Línguas em desaparecimento Kees Hengeveld Universidade de Amsterdã.
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Mídia, Consumo e a Adultização de Crianças: Uma Reflexão Macrossocial1
Tiziana Brenner B. WEBER2 Eliane Cristine FRANCISCO-MAFFEZZOLLI3
Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR
RESUMO Este ensaio teórico é resultado de uma reflexão sobre o que é a adultização de crianças e sua relação com as mídias e práticas de consumo sob uma perspectiva macrossocial. As crianças de hoje vivem em um contexto sócio-histórico-cultural diferente daquele das gerações anteriores. Com pais mais velhos e um menor número de irmãos, as crianças são “reis” e “rainhas” em seus lares. Além do fácil acesso a conteúdos, informações e pontos de venda, os pequenos também possuem uma rígida rotina de estudos e atividades extracurriculares. Nesse cenário, a criança está exposta a diversos estímulos pertencentes ao mundo adulto, compreendidos como adultizados. Com fronteiras indefinidas, os universos adulto e infantil acabam se misturando e a mídia, assim como as práticas de consumo mostram-se um termômetro e também influenciadores desta situação.
PALAVRAS-CHAVE: Adultização; Consumo; Criança; Mídia. INTRODUÇÃO
Da Idade Média ao Século XXI, a sociedade passou por inúmeras transformações
políticas, econômicas, sociais e culturais. A organização social foi se modificando, assim
como seus conceitos e significados. O mesmo aconteceu com a infância: inexistente como
ideia na época medieval e reinstitucionalizada na segunda modernidade (ARIÈS, 2014;
SARMENTO, 2003). Diante dessas transformações, assim como com o fácil acesso a
informações e conteúdos que permitem a tecnologia, observa-se uma difusão de fronteiras
entre os mundos adulto e infantil (BUCKINGHAM, 2006; POSTMAN, 2012; PROUT,
2010). Essa nebulosidade entre fases faz com que estímulos adultos atinjam crianças das mais
diferentes idades, gêneros e classes sociais. Esses estímulos muitas vezes contribuem para
que crianças internalizem comportamentos, atitudes, hábitos, formas de lazer, cuidados,
responsabilidades e ações típicas de uma vida adulta. Quando essa apropriação acontece,
compreende-se o fenômeno da adultização, manifestado por meio da ação social.
1 Trabalho apresentado no DT 07 – Comunicação, Espaço e Cidadania do XVII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul realizado de 26 a 28 de maio de 2016. 2 Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Administração da PUCPR, email: [email protected] 3 Orientadora do trabalho. Professora do Curso de Pós-Graduação em Administração da PUCPR, email: [email protected]
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A confusão entre fronteiras adulto e criança é facilmente percebida no mercado de
consumo. Produtos como bolsas, sutiãs, sapatos de salto, dentre outros, hoje são oferecidos
para mulheres, assim como para meninas (SILVEIRA at al., 2010). A pluralidade de
indústrias, investimentos em marketing e a preocupação em atender às crianças, demonstram
também a atratividade que tem o segmento infantil para as empresas. São destinados às
crianças produtos e serviços dos mais diferentes segmentos como brinquedos,
entretenimento, vestuário, higiene, alimentos, móveis, dentre outros. Observa-se que até
mesmo os espaços e layouts de supermercados, restaurantes e shoppings são pensados para o
público infantil (FELIPE; GUIZZO, 2003; SARMENTO, 2003).
Hoje, além dos pais investirem cada vez mais comprando produtos para seus filhos,
as próprias crianças recebem dinheiro para gastar de acordo com seus desejos. Elas são um
nicho atual e também um potencial mercado futuro. Além de futuras consumidoras mais fiéis
quando criam relacionamento e vínculo emocional com as marcas desde cedo (MCNEAL,
1992; KARSAKLIAN, 2000). O poder de influência das crianças sobre as compras da família
também é grande e já foi alvo de diversos estudos (DALAKAS; SHOHAM, 2006;
NORGAARD et al., 2007; SÁ et al., 2012; SUNITA, 2013).
