Inovação na Educação Básica e Tecnologias Educacionais: Aplicando os 4Rs dos REA

16
239 INOVAÇÃO NA EDUCAÇÃO BÁSICA E TECNOLOGIAS EDUCACIONAIS: APLICANDO OS 4 Rs DOS RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS Andreia Inamorato dos Santos Há pouco mais de uma década os recursos educacionais abertos 1 (REA) vêm ganhando espaço no cenário educacional internacional. No Brasil particularmente, esse conceito se propaga rapidamente entre educadores, pesquisadores e formadores de opinião, na medida em que reflete a possibilidade do compartilhamento do conhecimento de forma a potencializar o acesso ao mesmo por grupos sociais diversos, vinculados ou não à educação formal. Isso acontece porque os REA têm algumas características próprias, que os diferem de outros materiais educacionais disponibilizados na Internet. Devem possuir uma licença livre 2 ou uma permissão expressa de uso 3 , que concede aos usuários certos direitos de uso concedidos pelo autor, e com isso algumas práticas antes não permitidas passam não somente a ser autorizadas como também incentivadas. Estas são as práticas conhecidas como as quatro liberdades básicas dos REA, sendo elas: reusar, revisar, remixar e redistribuir. Na educação básica, dentro os grandes desafios do professor, está a busca por materiais educacionais inovadores e atualizados, que possam enriquecer a aula e trazer experiências estimulantes para a aprendizagem. O livro didático, apesar de ser um dos principais suportes pedagógicos do professor, muitas vezes carece de atualização, além do que é, na maioria das vezes, o material básico, e não complementar às aulas. Trata-se, portanto, da necessidade do uso de tecnologias aplicadas à educação, por meio das quais é possível encontrar na Internet uma gama de materiais educacionais em diversos

Transcript of Inovação na Educação Básica e Tecnologias Educacionais: Aplicando os 4Rs dos REA

239

INOVAÇÃO NA EDUCAÇÃO BÁSICA E TECNOLOGIAS EDUCACIONAIS: APLICANDO OS 4 Rs DOS RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

Andreia Inamorato dos Santos

Há pouco mais de uma década os recursos educacionais abertos1 (REA) vêm ganhando espaço no cenário educacional internacional. No Brasil particularmente, esse conceito se propaga rapidamente entre educadores, pesquisadores e formadores de opinião, na medida em que reflete a possibilidade do compartilhamento do conhecimento de forma a potencializar o acesso ao mesmo por grupos sociais diversos, vinculados ou não à educação formal.

Isso acontece porque os REA têm algumas características próprias, que os diferem de outros materiais educacionais disponibilizados na Internet. Devem possuir uma licença livre2 ou uma permissão expressa de uso3, que concede aos usuários certos direitos de uso concedidos pelo autor, e com isso algumas práticas antes não permitidas passam não somente a ser autorizadas como também incentivadas. Estas são as práticas conhecidas como as quatro liberdades básicas dos REA, sendo elas: reusar, revisar, remixar e redistribuir.

Na educação básica, dentro os grandes desafios do professor, está a busca por materiais educacionais inovadores e atualizados, que possam enriquecer a aula e trazer experiências estimulantes para a aprendizagem. O livro didático, apesar de ser um dos principais suportes pedagógicos do professor, muitas vezes carece de atualização, além do que é, na maioria das vezes, o material básico, e não complementar às aulas.

Trata-se, portanto, da necessidade do uso de tecnologias aplicadas à educação, por meio das quais é possível encontrar na Internet uma gama de materiais educacionais em diversos

240

formatos e mídias, que possam exercer esse papel complementar ao do tradicional livro didático.Portanto, para que o uso desses materiais seja feito sem o infringimento dos direitos dos autores originais e para que o seu potencial seja realmente aproveitado em contextos específicos é importante que eles tenham uma licença livre, para que as liberdades de reuso, revisão, remix e redistribuição possam ser aplicadas.

EXPLORANDO OS 4 ‘RS’ DOS REA

Dependendo do tipo de licenciamento dado aos recursos, certas liberdades previstas nesses 4Rs podem ou não estar contempladas. Na base do conceito de abertura dos REA está a compreensão de que o conteúdo está livre para ser reusado. Dessa forma, se um professor encontra um REA (digamos, um texto) escrito por outro professor na Internet e quer copiá-lo para utilizar esse texto na sala de aula com seus estudantes, ele pode utilizar, não somente trechos como a atual legislação prevê, mas o texto por completo. Porém, se ele desejar disponibilizar esse texto no seu blog na Internet para os alunos (e outros usuários) fazerem o download do mesmo, ele estará redistribuindo esse REA, o que de certa forma aumenta a abertura desse recurso. Caso haja a necessidade de fazer uma revisão ou um remix nesse texto com outros materiais educacionais, é certo que a abertura desse recurso deverá ser ainda maior. Ou seja, o nível de abertura do REA está diretamente relacionado ao tipo de licença livre a ele concedido. Nesse sentido,, Bissell (2009) diz que “o tipo de licença de um REA é critico para a sua definição”. O gráfico abaixo ilustra esse conceito de abertura dos REA:

Figura 1 – Os 4Rs e o aumento da abertura.

