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    O QUE A FILOSOFIA

    A. O termo filosofia

    1. Etimologia do termo filosofia

    a. O termo filosofia composto de dois termos gregos: phlos, quesignifica amigo de, amante de, afeioado a, que gosta de, que tem gosto em,que se compraz em, que busca com af, que anseia, etc., e sopha, quesignifica sabedoria, saber, cincia, conhecimento, etc.

    b. Assim pois, etimologicamente, o termo filosofia significa: amor sabedoria, gosto pelo saber, etc.

    2. Origem do termo filosofia

    a. O termo filosofia nasceu no crculo socrtico, quer dizer, nocrculo de SCRATES e dos discpulos dele, ou talvez antes ainda nocrculo pitagrico, quer dizer, no crculo dePITGORAS e dos seusdiscpulos.

    b. Eram chamados de filsofos os homens que buscavam a sabedoriasuprema, quer dizer, a sabedoria ltima e radical da vida e das coisas, ouseja, o saber que busca a dimenso ltima e radical da vida e das coisas.

    3. Trs acepes do termo filosofia

    a. Filosofia como forma de vida

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    = O termo filosofia pode designar, antes de tudo, uma forma de vida: afilosofia entendida como vida filosfica, como viver filosoficamente; assimentendiam a filosofia, por exemplo, os filsofos cnicos e cirenaicos e, emmuitos aspectos, os prprios filsofos esticos.

    = Esta acepo do termo filosofia ainda ressoa na nossa linguagem quandodizemos que algum conduz a sua vida com muita filosofia; esta mesmaacepo do termo filosofia recolhida nas acepes 3 e 4 do termofilsofo noDicionrio AURLIO:

    # Filsofo aquele que procede sempre com sabedoria e reflexo, quesegue uma filosofia de vida.

    # Filsofo aquele que vive tranqilo e indiferente aos preconceitos econvenes sociais.

    b. Filosofia como doutrina sobre a vida

    = O termo filosofia pode designar tambm uma doutrina sobre a vida: afilosofia entendida, sobretudo, como resposta ao problema do sentido da

    vida e da existncia humana.

    = aquilo que no fim do sculo XIX e comeo do sculo XX chamou-se de

    filosofia da vida (Lebensphilosophie); o mesmo DILTHEY no alheio aesta idia da filosofia.

    c. Filosofia como saber acerca das coisas

    = O termo filosofia poder designar, finalmente, um saber acerca das

    coisas: a filosofia entendida como conhecimento intelectivo (no sentidomais amplo desses termos) acerca das coisas (abrangendo entre as coisas o

    homem e a sua vida).

    = Esta terceira acepo do termo filosofia a que nos interessaespecialmente, ainda que no unicamente; a ela aponta sobretudo, comotemos dito, o termo filosofia na sua origem: a filosofia entendida como saber

    que busca a dimenso ltima e radical da vida e das coisas.

    = Pois bem, para poder dar uma definio mais estrita do que a filosofiaenquanto saber que busca a dimenso ltima e radical da vida e das coisas, necessrio, antes de tudo, que digamos em que consiste essa dimensoltima e radical das coisas (incluindo nelas a vida mesma) que busca esse

    saber, essa sabedoria, que chamamos de filosofia.

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    B. A nossa definio de filosofia: a filosofia o saber acerca da dimenso

    difana, transcendental, metafsica, das coisas.

    1. As trs dimenses das coisas: o bvio, o ultra-bvio e o difano dascoisas, e os trs tipos de saber humano acerca das coisas: o saber comum, osaber cientfico-tcnico e o saber filosfico ou filosofia.

    a. O bvio das coisas e o saber comum acerca delas

    = Quando o homem se pe a caminho para saber acerca das coisas, humadimenso delas que sai-lhe ao encontro no caminho; por exemplo, se umhomem quer saber acerca desta garrafa, topa sem mais nem menos com o

    seu tamanho, com a sua forma, com a sua cor, com o seu brilho, com a sua

    temperatura, com o lquido que contm, com o fato de que estmeio vazia,de que estsuja, etc.

    = Pois bem, todos esses caracteres, partes, propriedades, etc., das coisas quesaem ao encontro do homem quando se dirige s coisas para saber acercadelas, constituem a dimenso do bvio das coisas; com efeito, sair aoencontro no caminho de algum diz-se em latim ob-viare; diz a Carta aos

    Hebreus, por exemplo, que, quando Abrao regressava de derrotar uns reis,Melquisedec, rei de Salm, saiu-lhe ao encontro no caminho (obviavit ei):cfr. Hb 7,1; Gn 14,17-20.

    = O bvio das coisas no primariamente a dimenso delas que se sabe

    facilmente, sem maiores complicaes; o bvio das coisas primariamente adimenso delas que nos sai ao encontro no caminho quando nos dirigimos scoisas para saber acerca delas, a dimenso das coisas que nos sai aoencontro no nosso contato imediato com as coisas, a dimenso delas quesalta vista, por assim dizer, e, que, por isso, conseqentemente, sabe-sefacilmente, sem maiores complicaes.

    = O bvio das coisas a dimenso delas que objeto do assim chamadosaber comum ou vulgar.

    b. O ultra-bvio das coisas e o saber cientfico-tcnico acerca delas

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    = Houtra dimenso das coisas que no obvia, quer dizer, que no sai aoencontro do homem quando este se dirige s coisas para saber acerca delas;assim, por exemplo, os eltrons, nutrons e prtons que compem a matriadessa garrafa, a velocidade do movimento das suas molculas, a pessoa ou a

    fbrica que a fez, etc.; com efeito, nenhum eltron dessa garrafa, porexemplo, saiu nem sairjamais ao encontro do homem quando se dirige aessa garrafa para saber acerca dela; nenhum homem topou nem topar

    jamais com os eltrons duma garrafa; os eltrons da matria das coisasjamais saltaram nem saltaro vista de ningum, entre outras coisas, porqueos eltrons, como todas as partculas elementares, pela prpria naturezadeles, no so visualizveis

    = Pois bem, todos esses caracteres, partes, propriedades, etc., das coisas que

    no saem ao encontro do homem quando o homem se dirige s coisas parasaber acerca delas, constituem a dimenso do ultra-bvio das coisas; comefeito, para achar todos esses elementos das coisas e para saber algo acerca

    deles, o homem tem que ir alm (ultra) da dimenso do bvio das coisase busc-los mais ou menos arduamente mediante a cincia e a tcnica.

    = O ultra-bvio das coisas a dimenso delas que objeto do assimchamado saber cientfico-tcnico.

    c. O difano, o transcendental, o metafsico das coisas e o saber filosfico

    acerca delas: a filosofia

    = Poder-se-ia pensar (e no so poucos aqueles que assim pensam!) que arealidade das coisas comea e acaba nas dimenses bvia e ultra-bviadelas, quer dizer, que o bvio e o ultra-bvio das coisas esgotam porcompleto a realidade delas, e que, por conseguinte, no cabe mais saberhumano acerca das coisas que os saberes chamados de comum e de

    cientfico-tcnico; quem assim pensa, considera que o saber humano acercadesta garrafa, por exemplo, se reduz a tudo aquilo que possam nos dizer o

    saber comum e o saber cientfico-tcnico acerca dela; isso assim?

    = Pois bem, hum saber (eis a filosofia, eis o saber filosfico!) que afirmaenergicamente que isso no assim para nada!; a filosofia defendeteimosamente que radicalmente falso que a realidade das coisas consista snas dimenses do bvio e do ultra-bvio delas, porque estconvencida deque huma outra dimenso das coisas, alis, a dimenso ltima e radicaldelas, que nem pertence dimenso do bvio das coisas, porque no sai aoencontro do homem quando o homem se dirige s coisas para saber acerca

    delas, nem pertence dimenso do ultra-bvio das coisas, porque o homemjamais poderach-la e saber algo acerca dela, por muito que valm da

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    dimenso do bvio das coisas, e por mais que a busque arduamentemediante a cincia e a tcnica.

    = E por qu?; responde a filosofia: porque essa outra dimenso das coisas, a

    ltima e radical delas, a mais difcil de achar por parte do homem, dadoque, paradoxalmente, bvia demais, mais do que bvia, toultimamente e radicalmente bvia que o homem no a percebe; essa outradimenso das coisas, apesar de pertencer s coisas e de estar em todapercepo delas, to transparente que carece da opacidade mnimanecessria para que o saber comum e o saber cientfico-tcnico acerca dascoisas consigam v-la!; trata-se da dimenso que vamos chamar de odifano das coisas.

    = Eis o objeto prprio da filosofia, do saber filosfico acerca das coisas: adimenso ltima e radical das coisas, que dizer, a dimenso do difano dascoisas.

    = E o que pertence a essa dimenso do difano das coisas?; vejamos;temos falado, por exemplo, da realidade duma coisa chamada de garrafa;

    pois bem, o que realidade, o que coisa?; dizemos que essa garrafa algo que existe; pois bem, o que ser, o que algo, o que existncia?; dizemos que isso uma verdadeira garrafa, que bela, que boa, etc.; pois bem, o que verdade, o que beleza, o que

    bondade?; eis alguns exemplos daquilo que pertence dimenso ltima eradical das coisas, dimenso do difano delas, e, portanto, ao objetoprprio da filosofia, do saber filosfico.

    = A dimenso do difano das coisas tm trs caracteres:

    # Primeiro: o difano das coisas, justamente em virtude da sua diafaneidade,deixa que apreendamos o bvio e o ultra-bvio delas, quer dizer, permite,sem obstculos, o transcurso de nossa apreenso dessas outras duas

    dimenses das coisas.

    # Segundo: o difano das coisas no sdeixa que apreendamos o bvio e oultra-bvio delas, mas faz que apreendamos essas outras duas dimensesdas coisas, quer dizer, faz efetivamente e positivamente possvel a nossaapreenso do bvio e do ultra-bvio das coisas; com efeito, poderamosapreender essa garrafa se no tivesse realidade, se no fosse, se noexistisse, etc.?

    # Terceiro: o difano das coisas, no sdeixa e faz que apreendamos asoutras duas dimenses das coisas, mas justamente a dimenso ltima e

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    radical do bvio e do ultra-bvio delas, quer dizer, a dimenso ltima eradical daquilo que constitui as coisas que apreendemos obviamente e ultra-

    obviamente.

    = A dimenso do difano das coisas a dimenso do transcendentaldelas, enquanto que a dimenso do bvio e do ultra-bvio das coisas adimenso do talitativo delas.

    # Daquilo que temos dito se desprende que a dimenso do difano dascoisas transcende (ultra-passa), as dimenses do bvio e do ultra-bviodelas.

