(JL)Ausência de Variação Da Flexibilidade Durante o Ciclo Menstrual Em Universitárias

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212 Rev Bras Med Esporte _ Vol. 8, Nº 6 – Nov/Dez, 2002 ARTIGO ORIGINAL Ausência de variação da flexibilidade durante o ciclo menstrual em universitárias * Christianne Pereira Giesbrecht Chaves 1 , Roberto Simão 1 e Claudio Gil Soares de Araújo 1,2 * Programa de Pós-Graduação em Educação Física da Universidade Gama Filho e Clinimex – Clínica de Medicina do Exercício, Rio de Janeiro, RJ. 1. Programa de Pós-Graduação em Educação Física da Universidade Gama Filho. 2. Clinimex, Clínica de Medicina do Exercício. Recebido em 23/5/02 Aceito em 14/9/02 Endereço para correspondência: Dr. Claudio Gil S. Araújo – Clínica de Medicina do Exercício (Clinimex) Rua Siqueira Campos, 93/101 22031-070 – Rio de Janeiro, RJ, Brasil E-mail: [email protected] latória e folicular no GE. Conclusão: Os dados obtidos não corroboram a impressão empírica de que a flexibilidade varia durante as fases do CM. Não se pode, contudo, afastar a hipótese de que a ausência de variações tenha ocorrido devido a alguma característica da amostra ou por limita- ções do Flexiteste em identificar mínimas variações, sen- do necessária a realização de outros estudos. Palavras-chave: Flexibilidade. Ciclo menstrual. Anovulatório oral. ABSTRACT Lack of flexibility variation during menstrual cycle in university students Background: Some physical components are markedly influenced by the different phases of menstrual cycle (MC); however, there is little information about changes in flexi- bility. Objectives: To analyze the behavior of corporal flex- ibility – global, per joints and per movements – in adult young women during different phases of the MC. Methods: A sample of 15 women was studied. The experimental group (EG) included students with regular MC, and the control group (CG) had students that had been taking oral contra- ceptives (OC) for at least one month. Data concerning the MC and OC use were acquired by questionnaire. The flexi- bility was evaluated by Flexitest, allowing a global analy- sis of flexibility (Flexindex), per joints, per movements and its variability. The Flexindices were compared with corre- sponding percentiles as to gender and age. For the statisti- cal analysis in three phases of the EG – follicular, ovulato- ry and luteal – and the CG in two different moments - between the days 5 and 26 of the MC, ANOVA and T-test were used as appropriate. Results: There were no signifi- cant differences in flexibility, per movements or Flexindex during the phases of MC in the EG or in the CG (p > 0.05). The Flexindex percentiles ranged from 14 to 35 for the CG, and from 14 to 80 for the EG. No significant differences between the joints and the variability indices during the MC were observed (p > 0.05), except for the distal-proxi- mal variability indices between the follicular and ovulato- ry phases on the EG. Conclusion: These data do not cor- roborate the empirical impression that flexibility changes RESUMO Fundamentação: Algumas variáveis da aptidão física são marcadamente influenciadas pelas fases do ciclo mens- trual (CM); contudo, há pouca informação sobre eventuais modificações na flexibilidade. Objetivo: Analisar o com- portamento da flexibilidade corporal – global, por articu- lação e por movimento – em mulheres adultas jovens nas diferentes fases do CM. Métodos: Estudou-se uma amos- tra de 15 mulheres. O grupo experimental (GE) foi consti- tuído de alunas eumenorréicas, enquanto o grupo controle (GC) incluía alunas em uso regular havia pelo menos um mês de anticoncepcional oral (AO). Dados referentes ao pe- ríodo menstrual e ao uso de AO foram obtidos através da aplicação de um questionário. A flexibilidade foi avaliada pelo Flexiteste, permitindo uma análise da flexibilidade global (Flexíndice), por articulação, por movimento e em sua variabilidade. Os Flexíndices foram ainda comparados com os correspondentes percentis para gênero e idade. Para a análise estatística das três medidas do GE – fases folicu- lar, ovulatória e lútea – e das duas do GC – entre dias cinco e 26 do ciclo, utilizou-se ANOVA ou teste t conforme apro- priado. Resultados: Não houve diferenças na flexibilida- de, movimento a movimento ou Flexíndice nas diferentes fases do CM no GE e nas duas medidas do GC (p > 0,05). O percentil do Flexíndice para o GC variou de 14 a 35 e no GE, de 14 a 80. Analisando as articulações e os índices de variabilidade, não foram encontradas diferenças significa- tivas com as fases do CM (p > 0,05), com a exceção do índice de variabilidade distal-proximal entre as fases ovu-

