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Jacob Dolinger DIREITO E AMOR e outros temas Prefácio de: CELSO I.AFER ßNOVRß ßio Jcìnøiro r Sõo Poulo . Recifø 2009 ffi 1.,,.r. - -.,, r.,. ¡.rr'

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Jacob Dolinger

DIREITO E AMORe outros temas

Prefácio de:

CELSO I.AFER

߀NOVRßßio dø Jcìnøiro r Sõo Poulo . Recifø

2009 ffi1.,,.r. - -.,, r.,. ¡.rr'

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A Ordem Pública em seus Diversos Patamaresi

A ordem pública, fenômeno principiológico que arravessa rodas asáreas do direito, merece especial consideração no plano do direito in-ternacional privado, onde exerce um papel de extrema importânciapara garantir o adequado funcionamento da eventual aplicação pelojuiz nacional de normas de sistema jurídico estrangeiro.

A ordem pública no direito internacional privado rem duas fron-teiras: de um lado, com o direito interno e, de outro lado, com o direi-to internaci onal lato s ensu.

Estas duas vizinhanças, em dois extremos, levam a uma ctassifica-ção diferenciada dos sucessivos graus de ordem pública em operaçãoz.

Vizinhança com o Direito Interno

O Primeiro Nível da Ordem Pública - Vista a ordem pública najustaposição do direito interno com o direito internacional privado,teremos a gradação da ordem pública de forma a que o seu primeironível funcionaparagarantir o império de determinados valores no pla-no do direito interno, impedindo que estes valores sejam desrespeita-dos pela vontade das partes. São, dentre outras, as leis de proteção aosmenores, aos incapazes, à família, à economia nacional e a determina-dos institutos civis e comerciais que constituem, de certa forma, a pu-blicização do direito privado.

I Publicado na "Revista dos Tribunais", vol. 828 (2004J.2 Vide Ricardo Ramalho Almeida, "A Exceção da Ofensa à Ordem Pública naHomologação da Sentença Arbitral Estrangeira - Questões de Doutrina e daPrática", in "Arbitragem Interna e Internâcional", Ricardo Ramalho Almeida(o.g.), p. 129 e especialmente p. 145, nota 46.

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Traclicion¿lmente não hat ia em nossa icgislação civil uma regra ex-pressa sobre a inderrogabilidade de leis protegidas pelo princípio da

ordem pública. clóvis Bevilaqua clispusera erl seu Projeto, no artigo14, que "ninguérn pode derrogar por convenção, as leis que-regulam a

consiit,riçao cla fämília, nem as que i'teressem a ordem pública e aos

bons costurnes", trias esta norma não foi incluída no Código Civìl de

191 6. l.Jo Código Comercial, o artigo I 29 dispóe sobre a nulidade dos

contratos comerciais que recaírern sobre objetos proibidos pela lei, ou

cujo uso ou fim fbr manif'estamente ofþnsivo da sã moral e bons cos-

trr|"r, sern referência expressa à ordem pública' O Código Civil con-

tinha uma regra semelhante no artigo 145, que consìderava nulo o ato

jurídico q.rur'tdo ilícito ou impossível o seu ob¡eto, mas ìgualmente,"- ,"f.iê.rcia alguira à ordem pública, nem sequer aos bons costu-

rnes. sobre a ausência da ordem pública do código de l6 escrevi que

nosso legislador cii,il provavelmente considerou que não há ¡ecessi-dade de"explicitar a proteção operada pela ordem pública' Esta' no

plano do diieito interno, pode permanecer oculta, irrevelac{a, no ano-

li*uao. Sua vigilância é uma questao tão ma'ifesta, tão integrante do

sistema juríclico, que o legislador não precisa pfeocupaf-se err mani-festá-la å*p."rro*"nte. Qualquer ofensa a uma lei, a uma instituição'pro."gido pela or<1em prrÈlica sera afètada na sua validade, ora anulá-vt-l, ora nula'.