    # Agora bem, isso no quer dizer que a dimenso do difano das coisasseja transcendente s coisas, porque, o difano das coisas , comoacabamos de dizer, uma dimenso das coisas, alis, a dimenso ltima eradical delas; dito de outro modo: o difano no nada fora, parte,acima, etc., das coisas; com efeito, jamais encontraremos por aa coisa,a realidade, o ser, a existncia, o algo, a verdade, a beleza, abondade, etc.; encontraremos, isso sim, que todas e cada uma das coisas socoisas reais, que so algo existente, verdadeiro, belo, bom, etc.

    # Como chamar, ento, esse carter da dimenso do difano das coisasque transcende as dimenses do bvio e do ultra-bvio delas, mas que no

    transcende as coisas, quer dizer que no transcendente s coisas?; afilosofia o chama de transcendental, para distingui-lo do nicotranscendente que seria Deus.

    # Agora bem, a dimenso do difano das coisas, a dimenso dotranscendental das coisas, a dimenso transcendental das coisas, temdois caracteres essenciais, que constituem a ndole constitutivamenteenigmtica dela:

    + O primeiro carter jo temos apontado: a dimenso do difano dascoisas, a dimenso do transcendental das coisas, a dimensotranscendental das coisas, transcende (ultrapassa) as dimenses dobvio e de ultra-bvio delas, mas no-transcendendo as coisas, quer dizer,sem ser algo fora, parte, acima, delas, isto , sendo uma dimenso, altima e radical, das coisas.

    + Segundo carter: a dimenso do difano de cada coisa, a dimenso dotranscendental de cada coisa, a dimenso transcendental de cada coisa,, em certo modo, idntica (numericamente e fisicamente a mesma) dimenso do difano de todas as demais coisas, dimenso do

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    transcendental de todas as demais coisas, dimenso transcendental detodas as demais coisas; com efeito, quando dizemos, por exemplo, que esta

    garrafa uma coisa real, existente, verdadeira, bela e boa, estamos dizendoexatamente o mesmo que quando dizemos isso de qualquer outra coisa do

    Universo!; por conseguinte, a dimenso do difano, do transcendental,apresenta-se a ns como uma espcie de envolvente fisicamente enumericamente nica e universal de todas as coisas do Universo!

    # Isto quer dizer que, se as coisas tivessem apenas a dimenso do difanodelas, ou seja, a dimenso do transcendental delas, a dimensotranscendental delas, no se distinguiriam em nada umas coisas dasoutras; evidentemente, no assim; em que se distingue, ento, porexemplo, esta garrafa das demais coisas do Universo, dado que enquanto

    coisa real, existente, verdadeira, bela e boa, etc., exatamente igual a todaselas?; esta garrafa se distingue de todas as demais coisas do Universo em

    que esta garrafa tal coisa real, existente, etc., quer dizer, em que temtal tamanho real, existente, etc., tal forma real, existente, etc., ocupa

    tal lugar real existente, etc., estcomposta de tais elementos fsico-qumicos reais, existentes, etc., etc.; em definitiva, se distingue por ter taldimenso bvia e tal dimenso ultra-bvia; daque a filosofia chame asdimenses do bvio e do ultra-bvio das coisas de dimenso talitativadelas, de dimenso da talidade delas.

    # Neste sentido, portanto, enquanto a filosofia, que o saber acerca dadimenso do difano das coisas, o saber acerca da dimensotranscendental das coisas, os saberes comum e cientfico-tcnico, que soo saber acerca da dimenso do bvio das coisas e o saber acerca do ultra-bvio das coisas, respectivamente, so o saber acerca da dimensotalitativa das coisas, da dimenso da talidade das coisas.

    = A dimenso do difano das coisas a dimenso do metafsico delas,enquanto que a dimenso do bvio e do ultra-bvio das coisas a

    dimenso do fsico delas.

    # As dimenses do bvio e de ultra-bvio das coisas costumam serconsideradas como a dimenso fsica delas, como o fsico das coisas;pois bem, temos que dizer, ento, que a dimenso do difano das coisas, adimenso transcendental delas, a dimenso do meta-fsico das coisas,a dimenso metafsica das coisas.

    # Mas aqui temos que fazer um esclarecimento similar ao que temos feito

    anteriormente: o metafsico das coisas no aquilo que estmeta(alm) do fsico das coisas, porque, como temos dito, o difano, o

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    transcendental das coisas no transcendente s coisas, quer dizer, no estfora, parte, acima, da dimenso fsica das coisas; pelo contrrio, ometafsico das coisas o fsico mesmo das coisas em dimenso meta(alm), quer dizer, o fsico mesmo das coisas em dimenso trans-(meta,

    alm)-cendental!

    # Por conseguinte, o saber comum e o saber cientfico-tcnico o saberacerca da dimenso do fsico das coisas; a filosofia, no entanto, o saberacerca da dimenso metafsica das coisas, o saber acerca do metafsicodas coisas; em definitiva, a filosofia o saber metafsico acerca das coisas, afilosofia puramente e simplesmente metafsica!; usualmente, a metafsica considerada como uma parte da filosofia junto s outras: lgica, tica,cosmologia, antropologia, metafsica, etc., mas, na verdade, todas essaspartes da filosofia so metafsica: a lgica metafsica do logos; a tica,metafsica do moral; a cosmologia, metafsica do mundo, a antropologia,metafsica do homem, etc.

    2. As dificuldades peculiares da filosofia enquanto saber acerca do

    difano, do transcendental, do metafsico das coisas.

    a. Precisamente por ser o saber acerca do difano das coisas, a filosofia osaber humano mais dificultoso e violento.

    = Neste mundo, as coisas mais difceis de ver so justamente aquelas queso totalmente transparentes, claras, difanas; quem de ns, por exemplo,no teve ja experincia de chocar violentamente contra uma porta devidro?; pois bem, precisamente enquanto saber acerca do difano dascoisas, o saber filosfico, a filosofia, consiste na viso intelectiva mais

    dificultosa: na viso intelectiva da diafaneidade mesma das coisas, dadimenso difana das coisas!; a filosofia o exerccio dessa dificlima eviolentssima operao intelectiva que justamente a viso intelectiva dodifano das coisas!

    = Este carter difcil e violento do saber filosfico, da filosofia, no devidoprimariamente e radicalmente nossa ofuscao intelectiva perante odifano, como pensam ARISTTELES e S. BOAVENTURA, mas aocarter de diafaneidade do difano mesmo.

    # Vejamos o que nos dizem ARISTTELES e S. BOAVENTURA.

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    + Diz ARISTTELES: Do mesmo modo que se comportam os olhos domorcego a respeito da luz do meio-dia, comporta-se tambm o intelecto denossa alma a respeito das coisas que so as mais visveis do mundo (t

    phsei phanertata pnton); quer dizer: assim como os olhos do morcego,

    acostumados escurido, ficam ofuscados perante a luz do meio-dia, assima inteleco humana, acostumada a inteligir coisas que na realidade somenos visveis (mais tenebrosas), fica ofuscada perante as coisas que narealidade so as mais visveis deste mundo; ARISTTELES no deuespecial importncia a isto, porque escreveu essas linhas e nada mais disse.

    + S. BOAVENTURA cita literalmente o texto de ARISTTELES eacrescenta: Porque, estando acostumado s trevas dos seres e das imagenssensveis, quando o homem va luz do Ser Supremo [Deus], parece-lhe que

    nada v; no entende que essa escurido a iluminao suprema da nossamente; refere-se S. BOAVENTURA dificuldade da nossa inteleco deDeus e da presena dele no mundo, justamente porque a luz de Deus tosuprema que nos ofusca.

    # Pois bem, tudo isso verdade, sem dvida alguma, mas no a verdadeprimria e radical, porque a dificuldade e a violncia da nossa visointelectiva do difano no consiste primariamente nem radicalmente naofuscao da nossa viso intelectiva perante o difano, mas, antes de tudo,no carter de diafaneidade do difano mesmo; com efeito, o difano dascoisas extremamente dificultoso e violento de ver intelectivamente pordois motivos:

    + Primeiro, porque o difano, como temos dito, apesar de ser uma dimensode todas e cada uma das coisas, no pertence dimenso bvia delas e nemsequer dimenso ultra-bvia delas, mas justamente a dimenso dascoisas bvia demais, mais do que bvia, to ultimamente eradicalmente bvia que a nossa viso intelectiva filosfica sconseguev-la com extrema dificuldade e violentando-se energicamente a si

    mesma!

    + Segundo, porque o difano, sendo como a dimenso ltima e radical detodas as coisas, includa, portanto, uma coisa chamada de viso intelectivahumana, no pode ser visto intelectivamente por ns desde fora dele, massempre e sdesde dentro dele mesmo!; dito de outro modo: o saberfilosfico, a filosofia, consiste em tratar de ver intelectivamente adiafaneidade das coisas, mas sem sair-se da diafaneidade mesma delas e de

    si mesma!; daque a filosofia, a viso intelectiva da diafaneidade das coisas,

    seja essa espcie de dificultosa e violenta retorso da viso intelectiva dascoisas sobre si mesma para poder ver intelectivamente nela a diafaneidade

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    das coisas mesmas!; e daque aquilo que a filosofia pretende no tirar-nosfora das coisas, mas justamente o contrrio: pretende reter-nos nelasultimamente e radicalmente para fazer-nos ver intelectivamente o difanodelas!

    = Por conseguinte, temos que afirmar energicamente, por muito paradoxal

    que parea, que a filosofia o saber mais dificultoso e violento acerca dascoisas justamente por ser o saber mais difano acerca delas!

    # Daque as coisas que diz a filosofia, muitas vezes paream trusmos, querdizer, afirmaes to triviais e to evidentes que uma perda absoluta detempo entreter-se ainda que seja sem enunci-las; por exemplo, afilosofia clssica afirma que todas as coisas so, quer dizer, que ser algo que pertence dimenso difana (transcendental, metafsica) de todasas coisas; pois bem, pode parecer que deter-se a pensar nisso, quer dizer, a

    pensar que as coisas so perder miseravelmente o tempo, porque o queconta verdadeiramente e saquilo que as coisas so!

    # Acontece, porm, que essa presumvel perda absoluta e miservel detempo nos leva precisamente a possuir intelectivamente as coisas na maior

    profundidade delas, quer dizer, a possuir intelectivamente a dimenso ltimae radical das coisas!!!; entre outros fatores, a preguia mental poder-nos-iaconduzir a negar que haja uma dimenso difana (transcendental,

    metafsica) das coisas, e a considerar a filosofia como uma pura inveno dementes delirantes...; muita ateno!; negar o transcendental (o difano, ometafsico) das coisas costuma ser o primeiro passo para negar otranscendente: Deus!!!!; daque muitos atesmos, sobretudo os positivistas,sejam anti-metafsicos convictos

    b. A ndole constitutivamente problemtica do saber filosfico, dafilosofia, em comparao com o saber cientfico-tcnico.

