JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

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Patrccínio:Prefeitura Municipal de Nmelrlm (PA)

1991

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Lins, Cristóvão.

Jari: setenta anos de história/Cristóvão Lins - Rio de Janeiro:DATAFORMA em convênio com a

Prefeitura Municipal de Almeirim (PA), 1991.

240 p.: il; 16x22 cmBibliografia : p. 235 -236

1. PROJETO JARI - História. I. Título.

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AgradecimentosJamais pcnsci cm cscrcvcr um livro. Também não

dcfcndo o ditado quc diz scr ncccssário a um homempara sc rcalizar, ícr um filho, planlar uma árvorc c es'crcvcÍ um livro.

Ìri[as, sc r^ss'in? for, filhos tcnho três: Diva Hclcna,Angcla Cristina e Cristovirtho, todos dc uma só mãe,minha csposa Etclvina c para os quais consigno aquios mcus primciros agradccimcnlos, pela paciência dasnoitcs c fins dc scmanas a clcs roubados, cnquantopcsquisava c cscrcvia o livro.

Árvorcs planíc:i muiías, por força da profissão deAgrônomo.

EscrcvcÍ um Iivro foi bcm mais ditícil, apcsar dccncorajado por tlivcrsos amigos e colcgas, enlrc clcsFliívio dc Britto Pcrcira, a qucm dcvo agradcccr pclocstímulo c, por quc não dizcr, poÍ mc havcr alé inli-maclo a fazê-lo.

Agradcço tambóm a Sombrcira, Ioão dc Mata,Raimundo Tavarcs, Dalila, Iosé Pinheiro, Iosé Ciria-co c lanlos oulros quc cnlrcvistei quc não só mc con-laram a história da lari, Çomo também foram pcrso'nagens da mcsnta..

Por I'im, qucro agradcccr pcnhoradamcnte a

Scbastião Baia Aguilla, c Raimundo Qucrroz, Íespec-livamentc prefcilo c vicc-prcfcilo da cidade de AI'mcirim, scm os quais csta obra não scria cditada ediÍ'und ida,

Cristovão Litts

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Apresentaçã,oEsIa é uma obra dc incgávcl mériío, pois ofcrcce ao leitor os

clemcníos ncccssários a um amplo e minucioso conhecimentosobre a saga da ocupação humana na Bacia do Rio fari, desdeo^r.scu.s habitanlcs mais primitivo,s, os índios, até os dias atuais.

Apcsar dc se fixar com maior riqucza dc detalhes no períodomais recente dos últimos scíenta anos, o autor viajou a temposrcmotos, iluslrando com baslanlc conhccimcnto o passado geo-morfológico da rcgião.

Cristovão Lins dividiu scu livro cm cinco fases distintas (dasquais vivcu dirctamcnlc as duas últimas), complementandosuas informaçõcs com vários anos dc exaustivo trabalho dc pes-quisa, quc incluiu o cstudo dc documcntação fragmentada epublicaç(tcs csparsas, alóm dc cnlrcvistas a habitantcs quc ocu-pam a região dcsdc a scgunda fasc dcscrita.

A história cla lari, coníada pelos próprios protagoniì:sms das

^çuas divcrsas fascs, ó um prccioso documcnto histórico, mate-rial dc raro valor, quc se pcrdcria no tempo não fossc a compi-Iação rcalizada pclo auíor. E um lrabalho a bcm dizcr históri-co, cluc vcm prccnchcr a lacuna dc ludo até então cscrito sobrecste cmprccndimcnío.

Eslc livro tlcstina-sc a Íodos aquclcs quc tcnham algumintcrcsse no proccsso sócio.cconômico do desenvolvimento denosso país e, cm espccial, desta rcgião, transformada hoje emponío focal dc convcrgência das atenções de todo o mundo,pcla ação crílica dos movimcnlos ccologistas e ambientalistas,

Foi para mim molivo dc orgulho c grande satisfação pessoalrccebcr do autor a tarcfa dc prcfaciar csta obra.

Montc Dourado, 19 tlc rlczcmbro ctc 1990

Fldvio M. de Britto Pereira

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Prefúcio do autorNa história empresarial da Amazônia, podemos cilar dois grandes projetos

que, à época em que foram cxecutados, foram muito combatidos pela-impren-sa. Porém, devido à evolução dos meios de comunicação, não se comparaÍamneste sentido ao acontccido à lari, principalmente na época dc Daniel Ludwig.Os projetos a que qucremos nos refcrir tratam da construção da Estrada ãeFerro Madcira/Mamoré (no Estado do Acrc) e a plantação de seringueiras emBcltcrra e Fordlândia, no rio Tapajós (Esíado do parií).

Como o tema do livro é o Projcto Jari, ícntarcmos naÍraÍ os fatos com amaior isenção de ânimos possível. Fatos históricos c tecnológicos, ocorridos nasquatro fases da existência cmprcsarial da Iari. Como funcioniírios hií dezoitoanos, testemunhamos duas fases desta cvolução, as quais denominamos de faseLudwig e fase nacional . As outras duas fascs, José Júlio ePortugueses, não tes-temunhamos, mas tivemos a felicidade de trabalhar e conviver com algumaspessoas daquelas fases c com toda a desòendência dos mesmos.

Pesquisamos ainda fatos históricos e políticos nos aceÍvos da Biblioteca deAImeirim, porém o Iivro é bascado fundamcnta]mcnlc no depoimcnto de pes-soas honestas e muito antigas da rcgião, proíagonistas c testemunhas das quatrofases empresariais da lari.

Em síntese, o Iivro procura naÍÍar cronologicamente a história e o desenvol-vimento tccnológico ocorrido em cada fase, começando pela mais antiga, deno-minada fase José Júlio, e indo até a atual, a fase nacional.

Antcs de chegarmos à história propriamente dita, faremos uma descrição detoda a região, falando de sua formação geológica, ocupação humana, sua hidro-grafia e de alguns falos históricos e políticos que marcaÍam a história do municÍ-pio de Almeirim, onde está inserida a :írea da lari.

Iniciamos o livro como um Íomance, achando que esta seria a melhor forma:uma pessoa vindo de fora e permanecendo na região, pesquisando o passado epresenciando a evolução...

As citações bibliográficas csíão conlidas no final deste Iivro, como também onome das pessoas quc colaboraram com informaçÕcs e orientações.

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Sum^úrio

PARTIÌ I -O JARI PRIMITIVOA regiãoOcupaçao humanaO crime do padre

PARTE II - A T,'ASIì JOSÉ .IÚLIOJosé Júlio de AndradeA Vila de ArumandubaComo José Júlio consolidou seu impérioO Capitao Crispim de AlmeidaDuca NenoA revolta de CezárioOs homens valentes da épocaSombreiraA venda das fazendas AquiquíA expediçíto alcmõAs tribos de índiosA frota de embarcaçõe s

Os produtos exploradosO padrão dos funcion(triosA pecudria

PARTE III - A FAS/ï PORTUGUESESOs novos sóciosOs novos rumos da JariA tentativa agrícolaA industrializaçao da castanhaA pecuóriaOs produtos exploradosAs filiais

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O político José Júlio

33354I4344475053555760636s6672747782A venda Dara os Dorlupueses

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PARTIi IV - A T'ASTJ LUDIVIGDaniel Keith LudwigA Jari que Ludw,ig cncontrouInfra-e strutl.ra do projetct e problcntes corrclalos

. Os projetos de LudwigA rotatividade de diretore s exe cLttivosA evoluçao do projcto flore stalO ciclo florestalA criação e e volução do SASIU ma populaçao cosmapo litaA fóbrica de ccluloseA saúdeA influência da Jari na regiãoO projcto arrozA ctgriculturaA pecurlriaMineraçãoAnos difíceis

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pAR'r'E V - A NACTONAT,TZAÇÃO DO ?ROJrìTOA cxpe riência de Azeveclo Atttune sA Companhia do JoriA transiçãoA emprcsa mais abertrtAJurieaecologiuA ítrea florcstalA exploraçao de madeira cultivadaA desativação do proje to errozA pecuclria bubalinaA órea de mineraÇão

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Programas fulurosConclusões" Flash" da regiaoBiblioRrafia

e ctn exccuçao

nos dias atuuis

22923r233235

lari:7O anos de história

Infuoduçãostamos no ano dc 1920, subindo o colossal Rio Amazonas no sentidode sua nascente, partindo da cidade de Belém, situada na zona do Es-tuário, próximo ao oceano Atlântico. o rio, com sua forte corrente-za, dcmonsírando scr ainda jovcm, à procura dc seu cuÍso definitivo,

constitui-se o único meio dc sc chcgar ao interior da Amazônia. A viagem denavio a vapor é lenta e já dura dcz dias. Apcsar da lentidão, é compcnsada coma bela paisagem tropical, animada pclo constantc cruzar dc bandos interminá-vcis de maÍÍecos, patos, mcrgulhõcs c outras avcs à frcntc do navio.

A tarde aproxima-sc, o sol aos poucos comcça a dcclinar c cm pouco tempo anoite tropical envolve tudo. Recolhemo-nos ao camaÍoíc e, à luz dc um lam-pião a gás, arÍumamos nossas coisas, pois o comandanlc do navio nos informouda proviívcl chcgada ao destino logo pcla manhã.

A noitc parccia não qucrcr tcrminar. Acordiívamos dc vez cm quando, ou-vindo apenas o barulho monóíono da miíquina a vapor. Rcsolvcmos cntão lro-car de roupa c cspcrar fora do camarotc o raiar do novo dia.

Aos poucos o sol comcça a propagar scus raios, proporclonando a dislinçãodo quc fôra no escuro da noilc impossívcl dc conícmplar, como as águas barrcn-las do Amazonas e sua mala ciliar vcrdc cscura.

Dc rcpentc divisamos ao longc uma clcvação csbranquiçada e rapidamenterccoÍÍemos ao comandantc do navio para confirmar nosso pcnsamento - Erarcalmcntc a vila de Almcirim.

Aos poucos o navio foi sc aproximando do atracadouro rudimentar. O co-mandante faz soar o fortc apito para anunciar a chcgada do navio. Ncste mo-mcnto já podcmos divisar nas elcvaçõcs a movimentação dos moradorcs, deslo-cando-sc para a beira do rio à cspcra do navio. Na realidade este era o acontcci-mcnto fcslivo quc só aconlccia a cada trinla dias. O navio atraca dcfinitivamcn-tc. E colocada a prancha para o cmbarquc c dcscmbarque dos passagciros. Es-pcro um pouco c lambóm dcscmbarco, para cntão iniciar a narração da históriacla Jari, com a maior iscnção clc ânimos quc mc ó possívcl.

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PARTEIO Jari primitivo

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O Jari primitivo

A regiãoMunicípio de Alrneirim tem uma área de 67.870 Kmr, limitando-se

ao Nort,e com a Guiana Holandesa, ao sul com os Municípios dePorto de Moz, Prainha c Gurupá; a Leste com o território Federaldo Amapá c a ocste com os Municípios de Monte Alegre e óbidos.

Esta área, como toda a Bacia Amazônica, ficou submersa cm regime oceânicode seiscentos a trezentos c cinqücnta milhões de anos, ou mais prccisamente,do período ordoviciano ao carbonífcro, ambos da era paleozóica.

Na área mczosóica, quc foi tlc 220 a 135 milhões de anos, a Bacia Amazônicajáera regida por um sistcma lacustrc, ópoca em que se deu o soerguimento dosAndes.

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A área da Jari, como todo o Município de Almeirim, cstá assentada sobredepósitos lacustres e fluviais, scdirncntados ncsta bacia durantc a era cenozói-ca. A bacia tem seus limitcs ao Nortc no rnaciço das Guianas e ao Sul no planal-to contral brasileiro. A rocha cristalina quc constitui a borda do que fora õ ocea-no, estende-se em forma dc arco, scrvindo dc basc ou assoalho entre os dois ex-tremos. Em cima destc assoalho acont.cceram as deposições estratigráficas, asquais correspondcm à escala gcológica do tcmpo.

Os depósitos dc origcm lacustre acontcccram posteriormente aos depósitosoceânicos e portanto sobre estes, mas cm um limitc bcm abaixo das bordas doque fora o mar. Logo, para mclhor cntendiúento, temos naárca da Jari forma-ções mais ao Norte, provenientes somcnte de deposições oceânicas, e mais parao Sul, no sentido do Rio Amazonas, forrnações provenientes de deposições la-custres.

As formações cstral.igráficas scdimentarcs são batizadas de acordo com olocal onde foram pcla primcira vcz idcntificadas, como por cxcmplo: FormaçãoTrombetas - encontrada no Rio Trornbctas, no Município de Oriximiná (Es-tado do Pará).

A formação Trombctas constitui a mais antiga formação scdimcntar cxistcn-

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l8 A região

te na Bacia Amazônica. É datada do período Ordoviciano, a 490 milhões de

anos, indo até o Siluriano,a430 milhões de anos, daârea paleozóica. São por-

tanto teÍrenos muito antigos, havendo na rcgião da Jari, ao Norte, afloramen-tos desta formação em releuo bastante acidcntado, O solo é formado de areiabranca fina e muito pobre.

Ao Sul, em contato com a formação Trombetas, encontramos a FormaçâoCuruá, assim denominada por tcr sido cncontrada pela primeira vez no municí-pio de Alenquer, também no Pará. Esta formação teve início no período devo-niano a 400 milhões de anos, indo até o período Carbonífero, a 350 milhões de

anos, cessando aí as formações sedimentares de origem oceânica na BaciaAmazônica.

A Formação Curuá caracteriza-se pelo afloramcnto de folhelhos de cor cin-za, associad-o muitas vezes a intrusÕ"i de diabásio. É nesta formação que apare-

cem os solos mais férteis, originários tlo diabásio de coloração vermelha, situa-dos em relevo bastante acidcntado, próximo a igarapés e nas encostas das ele-vações. Estes solos não são originados exclusivamente de deposições sedimen-tatês e sim devido a intrusâo do mágma nestas'rochas. Nos topos aplainados dos

morros encontramos solos de coloração amarela escura, aparentemente ricosem matéria orgânica e de boa fertilidade. Nestes solos também verifica-sealguma contribuição das rochas magmáticas.

Em seguida vem a Formação Barreiras, já no período terciário da era ceno-z6ica, dúada de setcnta a doze milhões de anos. Nesta era, a região jâ eraregida por um sistema lacustre. Esta formação predomina nas tcrras da Jari, em

uma tintra ao Norte no Paredão de Pedras, ao sul no Amazonas; a Leste no RioJari e a Oeste no Rio Parú.

Esta formação origina solos arenosos com pouca argila, em relevo suave-mente onduladb e emlima dos platôs que clcvam-se até duzcntos metros acimado nível do mar, com solos bastante argilosos.

Finalmen te, a vá,rzea é o mais rcccntc episódio geológico, ainda em proccsso

de formação, devido à colmatagcm. Sua formação ó rcccnte, iniciada no perío-do Holocênico hátonze mil anos até os nossos dias. Esta formação origina soloscom predominância de argila.

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Com relação à formação dos rios, a bacia, que já havia passado por um re-gime de sedimentaçâo oceânica. continuava a ser sedimentada por regime la-õ.ustte de água paiada, talvez mais acelerado que o primeiro. Com isto, a

mesma ia se tornando cada vez mais rasa, impedindo que aágua provenientedas partes mais altas fluísse para as mais baixas. Desta maneira surgiram rioscomõ o Jari, Parú e outros que têm suas nascentes no maciço das Guianas ou no

O Jari primitivo

Planalto Central Brasileiro c que aos poucos foram crodindo as camadas estra-tigráficas e formando seus cursos definitivos.

Tomando como ponto de rcferência o Rio Amazonas, as terras da Jari estâosituadas á margem esquerda do mesmo rio, contidas entre as Latitudes de0027'00"5 e 0l'30'00"S e Longitudes de 5l'40'00" e 53'20'00".

Existem ainda outros rios de menor tamanho como o Cajari, Arraiolos, Ca-racurú, Esposendo c Muriacá, lodos com a pcculiaridade de possuirem águasescuras.

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Tomemos agora o Rio Jari como cxemplo, partindo de sua foz no Amazonase nos dirigindo para Noroes[e, no sentido dc sua nasccnte. Como falamos ante-riormente, o Jari ó um rio que possui águas escuras ou pretas, não podendo por-tanto ser comparado com um rio de águas brancas ou barrentas, no que tange àfertilidade dos solos quc ficam pcriodicamcnte sob sua inundação. Meimoassim, numa distância de aproximadamente 80 km de sua foz com o Amazonas,existem grandes cxtcnsõcs de campos nat.urais e sua mata ciliar é exuberante.

Entre as gramíneas existent.es, podcmos ciÍ,ar a canarana dos barrancos (E-chinochloa polystachya) o rabo de rato (Hymenachnc amplexicaulis) e a po-monga (Leersia hexandra). Essas gramíncas são altamcnte palatáveis e proiéi-cas.

Sua mata ciliar é formada de uma grande variedade de espécies, onde predo-minam as seringueiras (Hevea brasilicnsis) o Tachi (Triptaris martiana) e aAcapuran a (Campsi andra lauri fol ia).

Mais para o interior da vá,rzea, na árca pantanosa, cncontramos grandes con-centrações de palmáceas, onde prcdomina o Buriti (Mauritia flexuosa) etambém o Capitari (Tabebuia insignis), pertcncente à família das bignoniaceas.O Buriti tanto ocorre nas rcstingas quc margciam o rio, como também em ilhasque se formam em grandcs quantidades, scndo algumas de até cinqüenta hecta-rcs, como é o caso da ilha Japatituba.

Encontramos t,ambém nas margcns do rio em quase toda sua extensão, nobaixo e médio curso, ou seja, de sua foz até a Cachoeira de Santo Antônio (aaproximadamente 170 km) grande incidôncia de anin ga (Montrechardia arbo-rcscens) pert,encente à família das Aráccas. Esta vegetação parece servir deproteção à margem do rio, onde também é a primeira vegetação, juntamentecom a Tabôa (Tipha dominguensis), a surgir nas ilhas que se formam no baixoRio Jari.

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20 A regiâo

O regime hídrico da região é o mesmo dc toda a Amazônia, sendo o pcríodode inverno, ou de enchente, que inicia-se em janeiro indo até o fim de junho, co período de verão, ou de sôca, de julho a dczembro. Durante o inverno a águatranspõe as restingas e penctra nos campos e matas. A profundidade média daságuas ê de 70 cm, bem mcnor do quc a dos municípios vizinhos, Prainha, MonteAlegre etc, que chegam a dois mct,ros de profundidade a mais, sendo esta cotaaumentada à medida quc sc aproxima dos Andcs.

A influência da maré no Rio Jari é, bastante significativa, atingindo a cotamáxima de 3,10 metros no môs de maio e a mínima de 0,30 metros negativos nomês de dezembro, isto a 80 km dc sua foz.

A título ilustrativo, a maré tcm influôncia no Rio Amazonas, numa distânciade até 1000 km de sua foz, isto na ciclaclc dc Óbidos.

A fauna ictiológica está cslrcitamcntc rclacionada com o rcgimc hídrico daregião, no que tange à ópoca clc rcprodução. A Amazônia não tem somcnte amaior rede hidrográfica do globo, mas também a maior divcrsificação de cspé-cies de peixes, estimada enl.rc 1500 a 2000 espócies.

Nos meses de janeiro a junho acontccem as piraccmas, onde os peixesnadam contra a correntezaaté próximo às cachoeiras, onde é feita a desova.Entre as inúmeras espécies que desovam nos rios Jari e Parú, podemos cit,ar oTambaquí (Colossoma macropomum) c a Pirapitinga (Colossoma bidens) nomês de março e a Pirarara (Phractoccphalus hcmiliopterus) em junho.

Na realidade os rios de água preta não são piscosos; os pcixes os utilizampara reprodução e voltam ao Amazonas. Isso ó dcvido à pouca fertilidade daágua, que não propicia a criação do fitoplancton, e tambóm dcvido à acidez daágua, não muito compat.ível com ccrl.as espócies. Os alevinos, logo após a eclo-são dos ovos, t.cndem tambóm a voltar para o Amazonas, ficando poucos cxem-plares adultos nas regiões dos rios de águas prctas.

Para o pescador, um dos indícios da piscosidade dc um rio é quando existemmuitos bôtos, sejam elcs tucuxis(Sotiília fluvialis) ou o bôto vermelho de maiortamanho (Inia geoffrcnsis), que dificilmcnte se encontra cm rios menorcs,sendo scu habitat preferido o Amazonas. Em época de piracema os bôtosacompanham os grandes carclumcs, mas passada esta ópoca, rctornam ao Ama-zonas, ficando poucos cxcmplares nos rios dc água cscura.

Existem outras espócics dc pcixes na rcgião do Jari que não são de piracemae desovam nos campos em ambientc dc água calma, como por cxcmplo o Pira-ruc(t (Arapaima gigas) o Tamoatâ (Callichthys callicthys) e outras espócics.

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Em quase todo o curso do Rio Jari no scu primeiro estágio, os solos são argi-

O Jrri primitivcr

losos dcvido à pcquena, mas cont.ínua, colmatagem efetuada pelas partículascm suspensão contidas em suas águas. Comparando a text,ura dos solos quemargciam o Rio Jari com os do Rio Amazonas, o primeiro apresenta texturamcnos pcsada, isto devido a transportar maior quantidade de areia, enquanto oscgundo aprcscnl.a maior quantidade clc siltc cm suas águas.

Na formação dos solos <lc vârzca, podcmos nol.ar nitidamente os vários está-gios cxistcntes, partindo-sc da margcm do rio ondc existe a mata ciliar. Nestelocal, que varia de extcnsão cntrc cem c duzentos metros em média, o solo émclhor cstruturalmentc e com cota mais alta em rclação aos estágios subse-qüentcs. Prova disso ó quc a cnchcnte nos meses de janeiro inicia-se pelointerior dos campos mais baixos, sendo a rcstinga, leso ou várzea alta, o últimolocal a scr cncoberto pelas águas.

O próximo estágio das várzcas clo Jari é avârzca baixa, bem mais cxtensaquc a primcira c com solos cstruturalmentc mais deficicntes. É na vá,rzea baixaquc exisl.cm as pastagcns; clurantc o vcrão (setcmbro a dezembro) estas árcasnão são inundávcis.

Após avárzea baixa, vcm o igapó, quc mcsmo no pcríodo de vcrão perma-ncce com água.

Ao contrário dos rios dc água branca do baixo Amazonas, a rcgião não apre-scnta os lagos, quc duranÍ.c o vcrão funcionam como criatórios naturais dospcixcs.

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A fauna cxistcnt.e nas margcns c no intcrior do baixo curso do Rio Jari não ógrande s ncm tão divcrsificada. Podcmos ciLar nas rcstingas altas a presença debandos dc guaribas (Alouatta da américa) c mais para o int.crior da vâ,rzea, játnas áreas de campo ou de igapó, as Capivaras (Hydrocchoerus hydrochoeris),os enormcs Jacarés açus (caimanniger nigcr spix) e Jacaré t.inga (caiman scle-rops), estes em grandes quantidades. Onças também cxistcm, mais na época devcrão; no inverno mudam-sc para as l.crras firmes mais próximas, ou ficam nastcrras altas ou cm cima dos boiados (acúmulo de matcria orgânica flutuante).

Lontras (Lutra cnydris) e Ariranh as (PteronuÍa Brasiliensis) não existem,em mais um indício de que a região não é piscosa, uma vez que estes animais ali-mentam-se de peixes.

A fauna avícola é tambóm discreta. Existcm patos, marrecos, garças, porémpoucos mergulhõss e cararás, avcs csl.as quc tôm como alimentação básica opeixe.

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22 A região

Em síntesc, o baixo curso do rio Jari ó formado de áreas de vârzea, comsolos argilosos, sendo pouquíssimos os locais onde pontas de terra firme (geral-mente elevadas) chegam aLê a margem do rio. Em gcral a topografia dominanteé a planície de vârzeas, o rio etc.

I

O rio apresenta uma largura média de aproximadamente quatrocentos me-tros e sua profundidade média ê de dez metros. Neste curso o rio apresentameandros bastante acentuados. A navegação pode ser feita com embarcaçõesde grande calado, scm qualquer restrição até uma distância de 108 km de suafoz com o Amazonas.

Como tributários do Rio Jari nesta primeira fasc, excetuando os inúmerosigarapés provcnient.es dc ambas as margcns, encont.ramos pela margem direitao Rio Caracurú, a aproximadamente 107 km de sua foz. Consideramos o rio Ca-racurú o limite do baixo curso do rio Jari e o início do scu médio curso, que scestende até a cachocira de Santo Antônio, numa distância de 60 km.

A medida que nos aproxirnamos do início do scu médio curso, as vârzeas vãoficando cada vcz mais cstrcitas c a tcrra firmc, sob a forma de platôs aplainados,aproximando-se da calha do rio. Tanto que a partir dafoz do Rio Caracurú, avá,rzea quasc não existe c o Rio Jari corre ent,re tcrrcnos bastante acidentados.Neste trecho o rio já é mais raso cm alguns locais, aprcscntando o surgimcntode praias de areia branca no pcríodo do vcrão. A navegação já é rcstrita a em-barcaçõcs de médio portc; a aproximação da cachoeira de Santo Antônio exigepráticos compctcntcs para ser feita com ôxit.o, principalmente na época deverão.

O solo cm suas margcns, cm rclcvo não acidentado, é bastante arenoso,apresentando igarapés com águas muito limpas. Em cima dos platôs aplainadosque em certos t,rechos sc constituem cm margens do rio, aprescntam-se solosmuito argilosos e desprovidos totalmcntc dc igarapós. Nestes trechos do rio,pela sua margcm csquerda, podcmos notar camadas de argila de coloraçãobranca em perfis bastantc significat.ivos. Esta ocorrôncia é mais evidente noinício do médio curso, ondc o Rio Jari descrcve uma grande curva à direita noscntido de quem se dirige à sua nascente.

A Florcsta Tropical em climax é cxubcrante, formada por inúmeras espéciesonde, tanto nos platôs aplainados como em relevo suavemente ondulado, pre-dominam a Maçaranduba (Manilkara huberi) a Maparajuba (Chromolucumarubriflora) a Castanheira (Bcrtholletia excelsa) em reboladas e o Angelim (Di-nizia excelsa).

A caça é abundante. Podcmos ci[ar a Anta (Tapirus Terrestris Lin), o Veadovcrmelho sem chifres (Mazana amcricana) a Paca (Cuniculus paca) a Cotia e aOnça pintada (Panthera onça Lin) predador das demais espécies citadas.

A fauna avícola na calha do rio e nas suas margcns é quase ausente. Isso se

O Jari primitivo

deve à inexistência de várzcas no médio curso do Rio Jari, onde aves de hábitosaquáticos, como o pato, o marreco e outras espécies, não têm meios de se ali-rãntut. Quanto às espécies quc se alimentam de peixes, como mergulhões e

arirambas-, quase também nãoexistem neste estágio pela pobreza de sua fauna

íctia.

Mais para o interior das margcns do Rio Jari, a incidência de aves é maior,principaímente araras e papagaios, que têm facilidade de alimentar-se de frutosque apresentam casca dura, como a castanha.

Em toda a área do Jari é baixo o índice de ofídios peçonhentos, comparadocom outros municípios vizinhos a Almeirim. Entre as espécies existentes, cita-mos a Surucucú pico dc Jaca, pcrtonccntc ao gênero Lachesi e Jararacas perten-

centes ao gêncro Botropcs. Cascavóis pcrtenccnt.cs ao gênero Crotalus, são

muito difícãis de encontiar, devido a esta espécie ser mais freqüente em regiões

de campos de terra firme. Acrcditamos que a medida que o rio Jari aproxima-seda região de campos próxima à scrra do Tumucumaque, o índice de cascavéis

aumente.

úclú

Passemos agora ao alto curso do Rio Jari, dclimitado por nós com seu iníciona Cachoeira ãe Santo Antônio e indo até ondc tcmos conhecimento, mesmo

em áreas não mais pertenccntes à Emprcsa.

A Cachoeira de Santo Antônio, com suas quedas d'água a despencar de uma

altura de trinta mctros, constitui scm dúvida alguma o mais belo espetáculo de

toda a região da Jari. Existem outras cachoeiras no Rio Jari, como por excmploas de 16óarát,Itacé, Piriquitá, Inajá e Aurora, porém a de Santo Antônio é a

maior e mais bela.

Como tributário do Rio Jari, no seu alto curso, podemos citar pela margem

csquerda o Rio Iratapurú, a 13 km da cachoeira de Santo Antônio. Quanto aos

igarapés, pela margèm direita temos o Carrapatinho, Cumarú, Bacaba, Setepãncádas,Igarapé do Inferno e o Ipitinga. Pela margem esquerda o Itacaraveli,piriquitá, Cãconopanãm, Aurora e Maracajá. Na Cachoeira Aurora o Rio Jarisc eipraia, formando rnuitas ilhas, scndo sua largura neste local vencida em

duas horas de canoa. Das corredciras baixando o rio no trecho abaixo da Ca-

chocira da Auroraatê encontrar águas calmas, são 45 minutos de motor l0ll2Archimedcs e cm sentido contrário, mcio dia de viagcm, no mesmo tipo de mo-

tor.

Com relação ao revestimcnto florístico da área, algumas espécies incxistcn-tcs nos primõiros cstágios começam a surgir, algumas com pecúliaridades, como

é o casó da Balateira-(Mimusops bidentata) que só dá na margom csqucrdadorio Amazonas, numa faixa bastantc ao Nortc de sua calha e tem scu limitc dc in-

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24A região

cidência atê a margem dircita do Rio Jari no seu alto curso, do euerecurú ppracima' Não existe Balateira na margem esquerda do Rio Jarí. outra curiosidddeé com. relação à Seringueira, que no Rio irarú é encont;.d; em ambas as mar-gens do baixo curso' até a cacioeira do Panama. No Rio Jari, a mesma vegetano baixo, médio e arto curso, até a cachoeira de ltacará.Além das espécics citaclas, antcriormen[e, a Maçaranduba, Maparajuba, acastanheira e o Angelim continuam incidlnãï m maior proporção, com desta-que também para a Copaíba (copaifera guianensis), rorliuïlde ocorrência.os solos são férteis, com afloramento de rochas de diabásio em certos tre-chos' A fauna íctia no alto Jari é maior qu. nà seu médio curso e talvezigual àdo baixo curso- Esre fato talvez scja oeïioo ã nao cxistircm predadores natu-rais, como o boto, e a incxistôncia oc moraàãrôt no alto Jari, a não scr os índiosuruguaianos e Aparai, quc só pescam para o seu sustcnto.As espécies existcntcs no alto Jari são as mesmas que encontramos no baixoe médio curso, como por excmpro o ramuaqui, Filhote, Tucunaré, surubimetc' E para corroborar o quc faiamos ont.riór*entc sobre a pequena quan.i-dade de predadorcs, encontramos no alto curso do Jari eremplares de peixesbem maiorcs do que no seu módio e baixo .uruo, dcnotando qu" os mesmos têmchances de crescer sem grandes riscos. Corno exemplo citamos o Filhote,encontrado com cerca de 100 kg e Jaús (Paulicea lutkeni steindachner) de até200 kg. 's"'v"' Dlvtt

Para quem não conhgcc-a região, a primcira pergunt.a é como essas espéciesexisÍem no alto curso do Rio Jãri, urã ""r ì";. Õachoeira de sanro Antônio[cm uma altura de trinta mctros, intransponrucr pfra os pcixes. Acontecc quc oRio Pacanarí, que tem sua foz com o Rio Jari, abaixo da Cachocira de SantoAnlônio, I'em comunicação, ernbora difícil,-;;; o Rio Jari acima da cachoeira,descrevendo um semi-círculo.

A título de informação, o-Equador corta o Rio Jari no seu alto curso, numadisrância de l5 km ao norrc oo itio ar;;;;;;, afrucnte pera margem direira doJari' Nesta árca também cxistem grandes cacauais como sub-bosque da mataautóctone.

O Jari primirivo

OcupaçãohumanaA ocupação humana da árca pcrtcnccnÍe ao município de Almeirim, comoem toda a Amazônia, é rclacionãda com_ a pré-históriaïu, mais prccisamente,com uma das entradas de imigrantcs asiáticbs pela Amórica do Nãrte, tìfoteti-camcnte estimada em 13 mil ános. Prcsume-sc que aos poucos estcs povos des-locaram-se em várias direçõcs, [anto na própria América do Norte como nasdemais Américas,-scnd9 quc o povoamcnró da Am azõnia e atribuído a umramo provcnient'e da Colômbja e-do Equador, dividindo-se um para o Sul, nocorredor entre os Ancles c o occano paôífico, c out.ro para a Bacia Amazônicaaté atingir o Occano Arlânrico.

Como vcstígio. destes povos prirnirivos na Ama zõniapodcmos citar os culti-vos pré-colombianos não Amazônicos, como por cxemplo: o Milho (zeamays), a Mandioca (Manhiot uütissima), o Algodã 9 fc"ttffium barbadensis),o Ananás (Ananas sativus), a cana rtcóÍra lc"yritirÃíãïiïitum)e a pimenta(Capsicum sp.). A cxemplo das culluras cit.aclas, os indígenas aqui encontradospelos europcus também-podcriam ,r.s.rn,iõi'd"rr., ú;;; prin-'irl;;;."Ë';j;;"quc o povoamcnto da Amazônia dcu-sc clc mancira muiro leïta c para isto pre-cisou de uns l0 mil anos ató quc os curopcus aqui cr,cgasscr.--'E sabido.que muilo antcs do dcscobrimcnto da Amórica já havia agriculturana Amazônia, fe-ita por indivíduos quc cultiuauam plantas poro ot.nder às suasncccssidadcs, além da simprcs corerá c oo c*tãtivismo.como cxcmplo de plant.as c.ultivadas podcmos citar o Timbó (Dcris nicon,D' urucu)' Dclc os índios util izavam o iuíì,- quc produz uma substância cha-mada rotcnona,' que é tóxica para anirnais á.-rongue frio (portanto usada napcsca)' O timbó era propagacloalravés clc cstacas e já não frutificava e nem flo-rescia' Da cana flccha (Gyncrium sagitatu*j

"ru ürilizado o pcndão, para fa-bricar flccha.

Como plantas. de cxploração podcmos cit.ar: Tucumã (Astrocaryum tucu-mã), da qual utilizavam o frúto para comcr ou sob a forma de vinho. Extraíamtambém a fibra chamada Tucum,.utilizada paia fazer rede ou como corda paraarco' A castanha do Pará (Bertholtctia exceis,a) era utilizada como alimento, re-tirando a amêndoa. Na árca do Jari, "o iiliáo do Rio pacanari (afluenre damargem direita do Rio Jari) cncont.ramos fiedras de formato arredondado detamanho variável, podendo cabcr na mão dó um adulto ou de uma criança, queevidenciam pcla existôncia de sulcos, sua utiúzaçao como utensílios na quebrada amêndoa da castanha e outras scmcntcs duras.

Na realidade, quando os curopcus aqui chcgaram os índios já praticavam aagricultuÍâ, só que dc uma manôira,nulto rufr, pois estavam atravessando aidade da pedra lascada, onde faziam o, t.uto, culrurais das ervas claninhas ma-nualmente' Eles não tinham condições de raúiirur urcnsílios de maior eficiônciae durabilidadc, a não scr clc tnatciiais .orno a madciro ou o p.oro. por isso fa-

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Ocupação humana

zi1ma dcrrubada da mata com machaclo clc pedra, scndo que as árvores *u{'duras cram machucadas, ou mclhor, ancladas, até quc Sccassem ; depois' 9oT- O

auxílio dc pedrarliunço"am faíscas sobrc fibra de ãlgodao ou folha de Imbaúba

(Cecropia S.P.) para a qucima das árcas'

Outro indício da prescnça humana na Amazônia antcs do advento dos euro-

p.ut A a arqueologia da regiao, (scndo a árca da Jari contida na Fase Mazagão'

entrc os rio Arag"uarí, nJTcrritório do Amapá, e o proprio Rio Jari) sob a

ioiro ãe Agricutiuto ác dcrrubada c qucima da mata, aldeias pequcnas situa-

das nos poucos iugot.t onde cxiste tc.ra firme, on6c também eram situados os

cemitórios. Esta fasc tcm datação iniciada no fim do pcríodo_pré-europeu, até

pouco tcmpo upOt a conquista da Amazônia (Sóculo XV - XVI)' Poderíamos

ainda citar, como indícioi da prcscnça humana na ópoca antcrior à chcgada dos

õutãp."r na vizinhança do municrpio ctc Almcirim, as pinturas rupcstres da

scrra clo Ercrô c da scrra cla Lua, no viz.inho município dc Monte Alcgre'

DÍJÚ

Após cstas fascs já mcncionaclas sobrc a ocupação humana na Amazônia' as

quaii são baseaãut.t hipótcsc.s, a história a scguir i'Áé tSit consistente' Como

prctcndctot opóno, not rcfcrir a árca do município d-e Almeirim' onde estão

localizadas aS tcrras da Jari, no quc tangc à ocupação hum^ana-, iremos abordar

up."ur fatos rclacionaclos clirctorr,.nt. .õrtr o história do rcferido município.

Iniciaremos pclos anos cntrc 1634 e 1637, quando Bcnto Macicl Parcntc,

consideraclo o maior matador dc ínclios da história da Amazônia, recebeu con-

óõrrao da Capitania do Cabo Nortc, cm carta do Rci Fclipc III'

Esta Capirania estcnclia-se do Rio Surubiú (no Município de Alenquer) até-.o

Oi;ooá* tna Oivisa do Tcrritório Fcdcral do Amapá com as Guianas) e era li-mitada a ocstc fcio fat,i, tcndo como scclc a Vila cl-c lauacuara' que hojc é a ci-

dade de Almcirim.

Almeirim foi aldeia dc catcqucsc, ondc os fraclcs Capuchos de Santo Antô-

nio fundaram a aldcia clo parú. Èxistc outra vcrsão: os holandescs tcriam lcvan-

tado um forr.e, sendo port.anto o primciro marco construído e Qug deu origem

ao local onde atualmente foi fundãda a cidadc de Almeirim. Na rcalidade os ho-

íunOrr., cstivãiam bem próximos a Almcirim, poróm na m-argcm direita do

Amazonas, na foz Oo Xingú, a uns 40 km abaixo- Existe tambóm o rcgistro da

história, que Manocl siquõira construiu utn fortc dc pedra e barro à margem es-

querda do Amazonas, a aproxirnaclarncntc 3 km da foz do Parú, hoje sede do

município. Este forte foi rcconstruído cm 1745'

Outro fato rclacionado com a história dc Almeirim foi a dcsignação dc Lton-cisco Xavier de Mendonça Furtaclo (irmão de sebastião José de carvalho e

Mclo, o tutarquôs dc Pom-bal) como douttnodor do Estado do Grão-Pará, em

O Jari primitivo

1751. Mendonça Furtado foi incumbido da demarcação das tcrras do Estado doGrão-Pará e teria que encontrar-se com o espanhol Don José de lturiaga, o quenão acontcccu na sua primeira viagcm e ncm na segunda. Mas foi durante suasegunda viagem ao Amazonas que Almeirim foi elevada à categoria de Vila, nodia22 de fevereiro de 1758. Categoria esta de duração efômera, pois logo noinício do século XIX, Almeirim cnlrou em dccadência, voltando a ser povoado.A partir de 1835 surgiu cm todo o Pará um moviment,o nativista denominado"Cabanagcm" e não só Almcirim como toclos os municípios do Pará sofrcramgravcs conseqüências.

Dentro do atual município dc Almcirim, c dcntro das lcrras da Jari, foramfundadas outras vilas, como por excmplo:

Vila de Esposendo, situada no rio clo mcsmo nomc, que ó afluente do RioArraiolos. O nome indígena dcste rio ó Tauró.

Vila de Arraiolos ou Guarimucu, situada à margcm esqucrda destc rio,numa distância de aproximadamcntc 40 km dc sua foz com o Amazonas. Ncstelocal existcm as ruínas dc um convcnto, no local dcnominado Freguesia.

Ern 1862 um important,e pcrsonagem da época, o padre Amandio Pantoja foiassassinado, assunto que abordarcmos no capítulo a seguir.

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O crime do padreNa Amazônia sempre cxist.iram grandcs latifúndios, e o município de Almci-

rim não fugiu à regra. Talvez ató seja o local onde este fato foi mais accntuado.

Em 1862 existia em Almcirim um grande fazcndciro que possuía a maioriadas terras circunvizinhas à scde clo município. Seu nome cra Vicentc ManoclMachado, o Capitão Vicentc, como o conhcciam. Diz a história que tal cidadãocra bcm quisto na região e tambóm muil.o rcspcitado. A história a seguir contacomo foi o assassinato do padrc Amanclio Pantoja, cscrita pelo professor Nico-lino Campos e cnriquccida com alguns dados pesquisados pelo autor destelivro; seus pcrsonagcns principais são o próprio Capitão viccnte, sua osposa

Walda c scu cscravo dc confiança, Andró Avclino dos Santos.

Há muitos anos a[rás, cm 1871, o cscritor portuguôs Eça de Quciroz escreviaum romance de ficção, dcnominado "O crimc do padrc Amaro", onde o princi-pal personagem cra um saccrdotc quc cotncl.ia um crime de scdução contra umaingônua mcnina, pretcnclendo dcncgrir com o romance todo o clero da época.Cõmo litcratura é uma obra cligna clc nota, mas o contcúdo, alóm de maldoso, é

dc todo falso c imaginoso.

Por ironia, em 1862, na pcqucna Vila dc Almcirim, no nosso Pará, à margcm

csqucrda do colossal Amazonas, um padrc clc nomc Amandio, cm vcz dc scr ocriminoso ó a vítima, c os motivos do critnc foram concupiscôncia e calúnia, pa-

rccendo o fato qucrcr provar quc o rornancc c a ficção, são uma coisa, mas a rca-lidadc é bcm outra.

Em 1862 era vigário cm Almcirirn o padre Amandio Pantoja. A pequenaVila, como a maioria das localidadcs da Arnazônia naquela época, vivia vidapacata, scndo o sacerdotc pessoa dc projcção, respcitada e ouv_ida nas dclibcra-çOer locais. O paclre cra jovcm, scgunclo a tradição, muito picdoso e zcloso dos

icus devercs sãcerclotais. Alóm clìsso, para ajudar scus paroquianos quc não

dispunham de médicos, cra, como sc dizia na época, cntendido nas homeopa-t,ias, o que o tornava ainda mais qucriclo c rcspcitaclo.

Morava tambóm na localidaclc um rcspcitável cidadão quc detinha, coisacomum então, o título de capitão da Guarda Nacional; era o Capitão VicenteManoel Machado. O Capitão Vicentc, como era conhecido, possuía uma belís-sima csposa a quem dcdicava todo carinho e atenção, alóm dc proporcionar-lhetodo o õonforto possível naquelas circunstâncias de longínguo interior. Mas

scus negócios, suas terras e scu modo de vida faziam-no afastar-se por muitosdias forá dc casa, dado quc as distâncias longas e o prccário transportc dc canoa

ou a cavalo, forçavam-no a cssas ausôncias prolongadas. Com isso sua csposa,scm nada para ïazcr, pois as mucamas tomavam conta do scrviço da casa, ficavanaqucla doce ociosidadc quc laz gcrar as más idóias ou, como diz o caboclo,comcça a pcnsar cm fazcr rcinaçõcs. E foi o que Walda fez. Comcçou a plane-jar rcinaçõcs; mas qucm havcria dc scr o parcciro? Numa cidade pequena,

O Jari primitivo

onde todos os conheciam, a nolícia corria rápida c ccrtamcnte tcrminaria emtragédia, dado o gênio violcntíssimo do Capitão Viccnte.

Mas Walda era de um caráter cínico, calculista, fria e egoísta, pouco lhe in-tcressando o que pudcssc succdcr aos outros, dcsde que pudesse servir a scusinteresses c desejos; não lhe importava o rcsto. Mas o medo do gônio do maridotolhia suas iniciativas. Sua alma c scu corpo fcrviam de lascívia e em sua menteborbulhavam idéias e planos mirabolantes. Até quc um dia, vendo o padreAmandio passar, admirou-lhc as fciçõcs, imprcssionou-a sua mocidade e viuali, dc rcpcnte, a solução para os scus problcmas. O padre, sim, o padre! Jo-vcm, simpático e ccrtamcnte a sua discrição c rcspcitabilidadc nunca poderiamdcspertar suspcitas dc ninguóm; scu pccado seria mais doce c scguro à sombrado segredo quc o padrc, crn scu próprio bcncfício, iria manl.cr.

E pôs o plano cm ação. Fcz-sc dcvota. Não faltava a uma missa, a uma la'daínha, a uma bcnção. Era semprc a prirncira a ocupar o banco da frcntc, bempróximo ao altar, c scmpre que acabadas as ccrimônias rcligiosas, aprcssava-sea ir a Sacristia beijar picdosamcntc a mão clo padrc. Assim comcçou a tecer ateia para apanhar sua prcsa.

Um dia o Capitão Viccnte aprcstou-se para uma viagcm dcmorada e avisou aesposa quc estaria auscnte por alguns dias Walda cxultou. Era chegado o mo-mcnto. No dia seguintc ao da partida do Capitão Vicente, Sinhá tJ/alda adoe-ceu e prostou-sc de cama, a scntir-sc muito mal.

Foi um alvoroço na casa; o Capitão não cstava c agora, o que lazer? A docn-tc, com voz fraca, pcdc que lhc scja chamado o vigário para confcssá-la c tra-zcr-lhe o Santo Viático. Prontamcntc o vigário accdc ao pedido e à tardc na pe-quena Vila soa o sino da Igrcja, convocando as irmandades para acompanhar opadre, que lcvaria o Santíssimo à doentc. E no silêncio da tarde segue a peque-na mas solcne procissão, rumo à casa do Capitão Viccnte.

O padre Amandio cnLra no quarl.o ondc na cama, entre lcncóis, estava adoente; algumas dcvotas o acompanham ató o quarto para as oraçõcs iniciais.Dcpois o padrc pcde quc se rctirem, para ouvir a confissão final da docnte. Eficam os dois sós: Sinhá Walda e Padre Amandio. Enl.ão, todo o cenário pron-to, Sinhá Walcla dá o botc... ïaz a proposta ao padrc. O padre ouve estarrccidoe escandalizado e dc imcdiato recusa a proposta, fazcndo ver a Sinhá V/aldaque aquilo era um sacrilógio, lazcr vir o sanlíssimo e usar da ocasião para fazer-lhe propostas indccorosas.

O Capitão Vicente tinha rctornaclo às prcssas; um cmissário tinha ido ao scuenconl.ro. Quando elc chcga, Walda, quc ainda não tinha desistido dc suas in-tençõcs, pcdc ao marido quc chame o padrc Amandio para vir receitar-lhcumas homcopatias, ao quc o marido prontamcnte accdeu. No entanto, o padrcAmandio recusa-se com muita hurnildaclc a ir até a casa do Capitão Viccntc ccmprcsta-lhe o livro clc homcopatias para quc lá pudcssem mclhor cscolhcr o

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30 O crime do padre

remédio para o mal de Sinhá Walda. Ao rcccber do marido a notícia da recusado padre em visitá-la, explodc o dcspcito dentro de V/alda; sem mais pensar eladiz ao marido que sabe a razáo da recusa do padre: ele estava com a consciênciapesada, envergonhado e amedrontado pois, na ausôncia do marido, tentara se-duzí-la. Repete-se a história da mulher dc Putfar e José do Egito.

A fúria, o ódio, a paixão tomam conta do Capitão Vicente e só uma idéiafixa-se em seu cérebro: lavar cm sangue sua honra ultrajada e a dignidade da es-posa. O padre Amandio tinha que morrer. O Capitão Vicente chama seu es-cravo de confiança, Andró Avclino dos Santos, e lhc ordena: "Você vai matar opadre Amandio! Ele ofendcu Sinhá \ü/alda, sua patroa, e tem de morrer. Eu tedou Cinqücnta mil réis c tua carta dc al[orria."

O dinheiro e a promcssa dc libcrdadc conquistaram imediatamentc o ncgropara a causa do patrão. Libcrdade c dinhciro, quc imporl,a se para isso tinha dematar o padre. Ainda mais que estc padrc cantõu a Sinhá, minha patroa. À noi-te, protegido pcla escuridão, o negro André Avclino vai à casa do padre paraexecutar a scntença, mas nada pôde fazer. A casa ant.iga, de fortes portas e ja-nelas, guarnecidas de poderosas t,rancas e fechaduras gigantescas, resistem àsinvestidas do negro. De manhã, o Capitão Vlcente fica fulo, louco da vida pelofrustrado da ação. E ordena ao nogro quc de qualquer maneira exccute a sen-tcnça.

André Avelino aguarda uma oportunidade. A casa do padre ficava umpouco distante da lgrcja. A poucos met.ros da casa iniciava-se a mata e era cos-tume do padre Amandio ao entardccer, dar pequenas caminhadas pela mataatrás de sua casa, pois gostava do contato com a naturcza. Nesse dia estcndeuum pouco mais o passeio ató o alto dc um pequena clcvação que chamavamScrra do Panaicá.

Dc rcpcntc, surgc-lhc à frentc a figura do ncgro André Avclino e scm mal-dar, o padre Amandio o saúda c tenl.a cntabular convcrsa com ele:

- O quc fazes aqui, mcu filho? Estás caçando?

- Não, responde dc pronto o escravo Andró Avclino. Eu vim te matar, deordem do meu amo, o Capitão Vicente.

- Mas por quê? Eu não lhc fiz nada.

- O Senhor mexeu com Sinhá Walda, por isso vai morrer.

- Mas eu não fiz isso, diz o padrc, amcdrontado. E olha, mcu filho, eu souum padre, é um pecado muito grande.

- Eu não tcnho nada com isso, o patrão mandou mat,ar e eu vou matar.

O padre pediu-lhe ao mcnos quc o deixasseÍe.zaÍ antes de morrcr, e ajoe-lhou-sc. Rezou e ao mcsmo lempo, corno hornem que cra, tentou um meio ex-

O Jari primitivo

Cruz que marca o local do crime do Padre Arnandio de Oliveira Panloia, hoie no cenlro da cidadcde Almeirim.

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tremo para se salvar. Dc repcnte lcvantou-sc e dcu lrcmcndo grito de socorro.O negro imediatamentc dcu-lhc um Liro c ao vê-lo caído, crivou-o de facadas.Em seguida, calçou as botas do padre, carrcgou scu corpo e o at.irou no rio,num lugar chamado Fortalcza.

Aí as coisas aconteceram rápido. A ausência do padre na sua casa foi notada.Buscas foram dadas. Por fim concluiu-sc que o padre tinha sido morto. Uma cs-crava do Capitão José Martins dissc tcr ouvido um tiro e um grito, quando àtarde, colhia lenha no mato. Um menino afirmava t.cr visto André Avelino sain-do da mata com a espingarda ao ombro c aLé falara com ele, pergunt.ando setinha ouvido um t.iro, ao que o ncgro rcspondcra que ele at.irara num papagaio,mas errara. Mas o ccrco apcrtou-sc. André c scu patrão, o Capitão Vicente, sãochamados a juízo. Negam tudo. Não há provas. Nada pode ser feito.

Mais Larde, por insistôncia clc pcssoas do povoado, o inquérito é reaberto. Eem Gurupá, pressionados pclo rcmorso, o Capitão Vicente Manoel Machado escu ex-escravo Andró Avclino dos Santos confessam t.udo e se dizem arrependi-dos. Em 8 de março de 1863, na cidade dc Gurupá, julgados pclo Tribunal doJúri, são condcnados: O Capitão Viccnte é condenado a 23 anos e 4 meses deprisão, com trabalhos forçados. Andró Avclino ó condcnado à morte, mas temsua pena comutada por D. Pedro II, cm prisão pcrpótua, a scr cumprida na ilhadc Fcrnando de Noronha. Quanto à infcliz V/alda, desprezada e humilhada,mudou-sc para Porto dc Mó2, ondc morreu pobrc c abandonada. Romarias sefízeram ao local do assassinato, na Scrra Do Panaicá.

Em I dc julho de 19 12, D.foi a Almcirim e convidou ocrimc. Lá uma idosa mulherdizem não nasce grama ncmnizar o triste cvent.o.

O mais interessante dc toda cssa história, conta a tradição, é quc o padreAmandio teria dito ao ncgro Andró Avclino, ant.os de morrcr, conformc relataeste último no tribunal, as seguintcs palavras:

- Por cste crime iníquo contra o ministro de Dcus, dissera o padre Aman-dio, durante CEM ANOS, Almcirim não tcrá vigário; a cidade não progrcdirá ,a doença perseguirá scus moradores c a pestc dizimará os rebanhos.

O crime do padre

PARTEtrA fase José Júlio

Armando Bahlrnan, Bispo Prclado dc Santarém,povo do lugar a Íazer uma romaria até o local domostrou o local exal.o da tragédia, onde segundo

nada c ali sc crgucu uma cruz de acapú, para pere-

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A fase losé lúlio

José Julio deAndmdeara quem não conhece a história de José Júlio de Andrade, ele foi tal-vezo maior latifundiário do mundo. Suas terras no Estado do Pará, nosMunicípios de Almeirim, Porto de Móz e Território Federal do Ama-pá, beiravam três milhões de hectares.

José Júlio era natural da cidade de Sobral, no Ceará, de onde veio aindamoço para o Pará, estabelecendo-se primciramente na cidade de Benevides, si-tuada às margens da estrada de ferro Belém-Bragança. Nessa cidade, José Júliotrabalhou na agricultura com seu tio que já residia no local, chamado JoãoPinto de Andrade. Nesta época José Júlio tinha entre desessete e dezoito anos.

Sua permanência em Benevides foi curta. Em 1882 viajou para aârea do RioJari, fixando residência primeiramente na localidade de Limão, situada àmargem direita no baixo curso do rio, próxima à foz com o Amazonas. Na loca-lidade de Limão, José Júlio de Andrade demorou pouco tempo, tendo se trans-ferido para o local denominado Padaria, situado no médio curso do Rio Jaripela margem esquerda deste. Foi ncste local que realmente José Júlio teve con-tato direto com a potcncialidade da rcgião. Trabalhou como seringueiro e cole-tor de castanha, vendendo sua produção para o comércio ambulante da época,o qual era feito na base do transporte a vcla ou mesmo a remo.

Para um homem que tinha apenas o curso primário, amealhar dentro dequinze ou vinte anos a fortuna em terras que constitui a Jari, é preciso creditar-lhe algum mérito, mesmo se tendo conhecimento que em alguns casos a manei-ra tenha sido extravagante. Na localidade denontinadaPrazeres, à margem es-querda do Rio Jari, José Júlio comprou aârea pagando ao seu legítimo doqo,Raimundo (ou Gageiro como era conhecido) com linha de pescar, tecidos c ou-tras mercadorias. Gageiro permaneceu na ârca,já com o consentimento do seunovo dono.

Para sc ter uma idóia de como José Júlio monopolizou a maioria das tcrras doMunicípio de Almeirim, às margens do Rio Arnazonas, a própria scde do Muni-cípio ficou com apenas mil metros dc cxtcnsão entrc suas áreas dcnominadasJaburú e Cuieiras.

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36 José Júlio de Andrade

José Júlio conhecia suas terras nos mínimos detalhes. Já com idade avança-da, sempre perguntava aos seus capatazes detalhes de algum lugar que conhe-cera quando moço, como por exemplo: Se ainda existia um taperebazeiro gran-de na boca do igarapé Angelim, do qual tinha tomado muito vinho feito porChiquinha Rodrigues, um dos seus casos amorosos quando iniciara sua vidaempresarial na Jari.

úúoJosé Júlio casou-se com Dona Laura, que era de Almeirim, e foram morar na

localidade de Aquiqui, em frente à cidade do mesmo nome. Ao contrário doque já foi escrito, ou seja, que dona Laura era filha de pessoas abastadas daregião e isto em parte ter contribuído para a fortuna de José Júlio, é de todofalso. Na realidade o sogro de José Júlio, cujo apelido era Caiarara, eÍa um ci-dadão comum de Almeirim. Não teve port,anto nenhuma influência com o seudinheiro na vitoriosa ascensão emprcsarial de José Júlio. Com Dona Laura, sualegítima esposa, que era mais velha que ele, José Júlio não teve filhos e nemcom sua companheiraZizinha, filha de um de seus servidores, de nome Veri-diano.

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José Júlio regeu sua empresa com maestria da Vila de Arumanduba, situadaà margem esquerda do Rio Amazonas, construída sobre palafitas, devido a âreaser de várzea, portanto inundável no tcmpo de cheia. Na realidade, ele vinhaapenas reger o início e o término das temporadas, pois a maior parte do ano via-java pelo mundo, ou estava em Belóm ou no Rio de Janeiro, onde tinha resi-dência. Vem então a pergunta: Como um negócio poderia obter bons resulta-dos com a ausência do dono, levando-se ainda em conta a imensa área territo-rial da Empresa?

A resposta é que José Júlio conhecia o potencial de seus castanhais, dos se-ringais e de todos os recursos naturais existentes em suas lerras, além de contarcom a lealdade e honestidade de seus colaboradores, sendo que alguns exce-diam-se em zelo, gerando situações que muito denegriram a sua imagem; umexemplo foi o seu cunhado Duca Neno, assunto que abordaremos em capítuloespecífico.

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Todos que conheceram José Júlio são unânimes cm descrevê-lo como pessoafina, educada, que não falava palavrões, despido totalmente de vaidade, dairdoa mão ao seu empregado mais humilde. Quando estava em Arumanduba ouviajando cm seus navios, em visita às suas propriedades, sentava à mesa de re-

A fase losé lúlio

feiçõcs juntamente com todos os seus colaboradores. Podia estar com qualquervisitante, fosse ele o mais importante e ilustre; se chegasse um de seus capatazesdo mais remoto local do seu império, pedia licença ao visitante e atendia seu co-laborador, dizendo em voz rouca (imitada pelas pessoas que entrevistei): "Meufuncionário não pode perder tempo, ele deve estar precisando de alguma coisa,por isso quer falar comigo.'