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  • 212 Rev Bras Med Esporte _ Vol. 8, N 6 Nov/Dez, 2002

    ARTIGOORIGINAL

    Ausncia de variao da flexibilidade duranteo ciclo menstrual em universitrias*

    Christianne Pereira Giesbrecht Chaves1, Roberto Simo1 e Claudio Gil Soares de Arajo1,2

    * Programa de Ps-Graduao em Educao Fsica da Universidade GamaFilho e Clinimex Clnica de Medicina do Exerccio, Rio de Janeiro, RJ.

    1. Programa de Ps-Graduao em Educao Fsica da Universidade GamaFilho.

    2. Clinimex, Clnica de Medicina do Exerccio.Recebido em 23/5/02Aceito em 14/9/02

    Endereo para correspondncia:Dr. Claudio Gil S. Arajo Clnica de Medicina do Exerccio (Clinimex)Rua Siqueira Campos, 93/10122031-070 Rio de Janeiro, RJ, BrasilE-mail: [email protected]

    latria e folicular no GE. Concluso: Os dados obtidos nocorroboram a impresso emprica de que a flexibilidadevaria durante as fases do CM. No se pode, contudo, afastara hiptese de que a ausncia de variaes tenha ocorridodevido a alguma caracterstica da amostra ou por limita-es do Flexiteste em identificar mnimas variaes, sen-do necessria a realizao de outros estudos.

    Palavras-chave: Flexibilidade. Ciclo menstrual. Anovulatrio oral.

    ABSTRACT

    Lack of flexibility variation during menstrual cycle inuniversity students

    Background: Some physical components are markedlyinfluenced by the different phases of menstrual cycle (MC);however, there is little information about changes in flexi-bility. Objectives: To analyze the behavior of corporal flex-ibility global, per joints and per movements in adultyoung women during different phases of the MC. Methods:A sample of 15 women was studied. The experimental group(EG) included students with regular MC, and the controlgroup (CG) had students that had been taking oral contra-ceptives (OC) for at least one month. Data concerning theMC and OC use were acquired by questionnaire. The flexi-bility was evaluated by Flexitest, allowing a global analy-sis of flexibility (Flexindex), per joints, per movements andits variability. The Flexindices were compared with corre-sponding percentiles as to gender and age. For the statisti-cal analysis in three phases of the EG follicular, ovulato-ry and luteal and the CG in two different moments -between the days 5 and 26 of the MC, ANOVA and T-testwere used as appropriate. Results: There were no signifi-cant differences in flexibility, per movements or Flexindexduring the phases of MC in the EG or in the CG (p > 0.05).The Flexindex percentiles ranged from 14 to 35 for the CG,and from 14 to 80 for the EG. No significant differencesbetween the joints and the variability indices during theMC were observed (p > 0.05), except for the distal-proxi-mal variability indices between the follicular and ovulato-ry phases on the EG. Conclusion: These data do not cor-roborate the empirical impression that flexibility changes