A instituição do inquilinato bem ilustra a sistemática protecionistada ordem pútli.a, up.ro, cla discreção do legislador' Veja-se a lei6.649, de 16 de maio'de 1979, que regeu o instituto e assim c{ispunha

"- ,",., artigo 46: "São nulas de pleno direito as cláusula no contratoáe locação que visem a elidir os objetivos da presente lei e, non'reada-

*.r1t.,-uq,t*le que proíbe å sua prorrogação"' Baseado nesse dispositi-r.o, o Tribinul de eiçudu Cível áo Estado do Rio de Janeiro, por sua 4u

Cá*u.u, assim ¡ulgou: "As despesas extraordinárias são de responsabi-

lidacle io lo.uio. " não podem ser atribuídas ao inquilino, sob alega-

çt; à, existência d. ,,tio'o,,",ia da vontade no contratar, eis clue tal

irincípio está limitado pela ordem pública cujas normas são cogentes

! g.r*ìr. São nulas u, .lásrrlut que visem elidir os objetivos da Lei n'

6.649/79, ex ui art. 46"4.

Alei 8.245 de lg de ourubro de 1991, rambérn sobre locação debens imóveis urbanos,.e* dirporitiu; ill; ;;i;, ;;r;ï;;;ì"r roartigo 45: "são nuras de preno direito u,.láurrrru, do contrato de loca_ção que visem a elidir os objetivos au p."r"n," l"i, not"Jur*ritJl, qrr.proíbam a prorrogação prevista _n o art. 47,ou que afastem o direito àrenovacão, na hipótese do art. 5l-, ou qrr" ir_,.rponh._ Jrrg;;;;"."niárias para tanto,,. Ne¡huma ,ef.rer,.ir-J orciem pública.

,trtfiîåi:sofia foi alterada p'lo coã,go ci"il i" t0ò)", ruioartigo

são lícitas, em geraf todas as condições não contrárias à ordem púbri-ca ou âos bons costumes; entre ,r'.o;Jiçil; d;î;r;r"r;_.:i;:* ",que privarem ," ,:9", efeito o ".go.iol;.iá;.;, ;; ,i;änii.ï ".puro arbítrio de uma clas partes. e ' )'

3 "Direito Internacion¿l Privado, Parte Geral", 7n edição, pp' 407-8' - - ^

+ApeiaçaoCir,eln.30'419,in.'BoletimAdcoas,,]9B5,verbete105.316-

Se o serviço for prestado por quem não possua título d.e habiiitacão,ou não satisfaça requisitoi ouiro, "r..tår*.iáor'."rrà'i ,'ãã'ooa..uquem os prestou :oq.ol a retribuição "or_ri_.*" .Jlrå'rä"a.,r,.ao trabalho executado. Mr' '. ã;'Ë';;'i;;;'il;åìt.ä o'.Tri "",*parre, o juiz atribuirá a quem o presrouã.td. qu",."r-rrlsiar .;;Ë;; IJ-r!JLwLr uma compensação razoável,

Parágrafo único _"Nau ,. .pli."r- segunda parte deste artigo ctuandoa proibição da prestaçâo de ierviç<,r ,;r"i;;'J. ì., ¿i iä";iÏ,,,...A experiência quase securar com o código de r9r6 demonstrouque se pode perfeitâmente viver sem qualquer expressa referência Ie-gislativa ao princípio da ordem pturrJ". Ë*endemos que se trara deum princípio tão imanente na nossa fìrosofia juríd.ica, no nosso sistemajurídico, na estrutura da nossa *";;;;;mia, que não há necessida-de de se fazer refèrência expresr; ; t; efeitos. Nossos tribunaissempre souberam detectar quando ,.,rr_, .onrrrao, um negócio, feria oprincípio-mor, regulador do Lquilíbrio ro.,al

" "J";ô;;;. öãrä,çu",co'tratuais, mesmo que aceitas por ambas as pârtes, que ferissem osvalores básicos de nóssa sociedade, ", pliruår;:;i ;;;å;;'oïuo, ,economia geral, sempre foram re¡eitajos por nossos tribunais semqualquer expressâ noi*u regisrada ¿ã;;;; "" ordem púbrica. certosprinc-'ípios têm mais força, mais eficác;;uand.o mantidos discreta-mente. E no caso da ordern pública,

"rtu àii..lçao ainda é mais impor_tante, pois, como é sabido, èla é volúvel, uit"rr-r" com a mudança decostumes, de mentalidades, de interesses nacionais, .; ;;; f;;r, ".

