John Love - A Vitória Sobre a Morte

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Por John Love A VITÓRIA sobre a morte

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Por John Love

A V I T Ó R I As o b r e a m o r t e

A vitória sobre a morte

Por John Love

John Love (1757-1825) foi ministro da Igreja da Escócia em

Londres e em Glasgow, e um dos organizadores do moderno

movimento de missões estrangeiras. John Macleod escreveu a

respeito dele: “Ele foi profundamente influenciado, no início

da sua experiência espiritual, por Jonathan Edwards e por ir-

mãos mais velhos da linha introspectiva da Nova Inglaterra.

Essa influência se mostrou indelével no ensino de Love. Quan-

do o Rabi John Duncan foi ordenado na Milton Church, em

Glasgow, em 1836, aqueles que estimavam o ministério de

Love consideraram Duncam “como Eliseu, sobre quem tinha

sido lançado o manto do seu senhor”. Os dois sermões a seguir

são de 1799, pregados em Greenock, Escócia, e foram publica-

dos no livro de Love chamado “Discourses on Select Passages

of Scripture1” (Edimburgo, 1829).

“Tragará a morte para sempre, e, assim, enxugará o SENHOR

Deus as lágrimas de todos os rostos, e tirará de toda a terra o

opróbrio do seu povo, porque o SENHOR falou” (Is 25.8).

1 Algo como “Sermões sobre passagens bíblicas selecionadas”. — N. do T.

John Love

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Primeiro Sermão Os bosques do paraíso original eram bonitos e agradáveis, per-

fumados e frutíferos; mas, por causa da inconstância e ingrati-

dão do homem, o pecado encontrou lugar para entrar nesse

paraíso, e a morte imediatamente o seguiu.2

A terra de Canaã foi preparada pela bondade de Deus

para a posteridade de Abraão, como uma espécie de segundo

paraíso; mas, veja os efeitos do pecado! Veja, no capítulo ante-

rior do livro de Isaías, as ameaças de ira proferidas pelo Deus

de Israel contra a Sua terra escolhida. A morte e a ruína cobri-

am aquela região sagrada.

Meus irmãos, o destino de toda a humanidade é estar

sujeita ao império da morte, o rei dos terrores; por isso, onde

quer que se mencione a salvação e a felicidade do homem, é

preciso dar atenção a esse importante mal; se não se fizer pro-

visão contra esse flagelo, toda a obra estará inacabada.

A nação e a igreja israelita que residia em Canaã foi o

palco onde o grande e ungido Salvador da humanidade seria

agora mostrado a todas as nações. A esperança da Sua vinda

era tão odiosa a Satanás e a seus anjos, que eles não podiam

deixar de ranger os dentes contra essa nação e igreja, onde Ele

mostraria a Sua glória. Por outro lado, no meio de todo tipo de

provocação e miséria, o zelo do Senhor dos exércitos em favor

do Messias e da Sua obra guardou essa nação escolhida e o seu

povo. E, para preservar esse estado de coisas, ajustado para a

manifestação do Salvador, executou esses juízos sobre os ím-

2 Tiago 1.15. — N. do T.

A vitória sobre a morte

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pios presunçosos, os quais são celebrados pelo profeta nos

primeiros cinco versículos deste capítulo.

Mas de que forma atraente, nos versículos seis, sete e

oito, ele descreve os frutos da longamente aguardada chegada

do Redentor dos homens moribundos! Um banquete para as

culpadas almas imortais de todas as nações; um banquete di-

vinamente preparado, indescritivelmente rico e satisfatório! A

fim de desfrutar esse banquete espiritual, Deus opera a remo-

ção da incrédula escuridão da mente anuviada! A consequên-

cia de haver provado esse refrigério vivificante é a vitória sobre

a morte! Benditas notícias! “Bem-aventurado o povo que co-

nhece os vivas de júbilo...!” (Sl 89.15).

Para tentar ilustrar um assunto tão precioso, permita-

me, primeiro, fazer algumas advertências sobre o significado

desta expressão singular: “Ele tragará a morte para sempre”.

Em segundo lugar, pretendo apresentar uma visão abrangente

dos métodos por meio dos quais o Deus da salvação faz com

que o Seu povo tenha vitória sobre a morte. Em terceiro lugar,

analisaremos as diferentes circunstâncias e períodos dessa

importante vitória.

I. Pretendo fazer alguns comentários a respeito dessa expres-

são singular, uma expressão cheia de significado e energia: “Ele

tragará a morte para sempre”.

1. O mero som das palavras comunica a ideia de um

solene e terrível conflito. A razão e o assunto da peleja é um

pobre e moribundo verme da terra. Mas quem está envolvido

no conflito? De um lado está o Rei da glória, Jeová, o Deus dos

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exércitos, coberto de majestade, vestido de poder, inflamado

de poder onipotente para subjugar o inimigo oponente. Por

meio da solenidade do combate, da parte de Deus, descobri-

mos a natureza formidável e as características da Morte, o rei

dos terrores. Aquele que disse, no princípio: “é certo que não

morrereis”, continua enganando os filhos da insensatez, ensi-

nando-os a zombar, com desdém insolente, da morte que re-

conhecem como inevitável. Eles se animam, com Agague,3

supondo que logo passará a severidade da morte que ainda

não experimentaram. Mesmo os filhos da sabedoria, às vezes,

são tranquilizados até dormir, quando acolhem pensamentos

superficiais a respeito do seu conflito final com esse inimigo.

Mas não nos enganemos. A declaração desse texto, rico em

graça e salvação, ensina-nos a pensar na morte com temor

respeitoso, como um adversário difícil. Para subjugar o terror

dela, e para aniquilar o seu domínio, o Todo-poderoso surge

numa peleja séria, e obtém para Si mesmo “um nome glorioso

e eterno”.