    RESUMOFundamentao: Algumas variveis da aptido fsica

    so marcadamente influenciadas pelas fases do ciclo mens-trual (CM); contudo, h pouca informao sobre eventuaismodificaes na flexibilidade. Objetivo: Analisar o com-portamento da flexibilidade corporal global, por articu-lao e por movimento em mulheres adultas jovens nasdiferentes fases do CM. Mtodos: Estudou-se uma amos-tra de 15 mulheres. O grupo experimental (GE) foi consti-tudo de alunas eumenorricas, enquanto o grupo controle(GC) inclua alunas em uso regular havia pelo menos umms de anticoncepcional oral (AO). Dados referentes ao pe-rodo menstrual e ao uso de AO foram obtidos atravs daaplicao de um questionrio. A flexibilidade foi avaliadapelo Flexiteste, permitindo uma anlise da flexibilidadeglobal (Flexndice), por articulao, por movimento e emsua variabilidade. Os Flexndices foram ainda comparadoscom os correspondentes percentis para gnero e idade. Paraa anlise estatstica das trs medidas do GE fases folicu-lar, ovulatria e ltea e das duas do GC entre dias cincoe 26 do ciclo, utilizou-se ANOVA ou teste t conforme apro-priado. Resultados: No houve diferenas na flexibilida-de, movimento a movimento ou Flexndice nas diferentesfases do CM no GE e nas duas medidas do GC (p > 0,05). Opercentil do Flexndice para o GC variou de 14 a 35 e noGE, de 14 a 80. Analisando as articulaes e os ndices devariabilidade, no foram encontradas diferenas significa-tivas com as fases do CM (p > 0,05), com a exceo dondice de variabilidade distal-proximal entre as fases ovu-

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    during MC phases. However, it is possible that the lack ofvariation could have occurred due to some sample char-acteristics or to Flexitest limitations in identifying smallchanges, which poses the need for other studies.Key words: Flexibility. Menstrual cycle. Oral contraceptive.

    INTRODUOO ciclo menstrual (CM) dura, em mdia, 28 dias, poden-

    do ser dividido em trs fases distintas: folicular, ovulatriae ltea. A fase folicular inicia-se no primeiro dia da mens-truao e dura entre nove e 23 dias; a fase ovulatria podedurar at trs dias e a fase ltea vai do fim da ovulao ato incio do fluxo menstrual1,2. Outros autores3,4 levam emconta apenas as fases folicular e ltea, inserindo a fase ovu-latria como uma etapa tardia dentro da fase folicular. Cadauma dessas fases caracteriza-se por um nmero especficode dias e por perfis especficos de concentraes sricasdos hormnios sexuais3.

    Na fase folicular e ovulatria, grandes quantidades deestrognio so secretadas, enquanto na fase ltea ocorre opredomnio de progesterona e, em menor grau, do estra-diol. A fase ltea caracteriza-se pelo aumento acentuadodos nveis sricos de progesterona, alcanando o seu picomximo logo aps a ovulao e que so responsveis peloaumento da temperatura corporal basal observada nestafase. Simultaneamente, o estrognio srico volta a aumen-tar nessa fase, aps reduo importante durante a ovula-o. Nos ltimos dias do CM, o corpo lteo vai-se degene-rando e os nveis de progesterona e estrognio caem,provocando o incio do fluxo menstrual e um novo ciclo serepete3.

    H estudos sugerindo que o desempenho fsico podevariar consideravelmente durante as distintas fases do CM,muito provavelmente em funo das variaes de tempera-tura corporal e do metabolismo que acompanham as cur-vas hormonais2,5-7. Enquanto h dados relativos ao com-portamento da potncia aerbia e da fora muscular8-10,pouco se conhece em relao flexibilidade. Relatos iso-lados de bailarinas sugerem que a mobilidade articular semodifica ao longo do CM. Considerando o perfil de curvados nveis sricos dos hormnios femininos durante o CM,especialmente a ao da progesterona sobre o aumento datemperatura corporal aps a ovulao, poder-se-ia especu-lar se a flexibilidade estaria aumentada na fase ltea.

    O objetivo deste estudo foi analisar o comportamento daflexibilidade corporal global, por articulao, por movi-mento e em sua variabilidade em mulheres adultas jo-vens nas diferentes fases do CM.

    MATERIAIS E MTODOS

    Aps um estudo piloto com oito universitrias, no qualse constatou a viabilidade da pesquisa, foram ajustadosalguns aspectos operacionais e, a seguir, avaliadas 20 ou-tras universitrias do curso de graduao em Educao F-sica na Universidade Gama Filho, do Rio de Janeiro. Den-tre as alunas participantes da pesquisa, somente em 15 delasfoi possvel obter todas as medidas completas e ter, ento,seus dados utilizados para posterior anlise.

