui um deputado federal para cada 49 mil habitantes, en-quanto o estado de São Paulo elege um a cada 571 mil, uma diferença gritante.

O sistema bicameral foi espelhado no modelo norte-americano, de duas câmaras mutuamente revisoras, no caso do Brasil com o ligeiro problema já mencionado – em algumas unidades federativas, a proporção da Câmara é prejudicada pelos limites de deputados por estado, o que vai contra o princípio de “uma pessoa, um voto”. Nas eleições de 1998, por exemplo, foram necessários cerca de 333 mil votos para se eleger um deputado federal no es-tado de São Paulo, enquanto em Roraima com apenas 17 mil votos se garantia um ga-binete próximo à praça dos Três Poderes, em Brasília. Este sistema também mostrou mais um de seus defeitos nas eleições de 2002, quando o Partido de Reedificação da Ordem Nacional (Prona), atual PR, elegeu seis deputados (três dos quais nem sequer eram residentes do estado de São Paulo, pelo qual foram eleitos) com a ajuda dos votos de Enéas Carneiro, que cravou mais de um milhão e meio de votos na ocasião.

Novo Praia de BelasCom a inauguração do Barra Shop-

pingSul, prevista para agosto de 2008, e o projeto de ampliação do Iguatemi para o próximo ano, o Shopping Praia de Belas também anunciou reformas até março de 2009. A idéia é dobrar sua área com um investimento de R$ 60 milhões. O centro de compras terá mais um prédio-garagem na esquina com a rua Marcílio Dias, com 70 novas lojas instaladas no terceiro piso, além de uma torre de 20 andares desti-nada a escritórios na parte voltada para Avenida Borges de Medeiros. Foi anuncia-da ainda a construção de uma passarela suspensa, com 50 metros de extensão e 16 metros de altura sobre a avenida Praia de Belas para interligar o terceiro andar

do shopping ao edifício-garagem. Outra novidade é um teatro-auditório no ter-ceiro andar. O local terá uma decoração inspirada em um teatro de Nova York com uma parece envidraçada que terá a vista para o Guaíba. Com a ampliação, o shop-ping oferecerá 264 lojas, dois restaurantes panorâmicos e uma academia.

Arte negra

Em comemoração ao Dia da Consciên-cia Negra, duas mostras podem ser con-feridas em Porto Alegre. DaTerra reúne pinturas de Grace Patterson no espaço Vinícolas do Brasil (Mostardeiro 189) até o dia 23 dezembro, com visitação de segunda à sábado, das 9h às 19h. Deuses

do Panteão Africano - reproduções de pinturas a óleo de Nelson Boeira Fäedri-ch – exposta no Café do Margs (Praça da Alfândega, s/nº) até 9 de dezembro, de terça a domingo, das 10h às 19h. Todas têm entrada franca.

Sons diversos

No finalzinho do ano, não faltarão opções para quem curte uma boa música. Confira: Capital Inicial desembarca em Porto Alegre, dia 13 de dezembro, com a turnê do álbum “Eu Nunca Disse Adeus”. O quarteto apresenta 13 músicas inéditas, com destaques para a faixa título, para A Vida é Minha no Teatro do Bourbon Country.

Quem volta a Porto Alegre é Marisa Monte, com a turnê dos CDs que consi-dera como “gêmeos bivitelinos diferentes, mas complementares”. Infinito Particular é um disco de canções que mescla de passado e futuro e Universo ao meu redor gira em torno do samba. O show intitula-do Universo Particular acontece de 7 e 8 dezembro no Teatro do Bourbon Country e apresenta, além de outros sucessos da cantora, canções dos Tribalistas.

Maria Rita passa pela Capital com a turnê de seu terceiro disco: “Samba Meu”. O álbum reúne 14 faixas de samba clássico com participações de Milton Nascimento, Arlindo Cruz e Chico Pinheiro. A cantora se apresenta no Teatro do Bourbon Coun-try nos dias 14 e 15 de dezembro.

RECORTES Por Thais Silveira

Caso Renan serviu pararepensar sistema político

Por Igor Carrasco

Muito se ensina sobre a ditadura militar para o jovem em formação no Brasil. Desde o começo do ensino médio, se fala do período em que o país foi submetido pelos quartéis militares, até a faculdade. Certamente na leitura da reportagem o leitor esclarecido deve ter exclamado: “Ora, mas a dispari-dade na representação parlamentar surgiu durante a ditadura militar”. Não estaria totalmente incorreto – muitos problemas, em geral, surgiram na época em que o país estava nas mãos dos militares. Por exem-plo, em 1977, por meio da Emenda nº8, o número máximo de cadeiras por estado foi estipulado em 55.

Subsequentemente, alguns números foram sendo modificados, nada muito com-plicado. Em 1982, foi aumentado o limite de representantes na Câmara em geral para 479. Em 1985, este número aumentou para 487. Tudo parte da mecânica do regime, que mantinha uma fachada de democracia representativa. Os estados do Norte e Nor-deste, mais beneficiados pelas disparidades de representação, eram os que mais elegiam deputados do partido da situação (Arena). Ficava assegurada a aprovação dos projetos dos militares.

Até aí, nenhum problema – praticamente todo mundo que fez ensino médio sabe disso. A parte que, seguramente, ninguém apren-deu na escola é que a Constituinte de 1988 não mudou essa situação.

Tendo em mente que a constituição que hoje rege o Brasil é, ainda, a mesma (fará 20 anos em 2008) parece injusto imputar toda a culpa da questão ao regime militar. O problema foi criado por eles, porém não é justo isentar a Constituinte, que negligen-ciou o povo brasileiro ao nada fazer para modificar o quadro. Em 1990, os estados prejudicados, com o destaque o Rio Grande do Sul, lideraram um movimento que de-nunciava o problema criado pelos militares e perpetuado pela constituinte. Desde então, passaram-se 17 anos e absolutamente nada se fez quanto ao assunto. Por quê? A análise dos números fica por conta do leitor interes-sado – mas uma prévia cai bem: o presidente Lula é muito mais forte nas regiões Norte e Nordeste do país que no Sul.

Uma reforma no sistema de represen-tação é necessária para que a proporção parlamentar torne-se justa e adequada aos interesses da população – não apenas na Câmara dos Deputados, onde o número de parlamentares deveria seguir o tamanho da população, como também no Senado Federal, argumenta o senador Paulo Paim (PT-RS). Paim é contra a extinção do Senado Federal: “É incorreto que, em momentos de crise, se proponha a extinção das instituições. O que devemos fazer é propor a mudança dos que comandam o Senado”.

