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IX ENCONTRO DA ABCP Estado e políticas públicas Os governos social-democratas e suas políticas para avançar rumo ao socialismo: um conceito alternativo à interpretação centrada na moderação Guilherme Simões Reis (UNIRIO) Brasília, DF 04 a 07 de agosto de 2014

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IX ENCONTRO DA ABCP

Estado e políticas públicas

Os governos social-democratas e suas políticas para avançar rumo ao

socialismo: um conceito alternativo à interpretação centrada na

moderação

Guilherme Simões Reis (UNIRIO)

Brasília, DF 04 a 07 de agosto de 2014

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Os governos social-democratas e suas políticas para avançar rumo ao

socialismo: um conceito alternativo à interpretação centrada na

moderação

Guilherme Simões Reis (UNIRIO) Resumo do trabalho: A ciência política costuma interpretar a social-democracia como moderação, adesão ao capitalismo e diferenças apenas residuais em relação ao liberalismo de mercado. Este artigo desenvolve outra definição, baseada nas ideias de Kautsky e Bernstein, com dois elementos-chave: a importância central da democracia representativa parlamentar e o reconhecimento de que há limites para avançar na transformação social. O reformismo gradual que daí decorre é o meio de governos social-democratas avançarem no socialismo, via políticas desmercantilizadoras, atuando no limite das possibilidades e lutando para modificar tais limites. Desenvolvido o conceito, ele é aplicado aos governos de seis países: Bolívia, Brasil, Espanha, Noruega, Suécia e Uruguai. O estudo desses casos indica que a Bolívia é o país onde está, surpreendentemente, o governo mais social-democrático, enquanto que a Espanha é o exemplo de onde não se avançou no limite das possibilidades. O viés neoliberal da União Europeia, com restrição à autonomia dos Estados, surge como limite para o avanço socialista nos países do continente, enquanto que as inovações dos governos sul-americanos apontam para a sobrevivência da social-democracia. Palavras-chave: social-democracia; socialismo; governos; partidos; desmercantilização; hegemonia

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Em geral a social-democracia é tratada, tanto acadêmica como vulgarmente,

como uma traição ao socialismo, como um meio de viabilizar o capitalismo reduzindo a

combatividade dos trabalhadores organizados. Faria parte da própria definição de

social-democracia a moderação, o posicionamento como “centro-esquerda”, não

havendo consideráveis diferenças programáticas em relação ao liberalismo de mercado.

Na interpretação celebrizada por Przeworski (1989), mas não exclusivamente propagada

por ele, os partidos social-democratas eram socialistas originalmente, porém teriam

mudado tanto seu objetivo como sua estratégia. Tal fato seria observável pelo modo

como a social-democracia europeia ajudou a promover os interesses capitalistas, em

prejuízo dos próprios trabalhadores, que sofreram com o aumento do desemprego e com

a precarização do trabalho. Essa forma de entender a social-democracia em contraste

com o socialismo pode ser exemplificada, inclusive, em análises sobre a repetição desse

fenômeno europeu na América do Sul: Panizza (2005) chama a moderação e abandono

da intenção de superar o capitalismo de “social-democratização” e Samuels (2004),

usando o exemplo do Partido dos Trabalhadores, afirma que ele se deslocou do

“socialismo” à “social-democracia”.

Um problema central dessa abordagem centrada na moderação é que ela

obscurece as persistentes diferenças entre direita e esquerda ou limita o escopo em que

se percebe que a social-democracia pode atuar efetivamente. Por isso, aqui se propõe

uma abordagem distinta, pela qual social-democracia é uma política socialista,

partidária, e favorece os trabalhadores em geral – não somente o operariado fabril1 - e

excluídos, que formam sua core constituency, sua base eleitoral prioritária. Em contraste

com os partidos comunistas ou marxista-leninistas, os social-democratas (ou socialistas

democráticos) enfatizam a importância central da democracia representativa e

parlamentar. Como refutam a alternativa da revolução violenta2, reconhecem que há

limites para esse avanço, que impactam em sua velocidade. A social-democracia deve,

1 Uma abordagem da social-democracia que não a considere um conceito aplicável apenas a uma época específica precisa incluir na base eleitoral dos partidos social-democratas outros grupos de trabalhadores, tal como fizeram na segunda metade do século XX partidos europeus tidos como social-democratas e também como ocorre com agremiações sul-americanas de esquerda surgidas posteriormente. A ênfase nesse grupo específico de trabalhadores fez sentido no passado, mas hoje precisa ser expandida sob o risco de anacronismo. A transição de partido de classe para pluriclassista, para “partido do povo” configurou-se como um processo demorado na Europa, enquanto partidos social-democratas sul-americanos, por terem em sua maioria emergido em contexto de maior trabalho informal e considerável setor de serviços, já se constituíram como pluriclassistas, com apelo para variados setores não dominantes e em situação de risco. 2 Revolução, aqui, não tem o significado de transformação profunda da ordem, pois a premissa é a de que esta pode ocorrer pela via institucional.

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portanto, avançar no projeto socialista no limite das possibilidades. Tais limites não são

fixos, de modo que os social-democratas devem buscar alterá-los, possibilitando

posteriores transformações mais profundas e reduzindo o risco de estas regredirem.

Na próxima seção, este conceito “alternativo” de social-democracia será

discutido em contraposição à abordagem mais recorrente. Em seguida, seis casos de

partidos competitivos, europeus ou sul-americanos, potencialmente classificáveis como

social-democratas, serão abordados à luz do conceito aqui sustentado, com ênfase em

suas políticas no governo e decisões, recorrendo-se principalmente à literatura

secundária. Os seis casos pesquisados são o Partido Social-democrata Trabalhista (SAP)

sueco, o Partido Trabalhista Norueguês (DNA), o Movimento para o Socialismo (MAS)

boliviano, o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), o Partido dos Trabalhadores

(PT) brasileiro e a Frente Ampla (FA) uruguaia.

Por que a social-democracia não deve ser definida como moderação

Assim como é problemático definir “socialismo” como “o que fazem os

socialistas”, tal como sugeriram os trabalhistas britânicos Herbert Morrison e Harold

Wilson e o ex-premiê francês Lionel Jospin (Maravall, 2009), também é inadequado

definir como social-democracia o que realizaram os atores considerados como social-

democratas ou que se classificaram como tal, a despeito de uma tendência à moderação

ser claramente observável. Não era como “moderação”, “defesa do capitalismo” ou

“centro-esquerda” que a social-democracia era definida por teóricos como Karl Kautsky

ou Eduard Bernstein.

Por mais que as condições mudem, para que algo seja chamado de social-

democracia em diferentes lugares ou épocas é necessário que alguns elementos centrais

lhes sejam comuns. Como os limites mudam com o tempo e de caso para caso, e o

reconhecimento (e enfrentamento pela via institucional) das limitações é parte essencial

da social-democracia, o próprio conceito é aplicável a diferentes contextos, épocas e

lugares. Tanto Kautsky como Bernstein chamavam a atenção para as variações nos

limites existentes em cada país ou sociedade. Ademais, o fato de um partido surgir

como social-democrata não significa que não poderá deixar de sê-lo: uma organização

pode, por exemplo, nascer como marxista-leninista, tornar-se social-democrata e,

depois, converter-se em liberal.

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Um problema paralelo ao de se apresentar a moderação como característica da

social-democracia é a interpretação de que o radicalismo ainda é possível, mas não mais

na clivagem socioeconômica. De acordo com essa abordagem, a moderação e a

homogeneização na política econômica entre a direita e a esquerda seriam inevitáveis e

caberia à última adotar uma política radical nas únicas áreas em que ainda seria

possível: nas questões pós-materiais, identitárias, comunitárias, de valores (é o

argumento, por exemplo, de Kitschelt, 1994, e Giddens, 1996). Efetivamente, a antiga

interpretação por parte da esquerda de que tudo era econômico já não é mais desejável;

isso não significa que seja admissível para um social-democrata excluir da agenda as

questões distributivas. Alguns partidos estudados nesta pesquisa, em algum momento,

tenderam a abandonar a preocupação distributiva avançando em direitos pós-materiais:

trata-se de uma forma nada social-democrática de fugir da imagem de “traição da

esquerda” mas, ao mesmo tempo, não confrontar desafios mais difíceis de

transformação da sociedade.