    = O saber cientfico-tcnico tem claro o seu objeto; todo ramo da cincia ouda tcnica busca intelectivamente a dimenso ultra-bvia dum objeto maisou menos determinado com o qual o homem jtopou; os cientistas e ostcnicos se pem diante duma srie de problemas que colocam uns objetosmais ou menos determinados, jencontrados, e tentam resolv-los; oconjunto desses problemas e das tentativas de soluo deles constitui arealidade da cincia e da tcnica.

    # Tanto assim que, se um ramo da cincia ou da tcnica no soubessepreviamente e com claridade quais so os problemas e as solues quepersegue, isso seria sinal inequvoco de que ainda no pode formar parte do

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    saber cientfico-tcnico; qualquer titubeio neste sentido sinal inequvocode imperfeio e de imaturidade dum presumvel ramo do saber cientfico-tcnico.

    # Isso no quer dizer que o saber cientfico-tcnico seja imutvel; tudo pelocontrrio: os diversos ramos do saber cientfico-tcnico mudamconstantemente; mas aquilo que muda neles o contedo concreto dassolues dadas por eles aos diversos problemas colocados; os problemas dosdiversos ramos do saber cientfico-tcnico ficam inalterados; assim, porexemplo, certo que a viso fsica do Universo tem mudado profundamentedesde GALILEU atEINSTEIN, mas tambm certo que todas asmudanas da viso fsica do Universo tem acontecido como resposta a ummesmo problema geral previamente definido e sabido pela cincia fsica: amedio matemtica do Universo.

    # Alguma vez muda tambm a formulao dos problemas dum ramo dosaber cientfico-tcnico, ainda que isso acontea srarssimas vezes e depoisde longos lapsos de tempo; mas, de todos modos, quando esse fato se

    produz, se deve sempre a uma nova formulao dos problemas desse ramodo saber cientfico-tcnico, que to clara e determinada como a anterior;nesses casos, cabe perguntar-se se esse ramo do saber cientfico-tcnico notem deixado de ser aquilo que era para converter-se num outro ramo

    diferente do saber cientfico-tcnico; por exemplo, a fsica da Idade Mdia ea fsica de GALILEU so na realidade dois saberes cientficos diferentes: oprimeiro estuda os princpios do ente mvel; o segundo estuda a mediomatemtica do Universo das coisas materiais; seja como for, em ambos oscasos a fsica sfoi saber cientfico quando comeou a dizer-se a si mesmapreviamente e com claridade aquilo que buscava intelectivamente.

    = A sorte do saber filosfico, da filosofia, completamente diversa!; o sabercientfico-tcnico tem problemas perante ele, s vezes complicadssimos, etenta resolv-los; o saber filosfico, a filosofia, comea por ser ela mesma

    um gravssimo problema, por ser ela mesma constitutivamenteproblemtica!

    # A precisa e rigorosa articulao entre um problema claramente formuladode antemo e a soluo dele, que a base de todo saber cientfico-tcnico,perde sentido no saber filosfico, na filosofia, porque, na realidade, o saberfilosfico, a filosofia, comea por no saber se tem objeto prprio ou, pelomenos, no parte da prvia e firme possesso dele!

    # Daque o saber filosfico, a filosofia, seja, antes de mais nada, um esforocontnuo para justificar a existncia do objeto prprio que pretende ter; dito

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    de outro modo: a filosofia, o saber filosfico, constitutivamente umaperene reivindicao do seu objeto prprio mediante um enrgico intento deilumin-lo, uma tentativa constante de salientar denodadamente aexistncia do seu objeto prprio, de abrir-lhe espao e passagem!

    # E isto assim, como temos visto, no porque o saber filosfico, afilosofia, simplesmente ignore ou desconhea de fato o seu objeto prprio,mas porque a ndole desse objeto constitutivamente latente, quer dizer,porque o objeto prprio da filosofia, do saber filosfico, ou seja, a dimensoltima e radical das coisas, de carter difano, transcendental, metafsico!

    # Se eliminamos da nossa considerao o bvio e o ultra-bvio das coisas, oque resta?; parece no restar absolutamente nada; essa a problematicidadeda filosofia, do saber filosfico: precisamente porque parece que no restanada, o saber filosfico, a filosofia, declara ferrenhamente que resta nadamenos que a dimenso ltima e radical das coisas, a qual parece no restar

    justamente porque difana, transcendental, metafsica!; a luta por fazer queno desaparea o difano, o transcendental, o metafsico das coisas, precisamente a violncia problemtica constitutiva da filosofia.

    # Por isso, no tem nada de estranho que, desde o arkhdos pr-socrticos,passando pelo ser de PARMNIDES, a Idia de PLATO, o entede ARISTTELES, o ente finito da escolstica, ocogitode DESCARTES, oconceito objetivo de LEIBNIZ, as condies transcendentais da experinciade KANT, o saber absoluto de FICHTE, SCHELLING e HEGEL, ato deseu de ZUBIRI, a filosofia, o saber filosfico, tem sido o ingente esforoprogressivo de constituir intelectivamente o seu prprio objeto, a tarefaviolenta de tentar arranc-lo da sua constitutiva latncia para coloc-lo numaefetiva patncia!

    c. Assim podemos compreender um pouco a angustura intelectual que

    oprime os filsofos.

    = Somente quando se encontra jfilosofando, vislumbra o filsofo a ingentetarefa que encetou pondo-se a filosofar; squando o problema, que afilosofia em si mesma, vai se abrindo passagem no filosofar do filsofo,perfila-se e desenha-se perante seus olhos a figura descomunal desse

    problema!

    = possvel que o filsofo tenha comeado a filosofar com um certopropsito intelectual prprio, mas isto no quer dizer que esse comeoseja o princpio da sua filosofia, porque o princpio da filosofia de todo

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    filsofo, o principio de toda filosofia, justamente a ndoleconstitutivamente problemtica da filosofia enquanto tal!

    = Daque, nesse sentido, possamos dizer abertamente: no saber filosfico,

    na filosofia, o princpio o fim, porque no passo primeiro, originrio eradical da filosofia, estjtoda a filosofia; tanto assim, que enquanto osaber cientfico-tcnico imaturo no saber cientfico-tcnico, como temosdito antes, no entanto, o saber filosfico, a filosofia, consiste precisamenteno processo mesmo da sua maturidade: a filosofia deve amadurecer em cada

    filsofo!; o resto filosofia escolar e acadmica completamente estril oumorta!

    = Quando o filsofo caminha arduamente no seu filosofar, o saberfilosfico, a filosofia ganha consistncia nele; jno mais o filsofoaquele que puxa a filosofia: a filosofia aquela que puxa o filsofo!; jnoa filosofia obra do filsofo, mas o filsofo obra da filosofia!!!

    d. Mas dpara dizer que existe a filosofia, ou sexistem filosofias?

    = A pergunta no improcedente, porque basta dar uma olhada histria dafilosofia para dar-se conta de que os diversos filsofos divergem sobre qualo objeto prprio da filosofia, do saber filosfico; por exemplo:para ARISTTELES o ente; para S. TOMS DE AQUINO, o ente

    enquanto ente; para KANT, o objeto fenomnico; para COMTE, o fatocientfico; para BERGSON, o dado imediato da conscincia;para DILTHEY, a vida; para HUSSERL, a essncia fenomnica;para HEIDEGGER, o desvelado na existncia temprea; etc., etc. ; e assimmesmo evidente que a ndole da filosofia, do saber filosfico enquantomodo de saber, tambm diverso para todos esses filsofos, porque dependede qual o objeto prprio que tem que saber a filosofia; por conseguinte,cabe perfeitamente perguntar: se, em definitiva, as concepes daquilo que a filosofia so tantas quantos filsofos, possvel falar ainda de a filosofia

    ou temos que falar simplesmente de as filosofias?

    = pergunta temos que responder o seguinte: certo que o conceito defilosofia no unvoco, porque as diferentes filosofias no dizem omesmo; mas tambm certo que o conceito de filosofia tambm no equvoco, porque as diferentes filosofias falam do mesmo; do qu?; nodum mesmo conceito de filosofia, mas sim dum mesmo saber real em

    marcha: do saber filosfico, da filosofia, que um saber queconstitutivamente deve estar buscando-se constantemente a si mesmo tanto

    em virtude da ndole peculiar do seu objeto (o difano, o transcendental, ometafsico das coisas), quanto em virtude da ndole peculiar do seu saber (a

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    problematicidade constitutiva do saber acerca do difano, do transcendental,do metafsico das coisas).

    = Por isso, todos os filsofos, unanimemente, sentem intelectivamente o

    saber filosfico, a filosofia, como imprescindvel, ainda que seja impossvelde definir precisamente e determinadamente de antemo; daque ARISTTELES chame a filosofia de conhecimento que se busca, eque, sete sculos mais tarde, nos diga STO. AGOSTINHO: Busquemoscomo buscam aqueles que ainda no encontraram, e encontremos comoencontram aqueles que ainda ho de buscar!

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    II

    A GNESE DA FILOSOFIA:

    SABEDORIA, NOVA SABEDORIA E FILOSOFIA

    A. A sabedoria oriental antiga

    1. Desde tempos remotos, surge no antigo Oriente (Caldia, Egito, ndia,Grcia, etc.) aquilo que chamamos de sabedoria.

    2. um tipo de saber que tem quatro caractersticas: (1) enfrenta-se com atotalidade do Universo, (2) porque quer chegar s razes ltimas do mundo e

    da vida, (3) com a finalidade de fixar o destino do mundo e da vida, (4) parapoder assim dirigir os atos do homem.

    3. Os sbios orientais nos contam em narraes (chamadas demitologias) o nascimento dos deuses (chamado de teogonia) e o

    nascimento do Universo (chamado de cosmogonia) pela ao dos deusesou de agentes extramundanos: o cu e a terra so produto dos deuses; essesdeuses no tm nada a ver com a ndole do cu e da terra.

    4. O contedo da sabedoria oriental , sobretudo, pressgio: a teogoniase prolonga numa cosmogonia que nos mostra o lugar que cada coisa tem no

    mundo, quer dizer, a hierarquia de potestades que debruam sobre ele; porisso, o sbio oriental o que faz interpretar o sentido dos eventos: o olhar dosbio se detm no espetculo da totalidade do Universo simplesmente parareferi-la a um pretrito, relatando a origem dela, e para projet-la num

    futuro, adivinhando o sentido dela.

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    B. A nova sabedoria indo-grega

    1. No mundo indo-europeu, um dia, o olhar do sbio se detm admiradono espetculo da totalidade do Universo nela mesma; nesse momento, ascoisas apresentam-se-lhe ao sbio como que assentadas na mole compactado Universo e agitando-se nela.

