IX SIMPOSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO -...
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IX SIMPOSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
III COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS
E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
POLÍTICAS E PROCESSOS DE FORMAÇÃO DOCENTE NO
TERRITÓRIO IBERO-AMERICANO:
CONSTRUINDO UM FUTURO COMUM
ANAIS
UNIVERSIDADE REGIONAL INTEGRADA DO ALTO
URUGUAI E DAS MISSÕES
Reitor
Luiz Mario Silveira Spinelli Pró-Reitora de Ensino
Rosane Vontobel Rodrigues
Pró-Reitor de Pesquisa, Extensão
e Pós-Graduação
Giovani Palma Bastos Pró-Reitor de Administração
Nestor Henrique De Cesaro
Campus de Frederico Westphalen
Diretor Geral
Silvia Regina Canan Diretora Acadêmica
Elisabete Cerutti
Diretor Administrativo
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Campus de Erechim
Diretor Geral
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Jorge Padilha Santos
Campus de São Luiz Gonzaga
Diretora Geral
Sonia Regina Bressan Vieira
Campus de Cerro Largo
Diretor Geral
Edson Bolzan
IX SIMPOSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
III COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS
EDUCACIONAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
POLÍTICAS E PROCESSOS DE FORMAÇÃO DOCENTE NO
TERRITÓRIO IBERO-AMERICANO: CONSTRUINDO UM
FUTURO COMUM
28 a 30 de setembro de 2016
ORGANIZAÇÃO DO EVENTO
PPGEDU – Programa de Pos-Graduação em Educação -
Mestrado em Educação
COMISSÕES DE ORGANIZAÇÃO
1.Comissão Científica Coordenação: GTs- Grupo de trabalhos
2.Comissão dos ANAIS
Coordenação: Luci Mary Duso Pacheco e Ana Paula Noro
Grabowski
3. Coordenação GTs
Coordenação: Elisabete Andrade
4. Coordenação Pôsteres
Coordenação: Juliane Claudia Piovesan
5. Comissão de Comunicação e Marketing
Coordenação: Gherusa Cassol Pinto e Lais da Rocha
Giovenardi
6. Comissão de Finanças e Captação de Recursos
Coordenação: Edite Maria Sudbrack
7. Comissão de Informática Coordenação: Juliano Alba e Thiago Roberto Sarturi
8. Comissão de Recepção
Coordenação: Anilce Angela Arboit, Janaine Gazzola, Daniela
Veroneze, e Vanessa Eloy
9. Comissão de Hospedagem, transporte e alimentação dos
palestrantes
Coordenação: Marcia Dalla Nora
10.Comissão de Brindes: Coordenação: Edite Maria Sudbrack
11. Comissão de coffe break Coordenação: Fatima Aquino
12. Comissão de Infraestrutura Coordenação: Charleston Braz Teston
13. Comissão de Certificação
Coordenação: Franciele Magalski Bisello
14. Comissão de Decoração Coordenação: Rosangela Ferigollo Binotto
15. Comissão Momento Cultural Coordenação: Vildes Mulinari Gregolon e Claudia Felin Cerutti
16. Pronto Atendimento
Coordenação: Odilara Centenaro
17. Lançamento de Livros Coordenação: Claudia Battestin
18. Exposições e Feira /Mostra Regional
Coordenação: Rosane de Fatima Ferrari e Claudia Battestin
UNIVERSIDADE REGIONAL INTEGRADA DO ALTO URUGUAI E DAS MISSÕES
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, EXTENSÃO E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE POS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - MESTRADO EM EDUCAÇÃO
CÂMPUS DE FREDERICO WESTPHALEN
IX SIMPOSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
III COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS
E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
POLÍTICAS E PROCESSOS DE FORMAÇÃO DOCENTE NO
TERRITÓRIO IBERO-AMERICANO:
CONSTRUINDO UM FUTURO COMUM
ANAIS
Organização
Luci Mary Duso Pacheco
Ana Paula Noro Grabowski
Frederico Westphalen, RS
2016
Este trabalho foi licenciado com a Licença Creative Commons Atribuição 3.0 Não
Adaptada. Para ver uma cópia desta licença, visite
http://creativecommons.org/licenses/by/3.0/
Organização: Luci Mary Duso Pacheco, Ana Paula Noro Grabowski
Revisão metodológica e diagramação: Luci Mary Duso Pacheco, Ana Paula Noro Grabowski
Capa/Arte: Lais da Rocha Giovenardi
Revisão Linguística: Responsabilidade dos (as) autores (as).