Em Belém, na sua residência de três andares na rua São Jerônimo (atual Go-vernador José Malcher), esquina com a Joaquim Nabuco, recebia todos os seusfuncionários e familiares que fossem a Belém, e lá oferecia-lhes todo o apoio'necessário. Quando falecia um funcionário que tivesse família, José Júlio ampa-rava a viúva e os filhos, não deixando que lhes faltasse nada. Dava estudo,roupa e tudo que fosse necessário até que os filhos de sexo masculino ficassemhomens, quando começavam a trabalhar na Empresa. As moças e Íapazes quequeriam continuar os estudos, José Júlio mandava para os colégios em Santa-ré-rn e Monte Alegre, sempre em regime de internato.

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José Júlio também criou muitas crianças, sendo que até um casal de criançasíndias da Tribo dos Caipós, da região entre o Rio Xingú e o Tapajós, foi criadoe educado por ele. Todos os entrevistados falam de sua paixão por crianças. Aovir a Arumanduba mandava abrir caixas de bombons e jogar no salão da casapara as crianças pegarem. Nesse momento "Boxe", o seu cachorro de estima-ção, misturava-se com as crianças e José Júlio ria divertidamente da confusão.As crianças também gostavam muito dele; faziam fila para disputar a vaga deembalá-lo na rede. Os índios, ao terem notícia de sua chegada à Arumanduba,vinham pedir presentes e o chamavam de "Papai Grande".

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José Júlio na realidade era muito rico e certã vez confessou a pessoa idôneapor mim entrevistada, ter possuído muito dinheiro, tendo perdido com jogos emulheres. Conheceu todos os continentes, falava regularmente vários idiomas edizia jâ ter tomado banho quatro vezes no Rio Jordão. Na Alemanha certa veztrouxeram-lhe como sobremesa castanha do Pará. José Júlio recusou polida-mente e o garçon lhe teria dito: "Isto é castanha do Pará, é uma sobremesaca-ríssima". Ao que José Júlio retrucou: "Eu sou o Rei da Castanha do Pará, cas-tanha lá eu dou com os pés." Na realidade a castanha graúda, após seleção, eraexportada para a Alemanha com a marca conhecida atê hoje na Europa como"Castanho do Jari". As castanhas miúdas eraïn vendidas em Belém.

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38 José Júlio de Andrade

Falando ainda de sua riqueza: entrevistando uma moça de sua confiança,que fora empregada em sua residência no Rio de Janeiro, soube haver uma sálaem sua residência de três andares na Rua Joaquim Murtinho, que mensalmenteera aberta paÍa limpeza. Nela existia um armário com aproximãdamente quatrometros de largura por três metros de altura, todo subdividido, onde eram guar-dadas patacas de ouro e pequenas barras, as quais eram limpas e embrultradasnovamente em papel próprio. José Júlio possuía também aproximadamentetrezentas casas, entre Belém e Rio de Janeiro. Como sempre gostou de jogarbaralho suas residências, tanto em Belém como no Rio de ianeiro, tinham sãlade jogos.

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Embora fosse católico, a superstição de José Júlio era notada por todos,principalmente com tudo que se relacionasse à água. Certa vez, em uma de suasfazendas no Aquiquí, morreram 98 reses afogadas em uma passagem pantano-sa. Chico Orácio, seu capataz, imediatamente reuniu todoJos empregados daredondeza e conseguiu aproveitar sessenta reses: salgou a carne, deiúu secarao sol e trouxe o produto para Arumanduba, a fim de ser aproveitado nas linhasde frente de trabalho. José Júlio não se aborreceu. Chamou Sombreira, seu ca-pataz em Arumanduba, e mandou jogar a carne toda n'água, dizendo: ..O que éda água, a água leva". Atitude semelhante tomava quanão uma de suas em-bat-cações afundava. lot exemplo, a Lancha de ferro fanary Nunes, que foi para ofundo do rio Arraiolos e mesmo com parte do toldo foia d'água,-só foi iesga-tada na época dos portugueses.

O povo falava,também que José Júlio tinha um fero mumificado e que rim-pava o mesmo todas as vezes que tinha um negócio importante a fazer. Se o fetochorasse ele fazia o negócio...

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Como político chegou a Senador. Nunca perdeu eleições em Almeirim, daíter angariado seu maior inimigo, o General Barata. Certa vez Barata mandouum fiscal à Arumanduba, o qual multou José Júlio em l0 mil contos de réis.Jgsé Júlio pagou a importância e deu mais l0 mil contos ao fiscal, dizendo:"Leve mais estes l0 mil para o Barata acender o charuto dele."

José Júlio era muito amigo do jornalista Paulo Maranhão, dono do jornalFolha do Norte, inimigo ferrenho do General Barata. Noutra ocasião, ejtandona Argentina, logo após uma de suas dasavenças com o General Barata, escre-

A fase losé lúlio 39

losé Iúlio dc Andrade em Lisboa, Portugal, provavelmenle no ano de /,930.

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40 José Júlio de Andrade

veu a um amigo dizendo: "Estou aqui comendo banana e dando banana para osbananas daí... " -

DDrJPróximo ao fim da vida e tarnbém da venda da Jari, vinha muito pouco àArumanduba e quando o fazia vinha em Catalina fretado, amerissando no Rio

Amazonas. Aí desfrutava do que gostava, como tomar vinho de açaí, comer ge-léia de mocotó

9_ slb.ore-ar

_os peiies pescados por Joaquim Souto, hoje .orï5

anos de idade. No Rio de Janeiro, onde residià, tinha ì.rpi" ã ruu úsposiçaópara embalá-lo na rede, já que não dormia em cama, dez moças de Arumandu-ba, que se revezavam noite e dia. Como não tinha filÍros, ruu hãrunça ficou puiuuma sobrinha de sua esposa, de nome Maria Laura.

José Júlio retirou-se.da Região dos MunicÍpios de Almeirim,Mazagã,o ePorto de Móz em 1948, já tendõ vendido.sua peõuária da Região do Rio Ãqui-quí para Michel de Melo e Silva, e por último à Jari pu.u urn gïpo de portugïe-ses. José Júlio morreu na ilha da Madeira, em Portugal, no uró de 1p.5), *uï roienterrado no Rio de Janeiro.

A,hr" Iosé Iúlio

Avila deArumandubaContam que certa vez José Júlio ia chegando à noite na cidade do Rio de Ja-

neiro, de navio, quando um de seus companheiros de viagem lhe feza seguintepergunta:

- Coronel, o senhor já viu coisa mais bonita?

José Júlio rcspondeu: - Já vi sim.

-Eoquefoi?- Arumanduba.

A Vila de Arumanduba, como já mencionamos, está situada abaixo da ci-dade de Almeirim, à margem esquerda do Rio Amazonas, em terrenos de alu-vião, sujeitos a enchentes anuais. Em função disso, a vila foi construída sobrepalafitas. O nome Arumanduba veio da existência no local de grande quanti-dade de ervas de nome arumã, (Ischnosiphon ovatus) pcrtencente à família dasMarantaceas.

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Residência de José Julio de Andrade em Arumanduba.

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A primeira residência de José Júlio em Arumanduba chamava-se ChaléGrande. Depois foi construída outra residência que até hoje mantém-se impo-nente ao tempo, chamada Casa Branca. Esta construção é toda em madeira deLei, coberta por telhas francesas, com janelas e portas de três metros de altura eassoalhada com acapú e pau amarelo.

Arumanduba no seu apogeu, entre 1920 e 1930, possuía quatrocentas casas.Nesta época a vila já possuíaluz elétrica, com estação geradora a lenha, oficinamecânica completa, com curso de fundição, eletricidade, carpintaria e marce-naria, sendo que o equipamento era todo importado da Alemanha e dirigidotambém por um alemão, chamado Dr. Guilherme. Arumanduba também pos-suía farmacêutico formado, de nome João Carvalho; grupo escolar dirigido pelap_rofessora Florzinha, e até escola de músic a, a caÍgo do Maestro HipóÍito.Nesta época também já existia telefone na vila, ligando a Casa Branca, õ escri-tório, a sede dos estivadores e a oficina mecânica.

Como lazer, além das festas dançantes na sede dos estivadores e em residên-cias familiares, existiam três equipes de futebol: escritório, oficina e estiva.

Nesta época a própria cidade de Almeirim não dispunha de certas facilidadesque Arumanduba já possuía, como por exemplo a comunicação. Arumandubapossuía telégrafo que falava com Belém e outros centros, sendo necessário queAlmeirim recorresse à Arumanduba toda vez que necessitasse comunicar-secom Belém. Em Arumandu.ba eram abatidas diariamente quatro reses paraserem distribuídas entre os empregados e para suprir o restaurante, que atendiafuncionários que vinham à Arumanduba a scrviço.

Todos são unânimes em dizer que José Júlio detestava a miséria e gente pre-guiçosa, por isso em Arumanduba não existia gente desocupada.

No Natal e final do ano, todas as famílias recebiam de graça presentes e pro-dutos natalinos vindos de Belém. No dia de ano novo era oferetido um grandechurrasco a todos, encerrando-se o ano com um grande baile na sede dos éstiva-dores, onde todos participavam.

Coino Arumanduba era a sede da empresa, o gerente, o guarda livros, os es-criturários e balconistas residiam neste local. A produção de castanha, borrachae demais produtos era armazenada em Arumanduba e daí gmbarcada para ou-[ros centros, como Belém e mesmo para a Europa.

A Vila de Arumanduba A fase Iosé Iúlio

ComoJoseJúIioconsolidou seu império

Já narramos o caso da posse denominadaPrazeres, que pertencia ao sujeitode nome Raimundo ou Gageiro, como era conhecido, comprada por José Júlioa ele com linha de pesca, tecidos e outras mercadorias. Porém a maior parte dasáreas foram adquiridas do Governo do Estado do Parâ ou do Município de Al-meirim a partir do ano de 1899, ou seja, dezessete anos após José Júlio ter che-gado à área do Jari.

Embora tenhamos considerado a fase José Júlio iniciando-se em 1920, anoem que atingiu seu apogeu, poderemos ver a seguir que ele já havia adquiridoterrâs bem antes deste ano. As primeiras terras foram adquiridas por intermé-dio do Conselho Municipal da Vila de Almeirim, conforme título primário,concedido em outubro de 1899, assinado pelo Intendente do Conselho Munici-pal Francisco Xavier Ribeiro. Em 1900 José Júlio adquiriu terras sob a forma detítulos definitivos, através da Inspetoria de Terras e Colonizaçáo, títulos estesassinados pelo Governador do Estado do Pará, José Paes de Carvalho. Eml90l foram adquiridos títulos de posse assinados pelo Governador do Estado,Augusto Montenegro. Também adquiriu terras por escrituras públicas, comopor exemplo no ano de 1906, lavradas pelo Tabelião Vicente Rolim Moraes, ouainda por títulos de legitimação e propriedade expedidos em maio de 1937,1938 e 1939, assinados pelo Interventor Federal José da Gama Malcher e Secre-tário Geral Deodoro Mendonça.

Existiam também posses adquiridas por compra e venda, conforme escrituralavrada em 1943 pelo Tabelião José Agostinho Guerra. Algumas posses foramadquiridas no Governo do Estado do Pará, por intermédio da Secretaria deObras Públicas "Terras e Viação", conforme títulos de legitimação de proprie-dades, alguns concedidos em junho e julho de 19l8 e expedidos em janeiro de1919, assinados pelo então Governador do Estado Lauro Sodré e tendo comoSecretário Geral Eládio Lima. Em 1921 José Júlio adquiriu mais terras doEstado e os títulos foram assinados pelo Governador Souza Castro, tendo comoSecretário Geral Barroso Rabelo.

A área Santa Maria, ou Arumanduba, qué foi a sede de José Júlio, foi adqui-rida por escritura pública em l0 de abril de 1906, lavrada pelo Tabelião VicenteRolim de Moraes, pelo valor de l0 contos de réis (Rs: l0:000$000,00). Aru-manduba pertencia à Sociedade Mercantil Andrade Queiroz e Companhia e foiregistrada no Cartório de Registro de Imóveis de Monte Alegre em 81311948,pelo Tabelião Acylino D'Almeida Lins.

Em síntese, José Júlio conseguiu amealhar seu império em 49 anos, ou seja:de 1899 a 1948, quando vendeu sua Empresa para os portugueses.

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O CanitãoCrispim dèAlmeida

Francisco Crispim de Almeida, o "Capitão Crispim", era também cearense,mas chegou ao Jari tendo passado primeiramente na região das Ilhas do Municí-pio de Breves. Inicialmente trabalhou como empregado de José Júlio, chefian-do a Filial de Padaria, na margem esquerda do Rio Jari, isto no ano de 1925.Com o passar dos anos tornou-se sócio de José Júlio, dominando toda a áreados Rios Jari e Cajari.

Dizem que foi José Júlio quem trouxe o "Capitão Crispim" para a Jari, de-vido ao mesmo ter cometido um crime na região das Ilhas. Certa vez Crispimameaçou ir embora e José Júlio ao saber teria dito: "O Crispim não vai embora,ele está nas minhas mãos..."

Crispim era semi-analfabeto e detinha a patente de Capitão da Guarda Na-cional, comprada pela importância de 400 mil réis. Dizcm que Crispim não gos-tava que o chamassem de Capitão, dizendo que Capitão era pinico.

Nesta época, na região do Cajari existiam outras pessoas com patentes deguarda nacional; eram elas: Major lJascar, Tenent.e Cipriano, Tenent.e Estácioe Alferes Esequiel

oúoVoltando para falar do Capitão Crispiffi, o mesmo era muito econômico; até

um botão que visse,no chão, juntava e perguntava para os que estivessem porperto, "quem quer"? Se ninguém quisesse dizia: "E por isso que vocês não têmnada", guardando em seguida o objeto. Dizem que as calças de Crispim erambem justas, ele dizia que calça larga era desperdício de pano.

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Crispim possuía sua guarda pessoal, comandada por Edson e tendo comomembros Hermenegildo e Maximiano Medonho. Certà vez, um sujeito denome Manoel Cândido, que já havia sido guarda pessoal de Crispim, foi serfiscal de seringueiros na localidade de Saudade, na região de Agua Branca. Láhavia uma moça de nome Luzia que também cortava seringa, e que ManoelCândido tentou seduzir, valendo-se de sua posição de fiscal . Luzia entãomandou um recado para Crispim, contando o que estava acontecendo. Crispimtomou conhecimento do caso, mas não tomou nenhuma providência. Passadoum tempo, Luzia mandou outro recado a Crispim, falando do mesmo proble-ma. Crispim então chamou sua guarda e ordenou que num sábado, quando ostrabalhadores descessem à Vila de Agua Branca para passar o fim de semana,dessem uns bolos em Manoel Cândido. No sábado, lá pelas quatro horas da tar

A fase José ltilio

de, Manoet Cândido chegou montado em um burro. Crispim havia ordenado a

Edson, Chefe da Guarda, que desse dezoito bolos em Manoel Cândido compalmatória feita de maçaranduba. Quando já havia dado oito bolos, José Luiz,(ue era o capataz da ârea e era contra este tipo tle tratamento, mandou suspen-der a sentença.

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De outra feita, um rapaz de Santarém que era maquinista da Lancha Duca,hoje lanary Àfunes, (sendo o primeiro nome devido a Duca Neno, cunhado deJosé Júlio e o segundo em homenagem ao político do Amapá) envolveu-se comuma mulher casada na localidade de Ariramba, no Rio Cajari. O marido, en-ciumado, participou a Crispim a ocorrôncia e pediu providências. Crispim auto-rizou sua guarda a dar uns bolos no rapaz. O castigo foi tão forte que para orapaz se alimentar foi preciso que lhe desscm o alimento na boca.

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Em 1926, Antônio Rufino era chefe de comboio de burros em Água Branca etinha um caso amoroso com uma mulher quc tinha uma jovem filha chamadaInês, que era xodó dc Crispim. Uma madrugada, Antônio, após ter passado a

noite com a mãe de Inôs, ao passar pela rcde desta fez-lhe uns carinhos, semperceber que a vclha havia vist.o tudo, ficando enciumada. Pela manhã bemcedo Crispim jâ era sabedor do cpisódio.

Crispim chamou João Batista, que acumulava os cargos de Agente de Políciae encarregado do dcpósito de mcrcadoria, e ordenou que desse uma surra emAntônio Rufino. Pela parte da tarde, Antônio Rufino retornava ao povoado deÁgua Branca, de onde havia saído de madrugada, quando foi convidado para iraté o depósito falar com João Batista. Scm maldar nada, Antônio Rufino apre-sentou-se a João Batista. Lá, já, estavam os três seguranças de Crispim, prontospara a execução da sentcnça. João Batista pediu emprcstado o terçado de An-tônio Rufino para evitar qualquer reação, scndo que foi atendido sem descon-fiar do que lhe iria acontecor. Aí os scguranças entraram cm ação. Usando osterçados, deram uma surra em Antônio Rufino, deixando-o todo cortado dasrimpadas.

Após estcs surramenl.os, Crispirn costumava mandar chamar os surradospara dar consclhos. Poróm quando mandou chamar Antônio Rufino, estc jáhavia atravcssado o Rio Cajari para a margcm esqucrda, embrenhando-sc namata. Crispim ao saber da notícia disse: "O Antônio vai fugir para o Maracá".Imediatamgnte pegou seu riflc "winchcster", chamou os cachorros, cmbarcounuma canoa e atravcssou o Rio Cajari, a[rás de Antônio Rufino. Os cachorrospegaram a batida de Antônio imecliatamcnl.c c comcçaram a latir. Antônio,

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O Capitão Crispim de Almeida

pre.ssentindo que estava sendo seguido, procurou um lugar para esconder-se.Achando uma grande árvore de cofa densa, tombada sobË o ãaminho, rõi ugã-char-se no final da mesma. Um doi cachorros chegou a ii ad onoe estava An,6-nio, mas o reconheceu e não deu alarme. Como 1íestã"a ãnoit"rcndo, Crispimvoltou deste local.

No outro dia bem cedo Crispim despachou dois homens armados para inter-ceptar a fuga de.Antônio para ó Maracã. Mas os dois voltaram à mrdinha com aceÍJeza de que Antônio Rufino tinha ido mesmo para o Maracá. Lá existia umsujeito de nome vicente Freire, do Rio Grande do Norte, q;; dominava a re-gião do Rio Maracá,. Lá podia c-hegar. gente fugida oo caiãri; dr ourras purt.r,que Vicente Freire dava proteção. -CriJpim resfeitava Viõente Freire.

Crispim chamou ent'ão seu filho de criação Ivan Alves e seu chefe de guarda,Pdlgn' para levar uma carta a vicentc Fieire, pedindo o ,.igute de AntônioRufino. Vicente Freire leu a carta de Crispim'e em seguida cthamou AntônioRufino, dizendo-lhe: "Estes homens vieram rhe buscai,;ãrãq;er ir?,, AntônioRufino- respondeu que não. vicente Freire disse então: "Diga u'ôrirpi,,'ï;;';;fugir alguém daqui do Maracá, eu não mando buscar e os qüe vierem oe râìuiãcá, daqui também não voltam pall.lá. ocrispim manda do Igarapé cumarupra lâ, eu mando do Cumaru pra cá." E assim fiàou rõi;id; oiuro de AnrônioRufino.

ftorJvicente Freire explorava castanha, borracha e outros

rico também. Mas adocccu de beribéri e voltòu ao Riodendo seus negócios do Rio Maracá.

- Dizem que a regìão do Cajari tinha sido livre, mas devido a constantesdos trabalhadores da ârea do Jari para r,ir, José rúlio .orprãu ã caiari.

produtos nat.ivos, e eraGrande do Norte, ven-

a fugir para o Maracá, mas VicenteJúlio.

fugas

Do Cajari os trabalhadorcs passaramFreire não quis vcnder sua árca para Josó

A fase losé lúlio

DucaNenoManoel Neno, mais conhecido como Duca Neno, também era cearense e

cunhado de José Júlio de Andrade. Dizem que toda má fama de José Júlio de-ve-se à maneira como Duca Neno tratava os empregados.

Por outro lado, dizem também que Duca Neno foi um grande administrador,não desperdiçando nada que pudesse ser aproveitado. Com ele tudo era pesadoe medido. Quando mandava fazer roupa para empregado, a fazend,a era todapesada, sendo devolvidos pela costureira todos os retalhos, os quais eram utili-zados para fazer fechos para matar cabas nas maÍombas(*).

Contam que certa vcz, o comandante de uma das embarcações pediu paviopara farol a querosene, que era usado para iluminação nas embarcações. DucaNeno pediu a nota anterior e disse ao comandante: "O pavio que você pediu nanota anterior dava para l5 dias. Ou você está acendendo os faróis muito cedo,ou apagando muito [arde."

A mãe de Duca Neno, sogra de José Júlio, morava em Almeirim e o ranchoera levado quinzenalmente. Ela então, avisou ao capataz da fazenda Aquiquí,em frente a Almeirim, que gostaria de fazer sua quinzena naquela localidade. Ocapataz, querendo ser amável com a mãe de Duca Neno, mandou buscá-la emAlmeirim, matou uma rês, deu toda a assistência necessária e mandou deixá-lade volta. Duca Neno, ao saber do fato, agradeceu ao seu capataz mas disse-lheque aquela lancha não era propriedade dele e nem de Duca Neno. Era de JoséJúlio e somente para estc poderia fazcr serviços. E acrcscentou que quando pu-desse compraria uma lancha para a mãe delc.

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Duca Neno tinha dois tipos de assinatura que colocava nas notas dos funcio-nários. Uma delas era um círculo onde podia ser atendida a nota na sua totali-dade; a outra era um círculo cortado ao meio, onde somente a metade da notadcvcria scr atendida.

Certa vcz, um emprcgado levou uma not.a de um remo e Duca Neno colocouna nota o círculo cortado ao meio. O caixeiro não entendeu e foi perguntar aDuca se cle não havia sc enganado, devido a nota scr apenas de um remo. Ducarespondcu que atcndcssc a nota conforme ele havia despachado. O caixciroteve que partir uma pá do remo, entregando ao funcionário.

(*) Curral tipo palafita

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(t) fibra de Mungubeira (Bombax munguba).

Duca Neno

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Dizem que Duca Neno não sorria para ninguém e falava estritamente o ne-cessário. Se estivesse fora do escritório e alguém quisesse falar-lhe, teria queacompanhá-lo, pois não parava para conversar com ninguém , daí ter o apelidode "Canela de Ferro." Com este tipo de atitude, Duca Neno angariou muitosinimigos. Por exemplo: "Café Torrado", mulato alto e forte, certa vez o fezparar à força, para escutar o que precisava dizer-lhe. Dizem que esta atitude de"Café Torrado" custou-lhe a vida. Pois na volta de uma festa na cidade de Al-meirim foi morto com uma facada pelas costas, a bordo da lancha Coronel IoséIúlio, sem nunca ter-se sabido o autor do crime. O povo diz que foi Duca Nenoque mandou um sujeito de sua confiança, chamado João Ferreira, executar"Café Torrado".

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Duca Neno levou a fama de ter feito muitas coisas ruins, quando na verdadesua intenção era a Empresa não ter prejuízo e proporcionar ao empregado pos-sibilidades de saldar suas dívidas. Um exemplo disso é o local situado namargem esquerda do Rio Jari, denominado "Paga Dívida". Este local é tidocomo o lugar onde aconteceram os maiores crimes de toda a história da Jari,quando na realidade o nome "Paga Dívida" era devido ao seringal destaáreaser o melhor de toda a Jari, com a densidadc do látex chegando a 50', portantopossibilitando ao funcionário chance de pagar sua dívida. Duca Neno rcservavatambém os castanhais dc perto de Arumanduba, que eram também muito bons,para os que adoeciam no início da safra da castanha, para não passarem deven-do de uma safra para out.ra.

Em Arumanduba ninguém ficava sem trabalhar, a não ser os doentes. Pelamanhã, o primeiro serviço de Duca Neno era percorrer a Vila de Arumandubaacompanhado do enfermeiro, para ver os doentes. Os que precisassem de trata-mento especializado eram encaminhados para Belém na primeira embarcaçãoque saísse de Arumanduba. Os que tinham problemas que impossibilitassem aexecução de suas tarefas rotineiras, eram aproveitados em outros serviços.Certa vez um rapaz havia recebido um golpe de machado no pé, que já estavaquase sarado, mas ainda o impedia de executar o seu serviço de vaqueiro. DucaNeno ordenou que o rapaz fosse tecer corda rJe envira(*) para usar nas fazen-das.

A fase losé Iúlio

oJo

Duca Neno morreu em 1929 de causa relacionada à sua conduta ditatorial,causa esta que abordaremos na próxima matéria, denominada a "Revolta deCesário."

Após a revolta de Cesário, quando foi preso, Duca Neno voltou de Belém"emperriado", como se diz na gíria. Não se alimentava, foi morar na fazendaAquiquí e não mais em Arumanduba, onde reinava. José Júlio ao chegar emArumanduba soube da situação de Duca Neno e o mandou buscar, mas Duca jáestava muito debilitado. Vendo a situação em que se encontrava Duca Neno,José Júlio autorizou que a mesma lancha zarpasse imediatamente paÍa Belém.Mas o comandante disse que não dispunha de lenha para alimentar a caldeira.José Júlio chamou Sombreira e ordenou que embarcasse seis mestres, para irserrando a madeira que tinha chegado da região das Ilhas de Breves e que sedestinava à construção de currais e marombas, para alimentar a caldeira e orde-nou quc colocasse a velocidade na última libra. Mas mesmo assim, Duca Nenornorrôu ao chegar a Belém

O personagem Duca Neno foi provavelmcnte a razãoprincipat de toda a mâfama atribuída à Empresa Jari de Josó Júlio.

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5l50 A fase losé Jtílio

Arevolta de CezanoJosé Cezârio de Medeiros era Riograndense do Norte, tendo chegado ao Jari

em 1928, na condição de aviado. Logo foi trabalhar na filial de Iratapurú no altoJari, como "cortador de seritrgâ", juntamente com doze companh.eiros e suajovem esposa, que diziam ser muito bonita. José Cezário sabia ler e escrevermuito bem e tinha na época 26 anos de idade. Diziam também que ele haviapertencido ao exército.

A causa da revolta é um pouco obscura no que tange ao seu real motivo, mas

sabe-se que foi relacionada a problemas com sua csposa, quando a mesmaadoeceu é precisou ir para Arumanduba, a fim de seguir para Belém para Íazertratamento. Uma das versões do caso é que em Arumanduba, Duca Neno a co-locou em uma casa sem o mínimo conforto, tendo cm baixo do assoalho um chi-queiro de bodes. A outra versão é que Duca Neno simpatizou com ela e como amesma não o quis, passou a massacrâ-la para ver se conseguia seu intento.

Ela então escreveu duas cartas a Cezârio, mas somente a terceira chegou a

seu destino, pois Duca Neno censurou a correspondência. Quando Cezário tcveconhecimento do que cstava ocorrendo com sua csposa, arquitetou a revoltaque passaremos a narrar.

Considerando a maneira como foi conduzida a revolta, sem deixaÍ vazaÍ Ív-mores que a denunciassem e'tendo a adesão dos aviados e trabalhadores das fi-liais de-Cachoeira e lratapurú, concluimos quc Cezário era realmente um sujei-to inteligente e um grande líder, pois o povo abandonou suas casas e criaçõcs e

o seguiu. A revolta em si foi tão bem planejada e sigilosa que a filial de Pacana-rí, abaixo da Cachoeira de Santo Antônio, a uns cinco quilômetros de distância,só teve conhecimcnto da mesma quando seu chefe Capitão Filomeno foi presopor Cezário, isto no dia cm quc o navio chcgou a Cachoeira, a 5 de julho de1928.

Desde o dia 17 dejunho Cezârio comcçou a reunir todo o povo na localicladede Cachoeira de Santo Antônio, à espera do navio que deveria chegar no dia 5

de julho, como aconteceu. De Cachoeira não saía ninguém c os que chegavamtambém ficavam detidos. Até a chegada do navio Cezário ajustou contas, comose diz na gíria, com algumas pessoas poderosas da região, como foi o caso dovelho Monsão, chefe da filial de São João do Iratapurú, que antes da revoltahavia ordenado que dessem uma surra em um rapaz, vindo o mcsmo a falecerna Vila de Santo Antônio da Cachoeira, dcvido ao espancamento. Cezáriomandou prender Monsão e obrigou-o a cavar a sepultura até chegar ao caixão,para em seguida colocar a terra de novo na cova.

Entre adultos e crianças, Cezário arregimcntou aproximadamente oitoccntaspessoas. Ao iniciar a revoltaCezârio prendeu primeiro o chefe da filial de Ca-õhoeira, de nome Loureiro. Em seguida, cspcrou o navio Cidade de Almeirimque quinzenalmente levava rancho às filiais e recebia produtos explorados. O

navio atracou no porto da Cachocira no dia csperado' Cezário então foi a bordo

c prcndeu o Comàndante Josó Américo c lodaa tripulação' Em seguida embar-

cou todo o povo e dcsccram o Rio Jari no rumo ãe Arumanduba' situada no

Rio Amazonas. Durantc a viagem, cada mcmbro da tripulação era vigiado por

pcssoas designadas Por Cezârio'

Ao chcgar próximo a Arumanduba, o navio diminuiu a marcha e apagou

todas as luzes. Cezânoplantou-ie próxímo ao mestre do lavio,de nome Jarara-

ca, fazcndo-lhe a seguint. u*.ãii *Se perd.eÍ a atracação' vai perder a cabe-

ça...,, Jararacaera bom rn.rtra,ìaó t.u.'ptoblema em atracar o Cidade de AI'

mcirimno trapiche de ArumanduUu, pttôisamente a uma hora da madrugada'

Imcdiat.amcnte Cezirio descmbarcou com seus homens e prendeu Duca Neno'

amarrando-o c colocanclo-o no pórao do navio. Em scguida iortou os fios do te-

iógirf" fara cuitar comunicaçãô com Belóm ou outro local'

Aí os rcvoltosos quiscram Saqucar os {cpósitos dc mercadorias' mas José

Júlio chcgou ná-tot.nto c dissô: "Sci quc aqui tcm mu^ito cearcnse' mas sci

tambóm quc aqui não tcm ladrão." Dito i,to, o pessoal afasto,u-se c José Júlio

autoriz.ou quc tirasscm o qu. forr. prcciro pu'à a viagcm ató Bclém' Ccz'drio

cntão rcmovcu 0 povo para n *uio Cidadc dc Alcnquc" maior quc o Cidade

;ffi-ï'ff;:*}ffi,o da cachoeiro, onffillià"à à yu;"t do mesmo nome. Neste local teve

;nii;i a Revolta de Cezário em 1928'

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de Almeirim, e zaÍpaÍam para Belém, Ievando Duca Neno, o qual seria entre-gue às autoridades. Nesta época, o governador do Pará era Dionízio Bentes.

Após a saída dos revoltosos de Arumanduba, o telégrafo foi consertado etransmitida a notícia para Belém. Uma corveta da Marinha interceptou o Ci-dade de Alenquer jâ próximo a Belém. Escoltado pela Corveta, o Cidade deAlenquer atracou no porto de Belém, onde os revoltosos foram todos alojar-senos quartéis e Duca Neno foi solto, pois José Júlio já havia providenciado sua li-bertação.

Esl.a revolta foi sem dúvida o fato mais depreciativo de toda a história da Jarie do próprio José Júlio de Andrade. Porém o interessante é que com poucas ex-ceções, como Cezârio, os revoltosos voltaram para a Jari e foram recebidos porJosé Júlio. Luiza Gama Tavares, na época com dozc anos, estava cntrc os revol-tosos, juntamente com seus pais e irmãos. Dcpois de chegarem a Belém forammorar em Peixc-boi, mas nest.e local scu pai, Otávio Augusto da Gama, não en-controu serviço. Voltou então à Jari, onde foi recebido sem ressent.imentos.

Ao iniciar a revolta, Cezârio mandou prcnder um cidadão de nome JoãoJosé da Silva, também do Rio Grande do Norte, que vivia no Itacará, acima daCachoeira de Santo Antônio. Mas Cezârio não levou João José entre os revol-fosos, talvez temendo uma reação, pois João José era muito valente, como ve-remos no próximo capítulo. Foi João José que, após a saída dos revoltosos deSanto Antônio da Cachoeira, subiu o Jari e trouxc todas as criações deixadaspelos revoltosos.

A revolta de Cezârio A fase losé Júlio

Oshomensvalentes da época

Além do pessoal da própria região do município de Almeirim, José Júlio re-crutava trabãlhadores do Nordeste, principalemte nos estados do ceará, Paraí-ba e Rio Grande do Norte. No meio destes trabalhadores havia homens valen-[es, como João José da Silva, Sombreira e mesmo da própria região, como"Café Torrado", Angelino e João Ferreira, para não falar de tantos outros.

.toD João José

João José, após a revolta de Cezário, que o deixou em Cachoeira de Santo

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a comeÍcialização, a não scr com sua filial de origcm.

Certa vez, dois fornecedores pertcnccntes à filial dc Cachoeira começaram a

vender borracha a João Josó, chefc da filial de Pacanarí. João José, sabendoque mais cedo ou mais tarde João Padeiro, chefe de Cachoeira, iria saber docaso, escreveu uma carta a cste contando o fato c SC rcsponsabilizando poralgum débito que os dois fornecedorcs por vent,ura tivessem com a filial de Ca-

choeira. João Padeiro recebeu a carta, leu e não deu rcsposta. Montou em umburro e partiu para Água Branca, a 53 km de Cachoeira, a fim de informar Cris-pim da ocorrência. Crispim era o chefe de toda a ârea-

Crispim leu a carta de João José e disse: "Olha, Padeiro, vamos tirar aquele

Antônio temendo alguma reação,tinham seus limites territoriais e

patife de lá..trar na filialnary Nunes)

foi scr aviado da filial de Pacanarí. As filiaisscus fornccedores de produtos, sendo proibida

Vamos colocar o Adclino no lugar dele." Aí combinaram Se encon-de Padaria, abaixo do Pacanarí. Crispim iria na lancha Duca, (fa'pelo Amazonas; depois subiria o Jari até Padaria.

Ao chegar em Padaria, Crispim já encontrou João Padeiro à sua espera. T 'ápâssarm a hoite planejando como iriam pegar João José. De manhã cedo sai-ia* para o Pacanarí. Desembarcariam só o Major Uascar, Adelino e João Pa-deiro. Crispim ficaria a bordo da lancha.

João José ainda estava dormindo, mas sua mulher jâ estava fazendo o café.

Quando João José veio falar com os três, o Major Uascar tirou do bolso a caÍtacom a ordem de sua substituição por Adelino. João José disse que não entre-gava a casa, o Major Uascar disse que elc tinha que entregar. João José puloupara pegar o revólver que estava pcndurado.na parede, m_as na capa. Aí JoãoÈadeiìo-o pegou por trás e caiu com ele. O pcissoal de bordo chegou e amarrouJoão José, cõloCando-o a bordo da lancha. Um negro, trabalhador de JoãoJosé, ainda veio com um terçado na mão, mas João Padeiro botou o revólvcrem cima dele dizendo: "não faça ação senão morre...". Em seguida baixaram o

Rio Jari para Aruúanduba, lcvando João Josó amarrado.

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José Júlio ficou aborrecido com o que elcs haviam fcito. Mandou soltar JoãoJosé imçdlatamente, deu-lhe dinheiro e cle foi embora da região da Jari, nuncamais retôrnando.

oo.r "Café Torrado"

"Café Torrado" era tambóm respcitado na-rcgião da Jari. Dizem que JosóJúlio comprâva burro bravo no Ccará para utilizaÍ no Lransportc dc Castanha.Quando os burros chcgavam cm Arumanduba, "Cafó Torrado" ia buscá-losdentro do navio, pegando-os com um braço por baixo do qucixo cíÍazendo-osaté fora do navio.

Como já contamos, "Café Torrado" foi morto mistcriosament.e. Algunsdizem que foi João Fcrreira, outro valentão da época, que o matou pelas costas.Isto a mando de Duca Neno. Esta suspcita foi confirmada na noite em que Ce-zário chegou a Arumanduba, trazendo cntrc os revolt,osos Angelino, que eratambém valent.e e irmão dc "Café Torrado". Dizem que João Ferreira ficoudentro d'água apenas com a cabeça de fora, atê a hora quc o navio partiu comos revoltosos para Belém, com mcdo de scr morto por Angclino.

Os homens valentes da época A fase losé lúlio

SombreiraJosó Januário Gomcs, o Sombrcira, como era conhccido, veio do Ceará no

ano de 1929, com mais 89 companheiros. Sombrcira conscguiu ser ao mesmotempo rcspeitado e querido por todos em Arumanduba, haja visto tcr sido pa-drinho por92 vezcs, tcndo anotado em um cadcrno os nomcs dc todos os afilha-dos e compadres.

Em Arumanduba, além dc capataz eÍa tambóm comissário dc polícia, cargoque ocupou dc 1929 até, 1970, apcnas com a intcrrupção de quatro anos, corrcs-pondcnte à gestão do General Zacarias dc Assunção como Governador doPará. Sua dcstituição do cargo foi por rnotivos políticos. Sombrcira apoiara oGcneral Barata, que havia concorrido às clciçõcs para govcrnador com Assun-

çãocperdidooplcito.

Em Arumanduba, até uma laclaínha tinha que tcr a autorização de Sombrci-ra. A cscola noturna era obrigatória para os adultos. Ficava a cargo dc Sombrci-ra a fiscalização dos faltosos, os quais tcriam quc justificar a falta, pois Sombrci-ra ia a domicílio vcrificar. Durantc o dia a cscola funcionava para as crianças; osmcninos maiores estudavam c trabalhavam na oficina. Em Arumanduba nãohavia mcnino vadio, scm ter o quc fazcr.

Após as22 horas as luzcs das ruas cram apagadas e somcntc dcntro das rcsi-dôncias tinha-se o dircito dc accndcr uma lâmpada, gcrada a bateria

ooú

Na ópoca cm que Sombrcira foi cxoncraclo do cargo de comisssário de polí-cia, os casos mais gravcs quc acontcciarn cm Arumanduba rcqucriam a sua prc-scnça para solução. A autoridadc clc Sornbrcira era tanta quc o próprio 9crcn-tc {c Arumancluba não tinha autoridade nos problcmas que acontcciam fora doescritório, como o próprio Sornbrcira mc confessou: "O Gcrcntc mandava dcn-[ro do cscritório c cu mandava fora."

DOn

Sombreira Linha a maior admiração por José Júlio, como pcssoa c como ho.mcm, tcndo dito a mim quc Josó Júlio cra um homom de pcso e mcdida. Dissotambóm que uma das cauìas da má fama dc Josó Júlio foi tcr rcccbitlo quurcnt0dcsorclciios que estavam nas prisõcs dc Bclóm, duranlc o Govcrno dc SoueoCastro, os quais foram distribuídos dc trôs cm trôs nas filiais do Rio Juri.

55

caslanha.

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oDo

Durantc os 4l anos cm que Sombreira esteve cm Arumanduba, aconteceuapcnas um crime passional, que foi o seguinte:

Existiam festas dançantcs em residências familiares, mas sempre com a auto-rizaçÃo de Sombreira. Certa noite, durante uma festa em casa familiar, surgiuuma convcrsa que a mulhcr do caixeiro viajante estava tendo um caso com umsujcito de nome João Jorgc, scndo quc os dois encontravam-se prcsent,es nafesta. Ao lomar conhecimcnto do problcma, Sombrcira chamou lóao Jorge e oaconsclhou a sc rctirar do local, para cvitar algum problcma

Em scguida Sombreira rct.irou-se. Pouco dcpois foram avisá-lo quc o caixci-ro havia matado João Jorgc. Os dois haviam cliscuticlo, o caixciro sacou de umrcvólver c alirou em João Jorge, errando o [iro. João Jorge jogou-se n'água, natentativa dc al.ravcssar um igarapé que corta a Vila de Alumaìduba, mai o se-gundo-tiro desferido atingiu-lhe as costas. João Jorge ainda atravessou o igara-piS, mas morrcu na margcm oposta, com o scu punhãl nas mãos. Sombreira deuoldcm'para que não mcxesseÍn no.cadáver até a chegada da polícia de Almei-1im. Após a necrópsia fcita pelo cnfcrmciro ctc nome lvo, ajuãado pelo próprioSombrcira, retiraram a bala quc havia ido alojar-se no coração dc Jôao fõrgõ.

Sombrcira fcz-me então a seguintc obscrvação:

"Qucm não ouve consclho, ouvc coitado."

Como disscmos ant.criormente, o Gerente de Arumanduba mandava dentrodo cscritório e Sombrcira mandava fora. Fato que mais uma vez teremos opor-tunidade de consl.atar, no próximo capítulo.

Sombreira A fase losé lúlio

A venda dasfazendasAquiquÍ

José Júlio possuía terras também na margem direita do Rio Amazonas, nosmunicípios de Porto de Móz e Gurupá. A região é de pastagens naturais abun-dantes, um dos melhores campos d,e vârzea para a criação de animais domésti-cos de grande porte, como o Búfalo e o Bovino, em toda a região do baixoAmazonas. Nesta área, José Júlio chegou a criar 25 mil bovinos.

A fauna da região é também muito rica, incluindo o lago mais piscoso detoda a região, denominado "IJrubú", com aproximadamente 3 mil hectares deárea.

A história da venda das Fazendas Aquiquí será narrada a seguir:

José Júlio tinha um compadre, seu conterrâneo, no qual depositava toda aconfiança, acreditando mais nele do que nos próprios sobrinhos, denominadosMajor Vicente, Major Perico e Major Ciríaco. Falando um pouco do compadrede José Júlio, lembro-me que quando ainda menino na cidade de Monte Ale-gre, certa vcz o vi no cartório de meu pai, tratando de negócios. Era mulato altoe vestia-se nesse dia impecavelmente de branco desde os sapatos, tendo aopulso relógio e pulseira em ouro maciço. Nesta ópoca, apesar de já scr umhomem passando da média idade, ainda era forte e clegante, bem credenciadoem relação ao sexo oposto, aliado também à sua condição de Gerente.

Contam que tinha uma amante de nome Lucy na rcgião do Aquiquí e quetodas as vezes que passava por ali, pedia ao maquinista da lancha, de nomeZéQuarenta, que aumentasse a velocidade da lancha para chegar logo. Daí surgiuuma marchinha que era canlada pelos empregados, cuja lct,ra transcrevemos:

Ia passando na ponta do Aquiquí

Puxa,-puxa Zé Quarcnta

Quero ver dona Lucy

Lucy, Lucy, Lucy

Lucy é meu amoÍ

Lií na ponta das areias

O Téu-Téu (*) já se afogou 1,,,,,u,,n"Dizem que o comprador das

José Júlio uma das fazendas, defazendas Aquiquí prometeunome Nazaré, com duas mil

ao compadre decabeças de gado

1*) Téu-Téu - ave regional

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José Júlio,das com toda(quc ao invéspraclor pagoumil rcscs.

A venda das fazendas Aquiquí

bovino, para o mesmo convencer José Júlio não só a vender as fazendas Aqui-quí, mas também informar a José Júlio menores quantidades dos bens existcn-tcs. O compadre então conseguiu convenccr José Júlio a fazer o negócio, dizcn-do que as marombas estavam muit.o danificadas, que nos últimos anos tinhamperdido muito gado devido às enchcntcs, os currais estavam todos precisandoscr rcfeitos etc.

confiando na palavra do compadrc, autorizou a vcnda das fazen-a infra-cst.rut.ura exist.cnte, com rcbocadorcs e o próprio gadode20 mil rcscs tcvc informadas apenas l8 mil). Dizcm que o com-o dóbito vcndcndo o próprio gado c quc no final ainda sobraram 8

Mas após o ncgócio consumaclo o comprador não dcu a fazenda promet.idaao compadrc dc José Júlio, alcgando quc não t.cria como cxplicar a doação aosscus sócios. O incidcntc vcio à lona pouco tempo dcpois, no dia da fcsta dc SãoBcncdito, na cidade dc Almcirim. O compadrc dcsacatou o comprador com pa-lavras dc baixo calão, rcfcrinclo-sc ao não cumprimcnto do acordo.

No outro dia pela manhã o comprador das fazendas Aquiquí chegou a Aru-manduba para comunicar o incidcntc a José Júlio. O compadre, que jâ era nestaocasião o Gcrenl.e de Arumanduba, não autorizou a atracação da embarcaçãodo comprador. Mas Sombrcira, que cra tambóm macho dc vcrdade, autorizou aatracação, fazendo valer suâ autoridadc clc Comissário dc Polícia.

José Júlio, depois dc ouvir Ludo quc o comprador lhe rclat.ou, dissc: "OCompadrc não é homcm para fazcr isto". Ao comprador só restou dcspcdir-scdc Josó Júlio, agradeccr a Sombrcira a gcntilcza dc tô-lo dcixado at.racar c cmscguida partir para o Aquiquí.

Josó Júlio passava pouco tcmpo cm Arumanduba. Vivia viajando para o cx-tcrior e com isso o compadrc ficou scnhor da situação. Entrou em conflito comos sobrinhos dc Josó Júlio, aos quais já nos rcfcrimos, quando os mesmos aban-donaram Arumanduba. Por fim incompatibilizou-sc tambóm com o Gcrcnt.cGcral, dc nomc Paulino, quc vivia em Bclórn. No rctorno dc Josó Júlio, Paulinocomunicou-lhe as ocorrôncias, impondo a condição: ficaria cle ou o compa-drc... Então José Júlio, quc já vinha cscutando certos comcntários sobrc o com-padre, mandou chamá-lo a Bclém c o dcmitiu, proibindo em scguida quc colo-cassc os pés cm Arumanduba. Sombrcira cncarrcgou-sc dc mandar lcvar ospcrtcnccs do compadrc cm Almcirim.

Daí cm diante os compadres Lornaram-sc grandcs inimigos, tant,o pcssoal-mcnl.c como na política. Certa vez o compadre candidatou-se a Prcfeito de Al-mcirim. Ao ter conhecimcnto, Josó Júlio embarcou para Bclóm e fretou umavião para o Rio dc Janciro, ondc conscguiu impcdir a candidat.ura do compa-drc inimigo.

A fase losé lúlio

Na época em que foi criada a Lei Trabalhista, o compadre pleiteou o tempode serviços prcstados a José Júlio. Este, ao tomar conhccimento, mandou-lheum telegrama com o scguintc teor:

Negro. Lembra de quem te tirou uma alpagarta (*) do pé e colocou uma gra-vata no teu pescoço, que até hoje não sabes dar o nó.

Assinado: Iosé lúlio de Andradc

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(*) Alpargala, calçado nordcslino dc tccido rúslico c corda

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A e>r-pedição alemãJosé Júlio conhecia a Alemanha, onde em uma de suas viagens mandou fa-

bricar uma série de espingardas de carregar pelo cano, gravando nas mesmas onome "Arumanduba". Estas espingardas, ao chegarem no Brasil, ficaram deti-das na alfándega de Belém, mas foram depois liberadas, e José Júlio prcsenteouseus colaboradores com elas. Porém a expedição alemã nada teve com as via-gens que José Julio fez à Alemanha, embora tenha dado todo o apoio necessá-rio: transportc para chegar ao Jari, fornecimento dc mercadorias c at.ó burrospara o transporte no interior da mata.

A expedição alemã era de carátcr cicntífico e tinha o apoio do Governo Bra-sileiro. As pesquisas tiveram início no ano dc 1935 e foram aré 1937, quando ocapataz da expedição, chamado Joscph Grcncr, morreu de uma febre repentinana filial de Santo Antônio de Cachocira. Após a mortc dc Grener, a expediçãoencerrou suas pesquisas indo para Bclóm, não sc t.endo sabido se por causa dosúbito falecimcnto ou por tcr concluído scu trabalho.

A expcdição veio de Bclóm no navio Coronel losé lúlio diretamentc paraSanto Antônio dc Cachoeira, situada no final do médio curso do Rio Jari. Emseguida subiram o alto Jari, Í.cndo montado sua base de acampamento próximaà Cachoeira de Macaquara, nas proximidades de uma maloca de índios Aparaí.Os membros da expedição cram: Oto, Kalis, Joscph Grcner e Ricardo.

Oto, que tinha emprcgado até para atar rcde, era o mais graduado dos qua-tro; pelas informaçõcs quc t.ivemos, devcria ser Geólogo, além de aviador.Teve uma filha com uma índia Aparaí, dc nomc Macarrani. A filha que era cha-mada Cessé, era branca c Linha ós olhos azuis. O pessoal chamava-a de "Ale-moa"; ela dizia que era Aparaí. Mais Í,ardc Cessé, que diziam ser muito bonita,casou com um índio da tribo.

Certa vez Oto veio de avião, amerissando no Rio Jari, abaixo da Cachoeira,no local denominado São José. Nos dias quc anteccdcram a chegada de Oto,Grener fazia diariamcnl.e uma fogueira à beira do Rio Jari, para marcar o localonde deveria pousar o hidro-avião. Ccrto dia Oto chegou e Íez o pouso semproblemas no local mcncionado, mas indo por água no avião até Cachoeira deSanto Antônio. Dessa vez clc vcio apcnas com um pequcno cachorro a bordo.Na volta levou muitas caixas com amostras de rochas.

Joseph Grener era o çapataz da expedição. Dizem que veio para o Brasil comquinze anos de idade, para a cidade de São Paulo. Falava bem o português e noano de 1937 tinha uns 30 anos de idade, sendo solteiro. Grener veio buscar mer-cadorias em Santo Antônio de Cachoeira, tendo dormido na noite anterior noacampamento da filial. Pela manhã acordou e começou a passar a mercadoria,em lombo de burro, para o local ondc cstava seu pequeno barco, acima da Ca-choeira, onde existe uma estrada dc 3 km contornando as corredeiras e a quedad'água. Foi quando sentiu-se mal, rctornando a Santo Antônio de Cachoeira já

A fase losé lúlio 6l

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Cemitério daVila de Cachoeira, na margemdireita do Rio Jari. Em primeiro plano a

rnarlcarndo a sepultura de Joseph Grenerl componente da expedição alemã entre J,935

parÍe mais alla, a suáslìca nazisla.

cru2e 1937, Na

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6362 A expedição alemã

com fcbrc alta. Pela partc da tardc, antes dc entrar cm coma, rccomendou queguardassem suas mercadorias.

Às oito horas da noite do mesmo dia, Grener faleceu no acampamcnto da fi-Iial. Como seus companheiros estavam muito longe de Cachoeira, o pessoal dafilial fez o sepultamcnto, mandando em scguida avisar os membros da expedi-ção para que baixassem imediatament,c o Jari até Cachocira. Lá ouviram dochefe da filial como tinha acontecido o fato; em seguida foram até o cemitóriovcr o local do sepultamento. De Cachoeira mcsmo embarcaram para Belém.Dois mcscs após o falcciment,o de Grcncr, Oto e outro membro rct.ornaram aSanto Antônio de Cachocira com uma cruz em Acapú, de três metros de altura,com letras gravadas na madeira em idioma Alemão e a suástica nazista. Em se-guida aprcscntamos a gravação em alcmão c sua tradução em port.uguês:

A fase losé Júlio

As tribos de índiosNa rcgião da Jari, entre os rios Parú e o próprio Jari, existiam tribos de índios

pertencentes aos grupos conhecidos por Tapuios. Estes índios Ïaziam excursõesèm canoas até Arumanduba, onde reccbiam presentes de José Júlio e retorna-vam a suas malocas. Na realidade não podcmos afirmar se as diferentes triboseram realment,e naçÕes difcrcntes. Mas apesar dos costumes sercm muito pare-

cidos, como por exemplo o tipo dc fcstas c a maneira de cnterrar os seus mor-tos, achamos que existèm g.andes difcrcnças, relacionadas principalment.e à es-

tatura c à cor da pcle das tribos.

Os Uruguianos, dc pclc morcna, cram fortcs c dc estatura mediana. Tinhamcabclos prctos c lisos. Eram trabalhadorcs, plantavam mandioca, milho,banana e outras culturas. Sua maior maloca no Jari cra chamada Maracajâ,acima do Rio Qucrecurú, ondc havia duzcntos índios.

Os Aparaí eram mais claros, porém mais baixos quc os Uruguianos. Eramexímios construtorcs dc canoas, poróm mais prcguiçosos; alguns corl.avam bala-ta. Viviam no igarapó lpitinga, aflucnLc do Rio Jari.

As duas tribos locais acima citadas eram constanl.cmcnte visitadas por oul.rastribos, como os Assurinis, quc viviam quasc no Tumucumaquc, e pclos Atcriós,quc vinham da rcgião do Rio Trombctas. Estas duas últimas tribos não utiliza-vam canoas, andavam a pé pela mata.

Como já mencionamos, os costumes dos Uruguianos c Aparaí cram seme-lhantCs, nO que tangc ao scpultamcnl.c dos scus mortos c SuaS festas.

Para os scpultamentos cxistia uma casa com piso dc chão batido, ondc osmortos eram cnterrados com todos os scus pcrl.cnccs dc cstimação (arco, flcchaetc) em scpulturas quc cram socadas ou cornprirnidas à mcdida quc ia-sc colo-cando a tcrra. No final a scpultura ficava nivclada com o chão.

O môs de julho era todo de fcsta. Dois mcscs antcs cram fcitos os preparati-vos, ou seja, fabricação das bebidas c as caçadas para conseguir carne. Para a

preparação da carnc era fcito o moquém, quc é um buraco no chão com 40 cmãc profundidade, mcio mctro dc largura c um mctro dc comprimcnto, tcndouma armação dc varas cm cima, a mcio mctro do funclo, ondc as caças eram cn-volvidas cm palha de banancira e assadas na qucntura da fumaça. Este sistcmaconservava a carnc da caça por muito tcmpo, sendo nccessário apenas csqucn-tar antcs de comer, ou cozinhar no tucupí. Outro costumc dcstas tribos era a fa-bricação dc bcijus de mandioca cm vcz dc labricação da farinha.

As bcbiclas eram muil.o fortcs c cmbriagavam bastantc. O sacurá cra fcito ra-lanclo a mandioca (Maniot pcntaphylla) c colocando a massa em panclas dcbarro dc um mctro dc altura, Lcndo o fundo pcqucno c a boca larga. Colocandoum pouco dc água, a massa cra aquccida cm fogo brando ao rcdor da pancla du-rantc um môs. Quando dava o ponto ccrto, aquclc procluto cra misturado com

JOSEPH GRENERSTARB HIER

AM2-r-36DEN

FIEB ERTO DIN

DIENS TEDEUTS C HER

FURS CHUNGSARBEIT

DEUTS CHEAM AZONAS

JAR YEXPEDITION

1935-37

Em português significa:

JOS EPH GRENERFALECEU AQUI

EM02-0t-36

DE MORTE DE FEBREEM

SERVIçO DE EXPLORAÇÃOPARA ALEMANHA

EXPE DI çÃOALEMANHAAMAZONAS

JARI1935-37

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garapa de cana para adoçar. A bebida é muito forte, chegando a fazer espumadcvido à fermentação.

Outra bebida é o Caxiri, cujo método de fabricação é o mesmo do Sacurá,com a diferença de ser feita de macacheira (Maniot utilíssima). O Caxiri, aocontrário do Sacurá, não produz forte efeito de embriagvez.

Os instrumentos musicais eram feitos de ossos de canela de veado e anta, uti-lizando também tamborcs. Para os festejos cram convidadas todas as tribos daregião, onde aconteciam os casamentos.

úúú

Certa vez houve um massacre de índios acima da atual aldeia Bona, no altoParú, num igarapé de nome Matuaré. A notícia chegou ao Rio dc Janeiro, quenesta ópoca ainda era a Capitat do Brasil. O Governo solicitou ao prefeito domunicípio de Monte Alegre, Dr. Catetc Pinheiro, dar todo apoio a um pesqui-sador alemão dc nomc Manfredo, que tinha sido incumbido de Íazcr verificaçãoda ocorrência. O incidente foi com uns crioulos franccses qus pesquisavamouro na região. Dois deles haviam mantido relaçõcs com duas índias jovens. Aosaber do fato, o tuchaua foi até o acampamcnt,o dos franceses com seus guerrei-ros, que flecharam os dois jovens. Houve a rcação dos franceses, que dizima-ram o grupo, deixando os corpos dcntro dc uma cavcrna.

Com auxílio de Chagas Brilhante, que era conhecedor da rcgião, Manfredochegou até a caverna, trazcndo seis esquelet.os e deixando os dcmais. Manfredodeveria levar as ossadas para o Museu Nacional do Rio de Janeiro, porémdeixou as mesmas durantc muitos anos com Chagas Brilhantc, quc acabou re-solvendo enterrá-las.

As tribos de índios A fase losé lúlio

A frota de embarcaçõesAs atividades cmpresariais de José Julio de Andrade necessitavam de trans-

porte fluvial para poder escoar sua produção. Seus negócios estavam situadosnas margens de grandes rios, como o Amazonas, o Parú e o Jari. Na Amazôniadesta época o túnsporte fluvial era o único meio existente de comunicaçãoentre os grandes centros.

A primeira embarcação dc José Júlio chamava-se Garcinha e era um peque-no barco construído cm madcira, sendo movido a caldeira. À medida que loséJúlio foi expandindo seus negócios, foi adquirindo embarcações mais possan-tes, tendo até mandado construir navios fora do país, em estaleiros holandeses.Ao todo José Júlio chegou a tcr Lreze cmbarcações. A scguir citarcmos seusnomes c relataremos alguns fatos marcantcs ocorridos com 4lgumas delas.