    Essas alunas foram recrutadas a partir de convite formu-lado pela investigadora principal durante as aulas regula-res. Especificamente, foram convidadas alunas que pos-sussem ciclos menstruais regulares, que no estivessemgrvidas e no tivessem a inteno de faz-lo nos prxi-mos meses. Os professores que ministravam as aulas esti-mularam a participao das alunas como atividade disci-plinar complementar.

    Antes de iniciar a coleta de dados, as alunas preenche-ram um termo de consentimento e responderam a um ques-tionrio com informaes pertinentes ao CM e ao eventualuso de anticoncepcionais hormonais. Constituiu-se um gru-po experimental (GE) com as alunas eumenorricas, consi-derando-se como grupo controle (GC) as alunas que faziamuso regular, havia pelo menos um ciclo, de anticoncepcio-nal hormonal. As alunas foram, assim, divididas em oitono GC, com a idade variando de 19 a 25 anos (22,3 1,3anos; mdia desvio padro) e sete no GE, com idade com-preendida entre 19 e 24 anos (21,0 1,7 anos).

    A coleta de dados ocorreu no primeiro semestre letivode 2001. As alunas foram medidas durante quatro semanasconsecutivas, sempre no mesmo dia da semana (quinta-fei-ra) e aproximadamente no mesmo horrio (entre 8 e 10hda manh). Todas as medidas foram feitas sempre na mes-ma sala, com temperatura ambiente controlada entre 20 e25 graus centgrados. Semanalmente, a investigadora ques-tionava as alunas sobre a presena ou ausncia de fluxomenstrual. As alunas estavam vestidas com roupas adequa-das para a prtica de exerccios, de forma que a execuodos movimentos no fosse prejudicada. Nenhuma alunahavia praticado qualquer exerccio prvio ou estava haviapelo menos uma hora sem praticar qualquer exerccio fsi-co mais intenso (superior a seis METs).

    O instrumento utilizado para a avaliao da flexibilida-de foi o Flexiteste11,12, realizado por uma nica avaliadorapreviamente treinada na sua utilizao e sem conhecimen-to prvio da alocao de cada aluna no grupo, o que ficousob controle de uma colaboradora, que anotava os resulta-dos medida que eles eram obtidos.

    O Flexiteste consiste na medida e avaliao da amplitu-de fisiolgica passiva mxima de 20 movimentos articula-

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    se distribuio gaussiana para os dados, de forma que atendncia central para todos os movimentos o valor 2; osvalores 1 e 3 so menos freqentes e os valores extremos,isto , 0 e 4, tendem a ser raros, especialmente em adultosjovens.

    A anlise do Flexiteste pode e deve ser feita para cadaum dos movimentos e/ou articulaes, porm, a soma deseus valores denominada Flexndice, um ndice globalde flexibilidade ou mobilidade articular. Os resultados doFlexndice tambm podem ser analisados em funo dosvalores esperados para uma populao da mesma idade egnero atravs das tabelas de percentis13. O mesmo Flexn-dice pode ser obtido por diversas combinaes de escoresdos 20 movimentos do Flexiteste e em decorrncia destapossibilidade. Arajo14 props cinco ndices de variabili-dade para esses resultados, tornando possvel distinguirperfis de mobilidade articular mesmo quando dois indiv-duos apresentam valores iguais de Flexndice.

    De modo sucinto, esses cinco ndices so: a) intermovi-mentos (IVIM), representando o desvio padro dos escoresindividuais dos 20 movimentos do Flexiteste; b) interarti-culaes (IVIA), refletindo a variabilidade entre as mobili-dades mdias obtidas nas diversas articulaes testadas; c)flexo-extenso (IVFE) comparando a mobilidade nosmovimentos de flexo e extenso; d) entre-segmentos (IVES) comparando as medidas de mobilidade dos segmentosinferior e superior do corpo e e) distal-proximal (IVDP) identificando eventuais discrepncias entre a mobilidadepassiva mxima das articulaes distais e proximais dosmembros14.

    Os anticoncepcionais utilizados pelo GC eram compos-tos por progestagnio e estrognio em iguais concentra-es em todos os comprimidos, variando apenas os frma-cos e a dosagem, conforme detalhado na tabela 2.