2. Mas, apesar de nos alertarmos e nos humilharmos

por meio desse entendimento da terrível natureza da morte,

animemo-nos confiantemente, reparando como o texto intro-

duz no conflito o infinito zelo de Deus: “Ele tragará a morte

para sempre”. Com que ímpeto divino o Deus da compaixão

irrompe no campo de batalha, quando a morte assalta os filhos

do Seu amor! Como um pai que, quando vê o filho sendo ata-

cado por um animal selvagem, ou por uma serpente, ou por

um agressor humano, precipita-se de uma vez contra o inimigo

e, se for mais forte que o atacante, rasga-o em pedaços. Assim

3 1 Samuel 15.32. — N. do T.

A vitória sobre a morte

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o Deus bendito descerá, “terrível, do Seu santo lugar”, para

lutar por Seus filhos, quando a mão de ferro da morte se puser

sobre eles. São esses os pensamentos sugeridos por Deus nes-

se texto, e mais explicitamente em Oséias 13.14: “Eu os remirei

do poder do inferno e os resgatarei da morte; onde estão, ó

morte, as tuas pragas? Onde está, ó inferno, a tua destruição?

Meus olhos não veem em mim arrependimento algum”.

3. Vemos, meus irmãos, desta forma, que “Preciosa é

aos olhos do SENHOR a morte dos seus santos” (Sl 116.15).

Além do mais, as mesmas palavras que mostram a grandeza do

amor de Deus nos levam a contemplar a glória do Seu eterno

poder, infinitamente mais do que suficiente para operar essa

importante vitória sobre a morte. “Ele tragará a morte para

sempre”. O Seu braço será suficientemente poderoso para

esmagar esse inimigo. Depois de subjugar o poder da morte, a

Sua mão direita se mostrará gloriosa em poder, poder sem

limites, em vigor maior do que aquele que de fato foi empre-

gado. A tremenda força da morte cederá ante a aproximação

do misericordioso poder de Jeová, como um gigante afunda no

vasto oceano, suficiente para ser a sepultura de milhões e mi-

lhões lado a lado.

Para que vocês creiam isso de todo o coração, irmãos

(e crer nisso de fato, na hora da morte, será muito importan-

te), lembrem-se da majestosa energia das silenciosas e pacífi-

cas ações do Deus onipotente na criação do universo, quando

não havia resistência inimiga nenhuma para ser superada.

Quem, então, pode conceber a triunfante eficácia do Onipo-

tente quando comovido, irado, inflamado pelo Seu amor zelo-

so?

John Love

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Esses são os aspectos que, humanamente falando, o

Espírito nos abre no texto, e em outras passagens. Ao mesmo

tempo, deixando de lado as personificações figurativas da mor-

te, fortalecemos nossa fé quando consideramos que, por maior

e mais apavorante que seja o poder desse mal, esse poder vem

de Deus. A morte é obra de Deus; ela é a censura de Deus con-

tra o pecado do homem. Segue-se que o mal que procede de

Deus, no que diz respeito à santa seriedade, necessariamente

tem de estar totalmente debaixo do Seu controle, e facilmente

será conquistado e absorvido pelo Seu amor triunfante.

4. Se, portanto, a causa da vitória é todo-suficiente, o

efeito, na experiência dos cristãos moribundos, precisa ser

uma rica sensação de vitória. “Em todas estas coisas, porém,

somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou”

(Rm 8.37). Quando Deus Se manifesta para tornar realidade

esse texto, o resultado é uma superabundante plenitude de

vitória sentida pela alma que está partindo. Pelo fato de rece-

ber uma força suficiente no presente, o crente deve avistar um

infinito tesouro além; as suas graças na hora da morte, fé, pa-

ciência, resignação, esperança e amor, devem ser ricamente

renovadas. A alegria da conquista deve ultrapassar tudo o que

ele jamais anteviu, e, com uma inexprimível exclamação de

gozo, lançar-se no oceano da eternidade. “Ora, àquele que é

poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto

pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em

nós, a ele seja a glória, na igreja e em Cristo Jesus, por todas as

gerações, para todo o sempre. Amém!” (Ef 3.20,21).

II. Uma vez que consideramos a particular forma de expressão

do texto, pretendemos avançar, meus irmãos, conforme nos

A vitória sobre a morte

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propusemos, para obter uma visão mais ampla do assunto, e

investigar por quais métodos o sábio e misericordioso Deus

conduz o Seu povo à vitória sobre a morte.

1. Isso é feito por uma clara e poderosa revelação da

glória de Deus.

Estêvão, o mártir, ao entrar nessa vitória, iniciou seu

último discurso com essa observação; e quem pode conceber a

maneira como ele sentiu a majestade das suas próprias pala-

vras? “O Deus da glória apareceu a Abraão, nosso pai, quando

estava na Mesopotâmia, antes de habitar em Harã, e lhe disse:

Sai da tua terra e da tua parentela e vem para a terra que eu te

mostrarei” (At 7.2,3). Essas palavras do inspirado sofredor des-

tacam a eficácia da iluminação divina, num caso análogo ao

que estamos considerando. O objetivo em vista era ajustar a

mente de Abraão para uma separação final de todo bem-estar

da sua terra natal, e fazer com que ele desejasse seguir o Deus

invisível para uma terra estranha e desconhecida. Mil argu-

mentações e questionamentos poderiam surgir em sua mente

contra essa proposta. Mas, para removê-las todas, e conceder

decisão e firmeza à mente do patriarca, “O Deus da glória apa-

receu a ele”. A transcendente excelência de Jeová foi profun-

damente impressa em sua alma: ao contemplar a Deus, e cati-

vado pelo amor divino, ele não hesitou em oferecer o sacrifício

requerido, e, em cada passo para longe de sua casa, ele glorifi-

cou o seu Deus.