Os nomes das cmbarcaçõcs cram os scguintes: Sobra I, Cidade de Alenqucr,Maracanã, Rio Cajari, Duca (Ianary Nunes), Tapuia, Cisne, Fortaleza, Maio,Cidadc de AImeirim, Aquiquí e lari. Dcnt,rc cstas cmbarcaçõcs dcstacamos oCidade de Almeirim e Cidade de Alenquer, que foram as cmbarcaçÕes utiliza-das pelos revoltosos no ano dc 1928. O navio Sobral rccebcu cste nomc devidoà lembrança da terra natal dc Josó Júlio, a cidade de Sobral, no Ceará. E o fari,que cntrou para a história dos navios-fant.asma que muitos afirmaram existir naAm azôn ia.

Einar da Costa Dant.as, no scu livro "Amazonas, Rio de muit.os nomes",conta a scguinte história sobre o Rio Jari: Durantc a revolta dc 1924, o Des-troyer Scrgipe, navegando durantc a noitc dc 24 dc agosto nas proximidades dailha das Marrccas,a16 milhas da cidade tlc Santaróm, travou combate com onavio-gaiola a vapor fari, dc propricdade do então Coroncl José Júlio de An-drade, que seguia com dcstino ao porto da cicladc Oc ÓUictos, scndo poróm to-mado e artilhado por forças rcbcldcs ao Govcrno Fcderal. Após a troca dos pri-meiros tiros, o lari foi alunclado sob os tlisparos dc canhão do Scrgipe. Segundoos moradorcs da cidadc dc Santaróm c da costa do Piracauerá, ao amanhccerdos dias 25 e26 dc agosto, dczcnas dc cadávcrcs cram avislados boiando.

Os antigos catraiciros do porto dc Santaróm, os vcndedores dc frutas e deout.ros produtos vcndidos a bordo dos navios, afirmam quc de vez cm quando,na data de24 de agosto, é avistadaaluz de um navio aproando em direção à ci-dadc de Santaróm. Logo a scguir csta luz dcsaparccc e clcs afirmam ser o "Fan-tasma" do lari fugindo a toda máquina dos tiros do Scrgipe.

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Os produtos exploradosNo ano de 1924 José Júlio de Andrade demarcou suas terras até o Itacará, no

alto Rio Jari, onde existe até hoje um marco. Existem ainda outros dois marcos:no Iratapurú e acima da vila dó Água Branca. O Agrimensor responsável porestc serviço chamava-se Paulo Muniz.

No mês de agosto de 1937 a comissão de limites subiu o Rio Jari até a GuianaFranccsa, tcndo retornado cm feverciro de 1938; Dizem que a comissão consi-dcrou a dcmarcação feita por Josó Júlio. A comissão era composta de cinqücntapcssoas, sendo o responsável pelos serviços o engcnhciro Morele e tcndo comoauxiliarcs os senhores Pombo e Lcônidas. Alóm dos citados, havia dois solda-dos do exércit.o, um telegrafist.a, os carregadores de matcrial e os remeiros. Aexpedição foi atê,a Cachoeira de Macaó, no alto Rio Jari, já próxima ao limitecom as Guianas, utilizando canoa. Dc lá para cirna, ató o Tumucumaque, ondcnasce o Rio Jari, a jornada lcvc quc ser fci[a a pó.

Em uma boa partc dcsta árca, José Júlio cxplorou produtos nat.ivos c tam-bóm ouro. A seguir dcscrcvcrcmos os proclutos cxplorados e os mótodos adota-dos.

úoD Castanha do

Castanha do Brasil (Bcrthollctia cxcctsa) -bidáccas.

Brasil

A casl.anha foi scm clúvida o maior ncgócio quc Josó Júlio cxplorou. Era sclc-cionada, scndo as maiorcs cxportadas para a Eúropa com a marca Jari, ohdc atéhoje ó conhccicla.

O fabrico da castanha, como cra chamaclo, clcpendia de muit.as providônciasantcs mcsmo dc rcalmcnt,c começar, como por cxcmplo:

No môs de oul.ubro, Josó Júlio mandava scus homcns dc confiança pcrcorrcros castanhais , paÍa estimar a produção daquela safra. Ncsta mcsma ocasião,cstes homcns já levavam trabalhadorcs para cfctuar os tratos culturais nos cas-taniais, que consistiam em qucimas cont.rolaclas da folhagcm e do sub-bosque.A fumaça era rcpelente para os insct.os quc atacavam as folhas da castanhelra,cm cspccial o gafanhoto grandc. Quanclo não cra fcita a qucima acont.cciamvcrclaclciras pragas dcstcs inscl.os, quc ao morrcr dcixavam o casl.anhal commau chciro.

Outra finalidadc da qucima controlada cra a limpcza do sub-bosquc, paraquc os casl.anhciros cnxcrgasscm os ouriços (*). A qucima do sub-bosque tam-

(*) InvólucÍo que contóm as amôndoas.

A fase losé Iúlio

bém desdobrava a folhagem em cinzas, favorccendo uma assimilação mais rá-pida pelas raízes das castanheiras. As castanheiras velhas ou atacadas por cipósparasitas eram limpas, possibilitando a volta da sua produção.

Essas equipes de vanguarda também levavam muita munição para espantaros pássaros que prejudicavam a produção da castanha. Por exemplo, a Araraque furava o ouriço quando ainda estava novo, derrubando-o, ou o Papagaioque comia a floração. Os castanheiros dizem quc cstas avcs podem diminuir aprodução de um castanhal em até 707o.

Existiam castanhais onde os trat.os culturais acima mencionados cram negli-cendiados, que ficavam até trôs anos scm produzir.

Após o retorno dcsta equipc de vanguarda cram monl.adas as Lurmas, esti-mando o númcro de burros que iriam scr prccisos, o pcssoal c tudo mais quefossc nccessário para a colcla da castanha. Por falar cm burros, todos os anosera preciso adquirir animais do Ccará c Rio Grandc do Norte, pois no final dasafra muil.os morriam c outros ficavam muito dclibitados clcvirlo ao scrviço for-çado (a carga dc um burro cra 100 a 120 kg).

Os comboios, como cram chamados, compunham-sc cada um dc quinze bur-ros e três castanhciros. A produção cra t.ransportada dc dcnlro dos castanhaisaté o dcpósito ccntral dc cada ârca. Daí cra Lransportada por barco para os de-pósitos de Arumanduba, ondc cra medida cm barricas de cem litros. José Júliochegou a produzir 75 mil hcctolitros dc castanha.

Nos dcpósitos dc Arumanduba c nas cmbarcaçõcs quc lcvavam o produtoaté o local de bcncficiarncnto, a caslanha prccisava cstar com ll%o de umidadepara evitar o cozimento da amôndoa, devido ao calor, capaz de iniciar um pro-cesso dc putrcfação, inutilizando o produto.'

coú Borracha

Apcsar da fcbrc da borracha já havcr passado quando Josó Júlio iniciou suavida cmprcsarial na Jari, a mcsma sc constituiu no scu scgunclo negócio, após acastanha. A título dc inforrnação, cm l9l0 a borracha quasc igualou-sc ao caféem exporl.ação, tcndo chcgado a 39o/a c aquclc cm 42a/o das cxportações brasi-lciras.

Na rcgião da Jari, a scringucira vcgcta principalmentc nos rios dc água prcta,como o Parú, Cajari c o próprio Rio Jari; não só nas rcstingas quc margciam osrios, mas tambóm na v'itrzca baixa, inclo ató o igapó. Em alguns locais, como cmCachocira dc Santo An[ônio, cla dá na t.crra firme, mas a produção dc lcitc émenor quc na v'árzca.

O nomc "scringucira" é dado a divcrsas cspócics do gêncro Hcvca,pcÍLcn-cenl.c à família das Euforbiáccas. Existcm pclo mcnos dozc cspócics dc Hcvca

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pcrtcnccntc à família das Lccit-

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ó8

que podem ser consideradas boas produloras de borracha, como por exemplo aHevea benthamiana, H. brasiliensis, H. pauciflora, H. rigidifolia e a H. spru-ceana. Esta última é também chamada de barriguda, seringaraha e seringueira-tambaqui. Seu caule é mais desenvolvido na base e ocorre mais no igapó. Ascápsulas ao se abrirem lançam longe as sementes, que são muito maiores que asdemais scmentes de seringueira, atingindo mais de 35 mm. O leite, apcsar deser branco, é de má qualidade, depreciando a borlacha quando exisl.e em suacomposição. O seringueiro e os compradorcs distinguem a borracha quando amesma tem na sua composição lcitc da scringueira barriguda.

Em 1736 o francês Charles Maric dc La Condamine encontrou a borracha,utilizada pelos índios da província dc Quito. Ao enviar carta à Academia dcCiências de Paris, mcncionou a árvorc como "Hhcvó", daí surgindo o nomc"Hevea".

Na época dc José Júlio, o proccsso para obtcr a borracha cra muit.o traba-lhoso para o seringueiro. Pcla manhã bcrn ccclinho o scringuciro iniciava ocorte das árvores, quc em média cra dc uma cst.rada, ou scja, 120 árvorcs.Quando cortava a última árvorc, já iniciava a coleta do lcitc em um baldc,deixando sempre a tigelinha prcsa na árvorc para a colcta do próximo dia. Umaestrada de seringusira dá cm módia uma lata de lcitc, ou seja, lS litros.

Após a chegada do scringuciro ao tapirí (*), o lcitc era colocado em umabacia e imediatamente iniciado o proccsso dc fabricação da borracha, para queo mcsmo não coagulassc. O proccsso consisl.ia no scguintc:

Fazia-se uma armação dc madcira no chão, scmclhante a uma pcqucna Lravcdc futebol, de um mctro dc comprimcnto por mcio mct.ro dc altura; cm scguidafazia-se um fogo brando cmbaixo do t.ravcssão, quc cra abafado para produzirfumaça. Esse travcssão era girado à mcdida quc ia-sc banhando com o leitc umaformação dc argila chamada boião, quc dava o format.o do bloco de borracha cque depois era rel.irado. Aos poucos o lcitc ia endurcccndo, ficando dc cor cs-cura, devido à defumação. Quando atingiam cm módia 80 a 100 kg, os blocoscram tirados do travessão, ficando o orifício.

Um seringueiro ïazia cm módia sctcnt.a quilos dc borracha por scmana c umatonelada por fabrico, o qual se iniciava cm agosl.o, indo até janciro. Na Jari nãose cort.ava scringa nos mcscs dc inverno, porque a maioria dos seringais sit.ua-va-sc em terrcnos de várzea inundávcis. Apenas no Lempo da Scgunda GrandcGucrra, José Júlio pediu que cortasscm a scringa na ópoca do invcrno.

O cortc da scringucira, ao contrário da balatcira (Mimusops bidcntada) daqual falaremos no capítulo rcfcrcntc à fasc dos portugucscs, cstcndc-sc portodo o ano, dcsdc que sc tenha critório, não danificando o cerne da árvore c sim

(*) Abrigo rústico na mata.

A fase José Júlio

utilizando apcnas a casca da mesma. O corte da scringueira é diário, sendo feitoum corte na casca de aproximadamente 20 cm de comprimento, em sentido dia-gonal ao fuste da árvore, de cima para baixo, terminando num sulco coletor, em

õuja base esrá a tigelinha. Quando o corte é muito profundo, atingindo o cerne

da árvore, o leite não escorre e a árvore fica exposta a ataques de insetos e à pe-

netração da água da chuva, podendo morrer.

r,JJ Maçaranduba

Maçaranduba (Manitkara hubcrl - pcrtcncente à família das Sapotáceas.

Essôncia dc grande inciclôncia nas árcas da Jari, onde atinge a altura médiade 30 mctros. Jósó Júlio a cxplorava preclatoriamcntc, pois para extrair o leiteprecisa-sc dcrrubar a árvorc. Ao contrário do lcitc da seringueira e da balatei-iu, o lcitc da Maçarancluba não escorre. Por um proccsso de anclamcnto do fus-te, rctira-sc o lcitc por raspagcm, quando o mcsmo vai coagulando.

A Maçaranduba pcrtcncc a mcsma família da Balatcira, scndo muito semc-

lhante a ósm. A difcìença cstá na folhagem, a Balateira dc folhas verdes e a Ma-

çaranduba dc folhas amarcladas.

Se não der para cozinhar o leite no mcsmo dia cm que é extraído, deve-se co-locar água para o mesmo não endurgcer. Faz-se primeiro um bolo e todo dia vaise fazcndo os morrões c mist.urando ao do dia anterior. O cozimento do leite éfeito igual ao da Balata, mas como ó muito quebradiço, não se cortava Maça-randuú acima das cachociras, porquc no t.ransporte, ao bat.er nas pedras do riopcrdia-se muito produt.o. Outro mot.ivo dc não se cortar maçaranduba acimadas cachociras cra porquc a.mcsma ia para o fundo.

O acon6icionamento da maçaranduba cram os bolõcs dc 50 kg. Não se podcmisturar o leite de maçarancluba com o cla balatcira, ncm com o da scringueira.

Dúo CoPaíba

Copaíba (Copaifera guiancnsis) - pertencente à família das leguminosas.

A extração do ólco é só no verão, quanclo é fcito um orifício com um tradoaté atingir o ccrnc, a uma altura dc 1,5 met.ro do chão. Quando o trado molha,retira-sc o mcsmo e faz-sc um scgundo orifício dcnominado suspiro, a meio

metro de altura do Primciro.

Uma copaibeira grandc chcga a produzir até duas latas de dezoito litros dc

óleo. Josól.itio tinha produçãó dc ató quarcnta mil litros por safra. Este ólcoera vcndido para fins mcdicinais, principalmente como anti-inflamatório c cica-

t.rizante. A õopaíba volta a dar ólco scis mcses dcpois da exploração.. Scus

frutos são apreèiados pelos animais silvcstrcs como o vcado, a paca, a cotia ctc.

69Os produtos explorados

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70 Os produtos explorados A fase losé lúlio

ceas e é um arbusto alto, escandcnte e robusto. Suas raízes servem para matarpeixes, mas José Júlio o vendia para fabricantes de inseticida, devido ao mcsmoconter a substância de nomc rotenoma, própria íalvcz para a fabricação doDDT.

Comprava também a casca prcciosa (Aniba cancllila), pertencente à famíliadas Lauráceas, a qual era utilizada para qualquer tipo de dor e para infecçõesurinárias.

A salsa (Smilax schomburgkiana kunt), pertencente à família das smiláceas,ó um cipó cujo tubérculo ó utilizado no traLamento do rcumatismo.

José Júlio vendia estcs produtos para a praça dc Bclóm, para farmácias queaté hojc ainda existem, como a farmácia Bcirão, por cxcmplo.

Sua incidência é em solos bons, geralmcntenão vegeta em terrenos de vârzea.

nas encostas de scrras; a copaíba

clDo AndirobaAndiroba (Carapa guianensls) - pertenccnte à família das iaetiáceas.José Júlio também comercializava o óleo da andiroba para Belóm. O óleo é

extraído do fruto cozido, depois do mcsmo [cr caído da áivore. A polpa é reti-rada e colocada ao sol, em uma folha de alumínio. Devido ao caloi, o óleo vaiescorrendo e sendo armazenado cm um rccipicnt.c. Em scguida este óleo écoado cm um pano, ficando pront.o para uso.

Os animais silvestres tambóm comcm o fruto da andirobeira, principalmenteo vcado, tornando sua carnc u.m pouco amarga, principalmcntõ o fígado. Aocontrário da copaibeira, a andirobcira dá cm uários tipbs dc solos, eir scrros,várzea e até no igapó.

Os índios do Jari usavam a massa rctirada da polpa do fruto misturada comurucum (Bixa orellana) como repclcnte a caÍrapatos c carapanãs.

oDú OuroO ouro da região do Jari tem melhor cotação que o do Tapajós, atingindo 22quilates. José Júlio explorava ouro por intúmóàio dos crióulLs'franõr"r, nó

igarapé, cumarú, situado à margem dìreira do Rio Jari.

-José Júlio possuía muito ouro guardado, como já abordamos anteriormcntc,

sob a forma de pequenas barras envoltas cm pap.i apropriado, sendo sua lim-pcza feita todos os mcses.

Além do ouro, na região do Rio Parú existia também diamante, encontradono igarapé Paicurú. Neste local-o garimpciro de nome Botica, da equipc dcchagas Brilhante, achou duas pedral do hmanho de um grão de milho.

. Toda 3 região do Rio Parú, fora cla área de José Júlio e da atual lari, é muitorica em ouro. Existiu um garimpeiro de nome Oliveira qu. ón.ontrou uma áreamuito rica em ouro e usava um sapatinho de ouro no coidão, daí ter recebido oapeli{o de_"sapatinho de ouro". O local chamava-se Grota Rica, situada no igu-rapé São Domingos. Isto aconteccu no ano dc 1936, ondc um quilo de oúovalia vinte contos de réis.

oúo Outros produtos nativos

José Júlio comprava outros produt.os em menor escala, como por exemplo otimbó (Lonchocarpus nicou) que pertence à família das leguminosas papilioná-

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I p.4"ãg So"nurcronarrosA dcdicação, a honestidade e o pronto atendimento dos serviços são notáveis

nos funcionários da época de José Júlio de Andrade.

Com alguns desses funcionários, ainda tive a oportunidade de trabalhar. Porexcmplo, João da Mata, que me disse certa vez que "o patrão pagava o cmpre-gado para zelar pelas suas coisas, se não, nâo precisava do mesmo". A descen-dência dessa gente segue os mesmos critérios.

Na área em que atuamos, a Agropecuária, lemos capatazes de fazendas,mestres em construções agropecuárias, que são verdadeiros profissionais, emque se pode ter toda confiança. Esses homens, apesar de não terem muito cstu-do, são muito criativos, observadorcs c intcligcnt.cs. Dcvo a eles grande partede meus conhecimentos práticos sobre o meu trabalho e sobre a região cm qucatuamos. Na realidade são muito humildes c prccisa-sc conquistar sua confian-ça para sc porcm à vontade para opinar.

Este padrão de funcionários José Júlio cultivou desde menino, mantendo emArumanduba uma espécie de colégio interno, com obrigações dcfinidas, cstu-do, oficina e lazer. Os rapazes ficavam nesse regime até completarem dezoitoanos, quando então começavam a trabalhar como empregados. Até atingir cstaidade, não fumavam e ncrh bcbiam, pois só poderiam ter vícios quando pudes-scm sustcntá-los, esta era a condição. Pessoas desta época, que entrevistci,acham quc o sistema quc cra adotado só ajudou a formar pessoas de bem.

Como abordaremos adiante, no capítulo sobre pecuária, José Júlio não com-prava medicamentos para o scu rebanho e ncm tinha veterinários trabalhandoou que prcstassem pclo mcnos asscssoria. Tudo era feito pelos capatazes, comtotal dcdicação. Dizem quc José Júlio rcconhccia a dedicação dc scus emprega-dos, permitindo que eles abatcssem animais para o seu sustento, e dizia: "sãoclcs que criam"; por isso não queria que ninguém passasse necessidade.

Entre L920 e 1925, estudavam na escola de Arumanduba, em regime dc in-lcrnato, 110 rapazes ente l0 e l7 anos de idade. Mat,usalém era o responsávelpclos rapazes. Pela manhã cedo uns aguardavam tapiocas (*) para fazer bcijú,outros carregavam água, depois iam tomar café. Durante a manhã, das oito àsonze horas trabalhavam no escritório, oficina e estudavam; pela tarde, das trezeàs dezessete horas, os mesmos afazeres se repetiam.

Na oficina trabalhavam em fundição, faziam pregos de pedaços de verga-lhão, confeccionavam pequenas peças etc. As roupas, sapatos, produtos de hi-gicnc pcssoal e tudo o mais que fosse neccssário, era fornecido por José Júlio.

A fase José lúlio

Os utensílios velhos eram devolvidos pclos rapazes para podcr receber novos.

Os que não tinham mãe, tinha a roupa lavada por pessoa contratada. Outro scr-

viço que José Júlio mandava os rapazes fazerem no vcrão, em époc19c sêca,

erà tiàr os peixes quc iam morrer nos lagos o igarapós e lançá-los no Rio Ama-zonas.

(r) Fécula alimentícia extraída da mandioca.

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74 A fase José lúlio

rios. Vacinações contra doenças como a aftosa, o carbúnculo sintomático e abrucelose, também não eram feitas.

A "broca", carência mineral que se manifesta com maior evidência no chifredos bovinos, os quais ficam completamente ocos, era tratada furando o chifrecom uma verruma e introduzindo creolina, benzocreol ou até querosene peloorifício. Em seguida o orifício era tapado com cera de abclha oú argila. Oi ca-paÍ.azes usavam tambóm purgantc dc salamargo para curar a broca.

A aftosa também causava grandcs prcjuízos, principalmentc no tempo dc in-verno, quando o gado cstava emarombado. O tratament.o cra feito à base debenzocreol, aplicado nas aft.as da boca, nos cascos fcridos c sob a forma dc pur-gantc. Era muil.o utilizado tambóm um produto chamado dc "cspecífico".

onc João da M ata

Como já vimos, a dcdicação dos capatazcs era fundamcntal para minimizaros prejuízos e José Júlio rcconhccia cste fat,o. Nas fazcndas quc 1,inham dc milrcses para cima, era abatida uma rôs por mês, sendo a carne distribuída cnt.re osvaqueiros.

Os cachorros da fazcnda também tinham uma cota dc farinha para ser mistu-rada ao leite, pois ajudavam muito no mancjo do gaclo, cada vaqueiro podendoter no máximo dois. Em ccrtas fazcndas as onças davam prcjuízo-na beácrrada eeram caçadas com a ajuda dos cãcs.

João da Mata, hoje com oitcnta anos dc idade, mas ainda muito forte e lúci-do, no dia 5 dc março dc 1930 estava dc malas prontas para ir trabalhar na Com-panhia Ford em Forlândia, quando José Júlio o convenccu a ficar e ir.tomarcont,a de uma de suas fazcndas no Rio Jari, de nome "Saudade". João da Matatrabalhou trôs fases da Jari, ou seja, de José Júlio a Ludwig e tinha consigo o se-guinte lema: "O patrão paga o funcionário para zelar pelas suas coisas; se nãofosse assim, não precisaria do mcsmo".

Na fazenda Saudadc, João da Mata chcgou a tirar no verão 48 latas de leite,de l8 litros cada uma, por dia. Estc lcite cra desnatado manualmente para fazermanteiga e uma parte para queijo. Dcpois dc desnatado o leite era dado aosporcos. Para executar cste scrviço, João da Mata já estava no curral às trêshoras da madrugada com mais onze companheiros, sendo que às sete horas damanhã já estavam soltando os animais para o campo.

Certa vez,na fazenda Saudadc, uma onça já havia comido doze bezcrras scmque os vaqueiros e cachorros a t,ivcsscm pclo mcnos avistado. Porém, devido aorastro eas embiaras (*) quc enconLravam, não se tinha dúvidas de que cra uma

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A pecuáriaNas regiões dos municípios de Almeirim e Porto de Mó2, arrisco dizer que

cxistem os melhorcs campos de vá,rzca de todo o baixo Amazonas. As purì"-gens, formadas dc gramíncas alt,amentc protóicas c palatáveis, como o ;Rabodc Rato" (Hymcychnc amplcxicaullis) a "Pomongã" (Lecnsia hexandra) e a"Canarana" (Echinochloa polystachya) propiciarú a José Júlio de Andradetcr o maior plantel de bovinos do baixo Amazonas daquela época.

Apesar da área ser inundada pcrioclicamcnÍ.g com as enchentes do Rio Ama-zonas, num pcríodo de scis mcscs, as rcstingas ou l.csos eram altos, onde o gadoadulto podia pastar com água ao nívcl do costado scm grandcs problcmar. Nurcalidadc esses campos são mais apropriaclos para a criáçao de üubalinos, qucsendo mais rústicos, não sofrcm muito no pcríoclo de chciás.

Durante o pcríodo de cheia, os animais subiam para as marombas para pas-sar a noite c durante o dia pastavam dcnÍro d'água. Na rcalidade óra nôrraépoca que os animais perdiam pcso c o ínclice dc mortalidadc aumsntava, prin-cipalmentc entrc os animais jovens. Com a chcgada do vcrão, os campos seca-Y_am

e o gado podia locomovcr-sc livrcmcntc à procura de boas pastagen s e ma-Ihando (*) à noitc em locais secos. No vcrão o gado engorclava e ai pariçõcsaconteciam no campo scm muito problcma, a não scr quano o campo era infes-tado dc onças (assunto quc aborclarcmos mais acliantc).

A qualidadc zootócnica clos anirnais cra muito ruim, dcvido a cruzamcntoscontínuos scm a troca dc rcprodu[orcs, o quc cm Zoot.ecnia ó denominado"IN-BRIDIN". A comprovação destc fato oc-orreu quando José Júlio ror11piouuma partida dc rcprodutorcs Zcbus, Gir c Indubrasil, quc ao cruzarcm commatrizes pcquenas, estas livcram muita clificuldadc na hoìa da parição; os pro-dutos eram muito dcscnvolviclos, clevido ao choquc de sangue do lado pateino.Aos poucos o gado foi mclhorando, proporcionancto pasúio no invcrno comágua em locais mais profundos, faÍ.o notacro pclos capatazcs.

DJJ

Na rcalidadc Josó Júlio tinha muilo gado, mas pouca qualiclade. Era como scdiz, o boi criava o rlono, cm vcz dcs[c o criar. Não exisìia muito empenho doproprietário cm dar mclhorcs condiçõcs aos animais; eram os capatazes quefaziam o que podiam, com os scus lirnitacros conhecimentos.

Ncsta época não sc mincralizava os anirnais, os quais supriam suas necessida-dcs orgânicas, nos barrciros (**) que ïaziam nas margcni dos igarapés ou dos

(r) Tcrmo rcgional, ondc o gado sc rcúnc para passar a noitc, Malhada.

(r*) (ìrandcs buracos quc os animais f aziam para corncr barro. (*) Embiara, animal morto por prcdador.

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onç4. Utt-t dia, João da Mata estava dando campo com mais dois vaquciros,quando os cachorros acuaram a onça numa ponta dc mata. João da Mata dcuunì tiro na bicha, qucbrando sua mâo. A onça cnvcrcdou por um local dc difícilaccsso. Os cachorros cnl.raram atrás c João da Mata tambóm. O caminho cramuito cstrcito c a onça, ao vcr João da Mata, partiu para cirna dclc, mas os ca-chorros a atacaram, fazcnclo-a virar para se dcfcndcr. Então João da Mata nãotcvc oul.ro jcito a não scr agarrar firmc no rabo da bicha c gritar para os com-panhciros quc vicsscm crìr scu socorro, onclc mal.aram-na a pauladas.

Ernbora a caçada dc onça c história dc pcscador sc dcva dar uma margcrn dcdcsconfiança, João da Mata ó urn sujcito quc não conta mcntiras c afinal, tcrácxccutaclo uma l.arcfa mais fírcil quc um caçador da tribo dos Massai da África,cuja maior procza ó scgurar um lciro pclo rabo, para quc os companhciros omatcm com suas lanças.

oúft

A ilha tlc Conrandaí, situada no Rio Anrazonas, foi o local quc [cvc maisonças dc todas as l'azcntlas clc Josó Júlio. Para sc tcr uma idóia, lá os bczcrrosviviarn prcsos no curral, não indo para o campo conì as ntãcs, pois sc fosscm sol-tos, as onças os pcgavam. Com a lroca dc bovinos por búfalos, as onças muda-ram-sc para o conl.incnLc, atravcssando unr braço do Amazonas dc aproximacla-mcntc rnil rncLros (tarcfa não rnuit.o clifícil, pois as onças são cxírnias nadado-ras). Itojc aincla cxistcm onças na ilha do Cornandaí, mas não ousam atacar osbú falos.

Úoa]Por falar cm búfalos, foi Josó Júlio qucm introduziu o búfalo na Jari, no ano

tlc 1907. Por Lo[al desconhccirncn[o, trouxc dois touros cla raça Carabao (origi-nária clo conl.incntc Asiático) c os lcvou para o Aquiquí, a fim tle cruz,â-los cõmo scu gaclo bovino. José Júlio clcsconhccia quc, apcsar da scmclhança, os bovi-nos c os bubalinos são cspócics difcrcntcs, scndo por isso rnuito ditícil obtcr urnproduto viávcl do seu cruz.amcnto. Corno havia dc aconl.cccr, csscs animais fi-caram bravios, isolando-sc clo gado bovino c só saindo do mato à noitc para pas-tar. Quando foram capturados para scrcrn abatidos, um dclcs aincla matou utncavalo.

Postcriormcntc a csLa cntrada dc búfalos, etn l9l8 Josó Júlio lrouxc duasvacas c utÌì louro, mas scmprc lirnitou o crcscimcnto do plantcl. No dcscmbar-quc cnì Arumanduba uma clas vacas, ao pular da cmbarcação, caiu cm cima dcum garoto quc cstava n'água, matando-o afogado.

Josó Júlio tinha conLraLo com o abatcclouro dc nomc Curro Vclho, dc Bc-lérn, ondc lazia dc dez a dotc crnbarqucs anuais clc bovinos para abatc.

A pecuária A fasc Josó lúlio

O político José JulioNo município de Alrneirim, José Júlio nunca perdeu eleições. Na realidade

elc aprcsentava seus candidatos, dando total apoio. Dizem que ele preenchiafolhas dc votação e scus candidatos cram scmpre vil.oriosos.

Josó Júlio chegou a scr Scnador da República pelo Estado do Pará, tcndosido também Deputado no ano de 1908, no governo dc Augusto Montcncgro.A título dc informação, ïaziam partc da bancada daqucla ópoca alguns dcputa-dos quc t.iveram destaquc no ccnário cstadual, como: Moracs Sarmcnto, JoãoRodrigucs dos Santos c João Antônio Luiz Coelho. Ncssa ópoca o município dcAlmcirim tinha 10.500 habitantcs c sua rcccita orçada cra dc Rs 40.000$000 (*),scjam Frs 66.666 (**) ou L 2.666 1*+'*;.

Havia duas cscolas primárias, uma para cada scxo, mantidas pclo govcrno cloEstado.

Almcirirn cntão fazia partc da Comarca dc Gurupá c sua municipalidadc cracomposta do Intcndcnl.c c scis vogais. Suas povoaçõcs mais avançadas cram Es-poscndo c Arrayolos.

No ârnbito estadual, o maior inimigo político dc Josó Júlio foi o Gcncral Ma-galhãcs Barata, quc chcgou a prcndô-lo uma vcz, fato narrado num Lrccho tlolivro "Sobrc os Mosaicos do Infcrno", clc Josó Ribciro, ondc cstc conta as arbi-traricdacles do Gcncral Baral.a, transcritas a scguir:

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O cstilo c as monsíruosidadcs tocam-sc, mcdcm-scs:írio quc fiquc consignado: - "O Correio do Pará"

c sc idcntificam! E ncccs-c o prédio que scrvia dc

scdc ao P.R.F. foram diídivas voluntárias do político c milionário, Sr. Iosé Iúliodc Andradc.

E mais adiantc continua Josó Ribciro na sua narração:

A scguir chega a vcz do ofcrtan(.c do "Corrcio do Pará" c do pródio doP.R.F., o Sr. José Júlio, fazcndciro, Scnador c grandc proprictário no municí-pio dc AImcirim. Prcso c dc scnÍincla à visía no hospital D. Luiz, é iníimado a

cntrar para os cofres públicos com a quantia de quinhcntos e quarenta c oitoconlos, cm dinhciro, dcnlro dc vinlc c quatro horas, Enlrou e silcnciou.

A imprcnsa rcgional nada mcncionou. O Sr. Josó Júlio foi passcar no cslran-gciro, Iogo dcpois. Continuanclo sua narração, Josó Ribciro acrcsccnl.a:

Os fundamcníos dcsíc confisco são irrisórios c muilo parccidos com aquclcs

(*) Rs - Conto dc Róis

(**) Frs - Franco Suíço

1***) f - I-ibra Esterlina

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da tábula do lobo e do cotdeiro. Almeirim era o feudo e município do políticoextorquido. Se nas outras localidades, a castanha pagava o impõsto de 7|Vo, advalo,rum, na exportação desse produto, ali o mesmo imposto ela cobrado à basede 57o, fixado em lei aprovada pelo Congresso do Estado.

_ .9 novo regime via nisso gÍave espertcza e não se Iembrou que o Sr. loséIúlio - hanrando a indústria de seu município e particularmentei suas proprie-dades modelares - só exportava castanha beneÍiciada e de bom tipo, qie assimobtinha melhares preços na pÍaça, o que não sucedia com as outàs localidadesexportadoras do mesmo produto. Houvc por bem condenar o mcncionado polí-tico, arrgnjando-se então aquelc confisco, naquela conta de chegaÍ, ott seia, aprcsumida difcrcnça dc impostos que dcsta forma sc igualara, Íixando-sô em10o/o, arbitrariamcnlc, a coníar de cxcrcícios antcriorcs. A qucstão, como scvê, era de dinhelro, conclui assim a narração José Ribciro.

oftcNo município de Alrncirim Josó Júlio t,cvc na polírica inimigos ferrcnhos,

como por cxcmplo Raimundo Ncvcs c scu compadrc dc confiança, a que já nosrc-fcrimgs no capítulo sobrc a vcncla das fazcndas Aquiquí. O úlrimo piefcito deAlmcirim quc tevc o apoio dc José Júlio foi o scu sobrinho Cclson, que ganhouas cleiçõcs concorrendo com o candidato do scu compadrc inirnigo, ô quãl cha-mava-sc Sabá Moreira. Foi nesl.a época quc houve o assassinatõ do abvogadoSantarcno Ezcriel Monico clc Matos, notícia que o Jornal "Folha do Nortc"pu-blicou cm 26.07.50, cscrita por Encas clc Carvalho com o título "(Jm crimc pre-mcditado", a seguir Lranscril.o:

Um crinre prenteditado

Conscrvando ainda na rcíina o quadro dantcsco da inqualificiívcl sclvageria àqual assisíí hií dois anos, hojc, data quc assinala a lutuõsa ocorrência, co-mo umfcrrcíc marcando as consciências rópobras dos scus b:írbaros aulorcs, lrago aestas colunas o rclaío ficl do quc sc passou, dcslinatlo ao julgamcnlo dos lõirc-Ícs.

Precisamante às 2l horas do dia 25 dc julho dc 1948, salt:ívamos no trapichcde Almeirim, dc bordo da lancha "Anajazinha", o Dr, Ezcriel Matos, o Comis-sário dc Allamira Pancriício dc \al, o fiscal Olaviano Santos Filho, o fiscal gcralValdomiro Lima, o comcrcianlc Otir Sactala e cu, rumando Íodos para alcsi-dência do prcfcilo local, ondc fomos rcccbidos hospilalciramenlc.

As 24 ho,ras aproximaclamcntc, chcgou ati o cabo do clcstacamcnto quc, per-mancccndo à porta da casa, ordcnou quc chamasscm o Prefcilo. Esie, aiso-mando à sacada, cscutou o militar dizcr-lhc: "Para o scnhor mandar o comissií-

A fase José Iúlìo

rio de Altamira falar ao dclcgado c ao "scu" Ncvcs, no trapiche". O Prefeito,em virtude da hora avançada, mais dc meia-noitc, c prcvcndo maus intentos,respondeu que cientificasse ao scu superior a inconvcniência daquela ordem.No entanto, se assim quiscssc, podcria vir à sua casa, onde o comissário o Íece-beria na sala.

Momentos após, divcrsas pcssoas rcccosas dc rcsultados funcstos procura-vam o Prefeito, pcdindo-lhc quc rctivcsse scus hóspcdcs, cm virtude de coÍÍe-rem boatos denunciadores dc quc prcmeditavam o assassinato do comissárioPancriício. Sob a proLcção do chcfc da Comuna, autoridadc constitucional, nopleno gozo dc scus dircilos, cstariam cm scgurança.

Aos cinqücnta minutos cto dia 26, passou diante da moradia do Prcfcito o Sr.Scbastião Morcira, indo batcr à porta do balatciro Cíccro Freilas, vizinho da-quclc, pcdindo-lhc cmprcstado um riflc, scndo aícndido. Inslanlcs dcpois, àuma hora da madrugada, aproximaram-sc da rcsidência do Prcfcito cm atitudchostil o dclcgado Ìt[anuc] Valadarcs, Raimundo Ncvc^s, o cabo do destacamcn-to e três praças,

Parando cm frcntc cla casa, o ctclcgado bradou: "SÍ. Prcfcito, vcnha fa]ar co-migo!". Dcbruçando-sc no parapcito do ptÍtio dc sua rcsidência, o Prcfcitodisse ao scu intcrlocutor quc ali cstava às ordcns. Esíc cxigiu cm lermos ríspi-dos que lhc cntrcgassc "cssc comissiírio palifc". Qucria matá-lo, pois prccisavadcsagravaÍ o conlcúdo dc uma carta que dclc rcccbera. O prefcito pondcroucom seÍenidadc, aconsclhando calma. Tuclo poderia scr rcsolvido convenientc-mcnle de manhã. Promclcu acompanhar o comissário à Dclcgacia (convém Íri-sar quc Valadarcs, Ncvcs c Scbastião Morcira cslavam armados de revólvcr eriflcs). Não alcndcndo ao pcdido do Prcfcilo, o dclcgado rctrucou-lhc quc lcva-ria o homem de qualqucr jcito. Ncssc intcrim vcm até o piítio o Dr. EzericlMa|os e tcnta, com pal;tvras, apaziguar aquclcs ânimos cxaltados. RaimundoNcvcs, um dos comparsas dc Valadarcs, colocando-sc cm frcnle dc EzcriclMatos, afirmou quc ali esíavam disposlos a ludo c quc sc prcciso fosse, tcria oarrojo dc ir buscar o comissiirio no intcrior do lar quc o abrigava. Ezcricl, prc-vendo conscqüências funcslas, rcsponsabilizou-sc, pÍometcndo conduzir Pan-crácio à dclegacia ao amanhcccr. O dclcgado cxaspcrou-se com a atiíude dc

^scu^ç antagonistas, que conscrvítvam scrcnidadc c clcvttção de ânimo dianlcdcssa arbitraricdadc quc transgrcdia os disposilivos da Lci. Ncgando-sc a uniraos scus própositos, pcrgunlou com qucm cslava falando, rcccbcndo do inlcr-pclado a afirmação quc cra advogaclo. A autoridaclc policial rcplicou quc nãovicra ali com disposiç[io dc obcdcccr il advogado c nclc via apcnas um inlrujão.

Ezericl, sem pcrdcr a noção do scu dcvcr, rcnova o pcdido dc calma, lcndo opos^sc.sso dclcgado resportdido: "Não qucrcm cnlrcgar o homcm, cnli,Io Il vüi",e virando-sc para íriís, susltcndcu os braços c ordcnou: "[ogo!"; ncssc inslanlctcve início o |iroício.

79O político José Júlio

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80 O político José Júlio

Surpreendido com o fato, corÍi para a sala, deitando'me no assoalho parlli-,rur-re das balas que silvavam em torno de nós. A dois passos de mim, vi Eze-

riel tombaÍ e me d^i"tr: "Carvalho, o Neves matou-me. Reajam!". Arrastei'meaté a cozinha e ao tentar mc levantar fui aíingido por uma bala no couro cabelu'

do, de cujo ferimento se esvaía o sangue, O Prefeito, acompanhado de sua es'

lo'tu e días filhinhas, a cozinheira, duas famílias que ali se encontravam refu''Siuàut e eu, jií sentindo me fugirem as forças pela perda de sangue, ficamos dei'tados no cimento daquele cômodo da casa.

Após vinte minutos de ataquc ccrrado, scm que tivésscmos aÍmas para en'frentar a sanha dos ignomin-iosos agrcssoÍes, a rcsidência do Prefeito foiíomada dc assalto pelõ delcgado, Raimunclo Ncvcs c José Batisla, que ali p,clc'traram armados. O att"gado, cmpunhanclo um Ícvólver amcaçava o Prcfeito,scndo obstado na sua fúiia homicida pcla advertôncia da csposa deste que, num

Íasgo dc coragcm, dissc: "olhc o quc o scnhor vai fazcr". colocando a arma na

ciríura, vociícrava quc queria o còmissiírio. Armado dc riflc, Ncvcs esbravcja'va: "Entreguem o comisstírio, scnão maío aíé as galinhas!". As famílias presen-

tes a estas ccnas canibalcscas grilavam, tomadas dc ncrvoso. O Prcfcilo, impos'sibililado dc rcação e dcfcsa ao scu domicílio violado, comunicou aos lransgres-

sores da Lei t dot dircitos que lhe assistiam, quc o comissiírio por elcs rec.la'

mado se entregava naquclc momcnlo às suas mãos. Solicitou então a Pancnícioque os acompanhasse, apelando àquelas feras revesíidas do poder, num esforçode tocar os5cus sentimcn'tos humanos, quc poupasscm torturas físicas ao prisio-neiro. Ncssa ocasião novo tiroteio alvcja a casa, Nevcs ordcna a cessação do

fogo, pois já tinham aprisionado a vítima da sua fúria.

Consumada a tragéctia e o scu intcnto satisfcito, rctiraram-sc do local quc

acabavam dc manchár de sanguc inoccntc, conduzindo o comissário. O Prefeito

acompanhou-os, scguido da õsposa, alarmacla e ícmcrosa pcla vida do marido.

Scntindo-me pÍesa dc acentuado mal cslar, dirigi-me à despcnsa cm busca de

meios dc curatiio para mcu ferimcnlo quando prcsscníi no mcu cncalço os per'seguidores. Tranqïci-mc Iií dcnlro. Ouvi crtlão uma voz do lado dc fora dizcr:,,Ãbra essa port-a!" Não tcndo atcndido Iogo, apl.icaram violcntas coro'nhadas dc fuzil. Abri a porla e vi dois soldados dc baioneta calada, em aíitudes

agrcssivas. LÍm dcles, icndo-mc cnsangücnlado, pcdiu ao outro quc mc dcixas'sc cm paz, pots já estava fcriclo. Ambos se rctiraram, scguindo para a Delega'cia. Encaminhcí-me à sala c verifiquci ncssa ocasião que Ezcriel estava morto,

vítima indefesa e inoccnlc da aíroòictadc daquclcs sicários. Sentindo a rcvolíaprópria de quem assistc a uma ccna biírbara c sangrcnta, sem nada mais podcr'fazer pcto âmigo, cujo alcnto dc virta úíil à família c à PiíIria sc cxtinguira dc

modo tão brusío, fu-i novamcnlc surprccndido pcla ordem ditada cm voz alÍapclo cabo Fcdcralino aos solclados do dcslacamcnto, que rondavam a casa'sobrc

a qual baixava o cstigma dos dcsmanclos da auloridadc local. O dclcgado

A fase losé lúlio

decidira que os policiais deviam "levar o Carvalho vivo ou morto" à sua presen-ç4.

Em vista do que presenciara e ouvira, escapei-me pelos fundos da casa, con-seguindo chegar à margem do rio, onde apanhei uma canoa que me levou aArumanduba, sendo ali medicado às 3:45 horas da manhã, fora do alcance doódio criminoso daquela horda de desordeiros que faziam das rédeas o flagíciode pessoas indefesas e alheias aos seus caprichos de déspotas.

Ezeriel Mônico de Matos Iá ficara prostado por mãos assassinas que a justiçado Céu não poupará. nos ^eeu^s decretos inexoráveis, azorragando as consciênciasdenegridas dos autores do nefando crime com o ÍemoÍso inevitável que osacompanhará pela Eternidade imensa, como imenso foi o seu delito,

A posteridade, num ato justiceiro exaltando a memória do mfutir imoladonesse dia de tétrica lembrança, associando-se à dor de seu pai, esposa e filhosextremosos, clamará vindicta amaldiçoando oi nomes dos carrasco.e que corta-ram o fio da existência daquele pranteado cidadão, em cujo peito ardia a chamade um ideal nobre e sacÍossanto.

Com o seu sangue geneÍoso ficou, porém, gravado indelevelmente erh nos-sos coÍaçÕes o DEVER de lutaÍ pela Redenção do Pará.

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Avenda paraos portugueses

José Júlio retirou-se em definitivo da região do município de Almeirim no

ano de 1948. Os motivos foram â sua saúde abalada e fatos como o que acaba-

mos de- narrar, os quais foram fazendo-o cada vez mais desgostoso, como disse a

uma pessoa de sua confiança por nós entrevistada.

No Rio de Janeiro, onde possuía residência à rua Joaquim Murtinho' no

bairro de Santa Tereza, José Jttio viveu seus últimos dias, vindo a falecer em

iúnno de 1952 na Ilha da Madoira, Portugal. Foi enterrado no Rio de Janeiro.

No Rio de Janeiro saía muito pouco, a não ser aos domingos para pa_ssar o

dia na casa de sua companheira Zizinha. Com sua esposa legítima, Dona Laura,não vivia bem. Passavãm até um mês sem se falar, e quando o faziam era na

maior cerimônia, com o contato feito primciramentc pelos empregados, sendo

que o encontro era na sala, cada um nã sua cadeira. Dorta Laura o chamava de

Ôuroru, e toda vez que era comunicada por um empregado do desejo de José

Júlio querer falar-lhe algo, dizia: "O que o Cazuza está qucrendo?"

Estas conversas não iam mais do que meia hora, sendo que em seguida cada

um ia para o seu lugar separado na cãsa muito grande,. de três andares. Tinhamcada um seu carro cbm motorista particular e nunca saíam juntos.

Quanto à sua companh eira Zizinha, possuía casa ainda maior e mais bonitaque a de Dona Laura.

Quando José Júlio vcndeu a sua emprcsa para um grupo de portugueses,

Dona Laura demorou muito para assinai os documcntos c o Capitão Crispim,que era também seu sócio, pcrmaneceu na sociedadc com o novo grupo.

PARTEItrA fase portugueses

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A fase portugueses

Os novos sóciosfase portugueses, como denominamos para caracterizar os aconteci-mentos, iniciou-se no ano de 1948 e terminou precisamente no dia 20de março de 1967 , com a venda da Jari para o norte-americano Da-niel Keith Ludwig, assunto do próximo capítulo.

Dizem que além dos motivos já mencionados, José Júlio desfêz-se dos seusnegócios devido a um débito com a firma J. Fonseca, sendo aconselhado porseu advogado de nome Otávio de tal a vendcr a empresa, embora a dívida fosseirrisória comparada com o seu patrimônio. A escritura de venda foi lavrada nodía 24 de dezembro de 1948 pelo Tabelião Edgar da Gama Chermont de Belémdo Pará; e registrada no cartório do Registro de Imóveis da Comarca de MonteAlegre sob o ne 829, folha 7 do livro 3-E, em 14 de janeiro de 1949, pelo Tabe-lião Acylino d'Almeida Lins. O valor global da transação foi de Cr$ 625.000,00(Seiscentos e vintc e cinco mil cruzciros).

Os portuguescs quc faziam parte da sociedade eram os seguintes:Joaquim Nunes de Almeida, que diziam ser o cérebro das decisões e residia

dirctamentc na árca da cmpresa, na localidade dc Jarilândia; Antônio Teixeira,José Joaquim Martins, Júlio Aires da Fonseca, José Antunes Fonseca e CrispimJoaquim de Almeida, o Capitao Crispim de histórias já relatadas da fase loséIúlio.

Crispim teria continuado na socicdade por ter um saldo com José Júlio. Poroutro lado a aceitação dc Crispim como sócio foi talvez devido ao seu conheci-mcnto dos negócios relacionados ao ext.rativismo, quc os portugueses continua-ram a praticar, com algumas evoluções. Além disso, Crispim entrou com tcrrasque em área reprcsentavam aproximadamcnte 40 mil hectares, situados no RioCajari (antigo Território Federal do Amapá) e no Pará, na margem esqucrdado rio Amazonas, entrc os igarapés do Arrozal c Fugido. Atualmcnt,c cssastcrras ent,re os igarapós do Fugido e Arrozal foram vendidas pcla EmprcsaAgropecuária Rio Cajari para um cidadão dc nome Sabá Lúcio.

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t6 Os novos sócios

*ï$$i'#' iffi' ,ffiJoaquim Nunes Almeida, um dos sócios portugueses, que residia diretamenle na Jari.

José Júlio transferiu para os portuguescs (com exccção da fazenda Aquiquí,negociada anteriormente) todo o seu vastíssimo território, as vilas residenciais,frota de embarcações, galpões e os negócios em geral, baseados no extrativis-mo.

J D 'I

Comparando a fase portugueses com a fase losé Iúlio, os primeiros forammais empresários, apesar dos negócios, os métodos e a maneira de tratar os em-'prcgados, t,ivessem continuado quase os mesmos. Os portugueses restringiramccrtas liberdades aos empregados, como por exemplo: na fase losé ltÍlio, a

qualquer hora quc sc chcgasse a Arumanduba o restaurante atendia o funcioná-rio ou qucm cstivcsse com fome. Também as notas quinzenais requelendo mer-cadorias cram atcndiclas, quase sempre na sua totalidade. Os portugueses co-

A fase portugucses

meçaram a cxercer maior controle sobÍe este tipo de situação. Chegavam até aerrar no corte de certos materiais, servindo de gozação para os funcionários,como o caso do carpinteiro que solicitou oito quilos de pregos de uês polegadasao senhor Aires, Gerente de Santana do Cajari, que em vez de cortar os quilosde pregos, cortou as polegadas; o carpinteiro the disse: "o senhor não nega queé mesmo português..."

Por outro lado, os portugueses foram mais libçrais. Na fase losé ltÍlio asáreas eram mantidas na maior privacidade. Até para pescar era preciso uma au-torização e o pescado destinava-se exclusivamente à alimentação local, não po-dendo ser negociado para fora da ârca. Os portugueses liberaram a área emtodos os sentidos, tanto econômica como politicamente.

Ao contrário de José Júlio, que não deixou descendência com a esposa nemcom a companheira, nasceram algumas crianças, filhas dos portugueses, queapesar de não reconhccidas foram bem tratadas pelos mesmos.

Basicaments as emprcsas que formavam a Jari na fase Portugueses foram:

Iari Indústria e Comérclo, que era a de maior volume de negócios, abrangen-do a comercialização da maioria dos produtos nativos.

A Companhia Industrial do Amapá, com sua sçde situada em Jarilândia, namargem esquerda do Rio Jari, próximo à loz do Amazonas, que tinha a finali-dade de industrializar toda a Castanha do Pará produzida nas terras da Jari e

circunvizinhança.

Por últim o a Companhia de Navegação lari S/A, composta pelas mesmasembarcações da fase losé lrúlio, em número de quatorze, entre navios e empur-radores. A finalidade desta empresa era suprir o fluxo de produtos nativosentre filiais e sedes, como Arumanduba e Jarilândia e destâs para o porto deBelém, que era o principal mercado comprador.

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Os novos rumos da Jaricomo vimos, os portugueses exerceram uma atuação mais empresarial com-

parada à fase anterior, no que concerne a controles em geral e principalmente àabertura de novos negócios que não eram explorados por José Júlio. Por excm-plo, a exportação de madeira para Portugal e Inglaterra, cujos portos de embar-que eram Jarilândia e a ilha do Cajari, no Rio Amazonas.

Das atividades exploradas por José Júlio, com exceção da pecuária, que che-gou a 25 mil cabeças, os portugueses excederam em produção todos os demaisncgócios. Como exemplo citaremos a produção de castanha do Pará, que ape-sar de ter alcançado em uma safra até75 mil hectolitros, os portugueses chega-ram a 77 mil.

Apesar de José Júlio ter colaboradores leais, o dono é sempre o dono, po-dendo tomar decisões impossíveis de scrcm tomadas pelos empregados, pormedo de resultados insatisfatórios. Pela análise que fizemos, entrevistandovárias pessoas daquela época, sentimos que a Jari de José Júlio começava aentrar em declínio. Apesar de gostar muito da sua empresa, cle teve a lucidezde desfazer-se em tempo da mesma, antes que problcmas mais sérios aconteces-sem.

Rcsidência fu época dos Portugueses na localidade de Jarilôndia.rcs.çtenctct cut ePoca aos rorruS,ueses na

Os portuguescs, ao contrário de Joséárca da cmprcsa. Logo após o negócio dainvcntário dc todo o accrvo da cmprcsa,

Júlio, vicram morar diretamcnt.e nacompra tcr sido rcsolvido, fizeram umacompanhado por quatro sócios, ini-

A fase porlugueses

ciando pcla Matriz Arumanduba. Nestc local a administração era constituídado gcrente Otávio Cabral, subgerentc Raimundo Nonato Bcntcs, guarda livrosBcnto Marques de Abreu, escril.urário José Bczerra de Andradc, caixa rcgistra-dora Pcrciliana Albuquerque, caixeiro viajante dc Belém, Huascar Port.ugal,classificador de produtos regionais José Ciríaco de Andrade Oliveira, e o capa-taz geral José Januário Gomes, o "Sombrcira", pcrsonagem que já conhecc-mos.

Após o inventário gcral, foi expcdicla uma circular cxplicando como seria ofuncionamcnto da emprcsa e qucm seriam os responsáveis pelas diversas fren-tcs dc trabalho. Ficou então estabclccido quc ficariam cm Belém AntônioTcixcira c Josó Joaquim Martins. Em Jarilândia Joaquim Nunes dc Almcida,no Cajari Júlio Aires da Fonseca e em Arumanduba Crispirn Joaquim dc Al-mcida, o único sócio não portuguôs c dcsccndcnt"c da fase,l'osi hilio.

Os portugucscs foram a fundo, como se diz na gíria, cm lodos os ncgócios. Opróprio Crispim tinha duas mil cabcças dc gado na fazcnda Pirancma quc nãocram da socicdade com José Júlio c ncm com os portuguescs; mas as tcrras pcr-t.cnciam a José Júlio c portanto à nova socicdadc. Crispirn Lcvc quc rctirar ogado da fazenda e os port.ugucscs imcdiatarncnl.c lá colocaram animais pcrten-ccntcs à socicdade.

Nas filiais, onde aconl.ecia o aviamcnto clc mcrcadorias c rcccpção dos pro-dutos produzidos, o comórcio foi suprido corn novas mcrcadorias c cm quanti-dades maiorcs quc na fase Iosé Iúlio.

rJD'I

A cxportação dc madcira para a Europa foi scm dúvida um dos maiorcs nc-gócios da fasc Porlugucscs. Para sc lcr uma icléia do volumc dcstc comércio, osportugucses faziam ctnbarqucs mcnsais cm quc às vczcs haviam ató trôs naviosno porl.o dc Jarilândia cspcrando carrcganìcnl.o. A madcira cra cxportada cm[oras, toda cla dc cssôncias dc v'ítrzca, como a Macacaúba (P/astymiscium ulcÍ)e a Sucupira (Bonwdichéa nitida) quc cram as mais valorizadas, rcccbcndo umlavramcnto a machado para ret.irar as cascas das partes brancas c os nós. Osportugucscs chcgaram a tcr duzcnl.os homcns no lavramcnto dcstas madciras.

A Macacaúba, apcsar de scr uma espócic dc v'á,rzea, afunda, cnquant.o amaioria das cssôncias tcm boa flutuabilidadc. Era prcciso cngajá-la na praiaquando a maré estava baixa, com toras dc Anin ga (Montrcchardia arborcsccns)para quc pudcsse flutuar. As outras cspócics cxportadas eram a Andiroba (Ca-rapa guiancnsis) e o Cedro (Cedrclla adoraía), cst.c cm rncnor cscala.

Em Jarilândia também foi montacla urna scrraria para o bcncficiamcnto dctábuas, pcrnamancas c vigas, scndo csta rnadcira utilizada nas fazcndas dc gado

E9

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9l

c també,m vendida a qualquer interessado, independcnte de ser funcionário ou

não da companhia' 'a nâviíìq nciona l' sendo a cuba-

A madeir a eÍaembarcada nos navios acionada pelo guinchc

gem fcita no exato momento en' que chegSva ao cónvés do navio' O transporte

da madeir. puruio r;;;i oo emuariúïiá"rriro a braço; trabalhavam em dias de

cmbarqu. upro*itãOãt.nte duzintos homens em turnos diurnos e noturnos'

;; p;., utê qu. toou madeira estivesse dentro do navio.

JÚÚ

Quando os portuguescs che.garam cm Arumanduba' cncontraram os galpões

cheios de balata " .ãrtunt a oei-*ãoos por José Júlio. Foram feitos também gran-

dcs embarques de gado para Belót, , tudo cra acompanhado por um dos sócios

designados.

NafaselosélúIio,osgerentesdasfiliaistinhamodireitodeabaterduasrcses por mês, sendo a carne

".nãiOï para os frcgucses' Os portugueses acaba-

ram com este negócio c porro** a manOat chaiquc e Piraru.cú pa? as. filiais'

tcndo havido quinzena de Arumanduba comprar ité dez toneladas de Pirarucú.

Na época Oe foié Júlio o Pirarucú só era comprado na Scmana Santa'

Em Jarilândia foi COnstruída uma carrcira para consertos de pequenas e mé-

dias embur.uçOãr. Èoi assim que a lancha lanary {-'.19t'que estava a sete anos

no fundo do Rio Arraioros rpoirupóisriçao de Jósé Júlio, como já vimos) foi re-

cuperada po, *rgulhadorei rontiutados, quc a tiraram do fundo.

Em Arumanduba foi montado um engarrafamento de cachaça' tendo sido

adquiridas duas pipas_com .opo.loãár fuïu 20 mil litros cada uma. Esta cacha-

ca. depois de engarrafada e rotulada, eia acondicionada em caixas de 48 gaÍÍa-

il; ; ã;"ããou pãtu as filiais, onde era vendida'

úflo

Na frota de embarcações foram fcitas algumas melhorias, como a substitui-

ção do sistema de caldêira a fogo, por motores a diesel' O navio Sobralense

(hoje Rio 1arífôì ilp;rudo peús pottugueses como se fosse um navio de tu-

rismo, fato que provocou crumada ônUe os sócios' cada um querendo mandar

mais que o ourto. úouu, até desentendimento entre José Martins' Joaquim Al-

rnòidu'. Crispim. O caso foi o seguintc:

A cmbarcação estava de saída da cidadc de Belém para Arumanduba' quan-

do o caixciro viajantc Huascaip*ú^f- recebeu ordem de Josó Martins' sócio

quc rcsidia cm gïtCm, para não dar ã chavc do camarote especial a ninguém'

ncm mcs,.,.,o poiu-o, ,'o.io, quó irabalhavam em Arumanduba, Jarilândia ou

Cajari.

