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INTERAÇÕES Revista Internacional de Desenvolvimento Local Universidade Católica Dom Bosco Instituição Universitária Salesiana V. 3 N. 5 Setembro 2002

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local

Universidade Católica Dom BoscoInstituição Universitária Salesiana

V. 3 N. 5 Setembro 2002

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ReitorPe. José Marinoni

Pró-Reitor AcadêmicoPe. Jair Marques de AraújoPró-Reitor Administrativo

Luilton Pouso

Editora UCDBAv. Tamandaré, 6000 - Jardim Seminário79117-900 Campo Grande-MSFone: (67) 312-3377 Fone/Fax: (67) 312-3373e-mail: [email protected] www.ucdb.br/editoraDireção: Heitor Romero Marques

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I N T E R A ÇÕ E SRevista Internacional de Desenvolvimento Local

Conselho de RedaçãoCleonice Alexandre Le BourlegatEduardo José de ArrudaEmília Mariko KashimotoLúcia Salsa CorrêaMarcelo Marinho

Editor ResponsávelMarcelo Marinho

Co-editorAparecido Francisco dos Reis

Coordenação de EditoraçãoEreni dos Santos Benvenuti

Editoração EletrônicaRosilange de Almeida

AbstractsBarbara Ann Newman

ResúmenesMari Neli Dória

Revisão de TextoRaquel Naveira

CapaMarcelo Marinho (projeto e fotografia)

Tiragem: 1.000 exemplares

Distribuição: Bibliotecas universitárias

Cecilia LunaBibliotecária - CRB n. 1/1.201

Interações. Revista Internacional de Desenvolvimento Local,n. 5 (Setembro 2002). Campo Grande: UCDB, 2002.62 p. V. 3ISSN 1518-7012Semestral1. Desenvolvimento Local.

Publicação do Programa Desenvolvimento Local da Universidade Católica Dom Bosco.Indexada em:

Latindex, Directorio de publicaciones cientificas seriadas de America Latina, El Caribe, España y Portugal(www.latindex.unam.mx)

GeoDados, Indexador de Geografia e Ciências Sociais. Universidade Estadual de Maringá(www.dge.uem.br/geodados)

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Índice

Artigos

A face territorial do desenvolvimento .......................................................................................... 5José Eli da Veiga

Desenvolvimento e educação em comunidades indígenas: uma parceria necessária ..........21Marta Regina Brostolin

Sistemas agrossilvipastoris como alternativa sustentável para a agricultura familiar .........25Reginaldo Brito da Costa, Eduardo José de Arruda e Lincoln Carlos Silva de Oliveira

La Agenda 21 en el Distrito Treptow-Köpenick: idea, desarrollo y particularidades ..........33Michael Anselm Schrick

Campo Grande: a formação da sociedade local e o desenvolvimento de sua identidadecultural ...........................................................................................................................................41

Aparecido Francisco dos Reis

Desenvolvimento Local: questões conceituais e metodológicas ..............................................51Sérgio Ricardo Oliveira Martins

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A face territorial do desenvolvimentoEl faz territorial del desarrollo

The territorial face of the developmentJosé Eli da Veiga

Universidade de São PauloContato: [email protected]

Resumo: Observa-se, de maneira geral, o emprego cada vez mais freqüente da expressão “desenvolvimento territorial”ou, por vezes, “desenvolvimento espacial”. Tal tendência pode indicar uma revalorização da dimensão espacial daeconomia, mas pode, igualmente, refletir o hábito corrente de se acrescentar adjetivos ao substantivo“desenvolvimento”. A investigação aqui exposta permite avançar proposições que decorrem dos debates sobre astendências da diferenciação espacial cidade/campo, sobre a heterogeneidade espacial do dinamismo econômico esobre as iniciativas locais que podem ser cruciais para o desenvolvimento. Procura-se, dessa forma, estabelecer asprincipais relações desses debates com a evolução do “planejamento regional”.Palavras-chave: Planejamento regional; Meio inovador; Desenvolvimento territorial.Abstract: It is observed, in general, the frequent use of the expression “territorial development” or, some times,“spacial development”. Such trend can indicate a revalorization of the space dimension of the economy, but it can,equally, reflect the current habit of if adding adjectives to the substantive “development”. The here displayed researchallows to advance proposals that elapse of the debates on the trends of the space unbundling cidade/campo, on thespace heterogeneidade of the economic dynamism and on the local initiatives that can be crucial for the development.It is looked, of this form, to establish the main relations of these debates with the evolution of the “regional planning”.Key words: Regional planning; Innovative medium; Territorial development.Resumen: Se observa, en general, el uso frecuente de la expresión “desarrollo territorial” o, algunas veces, “desarrollospacial”. Tal tendencia puede indicar un revaloriza1ción de la dimensión del espacio de la economía, pero puedereflejar, igualmente, el hábito actual de agregarse adjetivos al substantivo “desarrollo”. La investigación aquí expuestapermite avanzar proposiciones decorrientes de las discusiones sobre las tendencias de la diferenciación espacialcidade/campo, sobre el heterogeneidade espacila del dinamismo económico y sobre las iniciativas locales que puedenser cruciales para el desarrollo. Buscase, de esta forma, establecer las relaciones principales de estas discusiones conla evolución de la “planificación regional”.Palabras claves: Planificación regional; Medio innovador; Desarrollo territorial.

campo, mais concentrado entre pesquisa-dores de temas rurais. Trata-se essencialmen-te de uma crítica à tendência relativamentecomum de se amalgamar desenvolvimentoe urbanização, como fazem os que afirmamser impossível que uma área rural se desen-volva sem que se torne automaticamentenão-rural. A segunda aborda a heteroge-neidade espacial do dinamismo econômico,mais concentrado entre estudiosos da “eco-nomia industrial”. Ela examina a tortuosaevolução do debate internacional desenca-deado pelos estudos sobre os distritos indus-triais marshallianos, que acabou dando res-paldo científico à idéia do ‘desenvolvimentolocal’, isto é, de que as iniciativas locaispodem ser cruciais para o desenvolvimento,pois se tornam importante fator de competi-tividade ao fazerem dos territórios ambientesinovadores. E a terceira procura estabeleceras principais relações desses dois debatescom a evolução do “planejamento regional”.

1. Da “dicotomia” ao “continuum” rural-urbano

Há quem acredite que o meio ruralesteja sujeito a um processo de urbanizaçãotão poderoso que a histórica contradição

Introdução

Este texto investiga as motivações doemprego cada vez mais freqüente da expres-são “desenvolvimento territorial” (por vezes“desenvolvimento espacial”). Seu principalobjetivo é saber se tal tendência indica umarevalorização da dimensão espacial da econo-mia, ou se, ao contrário, não passa de maisum prolongamento da infindável mania dese acrescentar adjetivos ao substantivo ‘de-senvolvimento’. A resposta também acabousendo de natureza geográfica: “nem tanto aocéu, nem tanto à terra”. Ou seja, parece estarhavendo, de fato, uma revalorização dadimensão espacial da economia; mas tudoindica que tal evolução está longe de permitirque se considere a expressão “desenvol-vimento territorial” como um conceitopropriamente dito, além de ser muito cedopara conhecer seus efeitos práticos. Mesmonão podendo dar uma resposta mais originalà referida pergunta, a investigação aquiexposta foi tão frutífera que permite avançar,a título de conclusões, dez proposições bemmenos banais. Elas decorrem de uma expo-sição que está organizada em três partes.

A primeira aborda o debate sobre astendências da diferenciação espacial cidade/

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, N. 5, p. 5-19, Set. 2002.

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entre cidade e campo estaria fadada a desa-parecer. Contudo, o que se verifica é a exis-tência de três tipos de países desenvolvidossob o prisma da diferenciação espacial entreáreas rurais e urbanas. Primeiro, um pequenogrupo fortemente urbanizado, que reúneHolanda, Bélgica, Reino Unido e Alemanha,no qual as regiões essencialmente urbanasocupam mais de 30% do território e asregiões essencialmente rurais menos de 20%,sendo que as intermediárias variam entre30% e 50%1. No extremo oposto há um grupomaior, formado por quatro países do “NovoMundo” - Austrália, Canadá, EstadosUnidos e Nova Zelândia - mas do qual tam-bém fazem parte três nações muito antigas:Irlanda, Suécia e Noruega. Nesse grupo asregiões essencialmente rurais cobrem maisde 70% do território e as relativamente ruraistêm porções inferiores a 20%. Finalmente, nocaminho do meio, encontram-se França,Japão, Áustria e Suíça, países nos quais entre50% e 70% do território pertence a regiõesessencialmente rurais e cerca de 30% aregiões relativamente rurais.

Qualquer esforço para interpretar osfundamentos desses três padrões de diferen-ciação espacial do mundo desenvolvido seráforçosamente levado a considerar fatoresnaturais objetivos, como o relevo, clima ehidrologia. Rejeitar explicações baseadas nodeterminismo natural não significa que sepossa admitir o puro e simples possibilismo,isto é, a desconsideração de limites físicos ebiológicos à ação humana na formação dosespaços rurais e urbanos, eludindo, assim,toda a problemática do relacionamento entreas sociedades humanas e os meios ditosnaturais2. Além disso, foi justamente o avan-ço das pesquisas científicas em urbanismoque fez emergir o conceito de “ecossistematerritorial”, entendido como o espaço sem oqual um ecossistema urbano não podeexercer o conjunto de suas próprias funçõesvitais. Se o ecossistema territorial é compostotanto de elementos do ambiente físico-biológico, quanto do ambiente construído edo ambiente antrópico, torna-se impossível,então, recusar todo e qualquer tipo de deter-minismo geográfico para explicar a locali-zação das atividades e das populações, comopretendiam os primeiros teóricos da econo-mia espacial3.

Nada disso impede, entretanto, queseja muito atraente a crença de que o destinodo espaço rural será seu desaparecimentopor força de avassaladora urbanização. Paraseus adeptos, a oposição cidade-campo jáseria, inclusive, uma questão inteiramentesuperada, uma vez que a ruralidade nãopassaria de mero sucedâneo de uma forma-ção social anterior, condenada pura e sim-plesmente a sumir, a exemplo do que já teriaocorrido na Holanda, essa vasta metrópoleurbana apenas recortada por corredoresverdes onde se misturam espaços recreativose terrenos de uso agrícola. A idéia chegou aser formulada nesses termos pelo secretáriogeral do Observatório Internacional deProspectiva Regional, na abertura de umcolóquio recentemente patrocinado peloSenado francês.

Acontece, contudo, que essa visão deconvergência para um suposto padrãoholandês, de grande metrópole esverdeada,não resiste a qualquer tentativa de se encon-trar homogeneidade espacial entre os paísesmais desenvolvidos, mesmo que se admita oreducionismo de considerar apenas osaspectos demográficos da questão. Um dospaíses desenvolvidos mais densamente po-voados – a Suíça – tem 13% de sua populaçãoem regiões essencialmente rurais, 25% emregiões relativamente rurais e 62% emregiões essencialmente urbanizadas. Esten-dendo-se por largas partes do Jura, da Plainee dos Alpes, as zonas rurais contribuem demaneira significativa à economia nacional,para não falar da imagem do país noexterior. E suas funções de residência, traba-lho e lazer são consideradas essenciais porsuas elites.

É verdade que só uma ínfima parte doshabitantes de meia dúzia de países do oesteeuropeu reside em regiões essencialmenterurais. Mas o peso das populações nasregiões relativamente rurais dessa seleta meiadúzia de países varia de 15% na Holanda a44% na Itália. Nesta última, como no Japão,não chegam a 50% os habitantes de regiõesessencialmente urbanas, mesmo que 70%residam em localidades urbanas. Em paísesmaiores, como a França e o Canadá, apenas29% e 44% dos habitantes estão em regiõesessencialmente urbanas, mesmo que 60%residam em localidades urbanas. De resto, a

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7A face territorial do desenvolvimento

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diferenciação rural/urbana pode ser muitoparecida em territórios tão diferentes quantoo da França e o dos Estados Unidos.

São bem diversas as combinações entreos vários tipos de atividade econômica quepermitem elevar os níveis de renda, educaçãoe saúde de muitas populações que conti-nuam rurais. As novas fontes de crescimentodas áreas rurais estão principalmente ligadasa peculiaridades dos patrimônios natural ecultural, o que só reafirma o contraste entreos contextos ambientais do campo e da cida-de. Enfim, a visão de uma inelutável marchapara a urbanização como única via de desen-volvimento do campo só pode ser considera-da plausível por quem desconhece a imensadiversidade que caracteriza as relações entreespaços rurais e urbanos dos países que maisse desenvolveram. Não faz sentido, portan-to, amalgamar desenvolvimento e urbani-zação, como propõem sem rodeios os quedizem ser impossível que uma área rural sedesenvolva sem que se torne automatica-mente não-rural4.

Estão justamente entre as menos urba-nizadas as microrregiões rurais dos EstadosUnidos que hoje desfrutam das melhoresperspectivas de desenvolvimento. São prin-cipalmente as do sul e do oeste que dispõemde clima agradável, montanhas, lagos, praias,podendo atrair muitos aposentados, turistas,excursionistas, esportistas, etc. Além dessescondados já escolhidos por migrantes de altarenda, há muitos outros, principalmente nooeste, nos quais a forte incidência de terrasfederais faz com que seu futuro esteja estrei-tamente vinculado à evolução das políticasgovernamentais relativas ao meio ambiente,ao turismo e outros ramos recreativos. Deresto, elevadas rendas per capita ocorrem noscondados rurais das Grandes Planícies,porque ali os serviços vinculados a atividadesagroindustriais engendraram baixíssimosníveis de densidade demográfica. E há muitaincerteza sobre as perspectivas socioeconô-micas de condados rurais da metade orientaldo país, principalmente no sudoeste, onde osserviços se combinaram a outros tipos deatividades industriais5.

Na prática, as desigualdades internasàs regiões rurais de um mesmo país podemser muito mais significativas que as referentesao contraste rural/urbano. Em mais de um

terço dos condados rurais dos EstadosUnidos (795/2288), pelo menos 20% dapopulação encontrava-se abaixo do nível depobreza em 1990; um problema de difícilsolução em 535 deles, quase todos concen-trados no sudeste e no sudoeste, mas tam-bém presentes nos Appalaches e em algumasreservas indígenas do norte e do oeste. Toda-via, mais de 80% da população rural ameri-cana reside em condados que conseguiramdesenvolver sistemas produtivos cada vezmais baseados em vários tipos de combi-nações de atividades terciárias com as duasoutras categorias setoriais. Para o conjuntodos espaços rurais dos Estados Unidos, asnovas fontes de crescimento e emprego estãonas atividades de serviços ligadas ao lazer,à aposentadoria e ao meio natural, mesmoque continuem muito importantes outrostipos de serviços, como os financeiros, deseguros, imobiliários, de comércio varejista,de restauração, de lavagem a seco, etc.

Enfim, as áreas rurais dos países avan-çados que permanecem subdesenvolvidassão aquelas que não lograram explorarqualquer vocação que as conecte às dinâ-micas econômicas de outros espaços – sejameles urbanos ou rurais – e não aquelas queteriam sido incapazes ou impossibilitadas dese urbanizar. E como as novas fontes decrescimento econômico das áreas rurais estãoprincipalmente ligadas a peculiaridades dopatrimônios natural e cultural, intensifica-se o contraste entre campo e cidade

Tudo isso quer dizer, então, que a desa-creditada abordagem “dicotômica” deveriaser reabilitada? Estaria sendo contrariada aabordagem inversa, de “continuum”? Depen-de muito, na verdade, do significado que seatribua a esses vocábulos6. De qualquerforma, o que não parece existir é qualquerevidência de que esteja desaparecendo ahistórica contradição entre cidade e campo,inclusive no caso holandês, onde os espaçosrurais tendem a ser caracterizados comomeros corredores nos quais convivem ativi-dades agrícolas e recreativas. Em outraspalavras, há uma falsa alternativa sendoproposta nesse duelo entre dicotomia e“continuum”. Mas para disso se dar conta, éabsolutamente necessário sair do isolamentodemográfico (ou no máximo sociológico) emque foi metido esse debate, como se seus

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8 José Eli da Veiga

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fundamentos ecológicos e econômicos tives-sem menor importância.

O desafio é, portanto, entender asvárias dinâmicas socioeconômicas, das maisefêmeras às mais duráveis, distinguindo bemas reversíveis das irreversíveis, pois algumaspodem ser duráveis sem que sejam necessa-riamente irreversíveis. Ninguém ignora quea proporção das atividades primárias naseconomias mais desenvolvidas caiu, neste sé-culo, de metade para um vigésimo. Enquantoisso, as terciárias subiram de um quarto paramais de três quintos, e as secundárias desli-zaram de pouco mais a pouco menos de umterço. Só que os resultados dessas grandestendências foram bem heterogêneos. Entreos países do primeiro mundo, a parte dosserviços varia de 50% a 70%, a das industriaisde 40% a 25%, e a das primárias de 10% a3% dos ocupados.

Mais heterogêneas ainda foram asrepercussões espaciais dessa enorme mudan-ça estrutural. O fato de atividades primáriasestarem forçosamente muito mais presentesnas zonas rurais não significa que os outrosdois tipos sejam necessariamente muito maisrecorrentes nas zonas urbanas. O empregoindustrial é mais significativo nas regiõesrelativamente rurais que nas essencialmenteurbanas, chegando mesmo a ser muito maisrural que urbano em países nórdicos, comoa Noruega e a Suécia. E os serviços têm quaseo mesmo peso em regiões essencialmente ur-banas e relativamente rurais, sendo extraor-dinariamente importantes nas regiões essen-cialmente rurais da Bélgica.

Não é portanto a composição setorialdas economias desenvolvidas que pode expli-car o surgimento, no final do século XX, deindícios opostos à chamada “desertificaçãorural” que estariam anunciando um certo“renascimento rural”. Essa hipótese foi con-trariada pelos estudos da OCDE que com-pararam as regiões rurais mais dinâmicas àsmais letárgicas ou decadentes. Os resultadosmostram que o melhor desenvolvimento dedeterminadas zonas rurais tem causas aindadesconhecidas, mas que, com certeza, nãoestariam relacionadas a diferenças em suasrespectivas estruturas setoriais.

Ora, foi justamente a vontade de en-tender quais seriam as fontes geradoras domaior dinamismo econômico de certas loca-

lidades que desencadeou tantas discussõessobre as virtudes dos distritos industriaismarshallianos para o desenvolvimento; umlongo debate que acabou dando origem aosamplos programas de pesquisa sobre relaçõesdas mais diversas entre mutações econômicase recomposições espaciais.

Foi a identificação de “constelações eco-nômicas localizadas que venciam a recessão”em áreas relativamente rurais como a Toscanae Emilia-Romagna (Itália), Baden-Württemberg(Alemanha), Cambridge (Inglaterra), Smäland,(Suécia), e até essencialmente rurais, como West-Jutdland (Dinamarca), que levou um grupo depesquisadores ligados à OIT a se perguntar, emmeados dos anos 1980, se essa virtuosacombinação entre eficiência e altos níveis deemprego poderia se tornar um modelo paraoutras regiões.

Idêntica interrogação estava no centrodas preocupações que levaram à formaçãosimultânea do Grupo Europeu de Pesquisassobre os Ambientes Inovadores (Gremi), quese propunha a entender os processos cole-tivos de aprendizagem. Os desdobramentosdo amplo debate que se seguiu foram eviden-ciando os limites da noção de “distrito”,fazendo com que paulatinamente fosse dadapreferência à noção mais ampla de “sistemasprodutivos locais (SPL)” (“Local ProductiveSystems”).

2. Do “distrito marshalliano” ao localismo

Muitas controvérsias foram se mistu-rando ao debate desencadeado pelos pio-neiros estudos italianos7, como evidenciamas revisões críticas publicadas em quatro es-pessas coletâneas sobre o assunto8. E os resul-tados dessa vasta produção científica aindanão explicam satisfatoriamente as razões domaior ou menor dinamismo econômico decada território, dificultando muito qualquertentativa de síntese. De qualquer forma,assim que algumas lições gerais sobre os“distritos” começaram a ser tiradas, foramtambém surgindo muitas dúvidas sobre apossibilidade de que elas pudessem vir a seraproveitadas em contextos muito diferentes.No caso italiano, por exemplo, constatou-seuma fortíssima correlação entre a distri-buição espacial da economia “difusa”, quecaracterizava suas províncias mais dinâ-

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9A face territorial do desenvolvimento

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micas, e a intensidade das formas familiaresde agricultura (e portanto de razoável distri-buição de renda). Além disso, a organizaçãomunicipal específica do Centro-Norte daItália, cuja origem remonta à Idade Média,mostrou que essas comunidades locaishaviam estabelecido há muito tempo umaboa divisão territorial do trabalho entrecidade e campo, uma organização muitoarticulada da sociedade urbana, e uma redemuito densa de comunicações.

Em áreas como o Mezzogiorno, histori-camente fundadas em formas patronais deagricultura, não existe a mobilidade e aarticulação social que engendram a criaçãode um grande número de flexíveis PMEs.Também não existe essa organização espa-cial que permite evitar uma fratura entrecidade e campo. Como enfatiza o economistaindustrial italiano Gioacchino Garofoli, nãose trata de um processo com vocação aocorrer em qualquer lugar, pois está ligadoa alguns pré-requisitos da própria formaçãosocioeconômica de cada território9.

Mas se as heranças institucionais deuma economia baseada na agriculturafamiliar são condições necessárias, elas estãomuito longe de ser suficientes. Para que muitasempresas e muitos empregos possam sercriados em regiões não privilegiadas pelavelha obsessão de “pólos” ou “eixos” urbano-industriais, também é preciso que elas dispo-nham de um mínimo de condições favoráveisem termos de comunicações e de serviços e,sobretudo, de condições que estimulem o“empreendedorismo”. Afinal, são os empre-endedores os principais agentes da mudançaeconômica, pois são eles que geram, disse-minam e aplicam as inovações. Ao procu-rarem identificar as potenciais oportunidadesde negócios e assumirem os riscos de suasapostas, eles contribuem tanto para um maioruso dos recursos disponíveis, quanto para aexpansão das fronteiras da atividade econô-mica. Mesmo que muitos não tenham sucesso,é sua existência que faz com que uma socie-dade tenha constante geração de novosprodutos e serviços.

Infelizmente, não se sabe muito bemquais são os determinantes do “empreende-dorismo”, apesar de sua crucial influênciasobre o crescimento econômico. Sequer existeacordo sobre os indicadores que melhor reve-

lariam os graus relativos em que o fenômenose manifesta. É sabido, entretanto, que eletambém nunca ocorre de forma homogêneaentre as regiões de uma mesma nação.Comparando-se extremos, percebe-se que emcertas regiões da Alemanha surgem mais doque o dobro de novas firmas do que emoutras. A mesma relação se aproxima dotriplo na Itália, na Suécia e no Reino Unido,chegando a girar em torno do quádruplo naFrança e nos Estados Unidos10.

Tudo indica que essas divergências espa-ciais da criatividade empreendedora corres-pondem ao chamado fenômeno de “clustering”(formação de “feixes” ou “cachos”). Segundouma das definições mais aceitas, “cluster” é umaconcentração geograficamente delimitada denegócios independentes que se comunicam,dialogam e transacionam para partilhar cole-tivamente tanto oportunidades quanto amea-ças, gerando novos conhecimentos, concor-rência inovadora, chances de cooperação, ade-quada infra-estrutura, além de freqüentementetambém atraírem os correspondentes serviçosespecializados e outros negócios correlacio-nados. E os estudos sobre a relação existenteentre a formação desses feixes e o “empreen-dedorismo” acabam sempre por enfatizar osfatores culturais que às vezes são compactadosna sedutora noção de “capital social”: umcomplexo de instituições, costumes e relaçõesde confiança que geram a “atmosfera” neces-sária a seu estímulo11.

São muito ilustrativas as conclusões dosbalanços feitos em paralelo pelo suíço DenisMaillat e pelo italiano Giacomo Becattini, res-pectivamente fundador do Gremi e principalexpoente dos distritólogos12. As abrangentespesquisas empíricas do Gremi levaram Maillata concluir que os ambientes inovadores(milieux innovateurs) se manifestam emcondições territoriais e produtivas das maisdiversas: podem ser especializados ou mul-tifuncionais, industriais e turísticos, urbanose rurais, de alta tecnologia ou de tecnologiatradicional. Dá para afirmar quais são asmudanças possíveis e identificar empiri-camente as que já estão em curso. Mas não sesabe o que realmente faz com que deter-minado território seja capaz de gerar umnovo modo de organização e de produção.

A principal conclusão de Becattini éque uma política industrial só pode ser

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10 José Eli da Veiga

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sistemática e racional se estiver apoiada numtableau das relações socioeconômicas “histori-camente determinadas”, isto é, numa repre-sentação da trama de sistemas produtivoslocais que não isole as relações técnico-econô-micas das relações socioculturais e institu-cionais, como faz a matriz input-output. Arevisão dos estudos e debates sobre os distri-tos industriais marshallianos acabaram porconvencê-lo de que os verdadeiros recursoscríticos de uma economia nacional são ossistemas locais: organismos de formaçãolenta e difícil, que constituem um patrimônioa ser reconhecido, conservado e fortificado.Assim, para superar a ignorância reinantesobre a importância dos SPL, Becattini con-sidera necessária a adoção de uma estratégiade pesquisa com três linhas de orientação:a) redefinição de uma grande parte doaparato teórico da economia e de outrasciências sociais; b) trabalho de campo queexplore as similaridades e diferenças e nãoevite as conexões entre fenômenos quepertencem a campos disciplinares diversos;c) uma caracterização atenta dos SPL, nalinha de trabalho explorada por seu colegaFabio Sforzi13.