Também encontramos referênciatigo 606:

expressa à ordem pública no ar_

270 ?l ì!/ !

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dern pública no passado pocle não rnais ferir hoje, e více-versa. Percleuo legùlaclo, do sèculo )O(l a oportunidade de seguir a sábia orientaçãodo legislador de oito décadas atrás, clue estabelecera um regime que

fincionou a pleno contento.De q,ralqrlc'r modo, permanece hoje, no regime do novo código, a

mesma idéia-básica de antes - ao aplicador da lei caberá determinaro que pode e o que não pode ser pactuado pelas pärtes em seus con-tratos. Assi*, ou ,,,rbenres que firmarem um pacto antenupcial libe-rando-se reciprocamente dos deveres estabelecidos para os cônjugesno artigo 1.566 (fidelidade, vicla em comuln/ mútua assistência) terãoeste aclrclo reconhecido ou rejeitado pelas autoridades judiciárias, em

caso de desavença entre os contratantes, de acordo com a filosofiamoral vÌgente à época da apreciação judicial, que entenderá aplicável,ou não,

OSa reserva da ordem públicaegrrndo r1a Orciem Pública

grau, a intervenção do PrincíPio da ordem pública na aplicação das leis

estrangelra s indicadas pelas regras de conexão do direito internacionalprivado.

|,1ão é tocla lei local, cogente - das que não poclem ser derrogadas

peia vontade das partes no plano inte¡no - que não poderá ser subs-

alrrrid" por lei estrangeira, diversa, no plano do direito intetnacionalprivado. Assirn, um menor cle l5 anos de idade não poderá, no plan'r

ínterno do direito brasiieiro, renunciar à proteção que the é estendidapeio legislador ao considerá-lo relativamente incapaz, por ser estâ uma

q.r"rtaó de ordem públic.a. Mas no plano internacionai, indicada 1ei

estrangeirå por regra de conexão, que considera uma pessoa de 15

anos capaz, poderemos aceitar e apiicar esta norma, sem preocupa-

ções para com a ordein Pública.trto porque a disposição do direito internacional privado brasileiro

- artigo 17 da Lei de lntrodução ao código clvil brasileiro - de re-

jeitar a aplicação de norma de direito estrangeiro contrária à nossa or-

ãem p,itrlica - só se dá quando a lei estrangeira choca a nossa ordem

púbhca de maneira mais grave. Seria o caso de uma lei estrangeira que

.or.r..d"ru" maioridade a uma pessoa de idade inferior, em nível totai-mente inaceitávei poï nossa orclem jurídica'

Assim sendo, a incidência da ordem pública interna em matéria de

direito internacional privado é bem menos freqúente do que no plano

puramente interno, quando do choque entre a 'ontade da pessoa ou

das partes com norma cogente.

Segue-se, em segundo

272 LIJ

- Mais raro ainda o recursoà ordem pública quanclo se tratâ de reconhecer direitos adquiridos noexterior, que classifícamos como o terceiro grâu, ou o terceiro nível daordem pública

s Vide HAROLDO VALLAD,{O, ,,Direito Inrern¿cional privac{o,,, vol. I, 5"edição, p. 498.

Exemplo clássico é o da poligarnia. Apesar d,e nossa lei vedar a po_ligamia, e ser esta uma norma cogente, inspirada nas bases fundamen-tais de nossa fìlosofia de direito d, fr*iliu, podemos perfeitamentereconhec-er efeitos jurídicos de uma ..ru*.nto pohgâr*co, cerebradoem jurisdição que permite o regime murtimatriÀoniar. IJma segunda,ou terceira esposa, que contraiu núpcias onde o casamento poligamicoé aceito, cujo marido se encontra no Brasil, terá direito d" i-.?rra-roem nossa Justiça por alimentos e por qualquer outra reivindicaçao quelhe seja facultada por-sua lei pessãal, Ë rrorr" Justiça poderá.oå."d"._lhe estas pretensões. Isto porque, t"ndo adquirido o direito a estas rei-vindicações de forma regítima no exterioi, a ordem pública não seopoe à execução destes direitos em nosso território.