A moderação constatável na social-democracia, portanto, não deveria ser

interpretada como desistência da transformação. Uma política moderada pode ser

produto tanto da intenção de se moderar como da impossibilidade de radicalizar. A

abordagem aqui defendida é consistente com as reflexões de teóricos da social-

democracia desde suas origens, na Segunda Internacional3. Não parte da visão

voluntarista ou ingênua de que todos os partidos chamados de social-democratas

realmente pretendem transformar a sociedade e agem conforme tal meta. Na realidade,

trata-se de abordagem muito mais exigente, pois, caso tais partidos não fizerem isso, ela

os desqualifica como passíveis de tal classificação.

Assim, o eventual abandono do objetivo de avançar, ainda que gradualmente,

rumo ao socialismo, tendo, ao invés, o sucesso eleitoral como fim último, significa que

o partido deixou de ser social-democrata. Isso não significa, é claro, que vitórias

eleitorais não sejam importantes. Por isso, foram selecionados para esta pesquisa seis

casos de partidos eleitoralmente competitivos. Todos eles, a despeito de suas evidentes

diferenças, seguiram uma trajetória similar à descrita por Przeworski (1989), de adesão

à democracia representativa, crescimento eleitoral e conquista do poder, situados na

esquerda do espectro político e, a princípio, representando prioritariamente os

3 Considera-se, aqui, que o socialismo da Primeira Internacional é prévio à social-democracia, configurando-se tanto ela como o marxismo-leninismo como duas variantes daquele mesmo socialismo de matriz marxiana.

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trabalhadores e segmentos desfavorecidos da sociedade. Aqui, apenas a premissa

adotada por Przeworski da troca de objetivo é descartada, para se poderem investigar os

avanços e enfrentamentos dos limites.

A distinção entre social-democracia e marxismo-leninismo, portanto, não seria a

de que um seria socialista e a outra não, mas sim o método escolhido: quando se

considera a democracia representativa eleitoral e parlamentar essencial para se alcançar

o socialismo, reconhece-se a existência de limitações para um avanço mais célere, visto

que suas próprias preferências não podem ser impostas à força. O avanço socialista,

para os social-democratas, só pode ocorrer por meio de reformas cumulativas; as

transformações são graduais.

Se geralmente se analisa a social-democracia definindo-a a partir de

características observadas em casos reais considerados como social-democráticos, a

proposta aqui sustentada faz o inverso: formula uma definição prévia de social-

democracia e a partir dela se avalia se os partidos e governos podem ser classificados

como social-democráticos ou, em caso de trajetória mais errática e inconsistente, se ao

menos algumas de suas políticas devem ser assim rotuladas.

É missão da social-democracia não apenas avançar o limite das possibilidades

como adotar medidas para deslocar a hegemonia, “puxar” o eleitorado mediano para a

esquerda. A conquista da opinião pública é central para a social-democracia, que dela

depende para a obtenção de vitórias eleitorais consistentes o suficiente para levar

adiante reformas profundas, que tenham caráter cumulativo e estejam menos sujeitas a

recuos futuros.

O socialismo, entendido como fim das relações de subordinação, pode ser

definido, no plano econômico, justamente como ponto final da desmercantilização,

como a extinção da redução dos indivíduos e das relações sociais à condição de

mercadoria. Como observa Milliband (1997, p. 13-14), “a história da reforma dentro do

capitalismo mostra que foi uma resposta muito parcial aos ‘problemas’ específicos, e

que foi limitada pela lógica do capital”, de modo que, “em uma perspectiva socialista, o

que se tenta por meio da reforma deve estar inscrito em um projeto de transformação

radical, e ser julgados ambos em termos das melhorias alcançadas e também em termos

de sua contribuição para o avanço do projeto”.

Há aqui duas premissas, que contrastam com a maior parte das abordagens: 1) o

conceito de social-democracia é aplicável a diferentes épocas e contextos, e não apenas

a uma época do tempo e lugar (como a Europa entre a Segunda Internacional e o pós-

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guerra)4; 2) a social-democracia deve ser tratada como uma forma de política socialista

que tem a democracia representativa, eleitoral e parlamentar não apenas como

instrumental, mas como fundamental.

A concepção de social-democracia aqui sustentada converge para o que

argumentavam autores como Karl Kautsky e Eduard Bernstein. Ainda que

freqüentemente posicionados em campos opostos dentro do Partido Social-democrata da

Alemanha (SPD), uma série de aproximações pode ser feita entre os dois, e tais

semelhanças constituem justamente o que aqui se sintetiza como a essência da social-

democracia.5 As diferenças entre o que defendiam os dois autores, por sua vez, também

interessam para o modelo teórico apresentado neste artigo: no interior dos partidos

social-democratas em geral há uma ala em busca de maior pragmatismo – o que se

identifica com o “socialismo evolucionário” de Bernstein – e outra que defende maior

purismo – aproximando-se da ortodoxia de Kautsky. A tensão entre os dois pólos, em

vez de ser um problema, é positiva por manter a social-democracia em equilíbrio, sem

se descaracterizar. Uma ampla vitória de um dos dois a afastaria do socialismo, seja por

de fato mudar seus objetivos, como sugere Przeworski, o que ocorreria no caso de

sucesso pragmático, seja por torná-lo um partido não competitivo, de gueto, o que

decorreria de hegemonia purista.

O purismo kautskiano derivava de sua visão da política dentro da lógica da luta

de classes. Alianças com partidos burgueses só seriam aceitáveis em casos excepcionais

e por períodos breves6, e parcerias do proletariado com camponeses e intelectuais

poderiam ocorrer mas sem que isso significasse qualquer alteração no programa do

partido social-democrata. Os proletários deveriam atuar na democracia como oposição,

até o momento em que, maduro e numeroso o suficiente, pudesse ser maioria no

parlamento e, então, levar adiante a “revolução social” (Salvadori, 1982; Waldenberg,

1982). A ideia de “revolução” para Kautsky, tal como na abordagem de Jaurès (1998),

4 Na mesma linha, Hobsbawn (2002, p. 416) considera que o PT é “um partido trabalhista e movimento socialista de massa clássico, como os que emergiram na Europa antes de 1914”. 5 Esping-Andersen (1985, p. 17) parece concordar com tal interpretação: “A teoria social-democrata moderna deriva da controvérsia entre o reformismo marxista, exemplificado por Kautsky, e o revisionismo de Bernstein.” 6 Conforme observa Salvadori (1982), Kautsky mudaria de opinião quanto aos governos de coalizão, defendidos por ele abertamente em seu A revolução proletária e seu programa, publicado em 1921, apenas três anos depois de A ditadura do proletariado. Entretanto, em quase todo o período de maior influência intelectual do autor, defendeu uma adesão pacífica à democracia representativa sem qualquer concessão política aos burgueses, encarando eleições e disputas parlamentares como arena preferencial da luta de classes. É esta linha de pensamento que representa, como tipo ideal, a ala “purista” de todos partidos social-democratas, conforme argumentado neste trabalho.

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está dissociada tanto de rapidez como de violência, significando, unicamente, que a

transformação é profunda (Przeworski, 1989; Manin, 1989).