O principal mérito de Sforzi foi tentarsuperar as distorsões impostas pelo uso dasfronteiras de caráter político-administrativocomo unidade espacial de análise. Afinal,apenas uma parte das localidades perten-centes às províncias que formavam a famosa“Terceira Itália” tinham o dinamismo daeconomia “difusa” presentes em distritosmarshallianos. Além disso, fenômeno idên-tico também ocorria no noroeste (“PrimeiraItália”). Era portanto necessário encontraruma unidade espacial de análise empíricaque não fosse tão distante dos marcos con-ceituais das análises econômicas de GiacomoBecattini, Sebastiano Brusco ou GioacchinoGarofoli e das abordagens sociológicas deArnaldo Bagnasco, Carlo Trigilia ou VittorioCapecchi. A contribuição de Fabio Sforzi foijustamente a de tomar o “sistema de locali-dades interligadas” como padrão espacial deanálise do processo de industrialização e dodesenvolvimento socio-econômico em geral.

A base do argumento é que o desen-volvimento ocorre localmente quando umaindústria e uma população têm a mesmaárea comum de interação social e econômica.

Isso acontece em todo tipo de localidade,desde as de tipo mono-industrial até asmarcadas por uma grande quantidade depequenos negócios mais ou menos similares.O que as diferencia é a maneira pela qual asfirmas e a população estão envolvidas nadivisão do trabalho. Uma regionalizaçãofuncional da Itália - feita a partir de dadoscensitários de 1981 sobre os fluxos de deslo-camento entre residência e trabalho (journey-to-work flows) - permitiu a identificação de955 Áreas de Mercado de Trabalho Local(LLMAs: Local Labour Market Areas), queforam agrupadas em 15 tipos de sistemaslocais mediante uma análise de suas estru-turas socioeconômicas.

Essa importante contribuição de Sforzifoi, infelizmente, distorcida pela divisãosetorial. Sua principal motivação era com-parar os 61 distritos industriais marshallianos(como os de Carpi e Prato), enquanto subca-tegoria das 161 LLMAs de industrializaçãoleve, a outros três tipos: a) as 76 LLMAs donorte e do centro dominadas por indústriase serviços (como as de Milão e Florença); b)as 64 LLMAs do sul, dominadas princi-palmente pelos serviços (como as de Nápolese Palermo); e c) as 96 LLMAs industriais donorte (como as de Lumezzane e Valdagno).

Ao selecionar as categorias que consi-derou “comparáveis”, Sforzi misturou todosos sistemas locais extra-urbanos baseados noturismo ou em atividades consideradas“semi-rurais” ou “rurais”. Pior, essas novecategorias extra-urbanas foram atiradasnuma mesma gaveta com as “marginais” eas “deprimidas” do sul. Assim, 11 tipos desistemas locais - reunindo 558 das 955LLMAs - foram amalgamados na únicacategoria considerada “residual” edenominada “Resto da Itália”.

Ora, quando se examina com atençãoas tabelas organizadas para fazer essacomparação, percebe-se que no períodoconsiderado – 1971/81 – a categoria “Restoda Itália” gerou proporcionalmente maisempregos no agregado do que qualquer umadas outras quatro, embora sempre tenha sidosuperada por alguma delas em quase todasas divisões setoriais específicas. Ou seja, sempretender, essa contribuição de Sforzi é umaexcelente ilustração do potencial gerador deempregos que também existe em sistemas

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locais extra-urbanos e menos especializados.Reforça a hipótese de que nesses sistemaslocais extra-urbanos e extra-industriaispodem existir efeitos sinérgicos de geração deempregos comparáveis até aos que se mani-festam nessa espécie de vanguarda consti-tuída pelos distritos industriais marshallianos.Mas como eles foram todos embutidos numaúnica e extremamente heterogênea categoria,formada por 60% das Áreas de Mercado deTrabalho Local, incluindo até as duas mais“deprimidas” e as 41 “marginais”, ficaimpossível separar “o joio do trigo”.

Esse forte viés “industrialista” foi man-tido na atualização feita com os dados censi-tários de 1991, apresentada na conferênciasobre “Sistemas Locais de Pequenas Empre-sas e Criação de Emprego”, organizada pelaOCDE em junho de 199514. Os sistemas locaissem concentração de emprego fabril foramoutra vez empacotados numa categoria“residual”, desta feita denominada “não-industrial”. O resultado ficou ainda maisestranho, pois nos anos 1980 houve reduçãogeneralizada do emprego no setor industrial,em flagrante contraste com seu aumento nosetor terciário, particularmente entre asempresas de “serviços não-tradicionais”. Ea inevitável conclusão foi, evidentemente, ade enfatizar que, “no mundo real”, as fron-teiras entre a indústria e os serviços estãosendo progressivamente removidas...

Os trabalhos apresentados na referidaconferência da OCDE marcaram uma clararuptura com a tendência anterior de atribuirapenas à indústria a glória pelo bom desem-penho econômico de determinadas áreasgeográficas. Os participantes preferiramchamar a atenção para as ligações entre asempresas em geral e sua capacidade de criarredes (“business links and networking”) ou, demaneira ainda mais abrangente, para ossistemas locais de PMEs (“local systems ofSMEs”). E própria idéia de “distrito” chegoua ser completamente “desindustrializada”na contribuição holandesa sobre o ‘distritofloricultor de Keukenhof’ (“the flower-growing district of Keukenhof”).

Pode-se dizer, portanto, que a redesco-berta da noção marshalliana de “distrito” foicertamente muito enriquecedora, mas que elanão pode dar conta da complexidade ediversidade dos sistemas locais. Ao mesmo

tempo, precisa ser evitado o risco de seremcriadas tantas novas noções quantas foremas situações diferenciadas. Daí a vantagemda noção de “sistemas produtivos locais”(“local productive systems”) que acabou, aliás,entrando no subtítulo da publicação dos anaisdessa conferência da OCDE sobre “SistemasLocais de Pequenas Empresas e Criação deEmprego”.

Nos Estados Unidos, 60% das ativi-dades econômicas puderam ser atribuídas aum total de 380 “clusters” em diversas fasesde amadurecimento, e depois classificadosem apenas quatro tipos de origens: a) recur-sos naturais estratégicos, como nos casos deChicago (agroalimentar); b) fontes de novastecnologias, como o Vale do Silício (micro-eletrônica); c) mercados de trabalho espe-cializado, como Dalton, na Georgia (tapetes)ou Tupelo, no Mississippi (móveis); e d) opor-tunidades mercadológicas, como Buffalo, emNew York (meio ambiente), ou mesmo NewYork City (jóias).

Todos os que procuraram entenderqual é a relação existente entre a formaçãodesses feixes e o empreendedorismo acaba-ram por enfatizar os mesmos fatoresculturais presentes em todas as caracte-rizações de “distritos” ou “SPL”. Como jáfoi dito, a única diferença é que esses fatoresculturais são muitas vezes compactados nasedutora noção de “capital social”, relan-çada com muita perspicácia pelas pesquisascoordenadas por Robert Putnam sobre asdiferenças de desempenho institucional dasdiversas províncias da Itália. Muitas vezes,o capital social é entendido como um com-plexo de instituições, costumes e relações deconfiança que alavancam a cooperação.Outras vezes, essa expressão “capital social”é expressamente evitada e substituída porlongas considerações sobre misteriososprocessos formadores de atitudes culturaisque afetam não somente a disposição acooperar com outros, mas, sobretudo, asestruturas institucionais que influenciam oempreendedorismo.

Uma excelente síntese da questão foifeita por Sebastiano Brusco ao apontar as trêslições essenciais que devem ser tiradas daexperiência italiana: a) a necessidade decombinar concorrência com cooperação; b) anecessidade de combinar conflito com parti-

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cipação; e c) a necessidade de combinar oconhecimento local e prático com o científico.Essas três lições fazem com que a interrogaçãocentral passe a recair, portanto, sobre ascondições que permitem a emergência deinstituições mais favoráveis a essas trêscombinações. E a resposta - como não poderiadeixar de ser - é afirmação de que o desen-volvimento depende essencialmente do papelcatalisador que desempenha um projetoelaborado por atores locais.

Nota-se, portanto, que nessa tortuosaevolução do debate internacional desenca-deado pelos estudos sobre os distritos indus-triais marshallianos, ganhou forte respaldocientífico uma perspectiva contrária à quepredominou durante muito tempo nas esfe-ras governamentais e nas organizaçõesinternacionais que procuram influenciar osrumos das políticas econômicas nacionais.

Com muito atraso, estas começaram alevar a sério proposições sobre desenvolvi-mento “endógeno”, desenvolvimento “debaixo para cima”, e até sobre “ecodesen-volvimento”15, acabando por admitir que asiniciativas locais podem ser cruciais para odesenvolvimento, pois se tornam importantefator de competitividade ao fazerem dos terri-tórios ambientes inovadores. Evidentemente,não demoraram tanto a aparecer as limitaçõesinerentes às resultantes políticas do “desen-volvimento local”, o que acabou por estimulardebates dos mais bizantinos sobre as relaçõesentre o “local” e o “global” no processo dedesenvolvimento, nos quais costumam até ase levar a sério ridículas disputas entre o“glocalismo” e o “lobalismo”...

3. Do planejamento regional aodesenvolvimento territorial

Durante a “era de ouro” (1948-73), apreocupação de minorar as distorções espa-ciais fatalmente provocadas pelo crescimen-to econômico levou à montagem de estru-turas administrativas cuja principal missãoseria a de “planejar” ou “ordenar”o povoa-mento (ou ocupação) de territórios nacionaismediante determinadas orientações deinvestimentos públicos em infra-estrutura evárias formas de incentivos e regulamenta-ções sobre os investimentos privados. Surgi-ram então vários tipos de arranjos adminis-

trativos nacionais de “planejamento regio-nal” (ou “ordenamento territorial”), que nãopodiam se basear em qualquer experiênciaacumulada em países capitalistas. As rarastentativas anteriores haviam sido todasrestritas a uma determinada região, além depertencerem ao contexto inverso, isto é, o dacontração da economia mundial durante oentre-guerras. Foi nos anos 1930 que a expe-riência do New Deal com a TVA (TennesseeValley Authority) incentivou o governobritânico a dar um tratamento diferenciadoa suas áreas de mineração muito afetadaspela crise, e estimulou o governo italiano aadotar medidas que pudessem reduzir amiséria do Mezzogiorno. Antes disso houveimenso desprezo pelo fator espacial, tantonas políticas econômicas, quanto na ciênciana qual pretendem se inspirar. No capita-lismo anterior a 1929, talvez só possam sercitadas as propostas dos saint-simonianos ea obra teórica de Von Thünen como asexceções que confirmam a regra.

Duas reações ao “marasmo” econô-mico que se seguiu à “era de ouro”, a partirdos anos 1970, pressionaram muitos dessesrecentes aparatos de planejamento (ouordenamento) a redefinir sua missão. Umadelas foi a forte vaga de “descentralização”baseada na idéia de que as distorções queproduziam as disparidades regionais desa-pareceriam por si só, caso as administraçõeslocais tivessem mais liberdade, poder e meiosde ação. Outra foi o impulso para uma maiorintegração supra-nacional, que se manifestouprincipalmente no oeste europeu, mas quevem tendo desdobramentos semelhantes emoutras regiões dos continentes americano easiático. E foi como resultado dos maisevidentes dessa dupla pressão que se deu odeslize semântico para “desenvolvimentoespacial” e, principalmente, para “desenvol-vimento territorial”.

As vantagens das palavras “espaço” e“território” são evidentes: não se restringemao fenômeno “local”, “regional”, “nacional”ou mesmo “continental”, podendo exprimirsimultaneamente todas essas dimensões. AUE vinha elaborando há quatro anos sua“perspectiva” ou “esquema” de “desenvol-vimento espacial”16, quando a OCDE criouum novo serviço com a missão de levar seuspaíses membros a elaborar suas próprias con-

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cepções de “desenvolvimento territorial”17.Muito mais significativas, entretanto, parecemser as motivações que levaram ao progressivouso do substantivo “desenvolvimento” parasubstituir os fora de moda “planejamento” e“ordenamento”.

Na França, foi uma comissão intermi-nisterial “de ordenamento do território” quepreparou um projeto de lei de orientação“para o desenvolvimento do território”. Talfato é considerado marco simbólico de umavirada, mesmo que do debate parlamentartenha resultado, em 4 de fevereiro de 1995,uma lei que acabou conservando os doisvocábulos (“l’aménagement et le développementdu territoire”). Basicamente porque o ordena-mento seria algo “consentido, outorgado eredistribuitivo”, enquanto o desenvolvimen-to seria “desejado, partilhado e produtor deriquezas”. Ou ainda, porque se pretendecruzar, num mesmo espaço, uma política“descendente (ordenamento) com umapolítica ascendente (desenvolvimento)”18.

A “perspectiva” européia de desenvol-vimento espacial (UE/ESDP) tem dois obje-tivos essenciais: aumentar a capacidade com-petitiva de territórios cuja integração no pro-cesso concorrencial é inadequada, e limitaros efeitos negativos de uma concorrênciaexacerbada. Nos dois casos, a abordagemespacial procura uma melhor combinaçãoentre competição e cooperação, de forma queo conjunto do território europeu possa atingirum nível ótimo de competitividade, refor-çando, ao mesmo tempo, sua coesão econô-mica e social. Para atingir esses objetivos, osmeios foram agrupados em três conjuntosoperacionais: a) um sistema policêntrico decidades, com uma nova relação urbano/rural; b) uma paridade de acesso à infra-estrutura e ao conhecimento; c) uma gestãomais prudente das heranças natural ecultural19. Para tanto, os vetores do desenvol-vimento espacial europeu20 foram triados emtermos de forças, fraquezas, oportunidadese ameaças (“SWOT analysis”) sendoidentificado um conjunto de 13 principaistendências (3 demográficas, 4 econômicas e6 ambientais), destacando-se o fato da econo-mia e do emprego europeus se tornarem cadavez mais dependentes das pequenas e médiasempresas (PMEs) como a mais importantedas tendências econômicas.

Uma das principais ambições do ESDPé tornar mais coerentes as quatro políticas co-munitárias de “significativo impacto espacial”que foram substancialmente fortalecidas, em1992, tanto pelo Tratado de Maastricht, comopelo subseqüente Conselho Europeu reunidoem Edinburgh: a) a agrícola (PAC), reforma-da nesse mesmo ano; b) a dos “Fundos Estru-turais”, ao qual foi juntado o novo “Fundode Coesão”; c) a de transportes e comuni-cações, agrupadas sob a sigla “TENs” (“Trans-European Networks”); e d) a política ambiental.

O serviço de desenvolvimento territorialda OCDE só foi criado por seu Conselho noinício de 1994, quase um ano depois daapresentação formal do projeto pelo Secre-tário Geral. Com o firme apoio da repre-sentação austríaca, ele propôs o agrupamen-to de quatro unidades até ali dispersas emoutras divisões: os grupos especializados emquestões urbanas, desenvolvimento rural edesenvolvimento regional, mais o programade ação e cooperação sobre iniciativas locaisde criação de emprego21. Baseou tal propostaem duas justificativas, uma de ordem políticae outra de ordem operacional:

a) As zonas urbanas, suburbanas e rurais sãocada vez mais interdependentes e os problemasde uma delas também interferem nas outras.Por exemplo, os fenômenos de aglomeração ede congestão urbana são inseparáveis dadebilitação de certas regiões e do êxodo rural.Além disso, os efeitos de proximidade tornamainda mais manifesta a necessidade de umaabordagem política coordenada, que possaintegrar o conjunto dos aspectos do desenvol-vimento. Assim, na escala local, os problemasde emprego, de harmonia social, de qualidadeda vida – para tomar apenas alguns exemplos –são indissociáveis [...].b) O desenvolvimento harmônico do tecidoeconômico está no centro dos trabalhos dosgrupos que tratam de assuntos urbanos, locais,rurais e regionais. Isso se traduz por ações quevisam encontrar, para uma determinada zona,um equilíbrio entre o fortalecimento de suacapacidade concorrencial e a melhoria da quali-dade de vida de seus habitantes. Atingir esseobjetivo exige a criação de novas formas deparcerias entre os atores envolvidos, quer elessejam públicos, privados, nacionais, regionais oulocais. Estímulo a projetos, iniciativa rural, açãourbana, tudo isso decorre da mesma idéia,segundo a qual as contribuições locais permitemoperar mudanças significativas na paisagemsocioeconômica territorial22.Durante o primeiro debate dessa pro-

posta, três outras delegações - Austrália,Canadá e Noruega - juntaram-se à da Áustria

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para considerar o novo serviço como “primei-ra etapa lógica” de um processo que deveriapermitir à OCDE uma abordagem analíticamais horizontal das questões relativas aodesenvolvimento econômico, social e ecológicode seus países membros. Em seguida, as dele-gações da Holanda e da Suíça foram aindamais longe, chegando a propor, inclusive, a“completa fusão dos órgãos subsidiários dosquatro grupos”. Mas tanto entusiasmo esbar-rou na resistência das delegações do Japão,da Bélgica e do Reino Unido, e numa certahesitação por parte dos representantes daIrlanda e da Espanha. Muitas dessas reticên-cias eram de ordem orçamentária, mas tam-bém foi mencionado o temor de que o novoserviço viesse a reforçar a concentração daOCDE em “questões de desenvolvimentoeconômico e industrial em detrimento dosproblemas ambientais, do turismo e dacultura”23. Como tais “dúvidas” não foramcompletamente superadas, elas voltaram a semanifestar em 1998. Mas, até o momento,nada disso alterou a natureza do “TDS”, quecontinua a ser apresentado da seguinte forma:

Fatores espaciais são elementos importantes na‘real’ organização da atividade econômica, mascontinuam fora do escopo dos atuais macroreferenciais. Esses dois mundos – o dos gestoresda política macroeconômica e o das localidades,cidades e regiões – continuam bem indepen-dentes um do outro, mesmo quando muitasquestões consideradas ‘locais’ têm revelado umcaráter cada vez mais ‘transfronteiriço’. De resto,distorções econômicas e sociais continuam aafetar a alocação espacial de recursos e de renda– assim como o papel do setor público – nãopodendo, portanto, ser ignoradas pelasabordagens mais gerais sobre o crescimento e oajuste estrutural.Contra esse tipo de herança, a OCDE reforçouseu trabalho sobre as relações entre políticasgovernamentais de caráter urbano, rural,regional e local, mediante o agrupamento dessasatividades em um único Serviço de Desenvol-vimento Territorial. Uma preocupação central éentender como as políticas desses quatro núcleosrelacionados ao espaço podem efetivamentecontribuir para reformas estruturais e funcio-namento das forças de mercado, e particu-larmente para a capacidade de geração deempregos produtivos, de adequado aprovei-tamento de recursos humanos, de melhoria dopadrão e da qualidade de vida, de resposta àcrescente demanda de amenidades, e deprevenção contra a marginalidade social e adegradação ambiental; enfim, todos os com-ponentes indispensáveis ao bom funcionamentodas localidades, cidades e regiões24.

Um dos fatores que fez brotar no inte-rior da OCDE a idéia de juntar sob o lema do“desenvolvimento territorial” seus núcleosvoltados aos problemas urbanos, rurais eregionais foi, com certeza, mais de um decêniode experiência com o programa dedicado àgeração de empregos mediante estímulos ao“desenvolvimento local”. Esse programa deação e cooperação sobre iniciativas locais decriação de emprego - que hoje se chama“LEED – Local Economic and EmploymentDevelopment” - foi criado em 1982, e deuorigem a uma vasta rede de intercâmbio quedivulga análises e relatos de experiênciasconcretas por meio de “notebooks” e de uma“newsletter” intitulada Innovation &Employment, que chegou a ser editada emparceria com a União Européia.

Em maio de 1993, o comitê diretordesse programa decidiu fazer uma série deavaliações nacionais das políticas e práticasde desenvolvimento local. O foco desses estu-dos anuais deveria estar justamente nas rela-ções entre as políticas nacionais, regionais elocais, de tal forma que se pudesse discutir acoerência dos programas de desenvolvi-mento local de cada país. O primeiro a secandidatar a esse tipo de avaliação foi ogoverno austríaco, numa iniciativa conjuntade sua ‘Chancelaria Federal’ e do seu ‘Serviçode Mercado de Trabalho’. Além de quatrofuncionários da OCDE e de dois repre-sentantes de países membros (Holanda eCanadá), o grupo de trabalho encarregadodessa avaliação contou com a colaboraçãode dois especialistas convidados: MichaelPiore, do MIT e Alvaro Espina y Montero,assessor especial do Ministro da Economiada Espanha.

Como logo no início dos anos 1970 aÁustria foi drasticamente atingida pela crisedo padrão de crescimento da “era de ouro”,ela foi um dos primeiros países a experimen-tar as opções de “reestruturação industrial”discutidas no âmbito das organizações inter-nacionais ao longo dos anos 1980, e queacabaram convergindo para a idéia centralde promover o “desenvolvimento local”. Issoteve um claro impacto no “Conceito Aus-tríaco de Planejamento Regional”, reelabo-rado a cada dez anos por uma “Conferênciasobre Planejamento e Políticas Regionais(ÖROK)”, presidida pelo chanceler federal

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e formada por vários ministros, gover-nadores das Länder e representantes dascomunidades locais. A principal diferençaentre os “conceitos” de 1981 e de 1991 foique o último não visa diretamente a reduçãodas diferenças regionais de padrão de vida,nem a criação/atração de novas empresasem áreas menos favorecidas mediante incen-tivos financeiros. O texto de 1991 procurou,ao contrário, definir com clareza o potencialde cada região para um desenvolvimento“endógeno”, dando origem, no âmbitofederal, ao “Programa para o Desenvolvi-mento Regional Endógeno (FER)”.

Ao tirar as lições da experiência aus-tríaca de “ajustamento local à reestruturaçãoindustrial”, o relatório do grupo avaliadorda OCDE fez uma leve crítica a essa evo-lução, enfatizando que o grande perigo daabordagem do desenvolvimento local é asimples agregação de programas, sem umaestratégia que de fato possa mobilizar oconjunto das comunidades. Ou ainda, que“a estratégia de desenvolvimento local éparticularmente válida como um comple-mento do desenvolvimento regional noâmbito de uma estratégia maior baseada noconceito de ‘desenvolvimento territorial’ – acombinação de políticas governamentais des-cendentes com iniciativas de desenvolvi-mento endógeno”25.

Outro fator que certamente contribuiupara que a OCDE decidisse criar um serviçode desenvolvimento territorial foi quase umdecênio de experiência com o programa dedesenvolvimento rural, particularmente oProjeto sobre Indicadores de Emprego Rural(“REMI Project”). Foi ele que deixou claro oquanto podem ser enganosas as compara-ções cronológicas de indicadores de empregopara uma mesma área, e o quanto podemser instrutivas as comparações espaciais emum mesmo momento. Apesar da baseestatística da OCDE ser uma das que melhorpermite comparações entre países – isto é,territórios - até o início dos anos 1990 essaorganização só dava atenção às séries tem-porais de cada país membro. No entanto, asdiferenças cronológicas das taxas de desem-prego, por exemplo, são muito menos signi-ficativas que as disparidades entre os paísesmembros. Em 1995, essas taxas variavam demenos de 3% no Japão a mais de 23% na

Espanha. E as disparidades regionais dentrode cada país eram ainda mais importantes.

Também se deve ao REMI a demons-tração de que o sucesso e o insucesso em criarnovas oportunidades regionais de empregonão estão estritamente correlacionados aosgraus de urbanidade ou de ruralidade. Aruralidade não é deficiência, e também nãoé sinônimo de declínio; tanto quanto urbani-dade e aglomeração não garantem automa-ticamente um próspero desenvolvimento.Em vez de comparar apenas as diferençasentre áreas rurais e urbanas, tornando impli-citamente o urbano como modelo para orural, o REMI preferiu se dedicar a compa-rações entre regiões mais e menos dinâmicas.Principalmente porque as regiões rurais maisdinâmicas podem ser melhor referência parasimilares mais atrasadas do que o seriam asurbanas. E foi a partir desse tipo de compa-rações realizadas pelo REMI que o programade desenvolvimento rural da OCDE passoua ganhar consistência.

O eixo dos poucos trabalhos sobrequestões rurais feitos durante os anos 1980era a necessidade de melhorar sua gestãopelos aparelhos de administração governa-mentais. Como a elaboração de políticas parao meio rural depende de um amplo e hete-rogêneo conjunto de entidades públicas, osprincipais desafios convergiam sistematica-mente para a necessidade de realizar umtrabalho cooperativo. Não é de se estranhar,portanto, que a palavra-chave dessa fasetenha sido “parceria”. Nessa linha, diversasatividades que juntaram responsáveis nacio-nais pelas políticas de desenvolvimento ruralcom estudiosos do assunto, revelaram oquanto era precário o entendimento da im-bricação dos problemas rurais com as maisamplas tendências socioeconômicas, am-bientais e políticas. Isto é, a necessidade deuma “uma abordagem mais global, e inclusiveterritorial, da política rural”26.

Além disso, processos de reforma daspolíticas agrícolas estavam em curso emmuitos países membros e, principalmente, naComunidade Européia. Tudo isso certamen-te ajudou para que, em 1991, o Conselho daOCDE resolvesse criar um programa voltadoespecificamente para o fenômeno rural, tendocomo primeira tarefa a elaboração de umrelatório, só publicado em 1993 com o

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provocativo título “Que futuro para os nossoscampos?” (“What Future for Our Countryside?”,“Quel avenir pour nos campagnes?”). E talveztenha sido justamente por mostrar a dificul-dade de se encontrar respostas convincentesa essa grande interrogação, que esse trabalhotenha contribuído, não só para a criação doServiço de Desenvolvimento Territorial, mas,sobretudo, para que se investisse em ‘estudosde caso’ e ‘oficinas de trabalho’ que pudessemtrazer novos “insights”, mesmo que nãotrouxessem conclusões generalizáveis.