A opinião é compartilhada pelo depu-tado federal Eliseu Padilha (PMDB-RS). Ele defende que o erro não está no modelo bicameral, mas sim nas práticas políticas, que resultam da legislação partidária e do poder excessivo, além do grau forte de influência do chefe do Poder Executivo na

esfera política. “Uma das grandes causas que o Senado deveria liderar, por exemplo, é uma reforma tributária que respeitasse o tamanho e a importância de cada unidade da federação não anda”, diz o peemede-bista. Segundo Padilha, o Senado em um sistema bicameral tem o papel de equili-brar a representação dos estados diante do contexto da Federação, não sendo correta nem ideal, portanto, sua extinção.

A proposição de extinção do Senado não conta com defensores expressivos no Congresso Nacional, embora algumas correntes do PT tenham se manifestado a favor da idéia. A história tem mostrado que momentos de crise não são os mais ade-quados para proposição apressadas, sem considerar devidamente suas conseqüên-cias. O equívoco pode ser perigoso quando se trata de extinguir uma instituição de 183 anos de idade, como tem o Senado.

Disparidade injusta

Em discussão, a validade do Senado Federal do Brasil, com 183 anos de história

Agência Senado

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Porto Alegre, novembro-dezembro 2007 5ensinohipertexto

Por Maurício Círio

Para que serve palha de arroz? Até poucos meses atrás, era só para adubo. Agora, alunos do Colégio Agrícola Estadual Daniel de Oliveira Paiva (Cadop), de Cachoeirinha, mostram muitas outras utilidades para a palha, entre elas, fazer papel. Por isso, ExpalhaArroz é o nome do pro-jeto, um trocadilho que quer chamar a atenção, não para o erro de português no verbo espalhar, mas para o fato de que aquilo que era palha, agora é bloco de papel, luminária e outros utensílios.

Quem entra para o projeto ExpalhaArroz está, realmente, se comprometendo e assumindo responsabilidades. Uma boa disponibilidade de horários é difícil para os alunos dos ensinos médio e técnico que estudam dois turnos, tendo pouco tempo para atividades extras. Mesmo assim, seis estudantes estão mostrando que o conhecimento pode ser alcançado também fora da sala e aula, no projeto que integra arte com educação ambiental.

Com o indicador apontado para a foto que mostra a palha sendo coletada, o aluno Jonas William Cezar instiga: “Olha como era antes, agora, veja no que se transformou”, já com o dedo voltado para as luminárias e blocos feitos com o papel da palha

Casca de arroz alimenta a arteUma professora e seis alunos produzem arte e conscientização ambiental em Cachoeirinha

Um longo tapete vermelho e pôsteres indicando os trabalhos de graduação e pós-graduação feitos por alunos da PUCRS e de outras universidades do país. Esse era o impacto inicial provo-cado pelo 8º Salão de Iniciação Científica, realizado entre 23 a 26 de outubro, no prédio 41 da Universidade.

O edição deste ano tinha o tema “Meio Ambiente e Susten-tabilidade”. Para abrir a mostra competitiva, os professores João Marcelo Medina Ketzer, da Facul-dade de Filosofia e Ciências Hu-manas, e Jorge Alberto Villwock, diretor do Instituto de Meio Am-biente da PUCRS, ministraram palestra falando de “pesquisa e sustentabilidade”.

Durante o evento, cada grupo fazia uma apresentação oral do

projeto e era avaliado por dois ou três professores, que também examinavam os banners que resumiam as idéias produzidas para a exposição. Almir Schaffer, professor de Engenharia Civil da PUCRS, que trazia a grade de avaliação e uma caneta nas mãos, elogiou a qualidade dos projetos. “Não são trabalhos de mestrado, e, mesmo assim, estão num nível muito bom”, avaliou.

As pesquisa que atingiram a maior pontuação, em cada cate-goria do Salão, receberam um vale de R$ 500 da Livraria Cultura (Porto Alegre) para aquisição de livros e qualificação da pesquisa do grupo. Todas as produções que obtiverem nota máxima, na média dos avaliadores, não saíram per-dendo, e ganharam um Certifica-do de Destaque do 8° SIC.

Pesquisa universitáriadestaca meio ambiente

8° Salão de Iniciação Científica, realizado na PUCRS, destacou “Meio Ambiente e Sustentabilidade”

de arroz. E acrescenta: “Viu? Nem tudo é lixo”. Quem visitou a 1ª Feira de Ciências e Tecnologia de Educação Profissional (Fecitep), que ocorreu no mês de outubro, no Colégio Parobé, em Porto Alegre, pôde parar no estande do ExpalhaArroz e ouvir este e outros depoimentos de alunos orgulhosos expondo o trabalho.

No pavilhão 10 do Parobé, representantes da Cadop parti-cipavam da feira que reuniu 85 projetos de ciências, feitos por estudantes de cursos técnicos de instituições públicas e privadas de todo o Estado. “Nosso objetivo é resgatar a história da produção do papel artesanal no Rio Grande do Sul. Além disso, árvores não precisam ser derrubadas quando podemos usar a palha do arroz para a produção de papel, que pode, então, ser transformado em arte”, explica Nilci Berwan-ger Deon, professora de artes do colégio de Cachoeirinha. Ela é a idealizadora e coordenadora des-te projeto, feito em parceria com a Papeloteca Otavio Roth e que vem destacando o colégio agrícola em diversos eventos regionais.

O ExpalhaArroz é conduzido pela paixão dos integrantes do projeto que realizam trabalho pioneiro como o de Maria Leda de Macedo no “Mão na Massa”, projeto de 1980, em Cachoeira do Sul.

No estande da feira, com cerca de um metro e meio de largura, foram colocados potinhos com a palha do arroz em todos seus es-tados de fabricação artesanal, até chegar ao papel. No chão, estavam expostos alguns dos trabalhos derivados do esforço de Jonas e seus colegas. Luminárias e blocos ilustravam o potencial da folha,

que é mais forte e resistente do que uma de ofício normal. Além da professora, os alunos também davam uma aula sobre o trabalho realizado. O projeto começou em março deste ano e pretende se estender em exposições futuras, com artistas conhecidos, convi-dados para confeccionar obras a partir do papel dos pupilos da

professora Nilci. Por enquanto, eles não sabem

ao certo qual a viabilidade eco-nômica do projeto. Os custos de produção não são elevados, mas o projeto fica condicionado ao for-necimento da palha, pois o arroz é colhido uma vez ao ano. Isso dificultaria a produção do papel em escala para fins comerciais.