O fenômeno da adultização manifesta-se no contexto social de uma infância
reinstitucionalizada. Esse processo está intimamente relacionado a mídia e ao consumo,
assim como com as novas organizações familiares e da escola. Seu estudo é relevante, além
de embrionário, uma vez que impacta a sociedade como um todo e envolve diferentes
questões sociais, além de econômicas (BARBER, 2009; UNFPA, 2013; INSTITUTO
ALANA, 2009; POSTMAN, 2012 SILVEIRA et al., 2010).
FRONTEIRAS INDEFINIDAS
Em 1982, o crítico social Neil Postman (1982, 2012) dá continuidade à discussão
iniciada por Ariès (1973, 2014) sobre a criança na história e seu papel na sociedade. Dividida
em duas partes, a obra de Postman (2012) trata sobre a construção da infância ao longo dos
séculos e sobre o “desaparecimento” da criança na modernidade. Segundo o autor (2012), a
infância surgiu com a invenção da prensa tipográfica - pois essa exigiu a criação de uma
educação formal que resultou em uma nítida separação entre os mundos das crianças e dos
adultos – e foi encurtada com o advento da televisão e difusão dos meios de comunicação -
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que permitiram o acesso a conteúdo para todos, independente de faixa etária, terminando com
o sigilo e segredos entre os dois mundos.
A tese de Postman (2012) despertou o debate relacionado às fronteiras entre adultos
e crianças e gerou inquietação entre os pesquisadores da área (BUCKINGHAM, 2006;
PROUT, 2010; SARMENTO et al., 2004). Apesar de sua relevância, a obra também foi alvo
de críticas que a julgaram conservadora e limitada (BUCKINGHAM, 2006; SARMENTO,
2003). Para Buckingham (2006), a fronteira entre crianças e adultos é difícil de ser
interpretada, assim como seus ritos de passagem. Portanto, afirmar que os meios de
comunicação foram os responsáveis pelo fim da divisão entre crianças e adultos é, segundo
Buckingham (2006), uma conclusão simplificada.
Outro motivo das críticas é o fato de Postman (2012) dar grande ênfase a fatores
externos, como a televisão, e pouco espaço para a reflexão sobre a ação da própria criança
neste meio. Em sua obra, a infância é retratada como frágil e as crianças como vítimas, sem
opinião ou voz ativa. Essa perspectiva da criança como um ser passivo é considerada para os
estudos recentes da área um retrocesso. Contrário a essa abordagem deriva o movimento da
Sociologia da Infância. Autores de referência na área como, Buckhingham (2006), Qvortruo
(2010), Prout (2010), dentre outros, entendem a criança como sujeito da sua própria
socialização e não apenas uma receptora da cultura e de processos de socialização propostos
por adultos (SIROTA, 2001).
Apesar das falhas apontadas pelos sociólogos da infância, a obra de Postman (2012)
foi fundamental para que as antigas ideias fossem reavaliadas (PROUT, 2010). Sarmento et
al. (2004) e Buckingham (2006) refutam argumentos que defendem a tese da morte da
infância, mas não negam a contribuição da obra. A infância tem sim passado por
transformações na segunda modernidade, uma delas, marcada pelo enfraquecimento entre as
fronteiras da infância e da idade adulta (BUCKINGHAM, 2006; PROUT, 2010).
Compreende-se que as características infantis já não correspondem àquelas de séculos
passados. A infância está diferente, o que é natural, uma vez que toda a sociedade passou por
transformações. Porém, nesse novo contexto um fenômeno se destaca: roupas, hábitos
alimentares, padrões linguísticos, brincadeiras, atitudes, desejos e aparência das crianças cada
vez mais se parecem com características adultas (POSTMAN, 2012). Estes novos
comportamentos, características e práticas de consumo não acontecem em um vácuo social,
mas sim em uma sociedade – também modificada – em que nota-se a existência de três
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grandes esferas, responsáveis pela socialização da criança: (i) a família, (ii) a escola, (iii) a
mídia e as práticas de consumo.