Essa linha mais empírica de trabalhofoi tão fecunda que torna impossível qual-quer pretensão a uma síntese que lhe façajustiça. Mas há três pontos que não podemdeixar de ser registrados: a) a matriz dosprincipais bens e serviços que aproveitam asvantagens competitivas do meio rural (queresultou de investigações sobre a equivocadanoção de “nichos de mercado”); b) as razõesda lentidão do processo de aproveitamentodessas vantagens competitivas; e, sobretudo,c) a crescente evidência de que estão nos pa-trimônios natural e cultural (“rural amenities”ou “aménités rurales”) as principais vanta-gens competitivas dos espaços rurais.

Ao selecionar os estudos de caso, a ên-fase recaiu sobre os bens e serviços que usamrecursos mais freqüentes nas áreas rurais. Emseguida fez-se uma classificação segundotrês características – recursos naturais,heranças culturais e tradicionais, e recursosambientais – e dois critérios econômicos –bens e serviços – da qual resultou uma“matriz” com seis janelas que ilustram muitobem a diversidade da economia rural. Depoisfoi feita uma lista dos oito obstáculos que maisdificultam um aproveitamento econômicomais rápido desses recursos, com ênfaseespecial para a distância que existe entre arealidade de formações sociais ainda“agrárias” e a própria natureza das moder-nas atividades de “marketing”.

O que mais chama a atenção nas seisjanelas da matriz da diversidade rural é quetodas elas estão umbilicalmente ligadas aoaproveitamento econômico do que se con-vencionou denominar “amenidades”. Ouseja, em sua etapa mais avançada, o desen-volvimento rural depende muito mais daspossíveis maneiras de tornar rentável apreservação de peculiaridades naturais e

culturais, do que da exploração dos velhostrunfos baseados na exploração da fertilida-de dos solos, ou no aproveitamento de van-tagens de localização industrial. E quandose consegue estabelecer uma sinergia entrepreservação de “amenidades” e dinamismoeconômico – como acontece, por exemplo,no caso da trilha de fronteiras suíça, ou nodos parques naturais franceses – fica simples-mente impossível dizer se a atividade é“primária”, “secundária” ou “terciária”.

A idéia de que os países membros daOCDE devem dar alta prioridade à capita-lização do valor das “amenidades rurais” foia principal conclusão da oficina de trabalhorealizada em setembro de 1997 no Japão, naqual foram analisados estudos de casoreferentes a doze países (Austrália, Áustria,Bélgica, Canadá, Finlândia, França, Grécia,Japão, Luxemburgo, Noruega, Suécia eSuíça). E as resultantes recomendaçõessugerem a adoção de dois tipos básicos depolíticas: a) políticas que estimulem a diretacoordenação entre os provedores e os benefi-ciários das amenidades (apoio à ação coleti-va e à valorização comercial); b) políticas queajudem a mudar certas regras econômicas(regulamentações e incentivos financeiros).27

Conclusões

O próprio caráter da exposição feitanos três tópicos anteriores impede que delase tirem verdadeiras conclusões (isto é,sínteses de confirmações ou refutações dehipóteses). Mas permite que sejam formu-ladas dez proposições em torno das quaisdeve se organizar o debate que permitirá oavanço das pesquisas sobre a face territorialdo desenvolvimento:

a) É errado abordar as relações entrecidade e campo nos termos em que se desen-rola o debate sociológico, isto é, de “dicotomiax continuum”. O aumento da densidadedemográfica nas zonas “cinzentas” - quedeixaram de ser propriamente rurais e quenão chegam a ser propriamente urbanas - nãosignifica que esteja desaparecendo a contra-dição material e histórica entre o fenômenourbano e o fenômeno rural. Em termoseconômicos e ecológicos, aprofundam-se, emvez de diluírem-se, as diferenças entre essesdois modos de relacionamento da sociedade

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com a natureza.b) Também é errado opor uma ten-

dência de “ressurreição rural” à velha teseda “desertificação rural”. Em termos estri-tamente demográficos, há áreas rurais quecontinuam se esvaziando e outras que se recu-peram. Mas as possibilidades de dinamismoeconômico dessas áreas não estão necessa-riamente correlacionadas às tendências demo-gráficas, uma vez que as mais promissorasvantagens competitivas das áreas rurais são“amenidades” que dependem de herançasnaturais e culturais, podendo ser até melhoraproveitadas por movimentos apenas tempo-rários de população.

c) O processo de aproveitamento dasnovas vantagens competitivas tem sidomuito lento porque depende dos inúmeros epouco conhecidos determinantes do “empre-endedorismo”. A ênfase no caráter endógenode tais determinantes - que está embutidano uso cada vez mais freqüente da noção de“capital social” - não deve, todavia, levar apensar que possam ser menos interessantesos determinantes exógenos que resultam daimportância que o conjunto da sociedade dáao patrimônio natural e cultural de seusespaços rurais.

d) Fatores supranacionais – como aintegração européia ou, de forma maisampla, a regionalização internacional e a“mundialização” ou “globalização” – têmprovocado uma heterogênea evolução daspolíticas governamentais. A crescente expo-sição ao comércio internacional e à acele-ração do progresso tecnológico exigem mu-danças estruturais que permitam removerobstáculos ao crescimento e ajudem a apro-veitar novas oportunidades. Muitas dessasmudanças estruturais são de caráter sub-nacional, mostrando a pertinência de umaabordagem territorial, para a qual os quadrosdirigentes estão, contudo, despreparados.Sabem que o principal desafio é identificaros fatores que permitiriam ampliar as opor-tunidades de desenvolvimento das regiõesmenos dinâmicas, mas também não ignoramque a resposta depende de uma explicaçãoainda muito precária sobre as razões dessemenor dinamismo.

e) O uso cada vez mais freqüente danoção “DT: desenvolvimento territorial” (ou“espacial”, como prefere a Comissão

Européia), tende a substituir a tradicionalexpressão “desenvolvimento regional”, poispermite uma referência simultânea aodesenvolvimento local, regional, nacional, eaté continental (no caso da Europa).

f) Mas essa retórica do “DT” tambémdeve muito à evolução paralela dos debatesda “economia industrial”, da “economiarural” e da “economia regional e urbana”.Nos últimos quinze anos houve nessas trêsdisciplinas uma forte valorização da escala“local”, logo seguida (ou acompanhada) danecessidade óbvia e imperiosa de não isolá-la das escalas superiores que vão até a“global”.

g) A retórica do “DT” é certamentemelhor que a do “desenvolvimento local”,mas ambas estão longe de engendrar uma‘teoria & prática’ que venha, de fato, superaras divisões setoriais (primário, secundário eterciário) e também permitir um tratamentointegrado da divisão espacial (cidade ecampo).

h) As mudanças semânticas do debatepúblico sempre revelam um sentimento cole-tivo de que noções utilizadas até determi-nado momento não mais dão conta da per-cepção que se tem dos problemas enfren-tados, nem exprimem direito o que se gosta-ria ou pretenderia fazer em seguida. Ou seja,são mudanças que refletem as hesitaçõesintrínsecas ao enunciado de novos projetossociais, e, por isso mesmo, as novas noçõesem torno das quais se organiza o debatepúblico costumam ser sempre muito impre-cisas, fluidas e ambíguas.

i) Não há, portanto, muito interesse emsaber qual pode ser a utilidade de cada umdos inúmeros adjetivos que têm sido acres-centados ao substantivo “desenvolvimento’conforme evolui o debate público sobre essagrande utopia dos últimos cinqüenta anos.Por isso, em vez de comparar o valor relativodas inúmeras maneiras pelas quais se podesubjetivamente qualificar o desenvolvimentocomo objetivo central das políticas públicas,o que interessa é discutir a real relevância dadimensão territorial do processo objetivo dedesenvolvimento.

j) É muito cedo para saber se, além deum indiscutível progresso retórico, a noção“desenvolvimento territorial” traz algo derealmente novo para um eventual desen-

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18 José Eli da Veiga

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, N. 5, Set. 2002.

volvimento das regiões sem dinamismo eco-nômico, que também costumam ser chama-das de periféricas ou atrasadas. Por exemplo,se estão melhorando as chances de umaregião como o sul da Itália (“Segunda Itália”)romper com a estagnação, mesmo que nãopossa deixar de ser periférica e atrasada emcomparações com as regiões mais dinâmicas.Não apenas porque a abordagem territorialsó começou a engatinhar em meados dosanos 1990, mas também porque é muitodifícil avaliar se as transformações positivasque estão ocorrendo no Mezzogiorno28

poderão vir a ser, de fato, favorecidas poressa nova abordagem.

Este texto, que é parte do primeiro relatório de andamentoda pesquisa que o autor está realizando na Europa comauxílio da FAPESP, já incorpora alguns dos comentáriosgentilmente enviados pelos colegas Ademir Cazella, EduardoEhlers, Ignacy Sachs, e Ricardo Abramovay.

Notas:1 Conforme tipologia da OCDE baseada na proporção

da população regional que vive em localidades rurais,isto é, com menos de 150 hab/km2. ‘EssencialmenteRurais’ são as regiões nas quais mais de 50% daslocalidades são rurais; ‘Relativamente Rurais’ são asregiões nas quais entre 15 e 50% das localidades sãorurais; ‘Essencialmente Urbanas’ são as regiões nasquais menos de 15% das localidades são rurais. Ver apropósito Abramovay (1999a).

2 Um excelente discussão desse problema está emBertrand (1975).

3 Ver sobre este assunto o interessante artigo deLarceneux (1996).

4 “It is impossible for a rural area to develop withoutautomatically becoming non-rural” (Saraceno, 1994,p. 468).

5 Cf. OCDE (1997).6 Parafraseando Jean Rostand, vale lembrar que é muito

mais fácil se entender com quem fala outra língua doque se entender com quem dá outros sentidos àsmesmas palavras...

7 Realizados desde o final dos anos 1970 peloseconomistas Giacomo Becattini, Gioacchino Garofoli,Sebastiano Brusco e Fabio Sforzi e pelos sociólogosArnaldo Bagnasco, Carlo Trigilia e Vittorio Capecchi.

8 Benko e Lipietz (1992); Rallet e Torre (1995); Abdelmalkie Courlet (1996); e Pecqueur (1996).

9 Cf. Garofoli (1996, p. 370). Ou seja, deve ser impossívela ocorrência dessa economia “difusa” em vastas áreasdo território brasileiro, embora ela seja não só possível,como muito provável, no norte gaúcho, em SantaCatarina, no sudoeste do Paraná, em algumasmesorregiões do Sudeste e do Nordeste, e até emcertas microrregiões do Centro-Oeste e do Norte.

10 Cf. OCDE (1998).11 Sobre a noção de “capital social”, ver Abramovay

(1999b).12 Cf. Maillat (1995) e Becattini e Rullani (1995).

13 Cf. Becattini e Rullani (1995, p. 188-190).14 Cf. Sforzi (1996).15 cf. Friedmann e Weaver (1979); Sachs (1980); Stöhr

(1981).16 Chamada de “European Spatial Development

Perspective (ESDP)” ou “Schéma de Développementde l’Espace Communautaire (SDEC)”.

17 O “Territorial Development Service” (TDS) foi criadoem 1994.

18 Leurquin (1998, p. 196).19 Cf. UE/ESDP (1997).20 Sendo 5 relativas às estruturas urbanas; 2 relativas à

mudança do papel das áreas rurais; 7 relativas às mu-danças nos transportes, comunicações e conheci-mento; e 4 relativas à contínua pressão sobre asheranças natural e cultural.

21 Esse programa, cuja sigla original era “ILE”, passoudepois a ser denominado “LEED: Local Economic andEmployment Development”.

22 Tradução livre de trechos do parágrafo 11 da “Notado Secretário Geral” C(93)83, de 29/06/93.

23 Estas observações resultam de uma leitura do processoverbal da reunião do Conselho, um documento“reservado” da OCDE.

24 Tradução livre do tópico “Territorial Development”da brochura The OECD in the 1990s, p. 40-41.

25 Cf. OCDE (1995, p. 77).26 Cf. OCDE (1993, p. 46).27 Cf. OCDE (1999:32-34).28 Fala-se mesmo de uma “grande svolta”. Ver a propósito

Bodo e Viesti (1997).

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19A face territorial do desenvolvimento

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Desenvolvimento e educação em comunidades indígenas: uma parceria necessáriaDevelopment and education in indigenous communities: an usefull partnership

Desarrollo y educación en comunidades indígenas: una aparcería necesaria

Marta Regina BrostolinUniversidade Católica Dom Bosco

contato: [email protected]

Resumo: O presente artigo aborda o tema desenvolvimento, questiona a forma como ainda se apresentam projetosna área, preocupados com a produção e não com as pessoas, principalmente quando se trata de planos e estratégiasde desenvolvimento voltados para as comunidades indígenas. Na concepção atual, o processo de desenvolvimentodeve estar centrado no ser humano, na busca por uma qualidade de vida. Nesta perspectiva, a educação pode ser oespaço promotor de uma relação intercultural de respeito, autonomia e desenvolvimento.Palavras-chave: Desenvolvimento; educação; comunidades indígenas.Abstract: This article reports on the theme of development, questioning how the projects are presented in this area,always concerned with production and not people, mainly when development and strategies are planned for theIndian community. In today‘s conception, the developmental process must focus on the human being, seeking goodlife quality. From this viewpoint, education can be the promoting area for an intercultural relationship of respect,autonomy and development.Key words: Development; education; Indian communities.

Resumen: El presente artículo aborda el tema desarrollo, cuestiona la manera como aún se presentan los proyectosen el área, preocupados con la producción y no con las personas, principalmente cuando se trata de planes yestrategias de desarrollo direccionados a la comunidad indígenas. En la actualidad, el proceso de desarrollo debeestar centrado en el ser humano, en la búsqueda de una cualidad de vida. En esta perspectiva, la educación puede serel espacio promotor de una relación intercultural de respeto, autonomía y desarrollo.Palabras claves: Desarrollo; educación; comunidades indígenas.

Bremen (1987) denuncia a tendênciade agentes promotores de projetos de desen-volvimento, de considerar as comunidadesindígenas como inseridas na mesma proble-mática da sociedade envolvente. São pobrese logo inserem-se no amplo leque da margi-nalização social, sinalizando para a comple-xa e importante relação entre etnia e classena América Latina.

O autor ainda questiona a validade deafirmações constantes em muitos projetossobre a participação dos indígenas em suaelaboração. Ao analisar os argumentos in-dígenas para a concordância com as propos-tas em questão, percebe que os mesmos co-incidem com os dos promotores. E ao anali-sar a concordância das comunidades indí-genas quanto às propostas formuladas poragentes externos, percebe também o autorque a concordância ocorre não pelas razõesque motivam o projeto, mas sim, para satis-fazer suas necessidades imediatas.

Contribui também para o fracasso demuitos projetos a falta de perspectiva paraa pequena produção agrícola em geral, nocontexto da política agrícola em vigor.

Esse é um dado de difícil compreen-são para muitos povos indígenas, sendo di-fícil chegar a uma certa ou até necessáriaadequação entre as exigências do mercadoregional e as características/condições pró-prias das mesmas comunidades.

Entretanto, ao procurarem soluções de

1. Introdução

Desenvolvimento é o desafio mais pre-sente que a humanidade enfrenta nos diasde hoje. A maioria dos planos de desenvol-vimento no mundo em desenvolvimento se-ria muito diferente se sua preocupação fos-se com as pessoas e não com a produção.

Uma estratégia de desenvolvimentohumano deve ser descentralizada para en-volver a participação da comunidade. Obje-tivos notáveis de desenvolvimento humanoadotados em planos nacionais são freqüen-temente frustrados porque aos beneficiáriosé dada pouca oportunidade de participaçãono planejamento e implementação. Quan-do os projetos se destinam a comunidadesindígenas, a situação é mais séria ainda.

Os agentes promotores não levam emconta, suficientemente, as característicasculturais de cada povo, a forma tradicionalde como organizam sua economia, ou en-tão, transferem determinadas característicasde um grupo para outro, generalizando as-pectos não generalizáveis, ou transferindopara os índios desejos e aspirações dos agen-tes não-índios.

Em Mato grosso do Sul, estado que abri-ga a segunda maior população indígena doBrasil, em torno de 51.000 índios, é comumtransferirem experiências dos Terena para osGuarani, partindo da falsa suposição de queos índios são fundamentalmente, iguais.

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, N. 5, p. 21-24, Set. 2002.

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, N. 5, Set. 2002.

problemas de curto prazo, acabam agravan-do ou criando problemas estruturais no sen-tido de provocarem maior dependência.

E essa dependência, (grifo nosso), nãoconduz a um desenvolvimento, pois segun-do Carpio Martin, em seu artigo Perspecti-vas de Desenvolvimento Local,

[...] o desenvolvimento local deve ser medidonão em termos de aumento de capital, mas sima medida que reduz a dependência das comuni-dades locais e promove a melhoria na qualida-de de vida (Martin, [s.d.], p. 3).Carpio Martin (1999), ainda afirma

queEl desarollo local es el reactivador de la econo-mia y dinamizador de la sociedad local, medi-ante el aprovechamiento eficiente de los recur-sos endógenos existentes en una determinadazona, capazde estimular y diversificar sucrecimiento económico, crear empleo mejorarla calidad de vida de la cominidad local, siendoel resultado de un compromisso por el que seentiende el espacio como lugar de solidaridadactiva. Lo que implica cambios de actitudes ycomportamientos de grupos y individuos.Podemos, então, entender Desenvolvi-

mento Local como a apropriação pela comu-nidade e pelo ambiente dos benefícios econô-micos dos processos de produção, através deum movimento participativo e articulado dosdiversos agentes locais, criando sistemas sus-tentáveis que diminuam os desequilíbriossócio-ambientais do crescimento econômico;aumentem a oferta de trabalho; contribuampara o equilíbrio entre os planos territorial esocial; coordenem e articulem políticas públi-cas de intervenção nas áreas de promoçãoeconômica e ordenamento territorial e com-patibilizem a promoção socioeconômica e aproteção do patrimônio natural e cultural.

2. Desenvolvimento humano, social esustentável

No processo de desenvolvimento, oalvo central é o ser humano como artesãode seu êxito ou fracasso, pois se requer quecada um, ao se tornar responsável pelo seupróprio progresso, influencie o seu entornocomo fonte irradiadora de mudanças, deevolução cultural, de dinamização tecno-lógica e de equilibração meio-ambiental. Por-tanto, não se obtém desenvolvimento semque se visualize o homem à luz da hierar-quia de valores, em sua integridade comopessoa humana, membro construtivo de sua

comunidade e agente de equilíbrio em seumeio geofísico. Enfim, o processo de trans-formação requerido pelo desenvolvimentoimplica necessariamente a evolução cônsciae autônoma do padrão de vida interno e ex-terno de toda a população.

Em vista disso, a regra teórica básica,que fundamenta o capitalismo moderno, temsido a de que todo desenvolvimento se carac-terize predominantemente como processo detransformação econômica com resultado ime-diato na área social, visando, por excelência,ao crescimento do padrão de vida externo dapopulação no seio da qual o mesmo ocorre.Neste caso, a transformação social é vistacomo consequência da transformação econô-mica, o que não se comprova, do ponto devista histórico, principalmente nos países sub-desenvolvidos e/ou em via de desenvol-vimento. Pelo contrário, o aumento da rique-za econômica não concebido, produzido epartilhado pela base populacional desses pa-íses, dentre eles o Brasil, ao invés de gerar ealavancar a qualidade de vida de sua gente atem agravado de maneira brutal e contínua,evidentemente no sentido dos segmentospopulacionais de base para os de elite.

Nos enfoques recentes do problema dodesenvolvimento, o relevante consiste, talvez,em considerar não que o crescimento com-porte aspectos sociais, mas que os avançossociais que aparecem simplesmente comometa ou resultado final, sejam, na realidadefatores contribuintes para o desenvolvimen-to e parte indispensável do processo de cres-cimento econômico, mediante o qual se podeatingir mais adiante melhores condições debem-estar humano.

Portanto, o que nos parece lógico é queas duas frentes de desenvolvimento – a sociale a econômica – andem interativamentejuntas, a social potencializando as pessoaspara se tornarem sujeitos e agentes e a eco-nômica ensejando sustentação material eapoio instrumental ao alavancamento dasocial no curso processual, disso resultando,aí sim, partilha da quantidade com quali-dade em todas as dimensões de concretudeda vida humana: saúde, higiene, salubri-dade, trabalho, segurança, educação, mora-dia, lazer, cultura, iniciativa, criatividade econgêneres.

A melhoria da qualidade de vida está

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23Desenvolvimento e educação em comunidades indígenas: uma parceria necessária

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condicionada à satisfação integral das neces-sidades básicas dos seres humanos do local,as quais podem ser resumidas em : subsistên-cia (trabalho, alimentação, moradia, saúde,procriação, humor); proteção (segurança,direitos sociais, família); afeto (auto-estima,vontade, sensualidade, solidariedade, gene-rosidade); entendimento (consciência críti-ca, curiosidade, instrução, capacidade deanálise e interpretação); participação (dispo-sição, diálogo, interação); ócio (despreocu-pação, tranqüilidade, tempo livre); criação(inventividade, imaginação, intuição, pai-xão); identidade (memória, coerência, reco-nhecer-se, diferença, compromisso) e liber-dade (autonomia, autodeterminação, assu-mir-se, arriscar ) (Martin, 1999).

Uma política de desenvolvimento vol-tada para a satisfação das necessidades hu-manas, entendida em seu sentido mais am-plo, transcende a racionalidade econômicaconvencional porque compromete o ser hu-mano em sua totalidade. As relações que seestabelecem e que podem estabelecer-se en-tre necessidades e suas satisfações, devempossibilitar a construção de uma filosofia euma política de desenvolvimento autentica-mente humanista.

Conceber as necessidades tão somen-te como carência, implica restringi-las aoaspecto puramente fisiológico, que é preci-samente o âmbito em que a necessidade as-sume com maior força e clareza, a sensaçãode falta de algo.

Portanto, na medida em que as neces-sidades surgem, motivando e mobilizandoas pessoas, surgem também potencialidadesque ainda podem chegar a ser recursos.

Assim, entendidas as necessidadescomo carência e potência, revelam um pro-cesso dialético constituindo um movimentoincessante.

Essa situação obriga a repensar o con-texto social das necessidades humanas deuma maneira radicalmente distinta de comotem sido habitualmente pensado por plane-jadores sociais e promotores de políticas dedesenvolvimento.

Neste enfoque, torna-se necessário ela-borar uma teoria das necessidades humanaspara o desenvolvimento que nos sirva comoinstrumento de política e ação, pois quandose fala em desenvolvimento , fala-se em me-

lhorar a vida das pessoas (desenvolvimentohumano), de todas as pessoas (desenvolvi-mento social), das que estão vivas hoje e dasque viverão amanhã (desenvolvimento sus-tentável).

Franco (2000, p. 36) afirmaSabemos mais ou menos quais são os ingredi-entes básicos do desenvolvimento humano esocial sustentável. Sabemos que, em geral, parase desenvolver é preciso crescer, mas crescersustentavelmente, produzir mais e melhor, seminviabilizar a vida das gerações futuras distribu-indo com mais equidade os frutos desse cresci-mento.

3. Desenvolvimento e educação: umaparceira necessária.

O desenvolvimento em escala humanarequer uma reestruturação e promoção deconhecimentos que despertem a consciênciacrítica e os instrumentos cognoscitivos neces-sários para contrapor as múltiplas formas dedependência. Essa promoção de conheci-mentos se dá através da educação e, ao rela-cionar educação e desenvolvimento, não de-vemos pensar como processos independen-tes, que só se associam por imposições das cir-cunstâncias históricas do presente. Embora oassunto, em si, pareça moderno e atual, oprogresso social jamais deixou de apresentardefinidas dimensões educativas. Se isso nãotivesse acontecido, não poderíamos sequercompreender o significado da educação nomundo moderno, ou seja, sua importânciacomo fator de reconstrução social.

Diz-se que uma comunidade se desen-volve quando torna dinâmicas suas poten-cialidades. E para isso acontecer é necessá-rio a reunião de vários fatores, dentre eles, onível educacional da população. É preciso aexistência de pessoas com condições de to-mar iniciativas, assumir responsabilidades eempreender novos negócios, buscando apoiono poder local e em outros níveis de gover-no, pois desenvolver, implica sempre emmudanças e participação da sociedade.

Portanto, o desenvolvimento local im-plica na formação e educação da própriacomunidade em matéria de cultura, capaci-dades, competências e habilidades que per-mitam a ela mesma, evidentemente com aajuda de todos os agentes e fatores externos,agenciar e gerenciar todo o processo de de-

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24 Marta Regina Brostolin

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, N. 5, Set. 2002.

senvolvimento da respectiva localidade, aoinvés de apenas participar de propostas ouiniciativas de desenvolvimento que venhamde fora.

O desenvolvimento local é pois, a dina-mização da população, a valorização dosrecursos locais, a criação de empregos e aju-da as mulheres e jovens, a implementaçãoda economia social, a criação de empresas,a dinamização da cultura local e capacida-de criativa e a investigação de novas tecno-logias de desenvolvimento, porque, investi-gar é, antes de tudo, praticar o exercício dacriatividade. Investigar é ver aquilo que osoutros não vêem e pensar naquilo que osoutros não pensaram. Énfim, investigar é abusca de novos enfoques para a participa-ção real na criação de novas iniciativas dedesenvolvimento.