ExpalhaArroz, promovido por escola agrícola de Cachoeirinha, mostra alternativa de utilização da casca de arroz

Fotos Vinícius Roratto Carvalho/ Hiper

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Porto Alegre, novembro- dezembro 20076 solidariedade hipertexto

Por Lidiana de Moraes

“Era uma vez uma ilha onde moravam todos os sentimentos”. O texto fixado entre desenhos nas paredes da sala de recreação da ala pediátrica do Hospital São Lucas, da PUCRS, captura o espírito do ambiente. O quinto andar do pré-dio abriga crianças que deveriam estar do lado de fora, correndo, brincando, indo à escola, mas, de-vido a problemas de saúde, estão reclusas naquele espaço, em suas ilhas particulares.

Ao tradicional tratamento da medicina pediátrica recebido pelos pequenos pacientes, alu-nos das Faculdades de Letras da PUCRS agregaram doses de lite-ratura infantil, criando a atividade Literatura Infantil e Medicina Pe-diátrica, distingüida com o prêmio Fato Literário 2007 na categoria projeto ao final da 53ª Feira do Livro de Porto Alegre.

O acesso aos quartos do quin-to andar do Hospital São Lucas, identificados com três números e uma letra, não é restrito a familia-res, médicos e ao pessoal da enfer-magem. Pelo menos três vezes por semana, livros e, não só remédios, chegam aos quartos. As histórias infantis contadas pelos alunos da Faculdade de Letras da PUCRS se abrem aos pacientes mirins como janelas para o mundo exterior.

A estudante Alessandra Maia é uma das contadoras de histó-rias às crianças internas. Com sentimento de solidariedade, ela passou a fazer parte do trabalho que mistura literatura e medicina

O prêmio Fato Literário de 2007 para o projeto Literatura Infantil e Medicina Pediátrica: Uma Aproximação de Integração Humana reforçou o sucesso de uma idéia iniciada há 10 anos. A coordenadora do trabalho e pró-reitora de Graduação, Solange Medina Ketzer, lembra que o projeto surgiu com incentivo do então coordenador da Pastoral da PUCRS, irmão Avelino Madalo-zzo. Solange, que era vice-diretora da Faculdade de Letras, diz que a idéia nasceu numa conversa com irmão Avelino e do contato com o coordenador do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina na época, Délio José Ki-pper. “Ele apoiou logo que ouviu

a proposta de levar ao hospital as alunas da disciplina de Literatura Infantil, para contar histórias para os pequenos enfermos”.

Com uma década de dedica-ção não é possível saber quantas crianças passaram pela atividade. Contabilizar números não faz par-te da iniciativa, explicou a pró-rei-tora. “Não temos a preocupação de quantificar, mas de qualificar atendimentos. O trabalho é tão dinâmico, tanto na sala de recre-ação, quanto nos leitos, que não caberia incluir controle do nú-mero de pacientes beneficiados. Queremos que as crianças fiquem felizes com as histórias que ouvem e que as mesmas ajudem a superar a dor e o sofrimento causados pela

enfermidade e pela reclusão”.Além do troféu, o projeto re-

cebeu R$ 20 mil dos promotores do Fato Literário, o Grupo RBS. O futuro do Literatura Infantil e Medicina Pediátrica é promissor. “Queremos continuar atuando no Hospital São Lucas e apoiar a criação de uma biblioteca infan-to-juvenil, única no país dentro de um hospital, com ações cada vez mais qualificadas para for-mar leitores”, anunciou Solange. Enquanto isso, mais histórias são contadas, gerando novos textos e desenhos que enfeitam o quinto andar, como aquele em está escrito “Existem anjos entre nós”. Anjos que contam histórias e anjos que as ouvem.

se integram de vez. Como alguns pacientes ficam internados mais tempo, eles se tornam amigos. Até conhecem a rotina do outro, sabendo se o companheiro de quarto costuma acordar mais cedo ou mais tarde. A intimidade facilita brincadeiras e o surgi-mento de apelidos tipicamente infantis como Sr. Preguiça, para quem demora acordar. Enquanto uns conversam, outros correm para recontar a história aos pais, mães ou à tia Ju, espécie de anjo da guarda que zela por todos os hóspedes daquele andar.

Pacientes sem condições de deixar os quartos não são pri-vados da fantasia dos livros. “Quando crianças estão ligadas a aparelhos e não podem ir à re-creação, nós passamos nos leitos e repetimos o mesmo processo”, explica Alessandra. O menino J.A.S. recebeu a visita particu-lar das contadoras. Perguntado sobre a fantasia que usaria em uma festa de Halloween, respon-deu prontamente: “De vampiro”. Mesmo sem a capa ou os dentes pontiagudos, o garoto de 12 anos deixou-se levar pela narrativa sobre o aniversário do Conde Drácula. De acordo com sua mãe, ele sempre gostou de ler e ouvir histórias. A aproximação com a literatura é outro objetivo do projeto que busca formar novos leitores e despertar o gosto pela leitura desde cedo.

No quarto ao lado, E.M.S, de seis anos, também ficou encan-tada com a festa do mais famoso morador da Transilvânia. Depois de ouvir o conto, a menina abra-çada a sua boneca Gabriela man-tinha os olhos fixos na estudante que segurava o livro com figuras feitas com dobradura que aumen-tavam de tamanho. Alguma dú-vida se ela havia gostado do que ouvira? “Eu vou contar a história para a Gabriela depois, porque ela chora quando eu penteio os seus cabelos”, explicou.

Anjos com asas de papelProjeto que une literatura e medicina no tratamento de pacientes mirins

do Hospital São Lucas da PUCRS conquista Fato Literário na Feira do Livro

logo que entrou na faculdade, em março de 2006. As atividades de-senvolvidas com crianças de seis meses a 12 anos são realizadas em etapas que vão do estudo de textos teóricos, para qualificar o estudante, até a escolha das histórias que não devem ser peda-gógicas em excesso, nem dotadas de pouca literatura. Também são organizados cursos que ensinam a contar histórias para as crianças de modo que elas sejam fisgadas pela literatura.

No HSL, o envolvimento com os pacientes começa desde a che-gada das voluntárias. Pacientes

já acostumados com essas visitas não escondem a ansiedade de ouvir a história preparada para a ocasião. “No hospital, passamos nos quartos para chamar as crian-ças que podem sair dos leitos para se dirigir à sala de recreação, e lá realizamos a primeira sessão do dia”, conta Alessandra.