    Para definio da fase em relao ao dia do ciclo e pos-terior anlise dos dados no GE, utilizamos o critrio pro-posto por Wojtys et al.2, assumindo que teramos a fasefolicular do primeiro dia do ciclo o dia em que ocorre amenstruao at o nono dia, a fase ovulatria entre osdias 10 e 14, o que em geral ocorre em mulheres eumenor-ricas; para a fase ltea considerou-se da segunda metadedo ciclo (dia 15) at o dia que antecede a menstruao,

    TABELA 1Movimentos do Flexiteste

    Item Articulao Movimento

    I Tornozelo Flexo (dorsal)II Tornozelo Extenso (flexo plantar)III Joelho FlexoIV Joelho ExtensoV Quadril FlexoVI Quadril ExtensoVII Quadril AduoVIII Quadril AbduoIX Tronco FlexoX Tronco ExtensoXI Tronco Flexo lateralXII Punho FlexoXIII Punho ExtensoXIV Cotovelo FlexoXV Cotovelo ExtensoXVI Ombro Aduo posteriorXVII Ombro Extenso e aduo posteriorXVIII Ombro Extenso posteriorXIX Ombro Rotao lateralXX Ombro Rotao medial

    res sempre feitos no dimdio direito e 36 se consideradosbilateralmente (tabela 1). O Flexiteste engloba as articula-es do tornozelo, joelho, quadril, tronco, punho, cotoveloe ombro. Oito movimentos so feitos nos membros infe-riores, trs no tronco e os nove restantes nos membros su-periores, sem aquecimento prvio. A medida feita atra-vs da execuo lenta do movimento pelo avaliador at aobteno da amplitude mxima no avaliado, para poste-riormente compar-la com os mapas de avaliao. Em ge-ral, o ponto mximo da amplitude de movimento detec-tado pelo relato de desconforto local pelo avaliado e/oupela grande resistncia mecnica continuao do movi-mento.

    Cada um dos movimentos medido em uma escala cres-cente e descontnua de nmeros inteiros de 0 a 4, perfazen-do um total de cinco valores possveis. A atribuio dosvalores numricos determinada quando a amplitude al-canada igual existente no mapa de avaliao. Nocaso de a amplitude alcanada em um determinado movi-mento encontrar-se entre dois valores do mapa de avalia-o, o menor valor prevalecer, mesmo que a amplitudeesteja mais prxima do valor mais alto. No existem valo-res fracionrios ou intermedirios. O tempo de execuodo teste , em geral, entre trs e cinco minutos, empregan-do uma seqncia modificada dos movimentos, na qual sominimizadas as mudanas de postura corporal.

    Pela natureza da escala e pelo modo como foram propo-sitadamente desenhados os mapas de avaliao, observa-

    TABELA 2Composio dos anovulatrios

    Progestagnio Estrognio

    0,075mg de gestodeno 0,02mg de etinilestradiol2mg de acetato de ciproterona 0,035mg de etinilestradiol0,15mg de desogestrel 0,03de etinilestradiol

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    independentemente da durao do ciclo individual. Para oGC foram utilizadas apenas duas medidas, compreendidasentre os dias 5 e 26 do ciclo, correspondendo a dias de usoregular do anovulatrio hormonal, assumindo assim con-centraes sricas hormonais idnticas nas duas medidas.

    A anlise estatstica seguiu os mtodos j preconizadose utilizados anteriormente em estudos com o Flexiteste13,14,incluindo estatstica ANOVA para medidas repetidas paracomparar os movimentos nas fases folicular, ovulatria eltea no GE. No que concerne ao GC, em uso de anovulat-rio, foi utilizado o teste t emparelhado, bicaudal, para com-parar as duas medidas compreendidas entre os dias 7 e 26do ciclo, que possuam concentraes hormonais constan-tes. Eventuais comparaes entre os dois grupos foram rea-lizadas com teste t bicaudal para amostras independentes.O nvel de significncia adotado para todos os procedi-mentos foi de 5%.

    RESULTADOSFoi realizado um total de 740 medidas de mobilidade

    articular utilizando o Flexiteste, sendo 160 para dois mo-mentos distintos no GC e 140 para cada uma das trs fases,para o GE.