Podemos dizer que estamos diante deum processo de Desenvolvimento Localquando houver um processo de aproveita-mento dos recursos e riquezas de um deter-minado local ou região, os quais podem servalorizados e transformados através do efe-tivo envolvimento da comunidade, resultan-do na melhoria da qualidade de vida da po-pulação através da geração de empregos,renda e acesso à saúde e educação.

Quando centramos como objetivo doDesenvolvimento Local a qualidade de vida,é necessário investigar o que determina essaqualidade de vida de uma pessoa ou comu-nidade, principalmente quando situada emoutra tradição cultural. E nesse caso, emer-ge com força a especificidade de uma pro-posta de desenvolvimento voltada para ascomunidades indígenas. É fundamentalatentar não apenas para as necessidades/demandas e bens econômicos ou recursos,mas para as formas internas de organiza-ção, suas estruturas políticas e sociais, valo-res, normas, espaço e cosmovisão. As eco-nomias indígenas articulam-se em torno dasrelações de parentesco, com divisão sexualde trabalho e voltadas para a geração de ali-mentos para consumo.

Cabe destacar que é sobre as economi-as indígenas que mais se faz sentir o impac-to da perda dos territórios e a destruição dosrecursos naturais, obrigando-as a passar deuma enorme diversidade e multiplicidade dealternativas de subsistência para uma ou

duas, apenas.O grande desafio para os projetos de

desenvolvimento em comunidades indígenasé a dificuldade em articular os saberes indíge-nas com o conhecimento ocidental. A cons-trução de alternativas econômicas nessascomunidades passa hoje, necessariamente,pela parceria entre os dois conhecimentos.

A educação escolar pode ser o elo deligação entre as duas culturas, sendo a esco-la um agente educativo, socializador e par-ceiro, oferecendo uma educação sintoniza-da com os direitos, interesses, necessidadese as especificidades da cultura indígena,transformando o ensino escolar em espaçode articulação de informações, práticas pe-dagógicas e reflexões dos próprios índiossobre seu passado, seu futuro, sobre seusconhecimentos, seus projetos e a definiçãode um lugar em um mundo globalizado.

Uma escola que faça com que o índioqueira continuar a ser índio e não ficar de-sejando abandonar a aldeia, que ofereçauma educação do índio e não para o índio.

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Sistemas agrossilvipastoris como alternativa sustentável para a agricultura familiarAgroforestry alternatives of sustainable production for family agriculture

Sistemas agroflorestales como alternativa sostenible para la agricultura familiar

Reginaldo Brito da Costa, Eduardo José de Arruda e Lincoln Carlos Silva de OliveiraUniversidade Católica Dom Bosco

contato: [email protected]

Resumo: Neste trabalho sistemas agroflorestais (SAFs) são caracterizados e discutidos sob a ótica da produção ruralsustentável. Propõem-se modelos de associações entre agricultura, pecuária e espécies florestais, adaptando estaspráticas à realidade regional. A implantação desses sistemas agroflorestais visa também proporcionar um padrãorazoável de qualidade de vida com a utilização da mão-de-obra familiar, bem como a auto-gestão das atividadesagrossilvipastoris por parte das comunidades rurais envolvidas, privilegiando-se desse modo associações ecológicassustentáveis próximas dos ecossistemas naturais. As alternativas expostas podem também conduzir a uma inserçãode pequenos produtores rurais no mercado de trabalho, hoje marginalizados em função do sistema agropecuáriovigente.Palavras-chave: Sistemas agroflorestais; agricultura familiar; desenvolvimento rural sustentável.Abstract: In this paper, the agroforestry systems are characterized and discussed from the point of view of sustainableproduction in family based agriculture. It will be proposed models to associate agriculture, cattle and forest species,adapting these practices to our regional reality. These systems could provide a good standard of life, using the familyworkmanship and self-administration in rural communities. It enhances the ecological production associations nearthe natural condition of ecosystems. The paper discusses the agroforestry systems as an attractive alternative toinserting small producers into the labor market, specially those who are marginalized under the current agriculturalpractices.Key words: Agroforestry systems; family agriculture; sustainable rural development.Resumen: Los Sistemas Agroflorestales (SAFs) son caracterizados y discutidos bajo la óptica de la producción ruralsostenible. Se proponen modelos de asociaciones entre agricultura, pecuaria y especies florestales, adaptándo estasprácticas a la realidad regional. Visa también, proporcionar un padrón razonable de calidad de vida con la utilizacióndel sistema familiar como mano de obra predominante, bien como autogestión de actividades agrosilvipastoriles porparte de las comunidades rurales involucradas, privilegiando las asociaciones ecológicas próximas de los ecosistemasnaturales. Las alternativas expuestas pueden conducir a una inserción de pequeños roductores rurales en el mercadode trabajo, hoy marginalizados en función del sistema agropecuario vigente.Palabras claves: Sistemas agroflorestales; agricultura familiar; desarrollo rural sostenible.

ponto de equilíbrio deve ser encontrado en-tre o uso tradicional e a necessidade da con-servação biológica dos ecossistemas.

A conservação biológica e o manejotradicional pelas comunidades locais, prati-cados ao longo dos séculos, devem ser con-siderados e avaliados num contexto de va-lor, pois, muitas vezes, atitudes sociais in-corporadas a práticas cotidianas têm pro-porcionado manutenção da paisagem e dacultura local nas áreas em exploração. Téc-nicas tradicionais de uso da biodiversidadee os valores culturais das regiões geográfi-cas envolvidas devem ser analisados critica-mente, evitando o decréscimo da diversida-de e a destruição do multifacetado panora-ma cultural, muitas vezes, por práticas agrí-colas impostas e geralmente equivocadas(Piussi e Farrell, 2000).

Esforços e mecanismos de incentivos,tais como: incentivos fiscais ou transferên-cia de conhecimento e tecnologia, soluçõesde mercado envolvendo público consumidore direitos de propriedade, podem ser realiza-dos no sentido de manter a sustentabilidade,associada a políticas que tornem a atividadede degradação florestal menos atrativa, ge-

Introdução

O Brasil é o país que abriga umamegabiodiversidade. Conforme estimativas,nele ocorrem 30% das espécies vegetais doplaneta. No entanto, essa biodiversidade nãoestá distribuída de modo homogêneo peloterritório nacional. A biodiversidade brasi-leira distribui-se em mosaico, com níveis maisvariados de preservação, mas também, comgrande variação quanto ao número e cate-goria de seus componentes por ecossistema.Áreas de grande diversidade se contrapõemàquelas habitadas por poucas espécies. Po-rém, em grande parte do país, de maneirageral, a biodiversidade vem sendo sistemati-camente reduzida pela ação humana.

As ações sobre o meio ambiente provo-cadas pela urbanização e expansão da fron-teira agrícola devem ser sistematicamenteavaliadas. As interações que ocorrem entrea sociedade e os ecossistemas florestais de-vem ser analisadas sob a ótica da gestão dosusos múltiplos dos recursos florestais na es-tabilidade dos ecossistemas e das estruturassociais, especialmente em regiões de áreasflorestais e assentamentos humanos. Um

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rem investimentos no capital social local eincentivem práticas extrativistas e agricul-tura sustentável (Richards, 2000).

No Brasil, o compromisso com a ques-tão ambiental evidencia-se através de inicia-tivas com o uso sustentável da biodiversida-de visando transferir conhecimento, de modobidirecional, por iniciativas empresariaiscom o envolvimento de comunidades locais.As ações e programas desenvolvidos noaproveitamento dos recursos naturais regio-nais buscam difundir conhecimentos e mo-tivar o interesse das comunidades, em reser-vas florestais, acerca dos temas referentes àconservação ambiental e fortalecimento dosvínculos comunitário-ambientais através deatividades produtivas sustentáveis, esta ati-tude de caráter diferencial tem possibilitadoagregar valor econômico adicional ao pro-duto natural. Muitas iniciativas buscam, ain-da, a manutenção e/ou a recriação de condi-ções ambientais propícias às atividades, taiscomo: a pureza do ar, proteção de nascen-tes e cursos d’água e a recomposição dehabitat para a vida animal.

Os problemas regionais, como porexemplo, a pobreza e a exclusão social, apon-tam para a necessidade de incorporar expe-riências desenvolvidas em diferentes paísese regiões, dentro de situações sociais epolíticas específicas dos grupos sociais envol-vidos no processo. Estas experiências devemser examinadas de forma multidisciplinar eapreendidas visando uma reflexão de abor-dagem integrada e examinadas dentro decritérios pré-estabelecidos, nos quais o conhe-cimento para exploração sustentável sejadisponibilizado.

A solução desses problemas sociaispode estar na capacidade de estimular a con-fiança, melhorar a organização familiar ecomunitária, e a auto-estima a quem tempoder de menos. No contexto de comprome-timento do Estado com estas ações, o pro-grama de fortalecimento da agricultura fa-miliar poderia não existir, se o Estado nãoenfrentasse as chamadas organizações tra-dicionais estabelecidas, que na maioria dasvezes são apropriadas por forças dominan-tes. Esta situação mostra que é imprescindí-vel a transferência do poder para forças co-munitárias locais. Assim, a sociedade devecriar mecanismos de controle e decisão que

induzam a continuidade das políticasimplementadas deixando as comunidadesmenos dependentes da boa vontade dosgovernantes (Vivan, 1998).

As pesquisas em agricultura alternati-va devem buscar idéias inovadoras relacio-nadas a como pesquisar e deve ser multidis-ciplinar, sustentável, agroecológica com ges-tão local, sofrendo influência e, às vezes, ori-entação da comunidade no direcionamentodas prioridades das pesquisas. Deve, tam-bém, gerar informações científicas que res-pondam aos anseios da comunidade e cen-tradas em sistemas experimentais compro-vadamente científicos, para determinar aviabilidade por longo período, oportuni-zando em novas bases técnicas e possibili-dades produtivas (Lockeretz e Molly, 1993;Almeida e Navarro, 1997).

As transformações mais drásticas, queafetaram as maiores extensões territoriais dopaís, têm ocorrido pela introdução de novoscultivos agrícolas, ou mesmo de animais do-mésticos, na matriz econômica nacional,com sua subseqüente expansão geográfica,sempre em busca de aumentos de produçãoatravés da simples ampliação de áreas de cul-tivo ou pastoreio, que pressiona os ecossiste-mas circundantes, complicando o espectroresultante. Por trás da homogeneidade vi-sual das paisagens assim criadas, esconde-se, ainda, um fator mais inquietante, a re-dução da base genética dos cultivos e dosrebanhos animais, com aumento da vulne-rabilidade genética (Valls, 2000).

A simples transferência de tecnologiacomo ferramenta de desenvolvimento temdemonstrado, ao longo do tempo, que se co-loca em risco não apenas o futuro de setoresnormalmente descapitalizados (caso em quese enquadram as diversas formas de agricul-tura familiar), como a própria sociedade.Apesar do conhecimento local não ser a úni-ca fonte de desenvolvimento, em muitos ca-sos, pode-se obter sucesso discutindo-o comênfase em outras estratégias de desenvolvi-mento. A busca da interface entre o local e oconhecimento científico, produz com siner-gia o chamado conhecimento em ação, ca-paz de promover desenvolvimento em basesustentável (Blaikie et al., 1997).

No contexto abordado, os SistemasAgroflorestais (SAF’s) apresentam-se como

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alternativas interessantes, tendo em vista asformas de uso e manejo da terra, nas quaisárvores ou arbustos são utilizados em asso-ciação com cultivos agrícolas e/ou com ani-mais, numa mesma área, de maneira simul-tânea ou em uma seqüência temporal(Dubois, 1996). Os SAF’s podem, ainda, pro-mover a integração de áreas rurais, conside-rando a participação das comunidades lo-cais na procura de soluções comuns e nego-ciadas para o desenvolvimento sustentado,assegurando o acesso e utilização racionaldos recursos naturais.

Os sistemas agroflorestais consideramos mais antigos sistemas de cultivo utiliza-dos no mundo. Porém, o interesse por estaatividade, do ponto de vista político e cientí-fico, começou a tomar forma na década de70, a partir de dúvidas sobre a eficiência daspolíticas de desenvolvimento vigentes, quenão pareciam se adequar às necessidades eanseios cada vez maiores de pequenos pro-dutores rurais (Nair, 1993). Em grande par-te, o aumento da produção agrícola emmonocultivos pode ser creditado ao avançoda atividade agrícola sobre novas áreas, sejapor simples expansão, seja pela busca denovos solos produtivos, após o esgotamentodos antigos (Costa, 1988; Valls, 2000).

Diante do exposto, o presente traba-

lho tem como objetivo propor modelos deassociações entre agricultura, pecuária e es-pécies florestais, adaptando-se essas práti-cas à realidade regional e local, privilegian-do associações ecológicas próximas dosecossistemas naturais.

Caracterização Geral dos SistemasAgroflorestais (SAF’s)

Os sistemas agroflorestais devem in-cluir, pelo menos, uma espécie “florestal”arbórea ou arbustiva. Essas espécies podemser associadas com uma ou mais espéciesagrícolas e ou animais. Espécies agrícolas deporte médio, como bananeiras, cítricos, café,cacau, mandioca, não podem ser considera-das como componentes florestais de SAF’s:cítricos, café e cacau, por exemplo, são espé-cies de porte arbustivo de origem silvestre,porém, foram objeto de longo processo dedomesticação e melhoramento genético e sãoconsideradas hoje como cultivos agrícolasperenes. Neste sentido, a combinação debananeiras e cítricos não possui o componen-te florestal, sendo, portanto, um consórcioagrícola. A combinação de bananeiras, man-dioca e uma espécie produtora de madeira,preferencialmente nativa, caracterizam umconsórcio agroflorestal (Figura 1).

Figura 1: Uso múltiplo de uma espécie produtora de madeira comercialmente viável em consórcio com bananeiras e mandi-oca (nos primeiros anos após o plantio da espécie arbórea).

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Nos SAF’s, as espécies florestais, alémde fornecer produtos úteis para o agricul-tor, desempenham um importante papel namanutenção da fertilidade dos solos. Emoutra situação, uma pastagem onde foramplantadas árvores para abrigar o gado nashoras mais quentes do dia, combinada comforrageiras herbáceas e arbustivas, tambémse constitui em um sistema agroflorestal.

Em casos de combinações de espéciesanuais e perenes que produzam frutas, fo-lhas ou raízes para alimentar os animais, porexemplo, os porcos, trata-se, também, de umsistema agroflorestal se estiverem presentesespécies arbóreas, arbustivas ou palmeiras,ou seja, espécies que façam parte do hábitoalimentar dos porcos.

Uma situação interessante para a nos-sa região (cerrado) foi apresentada por Melo& Guimarães (2000), no qual consorciaramuma espécie frutífera (guariroba – Syagrusoleracea) muito utilizada na alimentação re-gional (Almeida, 1998), com mogno, compa-rando com as associações da mesma espéciecom nim (Azadirachta indica) e da mesmaforma com seringueira (Hevea brasiliensis). Osresultados desta pesquisa se mostrarammuito promissores.

Classificação dos SAF’s

Existem diversas classificações dosSAF’s porém, três classificações são as maiscomuns e utilizadas:

1) Sistemas silvi-agrícolas (Dubois,1996), caracterizados pela combinação de ár-vores ou arbustos com espécies agrícolas.Neste caso, o arranjo temporal das plantasdeve ser analisado com detalhe, tendo em vis-ta o ciclo de vida da espécie perene a serestabelecida no consórcio. Nair (1989)enfatiza este cuidado com uma situação ex-trema: o sistema de agricultura migratóriaenvolvendo de 2 a 4 anos de cultivos agríco-las, e mais de 15 anos de pousio para que umanova cultura agrícola possa ser semeada. Por-tanto, o agricultor deve planejar a implanta-ção desses sistemas de forma a compensar emoutra área de sua propriedade a produçãoagrícola desejável, mantendo a sustenta-bilidade econômica no referido período. Poroutro lado, o retorno virá em forma da manu-tenção, ou mesmo do aumento da fertilidadedo solo da propriedade.

2) Sistemas silvipastoris, caracteriza-dos pela combinação de árvores ou arbustoscom plantas forrageiras herbáceas e animais.As espécies de gramíneas podem, também,ser plantadas em rotação para produção defeno ou pastagem, permanecendo no siste-ma por vários anos. Por exemplo, a combina-ção de pasto com Cumbarú. (Dypterix alata),Macaúba (Acrocomia aculeata), Canafístula(Cassia ferruginea) e Guatambú (Aspidos-perma australe).

3) Sistemas Agrossilvipastoris, algu-mas considerações devem ser apresentadasno contexto deste sistema, por exemplo, ouso de conceitos de desfolhamento seleti-vo no planejamento das opções de manejo(Pezo & Ibrahim, 1999).• No manejo das associações de espécies

lenhosas com espécies herbáceas, os ovi-nos e bovinos deverão ter acesso à pasta-gem quando as copas das espécies lenhosasestiverem acima da altura dos animais;

• A seletividade que manifestam as espéciesanimais por uma determinada espécie ve-getal será utilizada para regular a compe-tição entre herbáceas e lenhosas;

• Para evitar perdas de plantas das espéciesdesejáveis em um sistema silvipastoril, acarga animal ajustar-se-á em função donível de oferta de folhas verdes das espéci-es desejáveis, e não se deve levar em consi-deração a oferta total da biomassaforrageira;

• A introdução precoce de caprinos que pre-ferem ervas e arbustos, por exemplo, emsistemas silvipastoris, somente justifica-sequando as espécies lenhosas já cumpriramo propósito forrageiro no sistema.

Modelos Alternativos

a) O Sistema “Taunguia”a.1) Definição e Considerações Gerais:

o termo “taunguia” é reservado ao caso es-pecífico de uma área rural, na qual cultivosagrícolas de ciclo curto são associados, portempo limitado, a um plantio uniforme demudas de uma ou mais espécies madeirei-ras e essas, ao crescerem, formam uma flo-resta de rendimento (Lok, 1998; Dubois,1996). O objetivo final do taunguia é a pro-dução de madeira para serraria, celulose epapel ou outros tipos de produtos como, com-pensados, lenha e carvão vegetal.

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O sistema foi desenvolvido com a fi-nalidade de diminuir o custo do estabeleci-mento de florestas plantadas destinadas aproduzir madeira. A espécie florestal madei-reira é plantada junto a cultivos agrícolas deciclo curto (milho, arroz, feijão e mandioca).As espécies perenes se aproveitam das capi-nas, limpezas e de uma eventual aplicaçãode adubos realizadas em benefício desses cul-tivos agrícolas e quando concluída a últimasafra agrícola, a espécie madeireira planta-da já terá alcançado uma altura razoável. Olucro gerado pela venda dos produtos agrí-colas amortiza em grande parte o custo doplantio das espécies madeireiras.

No Brasil, o sistema taunguia está sen-do utilizado quase que exclusivamente comomeio de baratear a formação de florestas deeucaliptos. Portanto, este é um sistema que ne-cessita de área maiores que aquelas utilizadaspela agricultura tradicionalmente familiar.

Por outro lado, em regiões já desma-tadas, o taunguia pode ajudar o agricultor aformar pequenos bosques para produção delenha, de carvão, de madeiras roliças paraconstrução e dos mourões utilizados no esta-belecimento de cercas. Nestas áreas o taun-guia poderia ser também empregado na for-mação de florestas plantadas de algumas es-pécies madeireiras de alto valor como a teca(Tectona grandis), uma espécie exótica de bomcrescimento, exigindo solos de boa estruturae a ocorrência de uma estação seca de três aquatro meses (Costa e Resende, 2001).

Nas áreas trabalhadas com o sistemataunguia, a mandioca somente é plantadaquando as mudas das espécies madeireirasjá alcançaram pelo menos 1 metro de alturatotal. A retirada dos tubérculos (raízes) damandioca deverá ser realizada com o devi-do cuidado para não danificar as raízes daespécie madeireira plantada. Recomenda-seque os cultivos agrícolas sejam distribuídosespacialmente, com no mínimo 40 a 50 cen-tímetros da linha de estabelecimento da es-pécie madeireira.

Em curto prazo, o pequeno produtorrural deseja obter safras expressivas dos seuscultivos de ciclo curto. Portanto, no sistemataunguia, é preferível plantar espécies ma-deireiras mais espaçadas e realizar podas deformação para corrigir o fuste que poderádepreciar o valor das árvores (Lok, 1998;

Dubois, 1996).a.2) Vantagens e desvantagens do

Taunguia: a principal vantagem é baratearo custo de formação da floresta plantada. Osistema propicia boas condições de sobrevi-vência, de crescimento às mudas de espéciesmadeireiras e aumenta a disponibilidade denitrogênio no solo, quando as entrelinhas sãoocupadas com cultivo de leguminosas (feijão,amendoim, entre outras).

O sistema apresenta algumas desvan-tagens, sendo a principal a questão da com-petição exercida pelas espécies madeireirassobre os cultivos agrícolas. Durante o primei-ro ano de estabelecimento, o taunguia exigeum volume maior de mão-de-obra. Adicio-nando-se a este aspecto os cultivos agrícolasque hospedam pragas que atacam tambémas espécies madeireiras plantadas devem serexcluídos.

b) Árvores com cultivos em aléiasA técnica de cultivo em aléia, conheci-

da mais comumente como “alley cropping”,é uma variação do plantio em linha (Medra-do, 2000). Consiste na mistura de árvores depequeno porte ou arbustos, podadosfreqüentemente. O objetivo principal é a pro-dução de mulch, proveniente das podas pe-riódicas que podem variar de duas a quatropor ano, dependendo da região.

Normalmente, em alley cropping, sãoutilizadas espécies leguminosas fixadoras denitrogênio, produtoras de folhagem abun-dante, como eritrina (Erythrina poeppigiana),gliricidia (Gliricidia sepium), leucena (Leucaenaleucocephala), farinha seca (Calliandracalothyrsus), Acássia (Acacia spp.), ou outrasespécies com essas características.

c) Cercas vivasAs cercas vivas constituem uma opção

dos sistemas silvipastoris, sendo esta práticamuito utilizada nos trópicos, principalmen-te em regiões de agricultura mais pobre (Me-drado, 2000). Várias são as espécies utiliza-das como cercas vivas. Entre elas, pode-secitar sabiá ou sansão-do campo (Mimosacaesalpiniifolia), quiabento (Peireskia culeata)e avelós (Euphorbia gymnoclada) (Lima, 1994).

A escolha da espécie deve ser feita combase em algumas características como tole-rância à poda e presença de espinhos paradificultar a entrada ou saída de animais e

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pessoas. O espaçamento de plantio normal-mente é estreito, mas deve variar com a es-pécie e com o local onde a cerca viva seráinstalada. Uma boa adubação orgânica éaconselhável no plantio, visando aumentara velocidade de crescimento da cerca.

As cercas vivas podem ser considera-das como sistemas silvipastoris na medidaem que a massa foliar das espécies lenhosasseja utilizada para a alimentação animal ouquando as áreas entre as cercas sejam cons-tituídas de pastos em lugar de cultivos agrí-colas (Pezo e Ibrahim, 1999).

Sistemas agroflorestais versusagricultura familiar

Estes sistemas envolvem o manejo de-liberado de várias espécies arbóreas em asso-ciação com culturas anuais e criação animale são utilizados para prover necessidadesbásicas das famílias. Ocasionalmente se ven-de algum excedente de produção. São siste-mas de alta diversidade, com produção du-rante todo ao ano.

Neste contexto, é oportuna a ação go-vernamental que, através do Programa Na-cional de Fortalecimento da Agricultura Fa-miliar (PRONAF), regulamentou por decre-to, que poderá ser transformado em lei peloCongresso Nacional. A nova lei define umapolítica nacional para a agricultura familiare empreendimentos familiares rurais, bemcomo o público beneficiário do PRONAF.Além disso, estabelece princípios para o fun-cionamento do programa, com a descentra-lização das ações, a sustentabilidade ambien-tal, social e econômica e reforça o papel dosconselhos estaduais e municipais, com aampliação da participação dos agricultorese suas comunidades.

Os sistemas familiares são semelhan-tes aos encontrados em todo o trópico, po-dendo ser classificado como “home gardens”ou quintais agroflorestais e possuem um altograu de sustentabilidade ecológica, com umaboa aceitação social (Nobre et al., 1994).

Estes sistemas caracterizam-se por ne-cessidade de poucos insumos e capacidadeconstante de produção; depende de mão-de-obra familiar, a qual se envolve durante todoo ano, não se concentrando em uma únicaépoca; suas demandas têm custos reduzidos,

apropriados a pessoas de poucos recursos.Ecologicamente, são parecidos com os ecos-sistemas naturais, devido à alta diversidadede espécies, capacidade de captar luz solar,controle biológico, reciclagem de nutrientesdo solo e redução da erosão. Nair (1993) defi-ne como “uma associação íntima de árvorese ou arbustos de uso múltiplo com cultivosanuais e perenes, com presença de animais”.

O aproveitamento dos recursos flores-tais é maior, complementado com a utiliza-ção em grande escala de plantas medicinais.Segundo Lok (1998), o sistema em discussãoocupa um lugar singular nos sistemas agro-florestais. Acrescenta que, nenhum outro sis-tema é tão diverso em quantidade de espéci-es e variedades, com várias estruturas, bemcomo, inúmeras possibilidades de associações.

A importância dos quintais florestais(hortos caseiros) aumenta devido, especial-mente a:• crescimento da população e a pressão so-

bre a terra, desencadeando uma dependên-cia cada vez maior sobre áreas mais redu-zidas;

• é um dos componentes mais importantesda “agricultura urbana” (estima-se que noano 2005), a metade dos produtos consu-midos nas cidades serão oriundos dessamodalidade de produção (Lok, 1998).