    2. Bastou este momento de deteno admirada da mente do sbio noUniverso em si mesmo, para separar os sbios hindus e gregos do resto dossbios: a cosmogonia dos sbios hindus e gregos comea a conter algomuito diferente, porque a sabedoria deles deixa de ser simples pressgiopara converter-se, ademais e sobretudo, em veda e em sopha.

    3. A sabedoria hindu (veda)

    a. Contedo fundamental

    = Em alguns hinos vdicos, nos Brmanes e nos Upanixades mais antigos,hreferncias ao conjunto do Universo nele mesmo, quer dizer, a tudoaquilo que he quilo que no hno Universo enquanto tal; esses textosafirmam que o Universo inteiro se acha assentado numa raiz divina: no

    absoluto (bram).

    = Mas o sbio hindu se dirige ao Universo para evadir-se dele ou parasubmergir-se na sua raiz divina, no bram; o sbio hindu faz desta evasoou imerso a chave da sua existncia: a busca da identidade do atm(oesprito do homem) com o bram(o absoluto); o sbio hindu sente-se assimparte dum tudo absoluto e a ele reverte.

    = O veda, a sabedoria hindu, portanto, tem, antes de tudo, carter

    operativo: verdade que algum dia pretenderpassar por etapas quepodem assemelhar-se a um conhecimento quase especulativo, mas este

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    tipo de conhecimento sempre uma ao cognitiva orientada para oabsoluto, para a comunho com ele.

    = Por isso, o vedafundamentalmente teosofia (o saber unir-se com a raiz

    divina, com o absoluto) e teurgia (a arte de realizar essa unio).

    b. A sabedoria hindu, o veda, filosofia, metafsica?

    = Hsempre uma certa equivocidade quando se fala de filosofia hindu, demetafsica hindu; vejamos.

    # certo que na sabedoria da ndia hmassas de pensamentos que, comcerta razo, ns qualificamos de metafsicos: se no os Upanixades maisantigos (Chndogya, Brihadranyaka, etc.), sim os mais recentes tm uma

    grande quantidade de idias que para ns seriam metafsicas; nestesentido, os comentaristas do Vedanta, como SHNKARA ou RMNUJA,tm uma grande quantidade de desenvolvimentos filosficos.

    # Mas a questo : esses pensamentos e idias eram metafsicos para oshindus?; tinham os hindus um conceito um pouco rigoroso e preciso - ainda

    que diferente do nosso - daquilo que ns chamamos de metafsica?; isso discutvel.

    = um erro grave - muito freqente, infelizmente - construir uma metafsicahindu fazendo, com idias e pensamentos hindus, aquilo que ns ocidentaisentendemos por metafsica; com efeito, se vertemos os nossos conceitosmetafsicos ocidentais sobre o pensamento hindu, aquilo que obtemos umhbrido que serqualquer coisa menos metafsica hindu; isso to erradocomo considerar teologia de S. PAULO as presumveis respostas que S.PAULO daria a um programa de teologia atual, quando a teologia de S.

    PAULO o programa teolgico e as respostas que S. PAULO tinha namente dele!

    = Por conseguinte, deixemos de lado a presumvel filosofia da ndia, a qualmereceria, sem dvida, um curso parte; seja como for, indiscutvel que andia dirigiu-se para o absoluto por uma via morta no mbito da intelignciaespeculativa.

    C. O orto da filosofia na Grcia: a sopha, a sabedoria como possesso daverdade sobre a Natureza

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    1. Nas costas jnicas da sia Menor surge, com TALES,ANAXIMANDRO, etc., o tipo do grande pensador que enfrenta-se com a

    totalidade do Universo, para referir-nos a realidade prpria dela, e no so nascimento dela pela ao dos deuses.

    a. Hmuitas especulaes histricas que buscam as origens da filosofiagrega no Oriente remoto, no Oriente prximo, no Egito, na Mesopotmia,etc.; mas todas essas especulaes histricas costumam esquecer o maiselementar e essencial: os gregos tiveram talento para dirigir-se dimenso

    difana das coisas, do mesmo modo que tiveram talento para transformaro saber em cincia; vejamos.

    = Para ter cincia no suficiente ter um monte de conhecimentosintelectuais, mesmo que rigorosos.

    = Os babilnios e os egpcios, por exemplo, tiveram muitos maisconhecimentos matemticos (por exemplo, de lgebra abstrata) que osgregos.

    = Os gregos, no entanto, que no tinham a menor idia da lgebra abstrata,tomaram sdois ou trs nmeros, com eles puseram imediatamente emfuno um logos, e fizeram uma demonstrao, um teorema, algocompletamente alheio a babilnios e egpcios.

    b. Assim pois, os gregos tiveram talento para apropriar-se da possibilidade

    do saber acerca do difano das coisas: foi o orto da filosofia: a filosofia seconstituiu como saber quando a inteligncia dos gregos foi arrastada peladiafaneidade das coisas; isto era uma pura possibilidade; de fato, no todasas mentes ao longo da histria humana tiveram acesso filosofia; a filosofiacomeou ali onde um grego, sabendo-o ou sem sab-lo, pretendendo-o ousem pretend-lo, lanou-se busca do difano das coisas!

    2. O descobrimento da Natureza (Physis)

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    a. Os jnicos descobrem que a realidade prpria da totalidade do Universopossui em si mesma uma estrutura unitria e radical: de fato, todas ascoisas que existem no cu e na terra nascem do Universo (e no sda aodos deuses!), vivem no Universo e revertem ao Universo quando morrem.

    b. Ento os jnicos nos dizem que esse fundo universal donde nasce tudoquanto hno Universo a Natureza (a Physis, de phyo, nascer, brotar,surgir, emergir, etc.); Natureza no apenas o conjunto das coisas que hno Universo; Natureza (physis) o conjunto das coisas que hnoUniverso enquanto que todas elas nascem (phyo) dum nico princpio(arkh) universal.

    3. Por conseguinte, a Natureza, no sentido explicado, tem duas

    dimenses, segundo estes pensadores jnicos; com efeito, o nascimento detodas as coisas do Universo concebido por eles como um magno ato vitalcom duas dimenses essenciais:

    a. Natureza como princpio (arkh) de todas as coisas:

    = As coisas nascem da Natureza como algo que esta produz de seu.

    = A Natureza, portanto, estdotada duma estrutura prpria, independentedas vicissitudes teognicas e cosmognicas.

    b. Natureza como fundamento permanente (arkh) de todas as coisas:

    = O nascimento das coisas concebido como um movimento gerador emque elas vo auto-conformando-se nessa espcie de substncia que aNatureza.

    = Dito de outro modo: as coisas, na sua gerao natural, recebem daNatureza a sua substncia; e, neste sentido, a Natureza algo que constitui ofundamento permanente que hem todas as coisas do Universo a modo desubstncia da qual todas elas esto feitas.

    = Pois bem, com a idia da permanncia desse fundamento, o pensamentogrego inaugura um tipo de saber, a sopha, que abandona definitivamente oscaminhos da mitologia e da teo-cosmogonia, para dar origem quilo quemais tarde sero propriamente a filosofia e a cincia.

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    4. A Natureza eterna.

    a. A Natureza, fonte inesgotvel de todas as coisas, permanece no fundode todas elas eternamente fecunda e imperecvel por cima da caducidade detodas as coisas.

    b. Daque a Natureza seja peiron (indeterminada, ilimitada) e, portanto,eterna; os jnicos imaginam essa eternidade da Natureza como um perfeitovoltar a comear sem perda alguma, como uma perene juventude (noesqueamos que eternidade (ain) e juventude (iuvenis) tm uma raizidntica: *ayu-, *yu-).

    c. Assim pois, a eternidade da Natureza consiste numa perene juventude,

    num movimento cclico, num eterno retorno.

    5. A Natureza o divino (theion).

    a. Para as antigas religies politestas, ser divino significa ser imortal; aimortalidade dos deuses deriva do inesgotvel caudal de vitalidade deles.

    b. Pois bem, para o sbio grego, a Natureza tambm algo divino nestesentido; a Natureza abrange todas as coisas, estpresente em todas elas comuma presena vital; esta presena vital da Natureza nas coisas, umas vezesestdormida, outras, desperta; estas variaes da presena vital da Naturezaem todas as coisas tm um carter cclico: acontecem conforme uma ordeme uma medida que o tempo (khrnos).

    6. Os sophi

    a. Estes pensadores gregos, foram chamados de sophi (sbios) porquearrancaram do Universo o vu que ocultava a sua Natureza, revelando aos

    homens aquilo que sempre .

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    b. ARISTTELES nos diz sobre eles o seguinte:

    = So sophiporque so aqueles que filosofaram sobre a verdade, umaverdade que consiste apenas no descobrimento da Natureza; para eles,

    buscar a verdade e buscar a Natureza so sinnimos; daque as obrasdestes sophitenham sido invariavelmente poemas Sobre a Natureza.

    = Estes sophiso fisilogos, porque so aqueles que buscaram a razo(lgos) da Natureza (physis).

    = Estes sophirealizaram este descobrimento pela excepcional fora da suamente, capaz de concentrar-se e abranger com o seu olhar perscrutador

    (theora!) a totalidade do Universo, penetrando ata ltima raiz dela ecomunicando assim com o divino.

    7. Contedo concreto destas sabedorias

    a. preferentemente aquilo que hoje chamaramos de astronomia emeteorologia.

    = Os fenmenos em que a Natureza se manifesta por excelncia soprecisamente os grandes fenmenos astronmicos e atmosfricos; neles sedesencadeiam os supremos poderes que debruam sobre as coisas doUniverso.

    = Daque a theora(o olhar contemplativo e perscrutador) tenha consistidoprimariamente num olhar para o cu, para as estrelas; essa theoradaabbada celeste levou primeira intuio da regularidade, da proporo e docarter cclico dos grandes movimentos da Natureza.

    b. Tambm a gerao, a vida e a morte dos seres vivos nos remetem aomecanismo da Natureza.

    c. Tudo isto se mostra quele que possui a fora para tirar o vu que ocultaa Natureza.

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    8. Esta sopha, este descobrimento da Natureza uma levssima inflexo,quase imperceptvel, a respeito da sabedoria antiga; uma ligeira oscilao amais, e teremos a rota que, ao longo da histria, levaro homem europeupelos novos roteiros da filosofia e da cincia: a sabedoria no como saber

    operativo, mas como puro saber.

    a. certo que o sophs grego quer desempenhar uma funo reitora dosentido da sua vida e da vida dos demais; com efeito,

    diz ARISTTELES que um dos significados do termo sophs, ainda notempo dele, aquele que dirige os outros e no dirigido por ningum; eacrescenta: a funo reitora do sophs assenta num saber excelente queabrange tudo quanto existe, especialmente o mais difcil e inacessvel aocomum dos homens.

    b. Mas tambm certo que este saber, a sopha, no um saber operativono mesmo sentido que o para o hindu.