Bernstein, por sua vez, era cético em relação a essa certeza de que o grande

momento chegaria, demonstrando, inclusive, que o operariado não seria a maioria da

população como imaginara Marx. Por isso, defendeu justamente a incorporação das

camadas médias como aliadas, o que faz sentido em sua concepção ética de socialismo,

não deduzida do materialismo histórico (Waldenberg, 1982; Fetscher, 1982; Salvadori,

1982; Kloppenberg, 1986; Przeworski, 1989). Bernstein (1997, p. 125) dá o importante

passo de explicitar que as instituições “liberais” não são contrárias ao socialismo, tendo

elas, em contraste com as instituições feudais, uma flexibilidade e capacidade de

transformação que possibilitariam sua adaptação em prol dos trabalhadores. O contínuo

aprofundamento do caráter democrático dessas instituições confundir-se-ia com o

próprio avanço socialista.

Se as diferenças entre Kautsky e Bernstein são importantes e se reproduzem no

interior dos partidos social-democratas até hoje, a essência da social-democracia, como

foi aqui afirmado, estaria no que suas visões de mundo tinham em comum. Ambos

defendiam a importância central da política parlamentar e do sufrágio universal. Já na

redação do Programa de Erfurt, Kautsky (1971) afirmava que, quando os trabalhadores

começam a fazer parte da política parlamentar, esta tem sua própria natureza alterada;

torna-se uma arena da luta de classes sem violência, em que não há desperdício de

tempo e energia de nenhuma das duas partes, pois ambas veem, como num termômetro,

seu grau de apoio e sua capacidade de avançar nas mudanças ou de freá-las. Em A

ditadura do proletariado, Kautsky (1979) defende, sem qualquer ambigüidade, a opção

pelos meios legais e pacíficos, a menos, é claro, que não se tenha uma democracia ou

que os adversários tentem derrubá-la. Aí, a violência seria necessária, mas justamente

para defender o regime democrático institucional, nunca o contrário (Kautsky, 1979;

Salvadori, 1982; Waldenberg, 1982).

Pode-se afirmar, em síntese, que ambos enfatizam a necessidade de aceitar e

participar da democracia representativa, inclusive admitindo a atuação dos partidos

burgueses; rejeitam o uso da violência (a não ser para se defender, justamente, de um

ataque autoritário e paraconstitucional das forças reacionárias); destacam a mudança do

caráter da democracia representativa a partir da emergência do partido social-

democrata; e reconhecem a existência de limites para uma rápida transformação

socialista.

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A perspectiva adotada neste trabalho de que há atores dentro dos partidos que

querem que estes deem uma guinada para cada um dos extremos – o do purismo e o do

pragmatismo –, e de que é essa tensão que mantém o partido aproximadamente em uma

posição mais central do continuum que forma o espectro da esquerda, podendo tender

um pouco para cada um dos lados, é representada graficamente a seguir.7 Os dois polos

– purista e pragmático – estão em permanente disputa dentro dos partidos e, se um deles

se enfraquecer demais, há o risco de o partido deixar de ser efetivamente social-

democrata (e se tornar meramente office-seeking, interessado em postos de poder como

fim último e não como meio de implementar determinadas políticas), ou de se isolar

como um partido de gueto, sem chances de vencer eleições e pouco ou nada capaz de

influenciar as políticas adotadas.8 A situação de equilíbrio social-democrático está

ilustrada no t0 do Gráfico 1, enquanto que o t1 representa a descaracterização mais

provável em partidos social-democratas competitivos: a da hegemonia pragmática com

esmagamento dos segmentos puristas.

t0 t1

Purismo Pragmatismo

Gráfico 1 – Distribuição de preferências e descaracterização da social-democracia

A definição da social-democracia como tensa síntese entre as alas “purista” e

“pragmática” é análoga à tensão entre a lógica da representação das bases eleitorais e a

lógica da competição eleitoral, presente na formulação de Kitschelt (1989) sobre a

7 O gráfico pressupõe uma distribuição bimodal de preferências dos membros do partido. Seria possível se considerar uma distribuição normal de preferências, com o “filiado mediano” situado numa posição equidistante entre os extremos pragmático e purista; ela também asseguraria a não descaracterização da social-democracia. Entretanto, aparentemente se trata de uma possibilidade menos provável, havendo uma tendência centrífuga nos partidos social-democratas. 8 É claro que membros não classificáveis como social-democratas – tais como liberais, comunistas ou puros office-seekers não-ideológicos – também podem contribuir para uma mudança de rumo dos partidos, complexificando a análise que se faz dos atores no interior da organização. Conforme observa Esping-Andersen (1985), inclusive, sua entrada é freqüentemente admitida, devido à frouxidão de critérios para as filiações e à maior liberdade interna, em contraste com os partidos comunistas.

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formação dos partidos políticos.9 A lógica da representação das bases eleitorais é

inspirada pela ideologia e pelas práticas políticas de seus apoiadores; a opção pela

lógica da competição eleitoral, por outro lado, implica o ajuste da organização interna,

do programa e das estratégias às condições do “mercado político”, para maximizar o

apoio eleitoral e conquistar eleitores marginais. Quanto mais puro e ideológico for o

programa do partido, mais restrito será seu apelo eleitoral. Entre as duas opções polares

haveria um continuum de possibilidades, da mesma forma, é claro, que há

possibilidades intermediárias entre os tipos ideais “purista” e “pragmático” na teoria de

social-democracia aqui sustentada.

O sucesso de um partido social-democrata é sempre relativo às limitações com

as quais se depara. As limitações são de vários tipos: correlação de forças entre os

partidos políticos, heranças teóricas tradicionais específicas de cada partido social-

democrata, necessidade ou não de formar coalizões com outros partidos, capacidade de

intervir na legislação, poder econômico do país e sua inserção na economia

internacional, grau de competências atribuídas ao Estado, proporção de clientes e

potenciais apoiadores de políticas públicas social-democráticas etc. Essa relação é

ilustrada no Gráfico 2, a seguir. A linha inclinada define o que se espera de um partido

social-democrata relativamente às limitações com que se depara para promover um

avanço socialista: quanto maiores forem as restrições, mais modestas são as

expectativas de avanço. O “fracasso” significa que o partido não avançou tanto quanto

possível, seja porque não foi competente na identificação das oportunidades existentes e

na elaboração e implementação das estratégias necessárias, seja porque não quis

promover mudanças tão drásticas quanto as condições permitiam (neste último caso, o

partido não pode ser classificado como social-democrata).

9 De acordo com o modelo de Kitschelt, haveria três tipos básicos de militantes ou ativistas em um partido, e a opção pela lógica da competição eleitoral ou pela lógica da representação das bases dependeria da correlação de forças interna no partido, mais especificamente da coalizão a ser formada por dois destes três: ideólogos, pragmáticos e lobistas. Os ideólogos são análogos ao que aqui foi definido nos partidos social-democratas como o “purismo kautskiano”, enquanto que os pragmáticos são análogos ao “pragmatismo bernsteiniano”. Os lobistas são representantes de grupos de interesses cujos temas estão vinculados à órbita política do partido, tais como sindicatos, associações profissionais e grupos religiosos. É importante salientar que essa categoria “lobistas” pode confundir, por compreender militantes relacionados a muitos diferentes grupos de pressão, com interesses conflitantes, dentro do mesmo partido. Enquanto alguns grupos de pressão podem ter interesses antagônicos aos bens coletivos ambicionados pelos social-democratas (por exemplo, muitos empresários do setor privado, especialmente aqueles relacionados a atividades não produtivas), outros podem ter interesses que convergem (geralmente é o caso dos sindicatos e movimentos sociais).

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Gráfico 2 – Limitações x Sucesso do partido social-democrata

O restante do artigo, portanto, procura discutir as políticas e reformas adotadas

pelos seis partidos estudados, quando no poder, que tenham ou não avançado no limite

das possibilidades para desmercantilizar e fortalecer os trabalhadores e excluídos ou

para alterar as limitações ao avanço socialista.