Traduzida de Hilton, J. e Wiley, D. (2010)

241

Para que se possa falar do nível máximo de abertura dos REA, representada pela base do triângulo na posição superior na figura de Hilton e Wiley (Figura 1), é necessário partir do princípio de que o recurso educacional terá uma licença que permite tais utilizações. Dessa forma, é primordial atentar para o fato de que um REA possui diferentes níveis de abertura, e que é a licença de uso atribuída a ele que permitirá ou não a aplicação dos 4Rs, um conceito idealizado por David Wiley (20074).

Reusar

O conceito do reuso é o fundamental num REA. Significa poder utilizar o material, seja ele em qualquer formato ou mídia, à vontade, desde que o autor original seja sempre reconhecido com tal. Uma música, um vídeo, um texto, um plano de aula ou qualquer outro tipo de REA pode ser utilizado em seu todo, e não somente em partes, quando possui uma licença livre. O conceito de reuso está quase sempre, mas não necessariamente, atrelado ao conceito de redistribuição quando se trata da prática. Isso porque o professor muitas vezes precisa distribuir o REA aos seus estudantes, por meio impresso ou eletrônico. Essa distribuição se potencializa se feita por canais de acesso aberto na Internet, como blogs ou wikis. Um exemplo de iniciativa de REA que se encaixa nessa liberdade do reuso é a Educopédia5, que será discutida adiante neste capítulo.

Revisar

Revisar um REA é uma das liberdades que permite ao professor6 fazer algumas modificações ou atualizar um recurso educacional de maneira que possa ser contextualmente útil para o seu propósito. Como exemplo de revisão (ou adaptação) de REA, cito a página de apresentação de um REA que passou por uma revisão de forma. Trata-se de uma videoconferência sobre objetos de aprendizagem e REA cujos slides e a narração foram sincronizados sem imagem por um professor, para atender às necessidades de seus estudantes, que não podiam em sua maioria acessar o replay da videoconferência original porque não disponibilizavam de banda suficiente para fazê-lo de forma eficiente. Uma vez que esse conteúdo era interessante para a disciplina estudada, o professor fez a revisão do material transformando a videoconferência numa ‘apresentação narrada’, e compartilhou com seus estudantes com a devida referência e licença livre. O conteúdo do REA não foi modificado ou revisado, mas sim a maneira como ele foi redistribuído7 na Internet, ou seja, a tecnologia utilizada para a sua disponibilização e o seu formato. A seguir a Figura 2 traz a imagem da página de acesso a esse recurso:

242

Figura 2 – REA adaptado por professor

Remixar

O remix também é uma adaptação, ou seja, uma adequação do REA para um propósito específico do professor, que se tornará uma obra derivada. Consiste em combinar esse REA com outros trabalhos, de forma a atender ao propósito do professor. Continua importante, num remix, citar o autor original do trabalho, indicando como acessá-lo.

Redistribuir

A redistribuição é um conceito bastante importante na filosofia dos REA. Isso porque ela garante a oferta de recursos educacionais na Internet, sejam originais, revisados ou remixados. Também conhecida como compartilhamento, a redistribuição consiste principalmente em se fazer uso de tecnologias aplicadas à educação para disponibilizar e disseminar um REA. Essa disponibilização pode ser feita para o público-alvo (alunos) ou aberta a todos na Internet. Vale lembrar, porém, que REA não depende das tecnologias digitais baseadas na Internet, pois um material impresso, por exemplo, que possua uma licença livre, também pode ser compartilhado

243

por meio de fotocópias, por exemplo. Mas as tecnologias digitais permitem a redistribuição dos REA para um número maior de pessoas, além de facilitarem o acesso ao material a partir de lugares diversos.

REA NO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

Uma vez que o Plano Nacional de Educação (PNE8) propõe que haja a inovação nas práticas pedagógicas da educação básica por meios das TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação), os REA parecem ser uma alternativa bastante viável para apoiar e dar sustentabilidade a esse objetivo.

O texto original do PNE9 não falava em REA, mas mencionava a necessidade de novas tecnologias educacionais e práticas pedagógicas. Sendo que, por meio dos REA, é possível fomentar a criação de livros didáticos colaborativos para o uso público, incentivar a produção de material pedagógico para os estudantes e de formação docente para os professores, assim como aumentar o número de atividades extracurriculares na educação básica utilizando-se das TIC (SANTOS, 2011), entendo que a inclusão do mesmo no texto do PNE em 2012, que foi encaminhado ao Senado Federal para votação, foi bastante pertinente.