    = O saber hindu lana o homem a evadir-se do Universo ou a arrojar-se nelepara identificar-se com o bram(o absoluto): a sabedoria hindu descobrimento do Universo para possuir o absoluto.

    = A sopha, no entanto, simplesmente recurva o homem diante da Naturezae diante de si mesmo: o descobrimento do Universo pela sophasimplesmente a possesso da verdade da Natureza do Universo.

    # A sophasimplesmente deixa que o Universo e as coisas fiquemdiante dos olhos do homem nascendo da Natureza tal como so.

    # Dito de outro modo: a operao da mente do sophsum fazer queconsiste em no fazer com o Universo nada mais que deix-lo, diante dosseus olhos, tal como : ento quando propriamente aparece-lhe o Universocomo Natureza.

    # Em outras palavras: a operao da mente do sophsno tem outro termoque a patncia do Universo como Natureza; por isso, o atributo primriodessa operao a verdade entendida como a-ltheia, como no-latncia!

    # Se o sophsdirige a sua vida e a vida dos outros, com a pretenso deassent-la nessa verdade, de fazer que o homem viva na verdade.

    c. Daque a sopha seja fundamentalmente uma especulao teortica.

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    = Por esta minscula deciso dos jnicos, nasceu o intelecto europeu comtoda a sua fecundidade teortica, e comeou a perscrutar nos abismosinsondveis da Natureza.

    = A sophatenta dizer-nos algo da Natureza, nada mais que pela Naturezamesma; na verdade do sophs, o descobrimento da Natureza no tem outrafinalidade seno esse descobrimento mesmo: por isso, uma atitudeteortica.

    = Assim, na Grcia, a sabedoria deixa de ser primariamente religiosa paraconverter-se em especulao teortica, em sopha.

    d. Esta sopha estainda longe do que mais tarde sero a epistme (cincia)e a filosofia propriamente ditas, mas aquela que abre a rota da futuracincia e da futura filosofia.

    = A sophamais que uma cincia uma viso teortica do mundo.

    # Os contemporneos destes sophisentiram a ao e a palavra deles comoum despertar a um mundo novo pela admirao: foi como um despertarluz do dia; dao carter marcadamente confuso e bidimensional destasabedoria em estado de despertar: estes sbios, na sua viso e na sua vida,movem-se num mundo novo, no mundo da verdade; mas o interpretam e o

    entendem com lembranas tomadas do mundo antigo: do mito; comodiz PLATO, no mito da caverna, vivem na luz, mas interpretam a luzdesde a obscuridade: o homem que sai pela primeira vez da obscuridade ao

    sol do meio-dia sente imediatamente a dor da ofuscao; os seusmovimentos so um tenteio incerto, dirigidos mais que pela luz nova pelalembrana da obscuridade passada.

    # Por isso, estes sophitm ainda roupagem e acentos de reformadoresreligiosos e de pregadores orientais.

    + O descobrimento deles se apresenta ainda como uma espcie derevelao.

    + O prprio ANAXIMANDRO, quando nos diz que a Natureza princpio, a funo que assinala a este princpio se assemelha muito auma dominao.

    + A sabedoria mesma destes sophitem ainda muito de regra religiosa; oshomens que se consagram a ela acabam levando uma existncia teortica

    (bos theoretiks) que lembra a vida das comunidades religiosas; asescolas filosficas tm ar de seita; assim, por exemplo, a escola pitagrica.

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    # Este carter ainda confuso da sophase evidencia com toda claridade nadupla reao que se produz nas mentes deles em ordem idia mesmado thes.

    + Com FERCIDES, o princpio de ANAXIMANDRO se prolonga peloque tem de dominante: a teocosmogonia rfica; por esta via, o esforodos jnicos volta a se perder no mito.

    + Com XENFANES, o princpio, naquilo que tem de raiz ou dephysis, comea a converter-se ele mesmo em thes; assim a teogoniaantiga vai se convertendo numa espcie de fsica jnica dos deuses; oprimeiro esboo de teo-logia!

    = Mas, com a sopha, a rota da filosofia e da cincia esto jabertas.

    # Desde as origens, temos na sophaos trs ingredientes dos quais jamais severprivada aphilo-sopha: uma teoria (jnicos), uma vida (pitagricos),uma nova atitude teolgico-religiosa (XENFANES).

    # A sophatem ainda uma existncia nebulosa, mas japonta para uma novaviso do mundo: a filosofia; e para um novo tipo de sbio: o filsofo.

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    III

    A FILOSOFIA NA FORMAO

    DOS FUTUROS PRESBTEROS

    A. Textos do Conclio Ecumnico Vaticano II

    1. Decreto Optatam totiussobre a formao sacerdotal (n. 15)

    a. As disciplinas filosficas devem ser ensinadas de tal modo que osestudantes se sintam conduzidos a adquirir sobretudo um conhecimento

    slido e coerente do homem, do mundo e de Deus, apoiados no patrimniofilosfico perenemente vlido.

    b. Para que os alunos conheam de maneira exata a ndole da pocapresente e se preparem convenientemente para o dilogo com os homens doseu tempo, tenham-se em conta tambm as pesquisas filosficas dos temposmodernos, em especial as de maior influncia na respectiva nao, bemcomo o mais recente progresso das cincias.

    c. A histria da filosofia se transmita de tal modo aos alunos que,enquanto penetram os princpios fundamentais mais decisivos dos vrios

    sistemas, sejam capazes de reter aqueles que forem demonstradosverdadeiros, de descobrir as razes dos erros e de refut-los.

    d. No prprio mtodo didtico, inculque-se nos educandos o amor pelaverdade rigorosamente pesquisada, observada e demonstrada, juntamente

    com o reconhecimento honesto dos limites do saber humano.

    e. Atenda-se diligentemente relao da filosofia com os verdadeirosproblemas da vida e tambm com as questes que agitam a mente dosestudantes.

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    f. Sejam ajudados os estudantes a descobrir o nexo existente entre os

    argumentos filosficos e os mistrios da salvao, que so estudados nateologia luz superior da f.

    2. Constituio pastoral Gaudium et spes

    a. n. 7:

    = Ao contrrio do que acontecia em tempos passados, negar Deus ou areligio, ou abstrair de ambos, no mais algo inslito e individual; com

    efeito, tais atitudes apresentam-se hoje, no raramente, como se fossem umaexigncia do progresso cientfico ou de certo novo humanismo.

    = Todas essas coisas, em muitas regies, no somente so expressadas nasmximas dos filsofos, mas atingem amplamente tambm as letras, as artes,a interpretao das cincias humanas e da histria..., de tal modo que, emconseqncia, muitos ficam perturbados.

    b. n. 44:

    = A Igreja, com efeito, desde o incio de sua histria, a fim de adaptar oEvangelho, enquanto possvel, capacidade de todos e s exigncias dossbios, aprendeu a expressar a mensagem de Cristo atravs dos conceitos edas linguagens dos diversos povos e, alm disso, tentou ilustr-la com asabedoria dos filsofos.

    = Esta maneira apropriada de proclamar a palavra revelada deve seguir

    sendo lei de toda a evangelizao.

    c. n. 53:

    = Quando se aplica s mltiplas disciplinas da filosofia, da histria, dascincias... e quando se ocupa das artes, o homem pode contribuir em altamedida a que a famlia humana se eleve s noes mais nobres doverdadeiro, do bom e do belo, e a um juzo de valor do Universo, de modoque seja mais claramente iluminada pela Sabedoria admirvel, que estjuntode Deus desde toda a eternidade, dispondo com Ele todas as coisas,

    brincando sobre o globo da terra e encontrando as suas delcias junto aosfilhos dos homens.

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    d. n. 62:

    = Os estudos e as descobertas mais recentes das cincias, da histria e dafilosofia despertam problemas novos, que acarretam conseqncias tambm

    para a vida e que exigem dos telogos novas pesquisas.

    = Aqueles que se dedicam s disciplinas filosfico-teolgicas nosSeminrios e Universidades procurem colaborar com os homens quesobressaem nas outras cincias, colocando em comum suas energias eopinies.

    3. DecretoAd gentes

    a. n. 16:

    = Hque abrir e aguar as mentes dos educandos, para que conheam bem epossam julgar a cultura de sua gente; nas disciplinas filosficas e teolgicas,percebam as relaes existentes entre as tradies e religies ptrias e areligio crist.

    b. n. 22:

    = Assim, perceber-se-mais claramente por quais caminhos a fpodeprocurar a inteligncia; uma fque tem em conta a filosofia ou sabedoriados povos.

    B. SAGRADA CONGREGAO PARA A EDUCAOCATLICA, O ensino da filosofia nos Seminrios(1972), I e II.

    1. Dificuldades atuais dos estudos filosficos

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    a. A reforma atual dos estudos filosficos nos seminrios enquadra-senum clima espiritual que apresenta-se, a respeito da filosofia, favorvel ehostil ao mesmo tempo.

    = Com efeito, dum lado, a nossa poca, com numerosas mudanas sociais emovimentos ideolgicos, rica em apelos a um srio relanamento dopensar filosfico; de outro lado, porm, nota-se a tendncia a menosprezar afilosofia ato ponto, em alguns casos extremos, de declar-la intil ou defaz-la desaparecer.

    # Sem dvida, a cultura atual, fechando-se cada vez mais ao problema datranscendncia, estse tornando contrria a um autntico pensamentofilosfico, e especialmente especulao metafsica, que a nica capaz deatingir os valores absolutos; neste sentido, hque mencionar, antes de tudo,o atual esprito tecnolgico que tende a reduzir o homo sapiensao homo

    faber.

    + A tcnica, enquanto traz humanidade numerosas e inegveis vantagens,no sempre favorece no homem o sentido dos valores do esprito.

    - Hoje se aprecia, em geral, que a mentalidade do homem parece enderear-se sobretudo ao mundo material, concreto, ao domnio da natureza, medianteo progresso cientfico e tcnico, reduzindo o conhecimento ao nvel dos

    mtodos das cincias positivas.

    - O acento posto unilateralmente na ao endereada ao futuro, o otimismoalimentado por uma confiana quase ilimitada no progresso, enquantoimpelem s transformaes imediatas e radicais no campo econmico,poltico e social, com freqncia fazem esquecer o carter permanente decertos valores morais e espirituais e, sobretudo, fazem que parea suprflua,ou atdanosa, a autntica especulao filosfica, que deveria, ao invs, serconsiderada como base indispensvel de tais mudanas.

    + Neste clima, a busca sria das verdades supremas freqentementedesprezada, e os critrios das verdades jno so os firmes e indiscutveisprincpios metafsicos, mas a atualidade e o sucesso; , portanto, facilmentecompreensvel que o esprito do nosso tempo se apresente cada vez comomais antimetafsico e, por conseguinte, aberto a toda espcie de relativismo.