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Os seis casos: Avanços, limites e retrocessos

Conforme se observou até aqui, um partido realmente social-democrata deveria

avançar tão radicalmente quanto as limitações possibilitassem e, simultaneamente, agir

para que tais constraints fossem arrefecidos, possibilitando novos e mais profundos

avanços futuros e dificultando recuos. Dentre os partidos analisados no presente

trabalho, justamente aquele menos classificável de acordo com as definições usuais de

social-democracia é o que mais avança no limite das possibilidades e que mais age para

mudar os limites. Liderado pelo presidente Evo Morales, o Movimento para o

Socialismo (MAS) boliviano, tratado de forma freqüentemente pejorativa não só na

imprensa mas também na academia, apresenta desempenho em termos de investimento

público no combate à pobreza que o torna recordista em transferências para a população

vulnerável, além de expandir direitos em tamanha intensidade que não é fácil encontrar

paralelos. Até o uso a receita proveniente dos recursos naturais para a redução da

pobreza é apontado como problema na literatura (Weyland, 2009), quando o condenável

seria, justamente, destiná-las a redistribuição em outra direção. O Partido Trabalhista

Norueguês (DNA), corretamente, fez o mesmo ao se descobrir petróleo no país, mas

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escapou às críticas em função da falta de uniformidade de critérios ainda comum na

disciplina.

Dentro da lógica social-democrática, a plataforma socialista do MAS, entendida

como a “refundação” do Estado, é a maior demonstração do seu avanço no limite das

possibilidades. Avançou dentro dos limites impostos pela correlação de forças, pela

situação econômica do país, entre outras restrições, respeitando os marcos da

institucionalidade da democracia representativa.10 O MAS sempre negociou quando

necessário, e se impôs quando tinha maioria. Após vencer a eleição de 2005, impôs seu

programa democraticamente tanto quanto foi possível pelos meios institucionais, em

função da correlação de forças. Quando conseguiu maioria parlamentar suficiente,

aprovou seu próprio projeto sem concessões, o que é resultado da regra da maioria,

princípio primeiro do jogo eleitoral. A impressão de que o MAS ignorou a oposição se

deve ao fato de ter sabido explorar sua fragmentação, negociando apenas com parte

dela. Mesmo quando a maioria dos governos dos departamentos estava nas mãos de

oposicionistas, em geral estes não estavam alinhados com os partidos de oposição no

Parlamento (Mayorga, 2008), os quais tampouco atuavam em uníssono.

De todo modo, ainda mais do que atuar no limite das possibilidades, o governo

do MAS se destacou por trabalhar para alterar esses limites, conseguindo, assim,

ampliar sua capacidade de avanço. Um primeiro exemplo disso foi a nacionalização dos

hidrocarbonetos, decisiva para gerar notável aumento de arrecadação do Estado e, com

isso, obviamente, de capacidade de gasto. As empresas estrangeiras que exploram

petróleo e gás foram forçadas, sob ameaça de expropriação, a novas relações contratuais

em cumprimento à nova legislação. O governo pôde, então, usar as receitas dos

hidrocarbonetos e dos recursos minerais para expandir o gasto e o investimento públicos

(Ellner, 2012, p. 111; Wolff, 2013). O Gráfico 4 mostra o quanto os hidrocarbonetos

foram decisivos para o aumento de receita e como eles possibilitaram que a economia,

mesmo com um aumento no gasto público, deixasse de ser deficitária para ser

superavitária.

10 A ênfase em elementos de uma democracia plebiscitária não anula isso, pois o sistema representativo continuou tendo preponderância no sistema político boliviano.

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Gráfico 3 – Equilíbrio fiscal da Bolívia (Receita x Gasto) como percentual do PIB Fonte: Weisbrot; Ray; Johnston (2009) / Banco Central de Bolivia e INE.

O governo Morales usou as prerrogativas legislativas do poder Executivo para

fragilizar a resistência da oposição a seu projeto social-democrata. O presidente

ameaçou usar decretos para impedir que a oposição no Senado boliviano, minimamente

majoritária, mantivesse a tática de atrasar os projetos de lei aprovados na Câmara dos

Deputados, que tinha ampla maioria governista (Mayorga, 2008). Morales usou decreto

também para redistribuir recursos provenientes dos hidrocarbonetos das administrações

departamentais para as municipais e encorajou a aprovação da lei da Renda Universal

da Velhice, que estabelecia o uso de 30% do total desses recursos (totalmente excluídos

apenas os destinados à previdência e às universidades) ao pagamento de uma renda

mensal para as pessoas de terceira idade. Estas duas últimas medidas enfraquecem a

arrecadação dos departamentos, nos quais se concentrava parte importante da oposição

ao governo (Mayorga, 2008).

A mais radical ação para a alteração dos limites, no âmbito institucional, foi a

convocação de uma Assembleia Constituinte. A Constituição, primeiramente, atendeu a

demandas específicas dos povos indígenas reconhecendo seus costumes, seu direito a

autogestão, sua cultura e idioma. A Bolívia passou a ser um Estado plurinacional, com

as línguas indígenas tornando-se oficiais e todos os mandatários sendo obrigados a

entender e se expressar em pelo menos uma delas; a bandeira indígena wiphala se

tornou símbolo oficial do país, tanto quanto o hino nacional ou a bandeira vermelha,

amarela e verde; e o sistema judiciário passou a incorporar, além do nível da Justiça

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Receita

Gasto

Receita dos Hidrocarbonetos

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nacional, os próprios usos e costumes indígenas para as suas comunidades, salvo

algumas exceções, como homicídio e estupro.

Além desses elementos, a nova Constituição avançou radicalmente também em

áreas mais diretamente enquadradas na clivagem distributiva. Retirou-se a

independência do Banco Central e se estabeleceu que cabe ao Executivo, “em

coordenação com o Banco Central da Bolívia”, determinar os objetivos das políticas

monetária e das taxas de câmbio. Todas as atividades econômicas passam a dever

desempenhar, constitucionalmente, um papel positivo no âmbito social, econômico e

ambiental; com isso, o direito à propriedade passa a estar condicionado à sua “função

social”, os latifúndios foram proibidos com a estipulação de uma quantidade máxima de

hectares permitida, e está banida a possibilidade de privatização de serviços públicos

básicos, como o provimento de água, a rede de esgoto, a saúde pública e a seguridade

social (Wolff, 2013).

A outorga constitucional do mecanismo de revogação de mandatos e a de outros

mecanismos de democracia participativa ou plebiscitária (ver Pérez Flores, Cunha Filho

e Coelho, 2010) é apontada por Wolff (2013) como forma de institucionalizar a

mobilização e a pressão de rua, fenômenos tradicionais na política boliviana. Pode-se

acrescentar que se trata de modificação das limitações ao socialismo, pois cria

dificuldades adicionais para eventuais governos conservadores, pró-mercado. Sem

dúvida restringe, também, a segurança e a capacidade centralizadora do próprio

governo, mas isso pode ser visto como meio de se evitarem os efeitos da “lei de ferro da

oligarquia” de Michels sobre sua plataforma e, portanto, de se reduzir o risco de

descaracterização pragmática da social-democracia.

O MAS alterou também os limites para o avanço de seu projeto ao modificar a

legislação eleitoral. Primeiramente, acabou com o nefasto procedimento de o segundo

turno das eleições presidenciais ser votado pelo parlamento e não pela população. Tal

regra havia criado historicamente uma incoerência entre a intenção do eleitor e o

resultado eleitoral, e, se Morales não tivesse conseguido a maioria absoluta dos votos

em 2005, e o MAS não tivesse ultrapassado os 50% das cadeiras na Câmara, certamente

um segundo turno decidido por parlamentares teria levado à sua segunda derrota na

corrida presidencial.