O conteúdo de cada resumo bem como sua redação formal são de responsabilidade exclusiva dos
(as) autores (as).
Permitida a reprodução, desde que citada a fonte.
Catalogação na Fonte elaborada pela
Biblioteca Central URI/FW
S621a Simpósio Nacional de Educação (9.: 2016 : Frederico Westphalen, RS)
Anais [do] IX Simpósio Nacional de Educação : III Colóquio Internacional
de Políticas Educacionais e Formação de Professores : políticas e processos de
formação docente no território ibero-americano : construindo um futuro
comum [recurso eletrônico] / Organização: Luci Mary Duso Pacheco, Ana
Paula Noro Grabowski – – Frederico Westphalen : URI – Frederico Westph,
2016.
4120 p.
ISBN 978-85-7796-186-3 (versão Compact disk)
ISBN 978-85-7796-187-0 (versão on-line)
1. Educação. 2. Formação de professores. I. Pacheco, Luci Mary Duso. II.
Grabowski, Ana Paula Noro. III. Título. 1. CDU 371.13
Bibliotecária Gabriela de Oliveira Vieira
URI - Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões
Prédio 9
Câmpus de Frederico Westphalen
Rua Assis Brasil, 709 - CEP 98400-000
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Impresso no Brasil
Printed in Brazil
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UNIFORMIZAÇÃO CURRICULAR, TESTES ESTANDARDIZADOS E
RESPONSABILIZAÇÃO DE PROFESSORES E GESTORES: OS EFEITOS DAS
AVALIAÇÕES EXTERNAS
Micheli Bordoli Amestoy1
Luiz Caldeira Brant de Tolentino-Neto2
GT3: Avaliação em Larga Escala e a Indução de Políticas Educacionais
Resumo: O objetivo do presente artigo é refletir sobre como os testes e as avaliações externas
influenciam as políticas educacionais, o currículo escolar e como, a partir de seus resultados
podem gerar responsabilizações ou bonificações para alunos, escolas e gestores. Buscou-se
debater como conceitos tão antagônicos como a meritocracia e a gestão democrática podem
estar presentes no mesmo documento - PNE - e serem metas para a próxima década da
educação básica brasileira. Na perspectiva de uma gestão educacional, prioritariamente,
(gerencialista e reguladora) a política de accountability transfere à administração da educação
uma lógica voltada ao mercado, ressignificando o conceito de educação não como um bem e
um direito de todos, mas como um produto, uma mercadoria que pode ser mensurável,
qualificável e comparável.
Palavras-chave: Políticas educacionais. Accountability. Avaliação externa. Educação Básica.
Introdução
As mudanças relacionadas ao papel da escola e a concepção de conhecimento escolar
remodelam o modo de conceber a profissão docente e a formação de professores para a
Educação Básica. Diante da expectativa lançada à escola atual, o professor assume a
importante atividade de mediar a aprendizagem dos alunos considerando diferentes realidades
e universos culturais.
O novo Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 13.005/2014 tem como foco
planejar e orientar a execução de melhorias no âmbito das políticas públicas educacionais e,
para isso, traça diretrizes e metas para a educação brasileira para a próxima década (2014-
1Doutoranda em Educação em Ciências. Universidade Federal de Santa Maria. Grupo de pesquisa
Interinstitucional Desempenho Escolar e Inclusão Acadêmica - IDEIA/ UFSM. Bolsista da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). E-mail: [email protected]. 2 Doutor em Educação. Universidade Federal de Santa Maria. Grupo de pesquisa Interinstitucional Desempenho
Escolar e Inclusão Acadêmica - IDEIA/ UFSM. E-mail: [email protected].
270
2024). Entre suas metas, destaca-se a meta 7, a qual se relaciona com o fomento da qualidade
da Educação Básica e com a melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem, determinando
médias nacionais para serem atingidas pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica -
IDEB até 2021.
A escolha por políticas educacionais com perfil ‘gerencialista’ fica clara no
documento do novo PNE ao estimular metas e estratégias (termos corriqueiros no meio
empresarial, competitivo) para a próxima década. A implantação da gestão por resultados em
um sistema educacional, em especial o do Brasil, aparenta ter menos relações e preocupações
com questões propriamente educativas e muito mais com questões financeiras e
mercadológicas em busca de uma nova governabilidade para a educação pública.