Características de forma dos hortoscaseiros

• um horto bem desenvolvido é uma imita-ção da floresta tropical quanto aos estra-tos verticais, a competição por luz e as fun-ções agro-ecológicas (Figura 2);

• o horto caseiro é uma composição de dife-rentes áreas de manejo que possuem es-truturas (horizontais e verticais), bem comocombinações específicas, caracterizadaspor seu uso;

• existe uma predominância de sombra, al-tamente valorizada por seus habitantes,que tem implicações para os tipos de culti-vo, de preferência em um horto caseiro;

• os limites do horto caseiro são definidos pormeio de uma mistura de fatores geofísicos,biofísicos e sociais, que incluem a mão-de-obra familiar e a quantidade de trabalhonecessária ao horto.

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, N. 5, Set. 2002.

Figura 2: Representação tradicional da estrutura vertical de um horto caseiro.

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Considerações finais

As alternativas abordadas no contextodo trabalho remetem para o desenvolvimentosustentável com base nas iniciativas endó-genas das comunidades rurais. É importantesalientar que, “uma sociedade sustentável éaquela que satisfaz suas necessidades sem di-minuir as perspectivas das gerações futuras”.Neste contexto, as alternativas de SAF’stendem a proporcionar um padrão razoávelde qualidade de vida, a utilização do sistemafamiliar como mão-de-obra predominante,bem como, autogestão de atividades, privi-legiando associações ecológicas próximas dosecossistemas naturais. Estes procedimentosreduzem o custo da produção e ao mesmotempo a diversificam. Portanto, as adoçõesdas alternativas aventadas propiciarão ainserção de produtores rurais no mercado detrabalho, hoje marginalizados em função dosistema industrializado vigente.

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Capixigui Sangra D’água

Pupunha Macaúba

Gabiroba

Inhame Tubérculos

Banana Abacaxi

Maracujá

Mangaba

Café

Cajá - manga

Jatobá Guapeva

Araticum

0

10

20

30

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La Agenda 21 en el Distrito Treptow-Köpenick: idea, desarrollo y particularidadesAgenda 21 in Treptow-Köpenick District: ideas, development and particularities

A Agenda 21 no Distrito Treptow- Köpenick: idéia, desenvolvimento e particularidades

Michael Anselm SchrickMinisterio da Economia, do Trabalho e da Mulher do Estado Federal de Berlin

contato: [email protected]

Resumen: El proceso de la Agenda Local 21 de los distritos berlineses empezó en el distrito de Köpenick, en el año1994. Gracias a la excelente cooperación entre los actores de la Administración Pública, de la Sociedad Civil y de lasIglesias y de ellos con sus contrapartes externos se creó un estructura de participación con la que se logró llegar aamplios sectores de la población e integrarlos. Luego de la reforma territorial de 2001 comenzó en Berlín la fusiónadministrativa de los nuevos distritos, entre ellos la de Köpenick con Treptow, lo que creó la necesidad de elaborar unaAgenda Local 21 conjunta. La Agenda Local 21 de Treptow-Köpenick no se define como una actividad exclusiva delsector ambiental, sino que pretende incluir otros campos, como por ejemplo el social, el de educación, el de entendimientoentre los pueblos y el de la cooperación internacional.Palabras claves: Agenda 21; Desarrollo Local; Cooperación.Abstract: The process of the Local Agenda 21 of the Berlin districts began in the district of Köpenick, in 1994. Thanksto the excellent cooperation among the Public Administration agents, from Civil Society and from the Churches andtheir external counterparts a participation structure was created with that which was believed to have reached amplesections of the population and integrated them. As soon as the territorial reform began in Berlin the administrativefusion of the new districts, amongst them that of Köpenick with Treptow, that which created the necessity ofelaborating a joint Local Agenda 21. The Local Agenda 21 of Treptow-Köpenick which defines itself as an exclusiveactivity in the environmental sector, as well as intending to include other fields, for example social, educationalunderstanding among peoples and international cooperation.Key words: Agenda 21; Local development; Cooperation.Resumo: O processo da Agenda Local 21 dos distritos berlinenses começou no distrito de Kopenick, no ano de1994.Graças à excelente cooperação entre atores da Administração Pública, da Sociedade Civil e das igrejas e deles, comsuas diferenças externas, criou-se uma estrutura de participação com o que conseguiu chegar a diversos setores dapopulação e integrá-los. Depois da reforma territorial de 2001, começou em Berlin a fusão administrativa dos novosdistritos, entre eles, a de Köpenick com Treptow, o que criou a necessidade de elaborar uma Agenda Local 21conjunta. A genda Local, 21 de Treptow-Köpenick, não se define como uma atividade exclusiva do setor ambiental,porém pretende incluir outros campos, como por exemplo o social, o da educação, o de entendimento entre os povose o da cooperação internacional.Palavras-chave: Agenda 21; Desenvolvimento Local; Cooperacão.

ses en desarrollo el acento de las agendasestá a menudo puesto en la lucha contra lapobreza, en países como Alemania, el acen-to no sólo está puesto en aspectos medioam-bientalistas, sino que su implementación seconsidera una tarea transversal que debeatravesar a la totalidad de la administraciónmunicipal y pretende además incorporar larelación “NORTE-SUR”, reflejada en laexistencia de un grupo de trabajo por elhermanamiento entre un distrito berlinés yuna ciudad peruana, en el caso que describeel presente artículo, pero ésta es solo una delas formas.

Si bien ciudades como las de Bonn,Bremen y Munich han incorporado procesosde Agenda Local 21 en el marco de suscompetencias y con distintos grados decompromiso institucional, el total de unida-des territoriales municipales alemanas quelo han hecho hasta ahora representa sóloalrededor de un 13,3% (B.A.U.M ConsultGmbH, 2001). Entre esas unidades terri-toriales está el distrito de Treptow-Köpenick,uno de los doce distritos que conforman laciudad-estado de Berlín, producto de la re-

Introducción

En agosto de 2002 tendrá lugar la Con-ferencia Cumbre de Medio Ambiente yDesarrollo “Río+10” en Johanesburgo,Sudáfrica. A diez años de la realización dela Conferencia Mundial en Río de Janeiro(UNCED, 1992) los municipios alemanesrealizarán un balance de los progresos alcan-zados en pos de un desarrollo sostenible.Entretanto son más de 2000 las comunas yciudades alemanas que iniciaron un procesode Agenda Local 21.

A diferencia del estatus de una con-vención, cuya ratificación compromete a lospaíses firmantes a su cumplimiento, la“Agenda 21” es un documento cuyo cum-plimiento está sujeto a obligaciones decarácter más bien moral. Por eso mismo suimplementación está sujeta a diversasinterpretaciones de contenido y estrategiasde realización.

El desarrollo sostenible se enfrenta condos problemas centrales, la creciente pobre-za por un lado y la problemática del medioambiente por otro. Mientras que en los paí-

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forma territorial de enero de 2001 queimpulsó su fusión. Treptow-Köpenick cuentacon 229.404 habitantes (Land Berlin 2002.)

El proceso de Agenda Local 21 enTreptow-Köpenick

El distrito berlinés Köpenick (ahoraTreptow-Köpenick) fue el primer distrito deBerlín en el cual la Asamblea Distrital dictóuna resolución para iniciar el proceso deimplementación de la Agenda 21 en suterritorio – 13 de octubre de 1994 –, cum-pliendo a la vez una recomendación de laConferencia Mundial de Medio Ambiente yDesarrollo de Río de Janeiro (UNCED, 1992).

Tras la caída del muro y de la Repúbli-ca Democrática Alemana (RDA), la Confe-rencia de Río contribuyó fundamentalmen-te a intensificar el proceso de discusión enlas comunidades eclesiásticas de Köpenickacerca de los límites del crecimiento sinbarreras y de los efectos del estilo de vidaoccidental en el resto del mundo. Las Iglesiaspor su parte, iniciaron también la discusiónsobre esta temática con el Parlamento y laAdministración del distrito, siendo por lotanto también iniciadoras del proceso deconsultas.

En setiembre de 1996 luego del primerproceso de consultas, el Alcalde Distrital Dr.Klaus Ulbricht le entregó a la población deKöpenick el primer borrador de trabajo dela Agenda 21 realizado para el distrito. Enel preámbulo constaba:

Los conocimientos ecológicos adquiridos en losúltimos veinte años demuestran a la humanidaden forma rigurosa que se ha traspasado el límitede la capacidad del suelo, del aire y del agua deabsorber la carga de sustancias nocivas yresiduos. Los conocimientos acerca de lacapacidad de absorción limitada de la tierra deresiduos no reciclables producidos por la acciónhumana, del agotamiento de la extracción denuestros recursos como así también lairreversibilidad de los cambios, entre otros, delclima, están señalando un catastrófico déficitde acción, pues en lo esencial, el mundodesarrollado económicamente continúaimperturbable con su hasta ahora apocalípticaforma de vida y desarrollo económico.El proceso de consulta social debe tener comoobjetivo la elaboración de un modelo dedesarrollo común. Este modelo, formulado den-tro de un amplio consenso, debe considerar lasdemandas de desarrollo sostenible... El procesode consulta de la Agenda 21 de Köpenick debe

ser concebido como un proceso duradero. Unmodelo de desarrollo no es intocable, por elcontrario debe estar siempre dispuesto a sufrircambios.Setenta y nueve premisas de desarrollo

sostenible se confrontaron con la problemá-tica particular del distrito más grande, des-de el punto de vista territorial, y con mayorprovisión de agua de Berlín. Entre los temasfiguraban, entre otros, Política, DesarrolloUrbano/Ecología, Juventud/AsuntosSociales/Salud y Economía.

En 1998 y en el 2000 fueron finaliza-dos respectivamente el segundo y tercer bor-rador de trabajo de la Agenda 21-Köpenick.Junto a un modelo de desarrollo actualizadocontienen doce áreas temáticas que definenampliamente las de Ecología, AsuntosSociales y Economía y tienen en cuenta elproceso social necesario para alcanzar lasostenibilidad. En las áreas temáticas sedescriben en forma detallada los respectivostemas y tareas a desarrollar: [1] AspectosInstitucionales; [2] Implementación de unaÉtica de Sostenibilidad; [3] Desarrollo deAsentamientos Humanos; [4] Protección delos Recursos Naturales; [5] Movilidad; [6]Desarrollo Económico; [7] Protección de losRecursos; [8] Protección del Clima; [9]Distribución Justa de las Condiciones deVida; [10] Protección de la Salud Humana;[11] Cultura, Deporte y Formación; [12]Cooperación Internacional.

En el entonces Distrito Treptow secomenzó en al año 1997 con la elaboraciónde una Agenda Local 21, sobre la base de laresolución de la Asamblea Distrital. Elproceso fue iniciado por ciudadanospertenecientes al “Foro Agenda Local 21-Treptow”, al “Grupo de Proyecto AgendaLocal 21” y por algunas colaboradores y co-laboradoras de la Administración del Dis-trito, quienes se reunieron en noviembre deese año en el “Foro Ciudadano Agenda Lo-cal 21-Treptow” para elaborar en forma con-junta un Programa de Acción para el Siglo21. Como resultado de estos encuentrosfueron presentados en junio de 1998 elprimero, y un año más tarde el segundo bor-rador para una Agenda Local 21. El tercerborrador de trabajo realizado en el año 2000se orientó ampliamente en los documentosexistentes de los distritos vecinos deLichtenberg y Köpenick.

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Área de Problemas en el nuevo distrito

A partir de la reforma territorial del 1de enero de 2001, la ciudad-estado de Berlínquedó integrada por 12 en lugar de los has-ta entonces 23 distritos que la conformaban.En ese marco se fusionaron los distritos deTreptow y Köpenick.

Entre los problemas más importantesen Treptow-Köpenick se cuentan, entreotros:• la quiebra de la infraestructura industrial

luego de la caída del muro y de la RDA,cuando en corto tiempo se perdieron dece-nas de miles de puestos de trabajo con lasconsecuencias sociales que esto trae consigo,

• el colapso de tránsito en la área antiguade la ciudad de Köpenick, situada en unaisla sin posibilidades de desvíos, lo queimpedía el desarrollo de la infraestructuraen este centro turístico e histórico,

• los planes de ampliación del aeropuertoBerlín-Schönefeld, situado relativamentecerca del distrito, con el objetivo deconvertirlo en un gran aeropuerto. Unagran parte de la población sintió temor anteun posible aumento de la contamincaiónacústica y ambiental y con ello de lapérdida de valor de sus propiedades,

Como tareas a proseguir deben sermencionadas las siguientes:• proteger las muchas fuentes de agua exis-

tentes en el distrito, los bosques y lasespecies de la biodiversidad,

• intensivar y continuar con las iniciativasde participación ciudadana y el proceso deconsulta,

• lograr una administración cercana alciudadano,

• fortalecer el comercio local y lograr nuevospuestos de trabajo, no por último en alámbito de las pequeñas y medianas em-presas (PYMES).

Estructura y actores/as de la AgendaLocal 21 Treptow-Köpenick

Con el proceso de consulta en el año1994 comenzó a formarse también unaestructura para el proceso de la Agenda 21en Köpenick, la que en esencia permanecehasta hoy, conocida como el “Modelo

Köpenick” y que continuó sin grandes modi-ficaciones luego de la fusión con el distritovecino de Treptow. Responsables de la Agen-da Local 21 son no sólo la administracióndistrital –Pilar I-, sino también la sociedadcivil a través de los grupos de trabajofusionados del Foro Civil Medio Ambiente yDesarrollo de Köpenick considerado como elPilar II, como así también las 36 Comunida-des Eclesiásticas Treptow-Köpenick, que agru-pa las más distintas confesiones -Pilar III-.

Administración del Distrito

Dentro de la administración distrital(Pilar I), las actividades localizadas con elAlcalde Distrital son dirigidas e imple-mentadas por el responsable de la Agenda21 y su coordinador. Entretanto en laAsamblea y en la administración del distritoexiste un amplio consenso acerca de que laAgenda 21 es una tarea transversal que in-cumbe a todas las áreas del Parlamento y laAdministración. Por eso se han adjuntadolos llamados “diputados civiles” a la mayoríade las comisiones de la Asamblea Distrital,quienes en su rol de participantes activos dela sociedad civil apoyan a los diputados enel proceso de la Agenda Local 21.

Sociedad Civil

La sociedad civil se ha organizado enel “Foro Civil Medio Ambiente y Desarrollo-Köpenick”, cuyos seis grupos ([1] DesarrolloUrbano, Tránsito y Turismo; [2] EnergíasRenovables; [3] Educación ambiental; [4]Hermanamiento entre Treptow-Köpenick yCajamarca; [5] Evitación de Residuos [6];Asuntos Sociales) trabajan en algunos temascentrales de la Agenda Local 21. En estosgrupos de trabajo colaboran muchosempleados de la administración del distritocomo así también representantes de lasIglesias. Luego de la fusión de ambos distri-tos la estructura original diseñada paraKöpenick se amplió para el nuevo distrito.

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Iglesias

Desde el comienzo estaba claro paratodos los participantes de Treptow yKöpenick que el proceso definido en la Agen-da 21 para el desarrollo sostenible de lacomunidad y el “Proceso por la Justicia, laPaz y la Conservación de la Creación”,propuesto por El Consejo Ecuménico de lasIglesias, estaban unidos inseparablemente.Representantes de la comunidad cristianaunificaron el proceso conciliar con el de laAgenda 21 en todos los campos.

El Grupo de Iniciativa para Un Mundode Köpenick (KIGEW) es la representaciónecuménica de base de la comunidad eclesi-ástica en el distrito que elabora los contenidosde los foros ecuménicos. La OficinaEcuménica de Köpenick (KöB) es responsabledel intercambio de información entreKIGEW, las comunidades eclesiásticas yotros grupos interesados en el trabajo de laAgenda Local 21.

Asociación Promotora

Con la creación de la Asociación Pro-motora de la Agenda Local 21 Treptow-Köpenicken 1996 se institucionalizó la estructura delPilar II y al mismo tiempo se creó unaposibilidad para captar donaciones y mediosde apoyo como así también para larealización de medidas de ajuste y decreación de empleo (SAMs y ABMs)1. Laasociación se concibe como un proveedor deservicios para el proceso de la Agenda 21 enel distrito; ella es responsable de crear elmarco jurídico para los proyectos sin finesde lucro. Apoyada en una buena coope-ración entre la administración del distrito,la de trabajo y la sociedad de servicios Futu-ro en el Centro, intenta reagrupar el procesoy las contrapartes según el principio de“gleichen Augenhöhe”, es decir de laigualdad de derechos entre las contrapartes.

Entretanto se iniciaron algunosproyectos bajo las medidas arriba mencio-nadas, SAMs y ABMs, entre ellos:• la Oficina de la Agenda 21-Köpenick

apoya las actividades de los grupos detrabajo, realiza eventos, mantiene elcontacto entre la Administración y lasIglesias y representa un importante punto

de encuentro para las ciudadanas y losciudadanos,

• la Oficina para una Economía sostenible en elParque de Innovación de Wuhlheide (unaparte del distrito) lleva adelante un inter-cambio de ideas y tecnologías en el distritoa través de la cooperación y pretendeademás, apoyar la creación de pequeñasempresas innovativas y orientadas a latecnología a través del establecimiento decentros fundacionales,

• el proyecto “Superación de la Violencia-Acciones locales para su Desactivación”,que unifica actividades existentes en elnivel local y que apunta a proponer nuevasacciones; más allá de esto debe tratar deunificar iniciativas comunales y eclesiásti-cas para jóvenes y generar ideas para su-perar la violencia.

Para la armonización de los interesesde los actores y las actoras de la Agenda 21en el distrito se creó un círculo de consulta.En él se reúnen una vez al mes representan-tes de la administración, de la sociedad civily de las iglesias para decidir acerca deactividades pendientes y discutir problemasy perspectivas de su trabajo.

Actualización de la Agenda 21 luego dela reforma administrativa

Con la fusión de Treptow y Köpenickse formó un nuevo grupo de redacción a laque pertenecen representantes de laadministración, la sociedad civil y las iglesiasde ambos distritos. Este grupo intenta unifi-car los borradores para la Agenda 21 deambos, cuyos contenidos están siendo dis-cutidos en la actualidad.

Las 79 premisas mencionadas anteri-ormente se han reducido entretanto a 17,mientras que los 12 campos temáticos men-cionados permanecen. El tema “Desarrollode un sistema de indicadores de sosteni-bilidad” completa la Agenda local, la que talcomo consta en sus borradores, se concibe así misma como una especie de toma fotográ-fica instantánea, dentro de un proceso con-tínuo que pretende mostrar perspectivas denegociación.

La población interesada será informa-da de varias formas sobre las actividades adesarrollarse en el marco de la Agenda Lo-

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Los tres pilares de la Agenda Local 21 en Treptow-Köpenick

Círculo de consultas (tres miembros de cada pilar)

Pilar I Pilar II Pilar III Administración

Pública Sociedad Civil Iglesias

Oficina Distrital Treptow-Köpenick de Berlín

Asociación Promotora de la Agenda Local 21

Departamentos especializados

• Oficina Agenda-21 • Oficina para una

Economía Sostenible

• Oficina Ecuménica de Köpenick (KÖB)

Foro Civil Medio Ambiente y Desarrollo-Köpenick

Grupos de Trabajo

Comunidades Eclesiásticas,

Grupos Cristianos de Base

• Energía y recursos Círculo Eclesiástico

Oberspree • Planeaminento Urbano,

Tránsito, Turismo, Protección del Medio

Ambiente

(responsable de Treptow

y Köpenick)

entre otros, la Oficina del Alcalde Distrital

Ü • Hermanamiento de ciu-dades Treptow-Köpenick -

Cajamarca

Û entre otros, Grupo de Iniciativa para Un Mundo

de Köpenick (KIGEW) • Educación Ambiental • Evitación de residuos • Asuntos sociales ↑ Coordinación de los Grupos

de Trabajo ↑: Círculo de Voceros

La Agenda Local 21 en Treptow-Köpenick intenta ser mucho más que una actividad exclusiva en el campo del medio ambiente y de entender su tarea transversal, que incorpora también la cooperación comunal Norte-Sur.

cal 21. Entre las actividades que se llevarána cabo figuran por ejemplo, una fiesta solaranual y las “Conversaciones en la Alcaldía”bisemanales organizadas por la admi-nistración distrital, la universidad populary la asociación promotora. El boletín infor-mativo “Agenda 21-Infoblatt” que fueraeditado bimestralmente hasta la fusión de losdistritos volverá a aparecer cuando seproduzca el encuentro Río + 10.

Un sólido componente de la Agenda

Local 21 es la cooperación con un municipiode un, así llamado, país en desarrollo. Estacooperación está prevista en la resolución dela Agenda elaborada por el Consejo de laAsamblea Distrital de Köpenick en octubrede 1994. Con este componente se pretendetraspasar los límites de una actividad pura-mente medioambiental y entender la Agen-da como una tarea que atraviesa transver-salmente a todas las otras, inclusive lacooperación Norte-Sur.

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Luego de algunas discusiones sedecidió llevar a cabo un hermanamiento so-bre la base de la Agenda Local 21 con laProvincia de Cajamarca. La decisión recayóen esa ciudad peruana porque ella ya teníaexperiencia en la realización de lasresoluciones de la conferencia de Río de 1992y a raíz de ello es llamada con entera justiciael “primer municipio ecológico del Perú”.Las experiencias de Cajamarca con las me-sas redondas y la participación de lapoblación son para Treptow-Köpenick muyimportantes.

Durante la visita del Alcalde Distritaly dos representantes de los Pilares I y II deKöpenick a Cajamarca en mayo de 1998 sefirmó el convenio del hermanamiento entrelas ciudades. En él se prevé una cooperaciónen todos los campos de la Agenda Local 21,no sólo entre los Alcaldes y funcionarios,sino un real intercambio de experiencias ymutuo conocimiento en todos los niveles.

Entre las actividades comunes acorda-das en el marco de la hermandad seencuentran, entre otras, las siguientes:• jóvenes profesionales no académicos de

ambas ciudades tuvieron la posibilidadentre los años 1997 y 2000 de conocer laciudad hermana por el término de tresmeses durante la realización de prácticasdentro de un tema predeterminado. Estasestadías fueron financiadas por la SociedadCarl Duisberg (CDG) en el marco de susprogramas de intercambio (ASA),

• durante la Conferencia de Medio Ambi-ente para Jóvenes realizada en Köpenicken noviembre de 1998 se conocieron losgrupos de teatro de jóvenes de Cajamarca“AlgovipasaR” y de Köpenick “AlteMöbelfabrik”, los integrantes de este últi-mo grupo visitaron Cajamarca a principiosde 2000.

• se iniciaron contactos entre Kindergärten,escuelas especiales y comunidades eclesi-ásticas de base de ambas ciudades,

• en acuerdo con las contrapartes deCajamarca se donó una gran cantidad deaparatos de medicina prácticamentenuevos a sus hospitales, los que fueronembarcados en el verano de 1999,

• se está trabajando en forma conjunta conuno de los problemas más grandes deCajamarca, es decir la provisión de agua

potable como así también el tratamientode las aguas residuales. Juntamente con laCDG y otras contrapartes se está buscan-do una solución. En este marco, en mayode 2000 participaron expertos y expertasde Cajamarca en una conferencia sobreagua y desagues que se realizó enKöpenick, juntamente con el grupo decoordinación, la Administración del Distri-to, la Asociación Promotora, la ONG KATEe.V, la Escuela Técnica de Altos Estudios deWildau y establecimientos de agua deBerlín. Estas actividades continuaron en el2001,

• con recursos financieros del Ministerio Fe-deral de Medio Ambiente comenzó en el 2000un programa de introducción en la agri-cultura ecológica en algunos territoriosrurales de la Provincia de Cajamarca.Como contrapartes actúan, entre otros, laSociedad Alemana de Cooperación Técnica(GTZ), KATE e.V. y la ONG de CajamarcaASODEL como así también comunidadeseclesiásticas.

Existe también una cooperación Este-Oeste. En setiembre de 2001 comenzó unproyecto piloto en el que las experiencias acu-muladas por el distrito Treptow-Köpenicktratarán de ser volcadas en el establecimientode una Agenda Local 21 para la ciudad L‚viven el oeste de Ucrania, para lo cual yatuvieron lugar las primeras visitas mutuas.En este momento se está preparando untaller en L‚viv para identificar campos deproblemas y actores/as.

Cada una de las actividades – sea enel ámbito del hermanamiento, en el de laeducación ambiental, en temas de energíaregenerativa o la bolsa de intercambio creadaen el 2001, sólo para nombrar algunos delos tantos ejemplos-, se desarrolla sobre labase de las estructuras institucionales yamencionadas, pero requieren también de unfuerte componente de trabajo ad honorem.Sin ese trabajo voluntario y comprometidodentro de la asociación promotora, de losgrupos de trabajo o de la iniciativa de losdesocupados, sea como representantes de laciudadanía o dentro de otras numerosasmedidas y proyectos de la Agenda Local 21de Treptow-Köpenick, ésta no sería posible.

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39La Agenda 21 en el Distrito Treptow-Köpenick: idea, desarrollo y particularidades

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Reflexión final

Köpenick fue el primero de los distri-tos berlineses cuyos representantes promul-garon una resolución - 1994 - para imple-mentar la Agenda Local 21 en su distrito. Esparticularmente en él donde se logró unaestructura que alcanza en la actualidad cadavez más ciudadanos/as y contribuye aintegrarlos/as gracias a un buen trabajo decooperación entre todos/as los/as partici-pantes, es decir la administración distrital,la sociedad civil y las iglesias entre sí y consus contrapartes externos, como por ejemploel Ministerio de Trabajo1.