    O Flexndice para as fases folicular, ltea e ovulatriado GE foram, respectivamente, 50,1 [2,1] (mdia [erro pa-dro da mdia]), 49,3 [1,8] e 47,6 [2,2], e as duas do GC47,0 [0,9] e 47,1 [0,7] (figuras 1 e 2). Os resultados para aflexibilidade por movimento, por articulao ou pelo Fle-xndice no diferiram durante as fases do CM, seja nasduas medidas feitas com o GC (p > 0,05) (figura 1) ou nastrs fases do ciclo nas alunas que no faziam uso de ano-vulatrios (p > 0,05) (figura 2). Tambm no havia dife-renas significativas no Flexndice entre os GE e GC. Quan-to aos resultados individuais do Flexndice, eles no

    variaram em apenas uma das alunas entre duas medidas,enquanto nas demais se observaram variaes de at 20%sem uma relao objetiva com a fase do ciclo menstrual.

    As universitrias testadas apresentavam nveis bastantevariveis de flexibilidade, correspondendo aos percentis14 a 80 para o GE, utilizando os dados da fase ltea. Opercentil para o GC variou de 14 a 35, considerando asmedidas obtidas entre o 17o e o 23o dia do ciclo. A medianado percentil para o Flexndice do GE ficou em 55 e a do GCem 32 quando comparada com os dados disponveis paramesma idade e gnero (tabela 3).

    No conjunto de medidas, a maior parte dos escores, como esperado pela natureza da distribuio dos escores doFlexiteste, ficou no valor 2. Dentre as 740 medidas realiza-

    Fig. 1 Flexndice das universitrias do grupo experimental nas trsmedidas

    30

    35

    40

    45

    50

    55

    60

    A B C D E F G

    FolicularOvulatriaLtea

    Fig. 2 Flexndice das universitrias do grupo controle nas duas medi-das

    30

    35

    40

    45

    50

    55

    60

    H I J K L M N O

    1a. Medida2a. Medida

    TABELA 3Percentis individuais do Flexndice das universitriasdo grupo controle (GC) e do grupo experimental (GE)

    GE Percentis

    A 20B 60C 65D 14E 15F 80G 55

    GC

    H 14I 35J 32K 25L 35M 14N 32

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    das, em 56 delas foi obtido um escore 4 e em apenas duasencontrou-se um escore 0, um no movimento de tornozeloI na fase ovulatria e outro no ombro XIX na fase folicu-lar, em duas meninas distintas do GE; em quase todas asuniversitrias encontrou-se pelo menos em um movimentoum escore igual a 4.

    Analisando movimento a movimento, observou-se quepara o GE no houve qualquer variao na mobilidade paraos movimentos de extenso do joelho e do cotovelo, nosquais todas as alunas apresentaram escore 2. J para osmovimentos I, II, VI, VII, XIX e XX, a maioria das alunasapresentou variao nas medidas de mobilidade articularao longo das trs fases do CM; em apenas dois nicos casos(duas alunas distintas), essa diferena chegou a dois pon-tos nos movimentos I e XIX. Em relao ao GC, em quatrodos movimentos no houve qualquer variao das medidas III, IV, IX e XVIII , interessantemente, movimentos dis-tintos daqueles em que houve ausncia de mudanas noGE. J para os movimentos VI, VIII, X e XVI, verificaram-se mudanas na maioria das alunas. Tal como ocorreu noGE, apenas em um nico caso, uma aluna do GC teve umadiferena entre as medidas que alcanou dois pontos nomovimento XIX.

    Em relao aos ndices de variabilidade, observou-se quepraticamente 2/3 dos escores se encontravam dentro da faixade normalidade, percentual que foi bastante semelhante nosdois grupos (p > 0,05). Apenas no que se refere ao ndicede variabilidade distal-proximal, houve uma diferena li-mtrofe significativa entre as fases ovulatria e foliculardo CM (p < 0,05). No que diz respeito s articulaes, nohouve diferena significativa entre as fases (p > 0,05).