A sala de recreação é o am-biente mais infantil que os jo-vens pacientes podem chegar dentro da realidade hospitalar. A disposição dos brinquedos, das mesas e cadeiras adequadas ao tamanho de seus usuários faz o ambiente semelhante ao de uma

Dez anos de aventuras no Hospital São Lucas

creche. Os desenhos coloridos e os nomes que ocupam as folhas de papel que decoram as paredes recordam outras crianças que passaram pelas mesas.

Mesmo com tantas atrações, nada concorre com as contadoras de histórias, nem o videogame. Elas chegam de mansinho à sala e se juntam ao grupo curioso com as aventuras presentes nas pági-nas dos livros. Depois da história contada, os ouvintes soltam sua criatividade fazendo fantoches, máscaras, dobraduras, colagens e a criação de novas histórias. Neste instante, os novos artistas

A pró-reitora de Graduação da PUCRS, professora Solange Medina Ketzer, distribuiu agrade-cimento à comunidade universi-tária: “Em nome de toda a equipe que participa do projeto Literatu-ra Infantil e Medicina Pediátrica: Uma Aproximação de Integração Humana, da Faculdade de Le-tras, envolvendo a Faculdade de Medicina, a Biblioteca Central e o Hospital São Lucas que, há dez anos ininterruptos, narra histó-rias para crianças enfermas da Pediatria pela internação SUS, agradeço a colaboração de todos pelo incentivo dado por ocasião do Fato Literário, patrocinado pelo Grupo RBS, Banrisul e Go-verno do Estado do RS.

A comunidade da PUCRS de-monstrou extraordinário apoio na votação popular, expressão calorosa que comoveu todos aqueles envolvidos diretamente com o trabalho.

A satisfação foi redobrada, quando a conquista foi do prêmio máximo na categoria, decidida por 90 componentes do júri espe-cializado. O valor será totalmente destinado ao incremento do novo espaço na pediatria do HSL: uma Biblioteca Infanto-Juvenil.

A vitória foi de todos, mas, de modo especial, das crianças e dos familiares que as acompanham no período de internação e que lutam, a cada dia, pela manuten-ção do dom da vida. Grata!”

Prêmio destinado à biblioteca

Alunas da Faculdade de Letras da PUCRS lêem, há dez anos, histórias infantis para crianças enfermas no HSL

Fernanda Fell/ Hiper

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Porto Alegre, novembro-dezembro 2007 7comunicaçãohipertexto

Por Thais Silveira

A sociedade hiper-espetacular, a homenagem a Jean Baudrillard e Guy Debord e as pesquisas em comunicação debatidas nos gru-pos de trabalho foram as três ver-tentes principais do 9º Seminário Internacional da Comunicação. Promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Comunica-ção da Famecos, o seminário foi realizado dias 7 e 8 de novembro, no Campus Central da PUCRS. Entre os palestrantes estiveram os franceses Philippe Joron, Patrick Tacussel, Lucien Sfez e Michel Moatti, e os brasileiros Francis-co Rüdiger, Juremir Machado e Ivana Bentes.

Simulacros e (dis)simulações na sociedade hiper-espetacular era o grande tema do seminário. No primeiro dia, houve um painel sobre as idéias dos dois pensado-res homenageados: Guy Debord, que impactou o público com a obra “A Sociedade do Espetácu-lo”, e Jean Baudrillard, filósofo que desde 1968 intriga o campo da comunicação com o livro “ O sistema dos objetos”.

O convidado francês Patrick Tacussel destacou que os autores

ajudaram a pensar o mundo atual, mas com seus próprios equívocos. “Há dialética na abordagem, um pouco de realidade”, disse. Para Tacussel, os dois produziram textos sobre a sociedade contemporânea, mas com algumas visões diferen-tes: “Debord viu como um imenso acúmulo o que Jean Baudrillard chamou de mistura dos signos”.

A obra de Guy Debord foi questionada por Francisco Rüdi-ger. Para ele, a sociedade do es-petáculo perdeu sua força quando passou a ser comentada. “Debord perdeu de vista a crítica em razão de sua teoria”, disse. Segundo Rüdiger, Guy Debord foi o ícone, o exemplo e a imagem da sociedade que ajudou a revelar há 40 anos.

Um panorama crítico do uni-verso francês do jornalismo atual foi traçado por Michel Moatti, que apontou alguns episódios recentes que minaram a credi-bilidade das mídias na França nos últimos anos. Além disso, ressaltou o grande crescimento das mídias eletrônicas, os blogs por exemplo, como demonstra-ções de amadorismo midiático incapaz de cumprir o be-a-bá do jornalismo, esquecendo de apurar as informações. Alertou também

para o perigo que algumas mídias correm de tornarem-se aliadas da publicidade e dos homens de ne-gócio e da política, servindo para a manipulação e a propaganda. “A tomada do poder pelos comunica-dores sobre os repórteres se refor-çou nos últimos anos, com perdas para o jornalismo”, frisou.

Como se configura hoje a sociedade do espetáculo, ante-vista por Debord, foi o assunto de Juremir Machado. Segundo ele, o espetáculo venceu a mí-dia brasileira, e exemplificou: “A apresentadora Angélica diz que o bebê (seu segundo filho recém-nascido) mama e dorme bem e isso é notícia na sociedade do espetáculo”. Depois definiu: “O espetáculo é a dominação da mídia pelos seus patrocinadores, é a justaposição de interesses”. Citando as quatro teses de Guy Debord, explicou que o espetáculo não é uma imagem, é uma relação social de pessoas, mediada pela imagem. “Nossa sociedade é rela-cional mediada por imagens, onde há uma hipervalorização das ima-gens midiáticas. A publicidade, por exemplo, fala das coisas sem falar nelas”, isto é, vende o objeto sem se referir ao mesmo.

Patrick Tacussel: “Guy Debord e Jean Baudrillard: espetáculo e simulacro, os estilos da radicalidade”

Francisco Rüdiger: “Guy Debord e a teoria crítica: a atualidade de A Sociedade do Espetáculo”

Ivana Bentes: Tratou sobre as imagens de exce-ção e a violência

Philippe Joron: “Ge-orge Bataille e a comunica-ção soberana”

Michel Moatti: “O ex-cesso de comunicação mata a informação”

Juremir Machado da Silva: “Das (dis)simulações na sociedade hiper-espeta-cular”

Lucien Sfez: “A simu-lação do corpo midiático”

Robert Pritchard: “Confronting Media Nihi-lism: How transparency builds meaning during cri-ses”

OS PaleSTranTeS

Rüdiger, Tacussel e Juremir no Seminário Internacional de Comunicação

Sociedade espetacular hipervaloriza imagem

Mídia mostra simulacros edissimulações contemporâneas

Fotos Camila Domingues/ Hiper

Comunicação soberana, um dos assuntos do conferencista Philippe Joron

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Porto Alegre, novembro-dezembro 20078 mundo hipertexto

Por Rafael Lopes Codonho

O cenário é Pequim e o bairro majoritariamente residencial, com moradias antigas, restau-rantes pequenos e armazéns. Polarizado pelas faculdades Com-munication University of China (CUC) e Beijing International Studies University, a poucas quadras de suas sedes, o bairro tem uma estradinha de terra por onde cruzam carros antigos e motocicletas carregando mais peso do que o suportável. À beira da estrada, por detrás de grades, um cemitério protege suas lápi-des, cobertas por galhos, folhas e pássaros negros.