En efecto, la reforma administrativa de2001 impulsó la fusión de dos distritos condistintas características: Köpenick yTreptow. El primero se distingue por su ri-queza en bosques y fuentes de agua, porposeer una estructura territorial parcialmen-te rural pero de gran significado histórico,mientras que el segundo se caracteriza porser un distrito más nuevo, por estar situadomás cerca del centro de la ciudad y pobladopor clase social media. El 31 de agosto de2002, el Alcalde de los distritos unificadosTreptow-Köpenick entregará a la poblaciónla nueva Agenda Local 21 (la primera Agen-da Local 21 de un distrito berlinés surgido araíz de una fusión administrativa) en el mar-co de un acto festivo y como contribucióndescentralizada a las actividades de “Río +10” en Berlín.

En el futuro se tratará de llegar amayor cantidad de ciudadanos/as y con ellode intensivar el proceso de consultas, de es-tabilizar las estructuras existentes, de ganar

nuevas contrapartes, no por último en elcampo de la economía local, como asítambién escuelas y centros juveniles paralograr que el proceso iniciado sea realmenteirreversible.

Revisado, traducido y prologado porAlicia Rivero

Notas:1 SAMs: Strukturanpassungs-Maßnahme (medidas de ajus-

te estructural); ABMs: Arbeitsbeschaffungsmaßnahme(medidas para la creación de empleo.)

2 Arbeitsamt: literalmente traducido significa „oficinade trabajo“.

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Campo Grande: a formação da sociedade local e o desenvolvimento de sua identidadecultural

Campo Grande: local society organization and cultural identity developmentCampo Grande: la formación de la sociedad local y el desarrollo de la identidad cultural

Aparecido Francisco dos ReisUniversidade Católica Dom Bosco

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Resumo: O artigo a seguir é resultado de pesquisas acerca da formação da mentalidade e da cultura do homem quehabita a cidade de Campo Grande e parte do estado de Mato Grosso do Sul. Serão discutidos os modos de pensar,agir e sentir da população local. O estudo foi realizado mediante a observação sistemática do material simbólicocomo registro de opiniões, dos sentimentos e do pensamento social. Nesse sentido, pensa-se numa sociedade comcaracterísticas agrárias centrada, ainda, numa mentalidade passadista, mas que caminha em direção ao que asociologia identifica como contínuo folk-urbano, isto é, uma sociedade em transição do rural para o urbano.Palavras-chaves: cultura; representação do espaço; identidade.

Abstract: The following article is the result on the formation on of the mentality and culture of the man who inhabitsthe city of Campo Grande and part of the state of South Mato Grosso. In the article the ways of thinking, acting andfeeling of the local population are discussed. The study is based on systematic observation of symbolic material suchas: registering of opinions, feelings and social though. In this way, one can think of a society with agrarian characteristicsstill center on thoughts of the past but going in the direction of what sociology identifies as continuous folk-urban.That is, a society in transition from the rural to the urban.Key words: culture; space representation; identity.

Resumen: El artículo que sigue es el resultado de pesquisas acerca de la formación de la mentalidad y de la culturadel hombre que habita la ciudad de Campo Grande y parte del Estado de Mato Grosso do Sul. En este estarándiscutidas, los modos de pensar, actuar y sentir de la populación local. El estudio fue realizado mediante laobservación sistemática del material simbólico como: registro de opiniones, de los sentimientos y del pensamientosocial. En ese sentido, se piensa en una sociedad con características agrarias centrada aún, en una mentalidad antiguapero en dirección al que la sociología identifica como continuo folk-urbano; o sea una sociedad en transición del ruralpara el urbano.Palabras claves: Cultura; representación del espacio; identidad.

cleos urbanos, ensejando a formação da agri-cultura. Criar gado tornou-se a profissãonormal do tipo médio do habitante da cida-de e de suas adjacências.

Desde o início do século XX, CampoGrande, assim como todo o sul de Mato Gros-so, é uma região eminentemente pastoril.Toda circulação de dinheiro e de outras ati-vidades estavam diretamente associadas aoboi, como pode-se verificar na descrição dePaulo Coellho Machado (1990).

No declínio, a cidade esvazia-se para recredescero movimento, com maior embalo, na alta doboi. Então a cidade assumia novamente o ar ale-gre e brejeiro, porque nós sempre dependemose vamos depender por muito tempo dos negó-cios pecuários. Novos bares e estalagens foramabertos, cabarés nasciam a todo instante, ao ladodo comércio de gêneros alimentícios, armazéns,bazares e outros que foram se aperfeiçoando.Mulheres de todas as partes procuram a cidade,onde corria dinheiro a rodo. Logo começaram achegar também as jovens paraguaias, internaci-onalizando e valorizando a zona campo-grandese. Frescas, bonitas, amoráveis, desini-bidas, falando e ensinando o guarani... Trouxe-ram a polca e a dolente guarânia, logo incorpo-radas ao nosso folclore e cantadas ao vilão dia enoite (Machado, 1990, p. 80).Campo Grande transformou-se no lu-

gar preferido dos boiadeiros, dos viajantes,dos negociantes de toda espécie, pela colo-

A sociedade campo-grandense tevesuas origens totalmente ligadas ao mundorural tanto nas atividades econômicasquanto culturais. Pode-se falar em uma socie-dade com uma cultura ligada às formas desociabilidade e de subsistência que se apoiavaem soluções econômicas mínimas. A econo-mia e o trabalho estavam condicionados pelagrande extensão de terras nas quais se culti-vavam a agricultura e a criação de gado,sendo este último o elemento econômico pre-ponderante na constituição da sociedadelocal. Assim sendo, enquanto cidade, CampoGrande e o próprio sul de Mato Grosso nas-ceram e se consolidaram a partir da criaçãode gado feita em grandes extensões de terras:

Esse sistema se realiza em grandes áreas ou pro-priedades, ele depende muito mais dos recursosnaturais - pastagens, barreiros salinos – do querecursos zootécnicos. A adoção desse processode criação propicia a formação de grandes lati-fúndios, porque a baixa rentabilidade da explo-ração do gado é compensada pela expansãoquantitativa de dois fatores básicos, a terra e ogado (Weingartner, 1995, p. 18).Segundo a autora acima citada, o

gado é que fez a base econômica. Espalhan-do-se pelas campinas e pelo cerrado abertodas terras da região, possibilitando a forma-ção das fazendas e o aparecimento dos nú-

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cação próxima dos centros produtores, fer-tilidade das terras e pelo acúmulo de capitalpor parte de vários fazendeiros.

Agricultura e trabalho

Outros pontos importantes no enten-dimento do habitante local são suas concep-ções de produção e de trabalho.

Na produção agrícola havia a predo-minância de uma economia de subsistência,associada a grande quantidade e a fertilida-de das terras. Plantava-se para viver, a co-lheita era enorme se comparada com o plan-tio. Em caso do enfraquecimento do solo,associado à precariedade da técnica, erapossível recorrer a novas terras, onde se re-criavam as condições anteriores, não apenasde produtividade, como de isolamento, per-petuando a auto-suficiência e tornando des-necessária a introdução de hábitos mais ri-gorosos de trabalho, condizentes com omodo de produção capitalista.

Essa prática tornou-se comum no in-terior do Brasil, como se pode observar aofazer a leitura de textos referentes à culturae ao tipo rural brasileiro.

Em Os Parceiros do Rio Bonito (1962),Antônio Cândido discute as transformaçõesnos meios de vida e padrões de sociabilidadedo caipira paulista tradicional, relacionando-as às mudanças socioculturais que acompa-nharam os processos de urbanização e indus-trialização no estado de São Paulo. Abando-nando a intenção original de investigar o im-pacto do processo de mudança nas manifes-tações folclóricas, mais precisamente nocururu, dança típica da região pesquisada, osociólogo acabou desenhando um retrato dohomem, conhecido como o rústico.

O conceito de cultura rústica baliza aanálise do autor, que acentua a necessidadede distingui-lo de folk-culture, pois, se em am-bos trata-se do tema do isolamento relativo eda incorporação e reinterpretação de traçosculturais, que vão se alterando ao longo docontínuo folk-urbano, cultura rústica indicaum padrão específico de contato interétnicoe cultural. Entende, dessa forma, que:

No caso brasileiro, rústico se traduz praticamentepor caboclo no uso dos estudiosos, sendo pro-vavelmente Emílio Willems o primeiro a utilizarde modo coerente a expressão cultura cabocla; ecom efeito aquele termo exprime as modalida-

des étnicas e culturais do referido contacto doportuguês com o novo meio (Candido, p. 22).A análise de Antônio Cândido apro-

xima a cultura cabocla do caipira à existên-cia nômade ou semi-nômade, associada aoprocesso de conquista dos sertões. O fato te-ria suas raízes históricas no fenômeno dasentradas e bandeiras, pois como nos adver-te o autor:

A expansão geográfica dos paulistas, nos sécu-los XVI, XVII e XVIII, resultou não apenas naincorporação do território às terras da Coroaportuguesa na América, mas na definição decertos tipos de cultura e vida social, condiciona-dos em grande parte por aquele grande fenô-meno de mobilidade. Não cabe analisar aqui oseu sentido histórico, nem traçar o seu panora-ma geral. Basta assinalar que em certas porçõesdo grande território devassado pelas bandeirase entradas – já denominado significativamentePaulistânia – as características iniciais do vicentinose desdobraram numa variedade subcultural dotronco português que se pode chamar de cultu-ra caipira (p. 35).Um lençol de cultura caipira teria se

estendido, assim, em fins do século XVIII,pelas capitanias de São Paulo, Minas Gerais,Goiás e também aqui em Mato Grosso doSul, em que se revelam formas de sociabili-dade e sobrevivência caracterizadas por so-luções mínimas. Segundo esse argumentohistórico, o homem rústico do interior, porconseguinte aqui do Centro-Oeste, teria her-dado do bandeirante a esquivança, olaconismo, a rusticidade e, como corolárioda grande mobilidade e dos padrões míni-mos de vida, o espírito de aventura: “na ha-bitação, na dieta, no caráter do caipira, gra-vou-se para sempre o provisório da aventu-ra” (p. 37). A principal característica dessacultura consistia na rusticidade, resultado doencontro de padrões culturais europeus, nocaso específico de espanhóis e portuguesescom os de etnias indígenas, modelando es-ses últimos, em grande parte, o modo de serda população local.

Segundo o autor, a dieta alimentar doelemento rústico resultaria dessa vida nôma-de e apresentava sensível semelhança com ados bandeirantes. O leite, o trigo e a carnede vaca seriam itens muito raros e a caça,atividade caipira por excelência. Nela se“desenvolvia a extraordinária capacidade deajustamento ao meio, herdada do índio” (p.55). Também na habitação a provisoriedadeestava gravada. A casa, um abrigo de palha

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sobre paredes de pau-a-pique, recebia onome de “rancho”, indicando o caráter depouso que tinha para o morador (p. 37).

O sociólogo não se detém muito a ex-plicar como uma característica cuja origemhistórica remontava ao bandeirismo e a umcerto padrão de povoamento se cristalizara,mais preocupado que estava com o proces-so de mudança nas áreas tradicionais de SãoPaulo, como efeito da industrialização e daurbanização. Tratava-se também de pensarcomo traços culturais vistos como garanti-dores de “equilíbrio ecológico”, portanto fun-cionais ao modo de vida caipira, se compor-tariam nas novas condições de organizaçãosocial. Por conseguinte, não restam dúvidasao autor que a cultura caipira ou cabocla,caracterizada por relativa independência emrelação aos núcleos urbanos, disponibilida-de de terras, trabalho doméstico, auxíliovicinal e acentuado tempo disponível paraas atividades de lazer, representava um pa-drão adaptativo às condições do meio:

Tendo conseguido elaborar formas de equilíbrioecológico e social, o caipira se apegou a elas comoexpressão da sua própria razão de ser, enquan-to tipo de cultura e sociabilidade. Daí o atrasoque feriu a atenção de Saint-Hilaire e criou tan-tos estereótipos, fixados sinteticamente de ma-neira injusta, brilhante e caricatural, já neste sé-culo, no Jeca Tatu de Monteiro Lobato (p. 82).O estereótipo da indolência explicava-

se pela organização da cultura, tanto em ter-mos biológicos, e daí a importância dos estu-dos da alimentação, como sociais, em tornode padrões mínimos, daí resultando umamargem de lazer maior. Esses padrões trariamdificuldades para a adaptação posterior anovos ritmos de trabalho e a eles também sesomavam características da saúde e da nutri-ção, apontadas muitas vezes como causasúnicas. A preguiça é percebida por Cândido,como um dado não contingente, como umtraço cultural do caipira. É explicada pelaestabilização de sua vida “em termos bioló-gicos e sociais em torno de padrões mínimos”(p. 86). Assiste-se, dessa forma, a uma novainversão da célebre frase de Monteiro Lobato:o Jeca não “estava assim”, ele realmente “eraassim”, dados os padrões culturais que organi-zavam a sua vida social, uma vida “mínima”.

Apesar de Antônio Cândido não sereferir à idéia de espírito ou mentalidadecapitalista como se vê na análise de MaxWeber acerca do tipo social básico forma-

dor do capitalismo nórdico-europeu, é pos-sível pensar nesse tema como pano de fun-do de seu trabalho. Tal afirmação é compre-endida a partir da leitura de A ética protes-tante e o espírito do capitalismo (1980).

Em Weber, o capitalismo como formaeconômica não poderia ter se desenvolvidosem uma mudança de visão de mundo bási-ca. Assim, Weber foi conduzido à idéia de quea explicação para o fato deveria ser encon-trada na estreita vinculação do capitalismocom a ascese puritana. O fato, de na época,os líderes do mundo dos negócios, os propri-etários do capital e os níveis mais altos de mão-de-obra qualificada, e, sobretudo, trabalha-dores disciplinados e com obrigação moralpara o trabalho, serem, na sua maioria, pro-testantes, demonstraria, segundo Weber, umatendência, nestes, para o racionalismo eco-nômico. A razão para este fato, Weber buscano caráter intrínseco e permanente de suascrenças religiosas e não apenas em suas tem-porárias situações políticas e históricas.

É exatamente no calvinismo queWeber passa a centrar sua análise no senti-do de perceber na visão de mundo aponta-da aqui, os elementos básicos guiadores docomportamento puritano: isolamento espi-ritual do indivíduo em relação a Deus; raci-onalização do mundo e a eliminação do pen-samento mágico, como meio de salvação.Deste modo, com o intuito de relacionar asidéias fundamentais do ascetismo puritanocom as tendências econômicas, Weber apon-ta alguns elementos coincidentes: o trabalhocomo a própria finalidade da vida; o suces-so profissional e a riqueza do indivíduocomo provas do cumprimento de sua voca-ção e da escolha divina, diferentemente docaipira estudado por Antônio Cândido.

A ascese puritana teria, então, liberta-do o fiel para a ânsia do lucro como um de-sejo de Deus. Com isso, Weber quer dizerque se precisa considerar a especificidadedas relações entre a economia e as represen-tações de mundo dos sujeitos de uma deter-minada sociedade.

Weber salienta, de um lado, para aimportância de se pesquisar as idéias comoparte da realidade social e, de outro, para anecessidade de se compreender a que ins-tâncias do social, determinado fato deve suamaior dependência.

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Parece que o caipira ou o Jeca pode sercompreendido como o inverso do calvinista,formado em outra visão de mundo em rela-ção ao trabalho. Cândido afirma que o Jeca“não é vadio, simplesmente não é ambiciosonem previdente” (p. 87). Tal condição apare-ce simbolicamente reforçada pelas origenshistóricas, reais ou míticas, que explicariam osentido de independência do caipira e que oteriam colocado à margem de relações escra-vistas ou servis. Por isso, surgiam expressõescomo a registrada por Antônio Cândido:“sino é para italiano”, no caso do estado deSão Paulo, que procurava “dar expressão ét-nica a duas tradições culturais diversas: a doimigrante europeu formado secularmente nospadrões de dependência senhorial; a do cai-pira, herdeiro da aventura de desbravamentoe posse franca dos sertões” (p. 189).

As relações de trabalho e a propaladapreguiça não poderiam ser dissociadas daestrutura fundiária, pois expulso das posses,nunca legalizadas, o “Jeca” persistia comoagregado, ou “buscava sertão novo, ondetudo recomeçaria” (p. 82). Apenas a partirdas décadas de 1940 e 1950 sua incorpora-ção à vida das cidades se teria tornado apre-ciável. Em seu estudo, Antônio Cândido, aoprocurar responder à pergunta de como secomportou a cultura caipira ante os fatoresde desequilíbrio representados pelo latifún-dio produtivo comercializado, o desenvolvi-mento urbano e o imigrante (p. 91), chega àconclusão de que “há resistência variável dacultura caipira segundo as formas de ocu-pação da terra, regime de trabalho e situa-ção legal. Onde há concentração de sitian-tes e ausência de latifúndio, vemos perma-necerem com mais integridade as relaçõesvicinais e o sentimento local” (p. 91).

O desamor ao trabalho do habitantedo sertão estava ligado à desnecessidade detrabalhar, condicionada pela falta de estímu-lo prementes à técnica sumária e a espolia-ção eventual da terra. Foi peculiar ao habi-tante local a dedicação a outros afazerescomo: a caça, a pesca e a indústria domésti-ca; e ainda atividades lúdicas como festas ecelebrações, que aprofundavam as relaçõessociais entre vizinhos, parentes e compadres,mantendo assim, a homogeneidade e coesãosocial, consideradas mais importantes que asatividades econômicas.

O trabalho encontrava-se ainda racio-nalizado pela observância dos dias de guar-da, considerados pelos mais velhos como“dias desastrosos”, nos quais se acreditavaque o trabalho podia causar prejuízo grave,devido ao desrespeito às normas religiosas.Se para a maioria a semana conta com seisdias úteis, para o sertanejo conta apenasquatro. No sábado ele não vai à roça, ficaem casa preparando os seus aviamentos decaça e pesca, ou em preparativos para ir aodomingo à vila; na segunda, ele descansa dafadiga do domingo. Entretanto, segundo An-tônio Cândido isso não quer dizer que o ho-mem rural fosse um vadio. Simplesmente nãoera ambicioso e nem previdente. Podendoapenas ser interpretado como um tipo quenão tinha extremas necessidades, portanto,tendo uma concepção de trabalho própriaem um universo relativamente fechado e ho-mogêneo de uma cultura rústica em territó-rios vastos.

Apesar da idéia corrente do isolamen-to das culturas sertanejas, Antônio Cândi-do oferece indícios de que tal condição seriareforçada, no caso dos parceiros do Rio Bo-nito, pelo avanço da civilização urbana. Tra-dicionalmente, a estrutura fundamental dasociabilidade caipira era o bairro – “agrupa-mento de algumas ou muitas famílias, maisou menos vinculadas pelo sentimento de lo-calidade, pela vivência, pelas práticas deauxílio mútuo e pelas atividades lúdico-reli-giosas” (p. 62). Poucas frases seriam tão ex-pressivas dessa realidade do que “o bairro éuma naçãozinha”, registrada pelo sociólo-go no curso de sua pesquisa, indicando aconsciência de pertencimento e identidadedos moradores.

No bairro caipira é que se deveria bus-car, de acordo com o autor, o sentido deautonomia ao poder centralizador do gran-de domínio rural e à independência do fa-zendeiro. O sentido sociológico da autarquiaeconômico-social não deveria ser buscado nolatifúndio, “largamente aberto às influênci-as externas, graças à sua própria situaçãode estrutura líder, e sim no bairro caipira,nas unidades fundamentais de povoamen-to, da cultura e da sociabilidade, inteiramen-te voltados sobre si mesmos” (p. 81).

Esse padrão de sociabilidade sofre pro-funda alteração no processo de transição da

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economia de subsistência para a economiacapitalista, quando cada vez mais a vidasocial do caipira se fecharia no bloco famili-ar, implicando a perda das relações vicinaise dos laços organizados em torno do bairro.Antônio Cândido descreve-a como crise eco-nômica, crise no padrão de vida e tambémcrise sociocultural; percebendo-a comoanomia, uma vez que:

A sua vida anterior comportava ritmo diverso,que não era estritamente determinado [...] pelasnecessidades econômicas mais elementares, deque depende a própria sobrevivência. A par dotrabalho agrícola, ocupava-se também com avida comemorativa, a vida mágico-religiosa, acaça, a pesca, a coleta, as práticas de solidarieda-de vicinal [...] este conjunto de circunstâncias fa-vorecia tanto o melhor ajustamento ecológicopossível a uma situação a limentar medíocre,quanto à integração social mais plena (p. 169).Em face da civilização urbana, a situ-

ação de equilíbrio ecológico da vida tradici-onal do caipira teria sido desestruturada, oque se faria sentir em diversos aspectos, sen-do a alimentação um dos mais relevantes. Amonotonia da dieta composta basicamente

por feijão, arroz, farinha e pouquíssima car-ne (mesmo a caça era rara) é acentuada peloautor que descreve, com detalhes, o cardá-pio semanal de um caipira.

A sociedade de transição

Pode-se identificar pelo menos duas fa-ses no processo de transição nesta sociedadecom cultura eminentemente agrária com des-tino a uma sociedade urbana. A primeira faseocorre concomitante à migração do homemdo campo, a partir da década de 50. Eviden-temente, Mato Grosso do Sul tem suasespecificidades, pois em outras cidades, a ur-banização se deu, principalmente em virtu-de da industrialização, sobretudo São Paulo.Aqui essa transferência ocorre mais posteri-ormente, no momento da divisão do estadode Mato Grosso. Nesse sentido, cidades comoCampo Grande e Dourados, crescem e pas-sam receber um fluxo maior de pessoas. Adescrição da evolução da população do esta-do pode ser verificada na tabela abaixo.

POPULAÇAO SITUAÇÃO DE DOMICÍLIO

1970 1980 1991 2000 RURAL 546.087 450.444 365.926 330.895 URBANA 452.117 919.123 1.414.447 1.747.106 TOTAL 998.204 1.369.567 1.780.373 2.078.001

Fonte: IBGE.

Foram apresentados aqui os dados das

últimas quatro décadas, isto é, desde os anos70, período da divisão e criação do estado deMato Grosso do Sul. A partir destes, pode-seobservar que a transferência da população dazona rural para as cidades do estado, foi ex-tremamente rápida. No geral, o crescimentodemográfico foi mais acelerado na década de70, período que corresponde à entrada demigrantes gaúchos que vieram trabalhar nocultivo de soja. Na década de 80 a taxaverificada foi de 2,4, mas segundo estimati-vas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geogra-fia e Estatística), no período correspondenteà década de 90, o crescimento da populaçãogirou em torno a 1,86% ao ano.

Considerando que o Estado de MatoGrosso do Sul encontra-se ainda em proces-

Tabela 1: Taxa geométrica de crescimento da população residente – 1970/2000.

so de ocupação, possui uma densidadepopulacional baixa de 5,25 habitantes porquilômetro quadrado, apresentando grandesvazios demográficos, como a microrregiãoBaixo Pantanal com uma densidade de ape-nas 1,37 habit/km². Por outro lado, pode-seperceber que aproximadamente 50% da po-pulação habitam as regiões de Dourados eCampo Grande, totalizando 1.131.474 mo-radores segundo o Censo Demográfico doIBGE de 2000.

Como pode-se perceber nas análise dosdados do IBGE, a grande mudança da po-pulação para a zona urbana ocorreu na dé-cada de 70. Nesse período, introduziram-seno seio da sociedade agrícola, novas técni-cas de produção, organizadas segundo opadrão capitalista. Ou seja, a mecanização

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dos processos agrícolas, como na produçãode soja, trigo, milho em várias regiões do es-tado, principalmente na região de Dourados,torna o Estado o 8º produtor de grãos dopaís. Também, no período, a atividade pe-cuária sofre mudanças no sentido do ajus-tamento aos modernos processos de criaçãode gado de corte e de leite, contado em 2000,segundo a SEPLANCT (Secretaria de Esta-do de Planejamento, Ciência e Tecnologia),com um rebanho de aproximadamente de25 milhões de bovinos.

O fato do estado ocupar um lugar dedestaque nas atividades agro-pecuárias nãose traduz imediatamente numa situação cô-moda para a população local. Também amigração da zona rural para as cidades trou-xe, do ponto de vista dos sujeitos sociaismudanças econômicas e novas formas deentendimento do mundo. Numa entrevistarealizada com uma senhora, moradora deCampo Grande, entre outras informações,pode-se observar uma certa saudade da fa-zenda, uma vez que a mesma, vivendo nacidade numa situação bastante adversa, re-vela as suas representações e o seu saudosis-mo de um tempo passado, que ao que pare-ce, era bem melhor que presente.

