Introdução às Energias Renováveis (Apostila_Eletronorte)

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Apostila de energias renováveis da eletronorte

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INTRODUO S ENERGIAS RENOVVEIS

PROMOO: ELETRONORTE - Centrais Eltricas do Norte do Brasil REALIZAO: Grupo de Estudos e Desenvolvimento de Alternativas Energticas GEDAE/FEE/ITEC/UFPA

OBJETIVO O objetivo desta apostila fornecer aos participantes do curso os conceitos bsicos sobre as fontes renovveis de energia, familiarizando-os com suas caractersticas, impactos, vantagens, desvantagens, e aplicaes prticas. A abordagem utilizada bastante sucinta, por tratar-se de um tema muito abrangente e que necessita de estudos mais aprofundados sobre cada uma das fontes aqui apresentadas. Dessa forma, este texto deve ser entendido como uma inicializao no assunto, que poder ser mais aprofundada de acordo com o interesse de cada leitor, fazendo uso da bibliografia citada como passo inicial.

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SUMRIO Introduo 1. Conceitos Bsicos 1.1. A Importncia da Energia 1.2. Energia e Potncia 1.3. Unidades de Energia e Potncia 1.4. Tipos e Fontes de Energia 1.5. Impactos Ambientais 1.6. O Efeito Estufa 1.7. Mecanismos de Desenvolvimento Limpo 2. Energia Solar 2.1. O Sol e suas Caractersticas 2.2. Geometria Sol-Terra 2.3. Radiao Solar Extraterrestre e Sobre a Terra 2.4. Potencial Solar e sua Avaliao 2.5. Energia Solar-Trmica 2.6. Energia Solar Fotovoltaica 2.7. Vantagens e Desvantagens da Energia Solar 3. Energia Elica 3.1. O Vento e suas Caractersticas 3.2. Perfil do Vento e Influncia do Terreno 3.3. Potencial Elico e sua Avaliao 3.4. Aerogeradores 3.5. Aplicaes de Sistemas Elicos 4. Energia Hidrulica 4.1. Definio de PCH 4.2. Centrais Quanto Capacidade de Regularizao 4.3. Centrais Quanto ao Sistema de Aduo 4.4. Centrais Quanto Potncia Instalada e Quanto Queda de Projeto 4.5. Componentes de uma PCH 4.6. Estudos Necessrios para Implantao do Empreendimento 4.7. Geradores Hidrocinticos 3

5. Energia Ocenica 5.1. Energia das Mars 5.2. Energia das Ondas 5.3. Energia das Correntes Martimas 6. Energia da Biomassa 6.1. Conceito de Biomassa 6.2. Tipos de Biomassa 6.3. Combusto 6.4. Gaseificao 6.5. Biodigesto 6.6. Limpeza dos Gases 6.7. Biodiesel 7. Energia do Hidrognio 7.1. O Hidrognio 7.2. Clulas a Combustvel 7.3. Princpio de Funcionamento da Clula a Combustvel 7.4. Principais Componentes de um Sistema com Clula a Combustvel 7.5. Tecnologias Empregadas em Clulas a Combustvel 7.6. Principais Aplicaes 8. Sistemas Hbridos 8.1. Estratgias de Operao 8.2. Vantagens e Desvantagens 8.3. Caractersticas de Sistemas Isolados e Interligados Consideraes Finais Bibliografia

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INTRODUO A energia um bem indispensvel existncia de qualquer ser vivo. Dentre as suas formas finais, a energia eltrica uma das mais elegantes, e est presente na vida de muitos, mas no de todos os seres humanos. A busca pela universalizao do atendimento eltrico constitui-se em um constante desafio vivido por cidados comuns, autoridades, governos e demais seguimentos da sociedade. Um dos principais motivos da ausncia de energia eltrica na vida de milhares de pessoas no mundo a condio de pobreza aliada situao de isolamento geogrfico em que elas se encontram. Apesar de ainda crtico, esse panorama vem se alterando com o passar do tempo. O avano na pesquisa e desenvolvimento de fontes alternativas baseadas em energias renovveis, somado a fortes programas governamentais e sociais, preocupados principalmente com a excluso proporcionada pela ausncia de energia eltrica e com os crescentes problemas ambientais, tm sido responsveis por profundas e importantes mudanas. Pases como a Alemanha, Espanha e Estados Unidos j contam com grande penetrao de energias renovveis em suas matrizes energticas. A nvel nacional, programas governamentais como o PROINFA e o Luz Para Todos vm se constituir em grandes incentivos ao desenvolvimento de estudos que visem tornar as fontes renovveis ainda mais competitivas. A expanso do atendimento eltrico no Brasil, assim como em muitos outros pases ao redor do mundo, d-se, basicamente, atravs da extenso de linhas de transmisso pertencentes ao sistema interligado, ou atravs da gerao trmica de pequeno, mdio e, por vezes, at mesmo grande porte, usualmente com a utilizao de grupos geradores com combustvel de origem fssil, principalmente leo diesel. A primeira uma soluo vivel quando o sistema de transmisso/distribuio no se encontra muito distante do centro de consumo a ser atendido, ou quando este tem porte suficiente para representar atratividade econmica para a concessionria. O segundo tem seus maiores atrativos na relativa facilidade de aquisio, instalao e uso, alm do reduzido custo inicial. Tais solues, entretanto, no constituem alternativas nicas. Ao contrrio, o acelerado crescimento tcnico das fontes renovveis vem tornando-as competitivas, e por muitas vezes mais viveis do que as fontes ditas convencionais. Sistemas renovveis, cujas fontes primrias so dos tipos solar fotovoltaica (FV) e elica, esto entre as opes mais consideradas atualmente, embora haja tambm a possibilidade de utilizao de sistemas a biomassa e pequenas centrais hidreltricas. Porm, para que se possa analisar de forma criteriosa em que situao e com que tipo de configurao o sistema o mais vivel para determinada aplicao, diversos fatores devem ser considerados. Dentre eles, os principais so os aspectos 5

tcnicos e econmicos de cada alternativa. Anlises de viabilidade tcnicoeconmica de sistemas de gerao de energia eltrica, principalmente aqueles que visam ao atendimento de locais remotos, so associadas a aspectos como a logstica de instalao, custos de capital, facilidades e custos de manuteno e operao, disponibilidade de combustvel, seja ele renovvel ou no, modularidade, confiabilidade, dentre outros.

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CAPTULO 1 CONCEITOS BSICOS 1.1. A Importncia da Energia

A energia fundamental para qualquer ser vivo, pois utilizada no atendimento de suas necessidades bsicas como a locomoo, a alimentao e a prpria manuteno da vida. O homem, de modo especial, dentre todos os seres vivos, o mais dependente da energia em todas as suas diversas formas, pois desenvolveu, ao longo da histria, mquinas, usos e costumes que precisam cada vez mais de energia, principalmente a eltrica. O homem busca melhor qualidade de vida, desde a pr-histria, fundamentalmente atravs de uma maior disponibilidade de bens de consumo, o que implica em maior produo. A produo precisa ser processada, transformando a matria-prima em produtos acabados, e a energia possibilita esse processo. Os produtos acabados precisam ser transportados, conservados e comercializados e, mais uma vez, a energia se faz necessria. Muitas maneiras de transformar a energia foram sendo criadas pelo ser humano, diversas tecnologias energticas foram consolidadas para que fossem melhor aproveitadas para o benefcio da humanidade. Entretanto, hoje em dia uma grande parte da populao mundial carece de uma vida mais digna e sobrevive isolada do mundo, sem condies decentes de sade, higiene, lazer, educao e cidadania, em grande parte porque no dispe de energia para satisfazer suas necessidades bsicas. No Brasil, com suas dimenses continentais, poltica energtica de fontes renovveis no convencionais ainda carecendo de incentivos mais firmes e constantes, distribuio de renda desigual, e com uma populao vivendo nos mais diversos climas e regies campos, cidades, ilhas, semi-rido, alagados, etc. os benefcios da disponibilidade de energia no chegam a todos os brasileiros. Hoje, com a adoo de programas como o Luz Para Todos e o PROINFA, busca-se diminuir esta desigualdade. A escolha da forma de energia ou dos mecanismos para process-la no nica e depende de diversos fatores como: cultura do povo, disponibilidade de recursos energticos, custo de implantao, operao e manuteno, viabilidade tcnica, etc. A produo, armazenamento e utilizao da energia pode ser feita atravs do uso de recursos naturais renovveis ou no-renovveis, com maior ou menor impacto no meio ambiente, com custos bastante diferenciados, com emprego imediato ou posterior, e com maior ou menor benefcio ao homem. As energias qumica, nuclear, trmica, mecnica, potencial e eltrica so algumas das formas conhecidas de utilizao da energia. A energia eltrica, por sua caracterstica funcional e no poluente (pelo menos no que concerne ao seu uso final) a mais difundida no mundo. 7

O Brasil, grande produtor de energia eltrica atravs de suas hidreltricas, no consegue atender todos os seus habitantes e indstrias apenas com esse recurso, quer por insuficincia na produo, deficincias nos sistemas de transmisso e distribuio, questes geogrficas, ou mesmo pelo elevado custo da energia. Em funo dessa realidade, outras alternativas de produo esto sendo, ainda que timidamente, incorporadas matriz energtica brasileira. Alm do j consagrado uso de termeltricas e grupos geradores a diesel, fontes alternativas e renovveis procuram ocupar seu espao no mercado e na sociedade. As energias elica e solar fotovoltaica destacam-se dentre elas, pois o Brasil possui as condies bsicas, sol e vento, adequadas ao atendimento das demandas de vrias regies. 1.2. Energia e Potncia

O conceito de energia bastante amplo e essencial na Fsica. Qualquer objeto que desenvolva trabalho est fazendo uso de energia para tal. Pode-se, por exemplo, usar energia na forma de eletricidade para aquecer um material, ou energia potencial para armazenar gua em um reservatrio. A prpria etimologia da palavra energia vem do grego s (ergos) que significa trabalho. Nos dicionrios da lngua portuguesa tambm encontra-se a definio de energia como sendo a capacidade dos corpos de desenvolver uma fora ou produzir trabalho. A potncia, por sua vez, a taxa com que se produz trabalho. Assim a potncia relaciona-se com a energia atravs da relao

P=

dE dt dE a taxa de variao da energia no tempo. dt

sendo P a potncia, E a energia e

Quando a variao da energia no tempo constante, a expresso anterior reduz-se a

P=

E t

As expresses anteriores podem ser reescritas colocando a energia em funo da potncia, das seguintes formas, respectivamente

E = PdteE = P.t

1.3.