Após descarregar toda a mercadoria em Arumanduba, o navio carrcgou com

produtos para ,rtãrn., a Belém. Joaquim de Almeida, um dos sócios' resident'e

ãm Arumãnduba, necessitava viajai até a cidade de Gurup_á juntamentc com

José ciríaco, para resolver probtemas da companhia com aJustiça daq-uela ci-

dade, situada no .u1ninho pára Belém. Ao chegar a bordo' solicitou de Huascar

Portugal a chave do camarote especial. Portügal respondeu que não sabia da

chave. Almeida desconfiou e imõdiatamcnte sãiu do navio muito aborrecido'

dizendo que naã uiãju.iu mais para Gurupá. Em seguida. chamou o comandante

e deu ordìns para qüe deixassé Ciríaco em Gurupá, pois sua presença era nc-

cessária para iesotv-er problemas de interessc da empresa.

No outro dia os três sócios quc residiam nas linhas de frentc reuniram-se em

Arumanduba para discutir o pìoblcma do camarote cspecial do Rio lari' Em

seguida partiram para rcsolver-o problcma com os sócios dc Belóm' Na reunião

José Martins oissJqu" rortugal hãvia feito a confusão c por isso quasg foi demi-

tido, mas Crispir irttucou:-"Vocôs são donos de uma banda do navio, a outra

banáa é nossa';. E assim terminou o inciclcntc'

A fase Portugueses

úúJ

A casa de José Júlio em Arumanduba era pintada a cada dois anos com tinta

a óleo branca. Os portugueses, como medidã de cconomia' rasparam a tinta.e

;;r*r". u fintu, .o* õal. Em Arumanduba, durante a fase losé lúlio, havia

abate de gado toáo, os dias. Os portugucscs passaram a abater somen1e em dois

dias da semana.

católicos praticantcs, os portugucses construiram uma capela de madeira em

Arumanduba, cula padroeirã etuïossa Senhora de Fátima. Gostavam de dan-

iut, ràt não iumavam nem tomavam bebidas alcóolicas.

Foi instalada radiofonia nas principais filiais, como Jarilândia, Caracurú, Ça.

choeira, Santana do Cajari e outras. O tetOgrafo do tempo de José Júlio foi

substituído por ráOio Vfíf falando diretamente com Belém e com as filiais' ha-

vendo portanto um grande avanço nas comunicações da empresa'

outra medida tomada pelos portugueses foi o rodízio dos funcionários entre

as filiais a cada dois anos.

Na fase Portugue.ses, os funcionários sabiam quanto ganhavam' embora re'

ccbessem em mercadorias. As notas eram atcndiãas de ácordo com o valor do

salário. Porém qu*]" alguém adoecia, scndo empregado ou membro da famÍ-

lia do funcionário, os portugueses davam total apóio. Se.necessário mandavam

ôãò.nt. para Ucióm e não õobravam do cmprcgado o valor do tratamcnto'

Os novos rumos da Jari90

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92 Os novos rumos da Jari

ioD

Os portugueses também se envolveram em política, só que não declarada-mente. Davam suport.e material e financeiro para os seus candidatos, comoaconteceu com Adolfo Macedo, que era funcionário da empresa e foi eleitoprefeito de Almeirim. Nas eleições para Governador do Parâ, quando concor-reram o General Barata e o General Zacarias de Assumpção, os portuguesesapoiaram este último, que foi vencedor. Josó Júlio havia sido político atuantena região e inimigo ferrenho de Barala, mas acreditamos que os portuguesesapoiaram Assumpção indiferentes à esta inimizade.

DOD

Durante a fase Iosé lúlio, na época dc Natal c Ano Novo todos os emprega-dos recebiam um rancho e produtos natalinos. Na ïase Portugueses, apcnas apessoa que liderava um grupo reccbia para distribuir com os demais seis refrige-rantes, uma garrafa de vinho c uma lata dc goiabada. Isto era mais para o pes-soal que trabalhava no cscritório ou nos dcpósitos dc mcrcadorias.

Em síntese: pclo quc pcsquisamos, os cmpregados cram mais saudosos comrelação à Fase losé Iúlio, pclos motivos expostos acima.

A fase portugueses

A tentativa agrícolaNa fase Portugueses já existiu um maior interesse em produzir alimentos,

como também racionalizar a exploração de produtos. Na fase losé hilio haviasimplesmente o extrativismo.

Os portugueses tentaram cultivar produtos como a pimenta do reino, o ca-cau, a seringueira e aJé mesmo o café. A área escolhida foi a filial de Santo An-tônio da Cachoeira, por apresentar solos muitos bons. Foram então derrubadasmil tarefas de mata virgem (equivalente a 303 hectares) e plantadas as seguintesculturas:

56 mil pés de seringueiras, cuja semente foi trazida das plantações deFordlândia, município de Santarém, no baixo Amazonas.

35 mil pés de café, com mudas vindas de Belém.

l0 mil pés de cacau, com mudas vindas de Belém.

l0 mil pés de pimenta do rcino, provavelmente com mudas vindas deTomé Açú, também no Pará.

Este projeto tinha financiamento do Banco do Brasil, o qual fazia vistoriasperiódicas. O responsável pelo manejo do projeto era Antônio Barbosa, quenão era agrônomo e nem técnico. Barbosa desentendeu-se com os portuguesese saiu da Companhia. Daí em diante as plantações foram abandonadas, semtratos culturais. Quando Orlando Barreto assumiu a filial de Cachoeira aindafez algumas limpezas, mas o mato já havia tomado conta da área, com prejuízosirreversíveis.

Por falta de melhores informações, não sabemos se o insucesso do projetodeveu-se somente à falta de tratos culturais ou se houve alguma doença nasplantaçÕes, principalmente nas seringueiras que não foram enxertadas; as se-mentes eram provenientes de local onde havia o Microcylus huley, que dizimouos seringais de Fordlândia. Esta tentativa agrícola aconteceu no ano de 1950,dois anos após a compra da Jari pelos portugueses.

Culturas de ciclo curto, principalmente o milho, foram produzidas por Or-lando Barreto em grandes quantidades, sendo que a alimentação dos burros detodas as filiais era produzida em Cachoeira. Além do milho, produzia-se feijãocanário e branquinho, tabaco e frutas.

Na filial de Água Branca, que possui solos também muito bons, os portugue-ses tiveram mais sucesso na agricultura, financiando os colonos para o preparodas áreas de plantio, fornecendo ferramentas e sementes e com a garantia dacompra da prõduçao. Água Branca foi uma colônia muito produtiva-, chegandoa produzir até trinta toneladas de farinha de mandioca por mês, que eram com-prãdas pela Companhia. Além da farinha, Água Brancã fornecia feijão, milho,tabaco e grande quantidade de frutas, principalmente laranja.

93

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94 A tentativa agrícola

Na fase losé Júlio, esta filial tinha como gerente José Miranda, genro do Ca-pitão Crispim e só vivia do extrativismo. Na fase Portugueses, assúiu a gerên-cia Antônio José de Almeida, filho de Joaquim Nunes de Almeida, um dós só-cios da Companhia.

A fase portugueses

A indushriatizaeãoda castanha

Na fase Portugue.sc^s a castanha, juntamente com a exportação de madeira,foi o negócio que mais investimento teve, haja visto ter sido montada em Jari-lândia uma fábrica de bencficiamento, com incentivos do Governo.

O processo de coleta da castanha é rudimcntar, trabalhoso e sobrctudo peri-goso. Constantementc acontecem acidcntcs, quasc todos fat,ais, pois um ouriçoque pesa em média um quilo, ao cair dc uma alt,ura de trinta metros chega aochão com um peso de proporções mortífcras. No decorrer dos anos na área daJari, são inúmeros os casos de acidentcs fatais provocados por ouriços que aocair, atingem os castanheiros em locais mortais, principalmcntc na cabcça.Aconteceú em Água Branca com o cidadão dc nomô JoãoBarrcto, quc um ou-riço ao cair dentro dc scu panciro, quc já cstava com carga dc sctcnta quilos,quebrou sua coluna vertcbral, causando-lhc a morl.c.

O castanheiro na mata junta o ouriço, quc é colocado no panciro preso poruma correia às suas costas, utilizando um utensílio chamado cambito. O cam-bito é feito com um pedaço de madcira vcrde com diâmctro entre 5 a 8 cm,tendo uma das extremidades cortadas em formato de cÍü2, com profundidadede l5 cm e amarrado à base de inserção para que as scçõcs não venham a par-tir-se e dando abcrtura quc comporte o ouriço, o qual é preso por esta espécicde mão mecânica e jogado no panciro prcso às costas.

O castanheiro pcrcorre os castanhais junt.ando os ouriços c vai colocando aprodução em local próximo a um lronco de árvorc ou pcdrcgoso para scrvir dcsuporte para a quebra do ouriço c rcl.irada das castanhas. A qucbra do ouriço ófeita com um machado pcqueno. Um castanheiro colcta em módia por dia atéseis hectolitros de castanha c carrcga no panciro até setcnta quilos de pcso. Atítulo de informação, um ouriço contóm dc 20 a 50 castanhas c scu pcso variaentre 600 a 1000 gramas; um hcctolitro de castanha (100 lts) dcpois de scco pcsasetenta quilos, havendo portanto uma qucbra de 30o/o. Os compradorcs dc cas-tanha da época rcccbiam do castanhciro 120 litros c pagavam apcnas 100 litrospor causa da qucbra.

O castanheiro, ao chcgar no local da vcnda das castanhas ao pat.rão, procediasua lavagem cm panciro; as quc flutuassem cram rctiradas, por cstarcm chô-chas. Em seguida o comprador retirava ao acaso ccm castanhas e cortava-as aomeio para vcrificar as quc esl.avam em proccsso dc putrcfação, ou com a amôn-doa cozida, por tcrem ficado cxpostas ao sol. O resultado do cortc era o valorque deveria ser diminuído da entrcga do casr.anhciro, como por cxcmplo:

.De vinte hectolitros foram cor[adas ccm castanhas ao acaso c quinze cstavampodres; a quebra scria dc 15o/o sobre os vintc hcctolitros.

Ao chegar nos depósitos dos compradorcs, a castanha era cspalhada no as-

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Page 50: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

96 A industrialização da castanha

soalho para que secasse, até atingir a umidade entre 1l a lSVo,Qtando era feitauma nova triagem de castanhas podres e cozidas. Este serviço, no tempo dosportugueses, era feito principalmente por mulheres, embora homens tambémirabaúassem nele. Dos depósitos a castanha era vendida para Belém, sendotransportada a granel no porão e convés dos barcos. O descarregamento erafeito com paneiros, despejando na carroceria de caminhões, que era cubado e

fazia a transformação para hectolitros.

Os portugueses tinham intenção de beneficiar toda a castanha produzida_naJari e iambém a produção dos municípios vizinhos. Para isso foi erguida em Ja-

rilândia, margem esquerda do Rio Jari, no então Território Federal do Amapá,uma construção em alvenaria, com armação para cobertura em seção de ferro.Foram montadas estufas para a desidratação da castanha, a fim de que a mesmaficasse com umidade adequada para conservação. O plano era exportar em

casca com umidade adequada e descascada, porém, desidratada e polida.

Com a venda da Jari para Daniel Ludwig, os americanos ainda tentaramlevar em frente o projeto, mas desistiram do negócio e a castanha, que poderiater dado mais um passo na região da Jari no que tange a melhor tecnologia, co-mercialização e sobretudo empregos para os habitantes de Jarilândia, conti-nuou do mesmo jeito da fase losé lúlio.

A fase portugueses

A pecuáriaComo no tempo de José Júlio, "o boi continuou criando o dono" na fase dos

portugueses, pois não houve nenhum avanço zootécnico que viesse melhorar aqualidade do rebanho, não só na parte de reprodução como também no manejoe tratamento sanitário. Mais uma vez citaremos a dedicação dos capatazescomo Felinto Camelo, João da Mata, Raimundo Uchôa e outros mais, que jun-tamente com seus vaqueiros, evitavam maiores prejuízos, principalmente naépoca de inverno.

Esses servidores utilizavam todos os meios para medicar os animais, já quenão tinham orientação de um veterinário, sendo que muitas vezes os tratamen-tos eram até certo ponto extravagantcs, como veremos a seguir.

Para a broca continuava o mcsmo l.ratamento do te mpo de José Júlio, queconsistia em furar o chifre com uma verruma, colocar no orifício querosene oubenzocreol, tampando em seguida o orifício com um torniquete de cedro (Ce-drella odorata) ou com cera dc abelha.

A desinteria cra tratada com o sumo da casca do tachí (triplaris martiana),Goiabeira (Psidium guajava L,) e Taperebâ (Spondias lutea t.). Quando ocurso não era infeccioso resolvia o problema.

As bicheiras que geralmcnte apareccm no umbigo dos bezerros recém-nasci-dos, provenicntes das larvas de moscas, principalmente da varejeira (Cochlio-mya macellaria), eram tratadas com creolina pura ou misturada com estercoseco ou barro embutida no local da bicheira.

A mineralização não existia; o gado comia barro nas margens dos igarapés edos rios, ou atrás dos lavatórios das casas na época de verão, onde bebiam aágua salobre que escorria das lavagcns dos alimentos, formando lamaçaisdevido ao pisoteio.

Na realidade, sc não fosse a riqueza das pastagens, readubadas anualmentepela enchente dos rios, teria sido difícil fazer pecuária naquela época.

Os portugueses se limitaram a fazer pccuária na várzea, não tendo portantopastagens cultivadas que necessit.assem de conservação e cercamentos, a nãoser nas savanas das regiões dc Saracura e da Velha Pobre, que utilizavam o fogopara fazet a limpeza do campo. Ncstas áreas de Savana, que somavam aproxi-madamente oito mil hectares, na ópoca de inverno uma parte do gado subia atoque para estes campos, ficando a maioria do rebanho no regime de marombasnas áreas de várzeas.

Nas savanas os animais livravam-se da água, mas não de outros perigos,como as onças, que davam muitos prejuízos. Nos anos de 1962 e 1963 uma onça"Sussuarana Maçaroca", como é conhecida regionalmente por possuir um tufode pêlo na ponta da cauda, de coloração vermelha e o lombo preto, matou siste-

97

Page 51: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

A pecuária

maticamente duas reses por semana, sem que os vaqueiros,loT. bons cachorros

acostumados a caçar onça, obtivessem êxito na sua caçada' No dia em que a

rrg. foi caçaãã, ó .upâtaz deu folga para_todos os vaqueiros, sendo abatida

uma rês para óomemotar o aconteciúnio. Na realidade a onça foi caçada com

ã-uiuA" Oos óacnorros que seguiram seu rastro, fazendo-a subir em uma árvore'

Os cachorros, qoãnOo no "n.ãtço

de onça, têq pelo m:ngl dois tipos de latido;

um quando a m-esma ainda está correndô no chão, (o latido é-descompassado-e

irenético); o outro quando a onça já está trepada na árvore (ele emite um latido

ãoÃpurtáOo, ottranáó prtr cimã1. O caçado;.d9 onça experiente distingue pelo

fufiOã dos cachorros se a onça ainda está no chão ou trepada em árvore.

úoD

o controle de uma fazenda consistia em contar o rebanho uma vez por ano.

Diú;;;-q;; "* ornu dererminada fazenda, no finat do ano foram contadas mil

õutúur. Ì.io decorrer do ano seguinteforam vendidas duzentas cabeças e nasce-

,u^ ír"r"ntos bezerros. A conía era feita sem incluir os nascimentos do ano e

,ir pur. bater as mil cabeças que tinham sido entregues ao capataz' ou seja: Mil,esei"recebidas, menos dúzenìas cabeças vendidas, teriam que dar oitocentas

.á6ãç.r, porém foram contadas somenie ?80 cabeças. A diferença de vintc ca-

beças para comptetàr as oitocentas era a mortalidade do ano. Esses controles de

mortalidade e nascimentos.eram avaliados pelos portugueses e não estando de

acordo com os seus planos, demitiam ou transferiam o capataz da Ïazenda.

A castração dos machos de dois a dois anos e meio acontecia no mês de outu-

bro, quandó o verão estava no seu auge. Este era o momento dos bons laçado-

res demonstrarem suas habilidades. Os animais eram reunidos em um descam-

pado, sendo que o macho a ser castrado era retirado do meio do rebanho. Fora

do seio de manada, o animal corria para fugir do laço de dois-vaqueiros, sendo

convencionado quem deveria fazeí a primeira t,entativa de laçá-lo. Uma vez

laçado o garrote, "tu

colocada a peia pelo outro vaqueiro, que ficava montado

com a cord"a retesada, enquanto um ierceiro vinha fazet a castração a faca,

guardando em r.gúiOu'os tôstículos numa saca, para serem depois preparados e

saboreados por todos.

Esta folia, apesar de divertida, causava também muitos acidentes, devidos ao

rompimento'de umabarrigada da sela ou um tropeço_do cavalo no terreno irre-

gular, cauSado pelo próprio pisoteio dos animais. Houve um ano que em uma

dessas folias u.ãnt.iru u* aãidrnt. fatal com um vaqueiro_de nome Sebastião

Mendes, que ao cair do cavalo fraturou o pescoço, vindo a falecer em Aruman-

duba um dia dePois.

Quanto aos animais castrados, era comum em oitenta garrotes morrerem um

ou dois devido a hcmorragias e têtano. Quanto a bicheiras, a castração era feita

no sistema boca de laranjã, ou seja, o teìtículo era cortado na ponta perpendi-

cularmente. Este sistema facilitava a caídaanimal corria, as larvas iam se desprendendozado eÍa a andiroba com copaíba, que alémbém cicatrizante.

A fase portugueses 999t

das larvas na hora da curação; oe caíam no chão. O remédio utili-de repelente aos insetos era tam-

Zootecnicamente o plantel era muito ruim, porque não havia orientação.Até o capaÍaz se apegava aos animais, não descartando touros velhos por afei-ção. Vacas velhas, se não fossem charqueadas para castanheiros, morriam develhice no campo, já que os portugueses não embarcavam vacas, somente bois.

A natalidade era muito baixa, não podendo se avaliar com precisão os núme-ros, mas calculamos em torno de 45 Vo. Geralmente a vaca dava cria num ano e

no outro se recuperava do desgaste, já que não era mineralizada, dando umacria a cada dois anos. A monta era contínua, ou seja, os touros permaneciam oano todo com as vacas. Não havia desmame de bczerros, permitindo que as

vacas amamentasssem suas crias em certos casos até um ano e meio de idade, oque retardava ainda mais o aparecimento do cio.

Os portugueses exploravam o leit.e, principalmente para a fabricação demanteiga e queijo. Apesar da consangüinidade muito estreita, já que não haviapreocupação em obter bons reprodutores, existiam algumas vacas com boa pro-dução de leite, chegando a produzir nove litros em uma ordenha.

A produção de bezcrros do ano era assinalada no mesmo ano, porém a ferraera somente quando o animal já estava com um ano de idade em diante. Estaferra era feita no curral, com os vaqueiros pcgando os animais "à unha", comose diz na gíria, após alguns goles de pinga para dar mais coragem.

No ano de 1962 os portugucses tiveram um grande prejuízo na sua pecuária,em virtude da água ter sido muit.o grande e o verão muito seco.

rJÚD

Os portugueses não deram muita atenção à criação de búfalos e limitaramseu crèscimìnto. Os vaqueiros da fazenda Cujaí, na margem direita do RioParú, negligenciaram o manejo, sendo que uma parte da manada ficou bravia,saindo dá mata apenas à noite para pastar. Certa vez um dos encarregados dosportugueses, de nome Manoel Português, promel.eu aos vaqueiros que se elcspegasiem os búfalos ou os abatessem, perfazcndo duas toneladas de carne char-quéada, a firma daria um motor "Archimedcs" para o serviço da fazenda, quc

ficava a 15 km da sede Arumanduba. Os vaqueiros cumpriram o prometido,mas na hora de receber o motor o Sr. Almeida alegou não ter conhecimento da

promessa de Manoel Português, dizendo a Felinto Camelo: "Motor dc pôpa ércmo", e não deu o motor.

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100A pecuária

oúoOS pOrtugueses Continuaram Com ceÍtas concesSões aos vaqueiros, Como por

excmólo o ãbate de uma rês por mês nas fazendas que tivessem de mil reses

p"ru iira, como também o foinecimento gratuito da farinh a pala ser misturada

ào leite que era dado aos cachorros que ajudava.m no manejo. Também na fase

dos portúgueses, os vaqueiros passaram a receber o valor do salário mínimo,rusì* rúrcadorias, séndo què os portugueses adiantavam o dinheiro para a

.orpru da farinha que não eia fabricada pelos mesmos. Foi liberada também

nas iarendas a criação de pequenos e médios animais como perus, patos' por-

cos, carneiros e bodês, com exceção de gado bovino e bubalino.

A fase portugueses

Os prod.utos exploradosNa fasc portugueses, além da comercializaçã,o em maior escala dos produtos

da fase losé lúlio, outros tipos eram comprados pelos portugueses, não haven-do quase nenhum que não fosse negociado, como por exemplo: frutas, peles deanimais silvestres e latex.

Com relação ao comércio de peles silvestres, as peles tipo fantasia de gatomaracajá c onça tinham maior valor comercial. Os gateiros, como eram deno-minados, embrenhavam-se nas matas, onde passavam até cinco meses caçandogatos e onças. O preço da pele era valorizado pela não existência de orifícios.Assim, as armas de fogo só tinham utilidade na hora de abater o animal já presono alçapão ou por outros métodos.

O gateiro dava prcferôncia ao alçapão, que é um tipo de caixa construídacom madeira forte, tendo uma entrada de 25 cm de boca, 50 cm de altura e lar-gura e 2,20 m de fundo, podendo ser usado tanto para gato como para onça.

O gateiro abate a tiro um animal (geralmcntc macaco) e faz o arrasto pelamata até a boca do alçapão, onde o mesmo é colocado bem no fundo. A onça(ou gato Maracajá) pega a batida ou a trilha do animal arrastado até o alçapão,entrando ng mesmo para ret,irar a cmbiara (*). Ao passar pela porta, é acio-nado um dispositivo, fazendo a tampa do alçapão cair. No outro dia o gateiro sóterá o trabalho de mirar bem na cabeça, para que a pele tenha classificação deprimeira.

Além do alçapão, existiam outras maneiras de capturar estes animais. O aba-fador e a bolsináa tiham o mesmo princípio do alçapão, com alguma variação namaneira"como era fechada a porta. Outro recurso utilizado era a espingardacom um pedaço de carne embutida no cano, pendurada a uma árvore com ocano apontado para baixo. Prendia-se uma linha no gatilho da arma de maneiraque quando a onça puxava a carne, acionava o gatilho, sendo atingida na boca.Este método era usado quando a onça já estava muito velhaca, não entrandoem nenhuma das armadilhas acima descritas.

Após a morte e retirada do alçapão era feita a tiração do couro (com todo ocuidado para não cortá-lo), deixando a carcaça. Certa vez Chagas Brilhantehavia descourado um gato Maracajá e deixara a carcaça dentro do alçapão,indo verificar as outras armadilhas na mata. Ao retornar, verificou que o alça-pão estava todo quebrado. Aproximando-se, deparou com uma onça pintadacomendo a carcaça do gato dentro do alçapão. Imediatamente Chagas puxou orevólver e deu um tiro na onça. Esta então partiu para cima dele, que descarre-gou o revólver sem parar. Somente com um tiro de espingarda a onça foi abati-

101

(*) animal morto por predador.

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Os produtos explorados A fase portugueses

oÍúA seringueira foi outra essência explorada pelos portugueses, já com alguma

evolução comparada com a fase José ltilio. Em alguns locais, devido à dificul-dade de acesso, continuavam os mesmos métodos primitivos de exploração daborracha.

Açima das cachoeiras, os portugueses continuaram a compra de borracha noformato de bolão ou prancha. Esta última tinha mais valor por estar mais com-primida (sem vazios no seu interior). No formato de bolões o comprador davauma quebra de 30Vo no peso, e na prancha de apenas 20Vo. O transporte nas ca-choeiras era muito trabalhoso; eram feitas lingadas, como se chamava umasérie de bolões ou pranchas enfiadas em um cabo de aço. Ao conjunto de váriaslingadas dava-se o nome de matulão. Em certos trechos do rio, próximo às ca-choeiras, era preciso desfazer os matulões para que as lingadas pudessem des-pencar cachoeira abaixo sem engatar em pedras ou tronco de árvores. O serin-gueiro acompanhava a borracha numa pequena canoa, desembaraçando as lin-gadas ou matulões dos obstáculos do percurso. Nas cachoeiras o seringueirocarregava nas costas a canoa para o lado de baixo e continuava o serviço até ul-trapassar esse trecho do rio.

Apesar de todo este trabalho, o seringueiro dificilmente pegava em dinheiro;recebia mais mercadoria em troca do seu produto. O aviado e o patrão eram osque ganhavam no negócio, sendo que o primeiro recebia a mercadoria do pa-trão e passva ao seringueiro por um preço muito maior e ainda ganhava uma co-missão do gerente da filial.

Ao chegar a filial, a borracha era toda fcrrada com as iniciais da mesma,sendo depois enviada para Belém.

Abaixo das cachoeiras, os portugueses utilizavam um método já mais evoluí-do, que consistia em coletar o leite de seringueira (cujo nome foi generalizadopaÍa latex) e misturá-lo ao amoníaco na base de'l litro para 20 de latex, paraevitar sua coagulação. Desta forma o seringueiro fugiu do sistema de defuma-ção do leite, que geralmente lhe causava problemas respiratórios, devido à fu-maç4.

Os patrÕes ou aviados incubiam-se de distribuir aos seringueiros lambores deduzentos litros onde o seringueiro ia armazenando sua produção. No dia da en-trega ao comprador, o preço era baseado no grau que o leite apresentasse, oqual variava de 4í' a 25". Durante o verão, devido às seringueiras serem subme-tidas a cortes diários, o grau caía, sendo recuperado quando o perÍodo dechuvas recomeçava. A medida que a concentração do leite (grau) diminuÍa, opreço também baixava.

Os portugueses chegaram a comprar em uma safraaÍé dois mil tambores dclatex.

103t02

da. Após o susto, Chagas verificou que todos os seis tiros de revólver haviam

atingido a onça, sendõ a pele classificada como de segunda, devido aos orifí-ciosl Chagas óonsidera esìe tipo de incidente uma das explicaçõ9s para-muitaspessoas qüe desaparecem na mata, Sem que nunca mais se tenha tido notícia das

mesmas.

Gareiro com peles de Gato Maracaiá e onça, sendo secadas ao sol.

Voltando ao couro: já devidamente tirado, o mesmo era espichado em vaÍas

(*) de forma que ficasie bem distendido e colocado para secar ao sol, sem sal-

got,J"to periodo de três a quatro dias. Se fosse épogajle chuva, era secado com

ãìuãnturà do fogo. Depois-de seco, era colocado DDT em pó para afugentar os

insetos, que faziam cair o Pêlo.

Tivemos informação de um gateiro que matou 160 gatos Maracajás e vinte

onças no período de um mês. Dizem os gateiros que a melhor época para caçar

é durante o uetao, pró*imo à margem dãs rios ou igarapés. Devido à falta de

chuvas, tanto a onçá como o gato e outras caças buscam estes locais onde a água

fica concentrada tt *ununcúis perenes, para alimentar-se de peixes'

Os portugueses compravam peles tipo fantasia em grandes quantidades; não

aviavam os gateiros, mas vendiam mercadorias para os mesmos'

(.) pcdeços finos dc madeira verdc.

Page 54: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t04

As frliaisNa fase Portugueses houve um maior incremento nas atividades em geral,

como já abordamos. As Filiais eram núcleos situados em uma determinada re-gião, onde a produção nativa era recebida e armazenada. Eram também o localde aviamento de mercadorias para os fregueses. Tinha cada uma o seu gerente,que na fase losé ltilio era apenas um empregado da Companhia e assim conti-nuou na fase dos portugueses, até o ano de 1965. De 1966 em diante os portu-gueses, visando o aumento da produção, depois de experimentar com bons re-sultados o sistema de participação nos lucros pelo gerente da Filial de Cachoei-ra (a percentagem era 20Vo do lucro líquido), estenderam o sistema para asdemais Filiais. A seguir transcrevemos a íntegra do documento que detalhavaesta deliberação:

INTRODUÇÃO Del. I166-Dir

Considerando que se faz necessária no momento uma reforma, se não total,pelo menos parcial, da estrutura de suas Filiais, com o objetivo de dar melhorescondições aos,seus auxiliares, visando com isso o incentivo para o aumento deprodução, resolve de comum acordo a Diretoria da lari Indústria e ComércioS/A,, tomar a partir de janeiro de 1966, as seguintes medidas:

1 - Todos os gerentes passam a ter participação no lucro das respectivas Fi-Iiais a partir desta data, nas seguintes condições:

a) A participação será de 10/o sobre o lucro líquido apurado, tomandopor base os elementos do balanço de 31 de dezembro de 1965, e oselementos do novo levantamento a seÍ efetuado de acordo com a ta-bela contida no item ne 3,

b) A título de pró-labore, será crcditada mensalmente a cada gerentena sua conta particular com a Matriz, a importância de Cr$ 150.000(Cento e cinqüenta mil cruzeiros).

c) A manutenção do gerente e sua família será por conta da filial, e es-criturada mensalmente sob o título CASÃ DA GERÊNCIA, en-quanto a sua família peÍmanecer no interior.

d) Se porventura a família do gerente permanecer em Belém, não ca-berá à Filial qualquer responsabilidade pela sua manutenção, quescrá única e exclusivamente do gerente.

A fase portugueses

e) As remessas de mercadorias teiías pelos gerentes para ^sua^s famíliasem Belém deverão seÍ acompanhadas dc uma relàção discriminadaem duas vias (sendo uma encaminhada à Matriz) e serão debitadasmensalmente na conta particular dos mesmos.

Í) Mensalmente scrá encaminhada à Matriz, juntamente com a relaçãode débitos e créditos, o valor dos fornecimentos feitos em conta par-ticular do gerentc, bem como dc íodas as contas contidas no item-4.

g) Para efe-ito d9 apuração do lucro, serão consideradas como despesasda Filial, os itens b e c.

h) O gerente tcrií direito a passagcns griítis nas embarcações da em-presa sempre que se fizer necessiírio, c sua família terá griítis nomáximo duas passagens por ano.

A partir desta data os saldos das contas correntes das filiais com a Matriz,referentes ao movimento dos anos anteriores, serão encerrados, abrindo-se uma nova conta, debitando-se pelos elementos contidos no balanço, Ie-vantado em 31 dc dezembro de 1965, sujeito a estudo e critério da Ìtiatriz.

.Esses elementos abrangerão:

A DEB ITO

a) Mercadorias.

b) Móveis & Utensílios.

c) Semoventes (pela totatidade dos existentes, sem discriminação entreos de propriedade da Matriz e da Filial).

d) Embarcações (Motores de pôpa e canoa).

e) Veículos.

Í) Gêneros.

g) contas a receber (com redução de sTvo para incobráveis).

h) Ferramentas e maquinismos.

105

a) Contas a pagar.

A CREDITO

Page 55: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

106As filiais

3 - Os balanços serão levantados obedecendo à seguinte escala de datas:

De 15 a 30 de novembro:F-03-CachoeiraF-06-PadariaF - 12 - São Militão

De 01 a 15 de dezembro:F-04-CaracurúF-07-ParaguaYF - 08 - Porto Alegre

De 16 a 31 de dezembroF-05-LimãoF-01 -ArumandubaF - 10 - Recreio

De 2 a 15 d,e janeiro:F - 02 - Agua BrancaF - 11 - Santana

4 - Serão obrigatoriamente lançadas mensalmente em conta própria, devida-

mente ideítificadas com a comprovação dos respectivos documentos, as

seguintes contas:

a) abertura de estradasb) construçõesc) benfeitoriasd) conservação de estradase) limPeza de varadourosÍ) cusieio de embarcações (conta Filial)g) custeio de embarcações (conta Matriz)h) custeio viaturasi) desPesas geraisj) casa da gerência

S - Do movimento das contas contidas no item anterior será remetida mensal-

mente à Matriz, uma cóPia.

6 - O rodízio dos gerentes das Filiais poderií ser feito a qualqueÍ momento em

que a Dirercría o juJgar necessário, fazendo-se imediatamente o balanço

das Filiais em que se verificar essa^s transferências, paÍa os finb previstos

no item 1.

l: = Filitl

A fase portugueses

7 - Excetuam-se das condições estabelecidas nos itens anteriores, as Filiais deCachoeira e Recreio (salvo quanto à data dos balanços), em virtude deterem sido já objeto de contrato anterior.

8 - Toda vez que a Diretoria achar necessário será convocada uma reuniãodos gerentes. quando serão apresentados e debatidos os problemas decada Filial e dos interesses da lari em geral.

A notificação dessa rcunião será dada a conheceÍ com a antecedência de,no mínimo, quinze dias.

9 - A qualqueÍ momento a Diretoria poderá emitir aditivos a esta delibera-ção, alterando ou aumentando os ^reu.9 itens.

Bclém, 25 de janeiro de 1966.

Iosé loaquim MartinsDIRETOR PRE.' IDENTE

p/ Iosé loaquim MartinsD IRE TOR V ICE.PRE S I DENTE

Eduardo TeixeiraDIRETOR COMERCIAL

Iosé Martins FilhoDIRETOR INDUSTRIAL

Ioaquim Nunes de AlmeidaDTRETOR FINANCEIRO

Aires lúlio da FonsecaDIRETOR SECR ETÁRIO

DOCUMENTO ESTE REGISTRADO NO CARTÓNTOCHERMMONT EM BELg*t,

t07

Page 56: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

108

A errploração da balataA balateira (Mimusópia bidentata) é uma essência florestal, pertencente à

família das gutíferas.

Esta essência ocorre na Amazônia com a peculiaridade de vegetar somentena margem esquerda do Rio Amazonas, em uma distância bastante grande aonorte da calha deste rio e tendo sua incidência somcnte até a margem direita doRio Jari.

JE uma essência de porte avantajado, chegando a ter em média trinta metrosde altura e circunferência de até scis metros. Sua ocorrência maior é em solosargilosos de boa fertilidade, embora ocorra também em solos arenosos de baixafertilidade, onde a produção de leite é mais baixa. Ocorre também com bastan-tc incidência em ilhas no Rio Parú, como por cxcmplo a ilha de [tacê, exploradapor cinqüenta balateiros. A balateira cntre dez e quinze anos já é adulta, poréma exploração do leite, ao contrário da seringueira, só.pode ser efetuada emmédia a cada quinze anos, isso se o corte náo for muito profundo, atingindo-lheo cerne (nesse caso a árvorc morrc).

A maçarandubeira (Manilkara huberí) é muito semelhante à balateira, com adiferença de apresentar folhas de coloração verde amarelada, enquanto a bala-teira tem folhas muito verdes.

Quanto ao fruto, é comido por animais silvestres como o veado, paca e prin-cipalmente o macaco; os balateiros também o apreciam bastante. A propagaçãoda semente na mata para o nascimento de novas árvores é fcita principalmentepelos macacos. A balateira vegeta cm rcboladas como a cast,anha, facilitandoum pouco sua exploração para o balateiro, cmbora o serviço de exploração sejaainda assim trabalhoso.

A primeira exploração dc balata na área da Jari acontcccu no ano de 1930,ainda na fase losé ltilio. Um sujeito de nomc Valcntirn, vindo do Rio Branco,foi aviado por Chico Vieira, um gerente de Filial da ópoca. Esta exploração foiefetuada no Rio Parú, ondc foi encontrada a balatcira em grandes quantidades.Poróm foi na fase Portugueses quc a balata Lcve seu apogeu, sendo explorada e

comercializada em grande cscala.

A balateira é cortada para extração do leite, começando do nível do chão auma altura de aproximadamente 1,5 metro, tendo fixado primeiramente umsaco impermeabilizado com seu próprio leire. O balateiro, como é chamado o"

cxtral,or do leite, precisa de uma série de equipamentos, os quais descrevere-mos a seguir:

O cinturão, feito com couro forte, aprcscnta quatro furos, por onde passa ocabo de aço de 314 de polegada e sete metros de comprimento. Este equipamen-to scrvc para fixar o balateiro à árvore, sendo que ambos ficam no interior doscio do cabo. A mcdida quc o balateiro vai subindo no fuste da árvore, vai tam-

A fase portugueses

bém jogando o seio do cabo mais para cilna. Na realidade o cinturão e o cabo,além de servir para o balateiro subir na árvore e fixá-lo à mesma, serve tambémcomo uma espécie de banco suspenso, já que o balateiro corta a balata sentadono cint,urão.

As botas são também de couro resistente, com perneiras que são fixadas porbaixo da bota, tendo nestas, esporas pela face interna que penetram no fuste dabalateira, ajudando na fixação. No momcnto do balateiro mudar de posição,ele fixa-se nas esporas e joga o cabo de aço mais para cima.

Um balateiro corta em módia doze balateiras por dia; pcla parte da tarde eleestá com as pernas inchadas devido à posição e aos utensílios (pesam em médiatrinta quilos).

Após o leite extraído e rccolhido no saco impermeabilizado (com o próprioleite da balateira com já vimos), vai sendo armazenado em um recipiente paradepois ser cozido, rcsultando no produto dcnominado balata.

O leite é levado ao fogo para cozinhar pclo pcríodo de aproximadamenteduas horas. Primeirament,e o calor fazcom quc o lcite tornc-se fino, em seguidaengrossando até ficar bem pastoso. Com urna palhcta dc madeira, o balateiroconstantemente vai mexendo a massa, para que não "pegue" no fundo do reci-piente. Quando dá o ponl.o ccrto, a massa ó rctirada (scmprc com o auxílio dapalheta de madeira) e levada para o puxador, quc ó um pcdaço de madeira roli-ço, tipo uma trave de futebol de 1,60 rnc[ro de altura, tcndo cmbaixo um jirau.Aí a massa é jogada no puxador c vcm distcndcndo até o jirau, onde é nova-mente repetido o serviço. A finalidacle do puxador é retirar do meio da massatodas as impurezas cxistcntes, colno por cxemplo: palhas, pedaços de pâu,areia etc. O puxador tcm Lambém a função dc dar a elasticidade (ponto) ade-quada para a fabricação de uma boa balata.

Após o serviço no puxador, a massa ó colocada na forma que já possui umpedaço de madeira no centro para scrvir dc orifício para a passagem do cabo deaço que servirá dc meio dc lransportc nos rios encachocirados da Jari.

Os balateiros faziam ccrtos tipos dc misIura do leite da balatcira com o deoutras essências florestais, o que dcpreciava.o produto. Como exemplo, citare-mos a mistura com o leite do garroteiro ou tatajuba (Bagassa guianensis) e como leite do Amapâ (Hancornia Amap,á). Com o garrotciro a balata ficava mole erasgava com facilidade ao bat,er nas pedras do rio durante o transporte, comotambém ficava com mau chciro. Já com o leitc do Amapá os blocos ficavammuito duros e quebradiços. Existiam balatciros cxpcricntes que conseguiam ca-muflar estas misturas.

Após ter sido preparada, a balata volta a ficar mole quando é submctida aocalor. Para isto basta cortá-la cm pcdaços pcqucnos c colocar na água fcrvcndo.Na região ainda existcm arlcsãos quc Lrabalham com a balata na confccção clc

Page 57: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

ll0 A exploração da balara

pequenos cavalos, bois, jacarés, macacos etc, que são vendidos como "souve-nir".

Após o cozimento, o leite quebra em média20Vo.Também pela parte danoitè o leite armazenado se expande, devido à fermentação. Durante o dia,com o calor, volta ao normal. Este fato foi motivo de um crime nos balatais da

Jari, acontecido no ano de 1954. O caso foi o seguinte: Na região de Santo An-tônio da Cachoeira, um rapaz chamado Luiz fazia parte de um grupo de cincoque cortavam balata numa determinada região. Entre os cinco existiam doisiimãos cearenses que nunca haviam cortado balata e portanto desconheciamceÍtas peculiaridades do serviço. Luiz adoeceu e por isso ficava a maior parte dotcmpo no tapirí, produzindo portanto pouca balata. Os irmãos cearenses, des-

conhecendo o comportamento do leite de balata (como já abordamos, à noiteexpande e durante o dia volta ao normal dcixando a marca no recipiente) come-

çaram a desconfiar que Luiz cstava furtando lcitc dos scus recipientes enquantoestavam na mata cortando as balateiras.

Certo dia, antes de sairem para a ma[a, elcs ameaçaram Luiz, dizendo 9üo,se ao voltar naquela tarde notassem que ele havia retirado leite dos seus reci-pientes, o matariam. Luiz era balateiro expcriente e sabia que o leite iria de-õrescer, deixando a marca nas paredes do recipiente. Decidiu seguir os irmãos a

fim de liquidá-los antes que isso acontecesse consigo. Como não tinha espingar-da, seguiu o rastro até o paneiro que ssrvia para carrcgar o saco com o leite,onde estava a espingarda. Em seguida descobriu onde o primeiro estava cortan-do balata e sem que o mcsmo percebcssc sua aproximação, matou-o com umtiro certeiro. Não foi difícil encontrar o scgundo, que ainda tcntou sacar o re-vólver, mas também foi morto. Deixando os cadáveres pendurados pelos cabosde aço, Luiz foi à proçura do Sr. Sobral, quc cra o chefc do aviamento dos bala-teiros daquela região. Juntamente com cstc c outros balateiros, Luiz foi até olocal dos crimes, onde foi obrigado a desccr os corpos das vítimas e enterrá-los.

A balateiraé cortada somcnte na época de inverno, porque seu leite ficamuitO ConcentradO no verão, nãO escOrrcndo para Scr coletado.

Antes de subir para o fabrico da balata, os balateiros eram aviados de merca-dorias pelos patrões, sendo as provisões acondicionadas em latas de dezoito li-tros, com a tampa soldada, para que em caso de alagamento nas cachoeiras não

sc molhasse os alimentos. A conta de cada balatciro era feita separada, mas

havia sempre grupos, geralmen'te de cinco balatciros quc habitavam o mesmotapirí, onde as mercadorias eram partilhadas por lodos, não havendo separa-

ção. A produção de balata sim, cada um marcava a sua com as iniciais do seu

nome, utilizando a faca ou tcrçado.

Os balareiros, quando partiam para o alto (nome dado aos balatais que fica-vam bastante ao norte da calha do Rio Amazonas) iam soltando foguetes paraanunciar a partida. O rctorno também cra anunciado pela explosão de rojões.

A fase portugueses

Balateiros ? lr-aJe de gala no relorno a Almeirim, depois de passarem seis meses nos balatais doalto Jari e Parú.

Page 58: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

tt2 A exploração da balata

As embarcações de maior porte, que conduziam os balateiros das localidadescomo Arumanduba ou Almeirim, só chegavam até o início das cachoeiras,como a de Santo Antônio, no Rio Jari, ou a do Panamá, no Rio Parú. Daí otransporte de mercadorias e dos próprios balateiros era feito em batelÕes, atéonde fosse possível, e por fim em pequenas canoas, que muitas vezes tinhamque ser descarregadas para contornar cachoeiras, sendo conduzidas no ombrodos balateiros, que depois retornavam para fazer o carÍeto das mercadorias,embarcar de novo na canoa e prosseguir viagem até chegar ao local onde de-viam produzir a balata.

Nestas viagens de vcz em quando aconteciam alagamentos nas corredeiras; a

canoa batia em pedras submersas, os balateiros às vszes perdiam toda a merca-doria e ainda ficavam contundidos por baques em pedras ponteagudas.

Basicamentc os produtos levados pelos balateiros não eram muito diversifi-cados: sal, feijão, arroz, farinha, trigo e conscrva. Lcvavam ainda medicamen-tos, munição e os utensílios próprios para o scu scrviço.

A competição sobrc a produção, entre os chefcs de grupos de balateiros e

mesmo entre os balateiros indiviclualrncntc, era bastantc levada a sério; a

média por balateiro era cm torno dc duas toncladas por fabrico. Somente um

balateiro chamado Cravo, da região do Rio Maincurú, município de MonteAlegre, produzia três toneladas. Esta produção foi recorde de toda a área pro-dutora de balata do baixo Amazonas, abrangendo os municípios de Alenquer,Monte Alegre e Almeirim.

Os balateiros marcavam com os patrõcs o dia em que devcriam rctornar coma produção, que era conduzidapelo rio, contida por cabo de aço. Na região de

Alenquer, principalmcntc, o transporte em ccrtas árcas cra fcito em pequenos

aviões, mas na região de Almeirim continuou o mcsmo sistcma utilizando osrios. Os patrõcs iãm então csperar os balatciros no dia c local combinado, lc-vando bastante cachaça e foguetes.

Alguns balateiros faziam promessa para os santos padroeiros da região,como São Benedito de Almcirim, Santo Antônio de Alcnquer ou São Franciscode Monte Alegre, onde ïaziam blocos de balata cspcciais, os quais eram leiloa-dos no dia destes festcjos. ,

Como a balata era um bom ncgócio na época, gcralmente os balateiros ti-nham saldos, Qüe eram pagos em dinheiro. Porém na maioria dos casos, empouco tempo os balateiros já estavam sem nenhum cruzeiro no bolso, tendogasto tudo com bebidas e prostitutas. Iniciavam então com o patrão um novocndividamento, já por conta da próxima safra.

úúú

Quando os balatciros baixavam, acontcciam os crimes nas cidades, onde a

A fase porlugueses

causa quase sempre era bcbida ou mulhcrcs. Havia exceçÕes, como o crime quepassaremos a relatar:

Na fase losé lúlio, mais prccisamente no dia 25 de julho de 1948, o delegadoda cidade de Almeirim, de nome Valadarcs, ordcnou a exccução do advogadoSantareno Ezeriel Monico de Matos, em história já narrada anteriormente.Porém já na fase portuguescs, no ano de 1953, Valadares será a vítima, sendoexecutado por um balatciro de nome Adão Sofia. O caso foi o seguinte:

Valadarcs foi o delegado que mais histórias ruins deixou no município de Al-mcirim, ondc o povo o tcmia. Os balatciros haviam rctornado do fabrico debalata c a pcqucna cidade dc Almcirim fcrvilhava com sua prcscnça, as festas sesuccdiam scm int.errupção.

Adão Sofia, balatciro da filial dc Santo Antônio da Cachoeira, na tcmporadapassada havia tido um pcqucno dcscntcnclirncnto com Valadarcs, mas conse-guiu cvadir-se antes destc tomar qualqucr atitudc punitiva. Agora Adão estavade volta e Valadares não perdcria a oportunidadc para ajustar as contas.

Por informação de tcrceiros, Valadarcs clcscobriu que Adão estava morandona casa dc um cidadão de nomc Hcnriquc Borgcs, que ficava um pouco retiradado ccntro da cidade, sendo preciso utilizar canoa para chcgar ao local. Valada-res então partiu para lá a fim de prcndcr Adão, levando consigo apenas ohomem quc rcmava a canoa. Ncssa altura dos acontccimentos a população todajá espcrava com maus prcsságios quc algo dc mal iria acontecer a Adão, poisValadarcs havia promctido trazô-lo vivo ou mort.o.

Adão foi preso na residência onde se encontrava, sem rcsistência, embarcan-do cm scguida na canoa dc volta para a cicladc, ondc a população às margens dorio curiosamcntc cspcrava. Ao vcr o povo, Valadarcs mais uma vcz quis de-monstrar sua valcnt.ia, passando a hurnilhar Adão, chamando-o de covarde echcganclo a rimpá-lo com um rcbcnquc. Como Adão não rcagia e a intenção deValadarcs cra matá-lo, cst.c mandou quc Adão abrisse a boca para cle colocarpílulas dcntro da mcsma. Adão obcdcccu a ordcm, mas no cxato momento doliro, balcu na mão dc Valadarcs, scnclo quc a bala apcnas atingiu-lhc de raspãoa coxa. Aí Adão agarrou-sc com Valadarcs, não danclo mais tempo para um se-gundo disparo. Estando com uma camisa clc mangas compridas, Adão havia es-condido na manga uma pcqucna faca dc rnigar (*) labaco. Puxou da faca, cra-vando várias estocadas cm Valadarcs; cstc caiu surprcso por tcrra, pcdindo aAdão que não o mal.asse, pois tinha mulhcr c filhos para criar. Adão atendcu opcdido dc Valadares, carrcgando-o até sua casa, sob o olhar incrédulo da popu-lação quc acompanhava o caso macabro.

Valaclarcs morrcu no clccorrcr da noitc dcstc cpisódio c assim o povo dc

113

(*) Migar tabaco - ato dc cortar o tabaco na fonna dc molc ou tabaco dc corda.

Page 59: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

ll4 A exploração da balata

Almeirim acredita que Ezeriel Monico de Matos tinha sido vingado. Adão foipreso, mas a cadeia de Almeirim ficou guardada noite e dia por aproximada-mente quinhentos balateiros, para que nada lhe acontecesse até que o Juiz d.e

Direito da Comarca de Monte Alegre autorizasse sua remoção para aquela ci-dade.

OJJ

Em síntese, a balata proporcionou aos municípios do baixo Amazonas e emparticular ao município de Almeirim na fase portugueses, um período de certaõpulência, que não deixou bases fixas, por ser um produto extrativista.

A balata era exportada para os E.U.A., onde era utilizada principalmente na

fabricação de bolas de golfe e na mistura com borracha para utilização empneus dê aviões. Os portugueses chegaram a comprar oitocentas toneladas de

balata por safra.

PARTETV

A fase Ludwig

io:aa ,'*iÍ

Page 60: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

A fase Ludwig

Daniel Keith Ludwiga Amazônia, os grandes invcstimcntos estrangeiros não foram bemsucedidos. como cxemplo, apcnas para ordenãr o raciocínio, citare-m_o.s a construção da Estrada de Ferro Madeira/Mamoré, iniciada eml87l pela firma inglesa public works construction company, e con-

cluída já no século seguinte, em _19

12, por outra companh ia, a Brâzil'RailwayCompany, tendo à frente percival Farqúhar.

Outro exemplo loi o plantio de seringueiras para a fabricação de borracha,entre os anos de 1927 e 1945, nas localidades de Belterra e Forálândia na resiãodo Rio Tapajós,.município de Santarém, plantações estas ioeaïizaãà; ;;l;gralde empresário amcricano do automobilismo Henty Ford. E por último aJari de Ludwig, que talvez devido ao avanço dos meios de comunicação, tenhasido o mais combatido c repudiado.

- Nossa proposta, tal como colocamos no início deste livro, é apresentar osfatos sem parÍ,idarismo. Passaremos ao relato dos fatos da fase tiawig basea-dos apenas no registro do que prcscnciamos cm dezesscte anos de perúnênciana ârea, s,cmpre atentos aos acont,ecimentos ocorridos, ou através de informa-ções por fontes fidedignas.

Tentaremos na medida do possível estabelecer uma cronologia dos aconteci-mentos, de forma geral, principalmente da vida d9 Ludwigla qual rivemosacesso através de alguns de seus colaboradores'mais chegadós, e pelo contatodireto com o próprio, em situações de trabalho. Porém iretendemos mostrarr-udwig tal como o vimos, no escritório ou andando pclas iuas de Monte Doura-do, na maioria das vezes a pé.

odJ

Como todos os grandes homens, Ludwig era muit,o simples, nada havendo deespecial relacionado às suas freqüentcs visitas à Jari. No avião que era utilizadopara ttazè,-lo de Belém a Monte Dourado, eram preenchidas ìodas as vagas,sendo que ele sempre utilizava a última poltrona. O avião nunca tcvc sua par-tida retardada por causa dele, que estava sempre pontualmcntc no hordrio prc-

tt7

Page 61: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

Daniel Keith Ludwign8

visto para a viagem. Quando vinha dos E.U'A' para o Brasil' utilizava com-

;;ú;õtituraiin; ;;" a VARIG) pois não possuía avião'

EmMonteDouradogeralmentef.azraSuasrefeiçõesnorestaurantestaff'junramenre com ;;;;ìï runcionãiiot. Tinha preferéncia por fruras, principal-

mente banana e mamão. Certa'nï, o adminiitrador de Monte Dourado' des-

conhecendo os ilLió; de Ludw;;;;*ãu--uit àe Belém grande variedade de

fruras. Ludwig ii;; muiro uuorrlïioo quando viu as fruras e disse que de outra

vez lhe trouxessem soment'e banana e mamão

A residência que utilizava era a casa de hóspedes' construída em madeira'

ondeexistiaumquartoqueerautilizadoporoutraspessoas'quandoelenãoesrava em MonìJõãuruào. Quando aindã era estudãnte de Agronomia' em

passagem po, úonte Dourad";;""*i.nt" de Monte Alegre' fui alojado neste

aparramenro "t ãããpunr,ia Oo'ói. Avcrtano Rocha' advõgado da Jari naquela

época.

Ao chegar à Jari, Ludwig já era homem Scptuagenário, porém muito alivo,

de andar ligeiro e firme, up.ru, ã;;;ü;te Oeieitúa colunã vele!11:::1l"tl:

de grave acidente em um de seus estaleiros (devido a uma explosão, preclsou

saltar n'águap;;; saluar dois de seus emprcgados, lesionando seriamente a co-

luna).

Guardonaret'inaumaimagemqueparc.ce.sintetiz^al:::temperamenlo:Uma vez Ludwig foi a Saracur;, q;Ji.tuiu de base para a implantação do Pro-

jeto Arro r;pu"-íru Àelhor visãodo campo, não hesitou em subir na desafia-

dora escada da caixa d'água, qua não tinha corrimão c cra bastante íngrcme'

EmMonteDouradoacordavaccdocianadarnapiscina;iasemprccami-nhando.

ÚÚfl

NacasadehóspcdeshaviaumzeladordcnomeFreitas,quesofriadereuma.rismo infeccioso e devido u .*u-oï.niu tilha muita dificuldade de locomoção'

Freitas afeiçoãu-r" u Ludwig, "rt. tãmbém o tinha em grande consideração'

CertavezaAdministraçãodeMonteDouradodemit'iu'o'devidoaseupro-blema físico. Na viagern r.guinte, Ludwig perguntou-por ele' Foi um alvoroço

em Monre Dourado, quando l"àíú OescãUtiu"a uerOàde. Por causa deste epi-

sódio ..gcnte grande quase. f"itotiia pela o1eã' (expressão irônica que assina-

lava as demiósões na Jari). ocerrá e qu. preitaì fòi readmitido no posro de

mordomo na casa de hósPcdes'

Falando ainda de Freitas, ele próprio mostrou-me uma carta onde Ludwig

autorizava todo o tratamento dele. Inicrizmente a doença já estava muito avan-

çacla c o tratamcnto não obl'cvc succsso'

A fase Ludwig

Ludwig não falava quase nada em português e Freitas muito menos em in-glês, mas os dois se entendiam muito bem; até piadas Freitas contava a Ludwige este ria, talvez da ingenuidade de Freitas. Freitas cuidava da roupa queLudwig tinha em Monte Dourado, tirava-lhe as meias, calçava seus sapatos, ha-vendo realmente muita afeição entre os dois.

úDO

Ludwig tinha alguns amigos muito chegados, como por exemplo o famosoator cinematográfico Clark Gable. Luiz Grantham, guo foi gerente da grandefazenda de Ludwig na Venezuela, denominada Yato Vergarenha, situada noRio Orenoco, contou-me certa vez que constantemente Ludwig ia caçar onçacom Clark Gable na Vergarenha e que os dois tinham realmente muita amiza-de. A título de informação, a Vergarenha tinha um plantel de cinqüenta milreses e foi nacionalizada na dócada de 1970.

Na inauguração da estracla de fcrro Munguba/São Miguel, Ludwig veio pelaprimeira vez direto dos E.U.A. até Monte Dourado, lrazendo vários amigos, osquais na maioria deviam ter sua idadc, scndo que o avião pertencia a um dosamigos. Nesta ocasião foi equipado um vagão do trem com bancos para gue,além dos convidados estrangeiros, várias famílias de Monte Dourado comcrianças, participassem da viagem de aproximadamente cinqüenta quilômetros.

JOD

Naquela época Ludwig estava entre os quat.ro homens mais ricos do planeta.Deveria andar com grande aparato de segurança pessoal, mas isso não aconte-cia, pelo menos em Monte Dourado e mesmo no percurso Estados Unidos/Bra-sil. Certa vez, de volta de uma viagern a scrviço aos E.U.A. eu e Luiz Grant-ham, que era mcu chefe imediato, encontramos Ludwig no aeroporto de Mia-mi. Primeiramente ele não nos viu e sumiu nos enormes corredores do aeropor-to. Grantham observou que elc deveria estar vindo para o Brasil. Dada a cha-mada do embarque, dirigimo-nos para o avião da VARIG. Depois de algunsinstantes, já dentro do avião, foi anunciado um problema no aparelho; devería-mos retornar ao saguão do aeroporto e esperar nova chamada. Foi já de retornoque cruzamos com Ludwig, que era o último passageiro a embaÍcaÍ.Imediata-mente ele nos reconheceu e Grantham informou-o do problema do avião. Fica-mos então por duas horas sentados em um banco, tendo ele ao centro, quandome ocorreu disfarçadamente observar no meio da multidão se existia alguémcom indícios de ser seu segurança. Nada, nada mesmo e ali entre nós estavatalvez o homem mais rico do planeta. De repcnte visualizei no box da VARIGum rapaz alto, at.lótico, que de braços cruzaclos olhava fixamente para onde cs-távamos. No espaço de tempo em que notci o sujcito até o momenl,o da novachamada para embarquc,não tive dúvidas de que Ludwig rcalmcnl,e andava

l19

Page 62: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

Daniel Keith Ludwig

com guarda pessoal. Poróm, no momcnto do cmbarque o rapaz aproximou-sede nós e Ludwig agradeceu-lhe os serviços. Era um cicerone da VARIG.