O mundo meu filho é um grande teatro. Essegrande teatro é formado por três tipos meno-res, diferentes. O da roça, por oferecer melho-res condições à vida, ar puro, e até levementeperfumado, fartura, abundância de água limpae corrente, tranqüilidade, ocupa o primeiro lu-gar na classificação. O segundo colocado é o tipoformado pelas cidades interioranas, pequenas,nas quais as pessoas vivem em harmonia, sãoamigas, cooperam para o bem-estar da comuni-dade. A terceira colocação coube ao tipo forma-do pela grande cidade, o tal mundo civilizado,onde há poluição do ar e sonora, maior númerode sofredores, de doentes, de acidentes e ladrõese de crimes de todo tipo (Rosa, 68 anos).Esta senhora foi criada numa fazenda

em uma cidade do interior do Estado de MatoGrosso do Sul. Morando atualmente emCampo Grande e, em grande medida depen-dendo da ajuda dos filhos para sobreviver esem aposentadoria, a mesma, embora de for-ma serena entende que o mundo de hojeperdeu os referenciais e os valores que tor-nam os seres humanos mais próximos unsdos outros. Sem dúvida essas formas de re-presentação são comuns, sobretudo nos maisvelhos e mais pobres que tiveram contatocom a vida tradicional e podem compará-la

com o presente. Verifica-se isso nas palavrasde João Santana (58 anos), morador de Cam-po Grande. Sua família veio da Bahia, quan-do ele ainda era criança, para trabalhar naagricultura na região de Dourados, hoje eleé aposentado como ex-funcionário daEnersul (Empresa de Energia Elétrica deMato Grosso do Sul) e tem uma pequenamercearia num bairro de Campo Grande.Segundo ele, o que recebe como aposentadonão é suficiente para o sustento da família,com 5 filhos, ainda solteiros e todos moran-do com ele. São ainda muito jovens, uma vezque se casou já com uma idade meio avan-çada. Embora cansado, se vê na obrigaçãode trabalhar mais um pouco ainda para po-der sobreviver junto com sua família.

Para ele, a vida numa cidade comoCampo Grande não tem sido das maistranquilas. Alega que tem muitas despesas epoucas compensações, já que o modelo eco-nômico não propicia uma melhora de situa-ção. Ele percebe que em relação aos seus paisele está melhor, tem mais conforto, mas issorepresenta um ônus muito grande, já que temde se comprar de tudo hoje em dia. O passa-do dele na zona rural era marcado por diasbem melhores que os atuais. Assim sendo,pode-se notar representações muito presen-tes na sua fala quando compara passado epresente:

1 - A abundância: reino da fartura.Grandes colheitas, onde se deixava “milhono pé para os porcos comerem”;

2 - A solidariedade: todos se ajuda-vam mutuamente e ninguém passava aper-to. O mutirão foi largamente praticado emtoda zona rural do estado, representandopara o roceiro: benefício, auxílio, obrigaçãomoral de retribuir a ajuda e também umadimensão lúdica: a festa;

3 - A sabedoria: havia gente que con-tava causos. Causos de santos, bichos, mila-gres. Todos com a função de instruir os maisnovos. Uma espécie de tradição oral. Lem-bra que havia mais respeito e temor: os fi-lhos obedeciam aos pais, os jovens aos maisvelhos, os afilhados aos padrinhos e toda leidivina.

Essa valorização do passado, emboraseja contada e apareça como real, é apenasuma imagem ideal. No passado havia doen-ças, mortes e recursos escassos. Mas é o tem-

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po onde aparecem os valores fundamentaisdesse tipo de cultura, tais como lealdade,amizade, compadrio, entre outros. O fato deestarem morando hoje na cidade, não signi-fica que se sintam completamente integra-dos. A impressão é que alguns indivíduosnão cabem no universo da cidade, revelan-do a anomia apontada acima por AntônioCândido no que se refere ao desman-telamento da cultura dos caipiras paulistas.

Integrando-se ou não ao universo ur-bano, esses sujeitos sociais encontram-senuma situação de aprender os novos esto-ques simbólicos disponíveis. O problemaaparece porque não existe um equilíbrio naaquisição destes novos elementos, logo amentalidade social oscila entre o mundo dacidade com seus valores, crenças, sentimen-tos e práticas sociais modernas e o mundorural, mítico, onde o tempo parece não mu-dar, e se muda é para permanecer numaeternidade obedecendo os ciclo da nature-za.

Tais situações revelam um profundoromantismo rural, passadista, a despeito dodiscurso em nome do futuro. A nostalgiapode ser vista como uma forma clássica deromantismo por aqueles que se recusam àalienação, aos conflitos de um tempo, e bus-cam num passado pré-urbano a utopia dotempo novo. No caso de Mato Grosso do Sul,a raiz desse romantismo está na idéia de queo atraso é uma condição determinante e pon-to fundamental a ser superado, pois todosos males econômicos, sociais e políticos sãodele advindos. Para tanto, na visão de partedos habitantes da cidade e, sobretudo doGoverno do Estado, há a necessidade de in-troduzir uma nova mentalidade através decapitalismo na forma de desenvolvimentoindustrial, da criação de uma burguesia ur-bana em detrimento dos grandes latifundiá-rios e por fim, do rompimento definitivo comas práticas políticas tradicionais como oclientelismo e o paternalismo:

Acho que o governo do Estado pode não ser lámuito competente para administrar o Estado etenha provocado ate hoje muita decepção nopovo. Todo mundo aqui em Campo Grandeesperava uma saída melhor, um maior investi-mento na área industrial. As pessoas queriamque a indústria viesse para Campo Grande eisso iria provocar emprego e ganho. O governoestá trazendo indústria só para Três Lagoas,Aparecida do Taboado, ali perto de São Paulo.

Não acho o governo bom, mas pelo menos éhonesto e não rouba como os anteriores. Aspessoas reclamam, mas não se lembram que esseEstado passou vinte anos sendo mal adminis-trado e roubado pelos políticos tradicionais quese alterarm no poder. O Estado está quebrado enem tem como fazer novos investimentos (Leila,46 anos – dona de comércio).O depoimento de Leila demonstra a

frustração que o governo administrado peloPT (Partido dos Trabalhadores), tem, de cer-to modo, provocado. Como é sabido, desdea divisão do Estado no fim de da década desetenta, ele tem sido governado apenas pordois grupos políticos ligados à estruturaagrária, aos grandes latifundiários. Apenasem 1998, a hegemonia latifundiária foi su-postamente rompida com a eleição de JoséOrcírio dos Santos, conhecido como Zeca doPT, para o governo estadual. As expectati-vas acerca do governo do PT giram, sobre-tudo, na idéia de criação de uma sociedadecom estilo mais capitalista com incentivos aindustria, o que teria como decorrência amenor dependência das atividades agro-pe-cuárias. Evidentemente, nenhuma mudan-ça de comportamento nas ações do governopodem ser isoladas do restante da ação dapopulação como um todo. A mentalidadeestá associada a formas tradicionais efossilizadas, logo, a mudança parece ser algoainda muito distante. Na continuação de suafala, Leila diz:

O Zeca não traz indústria para cá porque aquiem Campo Grande não tem mão-de-obra qua-lificada. As indústrias que se instalaram em TrêsLagoas, trouxeram gente de São Paulo para tra-balhar. Pegou pouca gente da cidade. Claro, pre-fere gente com capacidade para trabalhar e aquinão tem. Eu sou dona de comércio e sei que issoé difícil. Não se encontra gente competente paranada aqui.Esses diagnósticos se recusa a ver que

as mazelas e os problemas do Estado estãocolocados na sua própria formação históricae no contexto de uma sociedade que pode seridentificada como em direção à urbanização,e por isso, provocando saudade ou perspec-tiva de novo tempo. Não pode haver espe-rança de que um governo, seja ele qual for,possa ser o agente exclusivo de mudança.

Assim sendo, tem-se de pensar no ur-bano ou no rural, no mínimo em duas pers-pectivas: a das estatísticas e a da cultura ouestilo, sendo aqui entendida como uma for-ma de pensar, agir e sentir dos indivíduos

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ou ainda, como um modo peculiar de “fa-zer as coisas” (DaMatta, 1998, p. 17).

A partir da perspectiva dos dadosdemográficos, Campo Grande pode ser pen-sada como uma cidade. Isso pode ser confir-mado tendo como referência os critériosadotados no Brasil para definir o que é umaregião urbana. Na verdade, a socióloga Ma-ria Narazeth Wanderlei Baudel (1997) apon-ta que o critério mais freqüentemente utili-zado para distinguir uma sociedade rural daurbana é o tamanho da população. Segun-do Wanderlei Baudel, cada país estabelece olimite além do qual um aglomerado pode servisto como urbano. Na França é acima de2.000 habitantes; nos Estados Unidos, o li-mite varia entre 10.000 e 50.000 habitantese na Alemanha é considerado como ruraltoda região que sofrer ausência de uma ci-dade com mais de 100.000 habitantes.

No Brasil, segundo a referida autora,existem dois critérios estabelecidos. Pela le-gislação, atribui-se a toda sede de municípioa condição de urbana e, do mesmo modo,são igualmente urbanos conglomeradospopulacionais, às vezes, de dimensões mui-to reduzidas, como é o caso da maioria dassedes distritais.

Partindo dessa concepção, compreen-de-se que Campo Grande se enquadra comouma sociedade urbana, assim como as de-mais cidades brasileiras. A legislação nãoconsidera como relevante se parte da popu-lação mora no espaço urbano e exerce pro-fissões ligadas ao espaço da zona rural.

Por outro lado, outros autores enfati-zam que rural e urbano são conceitos queperpassam a noção de território e de tama-nho de população, sendo compreendidos,portanto, a partir do tipo de sociedade oumentalidade que se pode identificar.

Segundo Ruben George Oliven (1996),as teorias sociais que lidam com esses con-ceitos apontam para um contraste entre osdois modelos de sociedade. Nesse contexto,existe a teoria do antropólogo norte ameri-cano Robert Redfield (1941). Seu modelo éconstruído a partir de estudos com campo-neses migrantes para a Cidade do México.Neste, o autor procura confrontar caracte-rísticas de uma sociedade não urbana com ade uma urbana. Assim, ele apresenta umasociedade não urbana como: “Pequena, iso-

lada, analfabeta e homogênea, com forte sen-timento de solidariedade grupal” (Oliven,1996, p. 13).

Neste tipo de sociedade descrita porRedfield, os modos de vida e o comporta-mento são tradicionais e espontâneos. Oparentesco, as relações pessoais, o grupo fa-miliar e suas instituições aparecem comofundamentos em detrimento da legislaçãoque igualaria todos os indivíduos:

A vila camponesa quando comparada com a vilatribal, a cidade pequena quando comparada coma vila camponesa, ou a cidade grande quandocomparada com a cidade pequena é menos isola-da; é mais heterogênea; é caracterizada por umadivisão do trabalho mais complexa; tem uma eco-nomia monetária mais completamente desenvol-vida; tem especialistas profissionais que são maisseculares e menos sagrados; tem instituições deparentesco e compadrio que são bem menos efi-cazes no controle social (Oliven,1996, p. 15).O autor aponta que a sociedade urba-

na é menos religiosa, mais racional e apre-senta uma menor tendência de atribuir adoenças ou outros males uma relação ime-diata com a quebra de conduta moral e doscostumes tradicionais. Também a sociedadeurbana permite uma ação maior de liberda-de para o indivíduo. A partir da definiçãode Redfield, a sociedade urbana é uma cole-tividade dividida em grupos e classes sociaise na qual há indivíduos isolados uns dosoutros. Os membros de uma sociedade comesse grau de complexidade não se conhecempessoalmente e, assim, se relacionam medi-ante certas instituições sociais como Estado,escolas, igrejas, meios de comunicação, co-mércio e grandes rituais coletivos.

Por outro lado, o modelo de Redfielddeve ainda ser compreendido como um mo-mento de transição entre os dois modelos or-ganização social. Assim, haveria sempre umdirecionamento da sociedade rural para socie-dade urbana, dependendo, é claro, do graude heterogeneidade das relações sociais e dadensidade populacional. As conseqüências dodeslocamento rumo ao urbano seriam a de-sorganização da cultura, a secularização e oindividualismo. Desse modo, a homogenei-dade de uma sociedade rural, com uma estru-tura monolítica, seria substituída na socieda-de urbana, por uma diversidade de papéis,ações e significados. A cultura rural se frag-mentaria, tendo então, como desfecho final,a desorganização e o conflito.

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Desenvolvimento Local: questões conceituais e metodológicasLocal Development: conceptual and methodological questions

Desarrollo Local: cuestiones conceptuales y metodológicas

Sérgio Ricardo Oliveira MartinsUniversidade Católica Dom Bosco

contato: [email protected]

Resumo: A visão humanista e ecológica requer, para sua compreensão e crítica, uma revisão de posturas e deestrutura de sentimentos, o que significa rever (portanto, questionar) convicções e crenças teóricas. De fato, aproposta humanista, holística e ecológica está na essência do conceito de desenvolvimento local, que assim adquiremaior complexidade e se torna um desafio à reflexão.Palavras-chave: Desenvolvimento local; participação social; desenvolvimento endógeno.

Abstract: To understand and criticise the humanistic and ecological viewpoint, it is necessary to review attitudes inthe structure of sentiments, which means reviewing (and as such, to question) convictions and theoretical beliefs. It iscertain that the humanistic, holistic and ecological proposal is the essence of local development, which thus aquiresmajor complexity and becomes a challenge for reflection.Key words: Local development; social participation; endogenous development.

Resumen: La visión humanista y ecológica requiere, para su comprensión y crítica, una revisión de posturas y en laestructura de sentimientos, lo que significa rever (por lo tanto cuestionar) convicciones y creencias teóricas. De hecho,la propuesta humanista, holística y ecológica están en la esencia del concepto de desarrollo local, que de esta formaadquiere mayor complejidad y se vuelve un desafio a la reflexión.Palabras claves: Desarrollo local; participación social; desarrollo endógeno.

maior problema, talvez entender (aceitarseria uma outra questão!) a proposta huma-nista, holística e ecológica, que está na es-sência do conceito de desenvolvimento lo-cal, seja algo realmente complexo que está aexigir muita reflexão. O presente trabalho,enquanto produto desta reflexão, se propõea analisar aspectos conceituais e metodo-lógicos do desenvolvimento local, cuja com-preensão, em última análise, requer uma vi-são de mundo bem distinta da convencio-nal, aquela centrada no racionalismo objeti-vista e cartesiano e em valores materialistase adeptos do consumismo.

Enquanto estratégia de planejamento ede ação, o desenvolvimento local aparecenum contexto em que se esgotam as concep-ções de desenvolvimento associadas a pro-gresso material (acúmulo de riquezas), pes-soal (“ganhar a vida”) e ilimitado (“quantomais melhor”), mas sobretudo é um produtoda iniciativa compartilhada, da inovação edo empreendedorismo comunitários. Mais doque um conceito, o desenvolvimento local é,na verdade, um evento sui generis, resultantedo pensamento e da ação à escala humana,que confrontam o desafio de enfrentar pro-blemas básicos e alcançar níveis elementarese auto-referenciados de qualidade de vida nacomunidade. É certo que compreender o de-senvolvimento local requer, indispensa-velmente, que se reflita sobre conceitos bási-cos que, em última análise, estão diretamenteimplicados no cenário formado pela própriadinâmica da vida e o ambiente de entorno.

1. Introdução

A atual tendência em se pensar e pla-nejar o desenvolvimento é dotá-lo de umcaráter mais humano, no sentido de consi-derar o homem simultaneamente como sujei-to e beneficiário. Trata-se, pois, de um pres-suposto óbvio, isto é, que as pessoas devemparticipar ativamente e não apenas serembeneficiárias do desenvolvimento. Está cla-ro que aspectos fundamentais que identifi-cam tal mudança de paradigma chegam aténós nas leituras e nas discussões sobre de-senvolvimento local, que é muito mais do queum conceito. Entende-se aqui que a dificul-dade de entender (por conseguinte de acei-tar) o desenvolvimento local é decorrente deconcepções e posturas pouco ou nada conci-liáveis e mesmo opostas ao estabelecimentode uma nova cultura do desenvolvimento.

Entende-se que os pressupostos da vi-são humanista e ecológica requerem, parasua compreensão, uma revisão de posturas.Não há espaços para fetichismos e radicalis-mos de qualquer espécie, tampouco paraconcepções restritas de cultura. Igualmentenecessário é rever a nossa estrutura de sen-timentos, porque se exige sensibilidade emdose suficiente para não conciliar com a ar-rogância tecnicista e, não raro, etnocêntrica.Certamente nada disso é fácil, sobretudoporque, no mínimo, significa rever (portan-to, questionar) convicções e crenças teóricas,o que certamente poucos estão dispostos aempreender e aceitar. Se de fato este não é o

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2. Desenvolvimento ou(des)envolvimento: a questão daparticipação

O termo desenvolvimento tem sidoassociado à noção de progresso material ede modernização tecnológica. Sua promo-ção, mediante o desrespeito e a desconside-ração das diferenças culturais, da existênciade outros valores e concepções, já teriafuncionado como “Cavalo de Tróia”, que,vestido da sedução do progresso, teria carre-gado em seu interior o domínio e a imposiçãoculturais que desequilibram e abalam associedades. É, pois, certo que a história dodesenvolvimento, na qual invariavelmente seatribui importância secundária à dimensãocultural, estão presentes mentalidades etno-cêntricas, evolucionistas e racionalistas(Verhelst, 1992).

Desenvolvimento associado a progres-so material decorre de uma visão positivistaque só enxerga desenvolvimento no cresci-mento de taxas e indicadores econômicos.Também encontramos a crença do progres-so linear e tecnicista, características, aliás, dopróprio modernismo (Harvey, 1998). Enten-der o desenvolvimento, de fato, não se tratade mera questão conceitual, mas de posturae de sentimento, basicamente sustentadospela modéstia e promotores da simplicida-de. A dimensão humana do desenvolvimentoestá fundamentalmente na valorização daspessoas em sua plenitude, que supõe cresci-mento econômico não como fim, mas comomeio de reduzir as privações e as afliçõeshumanas (Torras, 1995). Voltar-se para aspessoas e não para os objetos, eis o princípiobásico do desenvolvimento à escala huma-na (Max-Neef, 1986). Não obstante, objetivaras pessoas e propor a sua participação emtodo o processo de desenvolvimento (do pla-nejamento à ação), mesmo que resultem emmelhorias efetivas das condições materiaisde vida, são insuficientes para assegurarema continuidade do processo. O verdadeirodiferencial do desenvolvimento local não seencontra em seus objetivos (bem-estar, qua-lidade de vida, endogenia, sinergias etc), masna postura que atribui e assegura à comuni-dade o papel de agente e não apenas debeneficiária do desenvolvimento. Isto impli-ca rever a questão da participação.

Desenvolvimento endógeno seriaaquele balizado por iniciativas, necessidadese recursos locais, tal como uma comunidadeque de fato se conduz a caminho do desen-volvimento, ou da promoção do seu bem-estar. Neste processo, a participação comu-nitária assumiria uma destacada condiçãodo desenvolvimento local, seja de sua efeti-vação, seja de continuidade (La Dinámica,1992). Como propõe Martín (1999, p. 172),o desenvolvimento local proporcional à es-cala humana deve ser entendido como a sa-tisfação das necessidades humanas funda-mentais através do “protagonismo real e ver-dadeiro de cada pessoa”. Entende-se quecriar as condições para que a comunidadeefetivamente exerça este protagonismo se afi-gura como o maior desafio para que o de-senvolvimento local aconteça, considerandoque, diferentemente da Europa, estamos di-ante de realidades locais nas quais persistemalgumas ausências importantes: da cidada-nia, da identificação sociocultural e territo-rial e do sentido de vizinhança.

Assim, o caráter necessariamenteparticipativo e democrático do desenvolvi-mento local é o seu “calcanhar de Aquiles”,uma vez que a participação é de fato umaconquista a ser empreendida individualmen-te por cada pessoa, num processo em quecada vez mais ela se torna cidadã (Demo,1988). Na essência da participação pessoalestá, além da tomada de consciência, a for-mação de um senso crítico e a sensibilidade.Por certo, são estes requisitos difíceis de se-rem obtidos, sobretudo quando não estimu-lados e mesmo sufocados por períodos depouca ou nenhuma democracia.

Ávila (1993, p. 5), defendendo o quedenomina de “municipalização qualitativa”,em termos de que seja esta uma “...saída,talvez porta única, na atualidade, para aendogeneização de nosso desenvolvimen-to...”, atribui importante papel à participa-ção popular. Entende-se que a participaçãocomunitária não se deve resumir a envolvi-mentos esporádicos e parciais de alguns ór-gãos e instituições de representação social.Participação é empenho pessoal por umaprendizado difícil das regras e meios de sefazer ouvir, entender e atender. A avaliaçãofeita por Fernández (1995 p. 34) dos gruposlocais da iniciativa comunitária Leader 1, na

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Espanha, cujo resultado aponta uma escas-sa participação da população local, faz crerque este é o maior desafio a ser enfrentadopor qualquer estratégia de desenvolvimentolocal.

É importante visualizar a participaçãoenquanto resultado do processo de constru-ção social, portanto sujeito a fatores históri-cos e culturais. Neste sentido, a participa-ção parece manter uma relação direta coma capacidade individual ou coletiva deinteragir, cooperar, associar-se e confiar, istoé, com o chamado capital social. Emboracomplexo e conceitualmente ainda impreci-so, o capital social assume patente visibili-dade enquanto recurso potencial de desen-volvimento, tanto mais pelo fato de que temseu aporte na dimensão cultural e não ape-nas sociológica ou espacial1.

Conclui-se que a participação não podeser vista como um mero requisito metodo-lógico na estratégia de sensibilização ou cons-cientização popular. Ela é muito mais do queum atributo do diagnóstico ou um recursoda ação planejadora. Negligencia-se a par-ticipação mesmo quando se empreendem to-dos os esforços em oferecer às pessoas a opor-tunidade ampla e irrestrita de participar. Oesvaziamento de uma reunião pode não ex-pressar desinteresse, mas ser um indicativoimportante de que o seu conteúdo não foiperfeitamente entendido ou aceito. Nestesentido, participativo não é o processo emque apenas se assegura a oportunidade daparticipação, mas aquele que a promove emtodos os sentidos, porque nela deposita suaprópria condição de vitalidade. Isto signifi-ca acreditar muito mais nas pessoas do queestamos acostumados, possibilitando econdicionando sua participação qualitativae não apenas quantitativa.

3. Desenvolvimento local para quê?

Na Europa, o Comitê Econômico e So-cial das Comunidades Européias (Comitê,1995) concebe o desenvolvimento local comoum processo de reativação da economia ede dinamização de uma sociedade local, combase no aproveitamento ótimo dos recursosendógenos, objetivando o crescimento daeconomia, a criação de emprego e a melhoriada qualidade de vida. Neste caso, observa-

se uma clara preocupação com a geração deemprego e renda, que tem sido a tônica naEuropa, aparecendo de forma contundentetambém aqui no Brasil2. Dowbor (1996), porexemplo, após admitir que o desenvolvimen-to local não deve ser apenas pensado poruma “lógica economicista”, afirma que talestratégia de ação de base local, na atuali-dade econômica e social do Brasil, deve con-siderar o “problema da necessidade da ge-ração de emprego e renda”. É certo que odesenvolvimento local não constitui a únicasaída para a crise do desemprego, mas en-cerra a perspectiva do enfrentamento destee de outros problemas socioeconômicos. De-senvolvimento local, todavia, não equivalea geração de emprego e renda, não obstantetem sido esta a tônica de grande parte dosprojetos (não raro, práticas sem fundamen-to teórico) que levam a rubrica de desenvol-vimento local.

Mahbub Ul Haq (1978), após apontaros “sete pecados” dos planejadores desenvol-vimentistas, conclui que o desenvolvimentodeve ser uma ação de enfrentamento real àspiores manifestações da pobreza, objeti-vando a igualdade de opções e não de ren-da. A oportunidade de escolha, o direito àliberdade e a condição das pessoas de opta-rem e buscarem por melhores condições devida formam, pois, o cerne do conceito dedesenvolvimento humano.

Para Rozas (1998), desenvolvimentolocal é a organização comunitária em tornode um planejamento para o desenvolvimen-to, por uma perspectiva de construção soci-al, constituindo assim em um instrumentofundamental, de caráter orientador e con-dutor, de superação da pobreza. Não se tra-ta, contudo, de buscar tão somente o aten-dimento às carências materiais, mas a iden-tificação e a promoção das qualidades, ca-pacidades e competências existentes na co-munidade e no lugar. Mas a superação daspiores manifestações da pobreza na atuali-dade requer igualmente uma revisão de con-ceitos e, sobretudo, de posturas. Muito apro-priadamente, Yunus (1998) afirma que nãose pode solucionar o problema da pobrezacom o mesmo “marco teórico” que permitiuou ajudou na sua criação.

O enfrentamento e a superação dapobreza têm sido a tônica do desenvolvimen-

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to local pensado e praticado na AméricaLatina. Cada vez mais seus pressupostoshumanistas têm servido a projetos que obje-tivam erradicar a miséria. Neste contexto, aparticipação representa um desafio aindamaior, haja vista que os segmentos mais ca-rentes, não raro migrantes, portanto viven-tes em um processo de inserção socioespacial,têm ainda mais dificuldade de se envolver econtribuir efetivamente nos projetos. Colocá-los na condição de maiores beneficiários doprocesso, contudo, assegura apenas o aten-dimento emergencial às suas necessidades.

4. Local, essencialmente um sentido delugar: a questão da escala

Implícita no conceito de desenvolvi-mento local está obviamente uma questão deescala territorial. O entendimento da escalalocal, como aquela que permite a eficácia dasações e um melhor acompanhamento dosresultados, está associado ao fracasso de ummodelo de desenvolvimento pautado na in-dustrialização a qualquer custo, no consu-mo de massa, em altíssimos custos ambien-tais e sociais, viabilizado por ampla disponi-bilidade de capitais (Leroy, 1997, p. 88-89).Uma nova concepção de desenvolvimento,que valoriza o local como referência terri-torial (sentido de lugar) e que ganha força,na Europa, a partir dos anos 80, quer apro-ximar-se das pessoas, apoiar-se na solidarie-dade comunitária, instrumentalizar a comu-nidade, envolvendo-a efetivamente na supe-ração dos problemas e na promoção do de-senvolvimento endógeno (Gobierno Vasco,1994).