Unidades de Energia e Potncia

O Princpio de Conservao da Energia implica em que todos os tipos de energia podem ser medidos atravs de uma nica unidade. Entretanto, antes do 8

conhecimento desse princpio, algumas formas de energia foram sendo descobertas e utilizadas e, com elas, suas respectivas unidades. Em funo disto, foi necessria a criao de fatores de converso que relacionassem as diversas unidades de energia conhecidas. A energia trmica, por exemplo, tem como unidade comum a caloria (cal), que indica a quantidade de calor necessria para elevar em 1 oC a temperatura de 1 g de gua. J o sistema de medidas britnico adota o BTU como unidade para o calor. Entre essas duas unidades a relao de converso 1 BTU = 252 cal No Sistema Internacional de Unidades (SI), a energia medida em joules (J), determinando o trabalho realizado por uma fora de 1 newton (N) em um deslocamento de 1 m na direo desse deslocamento. A relao entre joule e caloria 1 cal = 4,18 J O uso de cada uma delas caracterstico de cada rea. Por exemplo, na rea de sistemas eltricos de potncia usual medir energia atravs do Wh (watt-hora) e seus mltiplos, kWh, MWh e GWh. O kWh equivale aplicao de uma potncia de 1.000 W durante o tempo de uma hora. Portanto: 1 kWh = 1.000 W x 3.600 s = 3,6 x 106 J = 0,86 x 106 cal Em relao potncia, no Sistema Internacional de Unidades (SI), essa grandeza expressa em watts, sendo que 1 watt (W) a potncia desenvolvida quando se gasta 1 joule de energia em 1 segundo. Outras unidades comuns de potncia so o cavalo-vapor (CV) e o horse-power (HP), sendo: 1 CV = 735,5 W 1 HP = 746 W 1.4. Tipos e Fontes de Energia

Fontes de energia so substncias e meios que permitem produzir energia til diretamente ou por transformao. Podem ser dos tipos renovveis (natural ou artificialmente) e no renovveis. Entre as renovveis naturalmente esto os rios, a radiao solar e os ventos; entre as renovveis artificialmente podem ser citados o reflorestamento e os resduos em geral; e entre as no renovveis, o petrleo, o gs natural, o carvo mineral e o urnio. Algumas das fontes energticas mais conhecidas para a gerao de energia eltrica so a solar, a elica, a trmica, a qumica, a hidrulica e a nuclear. A energia solar na Terra decorre da incidncia dos raios solares na forma de luz e calor e , na realidade, a origem de todas as outras formas de energia 9

conhecidas. Seu aproveitamento estende-se desde a secagem de produtos at os mais modernos coletores solares planos e parablicos e os painis fotovoltaicos. A energia elica decorre do movimento dos ventos e tem sido aproveitada h sculos em embarcaes vela, moinhos de vento e cata-ventos para bombeamento de gua. Modernamente, essa forma de energia tem sido utilizada atravs dos aerogeradores, ou turbinas elicas, que convertem a energia elica em energia eltrica. A energia trmica manifesta-se sob forma de calor, podendo ser armazenada em determinados sistemas, sendo que quanto mais quente estiver um corpo, maior a energia armazenada. Os exemplos de utilizao dessa forma de energia vo desde corriqueiras aplicaes domsticas, como o ferro de engomar e os aquecedores, at os fornos de alta temperatura utilizados na indstria e as centrais termeltricas, que utilizam geralmente o leo diesel como combustvel. A energia qumica liberada durante uma reao qumica. Alguns exemplos so a queima do carvo, da gasolina e de leos combustveis, e as pilhas e baterias eltricas. A energia hidrulica a energia cintica ou potencial das guas. Seu aproveitamento estende-se de pocas remotas, na forma de rodas dgua, at os dias de hoje, na forma de centrais hidreltricas de diversos portes. As formas mais comuns de aproveitamento dos recursos hdricos so as hidreltricas de grande porte, que visam atender grandes centros e indstrias. Elas fazem uso de altas quedas e volumosos cursos dgua, de grandes estruturas na forma de barragens, e requerem freqentemente a alterao do fluxo dos rios e a formao de grandes lagos artificiais. Essa forma de gerao de energia a principal na matriz energtica brasileira. As pequenas centrais hidreltricas, que destinam-se ao atendimento de pequenos consumidores, como comunidades rurais e fazendas isoladas, necessitam para seu funcionamento de pequenos desnveis em pequenos cursos dgua e obras civis de pequeno ou mdio porte. As rodas dgua so tambm uma boa opo quando se trata de pequenos aproveitamentos, exigindo apenas pequenos desnveis em pequenos cursos dgua. A energia nuclear produzida nas reaes nucleares (comumente a fisso nuclear) e origina-se da transformao de parte da massa das partculas reagentes em energia. Como exemplos tm-se os reatores nucleares. Dentre as diversas formas de aproveitamento da biomassa encontram-se os gaseificadores, que produzem gs combustvel (gs pobre) a partir da biomassa de resduos (lixo urbano, cascas de gros, resduos de serrarias, bagao de cana, etc.). Bastante comuns so tambm os biodigestores, que produzem o biogs sem a presena de oxignio, a partir de vegetais aquticos (aguaps, algas, etc.), resduos 10

rurais (cascas de gros, capim, esterco animal), resduos urbanos e resduos industriais, produzindo ainda como subproduto o biofertilizante. Tambm os diversos tipos de fornos, que transformam madeira em carvo vegetal, ou utilizam-se da queima direta de lenha so exemplos do aproveitamento da biomassa como fonte energtica. Finalmente, a energia eltrica pode ser obtida a partir de qualquer outra forma de energia, atravs de processos de transformao diretos ou indiretos. A produo ou transformao de energia eltrica realizada atravs do uso de algum tipo de fonte de energia, primria ou secundria. As fontes primrias so aquelas encontradas diretamente na natureza e as secundrias so as obtidas por processos de transformao das primrias. As fontes de energia podem tambm ser classificadas em renovveis ou no renovveis, podendo ser as primeiras ainda de carter natural independente da ao do ser humano - ou artificial dependente deste. Fontes No-Renovveis O petrleo, o carvo mineral, o gs natural e o xisto betuminoso so exemplos de fontes no-renovveis de energia, porque no so produzidos mesma taxa em que so consumidos e, por essa razo, se continuarem a ser utilizados nas taxas atuais, tero seus estoques esgotados em um perodo mais ou menos curto. A abundncia dessas fontes na natureza e a relativa praticidade de sua obteno e transformao levaram ao seu uso intensivo, principalmente nos dois ltimos sculos. O uso irrestrito desses recursos, associado falta de cuidados com o meio ambiente, inicialmente no vislumbrados ou no verificados, simplesmente resultaram, nos dias de hoje, na escassez do petrleo em mdio prazo e no comprometimento de florestas e grandes mananciais de gua. Paralelamente a isto, a fauna e a flora, diretamente afetadas pelos resduos provenientes da explorao e aproveitamento dessas fontes de energia, tm pagado um preo muito alto. As fontes no-renovveis de energia, ainda que hoje representando a principal fora motriz nos pases desenvolvidos, precisam ser utilizadas de modo mais racional, observando-se no apenas os fatores tcnicos e econmicos, mas tambm a extenso dos impactos ambiental e social do seu uso. O leo diesel, por exemplo, ainda um componente importante na gerao de eletricidade em localidades isoladas e em sistemas de reserva (backup), em aplicaes que no permitem a interrupo no fornecimento de energia. Os grupos geradores a diesel existentes no mercado abrangem uma faixa ampla de potncia, atendendo aos mais diversos tipos de aplicaes. O custo de implantao dos grupos geradores a diesel so quase sempre mais atraentes quando comparados com os dos sistemas renovveis de capacidade equivalente. Uma anlise de tempo de retorno de investimento, no entanto, pode revelar que o maior capital inicialmente investido nos sistemas renovveis recuperado aps alguns anos de operao. 11

Alm disso, a menor agresso ao meio ambiente, o menor nvel de rudo dos sistemas que utilizam as fontes renovveis, alm de seu maior tempo de vida til, so fatores que devem ser considerados na escolha da fonte de energia e da tecnologia utilizada. Fontes Renovveis Consideram-se fontes renovveis de energia aquelas que apresentam taxas de reposio equivalentes s de sua utilizao, podendo essa reposio ocorrer naturalmente ou artificialmente. Como exemplos das renovveis naturalmente podem ser citadas as fontes solar, elica, hdrica, e a biomassa natural. As renovveis artificialmente so representadas pela biomassa plantada e pelos resduos gerados nas indstrias e demais processos controlados pelo ser humano, inclusive o lixo. Considerada a definio de fonte renovvel do pargrafo anterior, deve ter em mente que fontes como a biomassa natural s podem ser consideradas renovveis se houver o seu correto manejo. Caso contrrio, elas sero no renovveis. As fontes renovveis esto disponveis em abundncia no territrio brasileiro e dentre as que oferecem maior potencial para explorao esto: a radiao solar, o vento, a gua e a biomassa com suas diversas formas de utilizao. As caractersticas geogrficas do Brasil, com grande nmero de pequenos ncleos habitacionais isolados, favorecem um estudo detalhado da competitividade dessas fontes com aquelas no renovveis. O amadurecimento das tecnologias para sistemas elicos, solar-fotovoltaicos e de biomassa certamente torna atrativo o uso dessas fontes em aplicaes especficas e em operaes integradas com outras tecnologias. O uso exclusivo das fontes renovveis para soluo definitiva dos problemas de energia uma opo ainda remota; entretanto, o desenvolvimento de novas tecnologias para melhor aproveitamento desses recursos e a integrao com outras formas de energia podem, sem dvida alguma, minimizar a dependncia brasileira e mundial de fontes no-renovveis de energia, alm de contribuir para a preservao do meio ambiente. No se pode, entretanto, excluir a possibilidade de uso das energias renovveis, ainda que com custos de implantao elevados, como o caso dos sistemas elicos e os fotovoltaicos, sem considerar os benefcios sociais e ambientais atrelados a ele. 1.5. Impactos Ambientais

Todos os tipos de aproveitamento energtico conhecidos causam, de uma forma ou de outra, algum impacto ambiental, que deve ser considerado quando da escolha do tipo de aproveitamento e de sua implantao. A alterao da paisagem basicamente comum a todos eles. 12

O aproveitamento do gs natural provoca a liberao de gases de combusto e de calor atmosfera. Existem tambm os riscos de vazamento e exploso no armazenamento e durante o transporte. As centrais hidreltricas podem resultar em alteraes importantes como a obstruo que a barragem apresenta passagem de nutrientes e organismos vivos, a perda de terras frteis, de tipos vegetais, de reservas minerais, alm de modificaes na paisagem e de alteraes nas atividades scio-econmicas das populaes. Os derivados do petrleo liberam para a atmosfera calor e produtos de combusto (gases txicos, poeira, compostos orgnicos, etc.) e apresentam riscos de vazamento e exploso. A energia nuclear produz rejeitos radiativos de difcil eliminao, alm de apresentar riscos de acidentes graves. A biomassa causa a emisso de slidos em suspenso e de gases quentes, nocivos atmosfera. A energia elica causa pequenos impactos visuais e sonoros, interferncia eletromagntica, morte e alteraes da rota migratria de pssaros. No caso da energia solar os impactos podem ser considerados de menor escala ainda. Os visuais vm sendo contornados com o surgimento de tecnologias que integram os equipamentos de gerao s edificaes. Outros impactos considerados, como os ocasionados no processo de fabricao de clulas fotovoltaicas, so praticamente desprezveis. 1.6. O Efeito Estufa