Na realidade Ludwig tinha verdadeira ojeriza a publicidade e por isso podiapassar despercebido pelos locais por onde andava. Neste episódio eu poderiater sido fotografado junto a ele em situação bem peculiar, pois até a entrada doavião Ludwig apoiou o braço no meu ombro, talvcz por t,ermos quase a mesmaaltura, enquanto não podia apoiar-se em Grantham, quc era bem mais alto.

J'ID

Ludwig tinha planos de produzir celulose em grande escala, prevendo a es-cassez do produto a partir da década de oitcnta. Certa vez Loren Mclntyre o en-trevistou em sua residência nos E.U.A (tendo também entrevistado várias pes-soas naJari, inclusive a mim, cm reportagem publicada na revista ÀIÁTIONALGEOGRAPHIC em maio de 1980, vol. 157/Na 5, sob o título "JARI: ABILLION DOLLAR GAMBLE"), quando Ludwig lhe disse que scmpre pcn-sou em plantar árvores enfilcirada's como o milho.

!uan Ferrer (em primeiro plano) deu a Ludwig o aval lécnico para a aquisição do Ja'ri.

A fase Ludwig t2t

Ludwig tinha planos também de produzir na Jari grandcs quantidadcs dc ali-mentos e com este objetivo foram monlados inúrncros cxperimentos, indo dafruticultura à pecuária e mcsmo cult.uras de subsistôncia cõro milho, mandio-ca, aÍÍoz etc.

Por ocasião da compra da Jari, o cngenheiro agrônomo panamenho JuanFerrer, pessoa de confiança de Ludwig, responsável pela corpra e implantuçáode vários plantios de fruticultura na América Centraf veio ueiificat u pot.niiu-lidade dos solos da Jari. Fcrrcr pcrcorrcu várias árcas da Jari a pé ou em tombode burro, mas sua mcta cra a região dc Nova Vida, onde os sólos eram muitoférteis. V/eimar Ugfroa acompanhou Fcrrcr nesta avaliação dos solos, quandoforam coletadas várias amostras. Dc anl.cmão Fcrrcr observou a V/ei*or qua otsolos de Nova Vida eram realmcnt.e de primcira qualidade e portanto aptospara os planos que Ludwig prctcndia implantar, què logo tiveram seu parecerfavorável.

Falando ainda de Fcrrcr, os americanos que lrabalhavam na Jari o temiam,pois suas opiniões eram ouvidas _por Ludwig. Fcrrcr foi o coordenador do pro-jeto de r- udwig e Anluncs, cm Minas Geraú, no município de Felixlândia', deplantio da mandioca para extração de álcool. Ncstc locai Ferrer veio a falecer,acometido de enfarte agudo quando fiscal izava as plantações de mandioca.Ludwig deu todo o apoio à viúva dc Fcrrcr, inclusivè fretahdo um avião paratransladar o corpo de Fcrrcr para o panamá, scu país dc origcm.

JDD

Na primeira uez que Ludwig vcio à Jari, utilizou avião frctado da companhiaKOVACS, prefixo PT - MGA, que comandado por Virgílio Arantes de Melopousou na pista que hoje é a rua 90, da Vila Staff. Era um bimotor CESSNA320 Turbo Charge que ficou fretado pcla Jari pelo pcríodo de seis meses. Nestaprimcira ocasião Ludwig lrouxe consigo maii quatro pessoas. A atual pista sófoi construída após a nccessidadc de operar corn aviõcs de maior porte, no casoos DC-3.

oJat

Ludwig era um homem que parecia termente. Em visita a São Raimundo, logo nouma de suas decisões de grande vult.o, emneamente. Foi assim:

decisões concebidas momentanea-início do projeto aÍÍoz, presenciei a

que a idéia pareceu surgir momenta'-

A várzea onde seria implantado o projeto aÍroz era ut,ilizada com pecuáriabovina desde as fases losé Iúlio e Portugueses, e os animais ainda se encontra-vam no local, mesmo com toda aquela movimentação de máquinas construindoos diques e já gradeando algumas part.es para os primciros plantios. Ludwig

Page 63: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t22 Daniel Keith Ludwig

residência nos E.IJ.A. por ocasião da entrevista concedida

- A billion dollar gamble" .Daniel Ludwig, folografado em suaLoren Mclntyle, sob o lílulo "Jari

A fase Ludwig

pôde então ver os animais. perfeitamente adaptados àquele ambiente, tendofeito várias perguntas. Os animais estavam realmente gordos e sadios.

Naquele mesmo dia, ao retornar a Monte Dourado decolando da pista de Sa-racura (sede da pecuária), Ludwig convidou Donald Height, chefe d-os serviçosde diques e canais do projeto arroz para sobrevoar a áiea da vârzea entre osRios Jari e Arraiolos. Momentos mais tarde, Donald Height dava-nos a notíciaqug Lldwig havia utorizado a dicagem de quinze mil heõtares para criação degado bovino naquela ârea.

O plano de Ludwig era ter um plantel de cem mil cabeças de bovinos emáreas devârzea dicadas, utilizando bombas para o serviço de drenagem e irriga-ção. Aliás este sistcma jáera adotado nos E.U.A. no estado do Teias, próxiiroà cidade de Corpus Christi, na grande fazenda King Ranch, berço da iaça bo-vina Santa Gertrudes.

__ L,gd*ig trouxe para a Jari, colaboradorcs dc sua maior confiança, comoV/illiam Turpim e Elmcr Han, este o pai dos supcrpclrolciros; maquinãrios dosmais modernos que existiam nos seus projctos cm outrar portcr do mundo;mandou construir máquinas cspccialmenLc para operar na Jari, como uma má-quina que custou milhõcs de dólares e não aprouoú no serviço de construção dediques em São Raimundo, tendo sido abanclonacla após a retirada dos dois pos-santes motores Caterpillar. Algumas máquinas aprovaram depois de adapta-ções, como os tratores agrícolas Copelane, que a princípio atolãvam muito nosterrenos pantanosos, reccbcndo depois rodas dc fcrro e pneus.

A estas tentat.ivassempre atento e emgíria, dizendo:

úatD

A Jari era rcalmente a menina dos olhos clcdes negócios distribuídos por quinzc paíscs, oJari, onde vinha em módia dc cinco a scis vczcs

de conseguir o equipamento ideal, o caboclo nativo estavavcrsos dc pé qucbrado "tirava o seu sarro" como se diz na

Os gringos estão chegandoTrazendo inovaçõesTrocando pncu por fcrroMas o trator semprc atolando.

Ludwig. Mesmo mantendo gran-Iocal que ele mais visitava era apor ano.

Por falar de seus ncgócios em vários paíscs, ccrta vcz t.ive nas mãos um livroque Ludwig mandou imprimir, quc cra chamado "Bíblia Ncgra", ao qual so-mente alguns funcionários dc confiança t.inham accsso. NcstJlivro constauamtodos os negócios de Ludwig, com fotografias e explicações de cada um. Supcr-petroleiros, a cadeia de hotéis Prince das Bahamas, minas dc sal c carvão'ctc.

Page 64: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

Daniel Keith Ludwig t25124 A fase Ludwig

dar-lhe a péssima notícia. Foi um corre-corre alucinante, deslocando máquinasde outros serviços para pcgar piçarra. O scrviço prolongou-sc noite a dent,ro,contando com a sorte de no momento existirem estruturas pré-moldadas pron-tas para receber concrcto. O certo é que na chegada dc Ludwig a casa estavapronta, mas ainda dentro das formas.

Ao chegar a Monte Dourado pela manhã, Ludwig foi dircto ao local da cons-trução, onde ainda assistiu a ret.irada das últimas formas. Aparcntemente firmee bonita, de coloração avcrmelhada devido à latcrita, a casa manteve-se de pé

até o sol escaldante dos trópicos ent.rar em ação, primeiro rachando as paredese em seguida dissolvendo-as como num passc de mágica, sob o olhar atônito dospresentes, especialmente dc Ludwig.

Este episóclio perenizou gozação clos outros amcricanos contra Bob: a casapassou para a história como "o chocolate do Bob". A verdade é que não sabe-mos se o fiasco foi devido à rctirada prccipitada das formas, à desproporção dccimento e outros matcriais, ou sc Bob, não acreditando no projcto, não sc es-merou para fazer uma coisa mclhor. Ludwig havia visl.o no México c no Nordcs-te brasileiro casas de adobe c qucria baratcar as consl.ruçõcs (o cirnento teriaque ser em parte importado, porquc a fábrica dc Capancma não tinha condi-ções de suprir a demanda).

úD-l

Ludwig dizia scmprc quc iria comctcr muil.os crros porquc t.cria scmpre quedecidir scm tcmpo para pcsquisar, c afirmava aos seus empregados: "enquantovocôs acertarcm mais do quc crrarcm, cstá ludo bcm."

Ludwig dizia tambóm que a pcssoa prccisava tcr sortc ncsl.c mundo. Elc, qucnunca jogou na vida, considcrava a Jari urn jogo muil.o excitanl.e, o maior dcsua carreira. Infclizmentc para elc a Jari não trouxc os rcsultados quc prctcn-dia. Infelizmente também para o baixo Amazonas, o cntão Tcrritório Fccleraldo Amapá c em particular para o município dc Alrncirim? Dcixo para o lcitoresta avaliação.

DOú

Mais uma sobrc a simplicidadc pcssoal dc Luclwig: ele mantinha em Monl.eDourado pouquíssimos objctos dc uso pcssoal, como roupa e sapato. Uma vczele foi a São Raimundo, scde do Projeto Arroz, usando uma calça com um ras-gão na altura do joclho. Ao dcsembarcar cm São Raimundo, um pcão aproxi-mou-se e perguntou ao Comandantc do avião: "Comandante, quem é cssc vc-lho?" O Comandantc rcspondcu-lhc: "Fala baixo quc é o Ludwig." E o pcão ar'rematou, abismado: "tambóm , qucm ó quc vai adivinhar que um homcm tãorico ande destc jcito!"

Este livro me foi mostrado por uma pcssoa por qucln Ludw.ig tinha muita consi-

dcração, senclo ;il t.;;óa'muito tninttu amiga. Tive conhecimento depois de

pcssoas muito *ui, graduadas que cu quc nunca tiveram oportunidade de ver o

livro.

úúa

Quando qucria falar com algum dirctor quc-sc cncontrava na Jari' Ludwig

simplesm.nt. ,nundava um telü Qá quc nctia époc3 9!ndo não cxistia telefone

em Monte Dourado) c a pessoa ttiiu qut tttot nôs E.U.A' na da1u marcada'

Certa vez, Ludwig mandou chamar o clirctor Joc Golson' mas o tclex' talvez

por atraso Oo .stiitóïio dc Bclórn, .tttgou cm- Monl.e Dourado às cinco horas da

tarde, não havendo mais tctnpo fotu oãuião tlccolar. Nessa época havia um vôo

do "Caravclle" da Cruzeiro quJ saía às 7:00 horas de Belóm para o Rio de Ja-

neiro e Golson tciia quc ir ncrt" vôo para pcgar outro avião para os E'U'A' na-

quele mesmo dia. Taivez porquc a Jaii trocaise constantemcnte de dirctor (na

fase Ludwig ïor-am dezeiscii) Cotson rcsolveu Ïazcr tudo para chegar aos

E.U.A. na data marcada. Mandou chamar o Comandante Cohen e perguntou-

lhe se poderia dccolar bem ccdo no dia seguinte para chegar cm tempo de pegar

o vôo para o nió. Còn.n ponderou qut pïttisava de um co-piloto para ajudar

na leitura dos instrumontos, uma vcz que o vôo cra not'urno e já estava Come-

çando a chover nïregiao._Nesta ocasiãò somcnte Cohen cstava em Monte Dou-

rado, pois o Comandãnte Juarcz estava cm Bclém com o DC-3' Cohen lembrou

q;;;; JarilânJia, a 80 km de Monte Dourado, havia um americano de nome

Copeland ffo*õiìu. .ru piloto amador. Imcdiatamente uma voadeira desceu

o Rio Jari a fim de ir busôar Copeland HoY..t, retornandg por volta da meia-

noire. No dia r.g"i"i", pit.itoÃãntc às 4:00 horas da madrugada, com a pista

iluminada pelos faróis de atgun, ,o,'o', Cohón tirava do sõlo o "Índia Alfa

Serra" e penctrava na escura e chuvosa maclrugada dc ÌvÍontc Dourado com

destino a Belém, chegando a tcmpo para Gorson pcgar o "caravcllc" e atender

sbm contratsmpo o chamado de Ludwig'

úoú

Outro fato que demonstra que auando.Ludwig pedia-alguma coisa eÍa para

ser feita, ororr.u ro* o chefõ ãtÈng"nharia gã6 Cuilvary' I-udwig pediu a

Bob que fizesse uma casa utunão pïçnrto (Laterita), com cimento é claro'

usandb as formas patcnteadas por ele'

como não acrreditava que a construção dcsse ccrto, Bob até esqueceu.do-as;

sunto. Um dia chegou a úonte Dourado um telex de Ludwig: estava vindo à

Jari, com chegada foru o dia seguinte-,-9-queria ver a casa que havia pedido para

Bob faz.cr. o oiióró, n.rto epocã cra wiliiam Turpim, que foi atrás de Bob para

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A fase Ludwig

Daniel K. Ludwig nasceu no dia 24 dejunho de 1897 em South Haven, es-tado de Michigan, Estados Unidos,,sendo descendente de família que chegouaos E.U.A. há duzentos anos atrás. E casado com a senhora Virgínia e não pos-sui filhos.

JÚÚ

Para finalizar essas ligeiras considerações sobre Ludwig, vamos contar maisum fato que mostra claramente que a Jari era a menina dos seus olhos. Foi o se-guinte:

Seu Vice-presidente na época, de nome Notter, era contra a execução doProjeto Jari e um dos motivos alegados era que Ludwig só dava atenção à Jari.Depois de certo tempo, Notter,mostrou interesse pela Jari e quis visitar o Proje-to. Numa verdadeira "pirraça't, Ludwig vetou a possibilidade, alegando que se

ele era ou fora contra o Projeto, não tinha motivos para visitá-lo.

t27Daniel Keirh Ludwig

126

3úo

Na realidade, Ludwig era um homem simples porque começou praticamente

do nada, uo, qoutoir. uãot de idade, no ano de-1911 e foi gradualmente expan-

dindo suas ariviãáããr. sóur pti*eitos esforços foram dirigidos de algum modo à

Marinha t"tetcaïtã. Sua primeira aventura foi a restauração de um pequeno

barco, vendendó-o t* seguida. De pequenosbarcos, passou para grandes na-

;ã;. A princípio, limitauã-se a refórmãr navios existentes, transformando-os

et naniôs rnai, úieis, para os quais haveria maior demanda' Depois começou-a

construir novos "u"iáJ,

ptit.ito em estaleiros públicos e depois em seus pró-

prios estaleiros.

Suas atividades de Marinha Mercante progrediam, construindo desdq navios

de 2.500 ton"ruJurãe fetroteiros com cãpaõioade de 327 mil toneladas. seus

interesses tornaram-se mais diversificadoi e incluíam a maior salina do mundo

(no México), minas de carvão nos Estados unidos e Austrália, refinaria de óleo

no panamá, minas de ferro na Austrália e Brasil, empresas de.seguros interna-

cionais, pro;etoslmobiliátiot nõt Estados Unidos, èmpreendimentos de agri-

Cultura nO panam â,-Yenezuela, Honduras, Paraguai e, é claro' o complexo

Jari.

Antes de iniciar a descrição da fase Ludwig, es.ctevi cart'a à NATIONALBULK çARRIERS,INC" em Nova lorque, dlrigindo-me a um amigo' dos

mais antigos colaboiadores de Ludwig. pessoa extremamente acessível' apesar

do alto cargo qõ;r;pava, de Vice-fresidente executivo do Comitê, ele res-

pondeu pronturn"nte àì minhas petgúntas, dando-me também a sua impressão

iobre Ludwig. Diz ele:

O Sr, Ludwig sempre empenhou-se em ser criativo. Nunca estava satisfeito

com o estado atual das coisas. EIe foi, em poucas palavras, a pessoa mais maÍ-

cante com quem eu tive o privilégio'de trabalhar-por um período de quase 45

anos.

Todos nós, que conhecemos o Sr. Ludwig, poderíamos.escÍ.ever muita coisa

sobre suas reaiizações, mas todas as nossas paaravras seriam inadequadas para

descreveÍ seu trabalho. EIe realizou mais em uma semana do que muita qe:|te

consegue em muitos anos, ou mesmo durante a vida toda. Deixo para.você des-

cÍeveÍ o seu ftabalho no lari. Acredito que tenho um bom conhecimento do

iiojito fari, mas prefiro abster-me de comentâtios.

Desejo-Lhe o melhor em seu Projeto'

Sinceramente:

F.L loyce

E x e cu t i ve V ice -Pre si dent

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128

AJari queLudwigeniontrou

Até o ano de 1967, quanclo Ludwig tomou possc da ârea da Jari, por comprado grupo português, a área havia cxperimcntado pouquíssimas transformações,em todos os sentidos, desdc sua origem com o Coronel José Júlio de Andrade.A própria sede do município, a cidadc de Almcirim, só aprcscntava atividadede comcrcialízação sazonal, na época do fabrico dos produtos nat,ivos. A co-mercialização dos produtos continuava cm grande partc fcita à basc de troca,onde dificilmcntc o produtor pcgava cm dinhciro.

Do ponto de vista físico a rcgião cncontrava-sc, a bcm dizcr, inl.act.a. A po-pulação vivia do cxtrat.ivisrno, scm ncnhurna Lradição dc agropccuária quc oslcvasse a cfct,uar dcrrubadas significantcs, a não scr cm pcqucnas árcas de plan-tio da mandioca para fabricar farinha.

A comunicação cnt.rc os difcrcnt.cs locais cra fcita quasc na sua totalidadcutilizando os rios. Em alguns locais cxistiam varadouros (caminhos que os cas-tanheiros utilizavam para cscoamcnto cla produção cm lombo de burro) e algu-mas cstradas com tráfego prccário. A cmprcsa dos porl.ugucscs mantinha algu-mas fonias cntrc as filiais mais import.antcs como Arumanduba, Caracurú e

Água Branca, tendo tambóm comunicação corn Bclórn pelo mcsmo sistema.

Na rcalidadc as filiais sc constituíam nos poucos núclcos populacionais cxis-tcntcs na rcgião. A localização dcstcs núclcos na sua maioria cra às margcns dosrios Jari, Parú, Caracurú c outros, quc c.ompõcm a bacia hidrográfica da área daJari. Os núcleos populacionais do intcrior, como por cxcmplo a Vila do Bandei-ra, Braço, Bananal c outros ficavarn localizados pcrt.o dc igarapés tributáriosdos rios acima mcncionados, mas cstcs na rnaioria não cram navcgáveis, scndoa comunicação feita atravós clos varaclouros ou cstradas cm prccárias condiçõcs.

No quc tangc à agropccuária, talvcz clcvido ao tnonopólio das tcrras nasfascs anl.criorcs, o município cra totalmcntc scm tradição no ramo. As várzeasque cxistiam próximas às calhas dos granclcs rios, como o Amazonas c Jari,eram utiliz.adas pclos scus proprietários para a criação dc gado (bovino princi-palmcnte).

Os solos férteis existcntcs nas árcas fora das tcrras da Jari estavam distantcsde Almeirim, uma módia dc 100 a 150 krn, scm cstradas dc accsso, alóm de csta-rcm acima das cachociras do Panama (no Rio Parú) ou a dc Sanl.o Antônio (noRio Jari), ficando muito difícil concluzir a proclução dc cercais ou frutas atéonclc os rios eram navcgávcis, cm facc do risco dc pcrclcr tudo por alagamcntonas cachociras. Na rcalicladc, na fasc dos Portugucscs já havia cstradas contor-nando as duas maiores cachoeiras (Panama c Santo Antônio, nos rios Parú cJari rcspcctivamcntc), mas cxisl.iarn oul.ras cachociras rio acima.

O mcrcado clc trabalho cra, a bcm rlizcr, incxis[cntc. Alóm dos cargos de ge-

A fase Ludwig

rente das filiais, existiam os cargos de balconista, contador, caixei.ro-viajante eo trabalho nas fazendas. o restante do pcssoal'.tu oniãdo pelas filiais, nasépocas do fabrico da castanha e borrachu. o, gerentes reccbiam uma parte dosalário em dinheiro, os demais tinham conra corÍenre com a filial ; q;J;;;i";-ciam e dificilmente pegavam em dinheiro. Como podemos ver, o sistema em-presarial vigente naquela gPoca não oferecia opç-oes de emprego. euanto aovínculo empregatício dos funcionários, a maioria não tinha ãarteira assinada,deixando de receber os benefícios que a lei lhes facultava.

Voltando a falar da cidade de Almeirim, esta era deficiente em escolas eprincipalmente cm_saúde. Apenas uma vez por mês o médico do SESp lotadoem Monte Alegre, Dr. Cid Fialho dos Reis, uinna dar consulta. Além da cidadede Almeirim, existiam escolas em Arumanduba e nas outras filiais, ru, nãohavia opções para o resto da população.

Como já vimos em capítulos antcriores, no interior das áreas da Jari (corres-pondente aos scus rios de água escura) a fauna íctica .ro póUr. comparada communicípios vizinhos, mas a fauna terreslre era muiro rióa,-piincipãire'tõìLonças e gatos, cuja abundância estava rclacionada à também grande quantidaàede outros animais silvestres, como o veado, a anta etc. Atribuírnos a riqueza dafauna terrsstre herbívora, à grande disponibilidade de frutas, como as da Maça-randubeira, Balateira e Castanhcira. A aruação predadora dos carnívoros man-tinha o equilíbrio.

A floresta de tcrra firme, apesar de cxubcrants, era muito velha. O aprovei-famento nas serrarias cra muito baixo (em lorno de l5Vo), principahõni, ã"espécics como o Angelim, quc na maioria cram ocos.

Quanto ao solo, tomanclo como rcferôncia o Rio Amazonas pela margem es-querda, onde está situada a Jari, os solos fértcis es[ão bcm paia o Norie, já nolimire de suas terras. 9oI exceção dc algumas árcas como Nãva Vida e pacana-ri, o rcstante da área da Jari era constituúo por solos de baixa fertilidade.

Em riquczas m.inerais, a região cra rica em Bauxita refratáriaeCaulim. Ogur.o' de alta qualidade, encontrava-se ao Norte das terras da Jari, entre os riosJari e Parú.

t29

ctúJ

A negociação de compra e vcnda da Jari entre Ludwig e os portugueses ocor-reu cntre out,ubro de 1966 e abril de 1967. Neste períodõor poïtuguéses desacc-leraram as op_erações, dando continuidade apenai aos serviço, ,rrrnciais à ma-nutenção da Companhia. Como se diz na gíiia, os portugueses rizeram õ "rgã-'qi9 cqm a"porteira fechada", ou seja: urnãerarn todas as-terras do municÍpioïcAlmeirim (no Estado do Pará) e do município de Mazagao (no entao Terrirório

Page 67: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

130 A Jari que Ludwig encontrou

Federal do Amapá), além da frota de embarcações, vilas residenciais onde fun-

cionavam as filiãis, as fazendas, serrarias, fábricas de beneficiamento de casta-

nha e os empregados, que estavam com dois meses de salários atrasados.

A nova Companhia regularizou a situação de todos os funcionários, não só

assinando a carìeira de tódos, mas aumentando o salário e aceitando o tempoãe serviço, baseando-se na própria informação dos mesmos. Havia casos de

àlgunr qïe haviam começad-o a trabalhar entre os dez a doze anos de idade,prïncipaìmente na área dó pecuária, onde o garoto que vive na fazenda cedo

começa a trabalhar.

A lari Florestal e Agropecuária de Ludwig fez o primeiro pagamento a seus

funcionários no dia 20 dajunho de 1967 e desde este dia aiê a sua venda para

outro grupo nunca atrasou em um dia sequer o salário dos mesmos.

Fisica.mente Ludwig recebeu uma área de I .632.121 hectares, sendol.l74.3gl hecrares no eslado do Parâ, município de Almeirim e 457.730 hecta-

res no Território Federal do Amapá, município de Mazagão.

Nesta imensa área física Ludwig implantou diversos projetos, que iremos re-

latar e descrever na medida de nosso conhccimento.

A fase Ludwig

Infta- estntrtura do proietoe problemas coní.êlaüos

Em virtude de sua localização distante de pólos economicamente implanta-dos e institucionalizados, a empresa Jari foi forçada a assumir os encaigos deuma infra-estrutura bem acima do normal de outros empreendimentos.

Pela total inexistência de uma infra-estrutura anterior na região, a Jari admi-nistrava uma empre.sa, com os encargos de infra-estruturas de uma cidade, comtodas as exigências naturais de uma comunidade civilizada, relacionadas a :

l) Habitação.2) Transporte (marítimo/fluvial, aéreo e terrestre).3) Educação e saúde.4) Abastecimento e supermercados.5) Geração, transmissão e distribuição de energia elétrica.6) Água - serviços de coleta, tratamento e distribuição.7) Drenagem e esgotos.8) Beneficiamentos básicos.9) Hospedagem.

l0) Atividades culturais, desportivas e recreativas em Monte Dourado.I 1) Serviços comunitários.12) Comunicações.13) Atividades paralelas.l4) Atividades agropecuárias.

Durante a fase de transição entre a sua implantação e a operação, os encar-gos infra-estruturais tornaram-se insuportáveis, não apenas pelo macro dimen-sionamento do projeto, como pelos encargos gerados com rèlação a terceiros,cuja penetração na ârea tornou-se incontrolável. Era praticamente impossÍvelpaÍa a empresa competir com o mercado natural, não somente pela locãlizaçaode sua ârea, gerando custos adicionais, como pelos elevados cuìtos adminisíra-tivos. Na tentativa de encontrar solução para esses problemas, em lg77 foi pla-nejada a Cidade Nova Jari, em área do então Território Federal do Amâpá.Este projeto previa a construção de uma cidade na Beiradinha de Munguba, èmlerra firme, quepassaria a constituir um distrito integrante do municípió de Ma-zagã'o - Amapá. A Jari doaria o terreno ao governo do Amapá, èxecutariatodos os serviços de infra-estrutura de água, esgotos, estradas, iluminação, e aconstrução inicial de mil casas para alojar seus funcionários.

Infrutíferas, contudo, foram as negociações junto ao Governo do Amapá,que se mostrou oposto à idéia. A Jari foi forçada a executar a construção deums infra-estrutura em Monte Dourado, com a construção de mil casas déstina-das a funcionários para o funcionamento das operações industriais.

l3l

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tt2 Infra-estrutura do projeto e problemas correlatos

ctuo

Os problemas foram se avolumando e agravando. Em 2 de outubro de 1979,foi criada a "Empresa de Desenvolvimento Santo Antônio Ltda.", constituídapela "Jari'Florestal e Agropecuária Ltda." (90Vo do Capital Social), "EntreriosComércio e Administração Ltda." (SVo) e SASI - Scrviços Agrários e Silvicul-turais Ltda." (5Vo), com o objetivo de atender às necessidades de infra-estru-tura acima descritas, dentro de um escopo empresarial.

A "Empresa de Desenvolvimento Santo Antônio Ltda." não teve, na práti-ca, uma atuação efetiva. Sua estreita interligação com a Jari, contando com ele-mentos da própria Diretoria da Empresa e com bens de propriedade da Jari, lhedificultou a atuação. Dessc modo, passou a própria Jari a fazer o que deveriaser atribuição da "Santo Ant.ônio".

DDo Habitação

A Jari continuou buscando outras maneiras para resolver o problema de in-fra-estrutura, mas sempre encontrando obstáculos, como por exemplo na áreade habitação. A Jari tentou a venda de terrrenes e casas a terceiros, visando:

l) Atender a demanda habitacional de Monte Dourado.2) Possibilitar a aquisição de casa própria a todos os funcionários da cmpre-

sa.3) Fixação do homem na árca, dirninuinclo a grandc rotat.ividade.4) Aproveitamcnto de mão-de-obra já fixada c rccrulada fora da área.

5) Incentivar a instalação de tercciros na área do projcto, cujas atividadesnormais, necessárias a uma infra-estrutura econômico-social e política,passariam a ser atendidas através dos órgãos públicos e privados, por setorde atuação.

Para que isso acontecesse, a Jari solicitou ao BNDE a liberação da hipotecada área residencial (dada como garantia do empréstimo para aquisição da fá-brica de celulose) e enviou carta consulta ao BNH, para estudo dapossibilidadedo financiamento para aquisição de terrcnos e casa própria através do PRO-HEMP - Programa de Habitação e Empregados.

A perspectiva aberta pelo programa PROHEMP permitia garantias aos fun-cionários relativas a propriedade de suas casas, como a sua comercialização e orctorno do valor das benfeitorias feitas, por ocasião de sua eventual retirada daârca. Permitiria também abrir a cidade para a iniciativa privada, bem comopara outras atividades governament.ais, de forma a const.ruir uma cidade abertae um novo pólo de desenvolvimento econômico-social.

A rcsposta do BNDE e do BNH foi que suas decisões dependeriam de um

A fase Ludwig

pronunciamento por parte do GEBAM - Grupo Executivo para o Baixo Ama-zonas, órgão do Governo Federal vinculado à Presidência da República.

oJrJ Transporte

Com relação ao transporte, fluvial, aéreo e terrestre a Jari obteve algum su-cesso:

Na parte fluvial, surgiram alguns serviços particulares, mas não em dimensãoque permitisse prescindir da atuação da "Navegação SION", pertencente aoGrupo da Jari.

No transporte aéreo, cujo serviço era totalmente execut.ado pela Jari, nofinal de 1979 a empresa TABA - Transporte Aéreo da Bacia Amazônica pas-sou a operar na área da Jari, com vôos no trajeto Belém/Monte DouradolBe-lém. Mas a Jari cont,inuou fazendo os vôos diários de suas aeronaves para Be-lém, pois a TABA não supria suas necessidades. Consultada, a VASP mostÍouinteresse em opcrar nesse trecho com suas acronaves. Mas seria necessárioatender a dois ítens:

l) Transformação da homologação do aeroporto de Monte Dourado, de pri-vado para público.

2) Aumento da extensão e asfaltamento da pista.

A Jari tentou junto ao le COMAR - Comissão de Aeroportos da RegiãoAmazônica o asfaltamento da pista. A rcsposta foi a seguinte:

l) Falta de verba.2) Ausência de prioridade para o atendimenÍ.o.

No que tange ao transporte terrestre, na época a Jari não conseguiu nenhuminteressado, tendo que continuar suprindo estes serviços.

rrr Energia elétrica

Com relação à geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, a Jarifez contatos em Brasília com a Divisão de Controle de Serviços de Eletricidadee com a Divisão de Águas e Eletricidade. Enviou também expediente à Direto-ria Geral do DNAE, em Brasília, solicitando autorização para uma das alterna-tivas abaixo especificadas:

l) Assumir a CELPA - Centrais Elétrica do Pará S.A., empresa concessio-nária da energia elétrica do Estado do Pará os serviços de distribuição deenergia elétrica oriunda de geração própria da Jari, a qual lhe venderia o"pacote energético" ao preço estipulado nas tarifas da espécie, encarre-gando-se a CELPA da revenda ao consumidor final.

133

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135t34 Infra-estrutura do projeto e problemas correlatos

2) A JARI gerar energia a t,erceiros, como concessionária na ârea, cobrandoo preço de tarifas adequadas à situação.

3) Concessão para empresas associadas e/ou subsidiárias do grupo Jari.

O último contato mantido com aqueles órgãos públicos verificou que o pro-cesso se encontrava no Departamento Jurídico para parecer. Segundo informa-ções, o assunto deveria ser encaminhado ao GEBAM, uma vez que havia ins-truções no sentido de que quaisquer assuntos referentes à Jari devcriam ser re-portados àquele órgão, para apreciação.

A fase Ludwig

Os projetos de LudwigNo ano de 1974, Ludwig definiu como seria utilizada aârea daJari na execu-

ção de seus projetos, tanto no estado do Pará, município de Almeirim, como noentão Território Federal do Amapá, município d,eMazagão.

O mapa foi baseado em fotografias aéreas (mosaicos semi-controlados),sendo portanto a escala e as estimativas aproximadas. A medição das áreas foifeita por processo mccânico, através do uso de planímetro polar, também sujei-to a variações ou aproximações. Existiu também a dificuldade na foto-interpre-tação de várias áreas, devido à presença de nuvens nas fotos e a escala del:40.000, que provocavam alguns enganos. Nesta avaliação não foram incluídos57.917 hectares localizados a Oeste do rio Parú, fora portanto do Bloco Jari-Amazonas-Parú, sendo 11.530 hectarcs da gleba Velha Pobre, próxima à ci-dade de Almeirim e 46.387 hectarcs de outras glebas mais ao norte.

Os vários projctos, com as respectivas áreas ncccssárias para sua execução(excetuando-se as áreas de proteção, est.radas, vilas e outras benfeitorias),estão descritas a seguir:

úrr 1. Projeto florestal

1.1 Plantações e pesquisasPara garantir o supriment.o contínuo de madeira para as fábricas de polpa,

papel, laminados e scrraria, seriam necessários 200 mil hectares de florestas deGmelina e Pinus, cssências já testadas para estas finalidades. Foi elaborado umplano cuja execução deveria ocorrer em duas fases. Para pesquisa da área flo-restal, foi considcrada uma área de l%o da ârea com floresta, portanto 2.000hectares, perfazendo 202.000 hectares para a plantação e pesquisa. Não esta-vam incluídas outras áreas ocupadas com estradas, faixas de proteção, pátios deaÍmazenamento de madeira, alojamentos cLc.

1.2 Sementeira e viveiroA Jari possui o maior viveiro do mundo, produzindo anualmente de trinta a

trinta e cinco milhões de mudas florestais, sendo em maior quantidade a Gme-Iina arborea (pertencente à família das verbenáceas) e Pinus caribaea (varie-dade hondurensis).

Para a produção de mudas atendcr ao Projcto Florcstal scriam necessárias asscguintes áreas:

Viveiro para GmelinaViveiro para PinusViveiro para outras espécies

60 ha20 ha20 ha

Area total de viveiros 100 ha

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t3ó Os projetos de Ludwig

1.3 Faixas de proteçãoAs faixas de proteção da mata nativa, de 100 a200 metros de largura, seriam

situadas entre áreas plantadas com Gmelina ou Pinus. A finalidade õra servir derefúgio aos animais, proteger os igarapés e a própria plantação contra incêndiose pragas que por,ventura surgissem em outras áreas. Foi estimado que entrefaixas estreitas e largas a área teria aproximadamente 20 mil hectares.

ooo 2. Pecuária

2.1 BovinoculturaConsiderando que em 1974 estávamos abatendo 1200 cabeças de gado por

mês para a subsistência de 30 mil pessoas, foi previsto que em 1990, coà or pto-jetos em fase operacional, teríamos uma popuiaçao em torno de 80 mil pesóas,demandando o abate de 3200 cabeças mensais, o que totalizaria 38.4d0 cabe-ças/ano. A fim de suprir esta necessidade, precisaríãmos de um rebanho de 100mil reses. Este rebanho bovino teria suas pãstagens entre a floresta de p.lnus, as-sunto que constituirá capítulo à parte neste livro.

2.2 BubalinoculturaA Jari não tinha o mesmo interesse na criação de búfalos, comparada com a

criação de bovinos. Porém existiam r!1eas prõpícias para a criaçâo da espécienas várzeas. Foram previstas áreas suficientes para a õriação ae qO mil cateçasde búfalos. Consideiaua-se também áreas necessárias para matadouro, pociiga(previsto plantel de 5 mil porcos, com abate mcnsal O-e gOO animais), óurmi",marombas etc num l,otal de 94 mil hectares, scndo 54 mil hectares no pará e 40mil hectares no então Território Federal do Amapá.

2.3 Animais de serviço (eqüinos e muares)Estes animais seriam criados para finalidades diversas, mas a principal seria a

de arregimentação dos rebanhos.

Dúo 3. Projeto arroz

- O projero previa uma plantação de 14 mil hectares, que poderia ser amplia-da, segundo as necessidades nacionais e mundiais. Para estè projeto, incluindoaârea das vilas de São Raimundo e Saracura, e ainda depósitós, iecadores e di-ques, a ârea necessária seria de aproximadamen te, 20 mil-hectares.

croo 4. Outras culturas

Outras culturas como o Dendê, Banana etc poderiam ocup ar 74 mil hectaresde áreas cultiváveis no Amapá. Esta previsão incluía mais Oe O mit hectares defaixas de mata nativa, com 100 a 200 metros de largura, perfazendo um total de80 mil hectares para gstas atividades.

A fase Ludwig

ooo 5. Hortigranjeiros

A fim de abastecer a população das áreas dos projetos com frutas, aves, ovose verduras, seriam necessários cultivos agrícolas e granjas que ocupariam áreaaproximada de 1500 hectares, incluindo também instalaçõés como depósitos,abatedouros e galpÕes para máquinas agrícolas.

DoD 6. Area industrialSeria necessária uma área de 500 hectares para instalar todas as indústrias de

potpa, papel, laminado, serrarias e beneficiamento de Caulim, incluindo escri-tórios, almoxarifados, depósitos de matéria prima e produtos industrializados,restaurantes, alojamentos, pátio de estocagcm dc madeira e cavacos, terminaisferroviários etc.

oDo 7. Jaztdas de caulim

- A área ocupada pclas jazidas de Caulirn, cxploradas pela "Cadam - Caulimda Amazônia", cra de l0 mil hectarcs aproximãdamente, incluindo instalaçõesna área denominada "Felipe", no Amapã.

oDú 8. Monte Dourado

Esta cidade, que na época deveria ter 3 mil habitantes era asede dos projetose deveria alcançar no ano de 1990 uma população de aproximadamente 30 milhabitantes. Para comportar toda a infra-eitrutúra ncceìsária, seriam necessá-rios aproximadamente 1200 hectares. Esta ârea já era efetivamente ocupadacom residências, comércio, escolas, hospital, supermercado, igrejas, estaçã^o de[ratamento d'água, estação de recuperação ou tratamento Oé réjeito, áiea delazer, recreação, clubes etc.

Doo 9. Silvivilas e vilas

A plantação de 200 mil hectares, para ser manejada e administrada racionale eficientemente, seria dividida em dez blocos de aproximadamente20 mil hec-fares cada um. Cada bloco teria seus próprios supèrvisores e executores. paraabrigar toda a mão- de-obra necessária à execuçao das operações de manejo'desse bloco, deveria exist,ir, de preferência próximo ao seuìentio, uma Silvivi-la. Naquela época já existiam duas irnplaniadas, abrigando o pessoal dos res-pectivos blocos.

Com 750 casas, as Silvivilas abrigariam engenheiros florestais, administrado-res, assistentes sociais, visitadores sociais, módicos, enfermeiros, capalazcs,

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t38 Os projetos de Ludwig A fase Ludwig t39

motoristas, operadores e trabalhadores com suas famílias. Nas Silvivilas existi-riam escolas, supermercados, centros comunitários, postos médicos, igrejasecumênicas e comissariado com destacamento policìal, além de recráçáo,praça de esportes, estação de tratamento de água, èscritório florestal e de admi-nistração comunitária, posto de lubrificação e abastecimento de veículos e equi-pamentos motrizes, oficina para reparos e manut.enção dos equiparentojdobloco. Deveria ter também área suficiente para acomodar o cent;o comunitá-rio, a horta e o pomar. Também as casas t.eriam quc t.cr quintais que permitis-sem o cultivo de pequcna horta e jardim, e ainda rccreação para õrianças. Foiestimada para cada casa uma área de aproximadamente 500'm2. As siivivilasteriam também ârea para acúmulo de detritos orgânicos (lagoa séptica). Nototal cada silvivila ocuparia área de 60 ha.

Nos projetos localizados no Pará havcria dez silvivilas e no Amapá três, tota-lizando treze silvivilas (*) correspondcndo a 780 hcclarcs.

Em seu conjunto, as áreas para silvivilas totalizariam 1005 hcctarcs.

ooú 10. Vias terrestres

10.1 Estradas principaisAs estradas principais da Jari ocupam uma faixa dc aproximadamente trinta

metros de largura, incluindo acostamcnlo, vala com largura de árvore a árvore,rcvestidas com cascalho ou piçarra, o que pcrmite o t.íf.go pesado e contínuodurante todo o ano, a qualqucr t.ipo de vcículo. Naquela?põca eram 600 km,que ao final do projeto estariam ampliados para maii de t200 km (3600 hecta-res) no Pará e 200 km (600 hectares) no estado do Amapá. No total seriam 1400km de estradas, ou 4200 hcctares aproximadamcnÍ.e.

10.2 Estradas vicinaisSão estradas existentcs nas áreas plantadas, dividindo-sc cm pequenas qua-

dras de aproximadamenl.e 25 hectarcs. São plancjadas e construíd'as, rrrpt.quc possível, na densidade idcal de 5 km para cadá 100 hcctares. Dão acessb aqualquer ponto das plantaçõcs, com largura módia cle 6,5 mctros. Na época jáhavia 4 mil km de cstradas, o que rcprescnr.ava uma árrea de 2 600 hectares.Quando a empresa atingissc os 274 mil hcctarcs plantados, em ambos os lados(Pará e Amapá) dcvcriam totalizar ccrca de l3 850 tm, corespondentcs a 8 120hcctares.

10.3 Estradas secundáriasSão estradas do tipo intcrmediário entrc as principais e as vicinais. permitem

tráfcgo pesado durantc todo o ano, obcdcccndo a cspccificações menos rigoro-

sas que a principal. Destinadas ao escoamento da madeira retirada das planta-çpel pa.ra os pátios de-estocagem ou concentração, ao longo da ferrovia, ouainda diretamente às fábricas. Seriam construíd aí à razao de"l km para caOa OOhectares, com largura de 16 mctros, ocupando área de 5 333 hectares.

10.4 Ferrovia' Destinada ao transporte de mad_e_ira dos pátios de conccntração para a âreaindustrial, ocupando uma faixa de 50 mctros de largura e 220 trn de èxtensão, oque representaria 1100 hectares. Os nove pátios planejados para receber a ma-

deira cortada, cada um com 20 hectares, somariam lSOhectaies. Assiffi, o com-plexo ferroviário deveria ocupar uma área correspondente a 1300 hectares.

os tipos de via terrcstre do projeto somariamhectarcs no Amapá.

Campos de aviaçãoJá existiam trôs campos de aviação, quc ocupavam área de aproximadamente

220 hectares' incluindo as faixas de apr-oximação. Outros prqu.no, campos de-vcriam ser construídos para o abastecirncnto dê aeronaues agiícolas, de adubos,defensivos agrícolas, socorros urgentes, lransportc de carga"s e passageiros. Nobloco do Pará seriam consÍ.ruídos mais cinco rãrpos (corrõspondendo a 50 hec-tares) e no lado.do Amapá dois campos (corrcspônclcnclo o b hr.torcs cacla, ouseja l6 hectarcs).

A ârea total tcria <lcz campos clc pouso, ocupando aproximadamen te 2g6hec t.arcs.

oro L2. Portos e trapichesA empresa já p9f :uía três portos cm Monte Dourado (correspondendo a

aproximadamcnte_ 1l hcctares), mais trôs cm São Raimundo (com tí hcctarcs) cum em Saracura (com I hcctarc). Eram sc[c portos ocupando urna átrea de 20hectares no bloco paracnse. No Amapá .rtuuo prcvistá a construção de trêsportos, corrcspondendo a 5 hect.arcs.

No total seriam dez porr.os, ern árca aproxirnada dc 25 hcclarcs.

croo 13. Rede elétricaConsiderando a hidrclétrica da cachocira dc Sant,o Antônio, no Rio Jari,seriam nccessários aproximadamcnte 450 km de rede de alta tcnsão para a

transmissão de energia. Paralcla a esta rede havcria uma faixa de 50 retrós ,etvegetação alta, ggg puocssc provocar acidcntcs. Esta faixa rcprescntaria Z 250hectarcs, sendo 1500 no bloco paracnsc c 750 hcctarcs no Amapá.

Em números globais, todos16 733 hectares no Pará e 2 310

DD3 1 1.

(*) A título dc informação,tura mcncionacJa.

existcm hojc duas silvivilas cm funcionamenr.o com toda a infra-est.ru-

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t40 Os projetos de Ludwig

ocro L4. Areas não aproveitáveis

l4.l Pântanos ou igapósSão áreas com vegetação constituída de buritizais e terrenos turfosos. Esti-

mava-se euo, dentro da área da Jari, existissem 100 mil hectares no Pará e54 855 no Amapá.

14.2 Riachos e igarapésEstimava-se uma área de 1200 hectares no Pará e 145 hectares no Amapá.

14.3 Afloramento de rochasA área estimada era de mil hcctarcs no Pará.

14.4 Áreas com relevo acidentadoEstimava-se que existisscm 7l 093 hectarcs no bloco do Pará e 134 mil hecta-

rcs no Amapá.

O total dc áreas não aproveitáveis cra dc 173 293 hcctares no Pará e 183 192hectares no Amapâ, perfazendo um total de 362 488 hectares.

DD.r 15. Reserva florestal

Em obediência à lei e por motivo de natureza ecológica, um mínimo de 50Voda ârea permaneceria com cobcrtura de mata nativa. Isso representaria umtotal de 817 727 hectares, sendo 493 312 hectares no bloco do Pará e324 415hectares no Amapá.

A fase Ludwig

SUMARIO

DISCRIMINAçAOPARÁ

(ha)AMAPA

(ha)TOTAL

(ha) %

I - Projeto Florestal2 - Pecuâria3 - Projeto afioz4 - Outras Culturas5 - Hortigranjeiros6 - Á,rea Industrial7 - Jazídas de Caulim8 - Monte Dourado9-SilvivilaseVilas0 - Vias TerrestresI - Campos de Aviação2 - Portos ou Trapiches3 - Rede Elétrica4 - Áreas não aproveitáveis5 - Reserva Florestal

1

IIIII

222 tffi54 00020 000

I 500500

I 200600

16 733270

20l 500

r73 293493 3t2

+o oõo

80 000

ro oõo

40523t0

l65

750t89 r92324 4r5

222 r0094 00020 00080 000

1 500500

l0 000r200I 005

t9 043286

252250

362 485817 727

13,6085,7597,2254,9020,0920,0310,6130,0740,0621,1670,0170,0010,1 38

22,20950.102

TOTAL 985 028 647 093 r 632 tzr 100,000

Page 73: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

A rotatividade dediretores executivos

A descontinuidade administrativa na Jari é um fato a ser levado em conside-ração na análise dos acontecimentos, principalmente no cargo de diretor execu-tivo, posto máximo na hierarquia da empresa e que sempre foi ocupado pornorte-americanos. Na maioria dos casos, os diretores executivos sequer tinhamtempo para dominar a língua portuguesa. Eram logo substituídos, dificultandoa assimilação dos problemas e a manifestação de opiniões. Alguns não se em-penharam em aprender o português, mesmo tendo passado mais tempo, comofoi o caso de Helmer Han e ti/illiam Turpim (este diretor por duas vezes). Dosdiretores executivos que a Jari teve entre 1967 e 1982, alguns falavam portu-guês, como por exemplo Loc Creig, que já havia trabalhado no Brasil na "OlinCraft", e Clayton Posey, que realmente aprendeu o português.

Ludwig era quem contratava seus diretores executivos e também quem osdemitia. No período de 1967 a 1982 a Jari teve dezesseis diretores executivos,sendo que nenhum demorou mais que dois anos, chegando a haver um diretor,de nome Rinelli, que durou apenas quatro dias no cargo. Neste caso, Ludwigmandou Rinelli para a Jari sem acertar seu salário. Após quatro dias, Rinelli foiaos E.U.A para negociar com Ludwig, mas não devem ter chegado a bom ter-mo, pois ele nunca mais voltou à Jari, tornando-se recordista da rotatividade deseu cargo

ooat

Além dos diretores que Ludwig contratava no mercado norte-americano, es-tiveram no cargo alguns de seus colaboradores mais chegados, que vinham porum período e depois retornavam aos seus trabalhos no Grupo, como é o caso deHelmer Han (considerado o maior engenheiro naval do mundo, inventor dossuperpetroleiros, soldados por seçÕes). Helmer Han era conhecido na Jaricomo o velho da bengala, devido à idade c ao uso permanente de uma bengala,por problemas no pé.

Howard King foi outro diretor que já trabalhava com Ludwig há muito tem-po. Foi o último diretor da fase Ludwig e um dos melhores que passaram pelaJari.

Joe Golson, a quem nos referimos ant,eriormen[e', foi diretor executivo daJari cm 1973. Gostava de esporte, tendo apoiado muito as competições esporti-vas da Companhia. Até bem depois de sua saída da empresa, ainda era dispu-tada a "Copa Golson", cuja taça ficou em definitivo com a equipe da MecânicaLcve, após tê-la conquistado por duas vezes consecutivas.

A fase Ludwig

DJÚ

Ludwig não tinha muito critério para demitir seus altos funcionários. Algu-mas vezes mandou até que subalternos demitissem seu chefe. Uma vez telefo-nou dos E.U.A. para Johan Zweed ordenando-lhe que comunicasse ao seuchefe imediato que ele tinha dois dias para se retirar da ârea da Jari. Zweedainda quis argumentar, mas Ludwig foi taxativo: "cumpra a ordem que estoulhe transmitindo"i Zweed não teve outra saída senão comunicar a demissão aoseu chefe imediato.

Antes de vir para a Jari , Zweed havia trabalhado em Portel, na empresa"Georgia Pacific", tendo obtido muita experiência em serraria. Esta experiên-cia muito lhe valeu, complementada também pelo domínio do idioma. Ludwigo apreciava muito , e Zweed assumiu a direção executiva da Jari por inúmerasvezes, mas sempre interinamente. Nunca quis ser efetivo, dizia que se istoviesse a acontecer, ele não tardaria a ser "comido pela onça".

Certa vez Ludwig chegou a Monte Dourado e chamou Zweed, que estava nocampo, com urgência . Zweed apresent.ou-se horas mais tarde a Ludwig noquarto da casa de hóspedes. Ludwig disse então: "Eu quero que você tomeconta da Jari para mim, porque eu vou demitir o Posey hoje à tarde"; Posey erao diretor executivo da Jari. Zweed ficou espantado com a notícia, pois além deser amigo de Posey, não via motivos para a decisão de L'udwig. Na realidadePosey era um excelente engenheiro florestal e um dos melhores diretores exe-cutivos que a Jari teve. Ludwig não quis revelar o motivo da demissão de Posey.Então Zweed disse que não podia aceitar, pois já que não sabia a causa da de-missão de Posey, o mesmo poderia lhe acontecer futuramente. Então Ludwigdisse enfaticamente: "Então você tambóm está demitido".

Apesar de rompantes deste tipo, Ludwig reconsiderava certos casos. À noitemandou chamar Zweed e cancelou sua demissão. Quanto a Posey, Ludwigtransferiu-o para os E.U.A., mandando outro diretor executivo para substituí-lo.

Neste incidente, Juan Ferrer havia estado antes com Ludwig e tudo leva a

crer que deve ter feito algum comentário depreciativo à administração dePosey. Como já dissemos, Ludwig acreditava muito em Juan Ferrer, mas destavez a bem dizer, ele deixou de vir à Jari depois deste incidente.

143

Page 74: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

r44

A evolucãodo projeto fiorestal

Ludwig realmente tinha o desejo de ver a floresta crescer uniformementecomo um plantio de milho, mas seu maior objetivo era produzir celulose emgrande escala, desde que previu, há mais de trinta anos atrás, a falta do produtono mercado mundial.

As essências tradicionais para a produção de celulose, até atingir o ponto decorte econômico, levam na Europa, (mais precisamcnte na Finlândia) de qua-renta a cinqüenta anos, e nos Estados Unidos de 25 a 35 anos. Ludwig apostavano mercado de celulose, mas sabendo dos problcmas de crescimento das essên-cias tradicionais, pôs-se cm campo à procura dc uma árvore que além de ter ocrescimento rápido, produzisse celulose de boa qualidade e pudesse competircom os produtos que já exist.iam no mercado mundial. Até este ponto, Ludwigainda não sabia onde implantaria seu projcto. Teria quc ser em um país declima tropical, que t.ivesse mão-de-obra disponível, terras baratas e em área su-ficiente. Daí em diante, as coisas aconteccram mais ou menos da seguinte ma-neira:

Ludwig tinha um assessor para assuntos agronômicos chamado tü/ijnkoop,de origem holandesa mas naturalizado nortc-americano. Ludwig deu-lhe a in-cumbência de pesquisar a essência florcstal que prenchesse os requisitos para arealização do seu grande projcto florcstal.

Depois de inúmeras pesquisas, Wijnkoop elegeu a Gmelina arborea, perten-cente à família verbenácea, como a árvorc que preenchia os requisitos deseja-dos: produzir boa cclulose, laminado de ótima qualidade, além da produção detábuas. Possuía tambóm a principal caract,críst,ica que Ludwig proc,urava: ocrescimento rápido, cmbora esl,e só acontccesse em algumas áreas da Asia (seucontinente de origcm) e cm solos muil.o fórteis de origem vulcânica, como porexemplo solos de Burna.

Wijnkoop trouxe as primeiras semcntcs dc Gmelina da África c não da Ásia,plantando-as no Panamá, estado de Chiriqui, que fica no sul, próximo à frontei-ra com a Costa Rica. As sementes foram coletadas na Nigéria, Costa do Mar-fim, Gambia e Malwee. Na África a Gmelina era plantadaìas áreas de minera-ção, para produção de tarugos de dois metros de comprimento por 10 cm dediâmctro, utilizados para contenção dc barreiras.

Na realidade a Gmelina não tem problcma de germinação, seja por estacasou scmenle, mas depcnde fundamenlalmcnt.c de solos férteis; mesmo em algu-mas áreas do seu continente de origem, como nas Savanas da Índia, ela vegêtamas não passa de arbusto.

A fase Ludwig

Úftat

Após os primeiros t,cstes no Panamá, Ludwig fez a seguinte pergunta aosseus assessores: "Onde deveremos implantar o projct.o?"

Como vimos, o projeto deveria ser implantado em um país tropical, pelosmotivos já mencionados. Após alguma procura surge a ârea da Jari, que perten-cia a um grupo de portugucscs que, consultados, most.raram int.eresse em ven-der sua propriedade. Após vcrificação in loco da árca pelos assessores de Lud-wig, principalmente Juan Fcrrer, aârea da Jari foi eleita como o local ideal parao grande projeto florestal a ser implantado. Apresentava extensão tcrritorialsuficicnte, boa topografia, rios navegáveis para escoamcnto da produção, climatropical, mão de obra barata c farta, e solos aparcntcmcnlc dc boa fertilidade.

oúú

Ludwig visualizou também as dificuldadcs quc cnfrcntaria devido à regiãodos municípios dc Almcirim e Mazagão sercm dcficicntcs em infra-cstrutura eprincipalment.e, não Lcrcm neïhuma tradição, vivendo quase que exclusiva-mcnte do extrativismo. Ele diversificou o seu projeto, aproveitando todas asoportunidades paralclas que scriam complemento dos negócios maiores, massempre tendo como carro chcfc o programa florcstal.

Como exemplo de novos ncgócios, fora os quc já existiam dcsde a fase dosportugucscs como a pecuária, Ludwig trouxe Paticholim contrabandeado da In-donésia (que não deixava que o procluto saísse do seu tcrritório). Wijnkoopatravessou à noitc de barco para a Malásia c em seguida despachou o materialpor via aérca para o Rio de Janciro, ondc imcdiatamcnte foi cnviado para a Jarie plantado.

Além de Paticholim, Ludwig tinha planos de produzir adoçants provenienteda semente de um vegetal chamado "Miracle Berry", que não continha elemen-tos cancarígenos. Este matcrial tambóm foi plantado na Jari, além de outros

' inúmeros ncgócios que abordaremos oport.unamcntc.

ÚDÚ

Voltando a falar da Gmclina, os primeiros povoamentos na Jari aconl.eceramem 1968 e foram provenientes de matcrial do Panamá c da África diretamente,sendo efetuados em solos originários dc formação "barrcira", QUC além debaixa fertilidade, leve sua mat.a nativa dcrrubada com tratores D-9. O serviçode enleiramento(*) também foi efctuado com o mcsmo tipo de máquina. Este

t45

(*) Reunião dos troncos e galhos com máquinas, garfo ou lâmina (Buldozer).

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t46 A evolução do projero florcsral

plantio foi cfctuado cm um platô dc aproximadamcntc duzentos mctros de al-tura cm rclação ao nívcl do mar, ondb hoje cstá situado o aeroporto de MontcDourado. A área plantada foi dc I l7 hcctarcs.

A princípio pcnsou-sc quc a causa do mau dcscnvolvimcnto da Gmelinafossc o arrasto de matória orgânica causado pclas máquinas no scrviço de enlci-ramcnto. Na vcrdadc estc falo contribuiu para cviclcnciar logo o quc dcvcriaaparcccr mais acentuadamcnt,c do tcrcciro ano cm diantc. Mcsmõ assim, de1968 a1973 foram plantados 28 mil hcctarcs dc Gmclina cm solos dc formaçãobarreira dc baixa fcrtilidaclc, corrcspondcndo aos Blocos "Doura6o" c "úi-gucl", e 22 mil hcclarcs cm solos dc módia c boa fcrtiridade.