ESFERAS DE INLFUÊNCIA NA SOCIALIZAÇÃO INFANTIL
O final do século XX foi marcado por importantes mudanças na sociedade: o ingresso
da mulher no mercado de trabalho e a queda na taxa de fecundidade. Entre outras
transformações observa-se uma redução da proporção das famílias tradicionais
(BUCKINGHAM, 2006). No Brasil, o núcleo familiar composto por um homem e uma
mulher com filhos caiu de 56,4%, em 2000, para 49,4%, em 2010. Enquanto outros tipos de
composição tornaram-se mais numerosos (IBGE, 2010).
As novas configurações familiares e a diminuição da população indicam um aumento
do contato infantil com pessoas mais velhas e menos contato com outras crianças
(BUCKINGHAM, 2006). Tal afirmação se justifica com base em três dados. Primeiro, a
melhora nas condições da saúde e qualidade de vida proporcionaram um aumento da
longevidade. Como consequência, as famílias atuais têm mais avós convivendo com netos
(IBGE, 2010). Segundo, o número de filhos por casais caiu significativamente, na década de
80 o número de pessoas por família era, em média, 4,5, em 2010, o índice diminui para 3,4
(IBGE, 2010). Terceiro, com o desenvolvimento da medicina e com a maior preocupação
com a economia doméstica, casais esperam cada vez mais tempo para tomar a decisão de
terem filhos (BUCKINGHAM, 2006; IBGE, 2010).
Apesar do menor número de filhos por família, Buckingham (2006) afirma que no
Reino Unido o orçamento familiar destinado às crianças aumentou consideravelmente nas
últimas três décadas. O que indica que, pelo menos de forma simbólica, o lugar da criança na
família tornou-se mais significativo. No Brasil, a tendência é a mesma, Crivelaro (2006)
afirma que os gastos com os filhos chegam a representar 75% de toda renda doméstica.
Segundo o professor, 15% dos 75% são gastos com itens não essenciais. Esses “mimos”
podem ser explicados pela tentativa de recompensar a falta de tempo e ausência em casa
(BUCKINGHAM, 2006; CRIVELARO, 2006).
Com os pais trabalhando em tempo integral, as crianças ficam mais tempo sozinhas
em casa, expostas a mídia e entretenimentos como a televisão, computador e videogames, ou
então na escola e em atividades supervisionadas. Nas classes mais favorecidas é comum que
as crianças tenham rotinas rígidas com aulas de inglês, esportes e música. A ansiedade em
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relação à violência e ao alto tráfego de veículos nas ruas diminui a liberdade infantil. O
“brincar na rua” ou em áreas públicas, comum nos anos 70, por exemplo, não é mais
permitido. A educação, por sua vez, passou a ser o “trabalho” da infância. Um ofício e
obrigação a serem cumpridos. Assim, as crianças encontram-se mais confinadas em casa,
com maior supervisão, mais compromissos e obrigações e por outro lado, com mais recursos
destinados a elas (BUCKINGHAM, 2006).
Com essas mudanças sociais, as crianças passaram a ter cada vez mais contato com
questões relacionadas à vida adulta. Hoje, elas passam por experiências, formas de convívio
e têm acesso a conhecimentos que no século passado eram negados a elas. O fácil acesso à
informação também permitiu que conteúdos inapropriados como sexo, drogas e violência
atingissem a infância. Essa tem, de fato, chegado ao fim anos mais cedo do que acontecia
anteriormente, mas, por outro lado, o período de dependência da criança ao adulto tem
aumentado. Vive-se em uma época em que a fase da infância se encurta, mas a imaturidade,
a dependência financeira e o projeto de família se alongam (BARBER, 2009;
BUCKINGHAM, 2006).