O Efeito Estufa um fenmeno natural responsvel por manter a temperatura da Terra maior do que a temperatura que o planeta teria caso no houvesse atmosfera. Este fenmeno, dentro de limites aceitveis, a maneira que a Terra possui para manter constante a temperatura, pois, somente assim, a vida seria propcia. No entanto, com o desenvolvimento tecnolgico e industrial pelo qual a sociedade tem passado durante os anos, o aumento da emisso de gases poluentes na atmosfera terrestre vem agravando este fenmeno natural, provocando o aumento da temperatura do planeta, o que acarreta em vrios desequilbrios ambientais decorrentes do Aquecimento Global. O Efeito Estufa ocorre da seguinte forma: quando o planeta recebe a radiao solar, perto de 35% dessa radiao refletida novamente para o espao, permanecendo os outros 65% retidos na Terra. Isto ocorre principalmente devido presena na atmosfera de gases como o Dixido de Carbono, o Metano, os xidos de Nitrognio e o Oznio (correspondente a menos de 1% desta), pois estes evitam 13

que os raios infravermelhos sejam refletidos para o espao, permitindo assim a presena de calor suficiente para a vida no planeta. Entretanto, fatores como o incremento da utilizao de combustveis fsseis e a destruio das florestas tropicais que aumentam a concentrao de dixido de carbono, alm da emisso de gases como o metano e os clorofluorcarbonetos, favorecem o aumento da temperatura global. Prev-se que o aquecimento global venha a ser em torno de 2 a 6 C nos prximos 100 anos, o que no s alterar o clima a nvel mundial como tambm aumentar o nvel mdio do mar em pelo menos 30 cm, o que poder interferir na vida de milhes de pessoas que habitam as reas costeiras mais baixas. Alm do aumento da temperatura e conseqente aumento do nvel das guas, o Aquecimento Global acarretar em vrios problemas para a sociedade como, por exemplo, efeitos sobre a sade humana, economia e meio ambiente. Em relao ao meio ambiente importantes mudanas so diretamente ligadas ao aquecimento global: derretimento das calotas polares, aumento do nvel do mar, mudanas das condies climticas, etc. Estes fatores podem interferir no apenas nas atividades humanas mas tambm nos ecossistemas. O aumento da temperatura global faz com que um ecossistema mude; por exemplo, algumas espcies podem ser foradas a sair de seus habitats, podendo resultar na sua extino, enquanto outras podem proliferar-se, invadindo outros ecossistemas. Alm disso, o aquecimento global responsvel pelo aumento de enchentes, de reas desrticas, e de fenmenos como cliclones e furaces. Logo, a sociedade como um todo passou a dar mais importncia a este assunto e comeou a buscar maneiras de amenizar as causas do Aquecimento Global. Algumas medidas adotadas so apresentadas a seguir. Painel Intergovernamental sobre as Mudanas do Clima (IPCC) IPCC significa Intergovernmental Panel on Climate Change, ou seja, Painel Intergovernamental sobre as Mudanas do Clima. Este painel uma ferramenta que os governos adotaram para estimarem previses e tendncias futuras das mudanas climticas globais, com o intuito de tomar decises polticas que evitem impactos indesejveis. O aquecimento global vem sendo estudado pelo IPCC e um dos ltimos relatrios divulgados faz algumas previses a respeito das mudanas climticas, as quais so a base para discusses entre polticos e a classe cientfica. Embora as previses do IPCC sejam consideradas as melhores disponveis, elas so o centro de uma grande controvrsia cientfica. O IPCC admite a necessidade do desenvolvimento de modelos analticos melhores para a compreenso cientfica dos fenmenos climticos. Crticos afirmam que as informaes disponveis so insuficientes para determinar a real importncia dos gases causadores do efeito estufa nas mudanas climticas. A sensibilidade do 14

clima aos gases de efeito estufa estaria sendo sobrestimada enquanto fatores externos estariam subestimados. Por outro lado, o IPCC no atribui qualquer probabilidade aos cenrios em que suas previses so baseadas. Segundo os crticos isso leva a distores dos resultados finais, pois os cenrios que predizem maiores impactos seriam menos passveis de concretizao, devido a discordarem das bases do racionalismo econmico. ECO 92 Realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1992, a ECO 92 foi um evento onde vrias naes discutiram as questes ambientais locais e globais, definindo regras e metas em comum, alm de estabelecer novas diretrizes polticas de interesses transversais e concretizar acordos conjuntos. Todos os participantes se comprometeram mais efetivamente em mitigar os emergentes problemas climticos, tendo como conseqncia mais concreta a emisso de um documento sobre a Conveno Quadro sobre Mudanas do Clima (em ingls, United Nations Framework Climate Change Convention, UNFCCC). Atravs desse documento, os 190 pases signatrios reconheciam que as mudanas climticas e o efeito estufa eram os fenmenos que comprometeriam mais gravemente o futuro do planeta. Assim, as novas polticas de preservao seriam de responsabilidade comum a todos. Os signatrios teriam como principal objetivo estabilizar a concentrao dos gases geradores do efeito estufa na atmosfera a fim de no gerar mais riscos para o ecossistema planetrio. O Protocolo de Quioto Realizada em 1997, na cidade de Quioto, no Japo, a terceira Conferncia das Partes (COP 3) foi a mais abrangente e culminou com a adoo do famoso protocolo, um dos marcos mais significativos desde a criao da Conveno Quadro das Naes Unidas sobre Mudana do Clima. Ele foi fundamentalmente utilizado como instrumento de combate s mudanas climticas. O Protocolo de Quioto definiu: que para sua entrada em vigor seria necessria a ratificao por pelo menos 55 pases industrializados e que, juntos, comprometeriam-se a reduzir pelo menos 5,2% de suas respectivas emisses combinadas de Gases do Efeito Estufa (GEEs). Isso corresponde a pelo menos 55% das emisses globais totais dos GEEs em relao aos nveis de 1990, at o perodo entre 2008 e 2012. Ao ser ratificado, o Protocolo passaria a vigorar num prazo mximo de 90 dias, o que significaria passar a ser um compromisso de carter legal, vinculando todas as partes envolvidas. Assim, se alguma das partes no cumprisse o acordo firmado, ficaria sujeita a penalidades dentro do Protocolo. Ressalta-se que, devido a essa vinculao legal, esse histrico compromisso passou a produzir uma reverso da tendncia histrica de crescimento das emisses iniciadas nesses pases cerca de aproximadamente 150 anos atrs. 15

A Unio Europia (EU) assumiu o compromisso de reduzir em 8%; os Estados Unidos, responsveis sozinhos pela emisso de 36% do total de gases, comprometeu-se (sem assinar) a uma reduo de 7%; o Japo concordou em reduzir 6%. Alguns pases como a Rssia e Ucrnia no assumiriam o compromisso de reduo, e outros como Islndia, Austrlia e Noruega ainda teriam permisso para aumentar suas emisses. O Protocolo foi aberto para assinatura de todas as Partes em 16 de maro de 1998 e acabou entrando em vigor somente em 16 de fevereiro de 2005, aps a entrada da Rssia, que ratificou-o em novembro de 2004. O Brasil assinou o Protocolo em 29 de abril de 1998, ratificando-o em 23 de agosto de 2002. Estados Unidos e Austrlia at hoje no ratificaram o Protocolo, mas esto cumprindo internamente metas de reduo dos GEEs com polticas prprias. Os gases potencializadores do Efeito Estufa relacionados no protocolo de Quioto Anexo A so: o dixido de carbono (CO2), o metano (CH4), o xido nitroso (N2O), o hexafluoreto de enxofre (SF6), os hidrofluorcarbonos (HFCs) e os perfluorcarbonos (PFCs). Alm destes, tm-se ainda os clorofluorcarbonos (CFCs). A contribuio de cada um desses gases para o agravamento do efeito estufa depende da sua durao na atmosfera e da interao destes com outros gases e com o vapor dgua, sendo que, a cada um atribudo um Potencial de Aquecimento Global (GWP), que fornece a contribuio relativa devido emisso, na atmosfera, de 1 kg de um determinado gs estufa. Conveno Quadro sobre mudanas do Clima (UNFCCC) Atravs do Painel Intergovernamental em Mudana do Clima (IPCC), a Organizao das Naes Unidas (ONU) passou a desenvolver e a implementar os critrios tcnicos e cientficos que possibilitaram o incio dos debates sobre as mudanas climticas. Em 1990, a ONU, de acordo com as recomendaes do IPCC, iniciou negociaes para a adoo do que viria a ser a primeira UNFCCC, ocorrida em 2 de maio de 1992, na cidade de Nova York. A conveno entrou em vigor em 1994, contando hoje com 186 Partes. Ficou estabelecido que os pases signatrios se encontrariam regulamente para continuar as discusses na Conferncia das Partes (COP). Essas Partes foram divididas em dois grupos, de acordo com os princpios de equidade e "responsabilidade comum, mas diferenciada": Alm dos eventos descritos anteriormente, as pesquisas por novas alternativas energticas para substituir o uso de combustveis fsseis se intensificaram, para diminuir a emisso de poluentes para a atmosfera. A utilizao de biocombustveis e a produo de energia eltrica a partir da energia elica, solar e de hidreltricas esto se tornando cada vez mais importantes para reduzir o aquecimento global. Entretanto, para a implementao destas alternativas, deve-se avaliar os impactos que as mesmas provocaro ao meio ambiente. o que ocorre com as hidreltricas, pois, apesar de estarem na categoria de renovveis e at no16

poluentes, trazem complicaes, porque exigem o alagamento de reas muito extensas. Com isso, a biodiversidade local fica desequilibrada e famlias precisam se desalojar. Os prejuzos para a agricultura tambm so grandes e, em alguns casos, onde houve a inundao de grandes reas de floresta, provoca a emisso de gases que agravam o efeito estufa, pois a vegetao submersa entra em processo de decomposio provocando a emisso destes gases. 1.7. Mecanismos de Desenvolvimento Limpo

Para uma melhor compreenso do surgimento do conceito de criao de mecanismos de flexibilizao para possibilidade de investimento entre pases, com o objetivo de reduo da emisso dos gases de efeito estufa, torna-se necessrio o entendimento dos principais motivadores para criao destes mecanismos, acordos e conferncias realizadas para discusso de solues para as mudanas climticas globais. Proposto pelo Painel Intergovernamental sobre Mudana do Clima (IPCC) um fator de ponderao para somar impulsos de emisses dos diferentes gases de efeito estufa, de forma que produzam resultados equivalentes em termos do aumento da temperatura aps um perodo de tempo especfico. A conferncia das Partes (COP 3) no estabeleceu caminhos para que cada pas atingisse suas metas, no entanto foram criados, trs Mecanismos de Flexibilizao que, quando fossem implementados, deveriam ser capazes de contribuir para a reduo da emisso dos principais gases de efeito estufa (GEE) os quais seriam: 1 - Comrcio de Emisses, que seria um mecanismo que permitiria que um pas que tenha diminudo suas emisses de gases de efeito estufa abaixo de sua meta, possa transferir o excesso das suas redues para outro pas que no tenha alcanado a sua meta; 2 - Implementao Conjunta (IC), que promoveria a possibilidade de cooperao entre dois pases constituintes do Anexo I (pases com metas de reduo de gases causadores de efeito estufa), atravs da implantao de projetos capazes de reduzir a emisso dos GEE; 3 - Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que seria um mecanismo similar ao IC, s que os projetos deveriam ser implantados em pases que no possuem metas de reduo de GEE. Somente no perodo de 29 de outubro a 09 de novembro de 2001 em Marrakech Marrocos durante a realizao da Stima Conferncia das Partes (COP 7), foi que houve a regulamentao completa dos mecanismos de flexibilidade definidos em Quioto durante a realizao da (COP 3). A partir da iniciativa do governo brasileiro, que props a criao de um fundo de desenvolvimento limpo, apresentada 1997 COP, somado idia da criao de 17