Ludwig scmprc consullava os mclhorcs cngcnhciros florcst.ais do munclosobrc seu projcto c todos dcmonstravam scu rcccio cm plantar uma só cspócic,isto porquc não sc sabia como a Gmclina sc comporLariã no dccorrcr dos'anos,no que tange ao scu dcscnvolvimcnto vcgctal.ivo c sanitário, como tambóm àaceitação da sua cclulosc no lncrcaclo munclial. Mas mcsmo assim Ludwig pros-seguiu, csperando que com o passar dos anos tudo iria clarcar. Era um grandcrisco, mas elc apostou.

Para sc t.cr uma iclóia, nos solos dc baixa fcrtilidadc a Gmclina crcscia cmmédia 14 m3 por hectarc/ano, ou scja 9,7 toncladas, cnquant.o quc nos solos fór-tcis o crcscimcnto era dc 42 mr por hcctarc/ano, cquivalcntc a29,3 toncladas.Porém cstes solos fórtcis nas árcas cla Jari não ultrapassavam 40 mil hcclarcs cncm lodo ele podia ser plantado, clcviclo à topografia muito aciclcntacla.

. 4le. do problcma do solo, a Cmelina foi atacacla por um fungo (Ceralocys-íis fimbriata), o quc muito con[ribuiu para'agravar a situação.

oJnDctcctado o problcma com a Gmclina, Ludwig ainda insistia cm plantar so-

mcntc csta cspócie. Foi prcciso Poscy c Zwecd por conta própria fãzcrcm umcxpcrimcnto de Pinus caribaca, varicdaclc hondurcnsis, paia quc Luclwig acci-Lasse a inl.rodução da nova cspócic no scu projcto florcstal.

. _ O Pinus, apcsar de não lcr crcscimcnto rápido comparado com o da Gmclinajá se sabia que não lcria problcma nos solos de baixa icrtilidadc da Jari, pois jásc conhcçia plantios da cspécie cm Santarórn (árca da FAO), Macapá (Icomi)-e1tcs.1o-Zwccd já o havia plantaclo cm Portcl, nas árcas da cmprcia';GcorgiaPacific".

O primciro plantio dc Pinus na Jari crn cscala maior, acont.cccu no ano dc1973, onde foram plantados 4 735 hcctarcs. A introdução do Pinus na Jari foiprovidcncial, apcsar dc não rcsolvcr o problcma dc iuprimcnto de matóriaprima para a fábrica, quc sc agravaria corn o Lsmpo, scndo nccessário cortá-locom oito anos dc idadc cm vcz dc no rnínirno dcz anos. Valc aqui rcssalt.ar que

A fase Ludwig

não foi só a Jari que tcvc o problcma dc suprimcnto de madeira no início dcsuas operações industriais. A Klabin, no município dc Tclômaco Borba (Para-ná) utilizou por muito tempo a Bracatinga (Bracatinga mimosa) aré que sua flo-resta normalizasse scu crcscimcnto. A Rigesa também tcve o mcsmo problcma,quando precisou usar para fabricar cclulosc o Pinus do Paran â (Araucaria an-gustifolia).

cftú

Continuando a narração da cvolução I'lorcstal na Jari, passarcmos a falarsobrc o Eucalyptus deglupta, quc foi a tcrccira cssôncia florcstal plant.ada, cclr,rc tcvc scu primciro cxpcrimcnto no ano dc 19tì0 na árca na 74.

Viveiro de Mudas Florestais (liucalypthus, Gmelina e Pinus). A produção média anual era de 30milhões de mudas.

A csta alt.ura dos aconLccimcntos já sc sabia do gravc problcma dc suprirncn-to quc a fábrica cnfrcnl.aria a partir dc 1982. Aliás tudo [cria sido mais suavc scNova Iorque não tivcssc rcduzido os plantios dc 1978 a 1982, quando a ordcmIoi "scgurar a barra", como sc diz na gíria, scm gastar dinheiro. E como não scpoclia cortar uma fábrica dc celulosc, uma vcz quc já cslava opcrando, cortava-sc o plantio. Nova Iorquc solicitava uma próvia sobrc o rcndimcnto da florcsta

147

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148 A evolução do projeto florestal

plantada. João V/elker, que era o chefe da árca, fazia trôs previsõcs: alta, médiae baixa. Nova Iorque tomava scmpre a prcvisão mais alta.

O Eucalyptus foi mais providencial que o Pinus, pois seu crescimento ó maisrápido e sua celulose de fibra curta era scmclhante à da Gmelina, que já haviaconquistado o mercado.

Além destas dificuldadcs encont.radas pela Jari, a mão de obra scm tempoadequado de t.reinamcnto (a FAO c o Banco Munclial consideram nccessárioum período de cinco anos para a absorção dc novas lócnicas por t.rabalhadorcsde paíscs cm desenvolvimento, como o Brasil) muito contribuiu para a falta deeficiência das atividades, lcvando aincla cm conta a grandc rotat.ividade no sctorrural.

A fase Ludwig t49

O ciclo florestalA floresta comcrcial da Jari foi estabclecida em áreas cujo rcvestimento flo-

rístico original era constituído de uma grande heterogeneidade de espécies.Esta florcsta nativa, apesar da cxuberância, aprgsentava pouco rcndimentocconômico em scrraria, scndo o índicc dc aprovcitamcnto em torno de l5Vo. Acausa do baixo rendimento cstava relacionada ao grande número de árvoresocadas, não se sabcndo ao ccrto a causa. Potlia scr por scnilidade da floresta,associada ao ataquc dc insct.os, ató mcsmo o solo, ou ainda outra causa desco-nhccida.

Entrc os anos dc 1968 c 1980 foram clcsmatados c rcflorcstados 106 l42hcc-larcs, assim distribuídos:

Nos primciros tcmpos do projcto o ciclo sc iniciava com a rcmoção da florcs-ta nat.iva, por mcio dc máquinas pcsadas. Fostcriormcntc cstc mÓtoclo foi aban-rlonado cm troca dc motosscrras, quc forarn na rcalidadc os cquipamentos dcrnaior utilização. Após a dcrrubada da árca cram consl.ruídas as estradas dccontorno, que serviam dc acciro, cviLanclo quc o fogo pcncl.rassc na mat.a.

A madcira cle lci cra crn parl.c rcl.irada para a scrraria, scndo utilizada emconstruçõcs dc portas, janclas, cobcrturas dc casas, construçõcs agropccuáriasr:tc. O rcstantc da mata cra qucimada, scndo quc cstc proccsso acontcccu ató al'írbrica dc cclulosc cnt.rar cm opcração. A partir daí cra rctirada [oda a madciral)iìra a caldcira dc força c scrraria, scguinclo-sc a roçagcm c qucima para o csta-lrclccimcnto clo rcllorcsLáìmcnto. Após a qucima, cram construídas as cstradas

ANO GMIìLINA PINUS EUCALYPTUS

1 9681969r970t97l197219731974r975r976r97719781979r980

117 ha410 ha

5 294 ha7 295 ha9 794 ha7 195 ha8 191 ha7 959 ha6 017 ha5 662 ha4 007 ha3 428 ha6 309 ha

4 735 ha

4 607 ha5 419 ha2971ha2 782 ha5 249 ha5 158 ha

875 hal2I ha

2 547 ha

TOTAL 7r 618 ha 31 796 ha 2 668 ha

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t50 O ciclo florcstal

clc planlação no perímctro das árcas quc tinham módulos de25 hcctarcs,aproximadamcntc.

ooarO Viveiro situado em São Migucl, eqüidistantc das áreas cm que scriam cfc-

tuados os plantios, produzia anualmcnl.c uma módia dc 35 milhõcs de mudas dcGmclina e Pinus. Na dócada clc 80 foi iniciacla a produção dc mudas dc Euca-lypt.us.

O plantio das mudas tinha scu início no môs dc janciro, quc coincidia com aópoca chuvosa da rcgião. Enlrc os anos dc 1968 c 1980, o maior númcro dc hcc-tarcs plantados foi ern 1975, com 13 318 hcctarcs, scndo 7 959 dc Gmclina c5 419 hcctarcs dc Pinus.

O plantio dc Eucalyptus só comcçou cm 1979,con uma árca dc l2l hcctarcs.As limpczas (roçagem) no caso clo Pinus cram fcitas duas vczcs no primciroano, duas no scgundo, duas no tcrcciro ano c uma no quarto ano, havcndo tam-bém a roçagcm anl.cs clo corl.c raso, quando o Pinus cstava com clcz anos dc icla-dc. A Gmclina quc cra cortacla aos scis anos clc idadc rcccbia duas limpczas noprimciro ano, duas no segundo c urna no Lcrcciro ano, havcndo ainda uma úl-tima limpcza na hora clo corl"c raso.

Outro trato cultural rcccbiclo pcla florcsl.a cra o combatc à saúva, nas árcascm quc havia ncccssicladc. O procluto utilizado cra a isca "Mircx".

nonOs incônclios na florcsta scmprc Í'oram causadorcs dos maiorcs prcjuízos,

apcsar dc todo o cuidaclo na ópoca scca, colìt a constantc vigília nas torrcs dcobscrvação distribuíclas cntrc as plantaçÕcs. Ao mcnor inclício dc fumaça cralogo acionada a cquipc clc plantão, com rnáquinas c carros-pipa prontos paracnl.rar cm ação. Mcsmo corn lodas cssas providôncias, a Jari tcvc prcjuízos comincôndios cm suas plantaçõcs, como no áìno dc 1976, cm quc foram pcrdidosaproximaclamcnl.c mil hcctarcs clc florcsta. Ncssc ano a chuva Larclou a chcgar ca Jari já havia conl.ratado uma cmprcsa dc aviação do Arizona cspccializada cmcombatc airco dc incôndios florcstais. A acronavc dcvcria sair dos EstadosUnidos no clia 9 dc dczcmbro, quanclcl ncl clia 8 chovcu cm Mon[c Dourado.

Í-Íll::l

Exccul.anclo-sc as lirnpcz.as pcriódicas, o combatc à saúva c não havcndo in-côndio, as árcas cram libcradas para o cortc raso para produção dc cclulosc aosscis c dcz anos, para a Crnclina c o Pinus, rcspccl.ivamcntc. Após o cortc raso,l'cito com mol.osscrra, a rnaclcira ia scnclo crnpilhacla na própria árca, ondc cra

A fase Ludwig

mcdida para cfcito dc pagamcnto aos scrradores, scndo depois transportada atéos pátios cm caminhõcs "Big-Stick". Dos pátios a madcira cra transportada portrcm aLé a fábrica de celulosc, a uma distância rlc aproximadamcntc 70 quilô-mclros, tcrminando assim o ciclo florcstal.

l5r

Page 78: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t52

ODJ

PqIu cxccução dos objetivos propostos foi estabclecido o "projeto Emprci-tciro", com um cronograma dc trabalho dc um ano, contando dc 3i .ll.7t â oc-zcmbro de 1972. Durantc estc pcríodo, o projcto dcveria usar os mesmos móto-dos utilizados pclas-cmprcitciras conl.rat.adas c rcccbcria da Jari o mesmo trata-mcn[o dispensado àquclas. An[cs da clata dc 3l.ll.7l (mais prccisamcn[e cm01.10.70), por rcsolução tomada pclos sócios da Jari Florcsraì c AgropccuáriaLtda., haviam sido criados os cscritórios dc rccrutamcnto dc mão dc obra cmPinhciro c Balça, no cstaclo do Maranhão. A rcsolução foi assinacla por UlissesGrant Kccnccrjo, reprcscnl.anclo a "(Jnivcrsc Tant<ihips Inc.", firmà com sedc

A fasc Ludwig

cm Monróvia (Libéria) e por José Gcraldo Garcia dc Souza, pcla Entrerios Co-mórcio e Administração Ltda., com scde no Rio de Janeiro.

O cronograma de trabalho do "Projeto Emprcitciro" consistia inicialmenteno dcsmal.amento de mil hcctares e a utilização dc quatroccntos homens naconservação do programa de rcfloresl.amcnl.o. Para chefiar o "Projcto Emprci-tciro" foi designado o tócnico agrícola Almy Lucas Bastos.

Ao final do pcríodo cxpcrimcnral, com o programa clc trabalho totalmcnteconcluído, a análise fcita pclos Srs. Zwced c Poscy indicava que a cxpcriônciafora válida c quc os subsídios colhidos pcrmitiam a ampliação clo "Projcto Em-prcil.ciro", agora com dircLrizes quc lhc possibilitavam não mais scguir os méto-dos e processos utilizados pclas cmprciteiras; quc fossc implantada uma admi-nistração quc pudessc at,cnder c fazcr cumprir as normas lcgais c mcsmo numafasc prcliminar, as bascs para um programa clc assistôncia social a scr dcscnvol-vido dentro das pcrspcctivas do projcto.

al -l al

Um fato cnl.rctanto vcio clctcrminar o aprcssamcnto dc todas as providôn-cias, ainda cm fasc dc plancjamcnlo, para cfctivação a curto prazo do "ProjetoEmprciteiro". No dia 22 dc março de 1973 o Ccncral Emílio Garrastazu Médi-ci, Prcsidentc da Rcpública, visitou as instalaçõcs da Jari cm Montc Douraclo.Essa visita foi amplamcn[c noticiada pcla imprcnsa nacional c muitos jornais doexterior a registraram , cxplorando cm manchctc o fato da Jari conl.rat.ar cm-prcitciras, omitindo-sc quant.o ao Lral.amcnl.o quc lhcs cra dispcnsaclo. Apóscssa visita, a Prcsidência da Rcpública acionou todos os scus Ministórios, o Scr-viço Nacional dc Informaçõcs (SNI) c o Dcpartamcnt.o dc Polícia Fcdcral, noscntido dc rigorosa fiscalização à cmprcsa Jari c dc cstudar mcdidas para cfc-l.iva prol.cção do trabalho rural, cm âmbito nacional. A Jari por sua vcz ativou o"Projeto Emprcitciro", ponclo à disposição dos órgãos públicos pcssoas com ca-pacidadc dc oricntação, dc carátcr lcgal c social.

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Uma das dificuldadcs cnconl.radas pclo "Projcto Emprcitciro" para cfctiva-ção dc mcdidas dc cunho social foi a alta [axa dc rotatividadc dc pcssoal naépoca (100o/o Lrimcstralmcntc). Habituados a trabalhos sazonais e rcccosos dosaspcctos ncga[ivos da política das cmprcsas cmprcitciras particularcs, os Lraba-lhaclorcs só accitavam trabalho sob conLrato dc prazo dctcrminado, com novcn-ta dias dc duração. Assim crn junho ctc 1973, na tcn[ativa dc fixar o homcm naiirca, foi iniciacla a construção dc quatro blocos com dczcsseis casas cm alvcna-ria na árca do Pacanary, cuja conclusão c ocupação sc vcrificou cm novcrnbro o

t53

A criacão eevolução tlo sA,sI

Desde o início do projcto florcstal a Jari vinha utilizando pequenas empresascmpreit.eiras, sob contrato, para os serviços de desmatamentô e rato silvicultu-ral-..Naqucles primórdios, sem uma experiência na área que lhe servisse de pa-radigma, a Jari dependia efctivamente das empreiteirai, as quais nao disiu-nham de infra-csl.rutura racional e ncm das condiçOcs mínimas óxigidas pcta Ló-gislação Trabalhista Brasilcira, capitalizanclo a jari, como contrat.ante, as con-seqüôncias dos erros c omissõcs dessas cmprcitciras diantc das cxigôncias lc-gais, c a antipatia do público mal informado.

Fazia-se urgent.e então quc fossc cstabclccida pcla Jari uma infra-cstrut.uraque lhe pcrmitisse:

Conhccer os mólodos dc trabalho dos cmprcitciros, para corrigir e coibirsuas distorções c abusos.

obtcr subsídios para a formulação dos novos conr.rat.os.

Obtcr subsídios para o cst.abclccimcnto dc padrõcs prcliminarcs dc cust.o.

Criar condiçõcs dc cxcrccr cfctiva fiscaliz.ação dos cmprcitciros, no quctangc à co-rcsponsabilidadc da Jari na sua atuação, diantc dos pieceiioslcgais.

Prccavcr-sc contra possívcis boicotcs clos cmprcitciros cm épocas crít.icasdo projcto.

Não dcpcnder exclusivamcn[c clc tcrcciros na cxccução dc um projeto dctal dimensão cconômica.

Oricntar as cmprcsas cmprcitciras para rccstruturação progrcssiva, noscntido das ncccssidarlcs c rcsponsabilidadcs da própría larl. -

Page 79: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t54 A criação c cvolução do SASI

Daniel Ludwig, fotografado ac,Gcneral I;igueiredo, na ocasião

lado do Presidente Médici, queChefe do SNL

visitava a Jari em 1973. Ao fundo

 fase Ludwig

o mcsmo ano. Essa cxcriôncia dcu origcm ao projcto das Silvivilas, já quc os rc-sultados a curto pazo foram satisfatórios.

Concomitant.cmcntc à cxpansão física dc suas rcsponsabilidadcs, o "ProjctoEmprcitciro" sofreu transformação raclical, passando a compor a csl.rutura daDivisão Florcstal da Jari, cm nívcl dc Dcpartamcnto, dcnominando-sc "Dcpar-tamcnLo dc Scrviços Especiais".

A Silvivila do Planallo, quc tcvc sua consLrução iniciacla pcla tcrraplcnagemcla árca cm outubro dc 1973, c foi concluícla cm le dc sctctnbro dc 1974, tcvc al-gumas dc suas casas ocupadas cm carátcr dc cmcrgôncia por cmprcgados daJari, cm facc da inunclação dc suas rcsidôncias cm maio (local Bciradão) pcloRio Jari.

Í-f Í :'l

As pcculiariclaclcs c a naturcza (lo Dcpartamcnto dc Scrviços Espcciais cxi-giam uma maior autonornia aclrninistrativa para sua dircção. Sc não basl.asscmas dificuldadcs locais para justificá-lárs, como decorrcntcs da complcxidadc dcadministrar os acampamcntos cspalhados na granclc área gcográfica ocupadapclo Projcto Florcstal, c a Silvivila clo Planalto, havia tambóm as rcsponsabili-dadcs lcgais, as prcssõcs govcrnamcntais c políticas iìtravós tlo scrviço dc rccru-tamcnto dc pcssoal rural. Assim, o DcparLatìlcnto dc Scrviços Espcciais dcvc-ria solrcr uma rcformulação radical dcsdc sua organízação cstrutural, parLindodc uma infra-cstrutura quc lhc pcnnitissc atcndcr clc forma autônoma aspcctosopcracionais, sociais, cconôrnico-financciros c lcgais.

O Dcpartamcnto dc Scrviços Espcciais dcixou clc cxistir no'dia 30 dc agostorJc 1975, atravós do comunicado quc transcrcvcmos a scguir:

Comunicamos a todos os Í-unciontírios quc a parlir do dia 01 de sctcmbro dc1975 o "Dcparlamcnlo dc Scrviços Espcciais" passariÍ a funcionar cfctivamcnÍ,ecomo Emprcsa Aulttnoma, com a dcnominação dc "Scrviços Agriírios c Silvi-culturais Llda. - SASI".

Por tralar-sc dc uma cmprcsa associada ao Grupo c quc lrabalhará dircía-mcnÍc ligacta à Jari e cvcnlualmcnlc com suíts associadils, agradcÇcmos o apoioc inccntivo quc lhc forcm dispcnsados.

Al,cnciosamcníc, Iohan C. Zwccel.

flr,:l

O SASI foi criado por rcsoluçiro dc 13.01.75, tcndo como sócios: "MadcirasUniboard do Brasil Limitacla", rcprcscntacla por scus gcrcntcs W. Hugh

155

Page 80: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t5ó A criação e evolução do SASI

Phillips e Antônio Nicolau Vianna da Costa e "Jari Florcstal e AgropecuáriaLtda.", rcpresent.ada por scus gcrentcs Clayton E. Posey e Antônio NicolauVianna da Costa. O capital inicial da socicdade foi dc Cr$ 100.000,00 (Cem milcruzeiros).

A sociedadc tinha por objctivo a prcstação dc serviços a Lercciros através deconl.ral.o dc emprcitada, de dcsmatamento, plantio dc mudas florcstais, conser-vação dc florcstas, assistôncia, vigilância, fiscalização dc árcas rurais, assistôn-cia c fiscalização dc rebanhos, scrviços gcrais dc campo c tudo o quc sc rclacio-nassc com as atividaclcs clc silvicullura, agricultura c pccuária, poclcndo aindaparticipar dc out.ras cmprcsas como acionista ou quotista, bcm como dcscnvol-vcr at,ividadcs ou asscssorias complcmcnl.arcs aos scus objctivos, observandoscmprc as cxigôncias lcgais.

A scde c fôro scria Montc Dourado, rnunicípio dc Almcirim, Estado doPará. O SASI podcria abrir agôncias, filiais c constituir rcprcscntantcs cm [odoo território brasilciro ou no cxtcrior, a crilório dc scus sócios cot.istas.

at:1.

Dra Ana Alcolumbre Moura, dando o pontapé inicial de uma partida de futebol em Monte l)ourado.

Para gcrcnciar o SASI, poraclvogacla Ana Alcolurnbrc

rcsolução dc 14 clc junhoMoura, quc pcrÍnáìncccu

de 1976, foi nomcada ano cargo ató julho dc

A fase Ludwig

1983. Ela foi a única mulhcr na história da Jari a dcscmpcnhar uma função exc-cutiva, chegando ao cargo dc Diretor Executivo Adjunto, em subst.ituição aoDr. Luiz Antônio de Oliveira, quc pediu dcmissão. A Drs Ana Moura foi ca-sada com o saudoso José Moura Filho, também advogado, falecido prematura-mentc em 1983. O Dr. Moura foi um dos pionciros da Jari na fase Ludwig.

rlflat

A estrutura monl.acla para o SASI cra simplcs, apcsar da complexidadc dcsuas operaçõcs: flcxívcl, para atcndcr o crcscimcnlo dos scus cncargos; radical,pcla rapidcz dc cxecução das dccisõcs adrninistrativas. No scu primciro ano dcfuncionamento a cmpresa tornou-sc um rnodclo para as novas organizaçõcs qucviriam a trabalhar ncssc tipo dc serviço.

Os problcmas com a mão dc obra, no cntanl.o, continuavam cxistindo. Oshomcns rccrutados pclo SASI conl.inuavarÌr com as lncsmas caractcrís[icas:analfabetos, scm documcnt.os civís, docnl.cs, scm qualqucr noção dc disciplina,de higicne e carcntes dc todos os rccursos, inclusivc dc afctividadc. A clifcrcnçacm relação àquelc comcço quc já parccc tão distantc no tcmpo ó quc o SASIadquiriu a experiência dc como solucioná-los cm nossos dias.

nonO SASI administrava duas Silvivilas (Planalto c São Migucl) c cstava na ex-

pcct.ativa do funcionamento dc uma l.crccira (Bananal, com trezcnt.as casas)que, apcsar de construída, ató hojc não cnt.rou cm funcionamcnt.o. A título deinformação, essas Silvivilas tinham infra-cst"rut.ura complcta: luz elé,trica, supcr-mcrcado, serviço médico e odontológico, crcchc, praças de csportes el.c. As rc-sidôncias eram construídas em alvcnaria, sendo quc cm março dc 1982 existiam234 residôncias em São Migucl c população cstimada em I 024 pcssoas. O con-sumo de água (tratada) cra dc I 200 000 litros por dia, ou I 200 m3. A Silvivilado Planalto, tambóm em 1982, tinha 355 casas, população estimada cm 1713pcssoas e consumia-sc 800 mil litros dc água por dia, ou 800 mr. E já que esta-mos falando dc núclcos habitacionais do Projeto Jari, Montc Dourado, sede daJari, em março dc 1982 tinha 1834 rcsidôncias s uma população estimada emtl 325 pessoas. O consumo dc água tratada no inverno era de cinco milhões delitros por dia e no verão scis milhõcs dc litros por dia.

DÚÍ

Voltando a falar do SASI, no dccorrcr clos anos houvc modificações no seucontrato social, como a nova denominação da sócia "Madeiras Uniboard doBrasil Ltda.", que passou a chamar-se "Madciras do Jari Ltda.", representadapor Francisco Josó Mcirclcs Posscr dc Andradc (portuguôs) e Octávio Aver-

157

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158 A criação e evolução do SASI

tano dc Macôdo Barreto da Rocha. Foi também incluída a prática do comórciocm gcral nas atividades do SASI, principalmcntc rclacionada à compra dc Cas-tanha do Brasil (Bcrtholclia excclsa).

A cxpansão do SASI [cve scu início ern janciro de 1977, com o início da com-pra dc Castanha existent.c nas árcas dc posse, propriedade e cnfiteuse(*) daJari, pclo cstabclccimcnto do controlc da colcta fcita por tcrcciros. A medidafoi tomada visando:

- Protcgcr as árcas das plantaçõcs, irnpcdindo a pcnctração dc csl.ranhos,cuja prcscnça causava sório risco de incôndios, em dccorrôncia das foguciras cmscus acampamcnl.os durantc a colcta do produto.

- Controlar os trabalhaclorcs da árca florcstal, dos quais um númcro consi-dcrávcl dcixava seus afazcrcs cluranLc o pcríoclo da safra, para colc[ar castanhasexisl.cnl.cs nas irnediaçõcs.

- Coibir o abuso dos motoristas clc caminhão quc durantc o horário do cx-pcdicntc.usavam o l.ransportc da cmprcsa para o cscoarncnto do produto.

- Aproveitar cconômico-financciramcntc o procluLo natural cxisLcnl.c naârea. A produção módia por safra cntrc 1977 c l98l foi da orclcrn dc 9 081 hcc-tolitros.

Dillc

O sctor hortigranjciro foi assumiclo pclo SASI, dcvido à insolvôncia daAgrotcc, cmpresa dc tcrcciros clirigida por Tctsu Cochi; quc manl.inha contratocom a Jari para criação dc frangos dc cortc c ativicladcs dc horticultura, tendosido o invcstimcnto financiado pcla Jari. Em 1978 o SASI absorvcu a cstruturac as al.ividadcs daqucla firma, sob a dcnominação dc "Dcpart,amcnl.o Horti-granjciro". O Dcparlamcnto tinha como objctivo a produção cm cscala comcr-cial de frangos dc cortc, ovos, vcrduras c frutas.

frúÍl

As atividadcs ds cxtração dc maclcira foram iniciadas no môs de dczcmbrodc 1978, segundo a oricntação c contratos firrnados corn a Jari. Na irnplantaçãodos serviços, foi utilizada a mão-dc-obra clo pcssoal já fixo na árca e residcntcnas Silvivilas. O trcinamcnto foi iniciaclo no môs dc novcmbro. Em dczcmbrojá havia 82 homcns t,rcinados para o scrviço c assim succssivamcntc, nos mcscsscguintcs, dc acordo com as ncccssidaclcs opcracionais.

(t) arrcndamcntos pcrpótuos

A fasc Ludwig 159

cJnA pccuária concluía as atividadcs do SASI. Com a implantação da nova polÍ-

tica da Jari, cuja oricnl.ação cra a de quc todas as at.ivicladcs paralclas ao p.ólctoflorestal dcveriam scr transfcridas para Lercciros,a Jari cont.ratou com o SRSI, apartir dc lo dc janciro dc 1981, a administração dc scus rcbanhos bovinos, buba-linos, suínos c eqüinos. Foi cnLão criado o Departamcnto de Agropecuária emsua estrulura, abrangcndo o antigo Dcpartamcnt.o dc Pccuária da Jari c o jácxistcntc Dcpartamcnl.o Hortigranjciro do SASI.

úrr Objetivos e estrutura

Para atcndcr ao acrÓscirno opcracional-aclrninistrat.ivo ocorriclo no SASI, anova cstrul.ura difcria da inicial apcnas na inclusão das cquipcs adminislrativasdas novas Silvivilas a scrcm construídâs ou concluídas ató 1981, alóm da ncccs-sária rcstauração dos scrviços assumiclos postcriclrmcntc, tais como cxtração clcmadcira e agropecuária.

As atividadcs do SASI cstavam clirigiclas no scnticlo dos scus objctivos ccn-trais, conformc abaixo:

- Suprimcnto dc mão dc obra rural aos vírrios projctos da Jari.

- Exccução dc scrviços conlratados conl a Jari para clcsmatamcn[o, traLocullural, cortc de maclcira c scrviços gcrais.

- Administração das Silvivilas.

- Atividadcs Agropccuírrias.

Para atcndcr a csscs objctivos, o SASI tinha as funçÕcs básicas dc aclminis-tração, produção, contabilicladc c controlc, contidas nas funçõcs clcrivadas, sobrcsponsabilidadc dos órgãos a scguir dcscritos:

GerênciaCoordcnava as atividadcs c clcscmpcnho clc todos os órgãos da cstrutura,

alravós dc suas funçõcs cspccíficas clc plancjamcnto, organização, dircção econ l.ro lc.

Coordenadoria de Assistência SocialProgramava c cxecu[ava, cm conjunto com as scçõlcs dc assistôncia social das

Silvivilas, os programas dc assistôncia social quc objctivavam, cm última análi-sc, a fixação do homcln na 'árca. Dc forma gcral, os problcmas quc o serviço so-cial cncontrava na população rccrutada diziarn rcspcito a:

- Alto índicc clc analfabctisrno.

- S ubn utrição.

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A criação e evolução do SASI

- Alto índice de natalidadc.

- Desagrcgação familiar.

- Falta de consciência como pcssoa.

- Individualismo.

At.ravés de processos dc análise dc casos, gru-pos e comunidade, o serviço

social exercia suasatividadcs. Os objctivos do SASI através dcsse serviço eram:

- Melhorar o padrão humano do trabalhador c scus familiares, proporcio-

nando-lhcs crcscimento inclividual c comunitário.

- promovê-los socialmcnte dcnt.ro dc um proccsso eclucaLivo e participati-

vo, através do ensinamcnto dc noçõcs dc higicnc, Scgurança e cducação'

- Elcvá-los a padrões dc valorcs conclizcntcs com a pcssoa humana'

- Intcgração com os sct.orcs dc trabalho, vindo a melhorar os índiccs de pro-

dutividade.

Escritório de Belémpreposto da cmprcsa junto aos órgãos fiscais, trabalhistas e previden-ciários

em Bclém; complómcntãva alguns sórviços do cscritório central, coordenava,

supervisionava e cxcçutava, atravós dc SctorCs próprioS,-o rcçrutamentO, a sele-

ção c o t.ransporte de trabalhadores rurais para Montc Dourado. O scrviço de

irrruton'cnto dc trabalhadorcs cra (c aindâ é hojc) rcalizado no intcrior dos

Estados do Maranhão, piauí c ccará. Em cada viagcm scmanal os recrutadorcs

faziam pcrcursos de mais clc 4.500 km, rcalizando viagcns dc longas distâncias a

pé, Can'Oa, barçO, mOtOCiClC[a, CAvalO, CarrO, enfim, pClO mCiO dC transpOrte

àisponíu.i nuqu.ias árcas. o rccrutamcnto dc trabalhadorcs rurais comprecn-

dia as seguintes ctapas:

- Busca do homcm na sua habitação. Entrcvistas fcitas sob clima de descon-

fiança.

- Dcslocamcnto com os candidatos pclo mcio dc transportc disponível,para o ósc.rirório *oitpróximo, emZó Doca (Maranhão), Terezina (Piauí) ou

Juazeiro do Norte (ccaìá), para o cxame clc seleção médica,-preenchimento de

audortros, do "comprouuntô do dcstino de trabalhador rural" (exigência-feita

p.iu eortaria Ministôrial na 3279 dc 10.09.73) e dcmais documentos neccssários.

- Rctorno ao lugar de origcm dos julgaclos inaptos na scleção médica'

- Viagcm à capital do cstado, paÍa,obtcr os vistos das autoridadcs cm alguns

formuláiios (cumprimento Pm - 3279).

- Retorno ao ponto de rccrutamcnto para coorclcnar o cmbarque dos candi-

datos em ônibus Para Bclém.

- chegada cm Belém, via direta ao porto dc cmbarque para Monte Doura-

A fasc Lu<lwig

do, no navio Rio Jari. Antes do cmbarque todos eram vacinados contra febreamarcla, varíola c tétano, pclas autoridades.sanitárias de Bclém.

ContabilidadeRcsponsável pclo plano gcral de contas, lançamentos, balanços, demonstra-

Livos financciros, orçamenl.os operacionais por sctores, revisão de resultados e

conl.rolc gcral.

Dcpartamento de pessoalExccutava todas as atividadcs próprias da árca, tais como recrutamcnto, sc-

lcção c Lreinamento do pcssoal prcvidcnciário, para atcndcr suas nccessidadesopcracionais; rcgistro de todo o pcssoal da cmprcsa, cálculo c prcparo dasfólhas de pagamcnto clos cmpregados horistas c dos rcmunerados por produ-

ção. Nas relaçõcs cxternas, prcparava a documcntação lcgal quc era enviadamcnsalmente aos órgãos fiscais fcdcrais. Coorclcnava as atividadcs de regisl.ro e

movilncntação dc pessoal nas Silvivilas, para uniformiclade dc procedimento.

X I: ra na área dc pcssoal quc sc tinha conhccimcnl.o tlo grau de analfabetismodo horncm rccrutado, ondc apcnas para cxcmplificar, narrarcmos um caso qucna rcalicladc é mais tristc do quc cngraçaclo, lnas quc rcalmcntc acontcccu:

Ccrta vcz um Íapaz, ao scr solicitado adizcr scu nomc para o registro cadas-

tral, rcspondeu quc scu nomc cra Mundico. Eln scguida a pcssoa quc estava lhcintcrpclando pcrguntou o nomc dc scu pai, tcndo o rapaz rcspondido quc eraDico dc Olivcira. A sua idadc não sabia informar, sabendo apenas que certa vczouvira sua mãc comcntar quc clc havia nascitlo cntre a safra da castanha c docacau, na sua rcgião de origcm no Estado do Maranhão. Ncsscs casos o serviçoclc pcssoal tinha que fazcr a intcrprctação: Dico só poderia scr Raimundo,embora o Íapaz conl.inuassc a rcpctir quc seu nome era Mundico. )í

ooo Silvivilas

As Silvivilas, unidades comunitárias projetadas e implantadas em áreas es-

tratógicas do projcto florestal, com a finalidade de fixar c prover o projeto demão-dc-obra, supcrou as expcctativas do scu plancjamento, tanto pclos níveisdc proclqtividadc alcançados, quanto pcla soma dos aspcctos sociais c econômi-cos quc a população dcssas comunidades adquiriram. Estruturalmcntc, as Silvi-vilas dispunham de administração c scrviços próprios, tais como:

- Aclministração local.

- Supcrmcrcado (a cargo do Dcptq clc Abastccimento da Jari).

- Escola (a cargo do Dcpto dc Educação cla Jari).

- Posto médico (a cargo do Dcpta dc Saúdc da Jari).

- Ccntros Comunitários.

l6l

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t62 A criação e evolução do SASI

- Scrviços Sociais de apoio.

- Quadra de esportes.

A administração das Silvivilas compreendia as seguintes atividades:

Serviço comunitárioEfctuava o controle de locação residencial, manutenção das residências, ser-

viços de urbanização,limpcza da vila c cont.role da população por faixa etária.

Serviço socialDcsenvolvia atividadc cducativa quc tinha por objctivo final a integração

emprcgado-emprcsa e tinha seus rcsultados rcgistrados no aumcnto scnsívcl daprodução c na maior pcrmanência do homcm a serviço da empresa. Dirigindoscu trabalho à família, o serviço social conscguiu rcsultados positivos, emtermos individuais e dc comunidadc. Vale aqui ressaltar o trabalho das irmãsPóvoas (Aspásia, Iracema e Uyara) assistcntes sociais dedicadas e compctentcse também das visitadoras sociais Antônia Canté, Tcreza Dias e Jandira Pedro-so.

Departamento técnicoO dcpartamento tócnico tinha por mcta o atendimenl.o de mão-de-obra e

produção, de acordo com os planos estabclccidos pcla Divisão de Manejo Flo-restal e Extração de Madcira da Jari.

Quanto ao Manejo Florestal, os serviços diziam rcspcito à área da semcntei-ra, reflorgstamento, limpcza das plantaçõcs e combatc à saúva. Os trabalhado-res dcsta árca eram contratados cm rcgimc dc horistas, com base no saláriomínimo da região, acrcscido de prômios dc assiduidade e produção, quandoaplicáveis. Para alojar estes trabalhadorcs, o SASI mantinha acampamcntosdistribuídos nas áreas operacionais, em construção de madeira, com capacidadepara alojar de 250 a 360 homcns cada um. Estes acampamentos eram dotadosde infra-osl.rutura simplcs c básica: cozinha, restaurantc, cant,ina, atendimentoambulatorial c com lazór, campos de futcbol e projcções scmanais de filmcs.

A cxtração de madeira tinha como atividadcs principais o corte, empilha-mcnto c transporte até os pátios. O trabalho de corte e cmpilhamcnto era reali-zado por cquipes dc dois, trôs ou quatro homcns. Para o corte dc madeira cramutilizadas motosserras, scndo a manutcnção fcita cm oficina instalada no pró-prio acampament,o.

O SASI possuía uma fro[a dc 31 caminhões Mcrccdcs Benz cquipados comBig-Stick(*). Os scrviços dc pcquenos rcparos, borracharia, lubrificação e trocadc ólco cram efctuados cm oficinas fixaclas nos locais dc operação. Os ser-

A fase Ludwig

viços mais especializados eram feitos na oficina da extração de madeira da Jari,localizada na Silvivila de São Miguel.

O pagamcnto cra feito pelo rcgime de tarefa, ou seja, por metros cúbicosproduzidos, assegurando ao trabalhador o salário mínimo regional.

Quanto à pecuária, que completava a estrutura do SASI, deixaremos paradcscrevê-la em capítulo especial.

t63

(*) F.spócic dc guincho quc serve para levantar a ma<Icira do chã<l até a carroccria do caminhão.

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164

Umapoptrlaçãososmopotrta

Ludwig tinha empreendimentos em todos os continentes. Com o ProjetoJari, Monte Dourado rccebcu pessoas de várias nacionalidades, que vinhamtransferidas de outras empresas de Ludwig e mesmo de países em que a Jari es-

tava adquirindo algum equipamento ou absorvendo tecnologia, como o caso doJapão e Finlândia, respectivamentc. Apenas para evidcnciar a multiplicidadede nacionalidadcs, apresentamos a listagcm abaixo:

- Norl.e-americana- Cubana- Mexicana- Canadense- Panamcnha- Chilena- Argentina- Pcruana

- Colombiana- Equatoriana- Inglcsa- Finlandcsa- Alcmã- Austríaca- Chincsa- Indiana

- Francesa- Australiana- Holandesa- Japonesa- Portuguesa- Espanhola- Indonésia- Italiana

Vale frisar que esta divcrsificação dc nacionalidades ocorrcu principal-mente entre os anos de 1977 e 1979, dcvido à montagem da fábrica de cclulose.As mais numerosas cram a finlandcsa, japoncsa, norte-americana, e chilcna.

As pessoas pertencentcs a estas nacionalidades viviam em pcrfeita harmoniaentre si e com os brasileiros, em torno de um objctivo comum a todos: transfor-mar o Projeto Jari, situado cm plcna sclva cquat.orial, cm uma emprcsa viável,econômica e socialmcnte.

Os festivais de dança das difcrcntcs nacionalidades eram um acontecimentomarcante em Monte Dourado. Os finlandescs apresentavam a Polca e as Val-sas; os norte-americanos a quadrilha americana ("Square Dance"); os chilenosa Cueca e a Chilota; e os brasileiros a tradicional quadrilha.

Essas pessoas desfrutavam dos mcsmos direit.os, fosse no supermercado, nosclubes ou em outro local da cmprcsa. Aconteciam ató casamentos, como porexemplo o de Bob Chilcr com Izabcl, clc norLe-americano e ela brasilcira (resi-dentes hoje nos Estados Unidos) e o de Arcnd com lracema, ela também, brasi-leira e ele holandês.

A fase Ludwig

A fábrica de celuloseQuando nos referimos à fábrica de celulose,estamos falando do conjunto

plataforma geradora de força e plataforma de celulose, que é na realidade a fá-brica. Este conjunto foi construído no Japão, estaleiro de Kure, pela compa-nhia IHI (Ishikawajima - Harima). A construção das duas plataformas comscus rcspectivos acessórios levou aproximadamente um ano, embora as partescomponentes do projcto fossem fornecidas por vintc diferentes empresas doJapão e levadas até Kure para a montagcm.

O cstaleiro dc Kurc, um dos maiorcs do Japão, possuía guindastcs capazesclc alçar cargas de até 1200 toncladas. Tanto a plataforma de força como a plata-l'orma de celulose têm altura cquivalcntc a um pródio dc quinzc andares, sendoo pcso do conjunto equivalcntc a 58 mil toneladas métricas. O custo do em-precndimento foi de 269 milhões dc dólarcs. Uma vcz terminada a construção,rcstava executar o seu transporte do Japão ató o Brasil, mais prccisamente até oporto de Munguba, situado à margcm dircita do Rio Jari, na região do baixoAmazonas. A distância que as plataformas dcveriam porcorrcr scria de 15 500milhas (28706 km) atravós dc marcs e occanos. O pcrcurso pclo canal do Pana-má, que diminuiria a distância, foi dcscartado dcvido ao l.amanho das platafor-mas (240 x 50m).

à fábrica de celulose sendo transporlada em mar aberlo, do Japõo alé o Porlo de Munguba, no RioJuri.

Estc episódio não tcve similaridade na história da marinha mercante mun-tlial. Somcnte uma emprcsa inglcsa accitou o desafio dc fazcr o transportc, com

165

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166 A fábrica de celulose

seus possantes rcbocadores de 22 mil cavalos de potôncia, os maiores do mun-do.

A plataforma de força saiu de Kure no dia la de fevcreiro de 1978 e chegouao porto de Munguba no dia 25 de abril do mesmo ano; foram portanto 87 diasde_viagem. Nove dias após a primeira partida, no dia l0 de fevereiro saiu a pla-taforma de celulose (Fábrica), tendo chegado à Jari em 4 de maio, seis dias apósa chegada da plataforma de força. Saindo do Japão, passou pelo mar da,s Filipi-nas, entrou no Oceano índico, contornou o cabo da Boa Esperança na Africa, omesmo caminho que há 501 anos atrás (1488) Bartolomeu Dias percorreu, pas-sando por maus momentos devido ao mar agitado; as plataformas sofreramtambém duas scmanas com fortes venl.os dc proa, para daí viajar mais tranqüi-lamente pelo Oceano Atlântico, chegando ao Amazonas, até entrar no Rio iarie finalmente ao porto de Munguba.

Quem teve a oportunidade de ver o deslocamento das duas unidades desde afoz do'íari até o porto de Munguba, num pcrcurso de 80 km, assistiu sem dú-vida a um grande espetáculo. O Rio Jari, com seus mcandros(*) em certos tre-chos bastante acentuados, possibilitava,a visão do espectador que encontrava-se do outro lado da mata verde escura entreposta, a progressão das plataformascomo uma fantástica miragem de edifícios em movimento. A população ribei-rinha do Rio Jari, desinformada dos acontecimentos, olhava pasmada e a imagi-nar o que seria aquilo.

oDo

Finalmente o comboio chegou em frente ao porr,o Munguba, onde previa-mente já havia sido feita uma escavação em terra firme às margens do rio,deixando uma pequena faixa de terra funcionando como uma comporta. Rom-pida esta faixa de terra, aâgua do RioJari penetrou na área escauada possibili-tando também a entrada das duas plataformas. Antes disso já haviam sido cra-vadas 3700 estacas de Maçaranduba (Manilkara uberi) no fundo da escavação,as quais serviriam de apoio para o assentamento das plataformas. Ao puxai asplataformas. para dentro do lago, tarefa executada por tratores D-8, aionteceuum acidente devido ao rompimento de um dos cabos, quebrando a perna do ci-dadãoque iria gerenciar a fábrica, de nome Ney da Silva. Em seguida a com-porta foi fechada novamente, tendo seu nível levantado, como também toda aperiferia da escavação. O próximo passo foi bombear água do Jari para elevar onível da água sobre as estacas que haviam sido cravadas, até permitir a coloca-ção das plataformas, já alinhadas paralclamente sobre o topo das estacas sub-mersas. O nivelamento foi facilitado devido às plataformas terem no fundobujões que quando abertos franquearam a cntrada de água fazendo-as calar em

A fase Ludwig

cima do topo das estacas. As comportas foram então abertas novamente,deixando a água do lago retornar ao Rio Jari. Aos poucos as plataformas forambaixando até repousar definil.ivamente sobre o topo das estacas, "acontecimen-to" festejado com grande júbilo pelos técnicos e pelo gerente de operaçõesThomas Connor, depois de três dias e três noites de trabalho ininterrupto. Ocrro de assentamento foi de 3/8", considerado desprezível.

Nos anos cinqüenta Ludwig chegou a cogitar dc um projcto semelhante aodas plataformas, para dessalinizar água do mar para a Arábia Saudita.

JJD

Antes da Jari fazer a primeiÍa caÍga dc celulosc, cm 1976 forarn enviadaspara a Finlândiatreze toncladas de Gmclina para os tcstes finais. Durante opcrcurso ocorrcu uma brotação intcnsa da madcira, o que despertou a curiosi-dadc da população daquelc país, todos qucrcndo vcr dc pcrto a carga verdevinda da Amazônia. Outro fato pitorcsco foi a dúvida dos cstivadorcs do porto,quc só descarregaram a carga depois dc rigorosa inspcção, para vcr se não haviacobras no mcio da carga.

liquipe de engenheiros japoneses da I Ill, que construiu a fiÍbrica de celulose e u.ieram para o Brasillrara sua monlagem.

t67

(r) Meandros - curvas acentuadas de um rio

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A fábrica de celulose

oúclA fábrica começou a produzir celulose no dia la de abril de 1979, com produ-

ção diária de 750 toneladas; o nome comercial de sua celulose era "JARIPULP" e a sua primeira produção foi transportada no navio "LAPAMPA".Esta celulose foi vendida para a fábrica de celulose do Parâ (FACEPA).

Ludwig tinha planos de construir outra fábrica de celulose, existindo inclu-sive o projeto das duas fábricas, uma ao lado da outra. Quanto à segunda fábri-ca, Ludwig ainda não havia decidido a tscnologia quc dcveria ser usada, poden-do ser Pasta Craft ou Pasta Mecânica, scndo esta última ainda estudada naépoca por seus assessores. Para os dois proccssos mcncionados o fat,or primor-dial seria a energia, daí Ludwig tcr tcntado a construção da hidroelétrica na Ira-tapurú, tributário do Rio Jari.

Conjunto da fiábrica de celulose e plataforma de força em funcionamento, vendo-se ao fundo o RioJari.

o-'.l

 fase Ludwig

Finalmente, voltando a falar da fábrica de cclulosc, quando a mcsma chegouà Jari, já haviam sido construídas a Planta Química, três oficinas e a serraria jácsl.ava montada, scndo uma das maiorcs da América Latina.

Rachador mecânico de madeira grossa naliva, a ser picada para alimentar a caldeira deforça.

()s pequenos pedaços de madeira depois de picados, são armazenados a céuaberlo, para posteriorlt ltr icação de celulose

t69

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A saúdeNo ano de 1967, quando se iniciou a fase Ludwig naJari, seu primeiro mé-

dico foi Teofiça Aber. Nessa época não existia hospital em Monte Dourado. Oatendimento era feito em Posto Médico, com apenas dois leitos para casos maissérios. Em Jarilândia, distante de Monte Dourado aproximadamente 80 km,funcionava a área de Agropecuária da Jari. Lá havia também um Posto Médico,chefiado pelo Dr. Jorge Luiz Valdívia, que até hoje trabalha na Companhia,sendo portanto um dos funcionários mais antigos das fases Ludwig e nacional.

Com o decorrer dos anos, as atividadcs da emprcsa foram se expandindo,tornando necessária uma melhor estrul.ura para atcndimcnto médico dos fun-cionários. Em 1974 foi instalado provisoriamente o hospital dc Monte Doura-do.

Devido à extensão da área de opcração, foi neccssária a criação de diversosCentros de Saúde para atcnder aos núcleos de população. Estes Centros deSaúde foram denominados Unidadcs Sanitárias. O hospital de Monte Douradoera o núcleo básico que controlava e coordcnava todas as atividades do pro-grama de Saúde Integral, desde a educação sanitária, medicina preventiva e cu-rativa, atê a cirurgia hospitalar. O hospital foi denominado Unidade de SaúdeIntegrada de Monte Dourado.

úúD

No ano de 1976, a população das árcas dc atividadcs da Jari cra a seguinte:

LOCAL HABITANTES

Monte DouradoSilvivila do PlanaltoSilvivila de São MiguelAcampamentosBeiradão até S. Antonio da CachoeiraBeiradinho de MungubaBraço, Bandeira e BananalJarilândia e São Raimundo

2 096r 837t 2293 0005 000

884I 0504 000

TOTAL 19 096

Ainda no ano de 1976 (31.12.76) a Jari possuía 3CADAM na mesma época possuía 185.

 fase Ludwig

Jttrge Luiz Valdivia, médico pioneiro da Jari ao lado de índios da tribo dos Aparaí, quecttnsullar no poslo Médico.

vinham seI l5 funcionários; a

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172 A saúde

ATIVIDADE FUNCIONÁRIOS

MódicosLaboratórioEnfcrmagcmSancamcn[oAdrninistração

090527092t

TOTAL 7L

Durante a fasc Ludwig a árca cle saúdc cla Jari dcparou-se com dois casosmais gravcs, quc rclatarcmos a scguir:

No dia 14 de janeiro dc1974, um domingo, às trôs horas da [ardc, chegou umcarro à residência do Dr. Jorgc Valdívia, pcdindo que cle fossc ucr um mortono acampamcnl.o Idcal.'Valclívia imcdiatamcntc seguiu para o local e depois deexaminar o cadáver dcsconfiou dc mcningitc, dcvido a manchas cscuras que ob-scrvou em sua pcle. O corpo foi transferido para o hospital dc Montc Douradoede lá para Bclém, ondc o Instit.uto Rcnato Chavcs confirmou o diagnóstico:Meningitc.

Dois dias dcpois no mcsmo acampamcnto, out.ro trabalhador, que na vés-pera havia sc queixado dc dor dc cabcça c fcbrc, amanhcccu morto. Os traba-lhadores entraram cm pânico c exigiram quc fosscm muclados claquele acampa-mento, atribuindo ao local a causa das mortcs. A transfcrôncia foi cfetuãdapara o acampamcnto da Pontc Ladainha, rnas ncstc local acontcccram maismortes. Os trabalhadorcs cnl.raram crn pânico total, dcslocando-sc a pé para oporto de Munguba, a fim clc cmbarcar no navio Rio lari para rctornar ao Ma-ranhão, scndo cont.iclos com muit.a dificuldade.

A essa alt.ura dos aconl.ccirncntos a Jari já havia providcnciado a vacina nosE.U.A, pois não cra fabricada no Brasil. Vindo pcla Varig, a vacina nem pas-sava na Alfândcga, scnclo rcmctida irnccliatamcntc para Monle Dourado. Vciotambém um módico nort.c-amcricano cspccialista no assunt.o, quc conseguiuidentificar a bactéria causaclora do surto como scndo do Grupo nC". Essehé-dico fcz cxamcs da garganl.a dos trabalhaclorcs da pontc Ladainha, constatandoquc 60Vo dos cxaminados acusavam a bactória da mcningitc mcningocócica,cmbora não csl.ivcsscm com a clocnça.

A fase Ludwig

Ncsta época em todo o país estava havcndo um surto de meningite e os ofi-ciais das Forças Armadas vinham até o aeroporto de Monte Dourado nosaviões "Búfalo" da FAB, para serem vacinados pela equipe da Jari no próprioacroporto. Durante o ano de 1974 aconteceram 34 mortes devido à meningite.Os sepultamcntos, mesmo de pessoas que morriam de outras doenças, eram fei-tos à noite, para evitar que houvesse pânico da população. Aos poucos a molés-tia foi sendo dominada pela equipe médica da Jari, que aprendeu a tratar doscasos, com o auxílio das vacinaçõcs quc cram cfctuadas em massa na popula-ção, até a crradicação da docnça. No ano dc 1975 foram vacinadas cont.ra mo-ningite 16 320 pessoas.

oú.t MaláriaNo ano de 1976 a malária l.eve grande inciclôncia, quatro vczcs maior que em

1975. Para se ter uma idóia, dos 3 296 casos dc hospitalização daquelc ano,1740 casos foram de malária, ou seja, mais da mctadc das internaçõcs(52,79Vo). Foram ao todo 2 015 casos de malária comprovados em cxamcs hc-moscópicos, sendo a maioria pclo Plasmodium falciparum. Dos 53 casos deóbito daqucle ano, doze foram causados pcla malária (22,640/o). O coeficicntetlc ocupação hospitalar de 7l,3vo em junho, passou em julho para 108,63vo,ttSosl.o e setembro 150,\Vo, al.ingindo cm outubro, no vórlice do surto, 1877o.

A Jari usava desde 1972 como profilaxia para a malária, o sal cloroquinado(rnótodo de Pinotti) na proporção dc 120 S dc cloroquina para 30 kg de salcomum refinado. Esta profilaxia foi usada durante cinco anos e depois retirada.O trabalhador rural não ingcria as quantidadcs necessárias, pois a maior partetlos alimentos ingcridos, como o charque e o pcixe, já continham sal. O custo dacloroquina também era muito alto, US$ 41,00 por quilo. Outra medida preven-tiva adotada com efeito muil.o bom foi o uso de FANSIDAR. Nos acampamen-los cram usados dois comprimidos cada duas scmanas, como dose "slandard".

O tratamento da malária cra fcito com cloroquina por via oral, mas quandosc Í'azia nccessário era usada a cloroquina injctávcl (intra-muscular); nos casostttais sórios o tratamento cra à base dc Sulfato ou Cloridrato dc Quinino, por viaoral ou endovenosa.

r73

Quanto a trabalhadorcs rurais, cm 1976 chegaram à Jari9 242, numa rotatividadc dc 70,06Vo no ano.

O corpo médico da Jari no ano de 1976 cra o scguintc:

l1 839 e retornaram

Page 89: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t74

A influência daJari na região

É indiscutível que a fasc Ludwig promovcu uma grande transformação só-cio-cconômica no município dc Almeirim, nos municípios vizinhos e mesmo emcentros maiorcs, como o comércio de Belém e Macapá. Se hoje projetássemoscomparativament.e a região com o ano dc 1967, constataríamos as seguintes mu-danças:

Na fase portugucscs, os cmprcgos cram resl.ritos a cargos mais elevados,como gerentes de filiais, cont.adorcs, caixciros viajantcs etc. Os que conseguiamempregos, na maioria o pagamcnLo cra fcito uma partc cm dinhciro c outra nabase de conta corrcnte, onde os produtos cram Laxados dc acordo com a conve-niência dos patrões. Além disso a maioria clos trabalhadorcs não tinha carteiraassinada. Na cidade de Almcirim o problcrna cra ainda mais gravc, não haven-do empresas ou qualquer tipo dc inclústria quc ofcrcccssc cmprcgo.

A fase Ludwig, alóm de absorvcr a mão dc obra rcstrit.a ao município de Al-mcirim, proporcionou tambóm oportuniclade de cmprcgos à população doentão Território Federal do Amapá e dos municípios vizinhos, como Porto deMó2, Prainha, Montc Alcgrc e Santaróm, incluindo também a rcgião do BaixoAmazonas e a Baixada Maranhcnsc (*). Esscs trabalhadorcs eram todos regis-trados lcgalmentc, rcccbendo o scu salário cm dinhciro c cmpregando-o da ma-ncira quc mclhor lhes convicssc.

O J ÍI

Socialmente, no que tangc à saúclc, na fasc poríuguc.çc^ç a cmprcsa não dis-punha dc médico; a cidadc dc Alrncirim ató bcm pouco tcmpo não tinha ummédico efetivo, a não ser na ópoca do Dr. Pcclro Sérgio Batista, filho de Almei-rim, falccido em dcsastrc aérco no ano dc 1978. Com o falccimcnl.o do Dr. Pc-dro, Almcirim perdcu talvcz o scu filho mais ilustrc, quc muito podia ter fcitopcla sua tcrra no campo social. Falando ainda de saúde, os casos mais gravesacontccidos cm Almcirim cram atcncliclos no hospital dc Montc Dourado; noscasos dc muita cmergôncia os aviõcs da Jari iam buscar o paciente em Almei-rim.

úú-t

A fasc Ludwig dcu oportunidadc a muitas pcssoas da rcgião, scm instrução,mas muito intcligentcs, a cviclcnciar cstc prcdicado, quc cra mol.ivo dc admira-

(*) Âssunto tratado na criação do SASI

 fase Ludwig

ção pelos estrangeiros. Por exemplo: a operação de máquinas sofisticadas, quculguns de nossos caboclos exccutavam com grande cficiência.

Na área da educação, Monte Dourado teve o 2e grau completo antes de Al-mcirim e muitos alunos vinham complctar scus estudbs nas esõolas da Jari.

úúoO mercado em geral foi muito incrcmcntado, em Monte Dourado c nos mu-

nicípios vizinhos, estimulando a comunicação no Baixo Amazonas. para se leruma idéia de grandeza, nos anos de 1978 e 1979 a Jari comprava mensalmenteno comórcio de Belém o equivalentc a quatro milhões de dólares. Ainda comrclação ao mcrcado, a fase Ludwig proporcionou a comcrcialização livre dosprodutos nativos, especialmcnt,c a borracha, cujo monopólio por muitos anoscmacterizou as fases anteriores.

cDatResta falar do Beiradão, na margcm csqucrcla do Rio Jari, no Amapá, que

lbi scm dúvida a mácula na hisrória da Jari dc todas as fascs.