Paulo fala de cansativos e difíceis sofrimentos descre-

vendo-os como leves e momentâneos; ele representa o cami-

nho da morte até o tribunal de Jesus Cristo como iluminado de

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um suave e convidativo brilho. Como ele chegou a essas idei-

as? Ouçam-no, meus amados irmãos, quando ele explica a

origem da sua grandeza de alma: “Porque Deus, que disse: Das

trevas resplandecerá a luz, ele mesmo resplandeceu em nosso

coração, para iluminação do conhecimento da glória de Deus,

na face de Cristo” (Compare 2 Co 4.17,18 e 5.1-10 com 2 Co

4.6).

Uma poderosa revelação da glória de Deus conduz a

alma à vitória sobre a morte. A suficiência da revelação para

produzir tal efeito se torna evidente quer consideremos a ex-

celência da glória manifesta à alma, quer levemos em conta a

majestosa clareza e evidência da luz que opera essa revelação,

ou a maravilhosa e imponente influência dessa luz sobre aque-

le que a recebe.

A glória de Deus, com as perfeições essenciais de Jeo-

vá, os Seus santos atributos morais, o Seu misterioso amor, a

Sua completa suficiência ilimitada, é assunto tão sublime e

magnífico, que o seu resplendor eclipsa toda excelência terre-

na; e, de acordo com a intrépida linguagem do profeta, no

capítulo precedente, faz com que o sol e a lua se envergonhem

de aparecer (Is 24.23).

Mas a revelação desse impressionante assunto, à luz

de Deus, conduz a alma para longe da fria região das opiniões e

das conjecturas. Essa luz, corretamente chamada nas Escritu-

ras de “maravilhosa luz”, brilha do alto com majestosa evidên-

cia, demonstrando a sua origem celestial, desfazendo toda

dúvida, encorajando a alma a descansar inteiramente por toda

a eternidade na segura verdade de Deus.

A vitória sobre a morte

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Um assunto tão vasto, tão glorioso, apresentado à

alma em tal luz, forçosamente possui uma força irresistível,

atrativa; afasta o coração do sistema inferior de coisas; empe-

nha o espírito imortal em retomar a sua eterna habitação no

próprio Deus. Esta é a linguagem, não do entusiasmo humano,

mas das Escrituras: “Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de

geração em geração” (Sl 90.1); “Pois disseste: O SENHOR é o

meu refúgio. Fizeste do Altíssimo a tua morada” (Sl 91.9); “...

aquele que permanece no amor permanece em Deus, e Deus,

nele” (1 Jo 4.16).

A consequência, em relação à morte, é óbvia. A remo-

ção de um mundo para outro não é mais uma mudança essenci-

al; é apenas uma alteração de circunstâncias; é uma elevação do

conhecimento imperfeito de Deus para ver a Deus como Ele é.

2. Em íntima conexão com essa iluminação no conhe-

cimento de Deus, a vitória sobre a morte é operada por uma

poderosa aplicação do sacrifício de Jesus Cristo à consciência.

À parte disso, a visão da glória de Deus seria terrível

demais para a criatura pecaminosa; ela inundaria de medo o

pecador. Bendito seja Deus, o mistério da cruz é, para nós, o

instrumento central da revelação da glória de Deus. É ilimitada

a influência desse mistério, quando aplicado à consciência para

dominar o terror da morte.

Essa tem sido a invariável experiência dos mártires

cristãos, lutando com Satanás, e com a morte em suas mais

terríveis formas. “Eles, pois, o venceram por causa do sangue

do Cordeiro e por causa da palavra do testemunho que deram

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e, mesmo em face da morte, não amaram a própria vida” (Ap

12.11). Essa é a universal experiência dos filhos de Deus, mes-

mo dos mais tímidos e fracos. “Visto, pois, que os filhos têm

participação comum de carne e sangue, destes também ele,

igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse

aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo, e livrasse

todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão

por toda a vida” (Hb 2.14,15). A sublime doçura desse triunfo

sobre a morte, derivado da morte e ressurreição de Jesus, o

Filho de Deus, se vê exibida e explicada nestas palavras memo-

ráveis: “Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte,

o teu aguilhão? O aguilhão da morte é o pecado, e a força do

pecado é a lei. Graças a Deus, que nos dá a vitória por intermé-

dio de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Co 15.55-57).

Para gerar um triunfo tão importante para a alma, é

preciso muito mais do que ideias especulativas a respeito da

redenção pela cruz, por mais ilustres, razoáveis e bem arranja-

das que sejam. É a poderosa aplicação desse mistério à consci-

ência que cria a verdadeira vitória sobre a morte. Aplicação

não feita por um homem em outro homem, não pelo homem

em si mesmo; mas uma aplicação feita pelo Espírito do Deus

vivo. Esse divino Agente executa a obra que, em vão, os enga-

nosos sacerdotes imitam, agitando o crucifixo diante dos olhos

mortiços dos moribundos. Ele glorifica o Salvador crucificado,

iluminando os olhos do entendimento para ver a Sua transcen-

dente excelência. Ele imprime na consciência temerosa a pure-

za e o imenso valor da obediência e dos sofrimentos de Ema-

nuel. Por meio da operação da palavra da verdade, Ele anima a

alma que se apressa até o Supremo Tribunal, que ela é aceita

A vitória sobre a morte

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no Amado diante do Juiz de todos; que o Deus Santo foi pacifi-

cado e está satisfeito; que as reivindicações do inferno estão

canceladas; que está assegurada a herança da glória.

O Espírito da verdade – o Consolador – transmite essa

luz evangélica em plena proporção a toda visão correta das

gloriosas perfeições de Deus; em plena proporção a todo pro-

fundo alarme da consciência; em plena proporção a toda a

seriedade da entrada, por meio da morte e do juízo, na eterni-

dade infinita e inalterável. Veja João 16.7-14; Efésios 1.17ss,

3.16ss.