Sarmento (2003) defende que as ideias e representações sociais sobre as crianças estão
se modificando, assim como, a estrutura familiar, as escolas e a mídia. Segundo ele, esse
processo não caracteriza um fim da infância, mas sim sua reinstitucionalização, ou seja, uma
mudança do lugar social imputado às crianças. Um aspecto central da reinstitucionalização é
a entrada e valorização da infância na esfera econômica, que ocorre de duas formas: primeiro,
pelo trabalho infantil em países periféricos, e segundo pelo marketing. As crianças contam
na economia, são influenciadoras e representam um dos segmentos de maior difusão mundial.
A elas são oferecidos desde produtos culturais como programas de televisão, livros e parques
temáticos, até produtos mais comerciais como moda, alimentação, brinquedos e mobiliários
(SARMENTO, 2003).
A infância está em processo de mudança, reinstitucionalizada como prefere Sarmento
(2003), mas com fronteiras mais difusas entre adultos-crianças como afirmam Postman
(2012) e Buckingham (2006). A presença da mídia na infância é inegável, assim como a
importância das crianças para a economia. Nesse contexto de transformações, observa-se,
não o fim da infância, uma vez que esta jamais deixará de existir como categoria social
(SARMENTO, 2003; QVORTRUP, 2010), mas sim o excesso de estímulos, referentes a
aspectos típicos de uma vida adulta, direcionados a elas.
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A figura 1 representa um esquema conceitual, inspirado na Teoria da Estruturação4
de Giddens (1984), da adultização na infância reinstitucionalizada. As três esferas analisadas
por Postman (2012) – escola, família e televisão – foram adaptadas de acordo com as
considerações de Buckingham (2006) e Sarmento (2003). (i) A família, (ii) a escola e as
atividades supervisionadas, (iii) mídia e consumo foram definidos, então, como a tríade de
influência que molda a infância de acordo com as transformações da sociedade.
Figura 1 – Esquema conceitual Fonte: Elaborado pela autora.
4 A teoria afirma que a estrutura social é tanto condição como resultado da ação, ou seja, a atuação humana constitui a estrutura (resultado), assim como é um meio para que a ação torne-se possível (condição). A estrutura, vista como um sistema de regras, leis e normas possibilita a agência, caracterizada pela capacidade do ser humano de desenvolver ações (GIDDENS, 1984).
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A família e a escola são as instituições tradicionais de educação, mas que cada vez
mais partilham com a mídia, um papel pedagógico (SETTON, 2002). Para Bourdieu (1999)
a família evolui de acordo com as conjunturais socioculturais e transmite seu patrimônio
econômico e cultural à criança. Essa o recebe e incorpora não de forma passiva, mas sim com
capacidade de agência e interpretação, como defende a Sociologia da Infância.
A ADULTIZAÇÃO DE CRIANÇAS
Como resultado desses estímulos adultizados constantes, as crianças podem se
apropriar de comportamentos, atitudes, hábitos, formas de lazer, cuidados, responsabilidades
e ações típicas de uma vida de adulto. Essa apropriação, fora de um contexto de brincadeira,
caracteriza um processo de adultização. Adultizar é, portanto, incentivar a inserção extrema
da criança em contextos não relacionados à infância. Crianças com muitos compromissos e
responsabilidades, assim como crianças preocupadas com cuidados com o corpo e aparência
são um reflexo destes estímulos. Não caracteriza a adultização brincar de ser adulto, mas,
sim, quando a brincadeira passa a ser uma preocupação ou necessidade. Por exemplo, brincar
de se maquiar é um comportamento natural, em que a criança imita a mãe. Porém, se a criança
usa maquiagem todos os dias como um cuidado necessário para sua beleza, a lógica é adulta
e não uma brincadeira de criança (TIBA, 2011).