No "Jornal do Brasil" rJe 28 dc junho clc 1987 o jornalista V/illiam Waack,ttcpois de teccr somentc comcntários dcprcciativos à Jari, ainda lcvc a infelici-{qd. de compará-la com Carajás, no quc langc à sua população dc influência.Disse cle com rclação a Carajás:

(...) O acesso 1ár9a, porém, é pralicamcntc rcstrito aos que tem algumac:oisa a fazer por Iá. Com isto, a Valc tto Rio Doce acabou criaido uma eípécieclc colônia de trabalho, na qual pcssoas uniformizadas e, pclo brilho dos olhos,dotadas de aparentemenlc intindiívcl confiança no futuro do emprecndimentoc do país, desfrutam de condições de vida incomparavelmentc melhorcs que atlc scus colcgas pionciros da fari, sclva acima do parií,

Rcalmentc o acesso à Jari foi muito mais fácil, comparado a Carajás, quccstá localizada em um tcrminal de cstrada, crn cujo pcrcurso até o proj"to naoItÍ população às suas margcns, ocupadas pcla dcnsa florcsta tropicàI. Üma es-lrada de no máximo 100 mctros dc largura, c de propricdade da própria empre-sll, que não pode ser comparada com um rio como o Jari, de 40Omctros dc lar-Sura (frente a Monte Dourado) c dc navcgação franca, ondc os ribcirinhos,com auxílio do [ransporl.c mais clcmcntar, quc é a canoa (montaria), podiamrlcslocar-sc por grancles distâncias conduzindo scus pcrtcnccs.

Por outro lado, uma parl.c da população quc constituiu o Beiradão foi de pes-$oas quc já habitavam as margcns do Jari clispcrsamcntc c quc sc juntaram cml'unção do projcto, na espcrança dc obtcr alguma compcnsaçâo.

t75

Page 90: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

A influência da Jari na regiãor76

O Beiradão existe, mas não foi por vontadc de Ludwig' No início' a Jari ten-

tou impedir seu crescimento ror medidas bastante radicais, tendo inclusive

derrubado os primeiros barracos com motosserras, mas esta atitude tcve roper-

;;;;ã;;egariv;-;ãiunt" ó courtno do Amapá. A Jari renrou a construção da

Cidadc Livre p;i; suprir o Bciradão, mas o Governo do Amapá também não

aceit.ou.

Em suma, uma coisa não se podc ncgar: sc a população quc formou o Beira-

dão, em grande parte, tivesse nõs teus Íugatcs de origcm emprcgo, escola.e ser-

;i;ó de íaúde, õ pioj.to Jari.jamais tctia propiciado a ocupação do Beiradão

pãilurnilias, fícando mais fácii crraclicar os-boidéis c outros tipos de atividades'

 fase Ludwig t77

O projeto atrozTudo começou em Jarilândia, situada à margem esquerda do Rio Jari, dis-

tante aproximadamente l0 km do Rio Amazonas. Em março de 1969 existiamoito acres de arroz plantados em experimentos, vindo defois plantios de dez8cres, vinte, cem e por fim duzentos acres, perfazendo toda a âréa experimental338 acre9, equivalentes a 136,78 hectares. As pesquisas foram feitaì pelo IRI(Research Institute) e até o ano de 1974 foram gasros US$ 10,5 milhõei. As va-riedades de arroz testadas originalmente em Jarilândia eram provenientes dosE.U.A., Filipinas, Colômbia e Suriname. A área onde foram èfetuadas as pes-quisas era de campos de vârzea, com vegetação nativa de gramíneas e solõ deformação aluvial, devido às enchentes periódicas do Rio Jari. Esta área foi pre-viamente dicada para evitar a penetração das águas do Rio Jari.

ÚJD

Ludwig pretendia produzir aÍÍoz em grancle escala para o mercado nacional9 R{a exportação, em uma área de 14 mil hectares situada na margem esquerdado Rio Amazonas, com produção anual de 120 mil toneladas. Esta área erã con-lÍnua e seria dividida em cinco blocos. Para atender à produção, a área de pes-quisa e produção de sementes foi instalada em São Raimundo, tendo sido trazi-das alqu.mas.variedades de arrozjá testadas em Jarilândia, como por exemploApani, Apuri, Bowani e IR-22.

As pesquisas foram iniciadas em Jarilândia, que dispunha de infra-estrutura,mas o plantio em escala seria implantado em São Raimundo, como aconteceu.Em São Raimundo a área de produção dc scmentes e pesquisa era de 179,22hcctares.

ooD

Em 1973, no início dos trabalhos de preparação dos diques (*) e canais emSão Raimundo, Saracura, euo era sede do projeto pecuária e já possuía algumacsl,rutura, serviu de apoio para os primeiros serviços. A construção dos diques ecanais foi jniciada com o emprego de uma máquina construída nos E.U.A., denome Jeet. Esta máquina, testada nos E.U.A. em solos com teor de argila infe-rior aos da Amazônia, tinha produção excepcional. Porém nos solos com altotcor de argila de São Raimundo, não teve a mesma performance e por isso foiabandonada, depois de retirados seus motores para outra utilização. A constru-ção de diques e canais passou a ser feita por trãtores D-8, com ai "Bucyrus" delança, e com as "Bucyrus 40-H", sendo que estas trabalhavam sobre balsas. As"Bucyrus 40-H" foram na realidade as máquinas que construiram os diques e

(r) Construçãos desrinadas a represâr águas correntes.

Page 91: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

178 O projeto aÍÍoz

canais do projeto arroz. Este tipo de equipamento podia operar no inverno e

verão, sendo que neste último a máquina ia fazendo o canal e progredindo como auxílio de sua própria concha (lança). A produção desta máquina era de 300metros de diques em 24 horas de serviço. Estes trabalhos eram chefiados pelonorte-americano Donald Heigh, tendo como encarregado de operações Antô-nio Leite, vulgo Antônio Boiadeiro.

A área do projeto arroz, situada entre a margem esquerda do Rio Amazonase a margem direita do Rio Arraiolos, estava sujeita às enchentes periódicasdestes rios. Para o estabelecimento do plantio de arroz, a ârea foi cercada comos diques, evitando a penetração da água.

Do que seria o plano original, ou seja o plantio de 14 mil hectares, foram pre-parados aproximadamente 3 800 hectares. O total de canais e diques da âreaque entrou em operação foram os seguintes:

CANAIS Largura (m) Comprimento (km)

Principal de irrigaçãoPrincipal de drenagemSecundário de irrigaçãoTerciário de drenagem

16

16

t23

46,4320,1097,2078.84

TOTAL 242,57

oclS

O primeiro plantio de escala comercial em São Raimundo foi no ano de 1974,quando foram plantados 200 hectares. Este plantio foi efetuado já com o aviãoagrícola "Ipanema", de construção nacional, uma vez que a Jari não obtevepermissão para importar os aviÕes agrícolas marca "Gluma" dos E.U.A. quepodiam carregar até 1500 kg de peso, enquanto que os "Ipanema" carregavaql500 fg. Neste plantio aconteceu um acidente que por sorte não foi fatal. O

DIQUES Largura (m) Comprlmento (km) C/Plçarra (km) S/Piçarra (km)

Principal de irrigaçãoPrincipal de drenagemSecundário de irrigaçãoTerciário de drenagem

l2r2

8

3

92,8740,21

194,40157,68

52,28

9,5

13,2040,21

181,20

TOTAL 485, I 6 61,78 234,61

A frse Ludwig

piloto de nome Pick, ao retornaÍ pata o pouso após o último tiro de sementerobre o campo, resolveu fazer uma acrobacia. O avião caiu, ficando totalmentedestruído, mas Pick só quebrou algumas costelas.

orJc]O primeiro preparo do solo para plantio do aÍÍoz foi feito com tratores agrí-

colas também construídos nos E.U.A. para operar em São Raimundo. Esseslratores, marca "Copelane" com roda de borracha ou ferro, aos poucos foramtdaptados para o serviço. Também foram usados "Massey Fergusson 1805" e"l 135".

No preparo do solo, especialmente na parte de nivelamento dos tabuleiros,houve dificuldades devido aos solos de vârzea da Amazônia obedecerem a umarcqüência na sua formação. Próximo à margem dos rios ou mesmo de um ígara-pé, na época das enchentes a água, ao transpor a vârzea, traz partículas em sus-pcnsão de várias granulometrias; as maiores e mais pesadas são depositadas porgravidade logo nos primeiros estágios, formando as restingas, tesos ou vârzeaalta. Nesta faixa, que vai de 100 a 300 metros de largura, o solo, além de ter boafcrtilidade apresenta também boa textura e estrutura. Em seguida vem a várzeabaixa, em maior extensão que avârzea alta e com solos química e fisicamentelnfcriores, estando também em pequeno desnível em relação à várzea alta.Tanto na vârzea alta como na baixa, a vegetação predominante são as gramí-neas. O último estágio é o igapó ou pântano, onde a vegetação predominante éo buriti (Mauritia flexuosa) e aninga (Montrichardia arborences) e a tabôa(Typha dominguensis) sendo o solo t,urfoso nestas áreas e o desnível mais acen-tuado.

São Raimundo estava situado entre o Amazonas de águas barrentas (portan-lo com grande quantidade de partículas em suspensão) e do outro lado o Ar-ruiolos, com águas escuras e pobres, sem sedimentos. Em função disso, as res-tingas das margens do Amazonas eram mais altas. Esse desnível provocou mui-tos problemas com relação à lâmina d'água para o plantio de arroz. Os igarapésquc existiam na área também dificultavam o nivelamento. Para integrá-los àsárcas de plantio era necessário primeiramente limpá-los com trator ou máqui-nüs escavadeiras para depois aterrar com solo mais consistente.

oooO plantio era feito com avião agrÍcola "Ipanema EMB 20lA-,sendo que as

Bcmcntes eram pré-germinadas (*). A adubação, bem como o controle de

(r) Pré-germinada - colocada n'água em sacos de 60 kg e depois cobertas com encerado, tcndolnÍcio a germinação.

t79

Page 92: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

180O projeto arroz

ervas daninhas, doenças e pragas era feita com avião, perfazendo em média

2 100 horas de vôo/ano.

A colheita era realízada mecanicamente após a maturação do grão, o g-u.e

ocorre em médi a 120 dias após o plantio. Eram empregadas colhedeiras combi-

nuãur, equipadas com sapatas pantaneiras, graneleiros para transporte do local

da coíheíta até as estradâs priricipais e carretas para o lran-sqgrte até o benefi-

õiaOor. As colhedeiras erarn nacionais, marca "New Holland 5050".

O sistema de irrigação e drcnagem era feito por bombas de grande vasão, de

4500 m3/hora e 9000 mr/hora, respectivamente.

oJO

O moderno beneficiador de São Raimundo possuía uma infra-estruturamontada para beneficiar, conforme_previa o projeto original, 18,5 tonela--

ãas/hóra ôu 120 mil toneladas/ano. iontaua cóm sete silos murchadores, 32

silos secadores e vinte silos para armazenagem, o que representava uma capaci-

dade de recebimento de 400 ioneladas ldia c l2 mil toneladas/mês de secagem'

O setor de embalagem tinha uma capacidade horária de 25 toneladas em

sacos de 30 kg,2,5 toneladas em pacotes de 1 kg'

São Raimundo beneficiava em média duas mil toneladas/mês' Podemos

notar a grande ociosidade do equipamento, que tinha capacidade para benefi'ciar 10 mit toneladas/mês, o que demonstra como tudo no projeto arroz estava

superdimensionado para a âre,a de plantio em operação.

DÚfI

Com 94 casas, a vila residencial dc São Raimundo possuía toda a infra-estru-

tura de uma Silvivila em Monte Dourado, como escolas, posto médico, super-

mercado etc.

São Raimundo sempre foi deficitária devido à superdimen-são de sua infra-

estrutura, comparada õom sua área de produção. Os pfanos de Ludwig de 91-pãitãr aÍÍoz só se tornaram reais uma uèr, quando foram vendidas para a Itáliaïl *it toneladas. Ludwig ainda chegou a tÍazeÍ de sua frota mercante um gran-

de navio, de nome "Ouró Prince", que serviria de armazém para o arroz a ser

exportado para o exterior. O "Ouro Prince" ficou ancorado por muito tempo

no porto àimargens do Amazonas, tendo depois retornado para o exterior.

Em suma, o insucesso de São Raimundo foi relacionado diretamente à sua

infra-estrutura dimensionada para 14 mil hectares, pois a produção agrícola em

duas safras anuais era comparada aos índices mais altos de produtividade exis-

tentes no Brasil.

A fasc Ludwig

A agriculturaAlém do plantio de arroz em São Raimundo, que foi o maior projeto agrícola

dc Ludwig, existiram outros experimentos, desenvolvidos sempre com a inten-ç[o do aproveitamento de negócios que completavam o complexo empresarialda Jari. Ludwig observou que o município de Almeirim não tinha produção deulimentos, sendo necessário monl.ar uma estrutura que pelo menos em parte as-scgurasse o abastecimento da Jari. Ludwig tinha negócios de fruticultura no Pa-namá, onde produzia e cxportava para os Estados Unidos c Europa.

fI JJ

Na Jari, em Saracura, Ludwig iniciou um plantio irrigado de banana, emuma área de 50 hectares. Este plantio era chefiado por um colombiano muitosimpático, de nome Ivan Dario Saldarriega. O plantio foi estabelecido em áreaüntcriormente utilizada com pecuá,ria, sendo plantada com coloniã,o (Panicummaximun). O resultado do empreendimento não foi econômico, devido ao solodc baixa fertilidade, originário de formação barrciras, além da rebrota do colo-nião, que após a gradagem do solo germinou intensamento, sendo necessáriasvárias capinas.

oooOutro plantio de certa importância também executado por Ludwig foi o

l)cndê. Primeiramente foi plantado cm Jarilândia, no local chamado Esperan-ça.Em Mont.e Dourado e Saracura também foram feitos experimentos. Oplano cra produzir óleos finos, destinando os resíduos para a produção de raçãonnimal. O resultado foi satisfatório.

DDO

A mandioca também foi plantada em Saracura, onde foram testadas varieda-rlcs procedentes de outros estados, como Minas Gerais e São Paulo, além dopróprio estado do Pará. O plantio foi efetuado também em área que anterior-Incnte havia sido de pecuária, com solo originário de formação barreiras. Andubação foi feita na base de 800 kg de termofosfato por hectare.

Das vinte variedades testadas, quatro apresentaram elevada produção, comuma população de 10 mil plantas por hectare. Estas foram: OIho verde, com 49ton/ha; Pecui, com 42,5 ton/ha; Seis meses, com 41,3 ton/ha e SuÍlnga, com 36,5ton/ha, sendo todas do Pará. Somente uma variedade do sul (São Paulo), a IAC127 obteve 35,2 ton/ha, com uma densidade de 16.666 plantas por hectarc.

A finalidade do plantio de mandioca era para proclução de álcool c ração

l8l

Page 93: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t82 A agricultura

para animais. O responsável pelas pesquisas era o Engenheiro Agrônomo Adil-son Antonio Nemer e a coordenação de Juan Ferrer e Han Steemeijer.

JÚÚ

Atém das culturas citadas foram testadas variedades de milho para produçãode ração, leguminosas e gramíneas para atender a pecuária, Sizal e Rami paÍa aprodução de fibras, Girassol para óleo, além do Paticholim e "Miracle berry",ao qual já nos referimos anteriormente.

A fase Ludwig

ApecuáriaA pecuária da fase Ludwig teve seu início com os animais adquiridos da fase

portugue,se.s, a qual já descrevemos anteriormente. O melhoramento zootêc-nico dos animais iniciou-se com a formação de pastagens em terra firme, umavez que o plantel da fase anterior utilizava as áreas devârzea (no inverno eramusadas as marombas para o gado passar a noite) e pela compra de reprodutoresda raça Nelore, que foram enlotados com a vacada comum existente. Em terrafirme foram desmatadas áreas em Jarilândia, no local denominado Esperança,e em Saracura. A espécie de capim plantado foi o colonião (Panicum máxi-mum). Daí para frente o rebanho passou a ser mineralizado e receber todos oscuidados veterinários, como vacinas contra Aftosa, Carbúnculo sintomático,Brucelose e vermifugações

Paralelamente ao aprimoramento zootécnico do gado já existente com a in-trodução de touros Nelore, foram adquiridas também quatrocentas novilhasNelore de excelente linhagem, sendo enlotadas com touros Nelore e Charolês.Vale aqui observar o problema das raças puras européias nos trópicos. Ostouros Charolês, apesar de produzirem uma descendência excelente na geraçãoFl, passavam o dia dentro dos igarapés para dissipar o calor corporal, saindosomente à noite para cobrir vacas e se alimentar. Este regime lhes causava pro-blemas de emagrecimento, sendo necessário de vez em quando reco-lhê-los para tratamento. Os ectoparasitas, como o carrapato, também causa-vam problemas devido à espessura da pelagem, que permitia sua fixação.

A Jari também adquiriu da Swift em São Paulo um plantel de vacas e algunstouros Santa Gertrudes. Este gado se adaptou bem às condições tropicais, comrazoável índice de natalidade.

CIOJ

Em 1974 foram efetuados os primeiros testds de inseminação artificial em bo-vinos na Jari, com a orientação de um técnico da Swift. O resultado foi conside-rado bom. De sessent"a vacas inseminadas, obteve-se um nascimento de 527o. Ométodo utilizado foi o ce.rvical profundo, óom o sêmen na forma de peletes quenecessitavam ser diluídos em uma solução de citrato de sódio com água destila-da. A conservação do sêmen era feita em recipientes próprios contendo nitro-gênio líquido a uma temperatura de 196 graus centígrados negativos. Estesêmen era proveniente de touros da raça Santa Gertrudes da Swift e foi usadocm vacas mestiças de Zebú e de sangue CharolêsÂ',{elore. Os produtos resultan-tes com Santa Gertrudes (3/8 Zebú + 5/8 "Short-Horn") e meio sangue Charo-lês/Nelore (UZ Charolês + l12 Nelore) saíram com pelo espesso, demonstrandoque nos trópicos o grau de sangue das raças européias não podia ser em maiorquantidade que o sangue do Zebú.

183

Page 94: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

184 A pecuária

Em Saràcura a pecuária tinha infra-estrut,ura montada, com currais e cercasfunciona.is,ãgua encanada, inseminadores treinados eluz elétrica, isto devidoao horário das inseminações, das dezoito horas em diante ou bem cedo às seishoras da manhã. As matrizes eram separadas em lotes de 250 e havia três retiroscom 750 vacas em cada um, perfazenão 2 250 no processo de inseminação artifi-cial. O índice de parição médio era de 7Svo, não sendo maior por causa dasvacas Santa Gertrudes, cujo índice era de 657o. As vacas Nelore davam gyVo eas meio sangue Charolês/Nelore 85Vo, sendo que as fêmeas deste grau de san-gue entravam em cio com dezoito meses.

Utilizando sempre o método de I.A. foram feitos inúmeros cruzamentos deraçal européias com Zebú' (Nelore) e mesmo entre as raças zebuinas, grtãnjoprodutos de alta qualidade zooté,cnica e pcrfeita adaptaçáo às condiçõe"s tropi-cais. Entre os cruzamentos efetuados entre Bos Tauros(*) e Bos Indicus(**) óo-demos citar os seguintes:

Charolês com Nelore - Utilizando sêmen de touros Charolês provados, pro-venientes da A.B.S. ("American Breeders Service") em vacas Nelore ou aze-buadas(***) obteve-se um produto de excelente qualidade. Este cruzamentofoi o que melhores resultados apresentou, como veremos abaixo:

- Os machos e fêmeas por ocasião da desmama, com idade entre g e 10meses pesavam em média 263 kg e 245 kg respectivamente, embora houvessecasos de machos que aos 10 meses pesassem até,342kg.

- As fêmeas entre l5 e l8 meses entravam em cio e podiam ser inseminadas,sendo o índice de parição médio de 85Vo.

- Os machos iam para o abaÍe com peso médio de 444 kg, na faixa de 24 a 36meses.

A fase Ludwig

- Os machos com idade entre 8 e l0 meses (ocasião da desmama) tinhampeso médio bruto de 230 kg e as fêmeas na mesma faixa, r97 kg.

- As fêmeas entravam em cio a partir de 24 meses de idade.

- Os machos iam para o abate com peso médio bruto de 428 kg, na faixa de24 a36 meses.

Após o cruzamento do "3l4 Zebu + l/4 Charolôs", voltava-se novamente ainseminar a fêmea deste grau de sangue com o Charolês puro, resultando o "5/8Charolês + 318 Zebv". Os animais provenientes deste úllimo acasalamento sãoconsiderados uma raça artificial, no caso o Canchim.

Acasalando uma fêmea de sangue "5/8 Charolês + 3/8 Zebv" com um machodo mesmo grau de sangue, o produto resultante guarda as mesmas característi-cas fenotípicas dos pais, sendo tambérn charnado de la bimestiço.

Além dos testes com o Charolôs, foram cfetuados cruzamentos (sempre pormeio da inseminação artificial) de "Hcrcfford" em vacas Nclore, dando tám-bém um excelente boi para corte, com peso médio de 424 kg na faixa de 24 a 36meses. Somente a título de informação, o "Herefford" tem uma caracJerísticadominante sobre as raças com as quais é cruzado, que é a cara branca (até a 5!geração).

Outro cruzamento foi o "Brown Swiss" (americano) com vacas azebuadas,para obtenção de maior produção de leitc, sendo o resultado razoável. Osmachos provenientes deste cruzament.o deram bons animais para o corte.

Por último foram cfetuados cruzamentos de "Beefalo" com vaca Nelore. O"Beefalo" é um cruzamento de gado bovino com o Bisão americano, quc per-lcnce a uma outra espécie (Bison bison). Os poucos animais nascidos (quinzeao todo) demonstraram bom porl,c c boa rusticidade. Infelizmcnte não iorampcsados para comparação com os dcmais produtos, mas es[imativamente os re-sultados ficaram cntre o"l12 Charolôs + l12 Nelorc" e o "l12Hercfford + l/2Nclore".

Para finalizar esta parte de cruzamentos e mestiçagens, informamos quecram feitos cruzamentos por meio de I.A. com Nelore puro para obtenção defômeas que serviriam de base para cruzamentos com raças européias. O plantelcm geral gozava de boa sanidade e somcnte no ano de 1975 houve um caso deraiv.a paralítica, transmitida por morcegos hcmatófagos, que foi controlada comvacinações e combate aos vetores.

uooHouve também o caso dc uma onça que comeu 152 animais, na maioria bc-

7.crros, no pcríodo dc aproximadamcnte um ano. Esta onça, até o dia cm qucloi caçada, virou uma espécic dc lcnda cntrc os vaqucirôs dc Saracura, qut

185

Além_dos requisitos citados acima, os animais provenientes desteJo (l/2 Charolês + l12Zebú) eram resistontcs às cóndições climáricas

cruzamen-da região.

Na retrocÍuza com o Zebu (geração de sacrifício) a fêmea "l/2 sangue Cha-rolês + l/2 Nelore" era inseminada-com sêmen de uma das raças Zebú como oNelore, Guzerâ, Gir ou Tabapuã. os melhores "3/4 zebu'+ l/4 charolês"(grau de sangue do novo animal) foram resultantes do cruzamento com o Ne-lore ou com o Tabapuã. O cruzamento era feito com o Zebu e não com o euro-peu' para evitar que o animal saísse peludo, tornando-se inconveniente paÍa aregião. A seguir daremos as características dcstes animais "3/4 Zebu + l/4 Cha-rolês":

(*) Bos Tauros - Gado europeu

(t*) Bos Indicus - Gado indiano (Zebtt)

1***1 Azebuadas - cbm grau de sangue das raças Zebu indefinidas.

Page 95: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t86 A pecuária

davam as explicações mais extravagantes sobre sua astúcia. Uma vez o capatazda ârea me disse que havia uma velha na localidade de Bom Jardim, às margensdo Rio Jari, acusada pelos moradores de virar onça. Assim, suspeitava ele, po-deria ser a velha que virava onça e vinha à noite alacaÍ os animais em Saracura.Realmente a onça era astuta. Sabíamos que ela existia porque achávamos as

embiaras, mas ela nunca voltava para comer uma segunda vez, fato incomumna espécie felina.

Certa vez um vaqueiro em campeada caiu com o cavalo em um buraco ero-dido pela chuva, não conseguindo retirar o animal. No espaço de tempo de trêshoras, quando vieram mais vaqueiros para retirar o cavalo, a onça já o haviamatado-e retirado do buraco, fugindo para a mata ao sentir a aproximação daspessoas.

DoD O sistema silvopastoril

A pecuária permaneceu em Saracura até 1978, quando o Colonião que haviasido plantado em solos originários de formação barreiras, de baixa fertilidade,começou a degradar. A pecuária foi então transferida para Monte Dourado, emconsórcio com as plantações de Pinus, conforme passaremos a relatar.

O sistema Silvopastoril da Jari foi efetuado em áreas plantadas com Pinus ca'ribaea. Pelo período de dez anos se fez pecuária bovina e eqüina, envolvendouma área de aproximadamente l0 mil hectares, com o manejo de até 3 mil bovi-nos, abrangendo as fases de cria, recria e engorda.

O sistema teve seu início com a derrubada da floresta, cujas áreas poderiamter até mil hectares. Primeiramente as terras eram inventariadas, para avaliar aaptidão do solo e também o aproveitamento de essências de valor econômico,como por exemplo o Angelim (Dinizia excelsa) e a Maçaranduba (Manilkarahuberfl. Antes de se efetuar a queima, a ârea era contornada por estradas. So-mente então eram edificadas as estradas de plantação, tendo os módulos emmédia uma área de 25 ha.

' O plantio de Pinus foi efetuado no espaçamento de 4 metros entre as linhas e

2,2 metros entre as plantas, existindo também espaçamentos 4 x 3 m. O plantiode gramíneas foi feito após o plantio do Pinus, sempre com um espaço dê tempode irinta dias. A densidade do plantio do capim, no caso o Colonião (Panicummaximum) e o Green panic, variedade Trichoglume, foi de duas linhas ao cen-tro, em cova aberta e distando uma da outra um metro. Além das espéciesacima citadas, plantamos também kikuio , Brachiaria humidicola, (não reco-mendável em floresta) no espaçamento de até 6 x 6 m entre linhas e 2 metrosentre os sulcos, estes'de 0,5 m de comprimento e 3 cm de profundidade, tendosido fechado o sulco com terra. A quantidade de semente para estes plantiosgirava em torno de2kg por hectare, sendo sementes de bom valor cultural e

germinativo. -

A fase Ludwig

Após o plantio do Pinus e do capim eram feitas conservações para eliminarervas daninhas. Somente após um ano os animais teriam acesso ao capim. Ocercamento da área era realizado logo após o estabelecimento dos plantios dePinus e capim, sendo as cercas de arame farpado, com quatro fios e aóhas a cadadois metros. O tamanho dos piquetes dependia da disponibilidade de água paraos animais, mas a média era de aproximadamente 100 hectares. Quanto à eAifi-cação de saleiros para mineralização dos animais, em média tinhamos dois sa-leiros por piquete.Para facilitar o manejo dos animais, principalmente quando a floresta já estavabastante alta, fazíamos corredores que direcionavam os animais para o curral.Após um ano de plantio do Pinus, os animais eram colocados na área para pas-tejo, pois o plantio geralmente era efetuado de janeiro até o fim de abiil, sendointroduzidos no segundo ano os meses corrcspondentes ao tórmino do plantiode cada ârea. Nos primeiros meses o manejo dos animais requeria cuidadospara que não houvesse pisoteamenl.o do Pinus. De qualquer forma, próximoaos saleiros e malhadas ocorriam numerosos tombamentos. O maior-cuidadoera não correr com os animais, deixando-os à vontade.

A carga de animais por área dcpcndia do tamanho do piquete. Era fcito rodí-zio avaliando a altura do capim pastado, embora o suporte fosse até o quartoano de I U.A (*) por hectare/ano. Para juntar os animais usávamos cavalos,com uma média de um vaqueiro paÍa trezentos animais, até o quarto ano. Apósesta época, quando o Pinus começava a fechar as linhas, usávamos um vaquéiropara 150 animais. Após o quarto ano, começavam as dificuldades da pecuária,que resistiu até o sétimo ano, mas com dificuldades na arregimentação dos ani-mais, diminuição da pastagem devido ao sombreamento da floresta e queda deacículas do Pinus.

Com a diminuição das gramíneas devido ao sombreamento, o gado passava ase alimentar de outros vegetais de diversas famílias botânicas, como por exem-plo o fruto da Jurubeba, (.Solanum grandeflorum) e leguminosas nativas, man-tendo-se fisicamente cm estado razoâvel. Vale aqui registrar a avidez do bovinopela casca de Gmelina, que foi completamente crradicada das plantações dePinus, onde servia como faixa de proteção contra incêndios. Os animais co-miam a casca desde a base até onde podiam alcançar, mâtando a árvore, mesmoantes do quarto ano, quando ainda havia capim. Vale ressaltar que a minerali-zação era permanente, não havendo outra explicação para o fato, a não ser apreferência pclo sabor.

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O sistema de reprodução era inseminação artificial, durante o período dc sc-

187

(t) I U.A. - 400 kg/bruto.

Page 96: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

188

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tembro a dezembro, chegando a inseminar 1200 matrizes, com índice de nasci-mento de 7 57o. O manejo para esta prática era reunir pela parte da manhã atéàs 9:00 horas, em local perto do corredor que dava acesso ao curral, todas asmatrizes para detecção do cio. Essas matrizes eram inseminadas no mesmo dia,a partir das l8:00 horas. Pela parte da tarde, das l6:00 horas em diante, reu-niam-se novamente as matrizes, apartando as que estavam no cio, para sereminseminadas no dia seguinte, a partir das 6:00 horas da manhã. Este manejo foifeito sem problemas até o quarto ano, tornando-se difícil à medida que o Pinuscrescia, impossibilitando a arregimentação dos animais. Devido a essas dificul-dades, nos últimos anos a monta natural foi restabelecida, em substituição aosistema de inseminação artificial.

DOit

Outra dificuldadc encontrada após o quarto ano foi o nascimento de bczer-ros no meio das plantaçÕes. Às veies era difícil achar o animal, o qual contraíamiíase no umbigo, vindo a morrcr se não fosse logo socorrido. Além de animaispequenos, perdemos também animais adultos, quc sc embrcnhavam no meioda floresta. Muitos foram comidos por onça c outros abatidos por caçadores.

froo

O manejo sanitário cra feito rigorosamcnte, com vacinação contra aftosa acada cem dias, vacinação nas fêmeas de até nove meses contra brucelose e apli-cação de pneumoenterite nos bezerros após o nascimento. As verificações eramfeitas duas vezes por ano e a aplicação de vitaminas em animais jovens sempreque necessário. Quanto a infestação de carrapatos e outros ectoparasitas, nuncativemos problemas sérios; de qualquer forma, os animais eram pcriodicamentebanhados com carrapaticida.

ftatr]

O manejo florcstal ncstas áreas rcstringia-se'ao combate à saúva e roçagensperiódicas, estas comprovadament.e em número bastante inferior, comparadascom áreas onde não havia o plantio de gramíncas.

Durante as fases acima descritas do manejo florestal, a pecuária se defron-tava com mais dificuldades: o aramc das cercas era cortado pelos trabalhadorese porteiras eram deixadas abcrtas, misturando lotes de animais. A cmpresa fezpecuária no meio da floresta de Pinus pelo pcríodo dc l0 anos e os cruzamentosforam os mresmos fcitos em Saracura.

DOO

A pecuária A fase Ludwig

Comparando duas áreas da mesma idade, uma em que foi feita pecuária e aoutra somente com floresta, obtivemos os seguintes resultados, após o corteraso:A ârea com pecuária (mesmo não restando mais capim no meio da floresta porocasião do corte raso) quando foi queimada, as sementes que estavam em dor-mência germinaram com grande intensidade, sendo necessárias quatro roça-gens no primeiro ano de plantio.

Atualmente a Jari luta para erradicar o colonião, pois as áreas não continua-ram com pecuária, o que restabeleceria um novo ciclo onde o capim seria denovo pastejado pelos animais até o sétimo ano.

Os resultados da ârea foram os seguintes, após o corte raso da floresta:

300

l0 anos

126 mt (sem casca)

80Vo (920 árvores)

4 x 2,2m.Espaçamento

A área em que não foi feita pecuária, guardando as devidas proporções, foiplantada no mesmo ano, com o mesmo tipo de sementes, mesmo método deplantio e mesmo espaçamento, em solos com as mesmas características, apre-sentando os seguintes resultados após o corte raso:

Espaçamento

JAJ

| 573

l0 anos

ll8 m3 (sem casca)

74Vo (846 árvores)

4 x 2,2m.

Pela observação dos problemas surgidos no decorrer do sistema durante dezanos, podemos sugerir aspectos que o melhorariam, pois particularmente acha-mos que os resultados foram satisfatórios.

Um dos aspectos a considerar seria a centralização administrativa para o sis-tcma. Havia muitos problemas que conflitavam, como por exemplo: a cargo dequem deveria ficar a limpezadaárea; qual a época mais aconselhável, além do.dcscaso do trabalhador rural, danificando porteiras e cercas ou ainda deixando'porteiras abertas, misturando os animais.

Número de hectares

Idade da floresta

Volume de madeira por hectare

Sobrevivência até o corte

Número de hectares

Idade da floresta

Volume de madeira por hectare

Sobrevivência até o corte

Page 97: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

190A pecuária

,t""lf i:9t::t9l3p9i o quarto ano.começavam as dificuldades da pecuária,f:ïjilt:*::pil_p-?'_1 9' anímais ou diricuiàuo.r de arregi'"";üà: ffi".ïãJl":.ïÍ'"0::t"1'j,:"x1":::J:::ï,..'ã;ìi;;;;;;ii;".ï;;ü'lï;"ï:;ï;-v-y Eel,vvevor, w\rrrvrultrt\Jò tlu(i u slstgma slrecria e engorda. Do quarto ano em diante os animais deveriam recebe, urna.rrr r vv t/ t/rwr llltt a

f.ç::,:r:*.:ï,:r..1"^.::lo,_c?m a finalidade de fazê_los mais ãóceis pelo con_

:1:,::u:l:_.:T^:*":_o.i.i1?:_pelo arrarivo qui ,ração exercia . ;;;;o";;;""ï:..rvJtrrv l,(lt íl òu-

ï::1":,llenrrarmenre, uma vez que ncssã fase a pasragem já se enconrra bas_tante diminuída.

A fase Ludwig

MineraçãoA Santa Patrícia, empresa de pesquisa de mineração, pertencente a Ludyig,

tinha concessão do Governo Brãsileiro para pesquisa de minério desde 1965,

tendo feito pesquisas em Barão de Cocais, no estado de Minas Gerais. O geren-

te de minerãção de tudwig no Brasil era o alemão Gerard (amar, tendo como

chefe das peiquisas de caúpo o geólogo Ditman Kelter, tam\ém de nacionali-dade alemã.

oúo

O acesso aos locais de pcsquisa cra muito difícil, como conta Raimundo Ju-

raci de Lima, que trabalha na Sanm Patrícia dcsde 1965. Para levar mercadorias

c equipamenioi, eram abertas picadas na mata e o transporte feito em lombo de

burio õo no ombro dos trabalhadores. Na realidade os equipamentos utilizadosnão eram pesados; eram sondas de porte médio a vácuo marca "Husto" (de fa-

bricação ámericana) rotativas, onde o matcrial era recuperado por sucção.Estasiondas tinham capacidade de perfurar até trinta metros de profundidade.O material coletado erá mandado para análises pela empresa Machario no Riode Janeiro, ou para a T. Janer em Belo Horizonte. O custo destas pesquisas era

muito baixo, devido aos recursos simples utilizados.

ooo

A, jazida de caulim no morro do Felipe tcve- concluídas suas pesquisas em

1969-. As reservas foram avaliadas em 150 milhões de toneladas, com a espes-

sura da camada de minério variando entre 35 c 50 metros, localizada a uma pro-

fundidade de l8 a 55 metros, podendo portanto ser minerada a céu aberto.

oDú A bauxita

Nas áreas pertencentes à Jari, a mineração Santa Patrícia pesquisou bauxitapara metalurgia nas seguintes localidades:

- Serra do Paranaquara, perto da Serra da Velha Pobre, limite das terras da

Jari, com resultado anti-econômico.

- Serra Azul, com acesso pelo Rio Arraiolos, com resultados também anti-cconômicos.

A bauxitarefraíátria foi pesquisada por Kelter e sua equipc no ano dc 1975

em seis platôs, que foram dêsignados de I a 6. A bauxita foi encontrada ccono-micamente nos ptatôs 6, 5 e 4, iendo nos dcmais muito alto o teor de fcrro.

A Docegeo pesquisou Bauxita cm área limítrofe com a Santa PatrÍcia, mas

191

Por outro lado, quem determinava a ârea que deveria ser plantada comgapit era a gerência florestal, que não levava àm consioerafío o abastecimentode água.para os animais. os piquetes tinham área média de 100 ha, dificultandoo manejo, principalmente apói o quarto ano. Os pastos deveriam ter no máxi-mo 50 ha, com estradas mais largas e cerca ao centro, para melhor manejo dosanimais e também para que na épóca do corte raso da flores[a não se danificasseas cercas' Deveri4m existir mais porteiras nas quadras para àrõour.nto da ma-deira em caminhão, ou mesmo a cerca elétrica, que poderia ser removida comfacilidade. -----'

Page 98: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

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l

t93t92 Mineração  fase Ludwig

- Calcário na Serra do ltauajuri,calcário foi utilizado na Fábrica decos.

município de Monre Alegre, em 1972. EsteCelulose para fabricação de produtos quími-

não encontrou bauxita refratária. O acesso à área foi feito pelo Rio Caracurú edepois pelo igarapé palheta, pera margem direita do caracürú.

A Jq-i quase perdeu a concessão da área do Caracurú no DNpM (Departa-mento Nacional de Produção Mineral).

aoúFora as áreas da Jari, a Santa Patrícia fez pesquisas minerais nos seguintes lo-

cais:

- Cruz Alta, situada na margem esquerda do médio Trombetas, municípiode Oriximiná, em l97l.O minério cra bau*ita para metalurgia. Esta área foivendida para a Alcoa.

- Pesquisa de Caulim no Rio Capim em 1973, sem rcsultado econômico.

-- Pesquisa de Chumbo no Cupari, afluente pela margem direita do Rio Ta-pajós, município de Aveiro.

- Pesquisa de chumbo no Rio curuá, município de Alenquer.

Anos difíceisOs anos de 80 e 8l foram os mais difíceis da fase Ludwig, devido a aconteci-

mentos referentes à própria empresa, quando Ludwig já demonstrava desestí-mulo, além de sinistros acontecimentos na região da Jari. Em agosto de 1980,Ludwig enviou uma carta ao Ministro-Chefe da Casa Civil do Governo, Gol-bcry dõ Couto e Silva, cujo conteúdo relacionava-se às dificuldades da Jari comsua estrutura básica e também com a indefinição oficial acerca da posse defini-tiva das terras. Este problema, desde fevereiro de 1980, estava no âmbito doGrupo Executivo do Baixo Amazonas (GEBAM) e atê aqucla data sem solu-

ção. O assunto da carta foi explorado por todos os jornais do País. Diziam que

Ludwig, na carta, amcaçava parar o projeto. Esta notícia deixou os empregadosda Jari mais apreensivos, pois já se sentia internamente o clima de maus pressá-gios.

ftDo

O ano de 1981 começou muito mal para a comunidade da Empresa Jari. Nodia 6 de janeiro, logo após os festejos de ano novo, muitos empregados retorna-vam com suas famílias de Macapá no barco Novo Amapá, navcgando pelo RioAmazonas com excesso de passagciros. Nas imediações da Foz do Rio Cajari,com destino a Monte Dourado, o barco naufragou ao batcr em um banco de

areia, matando mais de quatrocentas pessoas. Neste acidcnte, o maior da histó-ria da Amazônia, muitas das vítimas eram cmpregados da Jari, havendo casos

dc família que perdeu todos os filhos. O acidente causou consternação na co-munidade dãlaii, que já vivia um clima de incertezacom rclação ao seu desti-no.

oJa

Quatro meses depois, no dia l5 de maio de 1981, acontcceu outro sinistro em

Monte Dourado. Quem o prcsenciou, não tcve dúvidas que a fase Ludwig es'tava chegando ao seu final:

Eram onze horas da noite quando o fogo começou no escritório central da

Jari em Monte Dourado. A notícia correu rápida e cm pouco tempo toda a po-pulação estava no local, presenciando o espetáculo dantesco. O povo em silên-ôio permaneceu no local até que as chamas consumir.am togg o prédio. _De.vezctn quando alguém, sem poder conter a emoção, dizia: "E o fim da Jari..."Aproximei-me-de Ezaí Holanda e disse: "Seu Ezaú, que coisa triste!" E ele rcs-póndeu-me: "É, meu filho, além da queda, coice". Ezaú era nordestino e profc-iiu o ditado que caracÍerizava o azar do sujcito que, ao cair do cavalo, ainda cracscoiceado pelo animal.

Page 99: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

t94

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Anos difíceis

Realmente a Jario seu papel de pólo

estava com azar e precisava mudar de rumo para continuarde desenvolvimento do Baixo Amazonas.

Esses acontecimentos culminaram com a decisão de Ludwig de não prosse-guir com suas atividades no Brasil. Para eviúr a estatização do projeto, o Go-verno Federal convoco-u um grupo de grandes empresários brasileiros, entreeles Augusto Trajano de Azevcdo Anrines (qug p-ossuía bem sucedida expe-riência anterior na Amazônia) para dar conriìüiorã;;;r;-;ndimento.Es.ta foi a origem da fasc nacional clo Projcto Jari, quc passamos a narrar emseguida. PARTEV

A nacionalização do projeto

Page 100: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

A fase nacional

A e:nceriência deAzev^edoAntunes

história dc Augusto Trajano dc Azevedo Antunes na Amazônia re-monta à ctócacla de quarcnta, scndo que na Jari especificamente é

bem mais rccente. Durante o ano de 1938, quando trabalhava comocngcnheiro civil na cidade dc São Paulo, ele dcslocou-se até Minas

Gcrais para uma pcsquisa em mincração, quc acabou por lcvá-lo a dedicar-sedcfinitivamento a esta atividadc.

JDJ

Para Antunes a profissão de mincrador pega no coração e na pele. Satirizan-do cssa paixão, narrou ccrl.a vcz a piada dc um cxplorador de minério quemorre e vai falar com São Pcdro, dizcndo que qucr cntrar no céu. São Pedrorcsponde que já tem cinco cngenhciros de minório por lá, e não há nuvem quercsista aos buracos que a toda hora cles vivcm abrindo. Decididamente, dessavcz cle não dcixaria cntrar mais um. O rccóm-chegado propÕe então conscguira rcmoção dos companheiros para o inferno, cm menos de um mês. São Pedroaccita na hora. Dali a quinze dias aprcscnl.a-sc o cngcnheiro, dizendo que oscompanhciros já tinham ido embora, c rcccbe muitas congrat,ulações. Masclepois dc vinte dias ele volt.a, dizendo quc vai cmbora, pois achava que "seaqueles patifes ainda não tinham voltado, era porquc tinha mesmo ouro porlá. "

r97

Antcsprcsa dcscndo na

arr O manganês do Am aPá

dc vir para o Amapá cm 1946, Antuncs era presidente daBelo Horizonte quc explorava minório de fcrro, manganês

Icomi, cffi-c calcário,

ópoca uma das maiorcs forncccdoras dc minório para Volta Redondu.

No ano de 1945 a "Hanna Exploration Co." fcz prospecçõcs nas jaz.idus derninório da região do rio Vila Nova, no sul do Amapá, mas scm rcsultutlo uni'mador. Na época o Governador do Amapá cra Janary Gcntil Nuncs, quo csttlvtltlcciclido a promouer o aprovcitamcnto dos minórios do Tcrritório, tcndo lun'

Page 101: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

198 A experiência de Azevedo Antunes A fase nacional

Para citar alguns exemplos da atuação da lcomi no Amapá, a Hidroelétricade Paredão no Rio Amaparí foi construída com os "royahies" pagos ao Territó-rio pela Indústria e Comércio de Minérios S/A (Icomi). A estrada de ferro queliga as instalações industriais da Icomi em Serra do Navio ao porto de Santana,num percurso de 194 km, gerou intensa colonização às suas margens. Ali aIcomi comprava desde uma dúzia de ovos até uma tonelada de farinha, tudoquc fosse produzido pelos colonos, a fim de incentivar a agricultura na região.A estrada servia também a população, que mesmo não sendo empregada daCompanhia desfrutava dos serviços das escolas e hospitais da Icomi, os quaiseram muito bem equipados. A mortalidade infantil eraa mais baixa do conti-nente americano, incluindo os Estados Unidos. A Icomi pôde ter um serviço desaúde eficiente porque contava com a cxpcriôncia de nomes como o Dr. PauloAntunes, sanitarista de renome int,ernacional que havia sido Secretário deSaúde do Estado de São Paulo, e o Dr. Hermelino Gusmão, dedicado servidorda empresa.

úftú

Voltando a falar clo manganês, na época da sua descoberta no Amapá, aRússia era o maior exportador mundial.

Um dos comcntários feitos por Antuncs cm uma de suas visitas ao Jari foi deque era preciso ter sortc neste mundo, conceito cstc também de Ludwig. Rai-mundo de Moraes em seu livro "O Eleilo das Graças" lambém se refere à sortede José Júlio em seus negócios. Em suas considerações Antunes registrou trêspcrsonalidades da história contcmporânca pclas quais ele não tinha simpatia,por motivos óbvios, mas quc teriam indiretamente facilitado o início de seu em-preendimento no Amapá: Stalin na Rússia, ao suspender a venda de manganêspara os Estados Unidos; Hitler, ao desencadcar a Segunda Guerra Mundial au-mentou a demanda de aço liga para armamentos e munições; e finalmente Nas-ser, do Egito, ao fechar o canal de Suez, dobrou o preço dos fretes marítimos,possibilitando melhor mcrcado ao manganês do Amapá, mais próximo dos Es-tados Unidos, o maior comprador mundial.

199

çado uma campanha de cstírnulo.à prospecção, prometcndo compensaçÕcs aquem lhe trouxessc amostras de minério e souuersã indicar sua procedência.Durante a campanha o caboclo de nome Mário Cruzse lcmbrou que anosatrás usara umas pedras prctas-e muito pesadas como lastro para sua embarca-

qão'.na qual fazia c-omércio pclos rios c-igarapés da rcgião. üa.io sc lcmbravade tê-las abandonado ao firn da viagem, nãs pioximidad"es de porto Grande. Foibuscá-las, j-ulgando tratar-se dc miãórios de'ferro c apresentou-se ao Govcrna-dor' As análises identificaram o minório: manganêr,^.or tóó, oe 55Vo aproxi-madamentc.

Para evitar quc cmprcsas dc mincração cnl.rassem dcsordenadamente nasT9a: a jazida foi dccrcl.acla rcsctua naõional, conformc publicado no DiárioOficial de 13 dc dczcmbro clc 1946.

Antcs do govcrno abrir concorrôncia para cxploraçã o da jazi6a, Janary con-vidou Antuncs para visitar a'á,rca, qu...o Jc-oirrcit o..rro1 Antunes foi até olocal da jazida em plena sclva, viu o minórió aflorado, cstudou lodos os relató-rios do geólogos e analisou cle prórpio as amostras colhidas. euando o governoabriu concorrência, a Icomi foi à única cmprcsa gcnuinamenÍ.e brasileira a apre-sentar-se como candidata,.disputando corn a "H-anna Exploration corpãü;-.:om-? Companhia Mcrictionãl dc Mincração, subsicl iilria da ..Unitcd

StarcsSteel", e saiu vcnccdora da concorrôncia.

OOfI A ICOMIVencida a concorrôncia, a Icomi prccisava de rccursos para a exploração dominério, resursos estes que não podiam r.. anaontrados no Brasil. Sendo assimassociou-se à "Bet,hlchem Stecl"-c com o aval do govcrno brasìleiro (sendo Ge-

'.úlio vargas o presidente d1 óp99a) conscguiiorn um crédit o de 67,5 milhões dedólares do Eximbank dc waihington. xío socicdacle a caemi rcria Slvo dasações e a "Bet,hlehem Slecl" 49Vo.

Conseguidos os rccursos necessários para tocar o empreendimen[o, mãos àobra' Entre 1954 e 1956 foi montado ródo o equipamcïro dc mineração emserra do Navio e toda a infra-estrutura básica oo proleto. No dia 5 de janeiro de1957 o presidente Juscelino Kubitschek acionou o botão para o embarque daprimeira carga de manganês para Baltimoi., nõr Estados Unidos.No decorrer dos anos a Icomi promoveu uma evolução progressiva do entãoTerritório Federal do Amapá (hoje transfoir"ooo .r àrroãoll loru se rcr umaidéia, quando a €mpresa chègou

_ao Amapá, suã capital wtí"upatinha 3 mil ha-bitantes. Passados 35 anos ã cidade d. ú;"õá tcm hoje 200 mil habiranres,outras indústrias, comércio forte e diversificad'o e com jüstiça podemos afirmarque este desenvolvimcnto foi fruto da iniciativa pioncira oï tlomi, quc gcroucondições dirctas c indiretas para csta rcaricradc.

Page 102: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

ilïl"il 200

A fase nacional

JD.I

Antes da formaçiïq1 c^omp1n-hia do Jari, cm scrcmbro dc lggl a firma deconsulroria "GRESAP Mccormict anã-n:f,rï ì,nr." (cÌvípt roli .on,rarada pararcalizar um lcvantamcnro das posiçõcs o,ilari Florcstal c Agropccuária c dacadam, prcparando com a oirirtenõiu,rc;:À;ilur Ancrcrr.n d co.,,projcçõcsde fluxo dc caixa das duas cmprcsas.

,rrilr:iXïi,,rorïï,0"r órgãos actminisrrari'os da COMPANHTA DO JARr ficou

Conselho cle Adnrinistracão:Augusto Trajano dc Azcïcdo Anruncs (presicrcntc)Amador AguiarArnaldo V/alter BlankDanicl G Sydensrricker

Edmundo Pena Barbosa da SilvaJoão Machado For[esLeonídio Ribeiro FilhoMurillo Valle MendesPaulo Dicrderischem Villares

Conselho Consultivo:Augusto Trajano dc Azcvedo Ant.uncs (Prcsidcntc)Amador AguiarAngelo Calmon de SáAntônio Carlos Almcida BragaArmando CondcCarlos M. Gomes clc AlmcidaGastão E. Bueno VidigalJ. Murillo Valle MendesJoão Machado FortesJoão Pedro Gouvcia ViciraJosé Carlos Morais dc AbrcuJosó E. Andradc ViciraLeonídio Ribeiro FilhoLuiz Eduardo CampelloMarcos Magalhães PintoOlacyr F. MoracsOlavo E. Montciro dc CarvalhoPaulo D. VillarcsPaulo Egydio MartinsNoberto dc AndradeRoberto Konder BornhauscnVictor C. Gradim Bouhosa

Diretoria:Edmundo Pcna Barbosa da Silva (Prcsiclcntc)João Baptista de Carvalho AthayclcSamuel Fincberg

Comitê Financeiro:João Baptista de Carvalho AthaydcRoosevelt Freirc Sevcrino DuartcJosó Luiz S. Miranda

CAULIM DA AMAZÔNIAEdmundo Pcna Barbosa da Silva (Prcsidente)Samucl FincbergSórgio Cabral dc Sá

A Compantria do JariY:t::#i?:t g:.1" j:i,:1,, .f

n tules é con voc ad,, c o I aborar n a nac ionali _zação do Projeto Jari. e consuiru " "i""r^;;,;""r\'

. L(rr'luurar na nactonalt-senso: a snlrrnãn nraic ?ô^^.*^_rt"1 l,ulguns grupos crììPrcsariais revclou o con_nï: : : ï j :l : 0"1",T:':^':'-: T'lj 1:: I q ;'.' ; : ; ;; il; ;'ò; fi fiì [ ;ï ï ï,ï J.",ï;[ïïrfff T.:::';t::::'i:.T::{tq4;;;;'';#;ïi'1ïlilf,ïiï:ïi;:i"^' I : r' ç' " ti. "

*ì ; ïï ii,ïil ï lïï ; ï'ïïf,'.ï: i'ii :i H 3 : "l'"lx'^l:: :: i :ç1l

; ;^ffi à " *Ë i e;, ï'.iì á I,ïJ ï :'; 3 Lï l. :ï: i :

"1: ï"' i::'*ï i: :l:^' Â,ti:l ï :na mcsma rcgião (pinus da

fff :? ii* : :T" {,Ì': X íf ,r, o p"i iô"o'p o I ; ?ïï il ; J i ï; iïr. .ï;:' Jí' ï:ì J ;Íi.l'ÍÍ;'""Íl::*'":{:Ïl',::::&;;nïiilïïSii::'i'-"'""ffi ïïïï:ilïï,ï,ï : T, :,ï " u p iã ú i. ,fr; ;;;ï ìíi ;ï Jï ;ïJ ï i ïï,:il i*, #,Â1,1# I í i;havia dado certo. fclizmente

outro fator considerado foi a proximiclaclc gcogriÍfica da lcomi em relação àJari, aliada às reraçõcs de amizãí;;;;;;i;,ï. Ànruncs íluà*ie, que conrri-buiram para faciliiar o proccsso dõ rransfcróncia do .;"r;ì; do projero Jaripara capitais privados biasilciros, alim dc assegurar o acesso a tocras às infor-maçõcs sobre o pranejamcnÍo originar ,r;;õ;.cndimcnÍo.Antunes havia reccbido dc Ludwig uma ofcrta, quc ainda estava considcran-do' para adquirir mediante pagamento a prazo as cotas do capital ,siJcÍlll,da"caulim da Amazônia Ltda". È"rro

";;;üí;]-roporcionou o insrrumentô,fíafira esmbilidade da administração oo projci; l;t'i. Antuncs dispunha-se a,adq,uiriressas co[as para,pagamcnLo a prazo c cin seguida lransfcrí-las pclo mcsmo valorpara a cornpanhia do Jari, em,integiat iiit*.r.c.apiral por cte subscrir.o, dcmodo a formar um broco dc açõcs qï, 1q. iãrrïúiúìír;;'üis;ar a maioria doconsclho dc administração da-componrriu ããJu. c conseqücnlcmcnte a esco-lha dos cxccut.ivos do projcto.

Page 103: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

202A Companhia do Jari A fase nacional 203

COMPANHIA FLORESTAL MONTE DOURADO

Conselho de Administração:Edmundo Pena Barbosa da SilvaDinar Goyheneix GiganteJoão Baptista de CarvalhoDiretoria:

Neste local faço um rctrospccto de minhaventude, mocidade, maturidade e vclhice...

Boas e belas lembranças. Isto é o passado

vida - Lembrança da infância, ju-

vislo do prcscntc!(Presidente)

AthaydcPorém aqui estií o prcscnte projetando-sc para o fuíuro, o futuro da Amazô-

nia, o futuro do Brasil, dc nossa gcní.c.

Aqui a coÍagem; alma, o vigor dc jovcns que í.êm fé!

Antes de tudo Íé em si mcsmo.

Qucm viver verií! Eu jtí vejo!

Antuncs

08/04/86

Edmundo Pcna Barbosa da Silva (prcsidcntc)Samuel FinebergHcrmelino Herbstcr GusmãoJanusz V/scieklicaManuel Ribciro cla Cruz FilhoMiguel Sampol PouRooscvclt Freirc Scvcrino DuarlcConselho Fiscal:Alcyr Carvalho da Silva

(suplcntc)

Paulo Pacheco pratas (suplcnte)Carlos Augusro da Silvciia LoboSônia Maria de Oliveira parcdcsHugo IbeasFernando Luiz Villarcs Cabral Filtlo (suplcnrc)

Constituída a Companhia do Jari, Ant.uncs veio a Montc Dourado, ocasiãoem quc [eve uma reunião com todos os oxccut.ivos da Jari. Nessa reunião eleexpôs as dificuldades. que a empresa devcria encontrar, mas cunhou uma fraseem minha memória: "Gostaria de lcr mais alguns anos de saúde e bom humorpara colocar a Jari no caminho ccr[o.',

JJJ

Nascido no dia 29 de sctcmbro de 1906, Antuncs é casado com a senhora SÍl-via, com qucm leve um casal de filhos.

uma caractcrística marcantc de homcns como Antuncs, Ludwig e José Júlioé a simplicidade e o dcsapego à vaidade pessoal, aliada ao entusiasmo empreen-dedor' São homcns sensívcis ao valor dai coisas aparentemcntc simples, mas degrande significado na vida cotidiana.

Durantc visita quc fizcmos a uma fazenrJa de búfalos Rio Jari abaixo, Ant,u-nes comentou, ao ver as galinhas da fazcnda, quc uma das coisas que mais lhedava-satisfação quando menino era fazcr ninÍro para as galinhas botarem ovos.Ao término dessa visita registrou no livro dc ocõrrônciaã da fazenda Marapí osseguintes dizcrcs:

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A transiçãoA transição entre a fase Ludwig c a fase nacional foi muito difícil, tanto para

a nova Companhia.do_Jari,!o que tange à administração e problemur.rog;;;icomo para os funcionários da fase Ludwig, principalmente

-os mais antigoï e ós

que tinham cargos mais clevados e continuaiam na empresa.