    + Neste contexto, no surpreende que jmuitos no achem espao para umafilosofia distinta das cincias positivas; hoje, com efeito, enquanto seaprecia quase em todas partes uma notvel diminuio do interesse pelasdisciplinas filosficas clssicas, vai aumentando rapidamente a importncia

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    das cincias naturais e antropolgicas, com as quais freqentemente sepretende dar uma explicao exaustiva da realidade, chegando ato pontode eliminar completamente a filosofia como algo arcaico e destinado a ser

    superado; desse modo, ao invs dum desejvel encontro que poderia

    contribuir ao verdadeiro bem e progresso tanto das cincias quanto dafilosofia, vai-se verificando um antagonismo com conseqncias negativaspara ambas as partes.

    # Ao mesmo tempo que muitos cientistas se opem filosofia distinta dascincias positivas ato ponto de rejeitar a existncia dela, certos telogosconsideram a filosofia intil e atdanosa para a formao sacerdotal; achamque a pureza da mensagem evanglica foi colocada risco, no curso dahistria, pela introduo da especulao grega nas cincias sagradas; pensamque a filosofia escolstica sobrecarregou a teologia especulativa com ummonte de problemas falsos e, portanto, so da opinio de que as disciplinasteolgicas tem que ser cultivadas exclusivamente com o mtodo histrico.

    = Outras dificuldades nascem no campo mesmo da filosofia; com efeito, ali

    onde a filosofia no contestada, cada vez mais forte o pluralismofilosfico.

    # Ele devido no sao encontro das diversas culturas do mundo, diversidade e complexidade das correntes filosficas, mas tambm ao

    pluralismo quase inesgotvel das fontes da experincia humana.

    # Este processo vai se acentuando apesar dos louvveis esforos que vriosfilsofos modernos esto realizando para chegar a uma maior coerncia dosseus sistemas e a posies mais equilibradas.

    # A vastido e a profundidade da problemtica suscitada pelo surgimento devrias filosofias novas e pelo progresso cientfico tal que tornaextremamente difcil no suma sntese, mas tambm a assimilao de

    novas noes to necessrias para um ensino filosfico verdadeiramentevivo e eficaz.

    b. natural que esta situao repercuta gravemente nos estudosfilosficos nos seminrios.

    = Dela se ressentem tanto os professores quanto os alunos.

    # Os professores

    + bem sabido quo graves e numerosas tarefas impem-se hoje atividadedum professor de filosofia: a necessidade de assimilar uma grande

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    quantidade de noes novas derivadas das diversas mentalidades filosficase do progresso das cincias; a problemtica, s vezes totalmente nova, quetem que afrontar; as exigncias de novas adaptaes na linguagem e nosmtodos didticos, etc.

    + E tem que afrontar tudo isso, s vezes, num curto espao de tempo, numambiente pobre de meios e com uns alunos no sempre suficientementeinteressados e preparados.

    # Os alunos

    + Ainda que demonstram interesse por certos problemas vivos, que dizem

    respeito ao homem a sociedade, em geral no so encorajados aos estudosfilosficos pelo clima cultural atual (endereado geralmente mais simagens do que reflexo) e, sobretudo, pela preparao prvia, que comfreqncia de ndole sobretudo tcnica e endereada praxe.

    + Existem, ademais, outras circunstncias mais especficas que tornammenos atraente para os alunos o estudo da filosofia: a perplexidade que

    muitos deles experimentam perante a multiplicidade das correntes

    filosficas contrastantes; o carter, a seu aviso, exigente demais e talvezimpossvel duma busca desinteressada da verdade; a averso aos sistemasfixos e recomendados pela autoridade; as deficincias dum ensino pouco

    atualizado que apresenta uma problemtica antiquada, separada da vida;uma certa linguagem filosfica arcaica, pouco acessvel ao homemmoderno; uma excessiva abstrao, que impede que os estudantes tenhamuma viso clara do nexo entre filosofia e teologia e, sobretudo, entrefilosofia e atividade pastoral, qual eles desejam se preparar acima de tudo.

    = Daque haja em vrios seminrios um certo sentido de mal-estar, dedesgosto e de desafeio a respeito da filosofia; daas dvidas sobre o valore a utilidade prtica dos estudos filosficos; datambm os fenmenos de

    diminuio ou inclusive de abandono do autntico ensino filosfico emfavor das cincias que parecem serem mais atuais e endereadas sexigncias concretas da vida.

    c. Como se v, as dificuldades principais que pem hoje em questo osestudos filosficos nos seminrios parecem poder ser reduzidas a estas trs:

    = A filosofia no tem mais o seu objeto prprio: ela tem sido absorvida esubstituda pelas cincias positivas, naturais e humanas, as quais estovoltadas aos problemas verdadeiros e reais, estudando-os com a ajuda dos

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    mtodos que so reconhecidos hoje como unicamente vlidos; a atitudeinspirada nas correntes positivistas, neo-positivistas e estruturalistas.

    = A filosofia tem perdido a importncia com vistas religio e teologia: os

    estudos teolgicos devem desligar-se da especulao filosfica como dumintil jogo de palavras, e construir-se com plena autonomia sobre uma basepositiva fornecida pela crtica histrica e pelos mtodos exegticosespeciais; a teologia do futuro ser, portanto, tarefa especfica doshistoriadores e dos fillogos.

    = A filosofia contempornea tornou-se hoje uma cincia esotrica,inacessvel maior parte dos candidatos ao sacerdcio: as modernas escolasfilosficas (a fenomenologia, o existencialismo, o estruturalismo, oneopositivismo, etc.) cultivam o seu saber a um nvel tal de tecnicismo novocabulrio, na anlise e nas demonstraes, que tornaram-se um campoprivativo para expertos altamente especializados; no se v, portanto, nem aconvenincia nem a possibilidade de inserir uma cincia to difcil ecomplexa na formao normal dos candidatos ao sacerdcio.

    d. compreensvel que estes obstculos paream a muitos quaseinsuperveis e que sejam capazes de suscitar em certos ambientes umverdadeiro e autntico desnimo.

    2. A necessidade da filosofia para os futuros sacerdotes

    a. Apesar de ter em conta quanto temos dito acima, estamos convencidos,

    no entanto, de que todas as tendncias a abandonar a filosofia ou a diminuira importncia dela podem ser superadas e, portanto, de que no devemdesanimar-nos; ainda que os obstculos que hoje se opem ao ensinofilosfico sejam numerosos e difceis, no se vcomo a filosofia possa sersubestimada, ou atsuprimida, na formao a um verdadeiro humanismo e,especialmente, com vistas misso sacerdotal.

    = Com efeito, querer ceder a tais tentaes significaria ignorar tudo aquiloque hde mais genuno e profundo no pensamento contemporneo.

    = Sem dvida, os problemas filosficos mais fundamentais encontram-sehoje mais do que nunca no centro das preocupaes dos homens

    contemporneos, ato ponto de que invadem todos os campos da cultura: aliteratura (novelas, ensaios, poesia), o teatro, o cinema, a rdio-televiso e

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    ata cano; neles so constantemente evocados os temas eternos dopensamento humano: o sentido da vida e da morte; o sentido do bem e do

    mal; o fundamento dos valores; a dignidade e os direitos da pessoa humana;

    a confrontao entre as culturas e o patrimnio espiritual delas; o escndalo

    do sofrimento, da injustia, da opresso, da violncia; a natureza e as leis doamor; a ordem e a desordem da natureza; os problemas que dizem respeito educao, autoridade, liberdade; o sentido da histria e do progresso; omistrio do alm; e, finalmente, no fundo de todos estes problemas: Deus, asua existncia, o seu carter pessoal e a sua providncia.

    b. evidente que nenhum destes problemas pode achar uma adequadasoluo ao nvel das cincias positivas, naturais ou humanas, porque osmtodos especficos delas no oferecem nenhuma possibilidade de afront-los de modo satisfatrio; tais questes pertencem esfera especfica dafilosofia, a qual, transcendendo os aspectos meramente externos e parciais

    dos fenmenos, volta-se realidade inteira, buscando de compreend-la e deexplic-la luz das causas ltimas.

    = Assim, a filosofia, apesar de precisar da contribuio das cinciasexperimentais, apresenta-se como uma cincia distinta das outras, autnomae maximamente importante para o homem, o qual estinteressado no semregistrar, em descrever e em ordenar os diversos fenmenos, mas tambm, esobretudo, em compreender o verdadeiro valor e o sentido ltimo deles.

    = claro que qualquer outro conhecimento da realidade no leva as coisasatesse supremo nvel da inteligncia, prerrogativa caracterstica do espritohumano; enquanto no for dada a resposta a estes interrogantesfundamentais, toda a cultura fica por baixo das capacidades especulativas do

    nosso intelecto.

    = Pode-se dizer, portanto, que a filosofia tem um valor cultural

    insubstituvel: ela constitui a alma da autntica cultura, dado que coloca as

    questes sobre o sentido das coisas e da existncia humana de modoverdadeiramente adequado s aspiraes mais ntimas do homem.

    c. Alm disso, em muitos casos, nem sequer possvel recorrerexclusivamente luz da revelao; uma tal atitude de esprito resultariaradicalmente insuficiente pelos motivos seguintes:

    = A adeso perfeita do homem revelao divina no pode ser concebidacomo um ato de fcega, como uma atitude fidesta privada de motivaesracionais.

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    # O ato de fpressupe, pela sua natureza, as razes para crer, osmotivos de credibilidade, os quais so, em grande parte, de naturezafilosfica: o conhecimento de Deus, o conceito de criao, a providncia, odiscernimento da verdadeira religio revelada, o conhecimento do homem

    como pessoa livre e responsvel; pode-se dizer que cada palavra do NovoTestamento pressupe formalmente essas noes filosficas fundamentais.

    # O sacerdote, portanto, precisa da filosofia para garantir sua fpessoal asbases racionais de valor cientfico que estejam ao nvel da sua culturaintelectual.

    = O programa defides quaerens intellectumno perdeu nada da suaatualidade: a verdade revelada requer sempre a reflexo por parte do crente;ela convida-o ao trabalho de anlise, de aprofundamento e de sntese, que sechama de teologia especulativa.

    # Evidentemente, aqui no se trata de repetir o erro cometido nos sculospassados, quando a especulao teolgica foi cultivada de modo s vezesexagerado e unilateral, atchegar a abafar os estudos bblicos e patrsticos; arespeito, preciso restituir o primado ao estudo das fontes da revelaoassim como ao da transmisso da mensagem evanglica atravs dos sculos;primado que indiscutvel e que nunca deve ser diminudo; hquecondenar, assim mesmo, o emprego abusivo da filosofia no campo que essencialmente prprio da cincia revelada.

