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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOPEDAGOGIA JOGAR: UM JEITO DE ENSINAR E APRENDER Por Adriana da Silva Couto Campinas Rio de Janeiro Junho de 2002

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOPEDAGOGIA

JOGAR: UM JEITO DE ENSINAR E APRENDER

Por

Adriana da Silva Couto Campinas

Rio de Janeiro

Junho de 2002

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOPEDAGOGIA

JOGAR: UM JEITO DE ENSINAR E APRENDER

Por

Adriana da Silva Couto Campinas

Rio de Janeiro

Junho de 2002

Monografia apresentada à

Universidade Cândido Mendes como requisito

básico para a obtenção do título de

especialista em Psicopedagogia.

Dedicatória

Tenho a alegria de dedicar este

trabalho a todas as pessoas da minha

família que sempre me

acompanharam ao longo do meu

curso e na elaboração da presente

monografia.

Agradecimentos

Aproveito o ensejo

desta monografia para dizer o

meu muito obrigada a todos

que me acompanharam,

principalmente aos

professores e aos colegas.

RESUMO

A presente monografia tratou da análise da

inserção do lúdico no processo de ensino-

aprendizagem das crianças. Procurou

mostrar como o jogar e o brincar interferem,

beneficamente, na motivação dos alunos e

traz substanciais melhorias no

desenvolvimento do trabalho do professor. O

lúdico, nas últ imas décadas, tem sido tema

de investigação em diversos campos do

saber e, primordialmente, na educação.

Pois, trata-se de um instrumento pedagógico

que só faz acarretar melhorias no

desenvolvimento individual do aluno, seja na

l inha da socialização, da criatividade, da

expressão corporal, da auto-afirmação ou da

participação pessoal no próprio processo de

aprendizagem. Concluiu-se, portanto, que é

da maior importância a análise das

potencialidades do jogo e do brinquedo no

ensino infanti l e, conseqüentemente, o seu

uso na sala de aula.

Sumário

INTRODUÇÃO — p. 7

CAPÍTULO I — A EDUCAÇÃO DA CRIANÇA AO LONGO DA

HISTÓRIA p. 9

1.1 — Histórico da educação infanti l no mundo p. 9

1.2 — A educação infanti l no Brasil p. 11

1.3 — O papel social da educação infanti l p. 13

1.4 — A educação infanti l na atualidade p. 14

CAPÍTULO II —JOGOS E BRINQUEDOS NA SALA DE AULA

p.17

2.1 — O brincar em instituições educacionais p. 17

2.2 — Jogo versus brinquedo p. 18

2.3 —Como deve agir o educador p. 21

CAPÍTULO III — O JOGAR E O BRINCAR NO

DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA p. 24

3.1 — O conceito de esquema corporal p. 24

3.2 — O jogar e o brincar: aspectos psicomotores p. 27

3.3 — Psicomotricidade — conceituação p. 28

3.4 — Reeducação psicomotora p. 31

3.5 — Jogar, ensinar e aprender p. 32

CONCLUSÃO — p.37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS — p. 38

INTRODUÇÃO

O objetivo central do estudo desenvolvido foi, essencialmente,

a análise das possibil idades de inserção do lúdico, sob a forma de

jogos e brincadeiras, no ensino infanti l , e seus benefícios para o

desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem dos alunos e

a conseqüente facil i tação do trabalho dos professores no seu papel

didático.

O estudo do lúdico justif ica-se por si mesmo. Nas últ imas

décadas, tem sido um tema freqüente de investigação em diversos

domínios, principalmente em educação. O fenômeno lúdico pode ser

observado no comportamento humano, especialmente, durante a

primeira infância.

É verdade que muitos investigadores se concentram,

habitualmente, no estudo do jogo simbólico e, só recentemente,

voltou-se a colocar interesse sobre o jogo como atividade física e

suas relações com os aspectos de desenvolvimento cognit ivo.

É válido dizer que o lúdico tem sido descoberto como um

instrumento pedagógico extremamente válido, uma vez que traz

benefícios em várias áreas do desenvolvimento individual. Motiva a

criança, estimulando-a a crescer em várias direções.

Na linha da socialização, da l iberação de potencialidades, da

criatividade, da expressão corporal, da auto-afirmação e a

participação pessoal no processo de aprendizagem, enfim, sob todos

os aspectos do desenvolvimento infanti l .

É, pois, da maior importância, analisar como o jogar interfere

no aprender infanti l . É relevante, também, pesquisar como o jeito de

ensinar do professor da escola infanti l será igualmente influenciado

pelo lúdico.

Para tal intuito, mapeou-se o histórico da educação infanti l e o

uso e objetivo do lúdico, enquanto facil i tador e possibil i tador do

desenvolvimento do processo ensino/aprendizagem. Através dos

jogos e brincadeiras, a psicomotricidade também é um fator

relevante, do qual trata o últ imo capítulo. Enfim, este trabalho trata

do jogar, um jeito de ensinar e aprender.

CAPÍTULO I

A EDUCAÇÃO DA CRIANÇA AO LONGO DA

HISTÓRIA

1.1 — Histórico da educação Infantil no mundo

Segundo Souza (1986), a pré-escola surgiu da urbana e típica

sociedade industrial. Sua origem não está vinculada a f ins

educativos, pois o principal objetivo dos primeiros estabelecimentos

criados era prestar assistência às crianças. Dessa forma, não se

pode confundir a criação das creches com a história da educação

infanti l , uma vez que a perspectiva instrucional é o paradigma que

fundamenta em todos os sistemas educacionais, desde sua origem

na Grécia.

A escola especialmente voltada ao ensino infanti l nasceu com

Robert Owen, em New Lanark. Este criou instituições para o

atendimento humanitário de crianças, idealizando um modelo de

microssociedade planejada que, ao ser implementada, fracassou.