Publicar e divulgar resultados de avaliações externas a partir de testes padronizados,
desconsiderando as condições em que foram elaborados e aplicados, conduz a interpretações,
por vezes, equivocadas sobre os fatores que interferem ou não na relação de ensino-
aprendizagem.
O gerencialismo difunde-se no campo educacional disseminando princípios orientados
pela eficiência financeira (SHIROMA; EVANGELISTA, 2011). Nessa visão gerencialista de
educação, o desempenho dos alunos nos testes é articulado à avaliação dos docentes e à
avaliação da instituição a qual o aluno pertence, concluindo-se dessa articulação que se o
aluno não foi bem nas avalições externas, ou seja, se ele não ‘aprende’ a responsabilidade é
exclusiva do professor e da escola a qual ele faz parte. Nessa relação de ‘culpados’, o Estado e
suas políticas não são em nenhum momento considerados no veredito final.
Porém essa realidade não é apenas brasileira. Em Portugal, segundo Afonso (2009), é
muito semelhante, e fica evidenciado na afirmação do autor sobre a educação portuguesa:
“vivemos num país onde o Estado avalia as escolas, os professores e os alunos, mas onde nem
o Estado nem as políticas públicas são suficientemente avaliados”.
Em um pensamento mais crítico sobre a atual realidade da educação no Brasil,
Shiroma e Evangelista (2011) afirmam que “a busca frenética pela eficácia a qualquer custo
faz do resultado não um fim – como é anunciado –, mas um meio para realizar a estratégia
atualizada dos Bancos para a gestão da educação e o controle dos professores”. As autoras ao
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citar as estratégias dos bancos, referem-se às concepções e intervenções em políticas públicas
realizadas pelo Banco Interamericano do Desenvolvimento e o Banco Mundial em projetos
educacionais brasileiros. Recentemente o Banco Mundial (2010) publicou as bases
conceituais de sua nova estratégia para o setor educacional, de 2010 a 2020. A organização
destaca que “uma cultura de monitoramento e avaliação de resultados deve permear o trabalho
no setor” (BANCO MUNDIAL, 2010, p. 9).
Nesse sentido, surgem cada vez mais avaliações para alunos, professores, instituições
escolares, gestão de professores. Será que é por meio de testes padronizados, cada vez mais
frequentes nas escolas, que conseguiremos melhorar a educação básica? Testar, medir, punir,
ranquear, bonificar, será que estamos mesmo falando de educação? Ou melhor, será que
estamos todos falando de uma mesma concepção de educação?
A accountability no cenário educacional
O termo accountability, de origem inglesa, está presente na literatura mundial há quase
um século. Estudos sobre este tema estão presentes em diversas áreas do conhecimento, como
ciências contábeis, direito, sociologia, publicidade, educação, saúde e principalmente em
pesquisas de administração pública e ciência política.
Embora seja um termo muito usado em diversas áreas, na educação é um termo
recente, e sua tradução mais frequente tem sido responsabilização ou prestação de contas.
Devido à multidimensionalidade do conceito de accountability, Afonso (2009) sugere não
traduzir o termo, pois assim reforça a ideia de que deve significar algo mais do que prestação
de contas. No cenário educacional, o termo accountability está presente na literatura norte-
americana desde a década 1970 (AFONSO, 2012).
No Brasil, o processo de internacionalização das reformas educacionais passa a
introduzir medidas de impacto no campo educacional nos anos de 1990 (FREITAS, 2012;
BROOKE, 2006), desde então a política de accountability vem sendo discutida a partir de
uma variedade de abordagens e perspectivas nem sempre convergentes, e comumente
associadas a um discurso pouco democrático e orientadas por reformas na administração
pública (SCHNEIDER; NARDI, 2014).
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Deste modo, as avaliações em larga escala no Brasil - resultado das reformas
educacionais - estão atualmente atreladas a uma política de accountability, uma vez que,
propiciam a obtenção e divulgação de resultados comparando diferentes contextos e
realidades, sejam elas nacionais ou internacionais, a fim de quantificar (medir) o desempenho
dos alunos e por fim, ‘qualificar’, por meio de notas, o ensino básico.
As avaliações externas constituem-se em políticas públicas que estão em processo de
desenvolvimento desde os anos 1990 com o SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Básica) e o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), e com a posterior criação
de outras avaliações para aplicação em âmbito nacional, como o caso da Prova Brasil,
Provinha Brasil e a Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA).
O IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) foi criado pelo INEP
(Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) em 2007 e representa a iniciativa
pioneira de reunir em um só indicador dois conceitos igualmente importantes para a qualidade
da educação: fluxo escolar e médias de desempenho nas avaliações.
Além destas avaliações e índices nacionais, existem inúmeras outras em âmbito
estadual e municipal que seguem a mesma lógica das correspondentes nacionais. Nos últimos
anos, os discursos sobre ‘testes educacionais padronizados’ crescem e tornam-se cada vez
mais fortalecidos e enraizados, uma vez que se somaram a seus objetivos o controle e a
qualidade do ensino básico nas escolas públicas brasileiras.
Catani, Oliveira e Dourado (2002) salientam que, se por um lado a avaliação
educacional serve como controle da educação para o Estado elaborar políticas públicas, por
outro lado serve também “como mecanismo de introdução da lógica do mercado, visando a
maior competição e desempenho, além de reforçar valores como individualismo e
meritocracia”.
Neste sentido, o que estamos presenciando é uma distorção entre conceitos, em que a
concepção de qualidade está intrinsecamente relacionada às avaliações e recaindo sobre
alunos, escolas e professores, metas e resultados que devem ser alcançados em cada um dos
níveis educacionais.
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Freitas (2013) é favorável à cultura da avaliação, mas não é favorável à cultura da
auditoria que a accountability traz, uma auditoria pesada em cima da escola e dos professores.
Para o autor, implementar esta política no Brasil sem evidências de impactos positivos em
outros contextos que adotam esta política é antiético.
Atualmente, o Brasil encontra-se em um processo de transição de uma política de
responsabilização branda para uma política de caráter forte, ao passo que o PNE em vigor
(2014-2024) tem como estratégia para melhorar a qualidade da educação a meritocracia,
descrita em uma das estratégias da meta 7:
Estratégia 7.36: estabelecer políticas de estímulo às escolas que melhorarem o
desempenho no IDEB, de modo a valorizar o mérito do corpo docente, da direção e
da comunidade escolar (BRASIL, 2014).
Plano Nacional da Educação e a Base Nacional Curricular Comum: o futuro das
avaliações externas
Uma das estratégias estabelecidas pelo novo PNE é a formulação e implementação da
Base Nacional Curricular Comum (BNCC) para melhorar a educação básica, abrangendo a
educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, tanto de escolas públicas quanto
privadas do país.
Um dos objetivos específicos que se pretende atingir por meio da BNCC é assegurar
que todo estudante brasileiro, em todas as regiões do país, tenha garantido o acesso à
aprendizagem de conhecimentos fundamentais, promovendo equidade e maior coerência em
todo o sistema educacional.
A discussão sobre a necessidade de uma base nacional comum curricular no Brasil não
é recente. Segundo a linha do tempo elaborada pelo Ministério da Educação (MEC), a
discussão atual teria se iniciado com a Constituição de 1988, seguindo com a LDB (BRASIL,
1996), a elaboração de Parâmetros Curriculares Nacionais (MEC, 1998a) e culminando com a
promulgação das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica e do Plano
Nacional de Educação (PNE). (BRASIL, 2010). Além disso, a preocupação com ideias de
unificar ações nacionalmente, de modo que cada um dos estados do país caminhe de uma
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forma homogênea, ela é ainda mais antiga que a Constituição de 1988, essa lógica já nasce
desde a época do governo Getúlio Vargas.
Apesar da inexistência até o momento de um currículo nacional obrigatório, temos as
matrizes curriculares elaboradas para as avaliações externas constituindo e organizando uma
configuração curricular e ocupando, inadequadamente, o lugar do currículo. Como exemplo,
temos a Prova Brasil que apresenta apenas um ‘recorte’ do currículo elencado em sua matriz e
mesmo assim, assume o papel de prescrever o currículo nas escolas.
Fica clara uma inversão de papéis, uma vez que, o que deveria ocorrer é que a Prova
Brasil deveria auxiliar o Estado e a sociedade a averiguar se os estudantes obtiveram, de fato,
seus direitos de aprendizagem garantidos. E não uma prova de caráter externo a escola
determinar o que deve ou não ser ensinado em sala de aula, e o resultado dos alunos nessas
provas ser o diagnóstico para ‘medir’ e ‘avaliar’ tanto os estudantes, quanto os professores,
gestores e a própria instituição escolar.