Foi adotado ainda um sistema eleitoral misto para a Câmara de Deputados em

que a metade relativa à lista fechada está atrelada proporcionalmente à votação para

presidente, e um sistema proporcional para o Senado que também segue a mesma

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distribuição de votos para o Executivo. Além de um candidato a deputado no distrito

uninominal, portanto, o eleitor escolhe uma única lista que compreende o concorrente à

Presidência e a listagem de seus candidatos a senador e deputado, impossibilitando-se,

assim, a votação cruzada (Zucco, 2009; Cunha Filho, 2010).11 O fato de, até a

aprovação da nova Constituição, cada departamento ter três senadores, sendo dois para a

lista mais votada e um para a segunda com maior votação, sobrerrepresentava a

oposição, que era forte nos dois menores departamentos e tinha presença em todos os

demais. O MAS, ao mesmo tempo em que acabou com o mecanismo desproporcional

que favorecia a oposição, condicionou a formação das bancadas parlamentares à

votação presidencial, o que, tendo em vista a popularidade de Morales, foi uma manobra

extremamente eficiente na disputa por melhores condições para a aprovação de seus

projetos.

O MAS adota posição tipicamente social-democrata no eixo socioeconômico, de

prioridade para a redução do desemprego, políticas de redistribuição de renda para

combater a pobreza, investimento em infraestrutura e ampliação da participação do

Estado na economia, seja por meio de empresas estatais ou de controle da ação privada.

Wolff (2013) constata que o MAS retrabalhou a relação entre Estado e mercado,

recolocando o primeiro como o ator principal no desenvolvimento econômico, ao

aumentar o investimento público, o controle dos setores estratégicos (hidrocarbonetos,

mineração, eletricidade e infraestrutura) e o número de estatais.

Se o MAS se configura surpreendentemente como o exemplo mais próximo do

conceito de social-democracia defendido este trabalho, o PSOE, na Espanha, por outro

lado, é justamente o caso exemplar de partido que de fato mudou seu objetivo,

hegemonizado pelo pragmatismo. Houve, por certo, traços social-democráticos, por

exemplo, na formação de um welfare state12, porém a mercantilização e a não

priorização do pleno emprego inviabilizam por completo a aplicação de tal

classificação. O grupo liderado por Felipe González defendeu vigorosamente a “lógica

da competição eleitoral”, conforme a tipologia de Kitschelt. Na eleição parlamentar de

1979, apesar de o partido ter aumentado sua votação para 30,4% (o triplo dos 10,7% do 11 Como observa Zucco (2009), se a fórmula proporcional para o Senado vigorasse em 2005, o MAS já seria majoritário, com quase 60% das cadeiras, e teria evitado problemas como a não votação pelos senadores dos projetos já aprovados na Câmara. 12 Mesmo muito críticos, Recio e Roca (2001) reconhecem que o gasto público aumentou durante todo o período entre 1982 e 1993, em parte por um investimento identificado com o welfare state: pagamentos para as famílias e serviços básicos como saúde e educação. Segundo Camiller (1996, p. 138), no entanto, os elementos de welfare state criados pelo PSOE “poderia[m] ter sido feita[os] por qualquer governo de direita esclarecido, num país capitalista com nível médio de desenvolvimento”.

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rival comunista PCE), seus líderes entenderam que o partido deveria ir ainda mais para

o centro e abandonar o marxismo (CAMILLER, 1996; SMITH, 1998; BOIX, 1998).

Houve uma extrema centralização de poder dentro do PSOE, com os rumos do partido

excessivamente definidos pelas decisões exclusivas do pragmático grupo de González.

A estratégia do PSOE foi definida por Kitschelt (1994) como oligopolização:

radicalizou inicialmente para a esquerda, tomando votos do PCE e, quando este

definhou, já sem um rival à altura à esquerda, aumentou sua base eleitoral migrando

para o centro – sem perder com isso os votos dos eleitores da esquerda, que já não

possuíam outra opção. Com o tempo, uma nova alternativa de esquerda pôde surgir,

com a Esquerda Unida (IU), mas o sistema eleitoral adotado (formalmente proporcional,

mas em geral com baixa magnitude, além da distorção regional do malapportionment),

que discrimina os menores partidos, não impediu que o PSOE maximizasse suas

chances de governar ocupando o centro do espectro político – onde se concentra a

maioria do eleitorado –, na confortável posição de partido-pivô.

Entre ocupar sozinho todo o espaço entre o centro e a esquerda ou formar uma

coalizão partidária que viabilizasse transformações profundas, os felipistas, que

detinham ampla margem de manobra, com poucas limitações tanto internas (hegemonia

intrapartidária) como externas (nenhum partido à esquerda ou ao centro que o pudesse

ameaçar), não tiveram dúvidas em consolidar o PSOE como “um partido de esquerda

que ocupa o centro”, conforme classificou Camiller (1996). Foi realmente uma opção da

liderança do PSOE, pois o sistema institucional espanhol é particularmente

concentrador de poderes no Executivo e o partido tinha folgada bancada majoritária de

57,7% das cadeiras no Congresso como conseqüência da eleição de 1982.

Priorizando a participação na integração econômica europeia, que se deu de

acordo com os ditames da economia neoclássica, o PSOE adotou no governo posições

pró-mercado dificilmente compatíveis, por exemplo, com uma real preocupação com a

produção de empregos. A margem de manobra sobre o quanto uma nação periférica e

atrasada como a Espanha poderia ditar as condições de sua entrada na Comunidade

Europeia (CE) possivelmente era reduzida, cabendo ao governo uma decisão de tudo ou

nada: aceitar o pacote completo ou seguir fora da CE. Internamente, no entanto, a

margem de manobra da cúpula partidária era total. Houve uma piora da qualidade de

vida da força de trabalho – tanto pela degradação de seus direitos como de seu poder

aquisitivo – e da correlação de força entre capital e trabalho, visto que enfraqueceu os

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sindicatos, fragilizou os empregados vis-à-vis os patrões, fortaleceu bancos e

empreiteiras, promoveu a mercantilização e a financeirização da sociedade.

Além do rígido ajuste econômico conduzido por especialistas com posições mais

pró-mercado animados com as experiências de Thatcher e Reagan, que se recusaram a

adotar medidas anticíclicas para fomentar a demanda (Borchert, 1996; Boix, 1998;

Smith, 1998; Recio e Roca, 2001), o governo González visou à racionalização do setor

empresarial, tido como despreparado para a competição internacional, priorizando ao

máximo a iniciativa privada, pois as estatais eram associadas à ineficiência e corrupção

do governo autoritário de Franco (Smith, 1998; Boix, 1998). Além das privatizações,

em cuja promoção o próprio governo gastou vultosas de dinheiro (Camiller, 1996) fez

parte do processo de “racionalização” das empresas espanholas grande volume de

demissões (Recio e Roca, 2001). Foram destruídos 500 mil postos de trabalho e o

desemprego aumentou de 17%, quando o PSOE assumiu o poder, para 22% em 1986 (o

mais alto do continente), a despeito da promessa de campanha de 1982 de reduzir o

desemprego à metade e criar 800 mil empregos.

Quando, após longo período fora do governo, o PSOE voltou ao poder nacional

com José Luis Zapatero no cargo de primeiro-ministro, as transformações lideradas por

González já haviam restringido a margem de manobra ou, nos termos aqui formulados,

haviam aumentado os limites ao avanço socialista. Ainda assim, no início de seu

governo, mais da metade do orçamento estava voltada para o gasto social13 –

especialmente moradia, pensões e dependência (Mulas-Granados, 2009). Depois, no

entanto, diante da crise, realizou reformas estruturais radicais e corte nos gastos visando

a recuperar o crescimento, impactando as pensões, o mercado de trabalho, as

negociações coletivas e as entidades financeiras.

Sánchez-Cuenca (2012) reconhece a limitação do que o governo Zapatero

poderia fazer, dada a pressão europeia, mas sustenta que não houve uma atuação o mais

à esquerda possível. Segundo ele, foram realizadas reformas estruturais que não tinham

a ver com a crise aproveitando-se a debilidade dos atores que poderiam oferecer

resistência, ao mesmo tempo em que o ajuste foi excessivamente centrado no corte de

13 Além disso, o PSOE se reaproximou dos sindicatos, com quem González havia tido severos atritos (os trabalhadores organizados sempre foram vistos por ele mais como um obstáculo à estratégia ultrapragmática do que como centro das preocupações no desenvolvimento de políticas públicas), e aprovou leis históricas voltadas para questões próprias pós-materiais, tal como a do casamento homossexual, da agilização dos divórcios, da reprodução assistida, da mudança de gênero dos transexuais no registro civil, da igualdade de gênero e da violência de gênero (Sánchez-Cuenca, 2012).