Apesar disto, suas idéias encontraram um adepto em Buchanam, seu

colaborador. (Idem)

Este últ imo, realizando campanhas junto às damas inglesas,

conseguiu fundos para f inalizar as construções de uma instituição

destinada às crianças órfãs e desamparadas, f i lhos de trabalhadores

operários. Pelo feito Buchanam recebeu o título de ' ' pioneiro da pré-

escola ' ' , naquele país.

Na França, numerosos estabelecimentos semelhantes foram

criados em 1940, baseados nos relatórios de Vil lerné, que despertou

o interesse pela sorte da infância abandonada. Conhecidas como

' 'Salles D'asile ' ' , mantidas pelas damas da sociedade e disfarçadas

de f i lantropia, estas instituições t inham o intuito de l idar com a

organização das refeições, jogos, obrigações e ocupações, iniciação

à leitura e cálculo.

Em 1848, o termo ' 'Salles D'asile ' ' foi substituído pela

denominação “escolas maternais”. Neste período, o foco do trabalho

transferiu-se primordialmente aos aspectos educativos. Este modelo

consagrou-se na França, com Pauline Kergomard, quando foi

reconhecido como sistema escolar. Nesta época, surgiu a primeira

legislação de amparo a essas escolas e foram desenvolvidos os

primeiros cursos de formação de professores especializados em

educação infanti l .

Na Alemanha, a pré-escola teve origem pela inspiração de

Froebel em 1837. O educador, preocupado com o potencial educativo

das crianças de baixa idade escolar, desenvolveu uma teoria que

orientou o funcionamento do primeiro Kindergarten em Blankerburg e,

ainda hoje, é considerado como de grande valia na educação infanti l :

' ' Não se educa a criança para a vida adulta e sim para a vida que a

rodeia ' ' . (Idem)

Tanto na Inglaterra como na França, o reconhecimento dos

cientistas a respeito da importância, pertinência e vantagens da

proposta de educação infanti l forneceu o respaldo essencial ao

desenvolvimento das experiências. A partir de então, foram obtidos

os recursos necessários a disseminação da iniciativa, adquiriu-se o

engajamento da pedagogia, ajustando os padrões às condições

essenciais ao progresso da educação infanti l .

1.2 — A Educação infantil no Brasil

No Brasil, as notícias dos primeiros interesses de assistência e

atendimento médico aos f i lhos de mulheres trabalhadoras nas

indústrias datam do final do século XIX. Tais ações surgiram por

iniciativa de alguns empregadores, em razão do elevado índice de

mortalidade infanti l causado pela pobreza em que viviam as famílias

operárias.

A necessidade do trabalho feminino requeria a proteção à

infância e as disposições legais para regulamentar o trabalho da

mulher durante a gravidez e a volta ao trabalho.Ainda no século XIX,

o diretor da Escola Normal da Praça, planejou, sem sucesso,

instalar o primeiro jardim de infância de São Paulo, nos moldes

froebelianos. (Romanell i , 1989)

A semente lançada germinou somente em 1896. Na ocasião, o

prefeito Fábio Prado implantou em toda a cidade de São Paulo, uma

rede de Parques Infantis, localizados em bairros operários.

Posteriormente, leis e departamentos foram criados para

regulamentar e f iscalizar a educação infanti l . Dentre estes, destacou-

se a SUPEMA – Superintendência do Ensino Municipal, que apesar

de seu grande potencial realizador, não deixou de sofrer a influência

da l inha assistencialista.

Suas f inalidades eram expressas ' ' Tirar a criança da rua,

oferecer-lhe um trabalho educacional pela valorização do lazer,

através de atividades saudáveis e organizadas, com alcance

higiênico e moral ' ' .

Desta forma, todo o mundo e, no Brasil, em particular, ocorreu

o maior desenvolvimento dos últ imos anos, que foi uma forte

consciência da necessidade da pré-escola, como etapa obrigatória no

processo educacional de cada escola. (Idem,)

No Brasil, houve uma despreocupação quase que total do poder

público com a pré-escola, traduzida na oferta de vagas de educação

infanti l , f icando reduzida a escola infanti l a uma função básica:

custodiar crianças durante algumas horas por dia, recriando-as,

al imentando-as e iniciando-as as atividades diversas, sem,

entretanto, incentivá-las a qualquer t ipo de desenvolvimento físico ou

intelectual orientado.

O poder público recebe as crianças das classes de famílias

pobres, cujas mães passam o dia fora de casa, em serviço. As

escolas particulares, por possuírem instalações, materiais e objetivos

instrucionais, acolhem crianças de classe média definindo suas

programações baseadas em teorias ecléticas que incluem os jogos

didáticos, com procedimentos envolvendo teorias de Maria

Montessori, Jean Piaget e outros educadores.

Com os avanços dos conhecimentos sobre a natureza no ritmo

da aprendizagem infanti l , foi possível visualizar uma nova função da

pré-escola : a de preparar convenientemente as crianças de o a 6

anos para melhor desempenho no ensino fundamental. (Mendes,

1999).

Até o início da República, muito pouco se fazia no Brasil em

relação à criança de 0 a 6 anos, tanto em termos de proteção jurídica

como de alternativas de atendimento pedagógico.

A partir das duas décadas do século XIX alguns grupos

privados começavam a elaborar projetos de atendimento à infância

que eram, insuficientes e quase inexpressivos ante a situação de

saúde e educação da maior parte da população.

A tônica do período que antecede os anos 30 é a medicalização

da assistência à criança até 6 anos. O surgimento de um Estado forte

e autoritário acarretava uma maior preocupação com o atendimento

da população infanti l . Essa valorização da criança seria

gradativamente acentuada após 1930, quando a ' ' causa da criança ' '

passaria a mobil izar o interesse de autoridades oficiais e a

consolidar iniciativas particulares.

1.3 — O papel social da educação infantil

A educação infanti l , mais precisamente a pré-escola, é uma

fase que antecede a escola, e que se inicia com o desenvolvimento

sensório-motor. A criança engatinha, segura objetos, examina, enfim,

reconhece o mundo circundante.