A geração de crianças que recebe esses estímulos adultizados de maneira excessiva,
recebeu, inclusive, uma nova nomenclatura: KGOY, Kids Growing Older Younger, ou seja,
crianças que se comportam como adultos precocemente (SILVA, 2014). Com o fim da
“divisão” clara crianças-adultos (POSTMAN, 2012), as fronteiras entre um mundo e outro
são cada vez mais incertas (SILVEIRA et al., 2010). Fruto dessa diferenciação nebulosa entre
adultos e crianças, observa-se que roupas, comportamentos, linguagem, atitudes, desejos e
aparência física das duas categorias estão cada vez menos distinguíveis e cada vez mais
parecidos (CALDAS, 2006; POSTMAN, 2012 SILVEIRA et al., 2010).
As figuras 2, 3 e 4 ilustram imagens do mundo real e mostram exemplos de
comportamentos adultizados. A figura 2 retrata a festa de aniversário de uma menina de nove
anos. A chamada balada mirim, modismo entre a nova geração, movimentou o mercado de
limusines, em 2014, cerca de 90% da frota da empresa Exotic Limousine, sediada em São
Paulo-SP, era destinada ao público infantil (VEJA, 2014). Exemplos icônicos de
comportamento adultizado podem ser encontrados no funk. Como é o caso da cantora de funk
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mirim MC Melody, figura 3. A menina trabalha desde os dois anos, hoje, com oito, tem
inúmeras atividades, além da escola, faz shows, grava vídeos e possui uma fanpage no
Facebook com mais de 28 mil curtidas.
Figura 2 – Balada mirim Fonte: Veja (2014).
Figura 3 – MC Melody Figura 4 – Ever e Ava Fonte: Globo.com (2015) Fonte: Insta/foreverandforava (2015).
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Exemplos de adultização não tão polêmicos também são bastante frequentes. Como é
o caso das amigas Everleigh Soutas e Ava Foley, figura 5, com dois anos e mais de 200 mil
seguidores no instagram.
No mercado de consumo por meio dos produtos ofertados e da publicidade também é
possível observar de maneira palpável a mistura e difusão de fronteiras entre adultos e
crianças (SILVEIRA et al., 2010). Tênis e calças de moletom, antes oferecidas para o público
infantil, estão abrindo espaço para o consumo de objetos relacionados aos adultos (CALDAS,
2006). Pereira (2014) afirma que o consumo reorganizou o mercado e contribui para a
formação da identidade das pessoas. Nesse cenário reorganizado observa-se a adultização da
infância e a infantilização do adulto. Com este novo comportamento de consumo infantil,
produtos que originalmente não eram destinados ao público infantil - figuras 6 e 7 - hoje são
facilmente encontrados no mercado nas mais variadas formas: sapatinhos com salto, sutiãs,
kits de maquiagem, esmaltes e bijuterias.
Figura 6 – Salto para bebês
Fonte: Pee Wee Pumps (2015).
Assim como o marketing traz visibilidade para a criança na economia (SARMENTO,
2003), ele também pode ser um estímulo para um comportamento adultizado (BARROS et
al., 2013; FERREGUETT, 2014; GIACOMINI; ORLANDI, 2013; SILVEIRA et al., 2010).
Estudos indicam que as crianças são mais permeáveis aos estímulos de marketing e sua
influência extrapola o âmbito do consumo e passa a agir também no seu desenvolvimento,
gerando comportamentos de consumo excessivo, obesidade, erotização precoce e estresse
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(BARROS et al., 2013; BREI et al., 2008; LIMA, 2011). Na publicidade a criança é
constantemente representada como um mini adulto, como observa-se na figura 8, anúncios
como estes foram inclusive tirados de circulação por serem considerados inadequados.
Figura 7 – Sutiã infantil com bojo Fonte: Virtual Fashion (2015).
Figura 8 – Dia das crianças Couro Fino
Fonte: Exame (2013).