3. Mas que novos feixes de luz são esses, que surgem

em meu horizonte distante, que roubam o mundo dos meus

olhos sem vida! Que glória é essa, que rapidamente me envol-

ve! Que sons eu ouço! Que rostos, que formas perfeitas pas-

sam velozmente! Que braços invisíveis me rodeiam! Que es-

plendores majestosos me atraem e, num impulso instintivo e

poderoso, arrastam o compasso, o desejo, o suspiro do meu

coração: “Deixe-me morrer, para que eu entre nessa maravi-

lhosa vida!”

Essa, minha alma, são as glórias da Nova Jerusalém que

se aproximam; esse é o Rei da glória, passando por tuas portas

eternas; esse é Jesus, teu Pastor, dando-te vida eterna: “Nin-

guém pode arrebatar-te das Suas mãos".4

Sim, irmãos amados, os céus estão abertos para todo

crente moribundo. O seu Deus traga a morte na vitória, mos-

4 Veja João 10.29. — N. do T.

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trando-lhe os belos campos, rios, frutos do Seu paraíso nos

céus.

Paremos por aqui; bastam já os pensamentos que

apresentamos. Há outros aspectos dessa vitória que permane-

cem por considerar. Nesse meio-tempo, pedimos que cada um

pense na preciosidade da divina comemoração proclamada no

contexto, a qual traz consigo a vitória sobre a morte. Que cada

um pergunte: Deus já destruiu a cobertura que foi posta sobre

mim pelo pecado e pela incredulidade, e o véu que oculta es-

sas glórias da mente obscurecida? Até que isso seja claramente

feito, que eu não descanse, nem dê descanso ao Deus da mise-

ricórdia. A Ele seja a glória para sempre.

“Tragará a morte para sempre, e, assim, enxugará o

SENHOR Deus as lágrimas de todos os rostos, e tirará de toda a

terra o opróbrio do seu povo, porque o SENHOR falou” (Is 25.8).

Segundo sermão “Porventura te foram reveladas as portas da morte? Ou viste as

portas da sombra da morte?” (Jó 38.17 – Tradução Brasileira).

Essa pergunta, junto com outras, foi dirigida pelo Onipotente ao

santo e paciente Jó, para conduzi-lo a uma humilhação mais pro-

funda e mais completa. Existem terríveis mistérios na essência da

morte, que confundem a investigação até dos mais sábios, e apa-

voram o espírito do mais corajoso dos homens. O homem, sozi-

nho, não está à altura de um inimigo cuja natureza e poderes lhe

ultrapassam a capacidade de investigação.

A vitória sobre a morte

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Bendito seja Deus, pois inversamente há mistérios de

amor e poder, demonstrados em favor dos cristãos agonizan-

tes, por meio dos quais o menor do rebanho do Redentor tor-

na-se vencedor nessa batalha solene.

Contudo, não é por meio de pensamentos superficiais

e banais, e por meio de emoções, que a alma ascende até a

capacidade que prevalece sobre a morte. É por meio de pro-

funda, íntima e, na maioria dos casos, demorada meditação,

que a alma, revigorada pela graça, tem acesso a essa luz de

vitória e alegria.

Para o seu auxílio, meus irmãos, nessa meditação, pre-

tendo mostrar-lhes os métodos e revelações por meio dos

quais Deus conduz o Seu povo à vitória sobre a morte. Ele ma-

nifesta-lhes a Sua própria glória, aplicando à consciência deles

o sacrifício de Jesus Cristo com majestosas evidências e poder.

Ele faz com que vejam as glórias do estado de quem

está no céu. Cristo disse a Seus discípulos: “daqui em diante,

vereis o céu aberto e os anjos de Deus subirem e descerem

sobre o Filho do Homem” (Jo 1.51 – RC). Paulo disse, quando se

apressava para a coroa do martírio: “nosso Salvador Jesus Cris-

to ... aboliu a morte e trouxe à luz a vida e a incorrupção, pelo

evangelho” (2 Tm 1.10 - RC). O mártir Estêvão, golpeado e

quebrantado no corpo pelas pedradas dos que o matavam,

mas interiormente poderoso e cheio do Espírito Santo, “fitou

os olhos no céu e viu a glória de Deus e Jesus, que estava à sua

direita” (At 7.55). Quando descreve o comum privilégio dos

cristãos iluminados, o apóstolo fala assim: “Mas tendes chega-

do ao monte Sião e à cidade do Deus vivo, a Jerusalém celesti-

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al, e a incontáveis hostes de anjos, e à universal assembleia e

igreja dos primogênitos arrolados nos céus, e a Deus, o Juiz de

todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados, e a Jesus, o

Mediador da nova aliança, e ao sangue da aspersão que fala

coisas superiores ao que fala o próprio Abel” (Hb 12.22-24).

Maravilhosa elevação! Devem os participantes dela

hesitar um momento sequer a respeito da morte? Vocês sa-

bem, irmãos, há hesitações, mesmo a respeito de certos prin-

cípios dessa experiência. Vocês conhecem as algemas que es-

torvam o ansioso voo da alma, e que lamentavelmente a im-

pedem de provar as alegrias desse outro mundo.

Mas Deus não permitirá que você fique nesse cativeiro.

Para torná-lo pronto para morrer, e desembaraçá-lo e desim-

pedi-lo para o combate final,

4. Ele revela a você a vaidade de todas as coisas terre-

nas, Ele comove você com a inevitável imperfeição e miséria da

sua condição de peregrino.

Por meio do novo nascimento, que conduz o pecador

para perto de Deus por meio de Cristo, a alma desperta para

um novo mundo, e não consegue mais idolatrar as coisas ter-

renas, como fazia anteriormente. Ao mesmo tempo, começa o

verdadeiro prazer pelas coisas legítimas, criadas por Deus. Por

causa da poderosa influência dos sentidos físicos, e da ligação

que temos com as coisas presentes e até mesmo nossos praze-

res espirituais, e especialmente por causa do engano da depra-

vação, torna-se uma difícil tarefa conformar mesmo uma alma

renovada a uma separação final de tudo o que se vê e é tem-

A vitória sobre a morte

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poral. Vemos no exemplo de Salomão como é possível, mesmo

para quem anda seriamente em comunhão com Deus, acabar

em apostasia e na desgraça de buscar satisfação mundana.