As mulheres trabalhadoras, que se afastam do ambiente

doméstico em busca de condições para produzir sua existência

material e a de seus f i lhos, o fazem com o intuito de satisfazer uma

outra necessidade que não consegue atender, que é acompanhar

seus f i lhos na escola, incentivando-os, porque elas acreditam no

saber, para alcançar melhor qualidade de vida.

Essas mulheres entendem que a escola é o local eleito como o

único meio que eleva o homem socialmente, desde que freqüente a

escola e aprenda a l ição. Deste modo, a escola assume para seu

universo de vida, uma perspectiva redentora.

Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, o papel da

escola tem ficado cada vez mais importante, por ter que proporcionar

a sistematização da educação de forma globalizada, muitas vezes

assumindo o papel famil iar. Mas esta importância não vem

necessariamente acompanhada de medidas polít icas que visem a

garantir condições adequadas de educação para as crianças em

idade pré-escolar.

A situação da infância, especialmente das classes populares,

sempre foi precária, através dos séculos. Com o passar do tempo,

foram surgindo instituições de amparo e assistência às crianças

abandonadas que, de início eram custeadas por entidades

f i lantropicas. Eram organizações religiosas que não se preocupavam

em oferecer às crianças a formação pedagógica.

1.4 — A educação infantil na atualidade

Hoje já tornada obrigação legal, o atendimento à educação

infanti l , por meio do ensino básico fundamental, segundo o qual as

escolas buscam atender os critérios determinantes da

municipalização do ensino, criando estratégias para sua implantação

gradual, busca fazer cumprir as exigências da lei, sem a

preocupação com o atendimento dos anseios da classe trabalhadora

quanto à formação de seus f i lhos desde pouca idade.

Existe, atualmente, a preocupação de educadores, psicólogos,

entre outros, voltados para a educação infanti l , rediscutindo a

educação para crianças de 0 a 6 anos, assim como uma nova

concepção de educação de crianças de 6 anos de idade.

Os diversos serviços de atendimento à criança de 0 a 6 anos,

que se constituíram ao longo do tempo, como creches, escolas

particulares, jardins de infância, aparecem como resultado de

reestruturações sociais, polít icas e econômicas.

Segundo Mendes (1999), a condição social feminina sofreu

grandes transformações. A partir de meados do século, no Brasil, as

mulheres buscam e lutam por melhores condições de vida e

realização no campo pessoal e profissional. Lutam pelo direito a um

espaço onde possam deixar os f i lhos, com segurança e bem

cuidados. Mesmo as mulheres que não trabalham exigem esse

espaço. Outro fator que pesou para o criação de estabelecimentos

infantis foram as poucas praças e locais urbanos à disposição das

crianças.

Duas concepções influenciaram a educação infanti l no Brasil :

assistencial ( ou de caridade ) e preparatória ( ou compensatória ).

Como assistencial, a função da educação infanti l era velar e guardar

os f i lhos da classe trabalhadora, mais expostos dos efeitos do

desenvolvimento industrial.

A distinção entre crianças pobres e ricas, marcou as unidades

infantis, propiciando o surgimento de diferentes estabelecimentos, de

acordo com a classe social da criança.

As crianças ricas e as pertencentes às camadas sociais médias

eram atendidas pelos jardins de infância, que visavam ao

desenvolvimento por meio de atividades, conforme interesses e

desejos da criança : jogos, trabalhos manuais, desenhos, poesias e

cantos, observação da natureza etc., com a ajuda de materiais

pedagógicos. As creches e escolas maternais serviam às crianças

pobres ou f i lhos da classe trabalhadora, oferecendo assistência

médica, odontológica, al imentos e vigi lância.

Por volta dos anos 70, surge a concepção preparatória ( ou

compensatória ), acreditando-se que a educação infanti l poderia

suprir a carência cultural das crianças das classes populares,

preparando-as para a escolarização fundamental.

Apesar do avanço das leis, muitas escolas l ivres ainda

proliferam sem autorização de funcionamento e supervisão dos

órgãos competentes, em prédios sem condições de atender às

características dessa faixa etária, com pobreza de propostas

pedagógicas e de pessoal qualif icado.

De acordo com Souza (1986) uma das estratégias que enfatiza

a necessidade de atendimento pré-escolar coloca uma das questões

essenciais, que é a do atendimento como aproveitamento e principal

no campo da educação, que é um caráter evidentemente prático, pois

que se refere ao atendimento à infância, como forma de auxil iar as

famíl ias das camadas mais baixas a cuidarem de seus f i lhos.

O trabalho iniciado na escola necessita ser continuado no lar,

pois os estímulos recebidos na instituição pré-escolar, se não

continuados, a probabil idade é que se percam, ao longo do tempo e

os resultados posit ivos serão observados somente enquanto se

realiza a intervenção da pré-escola. O acompanhamento da famíl ia é

essencial. (MENDES, 1999).

Há, ainda, que ressaltar a importância da atividade lúdica no

verdadeiro desenvolvimento do processo de ensino/aprendizagem.

No capítulo seguinte, mapeou-se um estudo dos jogos e brincadeiras

no processo de apreensão dos alunos, seus benefícios e

possibil idades.

CAPÍTULO II

JOGOS E BRINQUEDOS NA SALA DE AULA

2.1 — O brincar em instituições educacionais

O uso do jogo na educação formal se fundamente quase

sempre nos estudos acerca do seu papel no desenvolvimento infanti l .

Estes são, de fato, indispensáveis para justif icar a importância da

presença da atividade lúdica no contexto educacional. Alguns

autores chegam a elabor propostas concretas da uti l ização do jogo

em instituições que se ocupam de crianças, na sua maioria, em

escolas.