    # Mas hoje, uma vez restabelecido o justo equilbrio e dado que foramrealizados progressos enormes nas cincias bblicas e em todos os setores dateologia positiva, possvel e necessrio completar e aperfeioar essetrabalho histrico com a reflexo racional sobre os dados revelados.

    + Dispondo jde dados muito mais seguros e mais ricos do que antes, otelogo especulativo deve submeter a uma crtica inteligente os conceitos e

    as categorias mentais nos quais se exprime a revelao.

    + Neste delicado trabalho, ele no sdeverservir-se dos descobrimentosrealizados pelas cincias naturais e, sobretudo, humanas (psicologia,antropologia, sociologia, lingstica, pedagogia, etc.), mas deverrecorrertambm, e especialmente, ajuda da sfilosofia, para que ela possa dar asua contribuio de reflexo sobre os pressupostos e sobre as concluses dosconhecimentos fornecidos pelas disciplinas positivas.

    + Dado que os mtodos das cincias positivas (exegese, histria, etc.)partem freqentemente de diversos pressupostos que levam implcitas

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    escolhas filosficas, uma sfilosofia podercontribuir notavelmente, entreoutras coisas, ao esclarecimento e avaliao crtica dessas escolhas (hojeespecialmente necessria, por exemplo, para o mtodo exegticode BULTMANN) sem pretender ter, no entanto, uma funo absoluta a

    respeito dos dados revelados.

    # Esta influncia recproca das duas cincias, enraizada jprofundamente nanatureza mesma delas, acentuada pela nova situao que se tem criadoneste ltimos anos na teologia, a qual - querendo se abrir a novas dimenses(histrica, antropolgica, existencial, personalista), querendo desenvolverdiversos aspectos novos (psicolgico, scio-poltico, orto-prtico, etc.),assim como aprofundar os seus mtodos (o problema hermenutico) -acarreta uma nova problemtica que toca s vezes os pressupostos mesmosdo conhecimento teolgico (por exemplo, a possibilidade das definiesdogmticas de valor permanente) e que requer, portanto, um novoesclarecimento e aprofundamento dos conceitos, como, por exemplo, a

    verdade, a capacidade e os limites do conhecimento humano, o progresso, a

    evoluo, a natureza humana e a pessoa humana, a lei natural, aimputabilidade das aes morais, etc.

    = A filosofia , finalmente, um terreno insubstituvel de encontro e dedilogo entre os crentes e os no crentes; nesse respeito, ela tem um valorpastoral muito evidente; portanto, absolutamente inadmissvel que umsacerdote catlico, chamado a exercer o seu ministrio no seio dumasociedade pluralista, na qual os problemas filosficos fundamentais sodebatidos em todos os meios de comunicao social e a todos os nveisculturais, seja incapaz duma inteligente troca de pontos de vista com os nocristos sobre as questes fundamentais que visam estreitamente tanto a suafpessoal quanto os problemas mais candentes do mundo.

    = preciso salientar, ademais, que todas as orientaes pastorais, asescolhas pedaggicas, as normas jurdicas, as reformas sociais e muitas

    decises polticas, comportam pressupostos e conseqncias de ordemfilosfica que precisam ser esclarecidos e avaliados criticamente; sem amenor dvida, uma autntica filosofia pode contribuir notavelmente humanizao do mundo e da sua cultura, fornecendo uma justa hierarquia devalores to necessria para uma ao frutuosa.

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    C. CARD. JOSFREIRE FALCO, Interveno na IV Congregao Geralda VIII Assemblia Geral Ordinria do Snodo dos Bispos, 1990: Sria

    formao filosfica nos Seminrios.

    1. A f, que no estudo teolgico procura a sua inteligncia, estarconstantemente ameaada se no estiver baseada em slidos princpiosfilosficos.

    a. Sem princpios filosficos seguros no possvel formar a conscinciacrtica dos seminaristas, indispensvel para enfrentar as inmeras correntesde pensamento e as ideologias que caracterizam o nosso tempo, e para uma

    reflexo metdica segura sobre os dados da f.

    b. Todavia, em alguns seminrios a filosofia de S. TOMS substitudapelas cincias sociais, ou por um amlgama de correntes filosficas semuma relao clara com a verdade revelada.

    2. O Snodo deve, por isso, insistir na necessidade duma formaofilosfica nos Seminrios.

    a. Vivemos num tempo marcado profundamente pela cultura cientfico-tcnica, e pelo progresso material que deriva do conhecimento e do domnioda natureza por parte do homem.

    b. Por esta razo, no pode faltar na formao dos futuros sacerdotes, alm

    dos conhecimentos cientficos bsicos que hoje toda pessoa culta possui,uma viso global e crtica da cultura cientfico-tcnica contempornea, dassuas conseqncias no modo de sentir, de pensar e de agir do homemcontemporneo, e das implicaes ticas que daderivam.

    D. JOO PAULO II, Pastores dabo vobis(1992), nn. 51-56: O estudo da

    filosofia na formao dos sacerdotes nas circunstncias atuais.

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    1. A formao sacerdotal tem quatro dimenses: humana, espiritual,intelectual e pastoral.

    2. A formao intelectual (inteligncia da f)

    a. A formao intelectual constitui uma expresso necessria da formaohumana e espiritual, possui uma especificidade prpria, e configura-se comouma exigncia irreprimvel da inteligncia, pela qual o homem participa daluz da inteligncia de Deus, e procura adquirir uma sabedoria que se abre ese orienta para o conhecimento de Deus e para a adeso a ele.

    b. Motivaes pastorais que demonstram a necessidade da formaointelectual.

    = Justificao especfica: a natureza prpria do ministrio ordenado.

    # Cada cristo deve estar pronto a defender a fe a dar razo da esperana

    que vive em ns (cfr. 1P 3,15).

    # Com muita maior razo, os candidatos ao sacerdcio e os presbterosdevem manifestar um diligente cuidado pelo valor da formao intelectualna educao e na atividade pastoral, dado que devem procurar umconhecimento cada vez mais profundo dos mistrios divinos para a salvaodos irmos.

    = Urgncia atual: o desafio da nova evangelizao qual o Senhor chamaa Igreja no limiar do terceiro milnio.

    = Premncia dum nvel excelente: dada a situao atual, profundamentemarcada pela indiferena religiosa, por uma difusa desconfiana no que dizrespeito s capacidades reais da razo para atingir a verdade objetiva euniversal, e pelas questes e problemas inditos provocados pelasdescobertas cientficas e tecnolgicas, necessrio tornar os sacerdotescapazes de anunciar o imutvel Evangelho de Cristo precisamente num talcontexto, e de torn-lo digno de credibilidade diante das legtimasexigncias da razo humana.

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    = Necessidade da maior seriedade possvel: dado o atual fenmeno dopluralismo bem acentuado no mbito da sociedade humana, e no da prpriacomunidade eclesial, preciso que os futuros sacerdotes adquiram umaespecial atitude de discernimento crtico.

    c. A formao intelectual dimenso essencial da formao sacerdotal;provas:

    = A formao sacerdotal um processo educativo unitrio com quatrodimenses (humana-espiritual-intelectual-pastoral).

    = As quatro motivaes acima expostas acerca da necessidade da formaointelectual so de carter pastoral.

    = A obrigao do estudo preenche uma grande parte da vida de quem seprepara para o sacerdcio.

    = A obrigao do estudo no constitui um componente exterior e secundriodo crescimento humano-cristo-espiritual-vocacional: por meio do estudo(particularmente da teologia) o futuro sacerdote adere Palavra de Deus,cresce na vida espiritual, e dispe-se a desempenhar o seu ministriopastoral.

    = O objetivo unitrio e multifacetado da formao intelectual preconizadopelo Conclio.

    # A formao intelectual deve ser pastoralmente eficaz.

    # Para isso, deve ser integrada num caminho espiritual marcado pela

    experincia pessoal de Deus, de modo a poder superar uma pura cinciaconceptual e chegar quela inteligncia do corao que primeiro sabe vero mistrio de Deus, e depois capaz de comunic-lo aos irmos.

    2. O estudo da Filosofia

    a. um momento essencial da formao intelectual.

    b. Leva a uma compreenso e interpretao mais profunda da pessoa, dasua liberdade, e das suas relaes com o mundo e com Deus.

    c. A filosofia de grande importncia.

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    = Pelo nexo que existe entre os argumentos filosficos e os mistrios dasalvao estudados em teologia luz superior da f.

    = Pela atual situao cultural bastante generalizada que exalta o

    subjetivismo como critrio e como medida da verdade.

    # Os candidatos ao sacerdcio devem desenvolver uma conscinciareflexiva da relao constitutiva existente entre o esprito humano e averdade que se nos revela plenamente em Jesus Cristo.

    # Somente uma sfilosofia pode ajud-los a desenvolver essa conscinciareflexiva.

    = Para garantir a certeza da verdade que a nica que pode estar na base

    da entrega pessoal a Jesus Cristo e Igreja.

    # questo nada abstrata da prpria verdade se encontram ligadas algumasquestes muito concretas: a identidade do sacerdote e o seu compromissoapostlico e missionrio.

    # Se no se estcerto da verdade, no possvel pr em jogo a prpria vidainteira e ter fora para interpelar a srio a vida dos outros.

    d. A filosofia ajuda a enriquecer a formao intelectual com o culto verdade.

    = O culto verdade uma espcie de venerao amorosa pela verdade.

    = Ele leva a reconhecer que a verdade no criada medida do homem,mas que confiada ao homem como dom da Verdade suprema (=Deus).

    # A razo humana, mesmo com limites e por vezes com dificuldade, podeatingir a verdade objetiva e universal, inclusive aquela que diz respeito a

    Deus e ao sentido radical da existncia.

    # A fno pode prescindir da razo e do afde pensar os seus contedos,como testemunhava a grande mente de S. AGOSTINHO: Desejei ver com

    inteligncia o que acreditei, e muito tive que discutir e esforar-me.

    3. As chamadas cincias do homem

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    a. So: sociologia; psicologia; pedagogia; cincia da economia e dapoltica; cincia da comunicao social.

    b. Pertencem ao mbito bem preciso das cincias positivas ou descritivas.

    c. Podem ser de grande utilidade para uma compreenso mais profunda dohomem e das linhas evolutivas da sociedade, em ordem ao exerccio o maisencarnado possvel do ministrio pastoral.

    d. Ajudam o futuro sacerdote a prolongar a contemporaneidade vivida

    por Cristo, qual referia-se PAULO VI: Cristo fez-se contemporneo aalguns homens e falou a linguagem deles; a fidelidade ao mesmo Cristo

    exige que esta contemporaneidade continue.