Contudo, a infinita paciência, sabedoria, poder e mise-

ricórdia do Deus bendito estão à altura para capacitar a alma

regenerada a manter a sua dignidade, e a renunciar voluntari-

amente toda dependência idólatra dos bens terrenos, consen-

tindo alegremente com o Espírito de sabedoria: “Vaidade de

vaidades, ... vaidade de vaidades, tudo é vaidade” (Ec 1.2).

Quando isso se consuma, ficam bem reduzidas as dificuldades

do conflito com a morte.

Mas além da visão da vaidade e insignificância ligadas a

todo o sistema das coisas terrenas, os filhos da luz veem-se

livres da sua condição transitória de peregrinos, e se cansam

dela quando experimentam pesares mais espirituais e doloro-

sos. Pela graça, o gosto deles e a sua capacidade de apreciar

coisas espirituais são consolidados e renovados. Por essa ra-

zão, eles têm fome e sede do próprio Deus, por Sua santa pre-

sença e comunhão, e desejam conformar-se à Sua imagem e

vontade, às alegrias da comunhão com Ele, ao contentamento

da Sua família. Mas eles são muitas vezes frustrados e desa-

pontados nessas buscas. O corpo da morte dentro deles, a

devastação do santuário de Deus, as imperfeições dos irmãos

crentes, a traição dos hipócritas, a remoção da luz de Deus, os

assaltos dos espíritos infernais os deprimem, assediam e os

atrasam na sua jornada. Eles descobrem que será mais ou me-

nos assim mesmo com eles enquanto viverem; por isso aguar-

dam ansiosamente o dia da morte, como a gloriosa data da

John Love

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plena libertação, da completa emancipação, e do perfeito

acesso a Deus, e a tudo o que é excelente, alegre e desejável.

5. No entanto, aqui precisamos compreender um outro

lado da obra graciosa de Deus nos filhos do Seu amor. Com

vistas ao triunfo final, o Senhor concede ao Seu povo uma

bendita consumação dos seus desejos santificados, relativa-

mente aos assuntos desta vida.

“Porquanto não saireis apressadamente, nem vos ireis

fugindo” (Is 52.12). Os cristãos que andam de modo digno do

seu chamado entre toda a vaidade e sofrimento da presente

era, estão envolvidos com buscas de imensa importância, e

ocupados com possibilidades e esperanças que Deus graciosa-

mente condescende em considerar. Ele cumprirá, a esse res-

peito, os seus desejos e atenderá as suas petições, até certa

medida satisfatória, para que eles possam alegremente seguir

o seu chamamento para a eternidade.

Esse cumprimento dos desejos desta época relaciona-

se tanto a propósitos internos particulares, realizações espiri-

tuais, ou a assuntos de especial interesse com respeito à causa

e ao reino de Cristo sobre a terra. Em alguns casos, refere-se a

bênçãos e libertações operadas em pessoas a quem o cristão

está ligado de forma especial. O patriarca Jacó é um exemplo

desse último caso. Depois de lançar-se ao pescoço do seu filho

há muito desaparecido, ele chorou por longo tempo. Depois,

“Disse Israel a José: Já posso morrer, pois já vi o teu rosto, e

ainda vives” (Gn 46.29,30). Mas os sentimentos de Simeão

foram ainda mais sublimes, quando, tomando o menino Jesus

nos braços, “louvou a Deus, dizendo: Agora, Senhor, podes

A vitória sobre a morte

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despedir em paz o teu servo, segundo a tua palavra; porque os

meus olhos já viram a tua salvação” (Lc 2.28-30). A respeito de

alguns dos que estavam com Ele, o Senhor Jesus declarou

abertamente: “alguns há que, de maneira nenhuma, passarão

pela morte até que vejam ter chegado com poder o reino de

Deus” (Mc 9.1).

Favores desse tipo, quer sejam de forma clara ou mais

obscura, com frequência visam à preparação dos filhos de

Deus para a sua partida que deve ocorrer em breve, e ilustra

vários aspectos da aliança da Sua reconciliação, como a seguin-

te: “Ele acode à vontade dos que o temem” (Sl 145.19); “O

alongar-se da vida está na sua mão direita” (Pv 3.16); “Precio-

sa é aos olhos do SENHOR a morte dos seus santos” (Sl 116.15).

E agora, o que mais resta para impedir a alma, despo-

sada com Jesus Cristo como virgem pura, de apressar-se para

os braços do seu amor, através do vale da morte? Para que

essa obra de Deus se torne perfeita,

6. A alma é alçada acima das aflições do corpo.

A amargura da morte, a severidade da sua angústia, a

crueldade e a violência da sua agonia, ainda parecem terríveis,

e produzem na frágil natureza desfalecimento, horror e medo.

Mas o Espírito do Senhor, habitando na alma crente, produz o

Seu vigor vitorioso. Ele incita a alma para sentir a sua indepen-

dência dos obstáculos da terra, a sua capacidade de subsistir e

ser feliz separada da carne e do sangue, e a sua superioridade

em relação ao sofrimento do corpo e da dor. Ele infunde-lhe

novo vigor e ardor, por meio de todos os poderes da imortali-

John Love

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dade, e faz com que ela, consciente da sua exaltação e digni-

dade, mas com grande humilhação diante de Deus, desafie o

pior que a morte pode fazer, e receba com prazer as suas des-

conhecidas aflições.