um plano de implementao conjunta entre pases desenvolvidos e em desenvolvimento, surgiu o conceito de mecanismo de desenvolvimento limpo MDL. Os projetos de MDL devem contribuir para a reduo de emisses de GEE mensurveis, sendo adicionais s emisses que ocorriam na ausncia da atividade certificada de projeto. Quando esta reduo fica caracterizada, os projetos de MDL podem obter os certificados de reduo de emisso (CRE), podendo ser acumulados pelos pases industrializados que participarem do projeto, de forma que, possam cumprir suas metas de reduo de emisses no primeiro perodo estabelecido pela COP. Dentre os principais motivadores para a criao dos projetos de MDL est a inteno de proporcionar financiamento e tecnologia aos pases em desenvolvimento, devido possibilidade de acesso aos CRE pelos pases industrializados, para que estes consigam cumprir seus compromissos de reduo de emisses. Um dos principais requisitos de um projeto MDL o de aumentar as metas de desenvolvimento sustentvel do pas anfitrio que, normalmente, ser o pas em desenvolvimento. Os pases em desenvolvimento no pertencentes ao Anexo I podem dar entrada com pedido de implementao de projetos capazes de reduzir ou capturar emisses de gases causadores do efeito estufa junto ao Conselho Executivo do MDL, tendo a possibilidade de obter os Certificados de Emisses Reduzidas (CERs). A aprovao de um projeto de MDL depende do cumprimento de regras e parmetros pr-estabelecidos, sendo os projetos validados e verificados por Entidades Operacionais Designadas (EODs), aprovados e registrados pelo Conselho Executivo do MDL. Estes projetos devem ser aprovados pelos governos dos pases anfitries (em desenvolvimento) e os que iro comprar os CERs (Desenvolvido), atravs da Autoridade Nacional Designada (AND). Para que seja caracterizado o critrio de adicionalidade para o MDL, o projeto deve conseguir reduzir as emisses antrpicas de GEE para nveis inferiores aos que teriam ocorrido na ausncia da atividade de projeto do MDL. Ento, a avaliao se d comparando as emisses do projeto com as emisses de um cenrio de referncia, ou linha de base. Tendo comprovado o projeto proposto uma emisso abaixo desta linha de base, ele passa a ser considerado adicional para reduo de emisses antrpicas. O fato interessante que a linha de base futura, caso no seja implantado o projeto do MDL, nunca poder ser confirmada aps a implantao do projeto; portanto a referncia de base para o futuro no poder ser medida. A diferena entre a linha base de emisso previamente fixada e as emisses de GEE monitoradas e reais do projeto de MDL o que determina a quantidade de Unidades de Reduo da Emisso (URE) para serem transferidas de uma parte ou 18

de uma entidade legal para outra. Portanto, um cenrio com altos nveis de emisses como referncia para a de linha de base torna-se potencialmente atraente tanto para os investidores, que podero conseguir maiores financiamentos, quanto para os pases anfitries, que tero maior facilidade para atrair os projetos de MDL. Os projetos e atividades relacionados ao mecanismo de desenvolvimento limpo podem envolver entidades privadas e /ou pblicas, devendo estas, estarem sujeitas s orientaes do Conselho Executivo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. O primeiro projeto de MDL aprovado pela ONU no Mundo foi o do aterro sanitrio de Nova Iguau, no Estado do Rio de Janeiro, que utiliza tecnologias bem precisas de engenharia sanitria, tendo os crditos de carbono sido negociados diretamente com a Holanda.

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CAPTULO 2 ENERGIA SOLAR A energia solar um recurso renovvel abundante em toda a Terra. A cada hora, a quantidade de energia solar que atinge a superfcie da Terra suficiente abastecer a humanidade durante um ano. A energia solar pode ser aproveitada atravs de mdulos fotovoltaicos para produo de energia eltrica, e em coletores solares, para aquecimento de gua ou outro fluido trmico. Alm disso, essa energia pode ser tambm utilizada na climatizao de ambientes, atravs do pr-aquecimento do ar que adentra em edificaes localizadas em regies frias, ou mesmo de resfriamento de ambientes, em regies quentes. 2.1. O Sol e suas Caractersticas O Sol uma estrela mdia, de massa igual a 2 x 1030 kg e raio de 6,96 x 108 m. uma fonte contnua de energia para a Terra. Nele, pode-se encontrar a maioria, seno todos os elementos presentes na Terra. O hidrognio (H) e o hlio (He) so os seus elementos mais abundantes, representando cerca de 80% e 18% respectivamente. Toda a energia gerada pelo Sol d-se devido a um processo de fuso, no qual o hidrognio transformado em hlio, liberando grandes quantidades de energia. A fuso est diretamente relacionada com sua regio mais interior, a coroa, que ocupa menos de 15% do volume do Sol, e contm cerca de 40% da sua massa. A temperatura da coroa varia entre 10 e 20 milhes de graus centgrados, onde ento a energia gerada irradiada ao longo de uma distncia igual a 70% do raio do Sol (zona radioativa). Essa energia levada superfcie do Sol por um processo de conveco, na chamada zona convectiva. A superfcie externa da zona convectiva a fotosfera, que a fonte direta de toda emisso radioativa do Sol. A temperatura mdia na superfcie do Sol de 6.000 C. A figura 2.1 mostra a espessura das principais regies do Sol. Para o ser humano, possvel observar apenas a luz visvel proveniente da fotosfera, pois as camadas mais internas do Sol apresentam um alto grau de opacidade. A fotosfera uma camada bastante estreita, com cerca de 500 km de espessura, apresentando uma temperatura de cerca de 5.800 K e uma diminuio considervel da densidade, quando comparada s camadas mais internas. Uma densidade menor favorece a diminuio da opacidade, permitindo que a radiao se propague. Em outras palavras, pode-se comparar o Sol a uma imensa fornalha, a qual sofre exploses a todo o momento, que consomem 4,2 milhes de toneladas de combustvel nuclear por segundo.

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No interior: Ncleo ~ 2 x 105 km, Zona Radiativa ~ 3 x 105 km, Zona Convectiva ~ 2 x 105 km, e na atmosfera: Fotosfera ~ 500 km Cromosfera ~ 1,5 x 10 km Zona de transio ~ 8,5 x 10 km3 3

Figura 2.1 - Estrutura do Sol, esquematizada fora de escala. 2.2. Geometria Sol-Terra

Coroa (tamanho no definido, atinge vrios raios solares)

No dia-a-dia observa-se o movimento aparente do sol numa direo que vai de leste a oeste ou simplesmente o nascer e o pr do sol. Notam-se tambm as variaes que ocorrem na durao dos dias e das noites em diferentes pocas do ano em algumas regies. Os movimentos que a Terra realiza so muitos; dentre os mais conhecidos esto o movimento de rotao, aquele em que a Terra gira em torno de seu prprio eixo e tem durao de um dia, e o movimento de translao, no qual a Terra gira em torno do Sol, e dura aproximadamente 365 dias. Dentre as conseqncias diretas desses movimentos podem ser citadas as diferentes duraes do dia e da noite em diferentes regies do globo e as estaes do ano: primavera, vero, outono e inverno. A Terra realiza o movimento de translao em torno do Sol percorrendo uma rbita elptica, onde o Sol ocupa um dos focos. A realizao desse movimento faz surgir um plano denominado de plano da ecltica. O eixo em torno do qual a Terra realiza o movimento de rotao, chamado de eixo polar, possui uma inclinao de 23,45 em relao normal ao plano da ecltica (figura 2.1). O ngulo compreendido entre o plano do equador terrestre e o plano da ecltica denominado de declinao solar () e sua variao ao longo do ano compreende-se dentro do intervalo de 23,45 < < 23,45. Um mtodo aproximado para o clculo da declinao, em graus, apresentado pela equao.284 + dn = 23,45 sen 360 365

onde dn corresponde ao dia juliano, variando de 1 a 365. A declinao solar zero nos equincios de outono (20/21 de maro) e primavera (22/23 de setembro). Nesses dias, o dia e a noite possuem duraes iguais em todas as regies do globo terrestre. No solstcio de inverno (21/22 de 21

junho) a declinao solar igual a + 23,45, correspondendo ao perodo do ano onde o dia mais curto e a noite mais longa. Finalmente, no solstcio de vero (21/22 de dezembro) a declinao igual a 23,45 e o dia apresenta a durao mais longa no ano inteiro. Vale ressaltar que essa anlise vlida para o hemisfrio sul. No hemisfrio norte, as datas dos equincios e solstcios se invertem, assim como a durao do dia e da noite durante os solstcios. A figura 2.2 ilustra as relaes Sol-Terra discutidas.

Figura 2.2 - rbita da Terra em torno do Sol. Para o correto entendimento do aproveitamento solar para gerao de energia, necessrio conhecer-se algumas relaes geomtricas entre os raios solares e a superfcie terrestre, mais especificamente sobre uma superfcie S qualquer. Essas relaes so descritas atravs de vrios ngulos (figura 2.3), que podem ser definidos a seguir: (1) ngulo de Incidncia (S): ngulo compreendido entre o raio solar e a normal (n) superfcie de captao; (2) Altura Solar (S): ngulo formado entre o raio solar e a sua projeo sobre o plano horizontal; (3) ngulo Azimutal da Superfcie (): ngulo compreendido entre a projeo da normal superfcie no plano horizontal e a direo Norte-Sul. O deslocamento angular tomado a partir do Norte e est compreendido entre -180 e 180, sendo considerado positivo quando a projeo se encontra esquerda do Norte e negativo quando se encontra sua direita;

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Figura 2.3 - Relaes geomtricas Sol-Terra. (4) ngulo Azimutal do Sol (s): ngulo formado entre a projeo do raio solar no plano horizontal e a direo Norte-Sul. Obedece mesma conveno citada para o ngulo azimutal da superfcie; (5) Inclinao da Superfcie (): ngulo formado entre o plano da superfcie coletora e a horizontal; (6) ngulo Zenital (z): ngulo formado entre o raio solar e o Znite; equivale distncia angular entre o feixe solar e a vertical do local de incidncia. Outro ngulo de grande importncia, no representado na figura 2.4, o ngulo Horrio do Sol (), definido como o deslocamento angular leste-oeste do Sol, a partir do meridiano local, devido ao movimento de rotao da Terra. Cada hora angular corresponde a um deslocamento de 15o. Adota-se como conveno valores positivos para o perodo da manh, com zero s 12 h.

Figura 2.4 - ngulos horrios compreendidos dentro do intervalo de um dia. 2.3. Radiao Solar Extraterrestre e Sobre a Terra A radiao solar uma radiao do tipo eletromagntica, e se propaga na velocidade da luz. A quantidade de radiao que atinge a superfcie terrestre bastante varivel, sendo influenciada pela geometria Sol-Terra, por condies climticas gerais, como a presena de nuvens, entre outros. Um conceito que caracteriza a radiao solar incidente sobre a superfcie da Terra e suas influncias o de massa de ar (AM), definida pela razo entre a massa atmosfrica 23

atravessada pela radiao direta e a massa que seria atravessada se o sol estivesse no Znite (figura 2.5). Matematicamente, a massa de ar definida pela equao abaixo, sendo Z o ngulo zenital, definido anteriormente. Quando o sol encontra-se no znite, AM = 1, e esta aumenta medida que cresce o ngulo entre o feixe solar e a vertical. Assim, para um valor de Z de aproximadamente 48,2, AM = 1,5.