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O setor infantil tem grande representatividade para o crescimento do país. A
economia, por exemplo, cresceu apenas 0,1% em 2014 (FOLHA DE SÃO PAULO, 2015),
mas o segmento voltado para as crianças recebeu destaque e mostrou-se uma alternativa para
indústrias e franquias recuperarem seus investimentos (SEBRAE, 2015). De acordo com o
Sebrae, grandes empresas estão apostando em marcas voltadas para o público infantil para
equilibrar as vendas. Além de consumidores mais ativos, segundo o sindicato das indústrias
do vestuário (SINDIVEST, 2015), as crianças estão mais exigentes, uma vez que
acompanham as tendências de moda pela internet, em novelas infantis e na própria escola.
Em entrevista para a revista Exame (2014), mães comentam sobre esse novo comportamento
de consumo, segundo elas, é normal os filhos não gostarem de repetir roupas, decidirem o
que vão vestir e acompanharem coleções de moda. De acordo com a matéria, esse
comportamento de consumo das crianças e de suas mães faz com que o mercado de moda
infantil cresça cada vez mais.
A moda infantil, por exemplo, representa um termômetro da adultização existente
nesta geração, assim como também a incentiva. Segundo Nassralla (2015), diretora das
marcas Brooksfield Junior, Donna e Grils, “a ideia é não infantilizar a criança, ser casual e
ter um estilo muito próximo ao dos adultos”. Por solicitação dos pais, a Ellus também lançou
uma linha infantil. Bozon (2014), diretora da marca, afirma que “a expectativa é ter 5% de
participação do segmento infantil nos resultados da marca no primeiro ano e chegar a 20%
em alguns anos”. A marca possui licenças para explorar personagens da Disney ou dos
Muppets, mas as estampas, segundo a diretora, mantêm o estilo mais adulto, em cores sóbrias,
como preto e cinza.
A sociedade moderna influencia constantemente as crianças com seus valores, em um
contexto em que ter é mais fundamental do que ser. A relação entre o que se usa e sua
identidade é bastante forte (WOODWARD, 2000). O que se tem, o que se compra e o que se
veste diz para os outros quem você é. Dentro desse contexto, o consumo excessivo é cada
vez mais aflorado, muitas vezes gerando frustração, manias e depressão (BAUMAN, 2007;
SILVA, 2014). Produto dessa realidade, as crianças KGOY sofrem a influência de estímulos
adultizados e quando se dá conta batons, esmaltes e roupas são oferecidos e entendidos como
bens necessários e relevantes para a vida das crianças (FERREGUETT, 2014).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os estímulos adultizados atingem meninas e meninos de todas as camadas sociais.
Estes não acontecem em um vácuo social, mas estão presentes nas esferas de socialização da
criança. Muitas vezes sem perceber, a família e escola exigem e incentivam as crianças a se
comportarem como adultos. O mercado já compreendeu este novo comportamento que é
refletido e influenciado pelas práticas de consumo e pela mídia. Assim por meio de produtos
e serviços oferecidos, o mercado contribui para reorganização da sociedade de acordo com
suas novas características. Mães se vestem como filhas, meninas pintam os cabelos, meninos
desejam computadores e pais compram videogames. Como um ciclo que se retroalimenta, a
mídia e o consumo influenciam ao mesmo tempo que refletem o fenômeno da adultização
presente na infância reinstitucionalizada.
Estes estímulos adultizados presentes na vida da criança podem ser internalizados e
assim se manifestam através da ação. Esta, por sua vez, molda a estrutura social, ou seja, as
regras, leis e normas da nossa sociedade ao mesmo tempo em que esta mesma estrutura
permite as ações sociais. As atuais práticas de consumo infantil, guiadas por questões sociais
– expressas na mídia - que atribuem a criança um papel cada vez mais parecido com o dos
adultos, refletem esta nova tipificação da criança: mais adulta, cheia de compromissos,
responsabilidades, com acesso ilimitado a conteúdos e informações e muitas vezes erotizada.