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gastos, sem que parte dos sacrifícios recaísse sobre os bancos e que se combatesse com

rigor a fraude fiscal.

Se não é seguro afirmar se houve falta de vontade de avançar no limite das

possibilidades ou se faltou capacidade para se perceber o quanto seria possível, é no

enfrentamento das limitações que a falta de compromisso com a social-democracia fica

patente. Não apenas Zapatero não atuou no limite das possibilidades, como agravou tal

limitação a um avanço socialista. Em 2011, sem que o próprio PSOE ou os ministros

tivessem conhecimento prévio, o premier apresentou reforma constitucional que proibia

o déficit público em condições normais (isto é, que não fossem as de guerra, catástrofe

natural, recessão profunda ou outras circunstâncias similares). Tal lei, na prática,

impede que o governo adote medidas anticíclicas em tempos de crise, aumentando ainda

mais o insulamento da economia em relação aos cidadãos, que já era significativo pelo

fato de a política monetária ser controlada por um banco central independente (Sánchez-

Cuenca, 2012)

Os demais quatro casos estudados – os dois sul-americanos e a dupla

escandinava – apresentam resultados menos decisivos do que o sucesso boliviano e o

fracasso espanhol, com avanços e contradições, mas avaliar suas trajetórias é útil para se

entender a dinâmica de avanços no limite das possibilidades e ações para alterar tais

limitações, bem como para se observar o efeito das disputar entre a ala pragmática e a

purista dentro do partido.

O contraste entre os partidos social-democratas dos dois países nórdicos aqui

estudados em relação ao PSOE na Espanha é notável. Além de suas centrais sindicais,

chamadas LOs, serem muito mais solidamente estruturadas do que o combativo

movimento sindical espanhol, elas ocuparam, especialmente no caso sueco, papel

relevante, por vezes de protagonismo, nas políticas adotadas pelo governo, enquanto

que, no país ibérico, os trabalhadores organizados foram sempre tratados como uma

variável, por vezes como entrave para a adoção das políticas desejadas.

Mais do que os limites enfrentados pelos partidos dos trabalhadores nos três

países, o que diferencia mais diametralmente a Suécia e a Noruega da Espanha é o

quanto o Partido Social-democrata dos Trabalhadores (SAP) e o Partido Trabalhista

Norueguês (DNA) procuraram tensionar esses limites e explorar as possibilidades,

mantendo as LOs mais como interlocutoras e parceiras do que como súditas, clientes ou

problemas. Justamente quando as centrais sindicais perderam influência, os dois

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partidos se afastaram da social-democracia, escondendo-se atrás de bandeiras

progressistas fora do eixo socioeconômico.

Como os dois países têm economias muito voltadas para a exportação e pequeno

mercado interno, o esquema, que priorizava o pleno emprego, dependia, para manter a

competitividade internacional, de haver moderação nos aumentos dos salários. Isso foi

possível devido à estrutura neocorporativista da Suécia e da Noruega, em que

trabalhadores organizados em uma central sindical abrangente – e próxima dos social-

democratas e trabalhistas – negociavam centralizadamente com a organização patronal,

sob a intermediação do Estado. Os governos social-democratas conseguiram manter o

quase pleno emprego por décadas, até o modelo começar a dar sinais de esgarçamento

por volta da década de 1960 na Noruega e na de 1970 na Suécia, em parte pela mudança

na estrutura produtiva, em parte pela crise mundial.

As proximidades dos dois casos não anulam o fato de que o norueguês e o sueco

também apresentam diferenças importantes. Tratou-se de dois experimentos distintos,

um estatista e outro de tentativa de controle dos rumos da economia mas com incentivo

à concentração capitalista nos setores competitivos. O DNA priorizou a organização da

produção e a intervenção direta via empresas estatais, enquanto que os social-

democratas suecos adotaram meios indiretos, preocupando-se mais com a redistribuição

e com a política salarial.14

Aparentemente, ambos funcionaram bem, talvez até com vantagem para o

último, o sueco. Entretanto, quando o SAP – e principalmente a LO – tentou, em

meados da década de 1970, dar o histórico passo social-democrático de transferir

gradualmente a propriedade das empresas mais eficientes para seus próprios

trabalhadores, por meio de fundos coletivos de investimentos para os assalariados para

os quais seriam transferidos os lucros excessivos, (Esping-Andersen e Korpi, 1984;

Pontusson, 1996; Vartiainen, 2001) , sofreu reação do empresariado. Este último venceu

a disputa ideológica, jogando a maioria da população contra o governo por meio de um

massacre midiático (Pontusson, 1996). Um peso menor da iniciativa privada

possivelmente teria representado menor limite ao avanço socialista.

Vartiainen (2001, p. 23) observa que a maior conquista estrutural da social-

democracia sueca foi o crescimento do maior setor público no mundo dentro de uma

14 Mesmo no caso de serviços essenciais, como a eletricidade, o SAP não se preocupou com o caráter público ou privado da propriedade, concentrando-se em limitar a liberdade das empresas para direcionar sua produção às metas programáticas da social-democracia (Esping-Andersen, 1985; Berman, 1998 e 2006).

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economia de mercado, tendo crescido ao longo de toda a história democrática do país

até o final dos anos 1980, passando o percentual do gasto público em relação ao PIB de

25% para 60% em 45 anos. O avanço social-democrata destacado pelo autor finlandês

ocorreu conquistando-se ideologicamente a população, atraindo setores amplos para o

welfare state em detrimento de soluções privadas de serviços e previdência, e

utilizando-se o emprego público como ferramenta de combate ao desemprego. Essa

estratégia, além de satisfazer os interesses dos trabalhadores e as preferências

programáticas da esquerda, foi útil para solidificar a hegemonia eleitoral do SAP.

Na Noruega, a política de maior destaque adotada pelo governo do DNA a partir

de 1951, de acordo com Mjøset et al. (1996), foi a do “socialismo de crédito”, centrada

em um comitê que regulava (e racionava) o suprimento de créditos para o setor privado,

mantendo os juros baixos, de modo a permitir o acesso a bens por parte das famílias de

poucos recursos e a orientar os investimentos para atividades produtivas e não para

especulação. Os bancos comerciais desenvolveram formas de escapar das regulações

para concessão de créditos, mas sua participação nos empréstimos foi reduzida vis-à-vis

a dos bancos estatais. O socialismo de crédito seria extinto pela direita, quando esta

esteve no poder na década de 1980.

Uma nova oportunidade, no entanto, abriu-se para os trabalhistas noruegueses

nos anos 1970. Em meio à grave crise econômica que afetava o mundo todo, foi

descoberto petróleo no Mar do Norte, surgindo uma fonte de extraordinária receita para

a Noruega. Com isso, a participação do petróleo nas exportações norueguesas saltou de

apenas 0,1% em 1972 para 35% em 1980 (o que teve a contribuição dos dois choques

do petróleo realizados pela OPEP, em 1973-1974 e em 1978-1980) (Mjøset et al.,

1996). Enquanto a Suécia teve dificuldade de manter os empregos públicos e de

preservar a renda real em função da contração da produtividade e do investimento, a

Noruega pôde driblar essa situação graças à arrecadação proveniente do petróleo

(Esping-Andersen, 1995).

O boom do petróleo atraiu grandes investimentos de capital na Noruega,

aumentando a demanda por mão de obra e permitindo que o governo do DNA adotasse

políticas fiscais muito expansionistas e desse nova guinada à esquerda, inclusive

aumentando o emprego público em 40% entre 1973 e 1989, adotando políticas

anticíclicas de crescimento acelerado para lidar com a recessão, implementando

políticas de renda que elevaram o rendimento real das famílias em 5% entre 1974 e

1977 (Iversen, 2001).