Quando se fala de “local”, está-se refe-rindo à escala das inter-relações pessoais davida cotidiana, que sobre uma base territorialconstróem sua identidade. O lugar é essabase territorial, o cenário de representaçõese de práticas humanas que são o cerne desua singularidade; o “espaço da convivên-cia humana”, onde se localizam os desafiose as potencialidades do desenvolvimento(Martín, 1999). É, pois, fundamental obser-var que o território adquire um destacadopapel enquanto condição e fator de desen-volvimento, qualquer que seja a comunida-de considerada. Não se trata, portanto, demero suporte das ações humanas, mas de

um agente que, de acordo com suas potencia-lidades e limitações, pode favorecer ou difi-cultar o desenvolvimento (González, 1998).É esta precisamente a idéia do território en-quanto meio inovador, na medida em que éconsiderado fator, e não apenas locus, da ino-vação, isto é, do pensamento criativo que,na forma de empreendedorismo, planeja-mento de ações, se volta para a solução deproblemas sociais, econômicos e ambientais.

Parece mesmo elementar que toda re-flexão, investigação ou ação na escala localdevam ser realizadas à luz da realidade co-tidiana, isto é, que devam incidir sobre pro-blemas relevantes e concretos de uma comu-nidade em seu entorno ou lugar, sem perderde vista as múltiplas determinações e inte-rações com outras escalas ou níveis de aná-lise. O lugar é o cenário interativo dos acon-tecimentos, onde os fenômenos naturais ehumanos acontecem e produzem seus efei-tos. Por isso não é apenas porção e sim sín-tese da totalidade socioespacial. Há, pois,uma “ordem local” diretamente associadaao cotidiano das pessoas, cujos parâmetrossão a co-presença, a vizinhança, a intimida-de e a cooperação (Santos, 1996a). Esta é aescala humana, que se identifica pela rela-ção entre as pessoas, entre estas e o seu en-torno (ambiente, empresas e instituições),pautada na interdependência e na comuni-dade de interesses, mas também, e princi-palmente, no cotidiano conflitante e solidá-rio vivido em comum.

A força do lugar (ordem local) resideno território compartilhado e identificadopor uma consciência social e comunitária deentorno, cuja essência é a própria históriavivida em comum (Santos, 1996a; LeBourlegat, 2000). O lugar se apresenta paraas pessoas por sua materialidade, pela apa-rência conhecida e familiar dos elementosque o compõem – casas, ruas, campos, a vi-zinhança, o clima habitual, etc. É certo quetal materialidade participa ativamente davida das pessoas, envolvendo-as por todosos lados, sendo assim, é no território, que osfatos ganham plena significação, tornando-se fatos socioespaciais. O enfoque socioespa-cial deve transcender a representação espa-cial e a localização dos fatos, e apreender oprocesso em que estes mesmos fatos adqui-rem em significação social. A cidadania, por

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exemplo, poderá não passar de figura deretórica se não relacionada com o território.Cidadão não é todo aquele que tem direitose deveres assegurados por lei, mas aquele queefetivamente tem condições de exercer essesdireitos e deveres. Neste sentido, Santos(1996b, p. 123) afirma que as condições deacesso aos meios de vida dependem, emgrande medida, de como as pessoas estãosituadas (e não apenas localizadas) no lu-gar, e conclui que “O cidadão é o indivíduonum lugar”. Isto quer dizer que, ao envol-ver práticas territoriais, em distintas espacia-lizações e em uma sociedade diferenciada, acidadania pode ser plena para uns e nulapara outros.

Na atualidade, as relações entre oglobal e o local adquirem papel fundamentalno desvendamento de ambos. Local e globalsão, com efeito, duas ordens imbricadas, es-sencialmente contraditórias e insupera-velmente dialéticas (Benko, 1996, p. 65). Aordem global é a representante dos interesses“estranhos” ao lugar e à comunidade. Aidéia de estranheza, cada vez maior entreas “ações” e os lugares (neste incluindo aspessoas), torna-se imprescindível à análisedo mundo de hoje. É mais uma vez Santos(1996a, p. 65) que chama a atenção para ofato de que, na atualidade, deve-se conside-rar que as “ações” são cada vez mais estra-nhas ao lugar e às pessoas, criando duasescalas, uma de “realização” e outra de“comando”. O estudo do lugar requer assimsua observação a partir de distintos níveisde análise.

É oportuno retomar o problema dadelimitação física ou cartográfica do lugar.Trata-se de uma interessante questão demétodo, que certamente se complica, se formeramente considerada como uma questãode precisar limites territoriais. Mas, comoafirma Castro (1995), definir “tamanhos” éum problema elementar da abordagem geo-gráfica, além de constituir uma inquietaçãopara outras áreas que lidam com o espaço.Obviamente tem-se aí uma questão de esca-la, entendida esta mais como “unidade deconcepção” e não como unidade de medi-da, limitada a um mero exercício matemáti-co. Entende-se que o espaço local define-sepor um conteúdo ecologicamente dinâmicoe historicamente elaborado e experimenta-

do pelas pessoas que nele moram (ou mora-ram). Grosso modo, as pessoas, considera-das em suas distintas possibilidades sociaise econômicas, relacionam-se com as condi-ções de ocupação e sobrevivência do lugar,com ele se identificam, dele se apropriam,nele formam raízes. Insiste-se que esta é aessência do lugar, chave da elaboração e dacompreensão de sua identidade. Na perspec-tiva da vida à escala humana, na medidaem que o objetivo maior é a conquista dobem-estar, o dimensionamento do lugar sóadquire sentido se considerado em funçãoda abrangência e contigüidade espacial dosinteresses, dos problemas vividos pela comu-nidade e dos recursos existentes.

Lacoste (1988, p. 74) ensina sobre a sig-nificação da escala, observando seu caráterqualitativo e não apenas quantitativo. Afir-ma que diferentes escalas não correspondemtão somente a “diferenças quantitativas”,mas igualmente a “diferenças qualitativas”.A escala de estudo não deve, pois, resultarde uma única e derradeira escolha, mas éfundamental estar consciente das limitaçõese possibilidades que se interpõem à análiseatravés da escala. Se a realidade diante dosolhos não é a mesma segundo a escala dadaé sobretudo porque ela é mutidimensional emultiescalar, não permitindo que o mesmofenômeno possa ser observado em escalasdistintas. A seriedade da questão da escalareside precisamente nas possíveis distorções(e “ocultações”) que ela possa engendrar narealidade observada (p. 84). Lacoste propõeque a escolha da escala deva ocorrer em fun-ção do nível de análise, isto é, no “tamanhodo espaço” a ser considerado pelo estudo (p.88-90). A escolha da escala é, pois, submissaao tipo de problema ou à ação que se querpraticar. É interessante observar, que o nú-mero de variáveis (“interseção de conjuntosespaciais”) se torna cada vez maior à medi-da que o tamanho do espaço se reduz (p.90). É, pois, como certa vez alertou MiltonSantos: “Quanto mais pequeno o lugar exa-minado, tanto maior o número de níveis edeterminações externas que incidem sobreele. Daí a complexidade do estudo do “maispequeno” (Santos, 1988, p. 3).

Assim, o manejo da escala na análiseterritorial está longe de constituir um exer-cício meramente matemático ou restrito à

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representação cartográfica. Souza (1996, p.16) propõe uma espécie de “raciocíniomultiescalar” para se alcançar maior poderexplicativo e perceber melhor a magnitudedos fenômenos. À escala local, por exemplo,a segregação socioespacial é qualificadacomo problema socioeconômico (e, obvia-mente, político) para o poder público local,preocupado com a elevação da pobreza ur-bana ou com o déficit habitacional. À escalaregional, são os fluxos migratórios articula-dos para o trabalho, percebidos como resul-tado e condição de uma atividade econômi-ca. Somente à escala do lugar é possível apre-ender a dimensão humana do sofrimento,das angústias, frustrações e expectativas.

5. Cotidiano e situação de vizinhança

Ao se tratar aqui do conceito de coti-diano, far-se-á investido da consciência deestar transitando entre duas correntes depensamento que se opõem (sem se excluírem)no que se refere à existência das coisas (dos“objetos”, do espaço). De um lado, o mate-rialismo e a objetividade, desde Aristóteles aKarl Marx (passando por leva de pensado-res, como Descartes e Newton), segundo osquais as coisas existem independente daconsciência humana3. Do outro, o idealismosubjetivo, desde Berkeley a Kant (passandopor Leibniz e, com certa dose de objetivida-de, por Hegel) que genericamente negava arealidade objetiva e somente admitiam a exis-tência material por via das “idéias” (Olivei-ra, 1988; Haesbaert, 1990).

Acredita-se que o estudo do cotidianopode acrescentar novos significados ao lu-gar. Mas o que vem a ser o cotidiano?

O cotidiano aparece em Kosik (1989)como expressão da própria existência huma-na no mundo. Trata-se, pois, da realizaçãodos afazeres diários, repetição das ativida-des vitais. Movida por preocupações, a pes-soa organiza seu dia-a-dia, criando uma redede relações que a influencia; o modo comovive (“existência”) expressa uma cotidiani-dade. Nas palavras do autor, “A vida coti-diana é antes de tudo organização, dia a dia,da vida individual (das pessoas); a repeti-ção de suas ações vitais é fixada na repeti-ção de cada dia, na distribuição do tempoem cada dia” (p. 69).

Em Lefebvre, o cotidiano é concebidocomo a dimensão constituída e instituídapelo “vivido”. Para ele, a vida cotidiana nãoacontece sem o “uso” que se faz do espaço edo corpo, mas também da “repetição” dosafazeres de todos os dias (Seabra, 1996; Sil-va, 1997). Tarefas simples diariamente exe-cutadas sempre da mesma maneira, como“levantar-se”, “tomar café” ou “ler o jornal”,marcam o compasso do dia e contêm as di-mensões da existência. Mas se o cotidianofaz-se da “repetição” (da mesmice), ele dámargem para o conflito e para o surgimentodo novo, a “insurreição do uso”.

O espaço cotidiano (o entorno) apare-ce como um campo de possibilidades ondese dá a “prática social”, por sua vez corres-pondente a uma prática espacial. Sem omi-tir o mundo real, a consciência (o pensamen-to) constrói um espaço de “virtualidades”,um objeto de representações. Eis o queLefebvre chama de “consciência do possí-vel”, que representa uma ordem estabele-cida, mas freqüentemente a subverte (Lutfiet al., 1995, p. 96-97).

Em Certeau (1999, p. 201-2), o lugarcomo ordem na consistência de seus elemen-tos, como “configuração instantânea” deposições, é também um campo de possibili-dades que se abrem às pessoas. Para o au-tor, da prática do lugar que subverte a sua“geometria”, sublevando-se contra a ordemestabelecida em sua configuração territorial,nasce o espaço (“...o espaço é um lugar pra-ticado.”). Nesta “fenomenologia do existir nomundo”, que é o cotidiano, prática do dia-a-dia, confrontar-se-iam o lugar (o material,estático, ordem construída) e o espaço (apercepção, a representação, a subversão). Olugar seria o campo do “permitido” enquan-to o espaço, o do “possível”. Na essênciadesta distinção, feita por Certeau, está a suaconcepção de cotidiano, feito da prática quecumpre a ordem estabelecida, mas sobretu-do da prática que subverte esta ordem, quevai além do permissível porque orientadapelo possível.

Certeau mostra uma concepção aber-tamente subjetiva de espaço, sendo esteconstruído pelo sujeito histórico que atua no“teatro objetivo”, que é o lugar. Neste senti-do, o espaço seria a percepção (e a perspec-tiva) das pessoas com base na experiência

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vivida. Assim dependente da percepção e daexperiência, o espaço não pode passar de umproduto da consciência humana. Entende-se aqui que tal concepção de espaço, depen-dente da consciência para existir (“espaçomental”), serve menos à compreensão darealidade, do que aquele que confronta aconsciência, mesmo sendo também um pro-duto dela. A distinção feita por Certeau en-tre lugar e espaço, o primeiro como equiva-lente da configuração territorial, mera dis-posição de materialidades, e o segundo, aprática cotidiana que reinventa (“atualiza”)o lugar, a “ordem”, na verdade se presta àapreensão muito mais de uma dimensão doespaço e do lugar, o cotidiano. Se o lugar ématerialidade construída, é também residên-cia do sentimento, da emoção. É oportunolembrar que tal materialidade traz em si tam-bém a idéia (ou a ideologia!) de quem a con-cebeu em um plano antes de produzi-la. Aordem construída, além de ordem precon-cebida pela consciência, é ordem tambémcondicionadora (às vezes ditadora) de no-vas consciências. Como na fenomenologia deHusserl, segundo a qual “toda consciência éconsciência de alguma coisa”.

Se o cotidiano serve à análise geográ-fica, é sobretudo por sua inseparabilidade dolugar, por ser essencialmente prática socioes-pacial. O cotidiano remete à proximidade deuma situação de vizinhança. Segundo San-tos (1996a, p. 255), em uma análise da situ-ação de vizinhança, a proximidade cumpreum papel fundamental enquanto base da“socialidade” e geradora da solidariedade eda identidade.

No lugar, a dialética entre a coopera-ção e o conflito move a vida social em comum.Neste contexto, onde se supõe o conheci-mento entre as pessoas e o conhecimento dolugar, como ficam aqueles que chegam defora, os migrantes, que trazem, na memória,outro cotidiano, a experiência vivida emoutros lugares? Santos (1996a, p. 263) afirmaque, para os migrantes, a memória, voltadapara o passado, lhes é inútil. Passada a“perplexidade” e o “atordoamento”, a idéiade futuro se forma enquanto se vai conhe-cendo o “novo” lugar. O desconhecimentodo espaço força-os a uma nova consciência,a que “olha para o futuro” (p. 263-4).

6. Por uma abordagem integrada

Fugir da concepção de mundofragmentária e mecanicista (cartesiana-newtoniana) supõe buscar uma visão inte-grada ou holística (ou ainda ecológica) quese aperceba da natureza sistêmica da reali-dade socioespacial. No mundo atual, verifi-ca-se a superposição cada vez mais nume-rosa e imbricada de interesses e de forças,em qualquer que seja a porção do espaçoobservada, invalidando quaisquer concep-ções ou conceitos estanques, parcializadosou estáticos, por qualquer que seja a área doconhecimento.

Capra (1982, p. 14) assinala que umaampla crise está a promover uma mudançade paradigma, que marca a superação daconcepção mecanicista-fragmentária pelaholística-integrada. Para este autor, umacompreensão “apropriada” do mundo atu-al, dos seus inúmeros problemas, não podese dar sem uma “... nova visão da realidade,uma mudança fundamental em nossos pen-samentos, percepções e valores”.

A racionalidade e o reducionismo quecindiu a unidade entre a natureza e o “ho-mem”, o corpo e a mente, concernente aométodo cartesiano, não obstante ter sido res-ponsável pelo grande desenvolvimento cien-tífico, forjou pensamentos e atitudes incapa-zes ou inconciliáveis à apreensão intuitivada realidade. Para Capra (1982, p. 35), o co-nhecimento intuitivo se assenta na experi-ência direta, no “estado ampliado da per-cepção consciente”, que é tendencialmentesintetizador, holístico e ecológico.

Presencia-se esta (re)descoberta, isto é,a crescente valorização do conhecimentointuitivo, quando o cotidiano e outras dimen-sões da existência humana como “emoção”,“percepção” são cada vez mais utilizadoscomo recursos analíticos na compreensão darealidade, do espaço.

Para ser integrada ou holística e, destemodo, conveniente com uma “nova visão darealidade”, a abordagem deve ainda conce-ber a totalidade como sistêmica, isto é, fun-dada na consciência do “estado de inter-re-lação e interdependência”, dos fenômenosfísicos, biológicos, psicossociais e culturais(Capra, 1982, p. 259). O princípio sistêmicosupõe considerar que o modo como as par-

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tes se relacionam e participam do todo é maisimportante do que as próprias partes, sendoesta uma questão de método fundamentalda abordagem integrada.

O conhecimento sobre o funcionamen-to de sistemas, a partir das observações dosorganismos vivos, tem revelado princípios deorganização fundamentais à sobrevivênciados mesmos. Do ponto de vista sistêmico, asobrevivência de um organismo (“sistemavivo”) não se dá sem associação e interaçãocom o ambiente. São estas relações de inte-ração, que explicam e dão sentido à vida in-dividual, que a concepção mecanicista e frag-mentária não é capaz de se aperceber e com-preender adequadamente. Um sistema, comoafirma Capra (1982, p. 260), é uma “totali-dade integrada”, de tal modo que não estálimitado às suas partes constituintes, sendotambém elas totalidades sistêmicas.

A concepção sistêmica, base para umaabordagem integrada, holística, pode igual-mente servir como potencial analítico parauma compreensão da totalidade socioespa-cial. Em primeiro lugar, uma abordagemsistêmica da formação socioespacial devefugir à tentação funcionalista de considerá-la como um organismo vivo. Pode ela ser vis-ta e estudada como um sistema, sendo destemodo equiparada a uma organização cujaestrutura, em interação com o meio ambien-te, é obrigada a uma constante mutação; ainteração com o meio supõe, simultaneamen-te, a adaptação e a ação no processo ininter-rupto de busca do equilíbrio (em si e com omeio), condição aliás indispensável de suacontinuidade. Internamente, o “sistema so-cial” determina os papéis e uma ordem a sercumprida pelos indivíduos (Brito, 1986). Aquestão é complexa e, portanto, de difícil tra-tamento. Todo esforço para não “naturali-zar” o que é social e histórico não será emvão. Não obstante, uma abordagem sistêmicada realidade pode ser mais apropriada àapreensão da totalidade socioespacial, domovimento e da transformação historica-mente contínuos. As tensões sociais, a sub-versão da ordem pela vontade pessoal e odesencontro entre o geral (social) e o indivi-dual não devem ser encarados como“disfunções” do sistema social, mas comoforças internas que atuam dialeticamente noprocesso evolutivo incessante de todo e qual-

quer sistema. Mas enquanto totalidadesocioespacial, não há uma evolução da soci-edade independente do seu meio. É funda-mental, portanto, saber como ela atua sobreo meio, como o altera e é alterado por ele.

7. Considerações finais

Está claro que o desenvolvimento lo-cal não é um receituário de medidas pron-tas, tampouco padronizadas, para seremaplicadas em qualquer lugar, mas uma es-tratégia de ação coerente com os princípiose os pressupostos ecológicos e humanistas.O desafio maior é certamente criar e conso-lidar uma outra “cultura de desenvolvimen-to”, cujo objetivo mais importante é, por umaperspectiva cultural, a elevação do estado debem-estar humano em todas as suas dimen-sões (psicossocial, ambiental e econômica).Neste sentido, o enfrentamento e a supera-ção das distintas formas ou manifestaçõesassumidas pela pobreza requer uma visãomais integrada e humanitária do própriodesenvolvimento. Requer uma visão maisdinâmica da própria pobreza, a ser entendi-da como fato historicamente determinado ecomo realidade sustentada por um conjun-to de relações socioeconômicas e políticas.

Tal como Capra (1982, p. 410), aqui seacredita que um paradigma voltado paravalorização humana, está em andamentoapesar das aparências. Por certo há um lon-go e tortuoso caminho a percorrer. Nestesentido, embora difícil, será indispensávelrever algumas de nossas crenças e convic-ções. Sem embargo, este é o desafio maior aser enfrentado.

Notas:1 “La cultura cruza todas las dimensiones del capital social de

una sociedad”, afirma Bernardo Kliksberg (1999, p. 90).2 Cf. “A região como ‘locus’ do desenvolvimento econômico”,

por João Pizysieznig Filho (Gazeta Mercantil, 19/8/98) e “Emprego e desenvolvimento local”, por ByronQueiroz (Idem, 5/9/98).

3 É de Aristóteles a conhecida frase “O que não está emnenhum lugar não existe.”

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Critérios para publicação

avanço das reflexões na área do DesenvolvimentoLocal;

Art. 6 - A entrega dos originais para a Revista deveráobedecer aos seguintes critérios:

I - Os artigos deverão conter obrigatoriamente:a) título em português ou espanhol;b) nome do(s) autor(es), identificando-se em rodapé

dados relativos à produção do artigo, ao(s) seu(s)autor(es) e respectivas instituições, bem como aauxílios institucionais e endereços eletrônicos;

c) resumo em português ou espanhol (máximo de 6linhas, ou 400 caracteres) e abstract fiel ao resumo,acompanhados, respectivamente, de palavras-chavee keywords, ambos em número de 3, para efeito deindexação do periódico;

d) texto com as devidas remissões bibliográficas nocorpo do próprio texto;

e) notas finais, eliminando-se os recursos das notas derodapé;

f) referências bibliográficas.II - Os trabalhos devem ser encaminhados dentro da

seguinte formatação:a) uma cópia em disquete no padrão Microsoft Word

6.0;b) três cópias impressas, sendo uma delas sem

identificação de autoria e outra acompanhada deautorização para publicação devidamente assinadapelo autor;

c) a extensão do texto deverá se situar entre 10 e 18páginas redigidas em espaço duplo;

d) caso o artigo traga gráficos, tabelas ou fotografias, onúmero de toques deverá ser reduzido em funçãodo espaço ocupado por aqueles;

e) a fonte utilizada deve ser a Times New Roman ,tamanho 12;

f) os caracteres itálicos serão reservados exclusiva-mente a títulos de publicações e a palavras em idiomadistinto daquele usado no texto, eliminando-se,igualmente, o recurso a caracteres sublinhados, emnegrito, ou em caixa alta; todavia, os subtítulos doartigo virão em negrito;

g) as citações virão entre aspas, em fonte normal (nãoitálica).

III - Todos os trabalhos devem ser elaborados emportuguês ou espanhol, e encaminhados em três vias,com texto rigorosamente corrigido e revisado;

IV - Eventuais ilustrações e tabelas com respectivaslegendas devem ser contrastadas e apresentadasseparadamente, com indicação, no texto, do lugaronde serão inseridas. Todo material fotográfico será,preferencialmente, em preto e branco;

V - As referências bibliográficas e remissões deverãoser elaboradas de acordo com as normas dereferência da Associação Brasileira de NormasTécnicas (ABNT - 6023);

VI - Os limites estabelecidos para os diversos trabalhossomente poderão ser excedidos em casos realmenteexcepcionais, por sugestão do Conselho EditorialInternacional e a critério do Conselho de Redação;

Art. 1 - Interações, Revista Internacional do Programade Desenvolvimento Local da Universidade CatólicaDom Bosco, destina-se à publicação de matérias que,pelo seu conteúdo, possam contribuir para aformação de pesquisadores e para o desenvolvi-mento científico, além de permitir a constanteatualização de conhecimentos na área específica doDesenvolvimento Local.

Art. 2 - A periodicidade da Revista será, inicialmente,semestral, podendo alterar-se de acordo com asnecessidades e exigências do Programa; o calendáriode publicação da Revista, bem como a data defechamento de cada edição, serão, igualmente,definidos por essas necessidades.

Art. 3 - A publicação dos trabalhos deverá passar pelasupervisão de um Conselho de Redação compostopor cinco professores do Programa de Desenvolvi-mento Local da UCDB, escolhidos pelos seus pares.

Art. 4 - Ao Conselho Editorial Internacional caberá aavaliação de trabalhos para publicação.

Parágrafo 1º - Os membros do Conselho Editorial Inter-nacional serão indicados pelo corpo de professoresdo Programa de Mestrado em DesenvolvimentoLocal, com exercício válido para o prazo de dois anos,entre autoridades com reconhecida produçãocientífica em âmbito nacional e internacional;

Parágrafo 2º - A publicação de artigos é condicionada aparecer positivo, devidamente circunstanciado,exarado por membro do Conselho EditorialInternacional;

Parágrafo 3º - O Conselho Editorial Internacional, senecessário, submeterá os artigos a consultoresexternos, para apreciação e parecer, em decorrênciade especificidades das áreas de conhecimento;

Parágrafo 4º - O Conselho Editorial Internacional poderápropor ao Conselho de Redação a adequação dosprocedimentos de apresentação dos trabalhos,segundo as especificidades de cada área.

Art. 5 - A Revista publicará trabalhos da seguintenatureza:

I - Artigos originais, de revisão ou de atualização, queenvolvam, sob forma de estudos conclusivos,abordagens teóricas ou práticas referentes à pesquisaem Desenvolvimento Local, e que apresentemcontribuição relevante à temática em questão;

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IV - Resenhas de obras inéditas e relevantes que possammanter a comunidade acadêmica informada sobre o

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Art. 7 - Não serão aceitos textos fora das normasestabelecidas, com exceção dos casos previstos noartigo arterior, e os textos recusados serão devolvidospara os autores acompanhados de justificativa, noprazo máximo de três meses.

Art. 8 - Ao autor de trabalho aprovado e publicado serãofornecidos, gratuitamente, dois exemplares donúmero correspondente da Revista.

Art. 9 - Uma vez publicados os trabalhos, a Revistareserva-se todos os direitos autorais, inclusive os detradução, permitindo, entretanto, a sua posteriorreprodução como transcrição, e com a devida citaçãoda fonte.

Para fins de apresentação do artigo, considerem-se osseguintes exemplos (as aspas delimitando os exemplosforam intencionalmente suprimidas):

a) Remissão bibliográfica após citações:

In extenso: O pesquisador afirma: “a sub-espécie Callithrixargentata, após várias tentativas de aproximação, revelou-seavessa ao contato com o ser humano” (Soares, 1998, p. 35).Paráfrase: como afirma Soares (1998), a sub-espécieCallithrix argentata tem se mostrado “avessa ao contatocom o ser humano”...

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c) Emprego de caracteres em tipo itálico: os programasde pós-graduação stricto sensu da universidade emquestão...; a sub-espécie Callithrix argentata tem semostrado...

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