Da mesma fbrma, podem-se reconhecer e executar sentenças es-trangeiras, que nossos tribunais não prolatariam, por f.rir"* noiru o._dem pública, mas que, uma vez profèridas . pussudu, "_ ¡rtgiao ,roexterior, seus efeitos são admitidos entre nós.Neste patamar só deixaremos de respeitar d.ireitos adquiridos noexterior quando a sua execução em nossa jurisdição for .Lo.urrt" a"forma gravíssima. Entende-se -.i"d" q"l não unanimemente - quea vinda de um estrangeiro com suas drra, erposas, para se rad.icar noBrasil, pleiteando que se respeite a varidadå " r.gttr*iã"i"iã ,",r,dois casamentos concomita;tes, permitindo-r"-rî",riu"rìo -g.urit,

deve ser vedada, porque provocaria uma situação gravissimâmenteatentatória a nossos princípios monogâmicos e, portanto, contrária ànossa ordem pública inte¡na para efeiios internacionais, mesmo em setratando de direitos já adquiridos no exterior.

A distinção é entre apricação direta e apricação indirera do direitoestrangeiro. Aquela constitui a aplicação da rei ãstrangeira pelo tribu-nai brasileiro, e esta, o recorrheci-"nio por nosso sistema jurídico delei estrangeira já aplicada em sentença à.firritiuu p."i;;i;;o-"*,.-rior, que atribuiu determinado direito a alguém, o' po, situação jurí-dica já consolidada, o que significa que este"dir"ío ¡a ," i".ofroro',

"opatrimônio jurídico da pessoas.

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I

O artigo 17 cia lei introdutória, como redigido, não deixa entrevera distinção entre estes dois graus da ordem pública no plano c{o direitointernacional privado. O dispositivo reza: "as leis, atos e sentenças cle

outro país, bem como quaisquer declaraçoes cle vontade, não terãoeficácia no Brasil, quando of'enderem a soberania nacional, a ordempública e os bons costumes", c1ue, segundo a classificação aqui expos-ta, deve ser interpretado da seguinte forma:

Primeiro: as leis estrangeiras, se ofenderem a nossa ordem públi-ca, não terão eficácia no Brasil, significando que não serão aplicadas noBrasil. Segundo: os atos, declaraç:ões de vontade e sentenças originá-rios do erterior, que representarn situações já consumadas, tambémnão terão eficácia no Brasil se ofenderem nossa ordem pública, mas aíem grau mais grave c1o qrre na hipótese da aplicação direta da lei-

Resumo do Direito Internacional Privado Justaposto ao DireitoInterno

Temos, assim, os três níveis de ordem pública quando justapostoo díreito internacional pr"ivado ao direito interno: a proteção contrâ a

vontade contratuai das partes, a proteção contra a aplicação de deter-minadas normas de direito estrangeiro e a proteção contra certassituações adquiridas no exterior, inclusive sentenças estrangeiras, emque o raio de alcance da ordem pública decresce do primeiro pâra o

segundo nível e do segundo para o terceiro.

Vizinhança com o Direito Intcrnacion¿lLato Sensu

Já quando vista em sua justaposição com o direito internacíonalem sentido lato, elaborâmos a distinção dos níveis da ordem públicapor outra perspectivâ, em que o prìmeiro nível permanece em defesada ordem interna, impedindo avençlas contrárias â determinados prin-cípios éticos, jr.rrídicos e econômicos dos quais o sistema não abremào, seguinc{o-se a ordem pública no plano do direito internacionalprivado, na defesa do sistema local tanto contra leis como contra sen-tenças estrangeiras [aí incluídos atos e declarações de vontadeJ con-trárias aos valores nacionais irrenunciáveis, em que se mantém a gra-ciação diversificada do raio de alcance da ordem pública para as leisestrangçeiras e para as situações jurídicas consolidadas no estrangeifo,como as sentenças profericias alhures, mas se engloba as duasmanìfestações em urrr só nível.