Atravessando a highway, uma vala de esgoto a céu aberto brinda os moradores. Uma senhora se agacha com uma vara na mão, na tentativa – logo bem-sucedida – de pescar um balde vermelho,

em meio a caixas de madeira, garrafas, sacolas e outros detritos. Se fosse uma região fronteiriça, a imaginação poderia divagar mais. No entanto, é um local comum, desprovido de tudo. É uma área desvalorizada como em qualquer grande cidade, onde a vizinhança é feita de não poucas raparigas da noite. Ah, e eles chamam estes lugares de casas de massagem!

Sobre o esgoto, uma ponte viabiliza a passagem de motos, bicicletas, ônibus, caminhões, derivados e cães. Em um canto, pouco escondido, um homem levanta a camiseta regata branca, coloca a barriga para fora e faz o que universalmente se imagina em frente a uma árvore selecio-nada. Ao lado dele, motos, carros e engradados de cerveja empi-lhados. Como qualquer paisagem chinesa, há uma construção sendo posta de pé.

As pessoas passam, estranham personagens de cabelos louros, narizes compridos, barbas, o sorriso fácil e ingênuo de quem passeia pelo desconhecido. Uns apontam para a novidade, outros sorriem, muitos ignoram. Seriam eles jornalistas? Um casal de meia-idade se aproxima e reclama de tanta sujeira. Depois de alguns minutos, descobre-se que era uma denúncia discreta, mas ainda uma denúncia.

Mais uma vez, quem não é da terra passa o sufoco de não enten-der e não ser compreendido, sen-sação permanente e inaceitável. É como ir ao McDonald’s e apontar na foto um milkshake sem falar uma palavra. “É pra levar ou come aqui mesmo?”. “Sim”. Um riso debochado surge no outro lado do balcão. O milkshake é mar-rom, mas dizem ser de morango. A fragilidade de estrangeiro não

permite protestar, e as poucas palavras aprendidas são usadas para explicar o incidente. Tudo leva muito tempo e o desgaste faz com que se aceite que chocolate é a mesma coisa que morango.

São avistados alguns homens. O primeiro está de bicicleta e leva atrás uma carga, outros dois an-dam em passo lento e, nos lábios, um sorriso maroto. Um deles veste pijama branco de mangas e calça compridas e tênis preto. “Empijamar-se” é quase um li-festyle: alguns casais vão às com-pras e passeiam à noite vestidos com o traje. Com a vestimenta, alguns ostentam uma luxúria não percebida por quem é de fora. “É tudo muito tradicional”. A frase, acompanhada por uma expressão de estranhamento e desdém, per-segue os indefesos. Chamar algo de tradicional legitima, atribui uma aura, e o casulo é construído

para ser hermético. O desavisado perde a pose e engole.

O “empijamado” e seus dois comparsas passam, sem grandes emoções. O anticlímax vai e volta. O aventureiro procura uma trilha sonora: a Ópera de Pequim, apesar de tradicional, é um pouco noisy para o momento. O barulho indica que algo desabou na lama. Se isso acontecesse na zona norte carioca, as pessoas já estariam colocando relógios, vales-refeição e a foto do santinho da sogra no chão. Ao olhar para o depósito de lixo, se vê uma bicicleta que foi parar no esgoto, intencionalmente. Não, a mãe de ninguém foi ofendida, o condutor não esbravejou. Risos aqui e acolá, os três foram resgatar o que caiu naquela água nada cris-talina. A bicicleta voltou a circular como meio de transporte. Mas o que perturba é aquele pijama nas ruas, imbatível e onipotente.

CRôNICA DA ChINA

Conheça a periferia de PequimNos subúrbios da capital chinesa, a pressa nas transformações deixa à mostra esgoto e dejetos

Fotos André dos Santos/ Hiper

Mulheres usam sombrinha para manter a pele branca, ideal de beleza oriental Roupas e cobertores secam nas ruas de bairro antigo pequinês. E a moradora usa máscara de beleza

Depósito de lixo a céu aberto Casas tradicionais são destruídas para dar lugar a conjuntos residenciais Ao fundo, prédio da CUC: constraste entre o moderno e a vida precária

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Porto Alegre, novembro-dezembro 2007 9comunicaçãohipertexto

Por Natasha Centenaro

Promover a identidade e a cultura nacional como alternativa à restritiva e segmentada progra-mação da televisão comercial é a proposta da TV Brasil, que deve começar a funcionar junto com as primeiras transmissões do sinal digital aberto. Com no mínimo quatro horas de programação local e outras quatro de produção independente, a nova TV preten-de ser a porta-voz da diversidade e promover a cidadania no país.

A TV Brasil foi debatida em audiência pública promovida pela Comissão de Serviços Públicos da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul. Na ocasião, o modelo e os desafios da im-plantação desse formato foram apresentados pelo ministro da Secretaria de Comunicação So-cial do Governo Lula, jornalista Franklin Martins. A reunião con-tou também com a participação do vice-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e coordenador-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, professor Celso Augusto Schröder, e da Secretária da Cultura do Estado, jornalista Mônica Leal.

O decreto que regulamenta a nova rede de televisão pública no país já foi publicado no Diário Oficial da União. A proposta cria a Empresa Brasileira de Comu-nicação (EBC), com atuação em todo território nacional. Serão destinados, inicialmente, R$ 20 milhões, através da Medida Pro-visória nº 398.

“A TV é a grande praça onde o país se encontra e por isso ela deve ser a porta de entrada para as diferentes culturas, local e na-

cional, e deve representar todos os sotaques do Brasil”, afirmou o ministro ao destacar o relevante papel da televisão na sociedade brasileira. O ex-comentarista po-lítico da Rede Globo argumentou que o modelo predominante no país é o da televisão privada, em detrimento dos canais públicos ou estatais. “As programações dessas redes não oportunizam um espaço para a divulgação da cultura nacional e esquecem que a obrigação primordial de um canal de comunicação é com o pú-blico, para, assim, ser um agente de transformação comprometido

com o social. A televisão pública surgiu para preencher esse espa-ço fundamental”, assegura.