7. A penetrante visão que a fé tem do Deus invisível

remove a desagradável estranheza do mundo dos espíritos —

o Mediador reinando em forma humana — a condição dos

espíritos redimidos — e dos seres angélicos perfeitos, com

quem o cristão, quase a desprender-se da terra, experimenta

uma familiar aliança, uma união íntima, uma forte atração. Os

anjos de luz, com doce familiaridade, rondavam o profeta pres-

tes a subir sem receio na sua carruagem de fogo (1 Rs 19.5,7; 2

Rs 2.11). A atenção do amado apóstolo estava colocada fir-

memente nos seus futuros companheiros na glória. “Estes, que

se vestem de vestiduras brancas, quem são e donde vieram? ...

São estes os que vêm da grande tribulação, lavaram suas vesti-

duras e as alvejaram no sangue do Cordeiro” (Ap 7.13,14).

Temos, então, um panorama dessa obra divina, por

meio da qual o Deus da salvação gera essa vitória. Passemos

agora, meus irmãos, a insistir um pouco mais nesse importante

assunto, considerando aquilo que nos propusemos no início:

III. As diferentes épocas e situações em que os santos do Altís-

simo desfrutam a vitória sobre a morte.

1. Essa bendita vitória é desfrutada com gradual ante-

cipação a partir do dia em que são eficazmente chamados e

convertidos a Deus. Faz parte da sabedoria dos justos anteci-

par com seriedade a morte: é nisso que se diferenciam da mul-

A vitória sobre a morte

19

tidão de néscios, cujo falso consolo e alegria dependem de não

se lembrarem de que são mortais.

Os solenes pensamentos a respeito da morte mistu-

ram-se com os primeiros momentos de despertamento dos

regenerados, e concedem inexprimível terror às inquietações

da consciência, e ao receio de não alcançar a salvação. Nesses

momentos de tremor, não é incomum que a pessoa, angustia-

da sobre a sua situação eterna, diga consigo mesma: O que

será de mim, se a morte me surpreender nesta deprimente

situação? Aí, então, os pensamentos se precipitam para o futu-

ro, e percebem o horror de morrer sem Cristo, e de ser precipi-

tado e condenado no abismo eterno.

Mas proporcional a essa amargura e angústia dessas

possibilidades, é a doçura e a alegria da reconciliação com

Deus, e a segura esperança da vida eterna que provém de crer

e conhecer a Cristo, e este crucificado. Daí os solenes pensa-

mentos da morte são suavizados, e começam a ser benvindos à

alma. E embora a mente esteja consciente de que há muito

ainda por fazer na real preparação para o conflito, de tempo

em tempo no avanço da comunhão com Deus, abrem-se os

segredos e intimidades daquela “aliança eterna, em tudo bem

definida e segura” (2 Sm 23.5). Ali o crente vê assegurada para

ele a concessão “da graça que é suficiente, e da força que se

aperfeiçoa na fraqueza” (2 Co 12.9). À medida que se aperfei-

çoa na vida espiritual, descobre que aumenta a sua expectativa

da vitória sobre a morte, como a luz da aurora, mais e mais,

até ser dia perfeito (Pv 4.18).

John Love

20

2. Essa alegria antecipada da vitória é terna e podero-

samente impressa na alma do cristão pela empatia com seus

amigos e irmãos moribundos. Faz parte dos frutos do amor

cristão dar a vida pelos irmãos, especialmente agindo em sim-

patia com eles quando estão morrendo. Os verdadeiros discí-

pulos de Jesus Cristo sentem mútua união e lealdade uns com

os outros, em face do rei dos terrores, sentimento desconheci-

do pelos outros. O grande apóstolo disse: “[vós] estais em nos-

so coração para, juntos, morrermos e vivermos” (2 Co 7.3). O

cristão olha à sua volta para os seus irmãos aflitos, carrega-lhes

os fardos, aguenta com eles o abalo da adversidade, está unido

com eles pelas cordas da aflição, desce com eles até o pó. A

preciosa recompensa da graça, unida a essa comunhão de

amor, é um testemunho e compartilhamento dessa vitória

sobre a morte, que eles gozam diante de Deus. “Bem-

aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericór-

dia” (Mt 5.7).

3. Por fim, chega a solene hora em que a morte não é

mais vista só de longe, mas envia seus precursores anunciando

que “vem após eles o ruído dos pés de seu senhor” (2 Rs 6.32).

A alegria do cristão fundamentado é saber que não precisa

buscar novos e desconhecidos recursos, agora. Ele só precisa

avançar em suas antigas práticas de fé, resignação, paciência e

anelo espiritual. Contudo, elas precisam ser renovadas com

vigor novo e com solenidade. Por essa razão, ele é despertado

nessa direção, e seus clamores aos céus se tornam mais fre-

quentes, mais agudos, e importunos. E a resposta a esses cla-

mores, ultrapassando tudo o que a fé poderia antecipar, lida

com a aproximação do inimigo que avança para o golpe final,

A vitória sobre a morte

21

iluminando o vale obscuro com brilho, cobrindo cada ferimen-

to com doçura e vitória. O avanço todo — pois é desnecessário

repassar os detalhes já indicados — pode ser resumido nas

palavras de Davi: “Laços de morte me cercaram, torrentes de

impiedade me impuseram terror. Cadeias infernais me cingi-

ram, e tramas de morte me surpreenderam. Na minha angús-

tia, invoquei o SENHOR, gritei por socorro ao meu Deus. Ele do

seu templo ouviu a minha voz, e o meu clamor lhe penetrou os

ouvidos. Então, a terra se abalou e tremeu ... Das suas narinas

subiu fumaça, e fogo devorador, da sua boca; dele saíram bra-

sas ardentes. Baixou ele os céus, e desceu ... Do alto me esten-

deu ele a mão e me tomou; tirou-me das muitas águas. Livrou-

me de forte inimigo ... Trouxe-me para um lugar espaçoso;

livrou-me, porque ele se agradou de mim” (Sl 18.4-9,16,17,19).