Figura 2.5 - Definio de massa de ar.AM = 1 cos Z

Essa expresso vlida apenas para ngulos zenitais de 0 a 60, pois para maiores ngulos, o efeito de curvatura da Terra torna-se significativo e deve ser considerado. No que se refere faixa de ocupao (espectro) da radiao solar, esta encontra-se, em termos de comprimento de onda, em uma faixa espectral de 0,1 a 5 m. A figura 2.6 mostra a distribuio espectral da radiao solar.

Figura 2.6 - Distribuio espectral da radiao solar. 24

A radiao solar pode ser representada usualmente atravs de duas formas: em termos de energia por unidade de rea, ou irradiao; e em termos de potncia por unidade de rea, ou irradincia. O valor mdio para o nvel de irradincia que atinge uma unidade de rea exposta aos raios solares perpendiculares a uma distncia mdia entre o Sol e a Terra no topo da atmosfera denominado de constante solar (GSC). Seu valor da ordem de:

GSC = 1.367 ( 20) W/m 2 A irradincia solar extraterrestre, GO, que atinge a Terra, varia ao longo do ano devido mudana na distncia Sol-Terra. Seu valor aproximado pode ser expresso pela equao.360 dn Go = GSC 1+ 0,033 cos 365

Geralmente, define-se potncia por unidade de rea pelo termo irradincia (W/m2) e energia por unidade rea pelo termo irradiao (Wh/m2). Uma outra forma de representar a radiao incidente no intervalo de um dia atravs do conceito de horas de sol pleno (HSP), que representa a energia total fornecida em um dia, normalizada em relao ao valor de irradincia de 1.000 W/m2. Como exemplo, caso um determinado local apresente irradiao diria total de 6.000 Wh/m2, o nmero de horas de sol pleno obtido dividindo-se esse valor por 1.000 W/m2, resultando em HSP = 6 h. Com relao radiao que pode ser aproveitada para gerao de energia, podem ser citados trs tipos principais: a radiao direta, a difusa e o albedo. A primeira aquela que atinge diretamente a superfcie coletora, sem sofrer qualquer influncia. A segunda aquela que atinge a superfcie aps sofrer espalhamento pela atmosfera terrestre. O albedo, a ltima parcela da radiao passvel de aproveitamento, aquela que incide na superfcie aps ser refletida pelo solo, aproveitvel somente se a superfcie estiver inclinada. A figura 2.7 mostra as diversas formas de decomposio da radiao emitida pelo Sol. A soma das parcelas direta, difusa e o albedo denominada de radiao global.

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Figura 2.7. Formas de decomposio da radiao solar.2.4. Potencial Solar e sua Avaliao

O Sol fornece anualmente para a Terra, 1,5 x 1018 kWh de energia. Trata-se de um valor considervel, correspondendo a 10.000 vezes o consumo mundial de energia nesse perodo. Este fato vem indicar que, alm de ser responsvel pela manuteno da vida na Terra, a radiao solar representa uma inesgotvel fonte energtica, havendo um enorme potencial de sua utilizao por meio de sistemas de captao e converso em outra forma de energia (trmica, eltrica, etc.). Existem vrias formas de aproveitamento da energia solar, muitas das quais j utilizadas h bastante tempo, como o aproveitamento direto para secagem de roupas, alimentos e iluminao, e outras mais recentes, atravs de equipamentos tecnolgicos, como o caso do aquecimento com coletores solares e a converso direta em energia eltrica por meio das clulas fotovoltaicas. O projeto de um sistema fotovoltaico requer o conhecimento e a cuidadosa utilizao de dados de radiao solar de um determinado lugar em particular. Dados de radiao tm sido coletados para muitas localidades no mundo. Essas informaes devem ser analisadas e processadas antes de uma estimativa da disponibilidade da radiao solar para um sistema fotovoltaico. O levantamento do potencial de energia solar para fins de estudos de distribuio geogrfica da radiao global no Brasil realizado de vrias maneiras, dentre as quais podem-se citar: os instrumentos de medio, modelos e mapeamento por satlite. O emprego de equipamentos mais precisos, baseados no efeito termoeltrico, bem como de sensores de estaes automatizadas ainda muito incipiente para atender s necessidades de todo territrio nacional. Os 26

actingrafos apresentam limitaes quanto sua preciso, especialmente em dias com elevado grau de nebulosidade, estando condicionados a calibrao peridica, a qual nem sempre realizada. De forma simples e direta, a solarimetria, pode ser definida como o conjunto de tcnicas responsveis pela avaliao do recurso solar disponvel em determinado local. de extrema importncia no estudo da energia solar para gerao de eletricidade, para que se possa analisar e quantificar de forma precisa o recurso disponvel. A medio da radiao solar, tanto a componente direta como a componente difusa, na superfcie terrestre de grande importncia para os estudos das influncias das condies climticas e atmosfricas. Com um histrico dessas medidas, pode-se viabilizar a instalaes de sistemas trmicos e fotovoltaicos em uma determinada regio, garantindo o mximo aproveitamento ao longo do ano, onde as variaes da intensidade da radiao solar sofrem significativas alteraes. A seguir so abordados alguns dos instrumentos de medio da radiao solar.Instrumentos de Medio

Os instrumentos solarimtricos medem a incidncia de radiao solar sobre rea, em condies especficas. Os dados de radiao podem ser medidos sob a forma global direta, ou atravs da soma das componentes direta e difusa, dependendo do instrumento utilizado. A coleta pode ser realizada sobre um plano horizontal (mais usual), ou sobre planos inclinados. Os instrumentos solarimtricos mais comuns so: Heligrafo: mede a durao da insolao, indicando o nmero de horas de brilho de sol dentro de um determinado perodo (figura 2.8);

Figura 2.8 - Heligrafo. Actingrafo: tambm conhecido como pirangrafo, mede a radiao solar global ou sua componente difusa, quando utilizada uma banda de sombreamento (figura 2.9);

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Figura 2.9 - Actingrafo. Piranmetro Fotovoltaico: mede a radiao solar global sobre o plano horizontal, sendo tambm indicado para observar pequenas flutuaes de radiao. Seu elemento sensor uma pequena clula fotovoltaica. So muito utilizados atualmente (figura 2.10);

Figura 2.10 - Piranmetro fotovoltaico. Piranmetro Termoeltrico: mede a radiao solar global, utilizando para isso uma pilha termoeltrica, constituda por pares termoeltricos (termopares) em srie. Podem ser de dois tipos: com sensor pintado de branco e preto alternadamente (figura 2.11), ou com a superfcie receptora toda preta e um bloco de metal de alta condutividade trmica no interior do instrumento;

Figura 2.11 - Piranmetro termoeltrico. Pirohelimetro: utilizado para medir a componente direta da radiao. Atravs de um dispositivo de acompanhamento do sol e de um sistema tico, aceita apenas a incidncia do raio direto, proveniente do disco solar (figura 2.12).

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Figura 2.12 - Pirohelimetro.Tcnicas de Medio

Geralmente, os levantamentos de recurso solar para fins de aproveitamento energtico utilizam dois tipos de medies. Um, que registra apenas a componente global da radiao, e outro, que registra a radiao global e sua componente difusa para, a partir desses valores, obter a radiao direta incidente. A radiao direta tambm pode ser medida por meio do pirohelimetro, mas, por este necessitar de um dispositivo de acompanhamento do sol, alm de um sofisticado sistema tico, ele apresenta custos muito elevados de aquisio e manuteno. Para medies de radiao global, o instrumento mais utilizado o piranmetro, cujo sensor est localizado no plano horizontal, recebendo radiao de todas as direes. A maneira mais usual de se apresentar os dados solarimtricos medidos em termos de energia por unidade de rea, ou irradiao, no plano horizontal. Os dados tambm podem ser obtidos sob a forma de potncia por unidade de rea (irradincia). Dependendo da aplicao, medies com bases mensal, diria, ou horria podem ser utilizadas. A partir de anlises precisas durante longo perodo de tempo, habitualmente calculado um valor mdio correspondente a um perodo especfico, como, por exemplo, um dia mdio correspondente ao perodo de um ms. O grfico da figura 2.13 apresenta valores mdios de radiao global (dias tpicos), obtidos em superfcie horizontal, referentes a dois meses com diferentes perfis para uma localidade do Estado do Par.1000 900 800 700 600 500 400 300 200 100 0 00:00

Irradincia (W/m 2)

Ms 1 Ms 2

06:00

12:00

18:00

00:00

horas

Figura 2.13 - Curvas de radiao para dias tpicos de dois meses distintos. Os dados de radiao solar so em geral coletados em intervalos amostrais de um segundo e integrados em intervalos de 10 minutos, uma hora, ou mesmo um dia. 29

Quanto menor for o perodo de amostragem e de integrao, mais precisa ser a anlise. Para a utilizao prtica dos dados solarimtricos no dimensionamento de sistemas fotovoltaicos, faz-se necessrio o seu tratamento e anlise. Aps a coleta, os dados so normalmente tratados, para apresentarem valores mdios de irradincia (W/m2), ou irradiao (Wh/m2). Anlises grficas so boas alternativas para uma melhor interpretao dos dados. Algumas das formas de representao de dados solarimtricos podem ser vistas nas figuras 2.14 e 2.15. Ambas as medies foram realizadas a partir de valores globais sobre uma superfcie horizontal, em perodos de integrao de 10 minutos, atravs de um piranmetro fotovoltaico. O grfico da primeira figura fornece as mdias dirias e a mensal, enquanto que o da segunda apresenta valores de um dia mdio, obtidos a partir dos dados horrios de um ms. Esse grfico conhecido como dia mdio ou dia tpico.700 600 Irradincia (W/m 2) 500 400 300 200 100 0 1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 475,66 W/m 2

dias

Figura 2.14 - Mdias dirias e mensal de irradincia para determinada localidade.1000 900 800 700 600 500 400 300 200 100 0 00:00

Irradincia (W/m 2)

06:00

12:00

18:00

00:00

horas

Figura 2.15 Dia mdio para um ms em determinada localidade. 30

2.5. Energia Solar-Trmica

Uma das formas mais antigas de aproveitamento da energia solar a sua converso em energia trmica, podendo-se a partir dela obter tambm a energia eltrica. Dentre as diversas formas de se aproveitar a energia solar trmica esto as seguintes.Coletores solares planos

A radiao solar pode ser absorvida por coletores solares planos, principalmente para aquecimento de gua a temperaturas relativamente baixas (inferiores a 100 C). O uso dessa tecnologia ocorre predominantemente no setor residencial, mas h demanda significativa e aplicaes em outros setores, como edifcios pblicos e comerciais, hospitais, restaurantes, hotis e similares. Esse sistema de aproveitamento trmico da energia solar, tambm denominado aquecimento solar ativo, envolve o uso de coletores solares planos. Os coletores so instalados normalmente no teto das residncias e edificaes. Dependendo do volume de gua a ser utilizada, o atendimento de uma nica residncia pode requerer a instalao de vrios metros quadrados de coletores. Para o suprimento de gua quente de uma residncia tpica (trs ou quatro moradores), so necessrios cerca de 4 m2 de coletores. Um exemplo de coletor solar plano apresentado na figura 2.16.