Nesse sentido, Amestoy (2015) descreve que nessa inversão de papéis
[...] as avaliações vêm orientando os conteúdos a serem ensinados e protagonizam
uma situação de padronização do ensino. Ao padronizar o ensino acaba-se
descaracterizando o status de conhecimento e conferindo-lhe o estereótipo de
mercadoria, produto ou resultado a ser divulgado, a fim de receber bonificações e
reconhecimentos ao mérito, o que caracteriza, de fato, os pressupostos de uma
meritocracia” (AMESTOY, 2015, p. 58).
Desenha-se aqui, a emergência de um ‘Estado –avaliador’, ou seja, o Estado passa a
incorporar, “a lógica do mercado, através da importação para o domínio público de modelos
de gestão privada, com ênfase nos resultados e nos produtos dos sistemas educativos”
(AFONSO, 2009, p.49). Isso porque a implementação de mecanismos de um ‘quase-mercado’
educacional, concretiza a remodelação do papel do Estado na condução das políticas públicas
e o fortalecimento nas formas e estratégias de controle educacional.
Tendo em vista uma unificação curricular, os sistemas de avaliações nacionais irão
ganhar ou perder força? Com a proposta de um currículo comum nacional, se projeta um novo
futuro para a produção de materiais didáticos no país, onde os sistemas de apostilamento
exercerão, juntamente com os sistemas de ensino das grandes corporações, grandes pressões
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para a elaboração e distribuição de apostilas de acordo com a base nacional, além da
adequação das avaliações externas a nova proposta curricular.
Nesse sentido, Tolentino-Neto (2015) relata que “Algumas cidades abrem mão de receber os livros didáticos via PNLD para
comprar, com orçamento do município, sistemas apostilados de ensino. A
expectativa difundida pelas empresas é de que a rede escolar terá melhor resultados
nas avaliações externas o que, em algum momento, se traduzirá em benefícios
econômico-sociais” (TOLENTINO-NETO, 2015, p.202).
No entanto, os resultados na Prova Brasil das escolas que utilizam as apostilas não são
maiores do que aqueles de escolas que adotam os livros vindos do PNLD (NASCIMENTO,
2015). E, além disso, os sistemas de apostilados não passam por avaliações oficiais de
qualidade (física e de conteúdo), e ainda, competem por orçamentos municipais destinados à
educação como, por exemplo, recursos para merenda e transporte escolar.
Muito mais do que pensarmos se os sistemas de avaliação irão ganhar ou perder força
frente a um currículo nacional comum, é necessário também refletirmos sobre a importância e
a abrangência que está sendo dada as avaliações externas e como estas estão influenciando,
não só nos currículos escolares, mas também, na oferta de materiais didáticos.
Testes estandardizados e a ideologia gerencialista na Educação
O discurso da busca pela ‘qualidade educacional’ em um contexto de um Estado-
avaliador (Afonso, 2009), enaltece a presença e a execução de dois elementos enraizados
nesse discurso: os testes estandardizados e a lógica de um mercado regulador. A esse respeito
Correia (2010) destaca que:
A cultura da qualidade tende, com efeito, a confundir-se com a multiplicação de
instrumentos de avaliação de tal forma sofisticados que parece desempenhar um
papel mais importante na imposição de uma ordem cognitiva mais ou menos
homogeneizante do que na apreciação e regulação da ação organizacional (p.458).
Diante desse discurso, os testes ganham espaço dentro das instituições escolares, uma
vez que se encontram consolidados em um mercado e em um Estado regulador. O Estado se
torna avaliador porque é regulador, ao adotar um novo perfil, ao consentir políticas que
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possibilitem desvirtuar as prioridades educacionais, ao responsabilizar as escolas e os seus
profissionais pelos resultados nesses testes.
Uma visão gerencialista de educação torna-se cruel quando apenas os índices/
resultados são analisados, ignorando os múltiplos fatores que interferem no desempenho
nesses testes. Ao responsabilizar as escolas e os professores, o Estado ignora as
responsabilidades atribuídas a si próprio, como poder público em prover condições adequadas
de infraestruturas e de trabalho, como também a das famílias desses estudantes, que de acordo
com a Constituição Federal de 1988, Art. 205, compartilha com o Estado o dever da
educação. Nesse sentido, os docentes não são os únicos responsáveis pelo aprendizado dos
alunos, e nem todos os ensinamentos e valores que um professor compartilha com os seus
alunos pode ser apreendido e medido em um teste estandardizado.