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Justamente quando o mundo se recuperava da recessão, a Noruega entraria crise,

em grande parte em função da queda do preço do petróleo. Se as políticas adotadas pelo

DNA não continuaram avançando à esquerda, tampouco tiveram um sentido

ideologicamente coerente para a direita: tanto adotou algumas medidas pró-mercado

como outras de caráter redistributivo ou estatista. Combinou taxa de câmbio fixa e

liberação dos fluxos de capitais, medidas limitadoras da autonomia governamental, com

a restrição do crédito justamente daqueles de renda mais alta. Se por um lado o

enfrentamento ao desemprego inicialmente fracassou, por outro o DNA conseguiu

reverter a desregulamentação promovida por um breve governo de direita e expandiu o

setor público justamente no setor bancário.

Hoje, o SAP sueco e o Partido Trabalhista Norueguês estão mais afastados da

definição de partido social-democrata aqui trabalhada, mas os dois claramente já se

enquadraram bastante nela. Não agiram simplesmente como partidos liberais

progressistas, mas como partidos social-democratas ao não se satisfazerem em serem a

Suécia e a Noruega os países onde o capitalismo é mais humano e tem a melhor

qualidade de vida do mundo: buscaram avançar no grau de autonomia dos trabalhadores

em relação aos empresários, o que pode ser pensado como mais um passo na direção do

ainda distante socialismo.

Ambos erigiram abrangentes e generosos welfare states com alto grau de

universalização a partir das décadas de 1930 e 1940, transformando países

razoavelmente pobres e atrasados nos welfare states mais desenvolvidos do mundo,

com centrais sindicais extremamente poderosas e influentes, além de alta qualidade de

vida para a quase totalidade da população. Em parceria com as centrais sindicais LOs,

conseguiram, para os padrões das economias capitalistas, resultados invejáveis em

termos de igualdade, qualidade e universalização de serviços públicos, benefícios

generosos e quase pleno emprego. Como observam Esping-Andersen e Korpi (1984), ao

se erigir um tipo institucional de welfare state, obtendo amplo apoio para as políticas de

bem-estar, a própria oposição burguesa foi pressionada a compactuar com a agenda

social-democrata. Se isso não chega a ser uma transição para o socialismo, tal como

ressaltou Cameron (1984), é sim uma vitória na luta por hegemonia.

Depois, a partir dos anos 1960, agiram para avançar mais rumo ao socialismo.

Na década de 1960 e ainda mais intensamente na primeira metade dos anos 1970, os

social-democratas suecos, por mais que tenham sido derrotados na disputa ideológica,

efetivamente tentaram imprimir um igualitarismo radical na política de solidariedade

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salarial e introduzir profunda democratização industrial e fundos de participação

acionária dos trabalhadores, que modificariam de forma decisiva a correlação de forças

entre capital e trabalho. O DNA, por sua vez, apesar de, pela ação de sua liderança

centralizada, ter tomado medidas prejudiciais ao avanço social-democrata na Noruega

nos anos 1960 e 1970, tais como a adesão à OTAN e a tentativa de integração à

Comunidade Europeia (que não ocorreu porque foi derrotada em votação popular,

inclusive com rejeição de muitos eleitores trabalhistas), soube aproveitar os recursos da

exploração do petróleo para criar empregos e gerar renda, além de ter introduzido

importantes mecanismos de democratização decisória no local de trabalho.

O afastamento dos escandinavos da social-democracia se deu na década de 1980,

quando foi promovida uma abertura para o mercado nos dois países, com parte da

responsabilidade pela mudança cabendo ao SAP e ao DNA. Reduziram a capacidade do

Estado de gerir a economia, por meio da liberalização dos fluxos de capital e da adesão

(ou da tentativa de entrada) à Comunidade Europeia, além de, no caso sueco, ter

ocorrido a privatização de estatais lucrativas (Pontusson, 1996). Houve algum recuo do

welfare state, com o correspondente fortalecimento das soluções privadas, além de um

aumento sem precedentes no desemprego. Insatisfeitas, as centrais sindicais LO se

afastaram dos dois partidos, que passaram a enfatizar mais as questões pós-materiais.

Em linhas gerais, movimento contrário ocorreu nos três países sul-americanos

aqui pesquisados. Todos eles, e não somente a Bolívia, destacam-se amplamente pela

redução da pobreza, entre outros meios pela distribuição direta de recursos para os mais

vulneráveis e pelo crescimento do emprego. Uma diferença significativa entre eles é a

maior limitação político-partidária com que se depara, no Brasil, o PT, tanto interna

como externamente. Enquanto o MAS tem folgada maioria absoluta e a Frente Ampla

tem cerca de 50% da representação nas casas parlamentares, o PT precisa formar

coalizões com setores conservadores, entre eles aqueles ligados ao agronegócio e a

grupos religiosos intolerantes. A correlação de forças com os demais partidos não é

favorável, dadas a alta fragmentação e a fragilidade dos aliados da esquerda. No

presidencialismo de coalizão eleitoralmente enviesado a favor de conservadores

pragmáticos (dispostos a se coligar com o PT, se é esse o meio de ter acesso ao poder),

tal como ocorre no Brasil, não resta alternativa senão atrair para o governo grupos

vinculados às oligarquias, ao setor financeiro, ao agronegócio, ao moralismo religioso.

Desse modo, apesar de o PT ter, em razoável medida, avançado no limite das

possibilidades, tal obstáculo é maior do que nos países vizinhos e é preciso agir para

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minorá-los. Para isso ocorrer, seria necessária uma correlação de forças favorável a esse

enfrentamento dentro do partido, com maior equilíbrio social-demorático entre puristas

e pragmáticos. Também dentro do partido, no entanto, a limitação ao avanço social-

democrata é maior no Brasil do que no Uruguai ou na Bolívia.

No âmbito intrapartidário, o pragmatismo opera no Uruguai como freio ao

avanço socialista, mas não é majoritário dentro da Frente Ampla. O setor pragmático

dentro da coalizão, que é liderado pelo vice-presidente Danilo Astori, é expressivo mas

minoritário, atuando como âncora para o avanço buscado pelos setores alinhados ao

presidente Mujica, como o Movimento de Participação Popular e a Lista 711, que

podem ser enquadrados como um núcleo bastante social-democrático, intermediário

entre o purismo e o pragmatismo. Na Bolívia, Evo Morales consegue efetivamente

coordenar os interesses de variados movimentos sociais em um mesmo bloco (Crisis

Group, 2005), que, mesmo heterogêneo, não funciona como conglomerado de correntes

rivais.

No Brasil, por outro lado, o PT vive a situação de hegemonia dos grupos office-

seekers. Hegemonizado pelo pragmatismo, com o encolhimento dos grupos mais

radicais e mesmo com sua adesão às teses do grupo majoritário – hoje conhecido como

Construindo um Novo Brasil –, o PT está cada vez mais orientado para a manutenção

do poder como fim último em vez de como meio para implementar políticas. Em função

da hegemonia pragmática interna no PT, o partido não é totalmente eficiente na

modificação dos limites para um avanço social-democrata. A extrema priorização da

conquista da Presidência tem como corolários uma menor preocupação em relação ao

aumento da bancada parlamentar petista e à presença do partido nos governos

subnacionais, havendo cessão excessiva de espaço para os aliados conservadores – com

destaque para o PMDB –, pois tal movimento aumentaria o atrito com aliados

conservadores na composição da coalizão nacional. É claro que o resultado é um ciclo

vicioso, com a não alteração significativa da correlação de forças, de modo que o

partido continua como refém de uma maioria conservadora no Congresso e se mantém

inalterada a limitação à realização de um avanço social-democrata.