Ferran, Mariet & Porcher (1979) defendem a instauração, na

instituição educativa, de uma dialética do jogar e trabalhar. Para isto

é preciso que subsistam os jogos l ivres, onde os adultos não

intervêm e que, por outro lado, a escola intervenha na atividade

lúdica das crianças em vários níveis:

a) observando o jogo infanti l tanto no recreio como fora do

perímetro escolar;

b) introduzindo na sala de aula o jogo como elemento

pedagógico, mas com o cuidado de conservar juntas duas virtudes

fundamentais: ele deve permanecer jogo (divertido e repousante) e

deve ser educativo e integrado no processo propriamente

pedagógico;

c) velando para uma boa integração dos "brinquedos

educativos" na instrução escolar levando em conta quatro fatores: os

jogos existem em si mesmos e por isso devem ser respeitados; eles

não foram feitos para a escola e por isso algumas precauções devem

ser tomadas no seu emprego para f ins pedagógicos; a criança

mantém nos jogos relações psicossociais fundamentais que devem

ser respeitadas e, f inalmente, os jogos não se confundem com os

brinquedos, ainda que mantenham entre si numerosas e profundas

relações (Os autores consideram o jogo como atividade e brinquedo

como objeto que serve ao jogo ). Para ser educativo, um jogo

educativo deve ser, antes de tudo, um jogo. (Idem)

2.2 — Jogo versus brinquedo

Estes autores acreditam que o jogo deve ser privi legiado em

relação ao brinquedo e sugerem que se possa pôr em prática os

diferentes jogos que chegam aos educadores pela tradição, pelas

trocas interacionais. Nestes casos poderiam ser analisados os

conteúdos dos diversos jogos que cada professor extrair ia de sua

história regional ou, ainda das lembranças dos amigos.

Ferran, Mariet & Porcher enfatizam ainda a fundamental

importância da formação dos professores como algo que lhes

fornecerá meios para empregar o jogo em toda a sua riqueza

pedagógica potencial. " importa primeiro que os próprios professores

saibam brincar para estarem em condições de partir do jogo das

crianças e a ele regressarem" (1979: 140 ). Os professores devem,

além de tudo, deixar a criança brincar sem abandoná-la nem conduzi-

la.

Leif & Brunelle (1978) também enfatizam a formação do

educador na sua proposta de inserção do jogo na escola:

"Não será o caso de uma exploração

pedagógica do jogo — nem mesmo de

insistir nas esperanças pedagógicas que se

basearam no jogo — mas de abarcar e

definir o jogo em sua natureza própria,

estudar as suas condições, a f im de poder

dar, na medida do possível, à criança e ao

adolescente, as possibil idades e os meios

de se entregarem a ele como à fruição de

uma atividade que é marca e expressão

natural do ser e do ego" (p.9).

Segundo os dois autores em questão, não é suficiente dar às

crianças o direito ao jogo, é preciso despertar e manter nelas o

desejo do jogo; não é possível se contentar em ampliar os recreios e

aumentar os estoques de brinquedos, é preciso formar educadores -

animadores.

Cabe uma nova postura na formação de professores para uma

plena e inteira reintrodução do jogo na escola pede, antes de tudo,

que eles sejam iniciados em um novo tipo de observação, que ocorre

mais para compreender do que transformar. Convém, em seguida,

torná-los capazes de abordar o jogo como uma discipl ina em si.

Portanto, torna-se indispensável fazer deles adultos que saibam

jogar (Idem).

Bandet & Sarazanas (1991), em um estudo sobre a criança e os

brinquedos, defendem que estes objetos devem ser simultaneamente

inspiradores, instrumentos e acessórios do jogo. Todos os meios de

educação deveriam, segundo as autores, informar-se sobre a forma

como as crianças brincam e sobre os objetos que poderiam contribuir

na atividade construtiva da brincadeira. As múlt iplas investigações

sobre o jogo mostram que não pode conhecer nem educar uma

criança sem saber nem por que nem como ela brinca. Também não

se pode esquecer que a brincadeira é pertence da criança. Para a

criança muito pequena o brinquedo é parte dela, do mesmo modo que

sua roupa, e tentar tomar-lhe o objeto é um atentado à sua

integridade. As crianças carentes de afeto teriam tendência a se

afirmar pela posse de certos brinquedos e é por essa razão que nos

deparamos com crianças que têm um brinquedo nas mãos, com o

qual não brincam mas do qual também não se separam. Neste caso,

querer forçá-las a comparti lhá-lo será contraproducente.

São diversas funções do brinquedo na vida das crianças,

especialmente em instituições. Muitas de suas reflexões se aplicam

às crianças em creches. Para ele, o brinquedo é o suporte do jogo,

mediador que permite à criança testar situações da vida real ao seu

nível, sem riscos e sob seu controle. Objeto que desperta a

curiosidade, exercita a intel igência, permite a invenção e a

imaginação e possibil i ta que a criança descubra, pouco a pouco,

suas próprias capacidades de apreensão, o brinquedo propõe à

criança um mundo do tamanho de sua compreensão. Por outro lado,

possui uma dimensão socializante: os jogadores se encontram têm

uma atividade comum e aprendem a coexistência com tudo que ela

comporta: noções de propriedade, de relacionamento, de respeito, e

todas as relações que subentendem a vida em grupo. No entanto, é

por que a criança é humana que, segundo ele, a sua relação com os

brinquedos é tão variada, tão motivada, tão rica.

O brinquedo possui uma característica que assegura a sua

primordialidade; ele pertence à infância, ele a simboliza, é o espectro

da criança. Contudo, mesmo considerando este aspecto, o autor o vê

como um terceiro elemento na relação educador/criança, assim como

a técnica educativa. Ela exerce um papel intermediário, cria um

centro de interesse comum, uma razão de se estar junto, responde a

uma necessidade permanente de tornar viável, harmoniosa e rentável

a relação entre educador e criança.

As crianças convidam com freqüência o educador a se juntar a

elas: transformado em jogador pode se divert ir também, ajudar as

crianças a compreender as regras, mudar o rumo do jogo, al imentar a

imaginação. O brinquedo não deixa o adulto de lado: com uma

discreta piscada de olhos ele o convida a se sentar no chão e se

divertir na companhia das crianças.