    DISCUSSOO presente estudo procurou analisar o comportamento

    da flexibilidade durante as diversas fases do CM. Para rea-lizar essa anlise consideraram-se universitrias aparente-mente saudveis do ponto de vista de hormnios sexuais eque diferiam apenas quanto utilizao ou no de anovu-latrios hormonais. Essa estratgia permitiu a caracteriza-o de nveis hormonais flutuantes ou constantes que seadequaram necessidade objetiva do estudo, sem precisarmodificar a atual rotina das participantes. No houve ne-nhum relato de incio de gestao ou complicao gineco-lgica de natureza hormonal no perodo da coleta dos da-dos ou no ms seguinte a este. No houve ainda registro dequalquer intercorrncia clnica relevante do sistema loco-motor que pudesse ter afetado a realizao das medidaspassivas de mobilidade articular.

    Como sempre ocorre em todo estudo em que no soencontradas evidncias de diferenas significativas, algu-

    mas possibilidades e limitaes metodolgicas devem seranalisadas. Uma das limitaes do nosso estudo, j citadaanteriormente, em relao definio das fases do CM,que, se fosse medida pelos nveis sricos da razo estrog-nio/progesterona na urina15 ou no sangue4, poderia ter per-mitido uma discriminao mais precisa da fase do ciclo.Outro aspecto a considerar a possibilidade de erro na rea-lizao da medida. Estudos anteriores sobre o Flexitesteapontam para uma alta fidedignidade intra-avaliador, comuma margem de erro mdio entre 1 e 2 pontos14. Dessaforma, a diferena encontrada entre medidas consecutivasem nosso estudo 2 a 4 pontos em mdia, algo maior parao GE, deve corresponder a diferenas efetivas de flexibili-dade e no a um erro de medida. Outro fator que apontapara uma variao real na flexibilidade o fato de que elaocorreu mais freqentemente em alguns movimentos, en-quanto o erro da medida tende a se distribuir igualmentepor todas as 20 medidas. Infelizmente, contudo, no foipossvel estabelecer um padro ntido entre as variaesde flexibilidade e as fases do ciclo menstrual. Todavia, pode-se especular que melhor identificao dos padres hormo-nais ou amostra maior ou mais homognea em relao flexibilidade ou, ainda, a utilizao de mtodos de quanti-ficao de lassitude ligamentar mais precisos pudessem tersido capazes de identificar modificaes ainda maiores oumais expressivas na flexibilidade que no puderam ter sidodemonstradas no presente estudo. Existe, assim, necessi-dade da realizao de estudos futuros para esclarecimentomais definitivo dessa questo.

    Existe um consenso de que as oscilaes hormonais ocor-ridas nas mulheres devido a alteraes, principalmente doestrognio e progesterona, durante o CM afetam a fisiolo-gia feminina. Em relao ao exerccio fsico, esse perfilendcrino pode alterar diversos fatores, tais como: a utili-zao de substrato energtico em diferentes intensidades evolumes de treinamento, consumo de oxignio, armazena-mento de substratos energticos e oxidao de gorduras8.

    Neste estudo no foram observadas diferenas signifi-cativas da flexibilidade, exceto por uma nica diferenaem um dos ndices de variabilidade, o que provavelmentese deveu a um artefato estatstico e no possui maior signi-ficado fisiolgico. J Wojtys et al.2, em seu estudo sobreCM e leso do ligamento cruzado anterior, afirmam que ohormnio relaxina possui habilidade de aumentar a lassi-tude de tecidos moles. Sua concentrao comea a aumen-tar no 12o dia, atingindo seu pico no 14o dia e isso se repeteno 20o dia do ciclo, portanto, no meio da fase ltea, o quenos permite deduzir que, teoricamente, h possibilidadesde durante o CM ocorrerem modificaes hormonais capa-zes de causar alteraes fsicas e metablicas na expressoda mobilidade articular ou da lassitude ligamentar. pos-

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    svel que as alteraes ligamentares especficas induzidaspelas modificaes dos nveis circulantes de relaxina noprovoquem alteraes passveis de ser identificadas pelaanlise em escala ordinal limitada em cinco opes do Fle-xiteste.