Figura 2.16 - Ilustrao de um sistema solar de aquecimento de gua.Coletores solares com concentradores

O aproveitamento da energia solar em sistemas que requerem temperaturas mais elevadas ocorre por meio de coletores solares com concentradores, cuja finalidade captar a energia solar incidente numa rea relativamente grande e 31

concentr-la numa rea muito menor, de modo que a temperatura desta ltima aumente substancialmente. A superfcie refletora (espelho) dos concentradores tem forma parablica ou esfrica, de modo que os raios solares que nela incidem sejam refletidos para uma superfcie bem menor, denominada foco, onde se localiza o material a ser aquecido. Os sistemas parablicos de alta concentrao atingem temperaturas bastante elevadas e ndices de eficincia que variam de 14% a 22% da energia solar incidente, podendo ser utilizados para a gerao de vapor e, conseqentemente, de energia eltrica. Contudo, a necessidade de focalizar a luz solar sobre uma pequena rea exige algum dispositivo de orientao, acarretando custos adicionais ao sistema, os quais tendem a ser minimizados em sistemas de grande porte. Entre meados e final dos anos 1980, foram instalados nove sistemas parablicos no sul da Califrnia, EUA, do tipo mostrado na figura 2.17, com tamanhos que variam entre 14 MW e 80 MW, totalizando 354 MW de potncia instalada. Trata-se de sistemas hbridos, que operam com auxlio de gs natural, de modo a atender a demanda em horrios de baixa incidncia solar. Os custos da eletricidade gerada tm variado entre US$ 90 e US$ 280 por MWh.

Figura 2.17 Coletores solares com concentradores cilndricos. Recentes melhoramentos tm sido feitos, visando a reduzir custos e aumentar a eficincia de converso. Em lugar de pesados espelhos de vidro, tm-se empregado folhas circulares de filme plstico aluminizado. O processo de converso resumidamente a seguir. consta de diversos estgios, descritos

Captao e guia da radiao solar: Neste estgio, a radiao solar captada na superfcie de abertura e guiada at o estgio de absoro e converso da radiao solar em energia trmica. Absoro e converso da radiao solar em energia trmica: Usualmente, nesta fase do processo, a radiao absorvida e transferida a um fluido termodinmico que circula no interior de um tubo ou sobre uma placa, revestida por materiais de alto coeficiente de absoro. A radiao ingressa no seu interior atravs

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de uma janela e, depois de mltiplas reflexes, absorvida, convertida em energia trmica e transferida a um fluido para posterior converso em energia mecnica, atravs de um ciclo termodinmico.Converso de energia trmica em mecnica: A energia trmica contida em um fludo convertida em energia mecnica, atravs de um ciclo trmico, dependendo da temperatura e natureza do fludo, lquido ou gasoso.

Apesar da existncia de uma grande diversidade de sistemas de gerao, a anlise de apenas algumas delas suficiente para ilustrar a maior parte dos critrios de projeto utilizados na tecnologia solar para produo de eletricidade. Existem algumas Centrais Solares com esta finalidade, que concentram a radiao solar em um pequeno absorvedor, o qual consegue obter elevadas temperaturas, chegando a mais de 4.000 C. Esses sistemas so constitudos por um campo de heliostatos, que enviam a luz solar a um receptor central, que a converte em energia trmica. A energia trmica convertida, a seguir, em energia eltrica, por meio de um ciclo termodinmico convencional. A Figura 2.18 mostra um desenho artstico de uma planta solar de receptor central para produo de energia eltrica.

Figura 2.18 - Usina solar experimental, prxima de Barstow, Califrnia, com produo de 10MW. O sistema constitudo por quatro subsistemas principais: o campo de heliostatos, a torre com o receptor, o mdulo de armazenamento e o conjunto turbina-gerador. A central solar, localizada em BARSTOW, na CALIFRNIA, um exemplo do emprego desta tecnologia. Essa central constituda por um campo de 1818 heliostatos de 39,9 m2 cada, instalado numa superfcie de rea igual a 291.000 m2. O receptor est localizado no topo de uma torre de 90,8 m de altura e produz vapor a 516 C, com uma potncia trmica mxima de 42 MW.

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2.6. Energia Solar Fotovoltaica

O aproveitamento da energia solar para produo direta de eletricidade teve incio h pouco mais de 160 anos quando, em 1839, o cientista francs Edmond Becquerel descobriu o efeito fotovoltaico ao observar, em um experimento com uma clula eletroltica (dois eletrodos metlicos dispostos em uma soluo condutora), que a gerao de eletricidade aumentava quando a clula era exposta luz. A partir da, foram estudados os comportamentos de diversos materiais expostos luz at que, no ano de 1954, Daryl Chapin, Calvin Fuller e Gerald Pearson desenvolverem a primeira clula fotovoltaica (FV) de silcio, com eficincia de 6%, capaz de converter energia solar em eletricidade suficiente para alimentar equipamentos eltricos. No ano de 1958, iniciou-se a utilizao de clulas FV em aplicaes espaciais, e at hoje essa fonte reconhecida como a mais adequada para essas aplicaes. Desde ento, a evoluo do mercado FV vem sendo bastante intensa, tornando comuns aplicaes em sistemas domsticos, sinalizao martima, eletrificao de cercas e outros. Em 2004 foi finalizado o projeto do maior sistema FV do mundo, o parque solar da Bavria, Alemanha, de 10 MWP de potncia instalada. Com relao ao mercado de fabricao de clulas solares, tambm verificado um contnuo crescimento, com a empresa Sharp sendo a lder mundial. O dispositivo responsvel pela converso da luz incidente em eletricidade denominado de clula fotovoltaica. Os materiais empregados na sua construo so elementos semicondutores, sendo, em escala comercial, a maioria fabricada de silcio, devido a trs fatores principais: o silcio no txico, o segundo elemento mais abundante na natureza (o primeiro o oxignio), e possui uma tecnologia consolidada devido sua utilizao predominante no ramo da microeletrnica. O silcio domina o mercado FV em suas trs principais formas construtivas: monocristalino, poli ou multicristalino, e amorfo. As clulas de silcio monocristalino (mono-Si) so desenvolvidas a partir de um nico cristal e, atualmente, j atingem 20% de eficincia comercial em aplicaes terrestres. Clulas de silcio policristalino (poli-Si) so constitudas de diversos cristais em contato entre si, dispostos de maneira no alinhada. Esse procedimento visa reduo de custos de fabricao da clula, embora haja uma pequena perda de eficincia. Os avanos tecnolgicos vm reduzindo bastante as diferenas de custo e eficincia entre as clulas mono e policristalinas, sendo atualmente pouco perceptveis. Finalmente, as clulas de silcio amorfo (a-Si) so constitudas de tomos de silcio dispostos de forma completamente desordenada. Sem a periodicidade na forma, h a tendncia do surgimento de imperfeies na estrutura. Para garantir melhor qualidade eletrnica aos equipamentos, quantidades substanciais de hidrognio tm sido ligadas ao silcio na composio da clula (a-Si:H). Clulas de silcio amorfo possuem custos de fabricao e eficincia reduzidos se comparadas 34

s de silcio policristalino. Comercialmente, a mxima eficincia verificada da ordem de 13%. Outras tecnologias de fabricao vm sendo pesquisadas e desenvolvidas a partir da combinao de elementos, porm ainda com menores apelos comerciais. Arseneto de glio (GaAs), disseleneto de cobre-ndio (CIS) e telureto de cdmio (CdTe) so algumas das tecnologias em estgios avanados de pesquisa e produo. Tais tecnologias apresentam vantagens como boas propriedades eltricas e bons nveis de eficincia, e desvantagens como riscos de contaminao e dificuldades de produo. Essas tecnologias, somadas ao silcio amorfo, so denominadas tecnologias de filme fino, devido s suas caractersticas construtivas. Por apresentarem valores razoveis de corrente, porm valores de tenso muito baixos, da ordem de milivolts, as clulas FV so normalmente associadas em srie, para garantir nveis de tenso e corrente adequados sua utilizao prtica. Tal associao de clulas em srie, em geral em nmeros de 30, 33 e 36, forma um mdulo fotovoltaico. Por sua vez, associaes de mdulos so denominadas de painel ou arranjo FV. Alm de compor a associao de clulas, o mdulo tem ainda a funo de proteger as clulas das intempries, isol-la eletricamente de contatos exteriores e fornecer rigidez mecnica ao conjunto. Geralmente, o mdulo FV composto, alm das clulas, por pequenas tiras metlicas responsveis por interligar as clulas e por fornecer contatos externos de sada; por um material encapsulante disposto diretamente sobre as clulas, normalmente um polmero transparente e isolante (EVA Etileno Vinil Acetato); por um vidro temperado e anti-reflexivo para a cobertura frontal; uma cobertura posterior, normalmente feita de polifluoreto de vinila; uma caixa de conexes localizada na parte posterior do mdulo; e uma estrutura metlica que sustenta todo o equipamento. A figura 2.19 apresenta um mdulo FV e suas partes constituintes.

Figura 2.19 - Partes constituintes de um mdulo FV. Um outro importante detalhe a ser observado na fabricao dos mdulos o formato das clulas. A cristalizao do silcio feita de modo que as clulas 35

apresentam formatos cilndricos, porm o ideal que elas ocupem a maior rea possvel do mdulo. Para diminuir perdas no processo, so usualmente realizados pequenos cortes, de modo que a clula redonda se assemelhe a um octgono. A figura 2.20 apresenta mdulos FV de silcio fabricados comercialmente a partir das formas mais difundidas. No primeiro deles, de silcio monocristalino, pode-se observar o corte das clulas e a rea no til deixada entre cada uma delas. Os mdulos de silcio policristalino e amorfo no apresentam tal problema.

(a)

(b)

(c)

Figura 2.20 - Mdulos FV fabricados comercialmente a partir de clulas de silcio (a) monocristalino, (b) policristalino e (c) amorfo. Dentre as caractersticas eltricas dos mdulos, vale comentar as mais importantes: potncia, tenso e corrente. Para analis-las de forma mais detalhada, apresenta-se na figura 2.21 as curvas caractersticas corrente versus tenso e potncia versus tenso de uma clula ou mdulo FV.