2.3 — Como deve agir o educador

Ao educador caberia introduzir uma nova concepção de jogo

para além dos l imites de uma manipulação estereotipada. Ele ocupa

um papel que lhe permite observar, diferenciar comportamentos e

intervir oportunamente. Em algumas situações é mesmo explicar,

discutir, refletir com a criança, esquecendo um pouco o brinquedo ou

jogo, vendo-o na globalidade da realidade individual da mesma. O

brinquedo não é o objeto prioritário que deve ser salvaguardado, mas

a oportunidade de aproximação da cr iança, oportunidade que ele

possibil i ta e a quem serve.

O papel do educador diante da relação criança/brinquedo: é

responsabil izar a criança diante deste objeto que lhe pertence.

Ensinar-lhe que ela tem direitos sobre ele e que estes direitos geram

riscos: se ela o quebrar, terá apenas um brinquedo quebrado; se não

guardá-lo, poderá perdê-lo. Esta é uma atividade educativa:

sensibil iza para as exigências que toda posse impõe e t ira do

brinquedo seu caráter sagrado.

Do mesmo autor é outra preocupação com o brinquedo coletivo,

brinquedo que não pertence a ninguém, e que, se destruído, será de

qualquer forma reposto. Ao educador cabe encontrar meios para que

este brinquedo adquira um sentido, para que ele deixe de ser um

objeto ao relento. Estes meios, desencadearão uma caminhada

educativa porque, longe de garant ir unicamente a perenidade do

brinquedo, o educador encontrará uma oportunidade de aprofundar-

lhe.

Na escolha deste objeto precioso o autor propõe que sejam

considerados quatro critérios: o valor experimental (o que ele permite

à criança como experiência, como manipulação); o valor da

estruturação (no que ele contribui para a construção da sua

personalidade); o valor da relação (como o brinquedo vai colocar a

criança em relação aos outros e a seu meio) e o valor lúdico(quais as

qualidades que o brinquedo trará ao jogo).

Outros critérios obrigatórios cabe introduzir, relativos à idade,

capacidades e gostos das crianças, assim como o projeto

estabelecido pelo educador. Na escolha deve-se observar que nem

todos os brinquedos e jogos convém a todas as crianças, a todos os

lugares, a todos os momentos. É necessário questionar não somente

o brinquedo, mas sobretudo o sentido, a proposta educativa.

É necessário ainda considerar outras funções do brinquedo,

fora das brincadeiras. O sentido de propriedade do objeto é expor um

brinquedo ao grupo é se expor um pouco, é mostrar que se tem

coisas e é ser reconhecido por isso. Um brinquedo aparentemente

abandonado em um canto pode não ter sido esquecido, pode estar

marcando um território. Assim como no exemplo em que crianças de

internato colocam um urso de pelúcia sobre a sua cama arrumada,

parecendo dizer: "Propriedade privada, esta é a cama de Fulano de

Tal".

Torna-se importante saber entender o signif icado dos

brinquedos que são quebrados. Nesta quebra, uma série de atos

signif icativos para a criança: conhecer o seu poder sobre a

realidade, saciar uma curiosidade natural, exprimir sua agressividade

e pulsões latentes, encontrar sua propriedade e desfazer-se dela. E,

através disso tudo, evoluir para uma atitude mais refletida na

próxima vez.

O brinquedo tem prioridade como instrumento pedagógico,

assim como é prioritário nas preocupações das crianças. Esquecê-lo

seria se afastar da criança, abstrair aquilo que traz em si a própria

noção de infância.

CAPÍTULO III

O JOGAR E O BRINCAR NO DESENVOLVIMENTO DA

CRIANÇA

3.1 —Conceito de esquema corporal

A criança percebe-se e percebe as coisas que a cercam em

função de seu próprio corpo. O corpo é uma forma de expressão da

individualidade. Isto signif ica que, conhecendo-o, terá maior

habil idade para se diferenciar, para sentir diferenças. Ela passa a

distinguí-lo em relação aos objetos circundantes, observado-os,

manejando-os.

O corpo da criança é sua maneira de ser. O desenvolvimento

dela é o resultado da interação de seu corpo com os objetos de seu

meio, com as pessoas com quem convive e com o mundo onde

estabelece l igações afetivas e emocionais. É através deste corpo

que estabelece contato com as entidades do mundo, que se engaja

no mundo, que compreende os outros. Todo ser tem seu mundo

construído a partir de suas próprias experiências corporais.

Isto implica uma relação psicológica, pois o movimento não é

um processo isolado e está em estreita relação com a conduta e a

personalidade.

Além de algo biológico e orgânico que possibil i ta a visão, a

audição, o movimento, o corpo deve ser também entendido como um

lugar que permite expressar emoções e estados interiores. A este

respeito Vayer (1984) afirma que todas as experiências da criança (o

prazer e a dor, o sucesso ou o fracasso) são sempre vividas

corporalmente.

Se acrescentarmos valores sociais que o meio dá ao corpo e a

algumas de suas partes, este corpo termina por ser investido de

signif icações, de sentimentos e de valores muito particulares e,

absolutamente, pessoais.

Uma criança precisa ter um corpo “organizado” para poder agir

através dos seus aspectos psicológicos, psicomotores, emocionais,

cognit ivos e sociais. Esta organização de si mesma é o ponto de

partida para que descubra suas diversas possibil idades de ação e,

portanto, precisa levar em consideração os aspectos

neurofisiológicos, mecânicos, anatômicos, locomotores.

Picq e Vayer (1985) afirmam que esta organização de si

envolve uma percepção e controle do próprio corpo através da

interiorização das sensações. Isto quer dizer que a criança aprende

a conhecer e diferenciar seu corpo como um todo e também a sentir

suas possibil idades de ação. Ela precisa, também, adquirir um

equilíbrio econômico e postural, uma lateralidade bem definida, uma

independência dos diferentes segmentos corporais e um domínio das

pulsões e das atribuições.

Tendo um cunho essencialmente neurológico, a expressão

esquema corporal nasceu em 1911 com o neurologista Henry Head.