Examinemos a ordem pública d.e terceiro grau, que atua no direitointernacional em seu senticlo mais arnpro, em que o princípio te,'ì ca-ráte¡ totalmente diverso, de natureza positiva e não negativa: é a or-dem pública muncrial, ou "verdadeirariente internacionar,,, que esta-belece e defencle princípios universais nos vários setores do direito in-ternacional e das relações internacionais, servindo os mais altos inte_resses da comunidade mundial, as aspirações da humanidade. Trata-sede urna ordem de valores situada acima dos sisremaslrrãì.* ,"a.r_nos' quer eventualmente, poderá colidir com interesses circunstan-ciais das nações individualmente consideradas6.'lustifica-se esta bifurcação da orcrem púbrica no plano do direitointernacional porque quando se analisa o direito ina..r.,u.i*l priva-do, distinguindo-o clo direito interno, está se processsa'do uma criva-gem dentro da ordem jurídica i.,ter.ru, na medida em que o sistemaque rege a solução do conflito das ieis é, basicamente, de direito inter-no. Assim, no plano,do direjto de c¿da jurisdição, "; o"rr;.;;v¿ do-méstica, por assim dizer, cabe ser detalhistu

"-d.rtu.". ,rÅ g.u-., p".,aplicar a lei estrangeira e outro grau relativo ao cumprimento da sen_tença estrangeira e quarquer outra manifestação de àireito adluirrdono,exterior' Mas, quando se coroca o direito internacional p.r,rädo aolado do direito internacional em sua dimensão mais ampla, em suaperspectiva realmente internacional, as distinções do recurso à ordempúbiica no plano interno perdem um pouco de sua importância, nãomais relevante o cuidado em crassificar o f,rncio""*.;;-;;.Jà,rr,_,i,de exceção para efeitos irrternacionais em apricaçao direta "loiì.rrr"indireta da lei estrangeira, sendo perfeitamente natural que as duasmanifestações da ordem pública ,ro ."-po do direito internacionalprivado ocupem um só grau na escala de aplicaçao do princípio- È,rr¿ourna qustão de relatividade.

Em outras palavras, quando se deixa de lado a ordem pública denatureza.negativa, que visa a proteger a ordem interna, para cuidar daoutra ordem pública, que objeriva-disciplinar u, ,"1"çáå, ;,rriJi.", ,roplano internacional, impondo obrigaçoeifosirivas aos membros sobe_ranos da comunidade internaciona'Í, a drsiinçao entre rei estrangeira esentença estrangeira passa para segundo plano, sendo suficlenie clis_

0 vide Rolin, ",¿rs um ordre pubric réeLement internatíonar,, in ,,Honunaged'une Cénération de JurisLes au président nor¿),iont,,,p. aal [l9g0J.

a1Á

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I ".t

tinguir c, papel da ordem pública no campo contratual estritamentei,r¡Ëtno du o.d.',-t pública ,to platto da aplicação da lei e das sentenças

estrangeiras-

As Várias Manifestaçóes da Ordem Pública VerdadeirarnenteInternacional

A ordem pública mundial, ou verdadeiramente internacional' ao

invés de negativâ, no sentidO de invalidar ciáusulas contratuais' impe-

clir aplicação de leis designadas, recusar reconhecimento a sentenças

estrangeiras, tem uma conotação positiva, um mandamento que visa a

p.oa*g".. valores que transcendem a jurisdição de um Estado' paraze-

î"l: p.iu defesa de interesses que afetam outros povos' e às vezes o con-

,"rio du, nações. Esta orc{em pública é positiva porque pede às autori-

dades estat¿is que algo seja feito, visanclo a esses interesses maiores'

E[¿ se manifesta de várias fonnas em diversos setores do direito.