Figura 2.21 - Caractersticas I x V e P x V de uma clula ou mdulo FV. As caractersticas eltricas dos mdulos, fornecidas pelos fabricantes, so baseadas em condio padro de testes: irradincia de 1.000 W/m2, temperatura da clula de 25 C e massa de ar (AM) igual a 1,5. Nessas condies, os valores de corrente de curto-circuito (ISC) e tenso de circuito aberto (VOC) so os valores mximos atingveis quando o mdulo opera sem carga. Sob carga, o valor mximo de potncia (PMAX) obtido pelo produto entre os valores mximos de corrente e tenso (IM e VM), quando o retngulo formado pelas linhas pontilhadas da figura anterior apresenta rea mxima. 36

Uma outra maneira de se analisar os parmetros de mxima potncia da clula atravs de seu fator de forma (FF). Quanto maior o fator de forma, mais prximo de um retngulo a curva ser e, conseqentemente, maior ser a sua rea. O fator de forma assume valores sempre menores que a unidade, por ser calculado pela razo entre o produto IM x VM pelo produto ISC x VOC. Esse parmetro varia pouco de uma clula para outra e, conhecendo-se seu valor, pode-se calcular a potncia mxima da clula atravs da equao.PMAX = FF ISC VOC

Dentre os fatores que influenciam as caractersticas da clula, a irradincia e a temperatura da clula so os mais importantes. Baixos nveis de irradincia reduzem a corrente gerada sem causar prejuzo to considervel tenso, enquanto que altos valores de temperatura da clula reduzem a tenso em maiores propores que aumentam a corrente. A figura 2.22 ilustra o comportamento da curva I x V variao desses dois parmetros.

(a)

(b)

Figura 2.22 - Influncia da (a) irradincia e (b) temperatura nas caractersticas dos mdulos FV.2.7. Vantagens e Desvantagens da Energia Solar Vantagens

A energia solar no polui durante seu uso. A poluio decorrente da fabricao dos equipamentos necessrios para a construo dos coletores solares e mdulos fotovoltaicos totalmente controlvel utilizando as formas de controles existentes atualmente. As centrais de gerao, especialmente as fotovoltaicas, necessitam de pouca manuteno. Os mdulos fotovoltaicos so a cada dia mais potentes, ao mesmo tempo que o custo dos mesmo vem decaindo. Isto torna cada vez mais a energia solar uma soluo economicamente vivel.

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A energia solar excelente em lugares remotos ou de difcil acesso, pois sua instalao em pequena escala no obriga a enormes investimentos em linhas de transmisso. Em pases tropicais, como o Brasil, a utilizao da energia solar vivel em praticamente todo o territrio e em locais longe dos centros de produo energtica, e sua utilizao ajuda a diminuir a demanda energtica nesses locais e, conseqentemente, a perda de energia que ocorreria na transmisso.Desvantagens

Existe variao nas quantidades produzidas de acordo com as condies climticas (nuvens, chuvas, neve, etc.), alm de durante a noite no existir produo alguma, o que obriga a que existam meios de armazenamento da energia produzida durante o dia em locais onde o sistema de gerao no esteja interligado rede eltrica. Locais em latitudes mdias e altas sofrem quedas bruscas de produo durante os meses de inverno, devido menor disponibilidade diria de energia solar. Locais com frequente cobertura de nuvens, tendem a ter variaes dirias de produo de acordo com o grau de nebulosidade. As formas de armazenamento da energia solar so pouco eficientes quando comparadas, por exemplo, aos combustveis fsseis, a energia hidrulica e a biomassa. Apesar de ser hoje uma tecnologia madura, seu custo ainda a maior desvantagem, se comparado ao de outras formas de energia usadas para iluminao e acionamento de mquinas, por exemplo. Entretanto, a energia solar um recurso importante e economicamente competitivo quando dirigida para determinados nichos como aquecimento de gua para residncias, eletrificao rural, bombeamento de gua, cercas eltricas, telecomunicaes, ou utilizao geral em localidades isoladas e de acesso difcil ou restrito.

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CAPTULO 3 ENERGIA ELICA

Aplicaes de energia elica so verificadas no mundo h milhares de anos, em moinhos de vento para moagem de gros e bombeamento de gua, embarcaes vela, etc. Mais recentemente, no fim do sculo XIX, surgiu a primeira aplicao de energia elica para produo direta de eletricidade, atravs do advento da primeira turbina elica, tambm conhecida como aerogerador. Aps um perodo de pouco interesse, j no sculo XX, a crise do petrleo nos anos 70 despertou um maior interesse pela energia elica, sendo introduzidas melhorias significativas nos sistemas, principalmente na aerodinmica das ps, nos geradores eltricos e nos sistemas de comando e controle. Atualmente, centrais elicas de diversos portes so utilizadas em vrios pases do mundo, especialmente na Europa e nos Estados Unidos da Amrica, para produzir energia eltrica. Pases como a Alemanha, a Espanha e a Dinamarca esto na vanguarda no uso de parques elicos, tanto em terra quanto, no caso da Dinamarca, no mar (offshore). A maturidade tecnolgica alcanada pelos sistemas elicos faz surgir equipamentos de portes cada vez maiores, j sendo verificada a disponibilidade comercial de turbinas da ordem de 5 MW. Grandes centrais geradoras, conhecidas como parques ou fazendas elicas, com capacidades de at centenas de megawatts encontram-se em operao ao redor do mundo, principalmente em pases como Alemanha, Espanha e Estados Unidos, lderes em capacidade instalada. Nesse ltimo encontra-se o maior parque elico do mundo, com capacidade de 300 MW, no Estado de Washington. No Brasil h uma abundncia de ventos em quase toda a costa, sendo estimado um potencial global de cerca de 140 GW, dos quais uma boa parte poder ser efetivamente explorada. A maior parte desse potencial encontra-se no litoral, mas existem tambm locais fora do litoral que podem ser convenientemente utilizados tanto para centrais de grande porte quanto, e principalmente, para aproveitamentos de pequeno e mdio porte, no atendimento de localidades isoladas da rede eltrica convencional.3.1. O Vento e suas Caractersticas

Os ventos so resultantes do movimento do ar na atmosfera terrestre e, assim como as demais fontes renovveis de energia, so originalmente resultantes da radiao solar que atinge a atmosfera. O aquecimento provocado pela radiao solar incidente na atmosfera, somado ao movimento de rotao da Terra, origina os movimentos do ar que formam os ventos. O aquecimento da superfcie terrestre pelo Sol heterogneo, tornando o ar nas regies prximas ao equador mais quente do que nos plos. Como o ar quente menos denso que o ar frio, ele eleva-se na atmosfera proporcionalmente 39

diminuio de sua massa. Em contrapartida, nos plos o ar frio, mais denso, tende a movimentar-se em direo ao equador. O ar quente se move em direo ao norte e ao sul, com o movimento cessando a aproximadamente 30 N e 30 S, quando o ar comea a descer e um fluxo de ar mais frio retorna e se instala nas camadas inferiores da atmosfera. O movimento de rotao da Terra tambm influencia na formao dos ventos. O ar frio presente nos plos tende a movimentar-se em direo ao oeste, enquanto que o ar quente no equador movimenta-se em direo ao leste, movimentos resultantes da prpria inrcia do ar. O resultado a circulao do ar em sentido antihorrio em regies de baixa presso no hemisfrio norte e circulao em sentido horrio no hemisfrio sul. As variaes sazonais da velocidade e direo do vento so resultantes da declinao de 23,5 do eixo de rotao da Terra em torno do Sol, ocasionando variaes no aquecimento produzido pelo Sol em diferentes regies do planeta. A fora de Coriolis, tambm resultante do movimento rotacional da Terra, responsvel pelos movimentos das partculas de ar, para a direita de sua direo no hemisfrio norte, e para a esquerda no hemisfrio sul. Quando o movimento do ar alcana o estado permanente, a fora de Coriolis equilibra os gradientes de presso, resultando em um movimento aproximadamente ao longo de linhas isobricas, constituindo os chamados ventos geostrficos. O movimento do ar se aproxima desse movimento ideal a altitudes maiores ou iguais a 600 m. A figura 3.1 ilustra os tipos de circulaes de ventos na atmosfera terrestre.

Figura 3.1 - Circulao dos ventos na atmosfera terrestre. Os ventos so em geral classificados em gerais e locais. Os gerais so aqueles que sopram sobre a atmosfera e os locais prximo superfcie. As mais importantes manifestaes locais dos ventos so verificadas em regies de margens de grandes massas de gua, como oceanos, grandes lagos e rios, e em regies de relevo acidentado, como vales e montanhas. A primeira origina a formao das brisas40

marinhas e terrestres. A brisa marinha manifesta-se durante o dia, devido formao de correntes de ar que sopram do mar para a terra, em conseqncia da maior capacidade da terra em absorver os raios solares e, com isso, aumentar a sua temperatura e a do ar sobre ela. Durante a noite manifesta-se a brisa terrestre, que sopra da terra para o mar, devido ao fato da temperatura da terra cair mais rapidamente do que a da gua neste perodo. Com relao s manifestaes verificadas em regies de vales e montanhas, durante o dia o ar quente localizado prximo s montanhas eleva-se, enquanto que no perodo noturno o ar frio desce e se instala nos vales. A figura 3.2 ilustra os dois tipos de manifestaes locais dos ventos.

Figura 3.2 - Tipos de manifestaes locais dos ventos. A potncia do vento proporcional ao cubo de sua velocidade, tornando este o parmetro de maior importncia em estudos de energia elica para gerao de eletricidade. De posse desse valor, faz-se necessrio o estudo de conceitos fundamentais como potncia e energia do vento. Conhecendo-se a definio de energia cintica e sabendo-se que potncia definida pela taxa de transferncia de energia no tempo, aps algumas manipulaes chega-se ao equacionamento da potncia elica mxima aproveitvel, em W, por um rotor de rea A (m2) em um determinado local com velocidade de vento v (m/s) e densidade do ar (kg/m3), conforme mostrado abaixo.

1 P = Av3 2

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3.2. Perfil do Vento e Influncia do Terreno

A velocidade do vento nula na superfcie do solo, devido ao atrito existente entre ela e o ar. Prximo ao solo, a velocidade aumenta mais rapidamente, sendo este aumento mais lento medida em que a altura aumenta (figura 3.3). A variao torna-se nula a uma altura aproximada de 2 km sobre o solo. O fenmeno de variao da velocidade de vento com a altura denominado de perfil vertical de vento.

Figura 3.3 - Perfil vertical de vento. Dois modelos so bastante utilizados para expressar a variao da velocidade do vento com a altura, sendo conhecidos como perfil da lei de potncia e perfil logartmico do vento, dados respectivamente pelas equaes abaixo. z v( z ) = v r z r

z ln z v( z ) = v r o z ln r zo

sendo v(z) a velocidade na altura z desejada, vr a velocidade na altura de referncia zr, o coeficiente de Hellmann, parmetro dependente da rugosidade do terreno, e zo o comprimento da rugosidade. Valores tpicos de e zo so apresentados na tabela 3.1.