4. A alma desfruta essa vitória sobre a morte no mo-

mento em que se separa do corpo. “...passa adiante em segu-

rança, por uma vereda que seus pés jamais trilharam” (Is 41.3)

— palavras ditas pelo profeta a respeito da notável expedição

de Abraão contra os reis, mas que bem se aplica à segurança e

vitória da alma quando passa pela morte. Há vitória, mesmo

em meio às dores, e sob o ataque do inimigo. Mas imediata-

mente depois de separar-se do corpo, a alma ascende àquela

luz e alegria da presença de Deus, onde jamais penetrou a

imaginação humana. Ali, de forma inexprimível, ela revê o con-

flito que passou, e dá glória Àquele a quem pertence a ordem

da morte. Aquilo que aconteceu sob uma nuvem de escuridão,

agora está manifesto na luz. A natureza da morte — a obra de

Deus ao conduzir o cristão através dela — a expressão do amor

de Deus e a sabedoria com respeito a todas as circunstâncias,

John Love

22

avaliada à luz do céu — enchem a alma de admiração, gratidão

e serenidade: isso tudo santifica as dores que se foram para

sempre, mas cuja lembrança cheia de alegria continuará por

toda a eternidade.

É dessa sublime e luminosa situação, na presença de

Deus, que a alma se inclina para contemplar com triunfante

confiança e esperança o pó que abandonou; olha para cima

para o incompreensível poder que sustém esse pó, e que glori-

osamente o reavivará; e olha para frente para a hora marcada

para a ressurreição. Dessa forma, a alma dos justos descansa e

se regozija debaixo do altar, no santuário de glória, entoando o

cântico de vitória, e “aguardando a adoção de filhos, a reden-

ção do corpo” (Rm 8.23), ao mesmo tempo que contemplam, a

cada momento, o modelo do futuro edifício, no glorioso corpo

do Senhor Jesus.

5. Avançamos, agora, para a cena de vitória que a lín-

gua dos homens e dos anjos não conseguem descrever. As eras

estabelecidas vão passar rapidamente; vai raiar a manhã assi-

nalada com brilhantes caracteres no livro de decretos de Jeová.

“o Senhor mesmo, dada a sua palavra de ordem, ouvida a voz

do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e

os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro... E, quando este

corpo corruptível se revestir de incorruptibilidade, e o que é

mortal se revestir de imortalidade, então, se cumprirá a pala-

vra que está escrita: Tragada foi a morte pela vitória” (1 Ts

4.16; 1 Co 15.54). A majestade, o poder e o amor do Salvador

— a glória dos Seus exércitos obedientes — a beleza, a felici-

dade, o número, a união e a ordem daqueles que ressuscitam

mediante o Seu chamado, e circundam o Seu trono — o seu

A vitória sobre a morte

23

senso de vitória — a perspectiva do gozo eterno — isso tudo

eu deixo que vocês, irmãos, perscrutem com seus pensamen-

tos iluminados. Imaginem a cena com toda a vivacidade que

puderem; avancem nas grandes profundidades tanto quanto a

luz de Deus, pela Sua palavra e pelo Espírito, conduzirem vo-

cês. Depois de fazerem isso, acreditem que a realidade será

infinitamente maior e mais abundante do que as suas mais

sublimes concepções, as suas mais doces e arrebatadas expec-

tativas. “...ainda não se manifestou o que haveremos de ser.

Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes

a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é” (1 Jo 3.2).

Mas como é importante a pertinência desse assunto!

Vamos reunir tudo o que está dentro de nós, para prestar

atenção com a maior seriedade, dedicação e imparcialidade. Ai

daqueles que se contentam com especulações estéreis e fanta-

siosas a respeito de um assunto desses!

1. Eu lhes suplico, irmãos, tomem cuidado com uma

falsa vitória sobre a morte. “Enganoso é o coração, mais do

que todas as coisas” (Jr 17.9). Por isso, quero alertar todos os

homens contra o engano. Ó inimigo das almas, quão cruéis são

as tuas manobras! Não te retiras do cenário da morte, onde os

pobres mortais avaliam a entrada para a eternidade pela últi-

ma vez? “O SENHOR te repreende, ó Satanás” (Zc 3.2). O Se-

nhor torna em estupidez a tua deliberação a respeito daqueles

que agora ouvem ou leem estas palavras! Para trás de nós,

assassino sujo de sangue.

Vimos que a vitória sobre a morte é uma peculiar obra

de Deus, uma obra em que de forma notável se revelam a Sua

John Love

24

mão direita e o Seu braço santo. Por essa razão, sem dúvida é

arrogância, presunção e estupidez que o pobre pecador imagi-

ne ser capaz de livrar-se da morte por suas próprias forças,

tentando fazer a obra do próprio Deus. Contudo, esse tipo de

audácia se vê em quase todos os infelizes mortais.

Quantas pessoas estúpidas estão por aí, joviais, des-

preocupadas quanto à morte, unicamente porque aprenderam

a esquecer que são mortais? São pessoas graciosas, agradáveis

e alegres, e presumem que a amargura da morte já passou;

pensam assim porque nunca empregaram uma hora sequer em

séria consideração a respeito do assunto. “Até quando, ó estú-

pidos, amareis a estupidez?” (Pv 1.22). Vocês pensam que po-

dem enganar a carranca da morte mediante leviandade e petu-

lância. Que surpresa está reservada para vocês! Que horas

solenes serão as horas do fim da sua vida jovial, quando serão

lançados nas tristes agonias da segunda e eterna morte! Des-

pertem, agora, vocês que dormem, se ainda lhes resta uma

fagulha de entendimento, um mínimo de respeito pela sua

própria segurança. Em Cristo, há vitória sobre a morte, mas

não para aqueles que permanecem irrefletidos, descuidados e

levianos. Continue dormindo mais um pouco, e o misericordio-

so Salvador do mundo fará o que prometeu em Provérbios

1.26: “eu me rirei na vossa desventura, e, em vindo o vosso

terror, eu zombarei”.