Setores da sociedade que dis-cutem o projeto vêem pontos que precisam de análise e um maior esclarecimento do Governo, pois o diálogo com as entidades civis e os setores de comunicação teria se mostrado ineficiente e, em alguns aspectos, contraditório. Desde o início está previsto um Conselho Gestor que, para os Movimentos Populares Sociais e os profissionais envolvidos, necessita da representação dire-ta da sociedade. Do outro lado, o Governo responde que essas instituições não precisam estar ligadas incisivamente ao Conse-lho, pois não seria a vinculação com as entidades que confere o caráter público à televisão. A crí-tica está na possível composição desse Conselho por “notáveis” indicados pelo Presidente. O ministro reagiu com veemência à ponderação. Para ele, não existe ninguém mais autorizado que Lula para nomear, lembrando sua eleição para a Presidência. “Ele é o representante da socie-dade no comando do país e tem as ferramentas para escolher”, asseverou. Martins não aceita a denominação de Conselho de Notáveis. “O órgão não deve ser representativo de corporações ou qualquer entidade”, completa.

Para o jornalista Celso Schrö-der, o Conselho é só uma entre as demais questões que precisam ser levadas em conta para a efetiva-ção de uma televisão realmente com viés público. Ele enfatizou que a rede pública tem que ter ga-rantias com relação ao conteúdo, à horizontalidade que possibilita uma democracia de verdade, au-tonomia e racionalidade econô-mica. Com isso, o coordenador do

Fórum Nacional para Democra-tização da Comunicação defende um modelo que esteja alicerçado a um corpo técnico profissional e especializado para assegurar, principalmente, a qualidade de conteúdo e a independência de qualquer governo.

Schröder citou o documento Propostas Preliminares para um Modelo de Radiodifusão Pública Aplicável aos Sistemas Estatal e Público de Comunicação no Brasil, enviado à Presidência e apresentado no I Fórum Nacional de TVs Públicas como uma alter-nativa de gestão, estruturação e aplicabilidade para a TV proposta pela Secretaria de Comunicação e sancionada por Lula.

A idéia se mostrou um passo importante para romper com os monopólios das grandes empre-sas de comunicação no Brasil. No entanto, ainda restam diver-gências para a solidificação de um canal que nasça e consiga se manter público, desde a sua ad-ministração até a programação. “O espaço da diversidade precisa contemplar um requisito essen-cial: mostrar o Brasil para o Bra-sileiro, informando os cidadãos, única causa pela qual a imprensa sobrevive”, ensina Schröder.

A nova TV Brasil, estatal ou pública?

Schröder, a posição da Fenaj

Franklin vê legitimidade no presidente para a escolha do Conselho da TV

Fotos Elson Sempé Pedroso/Hiper

Conselho indicado pelo presidente e não pela sociedade civil organizada é a grande discussão

“Deve ser um agentede transformação”

Entidadescivis reclamam

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Porto Alegre, novembro-dezembro 200710 esporte hipertexto

Porto AlegrerAdicAl

Durante mais de 30 dias, Porto Alegre foi a capital da adrenalina. A segunda edi-ção dos Jogos Radicais , que ocorreu de 27 de outubro a 3 de dezembro, possibilitou aos atletas e admiradores um convívio com diferentes modalidades.

No primeiro final de se-

No Parque Marinha do Brasil, em Porto Alegre, o skate tem o lu-gar ideal para a prática de sua pri-mordial função: “surfe no asfalto”. O esporte foi criado nos anos 60 por californianos cansados de não ter o que fazer em dias sem ondas. Já os porto-alegrenses se especializaram na categoria skate surf style, devido à total impossi-bilidade de pegar ondas.

Geoge Barwinkel, o Dodi, presidente do Marinha Skate Club (entidade reconhecida pela Fede-ração Gaúcha de Skate) explica que a modalidade consiste em fazer manobras do surfe no skate. “Inclusive o formato de competi-ção é o mesmo: uma bateria tem três voltas em que são somadas apenas as duas melhores”, disse. Neste ano, o evento contou com a presença do locutor Marcel de Rose, conhecido por narrar campeonatos de surfe, o que o

fez algumas vezes se confundir na narração. “A moral é ficar o mais parecido possível com o surfe, mas sem forçar a barra”, pondera Dodi.

Marcelo Lima Pingret, o Shao-lin, 24 anos, anda de skate desde os 11. Começou com o street, que é a modalidade mais praticada no Brasil, onde são usados obs-táculos encontrados na rua, como corrimãos e escadarias. Alguns anos depois, sua paixão por pe-gar ondas e a energia do parque fizeram com que ele se identi-ficasse com o surf style. Apesar do trabalho, ele reserva tempo durante a semana para praticar e já acumula diversas vitórias em campeonatos. Para Shaolin, o esporte serve como um treino para quem só pode ir à praia nos finais de semana. “O Marinha é o refúgio nesta selva de pedras em que vivemos. O parque passa uma

energia, uma espiritualidade que a galera consegue se imaginar até surfando no concreto”, assegura o jovem.

AcidentesAlém de ser um esporte de

velocidade, técnica e adrenalina, o skate é praticado em superfície bem dura, onde os riscos são considerados grandes. “Como tudo na vida tem um lado bom e outro ruim, comigo mesmo já aconteceu diversos tombos, arra-nhões, esfolados. Abri o supercílio quando bati de rosto em uma das paredes no último campeonato. O capacete me salvou de ter aberto a cabeça, mas não tive a mesma sorte com as costas, que foram comidas pelos cascalhos da pista. Já teve gente que morreu no Ma-rinha. Por isso, aquele ditado: use equipamentos e evite ferimentos”, aconselha Shaolin.

Skate surf style: longe do mar, mas perto das ondas

Adrenalina pura durante osJogos radicais no Marinha

e na praia de ipanema

mana, o Parque Marinha do Brasil se tornou reduto dos esportistas, recebendo mais de cinco mil pessoas. Para animar os presentes, show de hardcore e a presença de DJs conhecidos no cenário eletrô-nico. Entre competições de skate e demonstrações de BMX e mountain board, não faltou ação, espírito de aventura e capacidade de superação. Os atletas, vindos de todo o Brasil, mostraram um amplo reper-tório de manobras e aéreos na pista de skate do parque.