Percebe-se uma tendência na educação brasileira, inspirada em culturas de avaliações
de outros países, em determinar “rankings” ou “standards” de aprendizagem e assim,
transfere-se a preocupação em fomentar o desenvolvimento intelectual do educando, para que
este se torne um cidadão minimamente esclarecido para fazer as suas escolhas enquanto no
exercício de sua cidadania, e volta-se para apenas a medição técnica do conhecimento,
esquece-se da humanização presente em muitos dos Projetos Pedagógicos das escolas e
prioriza-se apenas a resposta correta, o “x” no lugar certo.
Nesse sentido, Freitas (2011, p. 10) considera que:
Os testes têm seu lugar no mundo educacional como ferramenta de pesquisa. O
grave problema é que eles foram sequestrados pelo mercado e pelo mundo dos
negócios e nele, as suas naturais limitações são ignoradas. Como vimos
anteriormente, os testes associam à sua função de medir, o papel de controle
ideológico dos objetivos da educação – mais pelo que excluem do que pelo que
incluem – e tem o objetivo de controlar os atores envolvidos no processo educativo.
Sem testes, não há responsabilização e meritocracia – teses fundamentais do
mercado.
Na perspectiva de uma gestão educacional, caracterizada como gerencialista e
reguladora, os testes para medição de ‘aprendizado’, a ‘pedagogia dos resultados e das
competências’ (Saviani, 2007), transferem à administração da educação, uma lógica voltada
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ao mercado e com as regras de que para se atingir a ‘qualidade total’, a meritocracia ou a
avaliocracia (CORREIA, 2005; AFONSO, 2008) sejam o melhor caminho.
PNE e questões antagônicas: da gestão democrática à responsabilização
A gestão democrática da educação está prevista desde a Constituição Federal de 1988
que estabelece no artigo 206 os princípios sobre os quais o ensino deve ser ministrado. Dentre
eles, destaca-se a gestão democrática do ensino público, na forma da lei. A constituição
estabelece que cabe aos sistemas de ensino definirem as normas da gestão democrática do
ensino público na educação básica.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) - Lei 9394/96, no Art. 2, inciso
oitavo, estabelece dentre os princípios e fins da educação nacional a gestão democrática do
ensino público, e no Art. 14, define as normas de gestão democrática para os sistemas de
ensino da educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes
princípios:
I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;
II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
Nessa perspectiva, a gestão democrática pode ser entendida como meio pelo qual
todos os atores sociais que compõem o processo educativo participam da escolha e definição
dos rumos que a instituição escolar deve seguir, de maneira a concretizar as ações e decisões
construídas, pensadas e executadas de forma coletiva e participativa.
Em contrapartida, temos no PNE em vigor (2014-2024) a gestão democrática ancorada
em princípios de meritocracia e desempenho, como exposto na meta 19 ao:
“Assegurar condições, no prazo de 2 (dois) anos, para a efetivação da gestão
democrática da educação, associada a critérios técnicos de mérito e desempenho
e à consulta pública à comunidade escolar, no âmbito das escolas públicas, prevendo
recursos e apoio técnico da União para tanto” (BRASIL,2014).
Nesse sentido, o PNE apresenta uma visão antagônica aos princípios básicos da gestão
democrática: coletividade e participação. Uma vez que a meritocracia valoriza o rendimento
individual em detrimento da coletividade, em detrimento de uma carreira profissional
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permanente. É o incentivo ao “cada um por si” ou do “salve-se quem puder”. Trata-se
portanto, de políticas consentidas na centralização e no controle de resultados e que, no
cotidiano da escola se traduzem na tensão entre a racionalidade administrativa versus a
racionalidade pedagógica.