A adultização não se relaciona apenas com a mídia e o consumo, mas sim com
problemas de interesse de todos como: a proibição da propaganda persuasiva direcionada ao
público infantil, o aumento da criminalidade infantil, o consumo de drogas cada vez mais
cedo, a discussão da diminuição da menoridade penal, a erotização precoce e gravidez na
adolescência (UNFPA, 2013; INSTITUTO ALANA, 2009; POSTMAN, 2012; SILVEIRA
et al., 2010). Compreende-la é fundamental para avaliar a sua normalidade ou não. Entender
o fenômeno e suas consequências é estudar a sociedade, suas práticas de consumo e esferas
de influência, assim como avaliar as responsabilidades que devem ter as empresas e meios
de comunicação.
REFERÊNCIAS ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 2014. BARBER, B. R. Consumido: como o mercado corrompe crianças, infantiliza adultos e engole cidadãos. Rio de Janeiro: Editora Record, 2009. BARROS, R. A. F; BARROS, D. F.; GOUVEIA, T. M. O. A. Crianças como pequenos adultos?
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Um estudo sobre a percepção da adultização na comunicação de marketing de empresas de vestuário infantil. Sociedade, Contabilidade e Gestão, Rio de Janeiro, v. 8, n. 3, set./dez. 2013. BAUMAN, Zygmunt. Vida líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. BOURDIEU, Pierre. Escritos de Educação. In: NOGUEIRA; CATANI (Orgs.) A miséria do mundo. Petrópolis: Vozes, 1999. BOURDIEU, Pierre. O campo econômico. Política & Sociedade, p.6; 15-58, 2005. BOZON, Adriana. Diretora de Branding da Ellus. 2014. Disponível em: <http://www.sebraemercados.com.br/grifes-apostam-em-colecoes-infantis-para-reequilibrar-suas-vendas/>. Acesso em: jun. 2015. BREI, Vinicius; GARCIA, Luciana Burnett; STREHLAU, Suzane. A influência do marketing na erotização precoce infantil. XXXII Encontro da ANPAD. Rio de Janeiro, 2008. BUCKINGHAM, David. Crescer na era das mídias eletrônicas: após a morte da infância. Tradução de Gilka Girardello e Isabel Orofino. Florianópolis, 2006. CALDAS, R. O. P.; BITTENCOURT, M. F. O Jogo e o desenvolvimento da criança: do consumo à criatividade. Departamento de Psicologia. PUC RJ, 2006. CRIANÇA & CONSUMO. Marisol – Outdoor Lilica Ripilica. Disponível em: <http://criancaeconsumo.org.br/acoes/marisol-outdoor-lilica-ripilica/>. Acesso em: out. 2015. CRIVELARO, Marcos. Filhos: famílias destinam 75% do orçamento para as crianças. 2006. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/economia/ultnot/infomoney/2006/10/12/ult4040u309.jhtm>. Acesso em: out. 2015. DALAKAS, Vassilis; SHOHAM, Aviv. How our adolescent children influence us as parents to yield to their purchase requests. Journal of Consumer Marketing, v. 23, iss. 6, p. 344-350, 2006. EXAME. Campanha é acusada de erotizar criança e causa polêmica. 2013 Disponível em: <http://exame.abril.com.br/marketing/noticias/campanha-e-acusada-de-erotizar-crianca-e-causa-polemica#2>. Acesso em: out. 2015. EXAME. Moda infanto-juvenil é mercado em expansão.Disponível em: <http://exame.abril.com.br/revista-exame-pme/edicoes/71/noticias/moda-infanto-juvenil-e-mercado-em-expansao>. Acesso em: jun. 2015. FELIPE, J.; GUIZZO, B. S. Erotização dos corpos infantis na sociedade de consumo. Pro-Posicções, v. 14n, n. 3 (42), set./dez. 2003. FERREGUETT, Cristhiane. Relações dialógicas em revista infantil: processo de adultização de meninas. Porto Alegre, 2014. FOLHA DE SÃO PAULO. PIB fica estagnado em 2014, com alta de 0,1%, pior resultado desde 2009. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/03/1608985-pib-cresce-01-em-2014-aponta-ibge.shtml>. Acesso em: jun. 2015.
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