No segundo final de sema-na, dias 10 e 11 de novembro, foi a vez do kitesurf. Depois de um sábado de chuva, os parti-cipantes foram presenteados com um domingo de muito sol e vento, fazendo com que os atletas tivessem excelentes condições para dar um show para as pessoas que passeavam na praia de Ipanema. Apesar do público não estar presente da mesma forma como no Parque Marinha do Brasil, centenas de pessoas puderam conferir dezenas de pipas colorindo os céus de Porto Alegre.

Os Jogos Radicais ain-da englobam esportes como wakeboard (foto), montain bike e skate down hill.

Por Helena eilers e Jamille callai

Manobras do skate na pista do Parque Marinha, em Porto Alegre

camila domingues/Hiper

Pedro revillion/Hiper

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Porto Alegre, novembro-dezembro 2007 11esportehipertexto

Esporte relativamente recente e que não para de crescer, o kite- surf mistura surfe, windsurfe e wakeboard. Ele se baseia em des-lizar e voar sobre a água, puxado por uma pipa. Pode ser praticado tanto no mar como em lagos ou represas. O mais importante é ter vento constante. Em Porto Alegre, serve como mais uma opção para quem gosta de esportes aquáticos e quer uma atividade mais radical do que a clássica natação.

Radicalidade não falta ao esporte. Pode se tornar perigoso quando praticado sem auxílio de um instrutor. Elías Seadi, instru-tor da escola Raia 1, tem 20 anos e começou a praticar windsurfe com 11. No ano passado, foi campeão brasileiro e vice-sul-americano. Há quatro anos praticando kite, já passou por alguns momentos de sufoco. Por ser um esporte que depende das condições atmos-féricas, às vezes, a instabilidade do vento deixa os praticantes na mão. Há alguns dias, ele treinava no Guaíba quando o vento parou. A pipa caiu e não decolou mais. O jeito foi subir na pipa e remar em torno de 40 minutos para

alcançar terra firme. Além disso, Seadi conta que o perigo é maior nas decolagens e nos pousos dos saltos. “Acontece às vezes, no instante da decolagem, o vento aumentar e o cara sair na areia e até bater em um carro ou um poste”, alerta.

Por ter ventos constantes, o Rio Grande do Sul é um ótimo local para a prática do kitesurf, que ganha cada vez mais adep-tos. Entretanto, devido ao custo dos equipamentos e das aulas, o esporte acabou se restringindo a classes mais altas da população. Uma pipa nova custa entre US$ 600 e US$ 1650, e as aulas, em torno de R$ 150 a hora. Seadi pode se considerar um atleta de sorte porque vive do esporte que gosta. Como instrutor, dá aulas enquanto a temperatura ainda está amena. No inverno, viaja para treinar em outros estados mais quentes e, recentemente, voltou do Havaí. Ele ressalta que o trabalho não é moleza: “Tomo torrão, fico com frio, bolha nas mãos, estou com corte nos dois pés. Mas, tirando isso, o resto é detalhe”.

O snake consiste em percorrer toda a pista, indo de borda em borda, fazendo o movimento de uma cobra. Nos Jogos Radicais, ele foi divido na categoria com e sem cone, chamadas de slalom e speed, e contou com a presença de homens e mulheres. Nas duas, o ganhador é o que fizer o percurso em menos tempo.

A assistente social Vanessa Sigal começou a andar de skate street com o incentivo de um ex-namorado. “Ele me ensinou os primeiros passos. Depois, co-mecei a andar de skate semi long (com a tábua intermediária entre a pequena, usada para o street, e a grande, chamada de longboard) pelas avenidas de Porto Alegre. Quando passou a ficar sem graça, me pilhei para andar na pista do Marinha, pois estava faltando

uma adrenalina a mais”. Há dois anos ela pratica a modalidade snake e ficou em segundo lugar na categoria sem cones nos Jogos Radicais deste ano.

No RS, o skate feminino vem ganhando espaço, mais adeptas e, assim, aumenta o nível dos campeonatos. Vanessa afirma que muitas pessoas acham que skate e mulher não combinam. “É como se andando de skate perdêssemos a feminilidade. Eu me cuido, me produzo como qualquer mulher. Nós, meninas skatistas, somos corajosas e ousadas, o que con-sidero um privilégio. O skate me prepara para enfrentar os desa-fios da vida e ter persistência e dedicação, fundamentais para vida profissional e afetiva. Caio, levanto e sigo em frente, pois é pra frente que se anda”, ensina.

Kitesurf: Um esporte com o vento a favor

Snake, adrenalina e velocidade

Deslizar e voar sobre as águas

Por Thiago Oliveira

Autor do livro “O Dia Em Que As Mulheres Viraram A Cabeça Dos Homens”, baseado na saga da Seleção Brasileira feminina de futebol que ganhou a medalha de prata nas Olimpíadas de Atenas, em 2004, Renê Simões, técnico de então da equipe, considera que a jogadora Marta é um fenômeno do futebol. “A Marta não está para o Ronaldinho Gaúcho. A Marta está para o futebol feminino como Pelé esteve para o masculino”, definiu.

O torcedor brasileiro desco-briu o futebol feminino durante os Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro, neste ano. Embora a modalidade já existisse há mais tempo, a Seleção Brasileira fez uma campanha incontestável até a conquista da medalha de ouro, em cima dos Estados Unidos, e despertou um interesse forte da população.

Na competição, foram seis vitórias, 33 gols marcados e ne-nhum sofrido. E Marta, a melhor jogadora do mundo, brilhou. Foi a artilheira do Pan com 12 gols e eleita a melhor atleta da com-

petição.Outro feito foi o segundo lu-

gar inédito na Copa do Mundo, na China. O Brasil foi derrotado pela Alemanha na final, por 2x0, quando Marta perdeu inclusive um pênalti.

A Fifa começou o evento de premiação da melhor jogadora do mundo a partir de 2001. O Brasil surgiu entre as três finalistas em 2004, quando Marta ficou com o terceiro lugar. No ano seguinte, ela conquistou uma segunda co-locação, e, na temporada passada, foi eleita a craque do planeta. Os fatos provocaram a pressão das jogadoras da Seleção Brasileira e da própria Fifa junto à Confede-ração Brasileira de Futebol (CBF) para a necessidade de organização de uma competição nacional. Na época do Mundial na China, as atletas estenderam uma faixa pe-dindo apoio para o esporte.

Às pressas, a entidade presidi-da por Ricardo Teixeira divulgou no começo de outubro a tabela da Copa do Brasil para mulheres, que começou dia 30 de outubro, com a participação de 32 times de todas as regiões do país. A duração, cur-ta, é de apenas 41 dias. A CBF ar-

gumenta que o campeonato teria que ser realizado o quanto antes, visto que o futebol feminino está na mídia e não seria conveniente adiar a realização do torneio. A entidade se comprometeu a pagar a despesa dos clubes.