Em outras pessoas, a estupidez da desobediência apre-

senta-se de forma mais ousada e honrada, e cria uma marca

mais forte. Cego a tudo o que é invisível — confiante numa

coragem que é resultado da constituição física e de princípios

mundanos — depois de ter escapado de vários perigos, e ter

A vitória sobre a morte

25

superado dificuldades — o pecador imagina que é um herói na

guerra contra a morte. Alimentado pelo aplauso de outros

pecadores, ele se torna ousado para com os perigos futuros, e,

diante da aproximação do terrível rei, se vê como quem cai

gloriosamente, e afunda num feliz descanso. Entre os pagãos,

esse tipo de gente recebia da parte dos sobreviventes as hon-

ras da deidade; e entre os atuais cristãos nominais não há dú-

vida de que esses tais têm seu lugar assegurado no céu. Mas

esse descrente venceu apenas a carranca e a sombra da morte;

ele só viu, embora tarde demais, o aguilhão da morte — o in-

ferno que o segue — as setas de vingança do trono do Todo-

poderoso. A tremenda decepção desses pecadores, quer seja

num leito de enfermidade, ou nalguma façanha militar, será

revelada na manhã da ressurreição; quando, aos pés de Jesus

Cristo, milhões e milhões de homens desses chorarão como

crianças, mas será um choro inútil. Aquele que não poupou os

anjos que pecaram demonstrará terrores por demais suficien-

tes para dominar, e abater, e subjugar todo o exército de mal-

feitores e desprezadores do céu.

Mas como são variados e multiformes os enganos do

coração humano! Outros conseguem uma falsa tranquilidade

entregando-se a um amargo silêncio e desânimo em relação à

morte. Ele pensam passar quietamente por sobre o precipício,

fechando os olhos, envolvendo-se no negro manto do desespe-

ro. Desalojados dos sutis esconderijos da segurança carnal, em

vez de buscar a cidade de refúgio de Deus, eles se precipitam

para o lado contrário. Mas pare! pare, ó pecador! não confie

nos seus próprios pensamentos; não pense que a simples de-

terminação será um abrigo para você. Nem pense que a sua

John Love

26

determinação lhe trará tranquilidade diante dos juízos ordena-

dos pela infinita sabedoria, e inflamados pelo fogo da indigna-

ção de Deus! Volte o rosto para outro lado. Voltem-se rapida-

mente “... à fortaleza, ó presos de esperança” (Zc 9.12).

Causa ainda maior aflição pensar na triste surpresa na

hora da morte de homens sérios, decentes, mais ou menos

diligentes em matéria de religião, “quase cristãos, mas não

totalmente” (At 26.28). Falta-me o tempo para expor todas as

espécies de enganos dos homens. Em suma, eles todos serão

reduzidos a uma ou outra das seguintes classes: Confiança

idólatra no homem, no seu conselho, autoridade e mérito;

justiça própria ou uso presunçoso dos méritos de Jesus Cristo.

Proporcionalmente, assim como a falsa segurança inebria e

enleva o pobre pecador, assim é amarga a surpresa quando

quem vence é a morte e não ele. Veja Lucas 13.24-28.

2. Esse assunto nos chama a atenção para as preciosas

revelações de Deus, e preparações da alma, que conduzem à

vitória real e não falaciosa sobre a morte. Essas já foram ex-

postas claramente. Preste atenção nisto, ó homem, quem quer

que seja você. A morte e você têm encontro marcado para

daqui a não muito tempo. E se você quer partir como vitorioso,

saiba que o fundamento da sua força precisa ser o conheci-

mento sobrenatural de Deus, — uma verdadeira aplicação do

sacrifício de Jesus Cristo à sua consciência, — um conhecimen-

to espiritual do céu, — e um coração livre deste mundo.

3. A respeito desse assunto, há várias responsabilida-

des que devem ser consideradas por aqueles que de alguma

forma estão seguros de andar em direção a essa vitória.

A vitória sobre a morte

27

Com alma grata e enternecida devem dizer com o salmista:

“Bendigo o SENHOR, que me aconselha” (Sl 16.7 comparado

com os versos 8-11).

Também devem respeitar reverentemente a voz desse

conselheiro celestial, que põe a diligência espiritual em íntima

conexão com a alegre existência da paz e do triunfo em meio

aos terrores da última batalha: “... amados, ... empenhai-vos

por serdes achados por ele em paz, sem mácula e irrepreensí-

veis” (2 Pe 3.14).

Revistam-se com a força da coragem sobrenatural.

Embora o seu coração seja débil e tímido, ó cristão, Jesus Cris-

to fará de você um leão. “Porque Deus não nos tem dado espí-

rito de covardia, mas de poder, de amor e de moderação” (2

Tm 1.7). Tenha como seu objetivo que Cristo seja magnificado

em sua morte. E, com esse fim em vista, aprenda o seu canto

fúnebre com antecedência, como os pobres índios o fazem

desde a mocidade, embora baseados em princípios mundanos.

E enquanto você o entoa, lança um compassivo olhar aos pe-

cadores que o cercam e estão perto de você, perambulando

sob a maldição, seguindo para os aposentos da morte. Dê o

seu melhor para alertar e salvá-los, enquanto eles ainda têm

saúde, e no dia da tribulação, antes que os seus pés tropecem

nos lugares obscuros.

A Jesus Cristo, a fiel testemunha, e o primogênito de

entre os mortos, e o Príncipe dos reis da terra, seja a glória e a

vitória para todo o sempre.

Amém.

John Love

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É proibida a reprodução de parte ou do todo desta publicação sem a

permissão formal do editor.

Edição: Manoel Canuto

Edição gráfica e capa: Heraldo Almeida