AJ A Orciem Pública Protetora de Outra Jurisdição

A ordem pública em seu sentido mundial, como expressão de um

novo conceito de ci¡'lliciade internacionai, poderá proteger os interes-

ses de outros Estados, mesmo quando os mesmos não estejam previs-

tos nas suas legislaçóes internas'Um caso clássico de extensão do âmbito da ordem pública com a

finalidade c1e tutelar interesses de outros Estados' que não cuidaram

dos mesmos ern sua legislação, foi a decisão da Suprema Corte de

Iou,a, em I BB7, que estãndeu a proibição de fabricação de bebidas a1-

coólicas pu.u u.då, sua exportação a outro Estado, onde inexistia proi-

biçao de consumo de álcool, ,Ju"do, desta fbrma, pelo bem-estar da

populaçao de um estado que não se preocuparâ com este problema'' '

Declrao fundada ,," *.r*" f¡losåfla foi prolatada pelo Tribunal de

Lyon, na França, oncle um fabricante desatendera normas de seguran-

ça de equipamentos destinados à exportação'" e*ùu, estas decisões foram criticadas pelo internacionalista fran-

cês Antoìne Piilet, que advogou a tese de que normas internas não de-

veriam ser aplicadas à exportação, pois tal poderia resultar em uma

interferência abusiva ,tu o,d"'''tp¡biica estrangeira' No caso da deci-

são da Corte de lo\t'a, Pillet achava que ela pretendia impor o padrão

de moralidade de seu estado a outro estado. "Quererá o estado de

Iowa ensinar os outros estados americanos como se comportar?", in-dagava o mestre francês. "Não seria isto um atentado à soberania d"osoutros estados?"7

Essa é uma concepção estritamente técnica sobre a ordem públi_ca, que não deve ser aceita anre o arual sentido de solidari"duJ";;t",nacional, em que cumpre atentar para a seguranca, a saúde pública edemais formas" de pr-oteção das popuraçoei de *iruu uo¡..ã"iur, "oespírito da ordem pública verdadeiramente internacional ou ordempública universals.

BJ Respeito pela Ordem pública de Outra Jurisdição

outra manifestação da ordem púbrica verdadeiramente interna-cional é aquela que toma em considàração a ordem pr:rti." r"i.rrru a.outro estado, respeitando suâs normas aog".rt"r.Em outro trabalho relatamos decisoes"de tribunais de vários países

- Câmara dos Lordes, um tribunal alemão, a Suprema Corte äe Is_rael, a Suprema Corte,holandesa, um trlbunál fro''ic, _ q,r" .oi.iau_ram a ordem pública de outra soberaniag.

C) Respeito pelos Atos Soberanos de Outro Estado

Act of State - Llnderhill u. Hernandezt,, em r897 e Banco Na-

7 , Antoine Pillet, "De L'ordre publíc en Droit Internatíonr¡l priué,,, Mélanges,vol. I, p. 475.I E"] verdade, o debate entre a posição adotada peros tribunais de iowa e d.eLyon de um lado e de Anroine piriet de ourro racro, .ontir.,'r, ,it-no;., .å*o ,"verifica no choque de decreros assinacios pelo presídente Jimmf ð"'riiiì* r sde janeiro de I981, e pelo Presidente Ron;ld Reagan, 32 dias *"i, ,".d.. Âq.rere,no final de sua presidência, assinou decreto no "senticro

de que, "- oao.rarrdoexportåções americanas de produtos proibidos pera legislaçâo deste país, masnão vcdados^pela legislação do_ país i..rportrdo., seriã obiigaçao ao gàu".',oamericano informar ao governo do país importador sobre os ¡.1oì d, meicadoriaexportada. Assumindo a presidência u*"ii.^.ru, Ronad Reagan ."uogor, , *edr-da, vìsando, tudo leva å crer, o desenvorvimenio do poder ä" .orr.J..o*iu ¿",exportações norte-americ¿nas.São duas visões diversas de como se olha para o mundo, para a humanidade, quarsas prioridades que devem nortea¡ a_vidados po,ror.nt." si. vicre Dolingår, op.cit., Þ" 426, nota 85, para maiores detalhes rob." o, clois clecretos presiãe¡ciaisamericanos.s vide tema ante¡ior: "orclem púbrica Mundial: ordem pública verdadeir¿_inente lnternacional no Direito Internacional privaclo,,.ro 168 US 2s0 (1897).