Segundo ele, o córtex cerebral recebe informações das vísceras, das

sensações e percepções táteis, térmicas, visuais, das sensações e

percepções táteis, térmicas, visuais, audit ivas e de imagens

motrizes, o que facil i taria a obtenção de uma noção, um modelo e

um esquema de seu corpo e de suas posturas. Head ainda afirma

que o esquema corporal armazena não só as impressões presentes

como também as passadas.

Schilder (1977), ultrapassando a realidade neuropsicológica,

chega ao conceito de imagem corporal que seria uma representação

mental de nosso corpo. Para ele, “O esquema corporal é a imagem

tridimensional que todo mundo tem de si mesmo.”

Analisando os jogos e brincadeiras das crianças, Morais (1986)

define imagem do corpo como uma impressão que se tem de si

mesmo, subjetivamente, baseada em percepções externas e internas

(exemplo: altura, peso, força muscular) e no confronto com outras

pessoas do próprio meio social. O conceito de esquema corporal

envolve um conhecimento intelectual e consistente do corpo e

também da função de seus órgãos. O esquema corporal, portanto,

regula a postura e o equilíbrio.

Estando intimamente l igada à auto-imagem, a auto-estima pode

ser posit iva ou negativa, dependendo da carga energética que se

coloca nos êxitos e fracassos que vivenciamos. Como a vida escolar

tem grande influência na auto-imagem da criança, o fracasso pode

abalar sua auto-confiança e outros fracassos tornariam-se iminentes.

Para Ajuriaguerra (1984), a denominação das partes do corpo

confirma o que é percebido, reaf irma o que é conhecido e permite

verbalizar (por um mecanismo de redução) aquilo que é vivenciado.

Portanto, tendo um esquema corporal organizado, é permitido a

uma criança se sentir bem, na medida em que seu corpo lhe

obedece, em que tem domínio sobre ele, em que o conhece bem, em

que pode uti l izá-lo para alcançar um maior poder cognit ivo. Ela deve

ter o domínio do gesto e do instrumento que implica em equilíbrio

entre as forças musculares, domínio de coordenação global, boa

coordenação óculo-manual. Tudo isto transparece nos jogos das

crianças.

O esquema corporal, estudado pela psicomotricidade, é a parte

visível e a imagem corporal é a idéia que se tem de seu próprio

corpo.

Sendo o corpo o ponto de referência que o ser humano possui

para conhecer e interagir com o mundo, é importante ressaltar que

este corpo servirá de base para o desenvolvimento cognit ivo, para a

aprendizagem de conceitos tão importantes para uma boa

alfabetização como, por exemplo, os conceitos de espaço: embaixo—

em cima, ao lado—atrás, direita—esquerda, etc. (Idem)

Primeiramente, a criança visualiza estes conceitos através de

seu corpo e só depois consegue visualizá-los nos objetos entre si.

Seu corpo também está inserido em um tempo e isto irá permitir

situá-la melhor no mundo em que se encontra. Este ponto de

referência vai permitir também uma inibição voluntária (a criança

inibe o seu movimento na hora em que precisar ou quiser). Ela

domina seus gestos ao escrever, domina seu tônus muscular ao

imprimir a força adequada para a realização de determinadas tarefas.

3.2 — O jogar e o brincar: aspectos psicomotores

A educação psicomotora envolve, necessariamente, o emprego

do lúdico. Deve ser considerada como uma educação de base, pois

ela condiciona todos os aprendizados pré-escolares; leva a criança a

tomar consciência de seu corpo, da lateralidade, a situar-se no

espaço, a dominar seu tempo, a adquirir habilmente a coordenação

de seus gestos e movimentos. A educação psicomotora deve ser

praticada desde a mais tenra idade; conduzida com perseverança,

permite prevenir inadaptações difíceis de corrigir quando já

estruturadas.

A psicomotricidade proporciona ao aluno algumas condições

mínimas a um bom desempenho escolar e aumenta seu potencial

motor, dando-lhe recursos para que se saia bem na escola. O

indivíduo não é feito de uma só vez, mas se constrói,

paulatinamente, através da interação com o meio e de suas próprias

realizações. O movimento é o suporte que ajuda a criança a adquirir

o conhecimento do mundo que a rodeia através de seu corpo, de

suas percepções e sensações.

Além disto, pode ser vista como preventiva —, na medida em

que dá condições à criança de se desenvolver melhor em seu

ambiente, e também como reeducativa — quando trata de indivíduos

que apresentam desde o mais leve retardo motor até problemas mais

sérios. É um meio de imprevisíveis recursos para combater a falta de

adaptação escolar, diz Fonseca (1988).

3.3 — Psicomotricidade — conceituação

Segundo Fonseca(1988), a partir do surgimento do termo

psicomotricidade em 1920 com Dupré, Defontaine define os dois

componentes presentes: psico signif icando os elementos do espírito

sensit ivo, e motricidade traduzindo-se pelo movimento, pela mudança

no espaço em função do tempo e em relação a um sistema de

referência. Fonseca (1988) afirma que se deve tentar evitar análises

desse t ipo para não se voltar ao erro de enxergar dois componentes

distintos: o psíquico e o motor, pois a presença de ambos constitui

um todo único.

A este respeito, ele afirma, tendo em vista conceitos

psicopedagógicos:

“(...), a inseparabil idade do movimento e da

vida mental (do ato ao pensamento), estruturas que

representam o resultado das experiências

adquiridas, traduzidas numa evolução progressiva

da intel igência, só possível por uma motricidade

cada vez mais organizada e

consciencializada .”(Fonseca,1988,p.84)

A psicomotricidade, para ele, não é exclusiva de um novo

método, ou de uma “escola” ou de uma “corrente” de pensamento,

nem constitui uma técnica, um processo, mas visa f ins educativos

pelo emprego do movimento humano. Ele vê o movimento como

realização intencional, como expressão da personalidade e que,

portanto, deve ser observado não somente por aquilo que se vê e se

executa mas também por aquilo que simboliza e origina.