    E. JOO PAULO II, Fides et ratio(1998)

    1. Sntese geral

    a. A filosofia tem o seu valor prprio no que diz respeito inteligncia daf.

    b. A filosofia encontra graves limites quando esquece ou rejeita as

    verdades da Revelao.

    c. A fe a filosofia exercem uma funo mtua tanto de avaliao crticae purificadora quanto de estmulo a progredir na busca e noaprofundamento.

    d. Para o bem e para o progresso do pensamento, a filosofia e a teologia

    tm o dever de recuperar a sua genuna relao mtua.

    2. Sntese por captulos

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    a. Primeiro captulo: a Revelao da Sabedoria de Deus.

    = A verdade que a Revelao nos faz conhecer no o fruto maduro ou oponto culminante dum pensamento elaborado pela razo, mas um dom

    gratuito de Deus acolhido pela f.

    = Huma dupla ordem de conhecimento: o da f, apoiado no testemunho deDeus e garantido pela ajuda sobrenatural da graa, e o da filosofia, apoiadona experincia dos sentidos e garantido pela luz do intelecto.

    = A Revelao de Deus, que se cumpre em Cristo, insere-se no tempo e nahistria; a histria torna-se, portanto, o lugar em que podemos constatar oagir salvfico de Deus.

    = A Revelao oferece ao homem a verdade ltima sobre a sua prpria vidae sobre o seu destino na histria; fora desta perspectiva, o mistrio daexistncia pessoal do homem um enigma insolvel; aceitando, com um atolivre de f, a Revelao, o homem chega a compreender o mistrio da suaexistncia.

    b. Segundo captulo: creio para entender.

    = Entre o conhecimento da fe o conhecimento da razo huma profunda

    ligao; se a razo e a fso separadas, o homem no pode conhecer demodo adequado a si mesmo, o mundo e Deus.

    = O homem, lendo com a sua razo o maravilhoso livro da natureza, podechegar ao conhecimento do Deus Criador; h, portanto, no homem, umacapacidade metafsica!

    = Tudo aquilo que a razo atinge, adquire pleno significado somente se posto no horizonte da f.

    # A razo, e portanto a filosofia, deve reconhecer o seu limite, representadopelo mistrio da Cruz, ponto chave que desafia qualquer filosofia; aqui todatentativa de reduzir o plano salvfico do Pai a pura lgica humana destinada ao fracasso.

    # A razo no pode esvaziar o mistrio de amor que a Cruz faz presente; aCruz, pelo contrrio, drazo a resposta ltima que busca: o critrio deverdade e de salvao no a sabedoria das palavras mas a Palavra daSabedoria (cfr. 1 Cor 1,17-2,16).

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    # A filosofia desafiada a acolher, na loucura da Cruz, a genuna crtica atodos aqueles que se iludem de possuir a verdade, encalhando-a nos bancos

    de areia dos sistemas deles.

    # A relao entre fe filosofia encontra na pregao de Cristo crucificado eressuscitado o escolho contra o qual pode naufragar, mas alm do qual podedesembocar no oceano da verdade; aqui se evidencia o confim entre a razoe a f, mas tambm o espao em que ambos podem se encontrar.

    c. Terceiro captulo: entendo para crer.

    = O homem estperenemente em busca da verdade, no tanto das verdadesparciais quanto da verdade total, quer dizer, do sentido da vida e da morte;

    tanto assim, que ele pode ser definido como aquele que busca a verdade;uma busca to profundamente enraizada na natureza humana no pode sertotalmente intil e v.

    = Mas uma busca do sentido da vida e da morte no pode ter sucesso a noser no absoluto; a fcristvem ao encontro do homem oferecendo-lhe apossibilidade concreta de ver realizado o escopo desta busca; assim, a fe arazo conduzem verdade na sua plenitude.

    d. Quarto captulo: a relao entre a fe a razo

    = Os Padres acolheram plenamente a razo aberta ao absoluto e nelainseriram a riqueza proveniente da Revelao.

    = A filosofia escolstica confirmou a harmonia do conhecimento filosfico edo conhecimento da f.

    # A fpede que o seu objeto seja compreendido com a ajuda da razo.

    # A razo, no cume da sua busca, admite como necessrio aquilo que a fapresenta.

    = S. TOMS DE AQUINO atingiu o ponto mais alto da harmonia entre ferazo.

    # A natureza, objeto da filosofia, pode contribuir compreenso daRevelao.

    # A fno teme a razo, mas busca-a e confia nela.

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    # A fsupe e aperfeioa a razo, assim como a graa supe e leva acumprimento a natureza.

    # A razo, iluminada pela f, libertada da fragilidade e dos limites que

    derivam do pecado e acha a fora para elevar-se ao conhecimento domistrio de Deus Uno e Trino.

    = A partir da Baixa Idade Mdia, a distino entre fe razo transformou-seprogressivamente em nefasta separao; desse modo chegou-se a umafilosofia separada e absolutamente autnoma a respeito dos contedos da f,e a um conhecimento racional alternativo f.

    = Na pesquisa cientfica foi-se impondo uma mentalidade positivista que seafasta de qualquer referncia viso cristdo mundo e que rejeita qualquerapelo viso metafsica e moral.

    = Como conseqncia da crise do racionalismo, tem tomado corpo,finalmente, o niilismo.

    = O resultado disso tudo tem sido o empobrecimento da razo e da f:

    # A razo, privada da contribuio da Revelao, percorre sendeiros lateraisarriscando de perder de vista a sua meta final.

    # A f, privada da razo, salienta o sentimento e a experincia, correndo orisco de deixar de ser uma proposta universal.

    e. Quinto captulo: as intervenes do Magistrio em matria filosfica

    = Perante as desvios do pensamento filosfico, o Magistrio da Igreja temintervindo vrias vezes, no para propor uma filosofia prpria ou paracanonizar alguma filosofia em especial, mas para reagir de modo claro e

    firme quando teses filosficas falsas ou discutveis semeiam graves errosameaando a reta compreenso do dado revelado e confundindo a fdopovo de Deus.

    = O Magistrio eclesistico deve:

    # Exercer com autoridade o seu discernimento crtico perante as filosofiasque chocam contra a doutrina crist.

    # Indicar quais pressupostos e concluses filosficas so incompatveis com

    a f.

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    = Fazendo assim, a Igreja quer provocar, promover e encorajar o

    pensamento filosfico, para que no feche de antemo a estrada que conduzao reconhecimento do mistrio.

    = Por isso a Igreja tem censurado:

    # O fidesmo e o tradicionalismo radical, pela desconfiana deles nascapacidades naturais da razo.

    # O racionalismo e o ontologismo, porque atribuem razo natural aquiloque conhecvel somente luz da f.

    = O Conclio Vaticano I mostrou que a razo e a fso, ao mesmo tempo,inseparveis e irreduzveis.

    = Hoje a Igreja deve:

    # Combater a radical desconfiana na razo por parte daqueles que falam dofim da metafsica.

    # Denunciar o neofidesmo teolgico que no reconhece a importncia doconhecimento racional e da sabedoria filosfica para a inteligncia da f,que reserva pouca considerao teologia especulativa e que despreza a

    filosofia clssica, cujos termos tm sido empregados pela inteligncia da fepelas formulaes dogmticas.

    # Combater o biblicismo que tende a fazer da leitura e da exegese da

    Sagrada Escritura o nico ponto de referncia verdadeiro, esquecendo aregra suprema da prpria fque provm Igreja da unidade Tradio-Escritura-Magistrio.

    # Frisar o seu grande interesse pela filosofia e comprometer-se na genunarenovao dela, indicando alguns percursos concretos a seguir.

    # Frisar que o estudo da filosofia reveste um carter ineliminvel naestrutura dos estudos teolgicos e na formao dos sacerdotes, os quais, navida pastoral, devero confrontar-se com as instncias do mundocontemporneo e captar as causas dalguns comportamentos dele, para daruma pronta resposta a elas.

    f. Sexto captulo: interao entre teologia e filosofia

    = A teologia deve entrar em relao com as filosofias elaboradas no curso dahistria.

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    # Para uma reta compreenso da Bblia e da tradio eclesial, expressada emformas de pensamento de determinadas tradies filosficas, o telogo deveconhecer estas tradies filosficas.

    # Sem a contribuio da filosofia, o telogo no pode esclarecer alinguagem sobre Deus, as relaes trinitrias, a ao criadora de Deus, arelao entre Deus e o homem, a identidade de Cristo, verdadeiro Deus everdadeiro homem.

    # O telogo moral deve necessariamente recorrer a conceitos de ticafilosfica como: lei moral, conscincia, liberdade, responsabilidade, culpa.

    = O problema da inculturao.

    # A Igreja, entrando em contato com as culturas, no pode deixar s costasaquilo que adquiriu pela inculturao no pensamento grego-latino; rejeitartal herana seria ir contra o desgnio providencial de Deus, que conduz aIgreja ao longo das estradas do tempo e da histria.

    # A Igreja de cada poca sentir-se-enriquecida pelas adquisies naaproximao atual s culturas orientais e acharassim novas indicaes paradialogar frutuosamente com as culturas do amanh.

    = Entre a teologia e a filosofia deve instaurar-se uma relao decircularidade:

    # Para uma melhor compreenso da Palavra, a teologia deve ajudar-se dafilosofia.

    # A filosofia sai enriquecida do encontro com a Palavra de Deus porque

    descobre horizontes insuspeitveis.

    # A fecundidade desta relao de circularidade tem sido demonstrada:

    + Tantos telogos cristos destacaram-se como grandes filsofos.

    + Os filsofos que fizeram filosofia em unio vital com a f, descobriramverdades que, apesar de serem naturalmente acessveis razo, talvez nuncateriam descoberto sem a contribuio da Revelao.

    + Sem a influncia estimulante da Palavra de Deus, boa parte da filosofiamoderna e contempornea no existiria.

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    # A teologia precisa da filosofia, porque a fse no pensada no nada(STO. AGOSTINHO); a filosofia precisa da Revelao para no perder-seno erro e para ampliar os seus horizontes.

    = desejvel que telogos e filsofos se deixem guiar pela nica autoridadeda verdade, de modo que seja elaborada uma filosofia em consonncia coma Palavra de Deus, que sero terreno de encontro entre as culturas e a fcrist, o lugar de entendimento entre crentes e no crentes.

    g. Stimo captulo: exigncias e tarefas atuais

    = A filosofia deve reencontrar a sua dimenso sapiencial de busca dosentido ltimo e global da vida.

    # No pode ser nem radicalmente fenomenista nem relativista.

    # Deve ter alcance autenticamente metafsico, capaz de transcender os dadosempricos, para chegar a algo absoluto, ltimo e fundante.

    = A metafsica mediao privilegiada na pesquisa teolgica; daqui operigo que representam para a fcristteorias filosficas como ohistoricismo, o cientificismo, o pragmatismo e o niilismo.