Para nivelar a competição, os jogos da primeira fase foram divididos por regiões e foram disputados em um formato de confrontos de ida e volta. Resta-rão oito clubes, divididos em dois grupos de quatro, que começam a se enfrentar em Brasília. Classifi-cam-se dois clubes de cada grupo para as semifinais. Os vencedores farão a final da competição no dia 9 de dezembro.

A escolha dos clubes repre-sentantes dos estados na Copa do Brasil gerou algumas polêmicas. No Rio Grande do Sul, o Pelotas protestou por ter ficado de fora, já que disputou todas as edições do Campeonato Gaúcho da catego-ria, enquanto o futebol feminino do Inter, que disputou o torneio, estava fechado há quatro anos. No Rio de Janeiro, a força política de Eurico Miranda tirou o Cepe de Duque de Caxias, tricampeão estadual, e colocou o Vasco.

O Internacional, com passado de vitórias no futebol feminino, e o Juventude, atual tricampeão estadual na categoria, represen-taram o Rio Grande do Sul, mas não se deram bem. O Inter eli-minou o próprio Ju e depois caiu diante do São José, do Paraná.

Como a equipe colorada es-tava desativada, o clube fechou

uma parceria com a ex-jogadora colorada Maria Eduarda Luizelli, a Duda. A atleta tem uma esco-linha de futebol e participa de competições femininas.

No Juventude, o departamen-to de Futebol Feminino iniciou as atividades em 1999, quando participou pela primeira vez do Campeonato Serrano, realizado

em Caxias do Sul, Canela e Flores da Cunha.

O Pelotas também tem tradi-ção no futebol feminino. Com a convocação de três jogadoras da equipe para a Seleção sub-17, o time vê crescerem as chances de ter jogadoras no grupo que dis-putará o Campeonato Mundial, em 2008, na Nova Zelândia.

Vinícius Roratto Carvalho/Hiper Agora é que são elas

Inter e Juventude caem na primeira fase

FUTEBOL FEMININO

Na Copa do Brasil, as garotas do Inter eliminaram o Juventude mas caíram no mata-mata seguinte contra o Paraná

Camila Domingues/ Hiper

Page 12: Jornal da Famecos/ PUCRS. Porto Alegre, novembro-dezembro ...projetos.eusoufamecos.net/memoria/wp-content/... · esquema do Detran gaúcho, as tabelas de preços dos serviços para

Porto Alegre, novembro-dezembro 200712 ponto final hipertexto

Por Yara Tropea

Chiquinha não precisa de personagens. É o comportamento que a inspira. Também não precisa do computador. Desenha com papel e caneta. Aliás, Chiquinha não preci-sa de nada para desenhar. “Eu não sei dese-nhar. Eu engano”. O que ela quer é contar histórias e isso sabe fazer. Chiquinha é a personagem dela mesma, Fabiane Bento Alves, 23 anos, estudante de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social (Fa-mecos), cartunista do jornal mais vendido do país, a Folha de São Paulo. Mas isso não é suficiente para conhecê-la. É bom saber, por exemplo, o que a move.

Na verdade, Chiquinha quer convencer que é possível ser jornalista através dos quadrinhos. E mostra. Desafiada pelo pro-fessor da Famecos Tibério Vargas Ramos a revelar do que ela estava falando, montou uma reportagem em quadrinhos sobre os mexilhões que aparecem nos cascos nos navios e causam problemas ambientais no rio Guaíba. Ganhou o último Set Universi-tário na categoria cartum.

“As pessoas esquecem que quadrinho não é só desenho. É texto também. Dá pra dizer que é uma mistura de literatura com cinema”, exagera. A monografia de con-clusão de curso não foge do seu assunto preferido. Mergulha na obra de Joe Sacco, repórter de guerra que, ao invés de escre-ver, ilustra e é o ícone do que ela chama de “new new journalism”. Mas sabe que ainda está longe de ter a credibilidade que um texto comum. “As pessoas ainda não levam a sério. Cartum está ligado à diversão”.

A estudante que começou na sessão “Pretensão” da revista Mad, publicou na “Abre-Alas” do Jornal do Brasil, voltou à Mad para matérias grandes em quadrinhos e fez vários trabalhos sem compromisso. É uma universitária em final de curso que,

Chiquinha, a repórterque desenha a notícia

Fabiane Bento Alves, estudante de Jornalismo na Famecos,já é, simplesmente, cartunista contratada da Folha de S.Paulo

até pouco tempo, não sabia usar a Internet para vender seu trabalho. Depois que ami-gos fizeram um blog, se viu obrigada a pos-tar e entendeu que o lazer podia dar alguma grana. A página eletrônica foi ponte para os veículos impressos. Agora, está convencida que a Internet não era só “egotrip”, como gosta de dizer, mas também pode ser usada profissionalmente.

No colégio, respondiacom balõezinhosEla tem apenas três anos como cartu-

nista profissional e nunca fez um curso específico. “Eu nunca comecei a desenhar. Eu sempre desenhei”. Nas provas do colé-gio não sabia explicar as coisas e respondia tudo com balõezinhos. Lia Mad, Chiclete com Banana, Laerte, Circo e diz que isso “formou seu caráter”.

Além da Folha de São Paulo, produz para o Diário de Pernambuco e a revista masculina Sexy Premium. Foi lá que Chi-quinha criou Astrúbal Eqüino, o cavalo-ator pornô que surgiu por causa da timidez da garota. Não se sentia à vontade para desenhar mulheres nuas, então o criou. O editor que queria histórias mais picantes e menos inocentes agradeceu.

Para os diários Folha e Diário de Per-nambuco, ilustra os cadernos jovens Fo-lhateen e Fanzine, respectivamente. Nesse caso não precisa de figuras. Usa as reais mesmo. “As pessoas dizem que sou criati-va, mas eu não sou. Sou boa observadora”. Procura retratar a garota que espera ao lado do telefone que nunca toca, o músico fracassado, o bêbado, as histórias do coti-diano, sem precisar de personagens.

Ela ainda não trabalha para os gaúchos. Mas gostaria. “Seria tri trabalhar por aqui. Mas não trabalho de graça. Cartunista não vive de brisa”. De boba, Chiquinha não tem nada. Ela sabe que vale o quanto pesa. Quer embarcar no mundo de Chiquinha? www.insanus.org/chiqsland

Vinícius Roratto Carvalho/ Hiper