Nesta mesma l inha de pensamento, Henri Wallon (1979), um

dos pioneiros no estudo da psicomotricidade, afirma:“Movimento

(ação), pensamento e l inguagem são uma unidade inseparável. O

movimento é o pensamento em ato, e o pensamento é o movimento

sem ato.”(1979,p.146)

Semelhantemente, Le Boulch (1997) também acredita que a

atitude em psicomotricidade deve ter sua própria identidade, e não

se deve associar necessariamente metodologias e correntes. Ele

afirma que a psicomotricidade recebe contribuições da psicanálise,

no tocante à importância do afeto no desenvolvimento e da

psicologia comportamental, no sentido de valorizar o instrumento

corpóreo para uma melhor performance da pessoa

Assim as manifestações emocionais também pertencem ao

campo da psicomotricidade. Toda e qualquer emoção tem sua origem

no domínio postural. Portanto, a comunicação é uma função

essencial na reeducação psicomotora.

Uma vez que a psicomotricidade leva em conta o aspecto

comunicativo do corpo e do gestual do ser humano, ela resiste a ser

uma educação mecânica do corpo. Portanto, graças à l inguagem, o

homem vive num mundo de signif icações, onde os gestos querem

dizer alguma coisa, o corpo possui um sentido que pode sempre ser

interpretado e traduzido.

Ainda de acordo com Le Boulch (1997), existem os

comportamentos inatos que a criança manifesta e comportamentos

aprendidos. Os comportamentos adquiridos das aprendizagens

básicas, como higiene pessoal e al imentação, fazem parte da

formação da personalidade e da imagem corporal. O desenvolvimento

psicomotor da criança é de fundamental importância para sua vida. É

preciso que a criança possa assimilar cada um de seus progressos

antes de adquirir um novo.

Segundo Shilder (1981), um elemento importante da adaptação

psicomotora é a lateralidade. O hemisfério esquerdo governa o braço

direito de um destro e não é possível mudar essa constituição

cerebral. A dominância lateral ocorre quando os movimentos se

combinam e se organizam numa intenção motora, no momento em

que a presença de um lado predominante se impõe para ajustar a

motricidade.

O reconhecimento direita-esquerda decorre da conscientização

da assimetria dos lados e constitui uma primeira etapa na orientação

espacial. Este reconhecimento só é precedido pela distinção frente-

atrás (conscientização do eixo corporal - 6 anos). A partir dos 7

anos, seguindo a evolução da lateralidade, a criança será capaz de

projetar em outra pessoa, a partir de seu próprio corpo. A direita e a

esquerda já não dependem somente uma da outra, mas, sim, do

ponto de vista da pessoa que as considera.

.

3. 4 — Reeducação psicomotora

A reeducação psicomotora tem por objetivo eliminar do

indivíduo mecanismos e hábitos que deram lugar a

perturbações.(Shilder, 1981)

A psicomotricidade tem como objetivo desenvolver o aspecto

comunicativo do corpo, o que equivale a dar ao indivíduo a

possibil idade de dominar o próprio corpo, aperfeiçoando seu

equilíbrio.

Le Boulch (1997) propõe que se una o aspecto funcional ao

afetivo, pois os dois têm que caminhar lado a lado, tanto dentro da

ação educativa como da reeducativa:

— Aspecto afetivo ou relacional

Este se exprime através da relação da criança com o adulto,

com o ambiente físico e com as outras crianças. A maneira como o

educador penetra no universo da criança assume aqui um aspecto

primordial. É muito importante que o professor demonstre carinho e

aceitação integral do aluno para que este passe a confiar mais em si

mesmo e consiga expandir-se e equil ibrar-se.

É através da postura, das atividades e do comportamento que

se expressa a boa evolução da afet ividade. Uma criança fechada em

si mesma possui falta de espontaneidade e tende a encolher-se e a

trabalhar com um tônus muito tenso, muito esticado.

— Aspecto funcional

Forma como um indivíduo reage e se modif ica diante dos

estímulos do meio. Um bom educador psicomotor, com sua

disponibil idade e competência técnica, pode ajustar muito o aluno.

Ele pode induzir situações que obriguem este aluno a agir

corretamente no ambiente, visando a um maior desenvolvimento

funcional. Ele pode auxil iar seu aluno a tomar consciência de seus

próprios bloqueios e procurar suas origens e, principalmente, realizar

exercícios adequados para um bom desempenho de seu esquema

corporal.

3.5 — Jogar, ensinar e aprender

Um bom educador será capaz de estimular o aluno como um

todo, a partir do conhecimento do desenvolvimento de todas as

áreas personalógicas como a cognição, a afetividade, a l inguagem,

o relacionamento social (ético), o lúdico e o lazer sejam interl igadas.

O cuidado especial que se deve tomar com as crianças em

seus primeiros anos de escolaridade é de grande importância, pois o

aluno sentir-se-á bem na medida em que se desenvolver

integralmente através de suas próprias experiências, da manipulação

adequada e constante dos materiais que o cercam e também das

oportunidades de descobrir-se. E isto será mais fácil de se conseguir

se estiverem satisfeitas suas necessidades afetivas, sem bloqueios e

sem desequilíbrios tônico-emocionais.

Podemos notar ao observar educadores, em especial os de

pré-escola e 1a série, como esta preocupação citada anteriormente

sobre o desenvolvimento da criança é deixada de lado em prol de um

treinamento funcional intensif icado.

Com efeito, para muitos professores, a repetição constante de

exercícios é essencial para que a criança se desenvolva. Neste

sentido, uma crít ica faz-se necessária: numa tentativa de

desenvolver a motricidade de seus alunos, solicitam o

preenchimento de folhas mimeográf icas de riscos à direita, à

esquerda, vert icais, horizontais, bolinhas, ondas.