As diferentes correlações de força entre os partidos políticos no Brasil e no

Uruguai tornam mais difícil, na situação do PT, instaurar reformas no âmbito das

questões pós-materiais do que é o caso da Frente Ampla, bastante ousada nesse sentido,

especialmente no governo Mujica. Nas questões socioeconômicas, ambos os governos

conseguem bons resultados sem, no entanto, promover reformas profundas (nenhuma

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rompeu com políticas econômicas ortodoxas ou implementou uma reforma tributária

radical). Entretanto, com uma correlação de forças interna mais equilibrada, a Frente

Ampla logra avanços, ainda que modestos, mais incisivos na mudança da estrutura da

relação entre capital e trabalho, como a ênfase autogestionária.

No governo Vázquez, foi realizada uma reforma tributária, que, entre outras

medidas, criou o Imposto de Renda das Pessoas Físicas, o qual, por ser uma cobrança

direta, tem impacto progressivo e era uma bandeira histórica da esquerda uruguaia

(CHASQUETTI, 2007). Foram ainda expandidos ou retomados direitos trabalhistas e

sindicais, possibilitando aumento do salário e renda. O desemprego caiu para 10%, até

então a taxa mais baixa desde 1988, e seguiria caindo durante o governo de seu

sucessor, Mujica. Além disso, criou-se o Ministério de Desenvolvimento Social

(MIDES), que implementou em um primeiro momento o Plano Emergência e, uma vez

saneada a grave situação social encontrada pela Frente Ampla quando assumiu o poder,

este foi substituído pelo Plano de Eqüidade. Ambos envolvem transferências de renda

para lares e indivíduos de baixa renda e sem situação de risco.

O governo Mujica aprofundou as conquistas do antecessor e incorporou ainda a

aprovação de leis com importante impacto simbólico: descriminalização da produção e

venda de maconha, legalização de casamentos homossexuais e descriminalização do

aborto, esta última uma medida inédita em toda a América do Sul. Como parte do

projeto de mudança da correlação de forças entre capital e trabalho, fomentou a

autogestão das empresas, criando o Fundo para o Desenvolvimento (FONDES), para

apoiar empreendimentos com a participação dos trabalhadores na direção e no capital

das empresas.15

No Brasil, foi levado adiante um projeto que Singer (2012) classifica de

“lulista”, que, além de ter mantido por algum tempo o governo confortável nas disputas

15 Mujica incentivou que essa fosse a solução dada para a empresa de aviação Pluna, que faliu, e para a indústria têxtil Paylana, que foi comprada em leilão pelo Banco da República, estatal. O fortalecimento dos trabalhadores em relação ao capital, por meio de projetos de democracia industrial ou autogestão, apresentou avanços bastante positivos na Noruega e no Uruguai, entre os seis casos estudados. O Partido Trabalhista Norueguês conseguiu aprovar em 1977 uma legislação que dava aos trabalhadores organizados direitos de cogestão em questões de saúde, segurança e processos de trabalho, com a revisão da lei sobre sociedades anônimas, destinando aos trabalhadores um terço do conselho das companhias acima de cinqüenta funcionários, além de obrigando os conselhos dos bancos comerciais a terem uma maioria de integrantes eleitos pelos trabalhadores ou designados pelo Parlamento (Mjøset et al., 1996). Na Suécia, o SAP também radicalizou em medidas nesse sentido nos anos 1970 (Pontusson, 1996), o que levou a central patronal SAF a empreender uma campanha contra a centralização da organização sindical, na figura da LO, conseguindo finalmente romper com a tradição sueca de cooperação entre capital e trabalho e negociar separadamente a partir dos anos 1980 (Esping-Andersen e Korpi, 1984; Vartiainen, 2001).

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eleitorais, foi caracterizado por alcançar conquistas importantes sem, no entanto,

avançar no limite das possibilidades ou alterar tais limites. A redução da pobreza foi

alcançada por uma combinação de transferência de renda por meio do programa Bolsa

Família, de aumento contínuo do salário mínimo, da expansão do crédito para

segmentos de baixa renda por meio da criação do crédito consignado (Singer, 2009 e

2012; Hunter e Power, 2007). Ao mesmo tempo, não se modificou radicalmente a

estrutura econômica, de modo que setores como o bancário e o agribusiness

aumentaram seus rendimentos.

Conforme analisa Singer (2012), não houve uma mudança na correlação de força

entre capital e trabalho, e sim a adoção de um modelo de arbitragem entre as classes

fundamentais. Buscou-se, assim, um jogo de soma positiva, em que os dois lados

ganham e ninguém perde, o que obviamente não é sustentável, sendo preciso escolher

um dos lados quando a recessão for inevitável. Questões como a descriminalização do

aborto, legalização do casamento gay ou descriminalização das drogas seguem fora do

horizonte, especialmente com o significativo crescimento do eleitorado evangélico e de

seu impacto no sistema representativo.

Comparando-se os casos brasileiro e uruguaio, pode-se concluir que, enquanto

no PT a hegemonia pragmática ameaça a descaracterização do partido como social-

democrata, os avanços da Frente Ampla na direção do socialismo parecem menos

instáveis. O fato de o núcleo pragmático corresponder a um terço do partido, no entanto,

pode até mesmo levar a uma ruptura, no momento em que as mudanças forem

demasiadamente profundas para que ele as aceite, ocorrendo então novo realinhamento

do sistema político uruguaio. Os avanços do PT são menos previsíveis, pois, até o

momento, foi possível conciliar políticas para os setores mais pobres e para setores

empresariais.

Dentro da perspectiva de social-democracia desenvolvida neste trabalho, não

basta ao partido socialista migrar para o centro do espectro político para vencer eleições,

é preciso que ele atraia o eleitor mediano para o socialismo, por meio da disputa

ideológica, de modo que a vitória nas urnas seja possível com uma platafoma mais à

esquerda que o status quo. A regulação da mídia16, portanto, assume relevância, pois

pelo menos em quatro países estudados – os três sul-americanos e a Suécia – é nítido o

16 Obviamente, essa disputa de hegemonia é incompatível com o financiamento público de veículos partidariamente dedicados a favorecer a oposição, tal como continuou sendo feito no Brasil pelos governos do PT, que se limitaram a ampliar o financiamento de pequenos veículos alternativos, notadamente na internet.

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alinhamento da maior parte da imprensa contra o governo do partido de esquerda ou,

pelo menos, contra suas medidas mais radicais. No país nórdico, isso foi decisivo

justamente quando o SAP tentou promover a mencionada radicalização em prol da

classe trabalhadora, com transferência do capital e do controle das empresas mais

lucrativas para os operários, pois os veículos de comunicação, majoritariamente nas

mãos dos mesmos empresários que perderiam poder, conseguiram virar a opinião

pública contra o governo.

Por fim, é preciso contatar que, a despeito de sua origem europeia, hoje o

conceito social-democrata parece se enquadrar mais às experiências sul-americanas, ao

menos às três selecionadas como casos deste estudo. Na América do Sul

(principalmente na Bolívia, mas não apenas), as inovações promovidas pela esquerda

mostram uma capacidade de enfrentamento dos novos limites com que hoje se depara o

avanço rumo ao socialismo. Na Europa, por sua vez, a União Europeia apresenta-se

como ampliação dos limites à ação de seus governos nacionais rumo ao socialismo,

posto que se afasta da democracia devido às instâncias supranacionais imunes à

accountability e enviesadas pelas normas e metas neoliberais.17

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17 Os moldes com que se formou a União Europeia foram marcadamente neoliberais: política econômica ortodoxa, insulamento do Banco Central Europeu e mesmo ausência de mecanismos democráticos de escolha dos ocupantes de posições-chave nas instituições de governança europeia: enquanto o Parlamento Europeu, instituição cujos membros são democraticamente eleitos em todos os países, tem poder limitado, quem tem primazia no âmbito legislativo em relação às áreas mais relevantes – economia, finanças e política externa – é o Conselho da União Europeia, e o principal órgão executivo é o Conselho Europeu, ambos controlados pelos governos nacionais dos Estados-membros mais poderosos, Alemanha e França.

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