Sendo assim, após o período de consulta pública da versão inicial do PNE, a redação do Plano foi alterada devido às emendas sugeridas, ficando assim:

Meta #7:

Estratégia 7.10:Selecionar, certificar e divulgar tecnologias educacionais para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, assegurada a diversidade de métodos e propostas pedagógicas, com preferência para softwares livres e recursos educacionais abertos, bem como o acompanhamento dos resultados nos sistemas de ensino em que forem aplicadas.

Estratégia 7.12:Implementar o desenvolvimento de tecnologias educacionais, e de inovação das práticas pedagógicas nos sistemas de ensino, inclusive a utilização de recursos educacionais abertos, que assegurem a melhoria do fluxo escolar e a aprendizagem dos alunos.

Em ambas as estratégias 7.10 e 7.12, os REA estão atrelados às tecnologias educacionais, muito embora, como já mencionado, um recurso educacional não dependa das tecnologias digitais baseadas na Internet para ser um REA. De qualquer maneira, são essas tecnologias que facilitarão a prática dos 4Rs.

244

TIPOS DE REA NA EDUCAÇÃO BÁSICA

Quando falamos de REA na educação básica geralmente pensamos em materiais educacionais que possam ser usados na sala de aula. Porém, o uso dos REA fora da sala de aula também deve ser previsto, uma vez que o acesso dos alunos no Brasil à Internet tende a ser maior fora da escola10. Além disso, não se costuma falar em cursos completos quando se trata de educação básica, mas também é perfeitamente possível, principalmente no que diz respeito ao ensino médio. Esses são cursos de qualquer tamanho visando ensinar algum aspecto específico de uma disciplina ou área do conhecimento. Portanto, os tipos de REA aplicáveis à educação básica são muito semelhantes aos da educação superior, salvo a pedagogia utilizada, que deve ser específica à faixa etária em questão. De maneira geral, são eles:

• Objetosdeaprendizagem.• Fotos,desenhoseimagens.• Arquivosdeáudio(podcasts,músicasetc.).• Textoselivros.• Pesquisas.• Vídeos.• Jogos.• Cursosdetamanhoeduraçãovariados.

Onde encontrar REA?

Pretendo agora mostrar três plataformas ou repositórios nos quais REA voltados para a educação básica podem ser encontrados. Particularmente, não acho que repositório seja o termo mais adequado ao se tratar de REA, pois pode dar a ideia de algo estagnado, estático. Os REA são, na verdade, muito dinâmicos, mas esse dinamismo depende também da facilidade com a qual os recursos podem ser editados, revisados, remixados e redistribuídos. Muitas vezes as tecnologias utilizadas para a disponibilização dos REA são baseadas num conceito de web 1.011, na qual a participação do usuário não é priorizada. Estes são, portanto, os repositórios que disponibilizam conteúdo, mas não apresentam ferramentas para o usuário interagir com ele, seja postando comentários, avaliando o recurso, modificando-o ou ainda fazendo o carregamento (upload) de seus próprios materiais, sejam eles novos ou derivados de outros REA. Esse tipo de interatividade entre o conteúdo e o usuário é a base da web 2.012. É fato, porém, que iniciativas baseadas em web 1.0 ainda abarcam a maioria dos REA que estão disponibilizados na Internet. Nesses casos, a

245

prática dos 4Rs acaba distribuída entre várias plataformas e tecnologias diferentes, pois o usuário tende a procurar por meios alternativos de publicação e distribuição dos REA. Mas vejamos a iniciativa de REA da Secretaria Municipal do Rio de Janeiro, a Educopédia:

Figura 3 – Educopédia Home – www.educopedia.com.br

A Educopédia foi lançada em 2011. É uma plataforma de aulas digitais online, que pode ser utilizada por qualquer pessoa que tenha acesso a um computador conectado à Internet. Ela contém REA organizados de acordo com o currículo da educação infantil até o 9º ano do ensino fundamental. Essas aulas contêm vídeos, jogos, textos, slides e links para outros sites e plataformas. Existem REA numa variedade de disciplinas na Educopédia: português, matemática, inglês, educação física, entre outras. A licença livre utilizada nessa plataforma é a Creative Commons CC-BY, portanto o usuário está livre para pôr em prática os 4Rs dos REA em todo o material disponibilizado pela Educopédia, desde que respeite a citação do autor original desses recursos (nesse caso, a própria Educopédia entra como fonte, uma vez que os recursos não contêm nomes individuais dos autores).

A Secretaria Municipal do Rio de Janeiro (SME-RJ) também oferece uma série de vídeos voltados para a formação docente no uso das novas tecnologias aplicadas à educação básica.