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cional de cuba u. sabatinotì, em 1964, são os clássicos precedentes

cla Suprema Corte norte-americana que sustentam a teoria de que o

Jucliciário não examina a validade dos atos de outra soberania' mesmo

.1*".1" se it'atâ de confisco oconido em seu próprio território e que

se reciame que o ato .o""n""t uma vioiação ão direito internacional

.or**.tro. Segurrdo os mais autorizados autores daqueles país' não

há lLigar para qualquer orciem pública ciue conflite com a política do

uma jurisdição de caráter universal para julgar aqueles que considera-mos åos¿is humani generis - inimigos do gênero humano. As terríveisatrocidades cometidas durante a segunda Guerra Mundial e os julga-mentos que se seguiram no Tribunal de Nuremberg e no Tribunal deTóquio - que estabeleceram a responsabilidade perante a comunida-de internacional dos organizadores e perpetradores do crime de geno-cídio, de crimes contra a humanidade e crimes de agressão e de guerra

- começaram a conscientizar o mundo da necessidac{e de disciplinaresta matéria e regulamentar uma jurisdição universal. os tribunaiscriados pela ONU para julgar os crimes cometidos na ex-Iugoslávia ena Rwanda, e, måis tarde, a criação do Tribunal Penal Internacional,com a aprovação do Estatuto de Roma, demonstram a evolução daidéiâ da ordem pública internacional neste aspecto fundamental davida da comunidade internacional.

O desenvoh'imento do direito internacional penal encerra apura-do interesse peios direitos humanos no plano internacional e, como jáescrevia Wolfþang Friedman, em 1966, a Declaração dos Dìreitos Hu-manos corporifica o que podem ser corretamente considerados os"padroes geralmente aceitos pela ordem pública internacional"ì3.

EJ Direito Econômico Internacional

Há vários aspectos da ativiclade econômica internacional que sãodiscretamente orientâdos pelos interesses internacionais, que vãoalém dos interesses da economia individual dos países, seguindo umacoordenada de proteção da ordem econômica internacional, com di-versificadas manifestações, como:

i) Lex Mercatoria - Há interesses econômicos internacionais, docomércio internacional que estimulam a criação e o desenvolvimentoda lex merc&toria, uma lei uniforme não escrita - além das conven-çóes - que influencia a f'eitura e o cumprimento de contratos e â so-lução de litígios, principalmente por meio da arbitragem.

ii) Direito monetário internacional - A antiga oposição fechadados tribunais ao atendimento das normas monetário-cambiais de ou-tro país fbram derrubadas pelo acordo do FMI, que determina em seu

ts "The Changing Structure of International Lata" , 1966, pp. 240-241 . Vide B.Goldman, op. cit-, p.464, que também se refere à orclem pública internacionalno que concerne à proteção dos direitos humanos.

acr of srateiz -

Ì'JocasoSabatinoaSupremaCorteamericanaasslmsetou:

manifes-

O PoCer iudiciário não examinará a validade da tomada de uma pro-

priedacie em seu próprio rerritório Yor un] C1llt:1".:::::î::' O"'i"¡, t"."ttl.cido neste país à época do processo' na ausêncra de um

t1âtado ou outro acordo relativò ao controle dos princípios jurídicos'

mes¡llo ,. ,. .".lur]-rì l -," o uao viola o direito internacional costumei-

Em seguida a Corte disse algo da maior relavância sobre a ordem

pública internacional:

Pcr mais ofensivo à ordem pública deste país que uma expropriaçáo

deste tipo possa ser, concluímos.que tanto o interesse nacional como

;;;;gÅJ do o¡'i"'iuo de es¡abãlecjmento da n'tle of Iøw entre as

nações são mais bem sen'idos pela manutenção intacta da doutrina do

ori of ,tot, neste campo de sua aplicaçáo'