    Tenaglia et al.6 estudaram a influncia do CM em mulhe-res sob o uso de AO e sem o uso do mesmo na tolerncia doestresse trmico descompensado. Este estudo encontrou quea temperatura retal se mantm significantemente mais altano meio da fase ltea comparada com a fase folicular ini-cial nas mulheres sem o uso de AO e o mesmo ocorre paraas mulheres que fazem uso de AO. Os autores sugerem queessas alteraes sejam decorrentes do ritmo circadiano eno da administrao do hormnio sinttico. Esses resul-tados em parte explicam a ausncia de aumento significa-tivo da flexibilidade do nosso estudo; embora a temperatu-ra corporal sofra elevao na fase ltea, provvel que elano seja suficiente para provocar aumento da flexibilidadenesta fase ou talvez esse aumento no tenha sido detect-vel.

    Em contrapartida, Charkoudian e Johnson7 encontraramque a associao de estrognio e progesterona promoveaumento da temperatura corporal de at 0,5 grau centgra-do. Em relao ao nosso estudo, os relatos de Charkoudiane Johnson7 indicam que no GC os resultados da flexibilida-de no deveriam variar, tal como ocorreu, pois estas meni-nas foram medidas somente durante o perodo sob o usode AO e todos os AOs eram compostos de derivados do es-trognio e progesterona, no promovendo, assim, modifi-cao notvel nos resultados. J o GE poderia ter apresen-tado maior flexibilidade na fase ltea, uma vez que asmulheres foram medidas nas trs fases do ciclo.

    Outro estudo de Janse de Jonge et al.4, que investigou afora de contrao mxima isomtrica do quadrceps, fa-digabilidade e propriedades contrteis estimuladas eletri-camente, fora de flexo e extenso isocinticas de joelhoe a fadigabilidade e a fora de preenso manual durante asfases do CM, mostrou que no houve diferena em nenhu-ma das funes musculares em uma amostra de 15 mulhe-res eumenorricas sem o uso de anovulatrio ou qualqueroutro hormnio por um perodo de pelo menos seis meses,sugerindo que as alteraes hormonais durante o CM noafetam as variveis acima. Por outro lado, discordando des-ses resultados, Sarwar et al.5 realizaram um estudo em 20mulheres, sendo que a metade no usava anovulatrio, ecompararam os resultados nos dois grupos. Foi encontra-do aumento na fora do quadrceps e de preenso manual,como tambm diminuio no tempo de descanso e aumen-to da fadigabilidade nas mulheres que no faziam uso deanovulatrio oral (AO) comparadas com as que usavam.Esses resultados foram encontrados na fase ovulatria. Com

    isso, os autores propem que esse aumento da fora tenhaocorrido pela alta concentrao de estrognio que antece-de a ovulao, sugerindo, dessa forma, que ele aumenta afora muscular, embora, neste estudo as concentraes s-ricas desse hormnio no tenham sido mensuradas. Em nos-so estudo, a determinao da fase do CM foi semelhante proposta por Sarwar et al.5, o que nos leva a inferir a possi-bilidade de provvel limitao para identificarmos os diasdo CM.

    Em se tratando do treinamento de resistncia, as con-centraes mais elevadas de estradiol e progesterona tm opoder de alterar a utilizao do substrato e a ventilao norepouso e durante o exerccio16. Bernardes e Radomski17estudaram as alteraes nas respostas hormonais do estro-gnio e progesterona ao exerccio realizado no cicloerg-metro, de forma contnua e intermitente, em mulheres jo-vens que faziam uso de AO. Eles investigaram o efeito dosexerccios em dois momentos: o primeiro foi na fase emque as mulheres no estavam sob o uso de AO e o segundo,na fase em que elas usavam o AO. A progesterona no res-pondeu de forma significativa quanto fase do CM ou otipo de exerccio. Essa aumentou durante os dois tipos deexerccio em todas as condies do ciclo e retornou aosvalores de pr-exerccio 60 minutos depois de cessado omesmo17.

    Em concluso, as alteraes das capacidades fsicas apre-sentadas durante as diferentes fases do CM esto sujeitas aconsidervel variao individual. Algumas mulheres noapresentam nenhuma alterao perceptvel na sua capaci-dade de desempenho em qualquer perodo do seu CM, en-quanto outras, no entanto, exibem desempenhos variveisao longo do ciclo. Estudos futuros utilizando outras popu-laes, amostras maiores e definio hormonal mais preci-sa das fases do CM so necessrios para que essa questopossa ser respondida de forma mais definitiva.

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