Quando querem ensinar conceitos dentro-fora, por exemplo,

pedem a seus alunos para colarem papéis coloridos, fazerem cruzes

ou desenharem dentro ou fora de um quadrado ou de qualquer

desenho. Ao f inal, acham que as crianças assimilaram corretamente

estes termos e passam para outros itens que serão “treinados” da

mesma maneira.

Acreditam, com isto, que estão usando de todos os recursos da

psicomotricidade para preparar os alunos para a escrita. São,

entretanto, exercícios totalmente desprovidos de signif icado para as

crianças e não são nem precedidos de um trabalho mais amplo de

conscientização dos movimentos, de posturas, visando a um

desenvolvimento mental maior.

Desenvolvem, na realidade, a aquisição de gestos automáticos

e técnicas sem se preocupar com as percepções que lhe dão o

conhecimento de seu corpo e, através deste, o conhecimento do

mundo que o rodeia. Os exercícios psicomotores, através dos

movimentos e dos gestos, não devem ser realizados de forma

mecânica, devem ser associados com as estruturas cognit ivas e

afetivas.

Está certo que algumas habil idades motoras começam a ser

desenvolvidas na família, mas não se pode negar a importância dos

primeiros anos de escolaridade. Muitas dif iculdades podem surgir

com a aprendizagem falha na escola. Por outro lado, também há

alunos que já vêm para a escola com problemas motores que

prejudicam seu aprendizado e que não são sanados em nenhum

momento, acarretando uma maior falta de adaptação escolar.

Do ponto de vista psicomotor, para que uma criança tenha uma

aprendizagem signif icativa em sala de aula, alguns pré-requisitos

devem ser observados:

Como condição mínima, a criança deve possuir um bom

domínio do gesto e do instrumento. Isto signif ica que precisará usar

as mãos para escrever e, portanto, deverá ter uma boa coordenação

fina. Ela terá mais habil idade para manipular os objetos de sala de

aula, como lápis, borracha, régua, se estiver ciente de suas mãos

como parte de seu corpo e t iver desenvolvido padrões específ icos de

movimentos. Deverá aprender a controlar seu tônus muscular de

forma a saber dominar seus gestos.

É necessário, também, que ela tenha uma boa coordenação

global, saindo-se bem ao se deslocar, transportar objetos e se

movimentar em sala de aula e no recreio. Muitos dos jogos e

brincadeiras, realizados nos pátios das escolas são, na verdade,

uma preparação para uma aprendizagem posterior. Com eles, a

criança pode adquirir noções de localização, lateralidade,

dominância e, conseqüentemente, orientação espaço-temporal.

Um fator importante para a educação escolar é o

desenvolvimento do sentido de espaço e tempo. Isto signif ica que a

criança se movimenta em um determinado espaço e tempo. Uma boa

orientação espacial poderá capacitá-la a orientar-se no meio com

desenvoltura. Do movimento que transcorre surgem noções de

tempo, duração de intervalos, seqüência, ordenação e ritmo.

Importante também como pré-requisito para uma boa

aprendizagem é a acuidade audit iva e visual, mas só podemos

propiciar estes estímulos se eles estiverem integrados e bem

orientados.

Se o professor estiver mais consciente de sua função de

educador, a maior parte das dif iculdades apresentadas pelos alunos

pode ser resolvida, facilmente, na sala de aula. O educador deve

estar mais atento e consciente de sua responsabil idade e despender

mais esforço e energia no processo educativo a f im de aumentar o

potencial motor, cognit ivo e afetivo do aluno.

Ao invés disto, o que acontece, constantemente, é o

encaminhamento dos alunos a especialistas pelo educador. Isto

ocorre pois, frente às mínimas dif iculdades, o educador não está

sabe como resolvê-las e isentam-se de qualquer responsabil idade,

culpando o meio sócio-econômico-cultural do aluno ou a

incapacidade e falta de interesse em aprender do mesmo.

CONCLUSÃO

No presente trabalho, partiu-se do histórico da educação da

criança, no mundo e no Brasil e, através da análise, se pôde

constatar o compromisso, crescente, por parte do Estado em fornecer

o espaço e os meios para o ensino infanti l . Necessidade moderna,

seja pela ocupação dos pais, seja pela conscientização da sua

importância na formação do indivíduo, têm se desenvolvido diversos

estudos a respeito da importância da educação, nesta fase da vida, e

o papel do lúdico como estimulador e facil i tador do processo

ensino/aprendizagem.

O lúdico é tudo aquilo referente aos jogos e brincadeiras.

Associado à infância, ao descompromisso e ao prazer, normalmente,

não é visto como instrumento de aprendizagem. No entanto, com o

desenvolvimento dos estudos em educação infanti l , diversos teóricos

têm constatado a sua importância no processo de ensino-

aprendizagem, trazendo, aos alunos, motivação e apreensão eficaz,

aumento da capacidade criadora e transformadora do conhecimento.

Através dos jogos e brincadeiras, a criança desenvolve

mecanismos para compreender melhor o mundo, para atuar nele e

encontrar suas próprias formas de representação.

No desenvolvimento da monograf ia, tratou-se do aprendizado

através dos jogos e brincadeiras, principalmente os uti l izados na sala

de aula. Constatou-se que, além de trazer motivação à criança, o

lúdico também melhora as condições didáticas dos professores, pois,

se os seus alunos sentem-se mais estimulados, o aprendizado

também é assimilado mais rapidamente.

Após a abordagem do lúdico na sala de aula, optou-se por um

estudo mais aprofundado no desenvolvimento da motricidade pelos

jogos, pois as crianças, desenvolvendo sua capacidade motora, e

isto inclui a acuidade audit iva e visual, estarão também mais

preparadas para enfrentar o mundo.

Enfim, o lúdico não pode ser esquecido no processo ensino-

aprendizagem das crianças. O jogo é um dos grandes aliados do

educador, pois, a criança, aprende melhor e mais rápido, brincando,

sente vontade de instruir-se e entender os mecanismos de tudo

aquilo que lhe está sendo propiciado como experiência de vida.

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