A pieocupação de qte a rule of .ta-w entre as nações fique acima da

ordem pública d" .uJu pui' ¿ ttm" lídima manifestação da prevalência

da o.dem pública verdadeiramente internacional

D) Direito internacional Penal

Oscrimesquecausamdanovitalaosinteressesinternacíonais,pondo ern perigo a segurança da comunidade internacional' afetam a

ordem pública internJcionai " to*o tal pedem uma regulamentação e

rt 376 IS 398 (19641.tzL.Henkin,R.C.Pugh,OSchacthereH"Smit'"InterncttionalLaw"'i993'p'rol

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artigo 8Ù, Seção 2 (bJ, que os contrâtos que sejam contrários aos regu-lamentos cambìais de um país-membro do Fundo não deverão ser res-peitados pelos tribunais de qualquer outro país-membro, não se dan-do execução a tais contratos.

A ordem pública internacional quer que as moedas nacionais se-jam protegidas, ela zela pela estabiliclade financeira de cada um dosL"*b.or ãa comunidade internacional, para eyitar que o desastre deum ou alguns, leve a um debacie econômico mundiai de grandesproporções, Como quase ocorreu por mais.de um vez nos últimos anos.Alex monet¿¿e pâssou a ser uma conexão de considerável importância.

¡¡i) Ditetøjasø!- O princípio de que nenhum país quer se

trur.ri6i*ur em fìscal dos interesses tributários de outro ainda impera,mas já se registraram sinais de que isto poderá modificar-se em breve.

Penso que se os estados - quando réus - podem renunciar à sua

imuniclade mesmo em matéria ius irnperiurr, também deveriam seraceitos como autores em matéria cle seus interesses soberanos. A pres-tação jurisdicional de outro estado se enquadra bem na cooperação ju-diiiallr',te.ttacional, cada vez mais desenvolvida e utillzada'

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OECD)aprovou o Conuè"çáo de Estrasburgo, de 1988, que estabeleceu assis-

tància aclministrativa em questóes fiscais, estabelecendo que cada uir-t

dos estados atenderá a peáido de outro estado para a cobrança de im-postos.

FJ Direito ambiental internacir¡nal

A cooperação internacional em rnatéria de proteção do meio am-biente é uma iealidade no mundo moderno, em que os países se dãoconta de que, acima de seus interesses, de sua ordem públic¿ no setorambiental, há que ser respeitada a ordem pública ambiental no planointernacional. Como diz a Declaração de Nairobi de l9BZ,

todos os povos do munclo devem atender à sua responsabilidade his-tórica, coletiva e individualmente, parâ garantir que nosso pequenoplaneia seja transmitido às gerações fituras em condiçóes que garan-i¿m r.rtrr" vida em dignidade para todos-

I ' Em cadajurisdição a ordem pública local rejeita a aplicação de di-reito estrangeiro que ofendè os valores básicos do foro (prnrcípio do dr-reito internacional privado em sua r,"izinhança coln o diÀito interno].. 2- cadajurisdição estende as regras i.,ter.ras que refletem slla or-

dem_pública para proteger outros países, mesmo quando estes nâo es-tabeleceram para si mesmos a mesma proteção (A).- 3. cada jurisdição deve tomar em conside.uçâo . respeitar a or-

dem pública estrangeira sempre que ela não se contraponha à sua pró-pria ordem pública, bem como respeitar atos sobe.anos de outros Es-tados (B e Cj.

4. cadajurisdição tratarâ como preeminente os princípios que de-rivam da ordem pública realmente internacional, q.r" proiegem os i.r-teresses comuns cla humanidade, mesmo quando isso reve a áesrespei-tar a ordem pública local (D, E e F).

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Resumo Geral da Evolução da Ordem Pública no PlanoInternacional

Ä evolução do princípio da ordem pública no plano ínternacionalseguiu as seguintes et.aPas:

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