Diane Ratvitch - ex-secretária-adjunta de educação e conselheira do secretário de
educação no governo americano do ex-presidente George Bush, e indicada pelo ex-presidente
Bill Clinton para assumir o instituto responsável pelos testes federais americanos - foi a
principal defensora da reforma educacional americana baseada em metas, testes padronizados,
responsabilização do professor pelo desempenho do aluno e fechamento de escolas mal
avaliadas. Porém, Ravitch, mudou de ideia após 20 anos defendendo um modelo que serviu de
inspiração para outros países, entre eles o Brasil. Para Ravitch,
Os testes são necessários e úteis. Mas os testes devem ser suplementados pelo juízo
humano. Quando definimos o que importa na educação apenas pelo que nós
mensuramos, estamos em sérios problemas. Quando isso acontece, tendemos a
esquecer que as escolas são responsáveis por moldar caráter, desenvolver mentes sãs
em corpos saudáveis (mens sana in corpore sano) e formar cidadãos para nossa
democracia, não apenas ensinar habilidades básicas. Nós até mesmo esquecemos de
refletir sobre o que queremos dizer quando falamos em boa educação. Certamente
temos mais em mente do que meramente letramento e cálculo. E quando nós usamos
os resultados dos testes, com todas as suas limitações, como meios rotineiros de
demitir educadores, distribuir bônus e fechar escolas, então distorcemos o propósito
da escolarização de uma vez só (RAVITCH, 2011, p. 190).
O modelo empresarial parece não ser a forma apropriada de melhorar as escolas.
Porém é o modelo desenhado e arquitetado para a próxima década da educação brasileira.
Será que também levaremos 20 anos para descobrir que esse talvez não seja o melhor
caminho para a educação e que nele estaremos cada vez mais distantes de uma gestão
democrática e participativa nas nossas escolas? Ou podemos aprender com as experiências
vizinhas para estabelecer nossas novas rotas?
Considerações finais
Os testes padronizados como ferramentas de pesquisa são importantes no âmbito
educacional. Esses deveriam ter o papel de auxiliar o Estado e a sociedade a identificar se os
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estudantes obtiveram, de fato, seus direitos de aprendizagem garantidos. O problema não são
os testes, e sim, o que está sendo feito com os seus resultados.
Medir, divulgar, bonificar, punir são termos comuns no contexto econômico e
financeiro. A grande questão é a transposição desses termos para a educação, definindo as
responsabilidades de ‘sucesso’ e ‘fracasso’ como se a educação fosse uma mercadoria
mensurável, qualificável e comparável.
A educação não pode ser tratada como um produto, porque simplesmente não é. A
lógica de uma gestão educacional gerencialista está situada na contramão de uma gestão
democrática. Meritocracia e coletividade caminham para lados opostos.
O processo de avaliação é importante para mensurar e diagnosticar os problemas do
ensino. Porém, ao restringir o conceito de qualidade da educação a indicadores como o IDEB
– que tem limitações em seus resultados – o conceito de qualidade recai a uma
vulnerabilidade e fragilidade que dão subsídios a questionamentos e inquietações sobre o que
é de fato qualidade educacional, de que qualidade estamos falando e para quem estamos
falando.
Para conseguirmos melhorias nos níveis de ensino da educação básica é necessário
observar alguns conceitos como, por exemplo, as políticas pedagógicas das escolas, os rumos
do financiamento na educação, o currículo escolar, a formação (inicial e continuada) de
professores, o salário dos professores (valorização salarial), e fundamentalmente o exercício
de uma gestão democrática.
Porém, não é impossível concluirmos pensando e sonhando que seja possível e
desejável pelo poder público construir uma escola, hoje utópica, simultaneamente, com
qualidade científica, pedagógica e democrática.
COMMON CORE CURRICULUM, STANDARDIZED TESTS AND
ACCOUNTABILITY: THE EFFECTS OF EXTERNAL EVALUATION
Abstract: The purpose of this article is to reflect on how tests and external evaluations influence
educational policy and school curriculum. We debate about the antagonistic concepts of
meritocracy and democratic management, presented in the same document - PNE - and setted
as goals for the next decade of Brazilian basic education. From the perspective of educational
280
management, the accountability policy transfers the administration of education, setting a new meaning to the concept of education as a product, a commodity that can be measurable,
comparable and qualifying.
Keywords: Educational Policies. Accountability. External Evaluation. Basic Education.
Referências
AFONSO, A. J. Para uma crítica da avaliocracia. OPS! Revista de Opinião Socialista,
Lisboa, n. 2, p. 14-16, 2008.
_____________. Nem tudo o que conta em educação é mensurável ou comparável.
Crítica à accountability baseada em testes estandardizados e rankings escolares. Revista
Lusófona de Educação, 2009,13, 13-29.
_____________. Para uma concetualização alternativa de accountability em educação. Revisa
Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 119, June 2012.
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