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Tabela 3.1 - Valores de zo e de acordo com o tipo de terreno. Tipo de Terreno zo (m) Muito liso: gelo ou lama Mar aberto calmo Mar agitado Neve Gramado Pastagem Descampado Plantaes rvores esparsas rvores compactas, sebes, prdios esparsos Florestas e bosques Subrbios Centros de cidades com prdios altos 10-5 2 x 10-4 5 x 10-4 3 x 10-3 8 x 10-3 10-2 3 x 10-2 5 x 10-2 10-1 2,5 x 10-1 5 x 10-1 1,5 3 0,32 0,13 0,19 0,10

As variaes tambm ocorrem na horizontal, mas costumam ser menos significativas, a no ser em locais de terrenos muito acidentados, onde a influncia dos obstculos considervel. A configurao do terreno onde se pretende instalar equipamentos para medio ou gerao elica deve ser cuidadosamente analisada antes da instalao, sendo ideal que a influncia do terreno seja a mnima possvel no perfil de vento do local. Obstculos de pequeno porte, como florestas de vegetao baixa e pequenas construes, apresentam pouca ou at mesmo nenhuma influncia, com o terreno podendo ser considerado plano nesses casos. Obstculos de maior porte, como vales, montanhas, cnions e grandes depresses, podem influenciar de maneira significativa no aproveitamento elico, estando a jusante ou a montante da torre de medio ou do aerogerador. Quanto maiores e mais prximos do equipamento de medio ou converso os obstculos estiverem, maior ser o efeito indesejado, originado pela regio de turbulncia formada nas proximidades do obstculo.3.3. Potencial Elico e sua Avaliao

O levantamento e a anlise do potencial elico so de extrema importncia para garantir a elaborao de um projeto bem dimensionado. Tal importncia torna este o passo inicial do desenvolvimento de projetos de sistemas elicos, inclusive

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para se dispor empreendimento.

de

uma

pr-anlise

sobre

a

viabilidade

econmica

do

Antes de tudo, so necessrias a identificao e avaliao preliminares das potenciais reas para instalao do sistema. Para isso, faz-se uso normalmente de mapas elicos e topogrficos, dados meteorolgicos de carter geral, quando disponveis, alm de observaes visuais. importante destacar, porm, que esses procedimentos apenas fornecem indicativos sobre o potencial elico disponvel em determinado local, sendo necessrias avaliaes mais criteriosas, como medies de campo durante considervel perodo de tempo, a fim de garantir a existncia de potencial tal que justifique investimentos na instalao do sistema de gerao. Com a difuso da energia elica em todo o mundo, atualmente encontram-se disponveis mapas elicos de pases, regies e at mesmo de estados e cidades. Um exemplo o prprio mapa elico brasileiro, disponvel para consulta, e que fornece indicativos preliminares sobre o potencial elico de todo o territrio nacional. A partir da anlise desses mapas, podem-se identificar locais onde haja maior probabilidade de sucesso de um empreendimento elico. Dados obtidos a partir de estaes meteorolgicas com finalidades diversas, tambm podem fornecer bons indicativos. Quanto mais prximas ao local pretendido de instalao do sistema estiverem as estaes, mais confiveis so os dados. Deve-se atentar para a finalidade das medies realizadas. Existem basicamente trs tipos de medies: as utilizadas por servios meteorolgicos nacionais, as especficas para determinao do potencial elico, e aquelas de altas taxas amostrais para determinao de rajadas e turbulncias. As primeiras so as mais comumente encontradas, mas normalmente no podem ser utilizadas diretamente para a avaliao da potencialidade elica, pois, apesar de coletadas durante longos perodos de tempo, costumam registrar pequenas quantidades de dados (dirios ou mesmo mensais). Alm disso, o nmero de estaes pequeno e encontram-se na maioria das vezes instaladas em locais que apresentam baixos valores de velocidade de vento, como reas agrcolas, aeroportos e centros urbanos. Como ltima etapa da identificao preliminar, mas tambm de grande importncia, est a visita aos possveis locais para instalao dos sistemas, para realizao de anlise visual. Algumas caractersticas topogrficas podem identificar locais com provveis ndices de altas velocidades de vento, tais como altas plancies ou planaltos, cumes de montanhas, regies costeiras com relevo e vegetao pouco acentuados, entre outros. Por outro lado, vales, reas de florestas e regies contendo terrenos acidentados caracterizam locais de baixas velocidades de vento. Especialistas podem facilmente identificar reas com maiores probabilidades de incidncia de ventos com altas velocidades, principalmente atravs de indicadores biolgicos e terrestres, j que o vento capaz de causar uma srie de impresses no ecossistema local, principalmente na vegetao.

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A formao de dunas um dos fatores que pode indicar a presena de ventos fortes em determinado local. Porm, as maiores fontes de informao so rvores e arbustos, principalmente aquelas de altura e caractersticas que propiciam o registro de evidncias de altas velocidades de vento. Deformaes e inclinaes ocorrem em funo do tipo e altura da vegetao, exposio ao vento, velocidade e direo do vento. Uma das classificaes que descreve os efeitos causados pelo vento na vegetao o ndice de Griggs-Putnam, que classifica os efeitos em ordem crescente de velocidade de vento, segundo os ndices de 0 a VII, conforme mostra a figura 3.4. A figura 3.5 apresenta um exemplo real de deformao verificada em rvore, podendo ser classificada pelo ndice VI ou VII de Griggs-Putnam.

Figura 3.4 - ndice de Griggs-Putnam sobre os efeitos causados pelo vento na vegetao.

Figura 3.5 - Exemplo de deformao em rvore causada pelo vento. No caso das anlises preliminares serem positivas, deve-se passar para a segunda etapa de levantamento do potencial elico, a etapa de medio, abordada no item seguinte.

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Instrumentos de Medio

Uma importante providncia a ser tomada no processo de medio de potencialidade elica a correta aquisio dos equipamentos que iro compor o sistema, sejam eles sensores, registradores de dados, ou a torre de sustentao. O insucesso nessa etapa pode ser determinante para inviabilizar o projeto. A seguir so descritos os principais equipamentos que compem um sistema de medio de potencialidade elica.Medidores de velocidade de vento (Anemmetros)

O principal equipamento do sistema de monitorao aquele responsvel pela medio do parmetro mais importante a ser considerado em projetos elicos: a velocidade de vento. Instrumentos de medio de velocidade de vento podem ser classificados basicamente em dois tipos: rotacionais e no-rotacionais. Entre os primeiros, os mais utilizados so os anemmetros de conchas (ou de copos) e os anemmetros de hlices. J os outros, mesmo no sendo to utilizados na indstria elica, possuem uma maior variedade de tipos, cada um operando com um princpio bsico diferente e sem apresentar partes mveis. Entre outros, podem ser citados os anemmetros de tubos de presso, de fio quente, acstico, radar, snico e laser. Os anemmetros do tipo rotacional so os mais utilizados em medies de velocidade de vento visando converso elio-eltrica. Eles operam de forma que a velocidade angular de rotao de seus eixos varie linearmente com a velocidade do vento. Os anemmetros rotacionais modernos produzem sinais eltricos, permitindo a determinao da velocidade de vento de forma instantnea. Como outras caractersticas dos anemmetros rotacionais esto sua boa faixa de exatido e seus custos menos elevados, o que no significa que os mesmos so menos eficientes. Anemmetros rotacionais modernos podem produzir sinais eltricos que permitem a determinao da velocidade de vento em qualquer instante. Em contrapartida, como desvantagem, esses anemmetros apresentam respostas mais lentas a variaes na velocidade de vento, quando comparados com alguns sensores no rotacionais. Os anemmetros de conchas (figura 3.6) possuem normalmente trs ou quatro conchas, podendo ser fabricadas de plstico ou metal, estando dispostas sobre um pequeno corpo.

Figura 3.6 - Anemmetro de conchas.

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Esses tipos de anemmetros so os mais utilizados na indstria de energia elica pelos seus custos relativamente baixos, se comparados aos demais, sua exatido e confiabilidade, sendo a sua velocidade de resposta determinada basicamente por seu peso, dimenses fsicas e atrito interno. Em comparao com os anemmetros de hlices, os de conchas apresentam maior preciso quando expostos a condies de turbulncia, de variao de direo do vento, e a ventos no horizontais originados por obstculos. Para medies especficas de turbulncias, anemmetros leves, pequenos e de baixa atrito so os mais indicados. Em condies gerais, anemmetros de conchas grandes so mais eficientes que aqueles de conchas pequenas, quando comparadas com o corpo do instrumento. Com relao s suas desvantagens relacionadas inrcia das conchas e a efeitos de sobrevelocidade, os erros gerados so pouco considerveis, no comprometendo a confiabilidade das medies. Os anemmetros de hlices possuem, mais comumente, duas ou quatro hlices, sendo os de quatro mais eficientes. Possuem resposta rpida e comportamento linear a variaes na velocidade do vento, que medida atravs do valor de tenso de sada de um gerador CC. As hlices so direcionadas ao vento com o auxlio de um leme de direo que tambm pode ser utilizado para medir a direo do vento. Anemmetros de hlices so mais utilizados para a medio das trs componentes da velocidade de vento, em funo de responder principalmente a ventos paralelos a seu eixo. Um arranjo de trs unidades em direes mutuamente ortogonais, como o apresentado pela figura 3.7, mede as trs componentes da velocidade de vento. Como desvantagem, os anemmetros de hlices apresentam erros mais acentuados quando expostos a condies de turbulncia e variaes da direo do vento.

Figura 3.7 - Conjunto de anemmetros de hlices para medio das trs componentes da velocidade de vento.

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Sensores de direo de vento (Anemoscpios)

Para medies de direo de vento utilizam-se anemoscpios, normalmente chamados simplesmente de sensores de direo, como os apresentados pela figura 3.8. Como sua preciso no to crtica quanto a dos sensores de velocidade, diversos modelos podem ser utilizados, de diferentes pesos, tamanhos e preos. Podem estar dispostos isoladamente ou integrados ao suporte do anemmetro, como mostram as figuras 3.8 (a) e (b), respectivamente.

(a) (b) Figura 3.8 - Sensores de direo (a) dispostos isoladamente e (b) integrados ao suporte do anemmetro. Medies de direo do vento so importantes, pois freqentes mudanas na direo podem indicar a presena constante de rajadas de vento. A situao ideal seria a verificao de uma nica direo predominante durante 80% do tempo ou mais.Sensores de temperatura, presso e umidade

Temperatura e presso atmosfrica, apesar de menos influentes que a velocidade e a direo do vento, tambm so grandezas de interesse para a determinao precisa do potencial elico. Sensores de umidade muitas vezes so integrados aos de temperatura, com custos baixos e, apesar de no influenciarem diretamente nos clculos do potencial elico, sua instalao interessante para a verificao de possveis influncias indiretas. A figura 3.9 ilustra um sensor de temperatura com higrmetro integrado.

Figura 3.9 - Sensor de temperatura.

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Registradores de dados

Todos os dados medidos atravs dos sensores apresentados anteriormente devem ser armazenados de forma a permitir a sua coleta e seu tratamento da melhor maneira possvel. Para tal, so utilizados registradores de dados, bastante conhecidos pelo termo ingls data-logger (figura 3.10). Equipamentos mais modernos apresentam grande flexibilidade em suas configuraes, permitindo a definio, pelo usurio, dos intervalos de coleta e da forma como os dados so apresentados, como por exemplo, clculos diretos de valores de potncia, valores mximos, mnimos e mdios, e ocorrncia de rajadas de vento.

Figura 3.10 - Data-logger para coleta e armazenamento dos dados medidos pelos sensores. Outra caracterstica importante o meio de armazenamento dos dados no registrador. O armazenamento pode ser feito em fitas, memrias internas, cartes de transferncia, ou enviados, manual ou automaticamente, a um computador. Em muitos casos a coleta manual, e o meio de armazenamento deve ter capacidade suficiente de memria para evitar o deslocamento constante de pessoal at o local de coleta. O envio automtico pode ser realizado via rdio, telefonia fixa ou mvel ou satlite, com o custo inicial maior desse tipo de sistema podendo tornar-se, ao longo do tempo, mais baixo que o custo constante de deslocamento para a coleta manual.Torres de sustentao dos equipa