- Para o paÍs c para os novos.empregados que estavam chegando, Ludwighavia saído derrol.ado da Jari pelos motiuos ruìr diversos. paraã irp.enru, poïteÍ tentado um golpc dc mcstre e que não deu cert.o. Para alguns novos funcio-nários, devido ao despcrdício, desóncsticlade c até, incompetãn.iu dos funcioná-rios antigos. _,1

Essas espcculaçõcs lcvaram a cmprcsa a perder muit.os funcionário compc-tentcs e que tinham amor à Jari. Pcrclcu tarnbém (c estcs não lhe fariam falia)muit.os outros ruins, quc para sc manl.cr nos scus cmpregos depreciauu* ,auácompanheiros; mas dcpois tiveram o mcsnìo dcstino dos-bons: foram tambómdcmitidos por não conseguir cscondcr por rnuit.o tcmpo seus dcfeitos.

JÚN

A falta de madcira para fabricar cclulosc foi um grandc pesadelo para a novaadministração da Jar.i, como já tinha ocorrido na fasõ Ludiig. Éoi prãciro inúo-duzir algumas cspécics nativas na composição da cclulorr, Jqu, felizmcnte nãoalterou sua qualidade, apcsar da divcrsìfi.uçao dc cspécics na'mistura.

O rccurso utilizado pcla Jari com cspócics nativas possibilitou quc sua flores-ta artificial não fossc corl.ada prcmaturamcn[e, scm aìnda ter atingido o uolumeeconômico, o quc.prolongaria ainda mais a dcpcndôncia dc mató;ia prima puroa fábrica. Além disso a Amccl, emprcsa do Gìupo Cacmi, possuía um granoeplantio de Pinus caribaca nas savanâs do Arnapá c muito contribuiu com"maté-ria prima para a fábrica dc cclulosc da Jari.

o capitarí (Tabebuia.insignis) pcrtcnccntc à família das bignoniáccas, foiscm dúvida a espécie nativa que mais contribuiu nos difíceis diaí da CompanhiaFlorestal Montc Dourado, cm scu problcma de falra de madeira para a fábrica-ção de celulose. o Capitari é umacspócic que vegeta em lerrenos pantanososde difícil acesso, sendo necessário faz-er canais conimáquinas para põdcr explo-rá-lo.

A ocorrôncia dcsta cspécie asscmelhava-sc a um plantio artificial homogô-neo, lendo a Jari.exlraído aproximadamcn[c 280 miÍ toneladas de madcira je-quivalente naquelc momento a 6 222 hectarcs de suas plantações de Eucatyptusfinos). O capitari é uma cspécic quc rcbrota após o ,ortr, semelhante à Gmeli-lu. Sua produção média por hectare cra de 56 toneladas, embora houvcssemáreas com ató 120 toneladas por hcctarc, cnquanto o Eucalyptus na ópoca pro-duzia 45 tonclaclas por hcctarc cm móclia

A fase nacional 205

occOutro grande problema da transição foi o baixo preço da cclulosc no mer-

cado inteinacional, que caiu a patamares nunca antes praticados, chcgando a

US$ 230,00 a tonelada, depois de ter alcançado US$ 500,00 por tonclada.

DOO

Antunes recebeu a difícil incumbôncia de administrar o Projcto Jari comtodos esses problcrpas, aliados ao ceticismo da nação com relação a emprccndi-mcntos estrangeiros quc depois dc nacionalizados estagnavam (como foi o caso

de Fordlândia e Belterra). Mas ele tcvc a lucidez de escolher, entrc os inúmcrosexecutivos de suas empresas, a pcssoa ccrta para a difícil missão. Est,c cxccutivochamava-se Janusz Wscieklica, um polonôs de nascimcnto, naturalizado brasi-leiro.

Janusz foi sem dúvicla o grande condul.or da dificílima transição da Jari. Comserenidade, bom senso e dctcrminação conseguiu lcvar o barco na tcmpcstadc.

Quando deixou a Companhia em 1986 aincla não havíamos chegado à bonança,mas o maior perigo já havia passado. Faço cssa comparação porque Janusz gos-

tava muito dè navegar, tcndo conhecido todas as áreas da Jari (inclusivc os mu-nicípios vizinhos) por água, lcrra e pclo ar, cm constantes sobrevôos.

Seria omissão grave não cimr um granclc aliado dc Janusz que foi scmpre in-cansável, principálmente nos contatos da cmprcsa com os órgãos do Governo.Este colaborador chamava-se Edmundo Pcna Barbosa da Silva, o cmbaixadorBarbosa, como cra conhecido.

E assim, cm síntcsc, aconteccu a transição na Jari, que para muitos seriamais um exemplo na Amazônia de cmprecndimento dc capital estrangeiro que

não daria certo, por incapacidade emprcsarial ou por falta de seriedade.

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206

que diz o seguinte:

A Assembléia Legislativa do Esíado do Parií, estaíui e eu sanciono a scguin-te Lei:Art I a - Fica criado o Distrito dc Monte Dourado, no município de Almeirim,

Estado do Pará, com as scguinícs dclimitaçõcs. Com'tçu nu foz do RioCaracurú, da_í seguindo rio acima até a cmbocadrru ão igarapé SerraAzul, s.eu aflucnte pe.la^margem csqucrda; pÍossegue f,elo'igarapéSerra Azul até a confluência com o igarapé'Sem Nõme, seu aTlrentepela margem dircita; daí pclo igarapé Scm Nomc até suas nasccntcs,no divisor dc águas dos rios Parú c lari (Coordenadas aproximadas':Latitude 0ü53'S e Longitudc 0j3.06'W).

Art 2e - Esta Lei entrarií em vigor na daía dc sua publicação.Art 3e - Ficam revogadas as disposiçõcs em contriírio.

Palácio do Govcrno do Esíado do panÍ,02 de maio de 19g3.

Iadcr Fon tcncl Ic Barbal ho

Govcrnador do Estado

Postcriormcntc à criação do Distrito de Monte Dourado, a Câmara Munici-pal de Almeirim, pela Lei Municipal ne 05/83, dcclara como ZonaUrbana a lo-calidade dc Montc Dourado para uso habitacional c de apoio, fixa seus limites edá outras proviclências. Esta Lei ó assinacla pclo prcfciro Joaquim Machado deSouza em 06 dc maio e publicacla no Diário Oficiai clc l6 dc dczcmbro dc 19g3.

BasílioBanco HallcsUnibancoSUCA MTclcparáTAB ACapitania dos PortosDelegacia de PolíciaRcccita EstadualPcrnambucanasRcccita FedcralPolícia FcderalIBDFSESPSub-PrefeituraBamerindusBradescoBanco do Brasil

1969r973r975t977t9771979r97919801980l98l19841984r98419841984r98519851989

DDfI

- Dando seqüôncia à abcrtura na árca da Jari, surgiram novos órgãos e esl.abe-lccimcntos, embora jâ cxistissem alguns dcsdc a Iose Ludwig. Cãmo excmplopodemos evidcnciar o fato de scr possívcl hoje a qualqucr p.írou que dil/vLrvrrrur çvruuuurat u ralo ue scr posslvcl noJe a qualqucr pessoa que disponhade recursos chcgar ou sair clc Montc Dourado nuqrì emcrgôncia, scm se utilizarutilizardos aviõcs da Jari ou cla linha regular da TABA. É que r*lrt.r mui[os táxis aé-rcos no acroport.o para atcnclcr aos numcrosos garimpciros da região, que têmbase fixa no "bciradão". Antcriormcntc a Jari íao eiptoraua ouõ (como tam-bém não o raz agora) mas não consentia quc fosse usado scu acroporto parabase dc táxi aórco. Na partc comcrcial, suigiram vários cst.abclccimcntos, cn-

A empresa mais abertaCom a nacionalização da Jari, o Governo

uma ampla mudança na vida comunitária daDistrito de Monte Dourado, criado pcla Leiblicada do Diário Oficial de maio de 1983 e

ficou com a obrigaçãoregião, iniciando com

nq 5075 de 02 de maio

de promovera criação dode 1983, pu-

A fase nacional 207

quanto prospcraram outros já existenl.es, como foi o caso dc Manocl Basílio,pioneiro do comércio em Montc Dourado. Basílio chcgou a Montc Douradoem 1968 para trabalhar na Jari. Em 1969 comprou uma bicicleta a crédito pclopreço de Cr$ 300,00 (Trczcntos cruzeiros), que t,ratou de rifar, apurandoCr$ 480,00 (Quatrocentos e oitenta cruzeiros). Com esse dinheiro pagou a bici-cleta e investiu o saldo na compra de sandálias "Marajó", iniciando assim suavitoriosa vida empresarial naârca da Jari, que muito tem servido à comunidadede Monte Dourado com scus cmprccndimcntos.

Os estabelecimentos bancários surgiram na fase Ludwig; o Banco Hallcsoperou em Monte Dourado dc 1973 até 1975, quando o Unibanco o substituiu.Na fase atual surgiram o Bamcrindus, Bradesco e mais recentemente o Bancodo Brasil. A título dc informação, o primciro gercntc de banco de Monte Dou-rado, inicialmcntc no Hallcs e posteriormcntc no Unibanco foi Deodato Perci-ra da Silva, hoje funcionário da Jari. Os órgãos oficiais na sua maioria foramcriados já na fasc nacional, com algumas cxccçõcs. A seguir darcmos uma rcla-ção dos estabcleciment.os hojc existcntcs cm Montc Dourado, com seus rcspcc-tivos anos dc fundação:

ESTABELECIMENTO ANO DE FUNDAçAO

Page 106: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

208

AJarieaecologiaExistem várias definições para o termo ecologia, embora todas se refiram ba-

sicamente ao equilíbrio do meio ambiente em que vivemos. Cada país, estado,município ou a mais simples pessoa humana tem condições de viver em harmo-nia com o meio ambiente, dele usufruindo e progredindo sem com isso alterarscu equilíbrio, desde que tenha conhecimcnto dos limites a que um determi-nado ambiente esteja sujeito. Particularmcnte achamos que o brasileiro de ummodo geral ainda não Lem educação suficiente para difcrenciar o que é ecologiac o que não é.

O caboclo amazônida, pcrdido no meio desta imensa floresta, vive em har-monia com o meio, sem no cntanto entcndcr nada de ecologia. Prova disso éesta imensa região quase intocada, agora modificada por imigiantcs do sul e su-deste, providos de tecnologia modcrna , capaz de destruir em pouco tempo oequilíbrio da área onde se estabclccem. A nação ainda dispoe de bastàntetempo para inici?r um serviço de conscicnl.ização a partir dos colégios, sem a ex-ploração {emagógica que hoje existc em torno da Amazônia. E pieciso usufruirdos benefícios que a Amazônia pode proporcionar, manejanão sua florestaadequadamente, como foi feito na fase Ludwig e cont.inua sendo de maneiraainda mais eïicaz na fase nacional.

É claro que no início do projcto perdcu-se madeira, pois a usina gcradora deenergia ainda não estava funcionando para fazer o aproveitamentoìa que nãoera utilizada nas construçõcs do projeto. Poróm, cncarando por outro ângulo, afloresta nativa heterogênea foi substituída por outra floresta onde todaJas ár-vores tcriam aproveitamento econômico, proporcionando o funcionamentopermanen[e de uma indústria que cmprcgaria inúmcras pessoas, gerando tam-bém outros recursos sociais para a rcgião.

úotJ

Para implantar seu projeto florestal, a Jari utilizou apenas 6,45Vo de suaârea, permanecendo o rest.ante como rcscrva florestal, onde caçar é proibido.Por ocasião da remoção da floresta nat.iva, a Jari deixou faixas dô maú intcrca-lada entre os plantios de cada ano, para que os animais se abrigassem até que aflores.ta homogênea possibilitasse a volta dos mesmos. No caio do plantio daGmelina, por exemplo, houve um aumento de animais silvestres como a cotia,Pac.a e principalmentc o veado, devido a abundância de frutos desta espécie. AJari nunca efetuou remoção de floresta próxima a rios e igarapés, evitandoassim o assoreamento dos mesmos. Nas est.radas são feitos sèrviços de conten-ção a fim de evitar erosão, utilizanclo o capim Kikuio (Brachiariâ humidicola).Também para evitar erosão devido à estrut.ura do solo, em sua maioria arenosa,não são feitas remoções dc mata nat.iva em árcas dc topografia acidentada.

A fase nacional

oúúNa parte industrial referente à fábrica de celulose, a Jari possui um sistema

de tratamento de efluentes em uma área de l6 hectares. O lançamento do líqui-do no rio Jari só é efetuado quando não existe mais toxidez. Podemos notar queas margens do rio Jari, próximas a fábrica de celulose, conservam a mesma ve-getação que tinham há dez anos atrás, quando a fábrica iniciou sua operação.

Vista óerea da Cachoeira de Santo Antônio, no Rio Jari. No local será construída umaHidroelétrica para gerar 100 MW, sem lago de inundação cachoeira acima, preservando o meioambienle.

A CADAM (Caulim da Amazônia), tambóm situada na margem do rio Jari,possui inúmeros lagos de decantação para evitar que os resíduos de caulimsejam lançados no rio Jari. A Bauxita, que está iniciando a fase de produção,construiu uma barragcm para a lavagcm, evitando assim que a água suja vazepara os rios e igarapés da região.

alDo

Na parte de pccuária a Jari optou pela bubalinocultura, aprovcit.ando scuscampos nativos em área de v'ârzea. Evitou assim desmatamcntos cm tcrra fir-

209

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210 AJarieaecologia

mc, que seriam necessários se continuasse com a bovinocultura. Além disso obúfalo presta um serviço à ecologia da região por intermédio de seus excremen-tos, que adubam o fitoplancto e em conseqüência produzem mais alimento aosprimeiros estágios da vida aquática, que são os alevinos, no caso dos peixes.

OJJ

- Ioj: a.Amazônia está em evidência. Antes porém, somente alguns pioneirosda iniciativa privada como por exemplo Henry Ford, Ludwig e Antunei arrisca-ram seus capitais promovendo seu desenvolvimento. O Governo na verdadepouco se preocupou com o seu descnvolvimento e com o seu povo. Para eviden-ciar a descrença do Amazônida, transcrevo o sonet.o "Paisãgem Amazônica"!eit9 em 1960 pelo meu saudoso pai (Acylino d'Almeida Lins), que sempre de-fendeu o desenvolvimento do baixo Amazonas de uma maneirà integàda aoprogresso e equilíbrio dos recursos nat.urais da Amazônia.

PAISAGEM AMAZONICA

Vendo a terra florir, desabrochar em flores,Vendo o fruto maduro, ao alcance da mão!Que não há de exclamar, num assomo de amores,Tcrra excelsa e feliz, "Terra da Promissão"!...

Vendo a fauna e a flora os múltiplos favores,Vendo o humo potente, esparso, a flor do chão!Quem mais esquecerá os malizes, as coresDesta opulenta, rica e bela rcgião!...

Ver seu filho, porém, que tristeza sem termo!Pigmeu infeliz, analfabcto, cnfcrmo,Abandonado e só aos azaÍes da sorte...

O que fazem por ti teus irmãos da cidade?Ostentam, sem pudor, riquezas e vaidade,Quando, obscuro herói, caminhas para a morte!...

IIAo palco fabuloso, cntrctanío, faltavaElemento capaz, dcsassombrado e forte,Que procurando a vida olhasse, frio, a morteDe espreita, tanta vcz, pcla florcsta brava...

A fase nacional 2tl

Surge então da aridez do flavo Meio NorteO sertanejo audaz que a seca malsinava,E do bugre que, outrora, isolado, arrostavaA natureza hostil, participa da sorte.,.

Sofrem assim os dois, desadoradamente,As agruras da seca, os tormentos da enchente,Sem remédio encontrar âs suas grandes mágoas.,,

Fatalidade atroz e crucial contingênciaDe perecer do sol sob a ígnea inclemênciaOu de ser, afinal, tragado pelas iíguas...

IIIComo sofremos nós, todos que aqui vivemos,Ouvindo este refrão que se tornou imundo:"Amazônia, hás de ser o celciro do mundo",Sem que nos dê alguém algo mais do que tcmos!...

Ora um pesquisador emérito, profundo,Despendendo milhões, afirma: "venceremospântanos, igapós, lagos e enfim teremos"...E o bugre já descrente: "um buraco sem fttndo"...

Ora um planejador de produção em massaDerrama, em catadupa, a nescia populaçaAs cifras que infileira indifercnte, a esmo...

Para vermos ao fim, que o "sábio", o "economista",Operam, realmente, uma grande conquista,"Cavando" a independência (e como?) de si mesmos!...

Page 108: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

2t2

A área florestalDuranl,e a fase Ludwig a Jari usou um sistema de tecnologia florestal ameri-

cano, isto devido a seus principais chefes serem engenheiros florestais america-nos. Perguntei recentemente a J.Zweed o motivo da Jari na fase Ludwig ter de-morado a utilizar tecnologias mais avançadas, que já eram usadas por empresasflorestaiS brasileiras (como por exemplo a Aracruz), pricipalmente na área deprodução de mudas e exploração florestal. Ele me respondeu que não haviatido tempo para mudanças porque as coisas aconteceram muito rapidamente.Também não se podia arriscar um outro método ainda não testado (como porexemplo a produção de mudas em tubetes ao invés de sacos plásticos) quandoeste último processo, apesar de não ser o mais avançado, estava dando certo.

Realmente tudo aconteceu muito rápido na fase Ludwig. Havia várias ativi-dades, não só florestais, acontecendo ao mesmo tempo, devido à diversificaçãode projetos.

"Assentada a poeira", como se diz na gíria, a Jari de Ludwig estava prontapara executar técnicas mais modernas, principalmente na produção de mudasflorestais e extração de madeira.

Na realidade o programa florestal da fase Ludwig partíu sem parâmetrosexistentes até então na Amazônia, com espécies florestais exóticas, as quais nãose sabia como iriam se comportar no decorrer dos anos.

D00

Na fase nacional já houve uma boa evolução na parte florestal. Passou-se dosistema americano para um sistema mais escandinavo, principalmente nas áreasde produção de mudas e exploração florestal. Além das áreas mencionadas, aJari de hoje está implantando aos poucos o sistema de propagação vegetativa eestuda a possibilidade de um outro método ainda mais avançado, a "micropro-pagação in vitro". A partir de uma árvore de. EucalypÍus com idade superior aquatro anos, um produtor de mudas consegue obter no máximo quatrocentasmudas por ano, usando os métodos tradicionais de reprodução vegetativa. Emlaboratório, aplicando os revolucionários recursos da "micropropagação invitro" é possível produzir cerca de 1,5 bilhões de mudas, sendo todas plantasidênticas, vigorosas e isentas de doenças, multiplicadas a partir de um fragmen-to do tecido da árvore original. A seguir, apenas para demonstÍaÍ a evolução,apresentamos dados e comentários dos sistemas das duas fases da produção demudas e extração de madeira.

Os tubetes são preenchidos com turfa na proporção de 507o e com casca deaÍÍoz carbonizada na proporção de 507o, havendo também outros substratossendo testados. A turfa pode ser caract"erizada como um carvão geologicamenterecente formado nos últimos 10 mil anos, sendo uma mistura heterogênea de

ATIVIDADES SACOS PLÁSTICOS TUBETES

Enchimento por homem/dia 2 200 und 5 000 und

Semeio por homem/dia, Pinus,Eucalyptus, Gmelina

10 000, 20 000,l0 000 (und)

l0 000,20 000,l0 000 (und)

Substrato por m3 (enchimento) 2 400 und 17 200 und

Transporte para o campo(carga de I caminhão)

1l 200 und 60 000 und

Peso da carga de I caminhão 8 000 kg 3 500 kg

Tempo de produção das mudas, Pinus,Eucalyptus, Gmelina (dias médios) 165, 105, 105 (dias) 165, 105, 105 (dias)

Quantidade de mudas por caixa 35 und 250 und

Peso por caixa 25 kg (35 mudas) 14 kg (250 mudas)

Remoções de mudas para o campo 2 a3 vezes nao e necessaÍro

Transporte de mudas para o campo caminhão comgaiola

caminhão comcarroceria

'Viagens por dia (caminhão) para omesmo número de mudas 6 viagens I viagem

Plantio no câmpo Necessitavamudeiros (*) Não necessita

Controle de crescimento da mudano Viveiro Não controlável Controlável

Qualidade da muda (sistema radicular,sanidade etc) Inferior Superior

(*) - Homem que leva mudas para o plantador.

A fase nacional

PRODUçAO DE MUDAS FLORESTATS

materiais orgânicos parcialmente decompostos (material lenhoso, arbustos, lí-qüens, musgos) e materiais inorgânicos que se acumularam em ambientes satu-rados de água. Nas áreas da Jari, como em toda a Amazônia, existem inúmerasÍ,urfeiras, as quais são conhecidas regionalmente como "boiados". Antes de suautilização como substrato de tubetes para produção de mudas florcstais,a Jari

213

Page 109: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

214

tcntou utilizarPorém não foi

a turfa como combustível para a caldeira da fábrica de celulose.encontrada uma turfeira com perfil econômico para esta finalida-

de, embora a turfa, não só na Jari mas em toda a Amazônia, se constitua emuma riqueza para a fabricação de adubos organominerais para adubação dossolos de terra firme.

A fase nacionalà ârea florestal

A exploracão demadeïra cútivada

A exploração da madeira cultivada foi iniciada em 1978, passanQ6 -^_ _.,._:^_erapas áté atingir o estágio atual. Inicialmenre a idéia era r{alizur toïlo^t]-llitrução mecaniúmente, -utilizando "Skidder", cabos aéreos e traniÏ1]^t]llo:mádeira inteira (sistema utilizado em grande escala nos Estaoos Üï9r,'^To"^i"skidders" não eram favorecidos pela"qualidade do solo amazôniiltl?,ltmentos pesados, compactavam em ãemaiia o solo, passando a ser utììÌ-^"jï11-mente nà exploração de madeira nativa. Os cabos áéreos, além O. ülT,i:t^::-to, não produziam o esperado, principalmente pelo baixo volume ailïïi':;ï

Com a necessidade de produção de macleira para abastecimento do r:r--:^^ ^os sistemas implantados nao apiesentando resuitados satisfatórios,ï11::t:1:corrida desordenada à ptoruiu de empreiteiras que realizassem ;t?ll:}|"Essas empreiteiras em sua maioria não possuíam estrutura para t.uì,11o1'.1?'balho coú corpetência técnica. Seus empregados eram introduzid;:tiT:^'Ji-lho sem o conhècimento mínimo necessário do equipamento de t.ih"^Ï:l'::?'tosserra) e o número de acidentes era altíssimo, alêm'da baixa proOüi,l.l,l9,(To^-Jari da fase Ludwig chegou a manter 28 pequenas empreiteirai cori'llt-T-9,t- ldamente dois mil [or.ir e produtivida'de'variando èntre duas "ì.Ë|t"#ill:das/homem/dia.

Numa primeira etapa, a SASI, empresa coligada criada ï:::ltï\ente para::,'"'"ï

o:,,11',1T:':ïu:ã:11ïj?ilr: l"::::::T::: jïr::'::'ll^dsã'ãã "oï;:dução, atingindo aÍê 60Vo, reduzindo com isso o número das emprei;:-:: P_'-Y_

oito e 1200 homens, com produtividade aproximadamente O.'.inletras para

das/homem/dia.com produtividade aproximadamente de cinco tonela-

Devido à falta de um plano anual de exploração, racionalizando ì r-,___, rde equipamento e mão-dè-obra, existiam períodbs críticos onde .;:::iiigide prodìção aumentava, principalmente devido às "corridas" 1p.rioìc^e1t]111tduçao de celulose) de etpe.i.r e produções diferentes, onde á ";;i,:j:,P:ïbusca de mão-de-obra era alucinante e em períodos subseqüentes erqü"i;;"i;;:veis as reduções bruscas.

Com a finalidade de introduzir um sistema para melhorar apro{sr,-.:.,^r^ ^baixar custos de produção, que comparados a outras empresas d'o tu":n-t:11t:estavam ern patarT:l"l:lig1.r, fói contratada uma fiima de consüiÏ"i,ïïïil:iri::::11$':'.?'^*1:ï',:::i^Tt:?'^11illl?i:^"1T:"::131:::d;ï;t;;ï:*:::'::9i:?,:^y1;"1'it::::u::,:::iT,::-*'::i'^":.pi:i.ri',uiïçïï"0"Jpontos que prejudicavain ou eram .:l'1"Ëïlull.r g1* g:ïI:i:g d.iljf,;,i;:dade e redução de custos, iniciou-se o trabalho de modificação noilïd;;operação:

Page 110: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

2t6 A exploração de madeira cultivada

- Inicialmente foram criados os Departamentos de Treinamento e progra-mação das operações de exploração de madeira. Passou a ser reali zadotreinamento para todas as funções (supervisores, operadores, motoristas,serradores).

Mudança no sistema de pagamento, de metro stereo para pagamento porárvore, com a vantagem de não ser necessário realizar pilha pãdrão, o queexigia tempo e esforço do ajudante para recolher toras distantes para com-pletar a pilha.

Planejamento dc trabalho antes do início das operações.

I - Contagem das árvorcs.

2 - Sentido de corte.

3 - Marcação e numeração dod trechos que iriam ser explorados.

4 - Determinação e locação de ramais em locais adequados para tráfegodos "Big-Stick".

5 - Identificação de acidentes gcográficos que interferissem na operaçãoe definição de opçõcs para a cxploração destes locais.

6 - Definição do valor a ser pago com base no volume médio da quadra.

7 - Definição do tamanho do trecho.

8 - Definição dos locais de estocagem da madeira retirada.

9 - Redução na distância de transportc dc madeira para os caminhões"Big-Stick".

l0 - Plano anual de produção homogêneo durante o ano todo, com usoconstante do mesmo número de equipamentos e mão-de-obra.

I I - Inllodução de pequenas máquinas gruas para descarregar cm locaisdifíceis, procurando otimizar a produção do ..Big-Stick',.

12 -Trabalhar apenas com homens da SASI, cxcluindo empreiteiras re-manescentes.

l3 - Unificação dos departamentos existentes: Corte, Transporte, pátiosetc fundidos em um único Departamento de Exploraçãó de MadeiraCultivada, com redução de pessoal.

14 - Adoção de conjuntos tipo "Julietas" (caminhão com dois reboques)com maior capacidade de transporte de madeira, aproximadamente60 toneladas por viagem, contra 45 toneladas do conjunto àníerior.

A fase nacional 217

RESULTADO FINAL

iJo

Para finalizar estcs brcvcs comcntários sobre a parte florestal, mencionamos

mmbém o levantamcnto do solo em que está plantada a floresta artificial da

Jari, passo este também de grandc importância. Hoje os plantios são efetuados

de ac-ordo com a aptidão do solo relacionada à essência florestal que melhor se

adapte ao mesmo, no caso o Eucalyptus, Gmclina ou o Pinus.

A seguir discriminaremos a extensão e distribuição perccntual dos solos da

Jari segìtndo sua base geológica; extensão c distribuição percentual dos solos

segundã as texturas; e finalmtnte a cxl.cnsão e distribuição perccntual dos solospor classe de relevo.

BASE GEOLOGICA

TrPO DE SERVIÇO Sistema anterior Atusl

Corte e empilhamento 5 ton/homem/dia l0 ton/homem/dia

B aldeação com caminhão "Big-Stick" 25 tonlçaminhão/dia 45 ton/caminhão/dia

Transporte pesado 45 ton/viagem 60 ton/viagcm

Custo final + US$ 15,00/ton + US$ 9,00/ton

SOLOS x 1000 ha Vo

Formação Trombetas (Paleozóico/S iluri ano) I I

Formação Curuá (Paleozóico/Devoniano) 36 3l

Contato com Formação Trombetas e Curuá 2 2

Diabásio Penetecaua (Mesozóico/Jurassico-cretáceo) 6 5

Formação Barreiras (*) (Ceno zóicof erciário) 67 60

Aluviões (Cenozóico/Quaternário) I I

TOTAIS rt2 100

(*) - Maioria dos plantios florestais da Jari

Page 111: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

218

CLASSES TEXTURAIS

x 1000 ha

Muito argiloso

Argiloso

Média/argilosa

Média/arenosa

TOTAL

A exploração de madeira cultivada A fase nacional

A desativacãodo projetn airoz

A exceção foi a fase Portugueses da qual não tivcmos conhecimento de al-guma mácula. Na fase Iosé Iúlio houve a "Revolta de Cezârio"; na fase Ludwiga construção do Beiradão, e na fase nacional a desativação do Projeto Arroz,embora para cada caso haja uma explicação.

Como se diz na gíria, Antunes "pcgou o bonde andando", com referência aoProjeto Arroz. Na fase Ludwig houve o superdimensionamento da infra-estru-tura de São Raimundo, que era para um plantio de l4 mil hectares, quando narealidade só existiam 3 800 hectarcs de área em produção de aÍÍoz. Enquantoainda dono de todo o complexo Jari, Ludwig fez tentativas de associar-se a

outras empresas, como por exemplo a Arco (pertencente ao grupo Atlantic) e

que não deu certo, sendo dcsfcita a socicdaclc. Na realidade Ludwig já havia se

desinteressado do complexo Jari c principalmente do Projeto Arroz. Foi sus-pensa a reposição de equipamentos e desativada a área de pesquisa, fato esteque consideramos a causa principal do fcchamcnto do Projeto.

Ao ser concretizada a transferência do complexo para a Nova Companhia doJari, o Projeto Arroz não foi incluído. Na realidade desde seu início o ProjetoÃrroz nunca havia dado lucro e ncm havia perspectiva de dar, a não ser quefosse redimensionado ou aumentasse sua área de produção, baixando tambómseus custos. Como Ludwig não achava ninguém que se intcressasse pelo ProjetoArroz, o mesmo seria desativado. Ant,unes mais uma vez foi convocado paratentar a manutenção de um projeto quc corria o risco de descontinuidade, cau-sando problemas sociais na região.

Além dos erros que vinham sendo acumulados na fase Ludwig,foi acrescen-tado mais um na fase nacional, que foi a escolha da administração. Apesar deserem pessoas de valor em suas áreas espccíficas, as pessoas escolhidas nãoeram tecnicamente as que deveriam tocar um projeto agrícola. Também as in-trigas constantes entre os administradores de São Raimundo muito influencia-ram o seu desempenho, além do custo operacional, que não chegou ao ponto deequilíbrio. Outro fator que deve ser levado em consideração é a evolução gené-tica que o aÍÍoz teve nos últimos quinze anoS, fazendo com que o aumento daprodução saturasse o mgrcado, reduzindo muito a procura do produto. SãoRaimundo tinha que arcar com toda a infra-estrutura básica (atendendo ainda acidade de Almeirim, devido à proximidade) enquanto em outros projetos de ri-zicultura estes encargos eram subvencionados pelo Governo.

JÚ3

Com a substituição da administração original da fase nacional, ainda foramexecutadas algumas medidas que surtiram bons efeitos nos custos operacionais,

219

CLASSE DE RELEVORELEVO x 1000 ha

Plano e suave ondulado

Suave ondulado e ondulado

Ondulado e forte ondulado

TOTA L

Page 112: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

como por exemplo a redução do número de funcionários de seiscentos paraquatrocentos, sem prejudicar em nada a operacio."allda;ã oã p-:eto; planeja-va-se inclusive chegar a 350 funcionários. ramuem roi èxúiado um trabalhode ampliação das áreas de produçao, utiti;.*i; o pisoreio de búfalos em áreasde terrenos turfosos, contidos er cerca elétrica. Este método deu ótimo resul-tado' Pretendia-se aumentar anualmente em 500 hecturcr-u áàa de produção,com custo 40vo mais barato que o método tradicionur, quã enuoruia somente oconcurso de máquinas. Este trabalho foi efetuado em ardur onor já haviam sidoconstruídos diques, mas que precisavam ser preparadas para focer estabelecero plantio do arroz, e constava do seguinte:

ln) Conslrução de uma cerca elétrica pela partc externa do dique, deixan-do-o para dentro da cerca, para que os animais pudessem passar a noiteem lugar mais seco. como à espócie bubalina náo t.r o hábito de saltarmuito, a ccrca tinha um metro àe allura, com dois fios de arame liso de3 mm de diâmetro, dist'anciados u* ooìuffo 40 centímetros. As estacaspara fixar os aramcs eram colocadas a cada vinte r.trár, com isolado-res plásticos tipo roldana_ para que não t,ouu"rr" ;;;; de corrente. oarame era colocado pelo lado de dentro da cerca. fuãr portes de 15 cmde diâmetro, que erãm os espichadores do arame , toíatizados geral-mente nos cantos da cerca, eram colocados isoladoies tipo castanha, deporcelana para evitar a perda de corrente e também para espichar oarame. A peça mais importantc de tod.o o ,irtã*ï qI .orpunha acerca elérica era o eletrificador (marca "Balleiup;f . Ërp aparelho re-cebia a energia gerada por pilhas,'bateria de automoíet óu corrente elé-trica (como era o caso)è a ttansmitia aos fios, sob a forma de curtos im-pulsos, uniformes e de arta vortagem, que duravam décimos de segun_dos' Assim, qualquer animal ou rirrro'pessoa que viesse a se encostarna cerca, ao receber o choque rapidamõnte se ietraía; e essa retraçãoevitava o perigo de danos à iaúde.

2n) construída a cerca elétrica, introduzia-se os animais na área em caÍgade pastoYg_l*rante pesada. Quanto menor a âreamelhor o serviço.os animais consumiarn logo a vegehção, pois o prrãoÀinância eÍa gra_míneâs, Taboa (Tipha domingueásisi e a Aning a (Montrichardia arbo-rescens) e o pisoteio se encarregaua de tombar õ ,esto da vegetação quenão era pastejada. No início os ãnimais se to.oroviu; p"r cima dos di-ques, pastando logo. as gramíneas existentes. Depois começavam afazet veredas para o interior da.âr.ea, pastando u tuuãu,ìue funcionavacomo um chapéu de sor em miniatuia, im.pedinão-u'Jrnetração dosraios solares. com a peneração do sol e o piìoteio oor ãnirais compri-mindo a turfa (*), a água começava a evaporar e em pouco tempo a âreaestava completamente drenada e sem o embaraço-d, uìgetação queembuchava nos'equipamentos na hora de gradear. Assim as máquinas

A desativaçâo do projeto arroz A fase nacional 221

podiam se locomovcr sem problemas, executando as etapas necessáriasaté o plantio do arroz. Esta consorciação de animais e máquinas possi-bilitaria a ampliação dos campos de produção, com economicidade de40Vo.

3o) Após a retirada dos animais, o serviço dc topografia voltava ao localpara fazcr a marcação dos canais de drenagem, irrigação e a colocaçãodos bueiros. Nesta fase, o serviço cra facilitado significativamcntc,como por exemplo:

Não era preciso abrir picadas a tcrçado no interior da taboa, já pastc-jada ou iombada pelos animais. As visadas com aparelho podiam sermais longas, adiantando o scrviço e a locomoção da equipe de topogra-fia, facilitada pcla firmeza do terreno já drenado.

outro aspecto ainda mais importante era a operação das máquinas"BANTAN", que f aziam os canais no interior das quadras dicadas.Esse serviço era fcito utilizando pranchões para que a máquina não ato-lasse na turfa; antes da progrcssão da máquina, era preciso mudar ospranchões com o auxílio da lança, dcixando de operar naquele cspaçode tempo. Na área em que os animais haviam passado, a máquina an-dava sem a nccessidade dos pranchÕcs.

4n) O nivelamento do tcrrcno para quc a lâmina d'água fosse uniformc cratambém facilitado pelo pisotcio dos animais, que fazia uma cspécic de"calo" no solo. Dessa forma a gradagcm daria ao perfil a profundidadenecessária, que seria ocupada pclo enraizamento do arroz. Ncstc sisl.c-ma,a nova administração de São Raimundo conseguiu preparar parcial-mente uma área de 231 hectarcs em 73 dias de pastoreio, com um con-tingente de 548 animais de dois anos de idade, em média. Na rcalidadenunca existiu uma máquina dc esteira ou roda qus tivesse rcndimentoeconômico satisfatório cm árcas pantanosas, ou para ser mais claro,que não atolasse. O pisoteio dos búfalos facilitava a opcração das má-quinas nesse sentido; podcmos concluir que a consorciação máqui-na/búfalo poderia tcr sido a grande valia no projcto aÍroz. Mas paraisso, cra preciso t,er pcssoas com vivôncia na Amazônia, e também comformação específica na árca de Agropecuária.

ooú

Tomadas essas medidas pela nova administração do Projcto Arroz, surge oproblema da variedade de aÍroz quc vinha scndo plantada a scte anos consc-

(*) - Turfa - mistura hcterogôncalenhoso, arbustos, líqücns, musgos)saturados de água.

de materiais orgânicos parcialmente decompostos (matcriale matcriais inorgânicos quc têm se acumulado cm ambicntcs

Page 113: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

222

cutivos (variedade J-229), cuja produção caiu verticalmente a nível de arroz descquciro, inviabilizando totalmente a at,ividade. Sem outra variedade testadaque substituísse aJ-229, em virtude da paralisação da pesquisa nos anos ante-riores, não restou alternal.iva a não ser paralisai a atividaOe. Com relaçao aósfuncionários, 5070 foram aproveitados em outros projetos do Complexò Jari eos demais demitidos. Hoje a maioria já foi absorvidã por outros pìojetos quesurgiram posteriormente, como a bauxita, por exemplo.

A desativação do projeto arroz A fase nacional 223

A pecuária bubalina

ii1il#r#$ifliiüi$ilffi;4$ffi 11 ;t;.,'rrulrt ;, s

ITIA^AdA Ae AprortrnAAAmenle Z mtl OuJAlos, reuntAos em CUrrAl na epoca ao ,nvc

Na Amazônia cxistcm cxcclcntcs árcas de várzca, propícias para a bubalino-cultura. As várzeas dos rnunicípios dc Almeirim e Porto de Móz sem dúvidaestão entre as melhorcs. Poróm, em virtude das chcias e secas, essas áreas sópodem ser ocupadas dc maneira pcrmancntc com a bubalinocultura. Nas fasesIosé lúlio e Portuguc.scs, como já descrcvcmos, as áreas de vârzeas da Jari eramutilizadas com bovinocultura, mas com rcndimento baixíssimo, pois o bovinonão tem a mcsma rcsistôncia cm ópoca dc chcia, comparado ao búfalo.

Na região do baixo Amazonas os criaclorcs dc bovinos utilizavam as pasta-gens de vârzca somente na época scca, scndo obrigados a investir em instala-ções nas duas árcas. F claro que ncm t.odas as várzcas do baixo Amazonaspodem ser utilizadas dc mancira pcrmancntc para a bubalinocultura, porquc onívcl de suas cnchentcs alcançam colas clcvadas, porém estimamos que mctadcdelas poderá ser utilizada pcrmancntcmcntc com búfalos.

O búfalo tambóm podcrá scr criaclo cm [crra firme com grandc rcndimcnto.O idcal ó uma árca de campos cobcrtos tipo Savana, com bons igarapés, cvitan-

Manada de aproximadamente 2 mil búfalos, reunidos em curral na época do inverno.

Page 114: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

224 A pecuária bubalina

do assim os dgsmatamentos. Temos conhecimento que ao Noroeste das áreasda Jari, no sentido do Tumucumaque, exist.em excelõntes áreas de campo tipoSavana, onde os índios da aldeia Bona tiveram um bom começo de criáção ã"búfalos. Também na área do Tiriós os índios já possuem uma grande rnanãda debúfalos, criados nos tipos de campo acima citádos. Particulãrmente achamosque a fronteira da pecuária bubalina do Pará deve se estender ao Norte atéesses campos, que se iniciam no Amapá e vão até o Rio Branco, utilizando tam-bém as várzeas.

úocA Jari da fasc nacional oplou pclo búfalo por motivos óbvios, tendo havido

uma grande cvolução c apoio principalmentc no início da fase, na pcssoa do Di-retor Janusz Wiscieklica. Atualmcn[c a Jari possui o maior rcbanho de búfalosdo Brasil, em lorno de l2mil cabcças, c suasãreas devirrzeaasseguram uma ex-pansão (scm neccssidade dc dcsmatamcntos) de até 30 mil cabeças.

A evolução da fase nacional rclacionacla à criação clc búfalos ocorreu emsuas instalações, cquipamcnt.os c na reprodução.

Co.niunto.de casa e curral, conslruído em cima de aterrofeito com máquina. Emfrente,lago decriação de peixes, resullanle da escavaçõo para o levantamenlo do ateiro.

As instalaçõcs foram consl.ruídas cm árcas próximas às margens do rio Jari,uma série dc atcrros fcitos por tratorcs, ao invós das tradicionais marombas.

A fase nacional 225

Esses atcrros tÔm em módia 50 mctros de comprirnento por 30 mctros de largu-ra. O primeiro passo consisl.e na marcação da área de 5O x 30 m, seguida daãs-cavação de fossos de ambos os lados, amontoando o material na área acimamencionada. O formato dcsscs aterros após seu t,órmino é de um Í.rapêzio,sendo bem compactado com o trator, c calçado com pedras rejuntadas côm ci-mento par? evitar a formação de lama. Tanto o curral como a casa "duplex"para duas famílias foram construídos em cima do at.erro, sendo que o assòalhocom altura de 3 m do piso serve como cobcrtura da área de ordenÈa.

O fôsso ondc foi efetuado o cmpróstimo para clcvação do atcrro foi tambémelevado em forma de dique, no lado oposl.o ao a[crro, para evit.ar que na épocade cheia a água transborclassc c pcrmitisse a fuga dos pcixes quesão criãdosdcntro do fôsso. O Tamuatá, por excmplo, sc alimcnta do esteico dos búfalos1Pós a lavagem do piso c por sua vcz scrvc de alimcntação para os pirarucús..Esse sistema dc piscicullura c pccuária bubalina é maii uma opção de rendapara a pccuária da Amazônia. A título dc informação, colocamos Ìiitros de pira-rucú com 20 cm dc comprimcnto c pcsando 600 gramas; depois de l5 meses osmcsmos estavam com l,l3 m dc comprimcnto c pcsando l7 kg cm média. OsTutuatás, quc na região só dcsovam no início do inverno (mês de janeiro),dentro dos fossos desovam o ano todo.

Na partc de cquipamentos foi introduzido o aerobarco no manejo dos búfa-los na época de cheia. O Aerobarco ó um veículo com hélice de madeira aco-plada a um motor VW, quc dcsli za com boa velocidade por cima da vegetaçãode gramíneas, cipcráceas e ouÍ,ras vegctaçõcs do campo, facilitando a úpervi-são e arregimenlação dos animais. Ainda na partc dc equipamentos; foi ìntro-duzido um sisl.ema de acondicionamcnto de leitc prodúzido pela Alfa Laval,c_9m capacidade de 1500 lilros, ondc o produto é mant,ido emrefrigeração de5' C pelo período dc oito horas, Lempo gasto para chegar em Montã Doürado,onde é distribuído à população. Estc equipamcnto é montado dentro de umbarco e composto de um reservatório dc aço inoxidável acoplado a um com-pressor de frio.

Na parte de melhoramenl.o genótico do rebanho, a Jari todos os anos com-prava reprodutores regist.rados da raça "Murrah", lcndo também adquirido umtouro de alta linhagem racial que cstcvc cm iegime de coleta de sêmen na Fa-culdade.de Ciências Agrárias do Par'â, sendo o sêmen utilizado no processo deinseminação artificial para a produção de reprodutores. Na parte dè insemina-ção artificial, com apoio do Dr. William Valc e sua equipe, a Jari tem obtido osmelhores índices de nascimento ató agora rcgistraclos nó país, tendo atingido amédia de 600/o.

A Jari também tem servido dc base para muitos Lrabalhos científicos sobre abubalinocult.ura, sempre associada ao Dr. William Vale e sua equipe. podcmoscitar o livro "Bubalinos - Filosofia' e Patologia da Rcprodução"'e a Tcsc d'cMestrado do Dr. Haroldo Francisco Lobato Ribciro pela Univcrsicladc RuralI

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Page 115: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

226 A pecuária bubalina A fase nacional

do Rio dc Janciro, com o tcma "Prcvalôncia dascas do Sistema Gcnital dc Búfalos, na rcgiãoPará".

Outro scrviço de grandc relcvância para a bubalinocultura do país cstá scndofcito cntrs a Jari c o Dr. Jcromc Langcncgcr, pertcncentc à Embrapa do Rio deJanciro, no tratamento dc docnças infccciosas, como por excmplo a tubcrculo-sc. E para finalizar, a Jari da fasc nacional tcm proporcionado estágios na ativi-dade pccuária para vários tócnicos cla írrca.

227

A área de mineraçãoNa fase Ludwig, como vimos, foram cstudadas as riquczas mineirais existen-

tes na área da Jari. Poróm, soment.e o Caulim cra c*piorado economicamente,com produção anual de 250 mil toncladas c faturamcnto anual de US$ 32 mi-lhõcs. Nessa fasc a cmprcsa tinha 440 funcionários c possuía 120 casas residen-ciais.

Com'o advento da fasc nacional, a fábrica foi ampliada e sua produção pasisou para 369 mil toncladas/ano c o faturamcnfo anual passou a ser deUS$ 50.974.000. CoT a ampliação o númcro dc cmprcgados pursou para 550 eforam construídas mais 138 rcsidôncias, pcrfazendo-2sã, r.nd'o que no momen-to cxistcm 64 casas em construção. Alóm cla ampliação, a Cadám melhorou opadrão do produto no quc sc rcfcrc ao índicc clc ìrniáade, e mantevc o padrãode alvura "A88", que sem dúvida está cntre os mclhores do mercado ,nundial.

de caulim, às margens do rio Jari. Aofundo as lagoas para receber

A título dc informação, a utilizaçiro clo Caulim procluziclo na Jari ó para co-bcrtura dc papcl, linLas c cosrnóticos, scnclo scus rnaiorcs cornpradorcs ã Japao,Itiília, Argcntina c o próprio mcrcaclo intcrno. A Euroclay, rinprrru com iedcna_Alcmanha, quc tanrbórn compra Caulim cla Cadam,6á-unra òspócic Oc con-sultclria sobrc a qualidaclc rlo produto.

Altcrações Clínicas edo baixo Amazonas,

Patológi-estado do

Primeiro bezerro búfalo nascido pelo método de inseminação artificial na Jari, no ano de ]987.

Complexo industrial da fábricao rejeito.

Page 116: JARI 70 ANOS DE HISTÓRIA - Cristovão Lins

228 A área de mineração

A Catiam é uma cmpresa gcnuinamcnt.e amazõnica, a partir da mina situadano Arnapá, sendo toda a sua direção opcracional ocupada por técnicos amazô-nidas, sem contar os funcionários de quase todos os nívcis, Que na realidade sãoo dínamo das operações.

úoo A bauxitaA Bauxita é outro fruto cla fasc nacional, cmbora tcnha sido estudacla na fase

Ludwig. A Bauxita cxistcntc na Jari ó rcfratária (somcntc a China e Guiana tômeste minério), o que lhe asscgura pcrspcctivas bastanl.e ot.imistas de comcrciali-zação. O complexo Caracurú II, onde cstá situada a jazida, tcm vida útil para 35anos, com produção dc 580 mil toncladas/ano.

A bauxita refratária scrvc para rcvcstirncnto dc fornos industriais, indústriaquímica (fabrico dc sulfato dc alumínio abrasivo) e cimcntos aluminosos.Atualmentc cstá scnclo montaclo o sistcma dc calcinação da bauxita, cujo fatu-ramento anual passará de US$ 55 milhõcs em módia para ccrca deUS$ 130 milhões. O mercado cxtcrno devcrá ser o mais visado, notadamente oJapão, Europa e os Estados Unidos.

Atualmcnte a bauxita tem 150 funcionários, tendo já construídas várias resi-dôncias na Silvivila de São Migucl. Quando a usina de calcinação entrar em fun-cionamento, o número de funcionários aumentará para 190 c mais rcsidônciasscrão consl.ruídas, de acordo corn a nccessidade.

A fase nacional 229

Programasfuturose em execução

O problema de energia na Jari sempre sc constit.uiu em fator limitante paraimplementar novos projetos, desde os tempos de Daniel Ludwig. Especifìca-mente falando sobre a hidroclótrica que Ludwig tcntou construiihá doze anosatrás, e para a qual não obtcve pcrmissão do govcrno brasileiro, hojc e prccisorcavaliar a não-cxccução da rncncionacla obra, comparanclo-a com a que sc prc-tcnde construir agora na fasc nacional.

. É eviclcn[c que se Luclwig rivcssc construído sua hiclroclérrica a rcgião csta-ria mais dcscnvolvida, uma vcz quc, como já disscmos, a cncrgia ero õ fator li-mit.ante. Poróm os projctos quc Luclwig tcncionava exccutar dcmandavamgrandcs árcas dc armazcnamcn[o híclrico c com isso inunclariam considcráveisáreas dc florcstas. O primciro projcto clc Luclwig era constil.uído dc duas eta-pas. A primcira, a hidroclótrica na Cachocira dc Santo Antônio, teria uma po-tôncia instalada dc 150 MV/. A scgunda ctapa scria uma outra hidroclótrica rc-guladora no rio Iratapurú, tributário do rio Jari pcla margcm csqucrda, e quegcraria 50 MV/. A outra opção dc Luclwig, caso não fossc possivit o primciìo,seria consl.ruir uma só hiclroclótrica na Cachocira Itapcuara, no rio Jâri, e qucgeraria 595 MW.

A hidroclótrica quc sc prctcndc const.ruir agora na fasc nacional lcm a carac-tcrística dc scr.uma Usina a "Fio d'água", ou scja, não cxigirá grandcs áreasinundadas.

O projeto da Usina dc Santo Antônio, quc scrá construída pcla margcm es-qucrda do rio Jari, consl.il.ui-se dc uma Lomada d'água ligada por concluios for-çados à casa dc força e clois cliqucs dc tcrra e enroõamcnio inicrligados por umvcrLcdouro dc concrcl.o. A usina tcrá uma capacicladc instalada dc 100 MW,com lrôs gcraclorcs dc 33,3 MW cacla.

A [ítulo dc informação, o comprimcn[o clos diqucs c clo vcrt.cclouro scrá 4c3 168 mctros, com uma altura dc 32 mctros c largura cle 7 mctros. As cscava-ções atingirão o montantc clc 600 mil mr c a massa dc concrcto armado de100 mil mr. O cronograma da obra, com cómcço previsto para o início da dó-cada de 1990, t.erá duração clc quatro anos crn iua-primcirar-fasc, para a produ-ção dc 33,3 MW.

Equacionado o problcma dc cncrgia, cxistc a possibilidacle da Jari futura-mcnl.c consl.ruir uma outra fábrica clc cclulosc, conl.ando com mát.eria primaoriginária do aumcnto clc produtividaclc dc suas árcas at.uais c cont.anclo tam-bém com o fornccimcnto da Amccl do Arnapá, cmprcsa pcrtcnccntc ao GrupoCacm i.

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230 Programas futuros e em execução

Em dezembro de 1989 tcvc início o asfaltamcnto da pista do aeroporto deMonte Dourado, já concluíclo, que agora pcrmite a operação de aeronaves demédio portc, como por exemplo, os Bocing 737.Esta obra foi executada pelaESTACON, empresa originária do próprio estado do Pará.

Iari:70 anos de história

Conclusõestarefa de construir na Amazônia uma civilízaçõo, constitui umdesafio permanente ò capacidade realizadora do homem. Narealidade o julgamento e as conclusões sobre o que foi nar-rado neste livro ficará a cargo do leitor. No início do livro

nos propusemos a relatar os acontecimentos cotn isençõo de ônitnos e es-peramos em grande parte ter realmente cumprido o prometido, emboraseia muito difícil vencer a emoção acumulada por dezessete anos conse-cutivos de permanência na Jari. Mas com honestídade: o que pudemosfazer, para contar o encadeamento ocorrido em setenta anos de história,foi feito. Esperamos que muita coisa que era comentada pejorativamentesobre a sua história tenha sido elucidada.

Temos certeza que Antunes continuará a grande obra iniciada porseus antecessores. O leitor já poderáfazer este julgamento aos dez anosde sua atuação.

É claro que aconteceram muitos erros na Jari, principalmente nafaseLudwig, quando a probabilidade de erro era maior devido ao grande nú-mero de projetos implantados simultaneanxente.

A Jari vai continuar. E um dia outro narrador acrescentaró mais umelo no encadeamento de sua história.

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Iari:70 anos de história

"FIash" regiãonos atuaÍs

isicamente, as te rras da JARt cstão contidas em 60To no municí-pio de Almeirim, Estado do Parâ, e 407a no município de Maza-gõo, Estado do Amapá.

Em todo'ç c.ttc.ç anos, sendo que mais acentuadamente nas FasesLudwig e a atual Fase nacional, não se pode negar que a região experi-mentou um desenvolvirnento industrial sem precedentes na história dobaixo Amazonas. Em c o ns eq üê nc ia de s te des e-nv olv ime nto, foram geradosrecursos finance iros que proporcionararn uma grande diiersificãçõo denegócios, tanto internamente cotno nos dimais municípioi vizi-Üot, como por exemplo Macapá, P rainlta, M onte Alegre e-Santarém.Esse intercâmbio de negócios conx os ntunicípios citatloíé baseado prin-cipalmente no mercado de ltrodutos alirnentícios, uma vez que a ràgiõoda JARI e os próprios municípios tte Almeirirn e Mazagão ainda opritrn-tam Srande déficit de alimentos. Outrofator desse iniercâmbio é o mer-cado de trabalho que a JARI oferece, sendo a maior procura provenientedo Estado do Amapá.

Hoie, Monte Dourado estít ligado a Bclém por vôos diários efetuadospela TABA (Transportes Aéreos Regionais da Bacia Amazônic-a) sendotalvez a linha mais cot?tercial desta Contpanhia. Entre os municípíosmencionados existem inúrneros barcos de médio porte que mantêm sema-nalmente linhas regulares, com si5;nificativo núrnero de passageiros ecargas transportados.

No Estado do Antaltci a cidacle tle Laranjal do Jari, popularmente cha-mada "Beiradão" , embora com crcscitttcttto desordenado e muito promís-cuo, começa a tel ediJ'icaç(tes na terrafirme , com ruas bem traçadas,luz elétrica e indícios de que a Cidade deverófixar resiclências familia-res neste local,ficando a beira do Rio para o comércio e outras ativida-dcs. E por falar ern comércio, ltojc Laranjal do Jari po.ssui comércio

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234 "Flash" da região nos dias atuais

forte e diversificado, sendo o ouro o principal produto comercializado. Apopulação de Laranjal do Jari é a segunda do Estado do Amapó, comaproximadamente 5 0 mil habitantes.

A Cidade de Almeirim, que no dia 23 de agosto de 1990 completoucem anos de existência, tem hoje sua Junta de Conciliação e Julgamen-to, fundada em 25 de abril de 1990 e foi elevada ò categoría de Comar-ca em 7 de iulho de i,989. Outrora completamente desprovida de assis-tência médica, Almeirim tem hoje um Hospital com vinte leitos que m)titotem aiudado a população local, como também dos municípios vizinhos.

Essa evoluçõo social do Município de Almeirim teve como seu princi-pal personagem o atual prefeito, Sebastiõo Baia Águila, sujeito simples edefócil trato, natural de Monte Alegre, meu conterrâneo, mas que jô seconsidera Almeirinense, pois labuta no município desde 1950.

Em síntese, o município de Almeirim tem tudo para se constituir numdos mais prósperos do Estado do Paró, pois tem grandes riquezas mine-rais, excelentes vórzeas para a pecuária bubalina, além de solos muitoférteis na região do alto Rio Parú, precisando apenas de estradas de co-municação afim de incentivar a agricultura.

lari:7O anos de história

BibüogzafraAlbum do Esíado do Parti/|908, organizado pclo Govcrnador Augus-to Monl.cncgro.

Manoel Rodrigues Fcrrcira - A Fcrrovia do Diabo.

Enóas Carvalho - Rcmcmorando um crimc prcmcditado (Folha doNorte de 2617 fiD.William Waack - Futuro dc cinqücnta mil pessoas faz o GoveÍnomantcr o lari. (Jornal do Brasil dc 2816187).

Jaakko Poyry - Turfa, uma altcrnativa encrgética cconômica e regio-nal.

C. Lins - Sislcma Silvopasloril na Jari (Scrninário 1986 - Jurima-guas - Pcru).

C. Lins - Manejo Extcnsivo dos Bútalos na Jari (Seminário 1983 -Araçatuba - São Paulo).

C. Lins - Preparo dc iírcas pantanosas para plantio da cultura doarÍoz inigado, visando o consórcio búfalos c miíquinas - 1987.

C. Lins - sisíema de produção Silvopastoril - (Simpósio TrópicoÚmido - 1980 - Belóm lPar'â)

C. Lins - Capitari para fabricação dc celulosc.

C. Lins - Turfa como substraÍo dc mudas florcstais.

Adilson Ncmer - Avaliação prcliminar sobre vinte cultivares deMandioca (1978).

Sinopsc dos Municípios do Parií.

National Geographic - Iari: A Billion Dollar Gamble.

Eneas Salari, Hcrbert. otro Rogcr Shubart, wolfgang Junk e AdéliaEngrácia dc Olivcira - Amazônia: Desenvolvimcnto e IntegraçãoEcológica.

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236 Bibliografia

Gcografia do Brasil / Rcgião Noríc - Fundação Instituto Brasilcirodc Gcografia c Estarísrica - IBGE.

Projcto Radarn - Progranra dc Intcgração Nacion al - Lcvanlamcn-to de Rccursos Naturais - Vol.5.

João Josó Lopcs Corrôa - Scminilrio tlc Solos lari.Profcssor Nicolino Carnpos - O Crintc do Paclrc Amandio.

Profcssor Rubcns Lima - Aulas clc Agricullura Gcral.

Einar da Costa Dantas - Amazonas, Rio de Ìtíuitos Nomcs.

Projeto Grttfico,DATAFORMA - Rua

Rio

editoração eletrônica e produção grdfica:Voluntários da Pátria, 190/l0l I - Botafogo

de Janciro - Tcl .:286-2172