246

É o programa Transformação 3.013, que está disponibilizado no YouTube (também como REA, sob licença Creative Commons padrão do YouTube). A videoaula n.º 23 da série é sobre os 4 Rs dos REA.

Outra iniciativa de REA na educação básica é a da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (SME-SP):

Figura 4 – Site da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo – http://bit.ly/ZBabtf

Esta iniciativa da SME-SP reconhece a potencialidade dos REA para a inovação da educação e valoriza as práticas de aprendizagem que envolvem a web – práticas de autoria, práticas pedagógicas e de colaboração entre instituições. Isso porque esses recursos educacionais disponibilizados pela SME-SP com licença livre (CC-BY-NC-SA)14 podem ser reutilizados por outras secretarias de ensino ou quaisquer instituições interessadas, além de professores e do público em geral. Em setembro de 2011, o Decreto n.º 52.681 dispôs sobre “o licenciamento obrigatório das obras intelectuais produzidas com objetivos educacionais, pedagógicos e afins, no

247

âmbito da rede pública municipal de ensino de São Paulo” (ROSSINI e GONZALEZ, 2012:61). Este tipo de política pública para REA se faz essencial num momento em que a educação aberta atinge o seu potencial em face das novas tecnologias aplicadas à educação. Educação aberta é um termo genérico, cujo uso foi popularizado na década de 1970, e hoje em dia abrange também as práticas de utilização de REA, de disponibilização de tecnologias de código aberto e pesquisas de acesso livre (SANTOS, 2012).

Essa iniciativa da SME-SP, portanto, contribui para o desenvolvimento do movimento REA e das práticas de educação aberta no Brasil. O site disponibiliza os Cadernos da Rede, que têm o objetivo de serem utilizados como material de apoio, tratando das diferentes instâncias pedagógicas das unidades de educação infantil. Disponibiliza também os Cadernos de Apoio e Aprendizagem, destinados aos estudantes dos nove anos do Ensino Fundamental, visando à melhoria da aprendizagem. Além disso, possui materiais de apoio para recuperação em língua portuguesa, matemática e outros cadernos de orientação didática e guias de planejamento para o professor. Os 4Rs dos REA também podem ser aplicados em todo o conteúdo do site da SME-SP.

Finalmente, a terceira iniciativa que me proponho a mostrar15 é o Projeto Folhas e Livro Didático Público, da Secretaria de Educação do Estado do Paraná, disponíveis no Portal Dia a Dia Educação.

Figura 5 – Livro Didático Público http://bit.ly/Y3dW7U

248

O Projeto Folhas foi uma ação de formação continuada de docentes implementada de 2003 a 2006 pela Secretaria Estadual de Educação do Paraná. Foi inicialmente criado com a intenção de promover a ideia do professor como produtor do conhecimento, que deve ser compartilhado. Não havia a intenção de ser um projeto REA no início, pois, como diz Hutner (2011:23516): “Na época a gente não tinha a mínima ideia de que isso se tratava de REA”. O objetivo era produzir material a partir das diretrizes do governo do Estado do Paraná, e distribuí-lo, de modo a ser útil aos professores. De acordo com Hutner (2011), o conteúdo do Projeto Folhas é uma produção colaborativa, na qual a avaliação de qualidade era feita primeiramente pelos pares e depois por um dos núcleos regionais de educação do Estado. Por último, a Secretaria Estadual de Educação aprovava e publicava os recursos na Internet. O Projeto Folhas não teve continuidade quando mudou a gestão do Estado do Paraná, mas os materiais já produzidos continuam disponíveis na Internet. Porém, a partir dele, nasceu o projeto Livro Didático Público, que é uma coletânea de folhas (do Projeto Folhas) produzidas por professores compondo um livro. Foram vários livros publicados no Portal Dia a Dia Educação, nas áreas de língua portuguesa, geografia, física, história e outras disciplinas. Eles possuem uma permissão expressa sobre o livre uso e compartilhamento dos mesmos, desde que os autores originais sejam citados. Novamente nesse caso, os 4Rs dos REA são perfeitamente aplicáveis.

ONDE DISPONIBILIZAR E COMPARTILHAR REA?

Os REA podem ser compartilhados de várias formas: em formatos digitais diversos (vídeo, áudio, texto, imagens etc.) na Internet, nas redes sociais, nos sites institucionais e nas comunidades de interesse comum.

Ao buscar um REA para ser editado e redistribuído, o professor pode muitas vezes se deparar com uma plataforma tecnológica que não apresente ferramentas que permitam ao usuário fazer o carregamento de conteúdos novos ou derivados. É possível que a instituição educacional à qual o professor esteja associado tenha seu próprio mecanismo de publicação de REA. Caso contrário, outras formas de compartilhamento de recursos na web precisam ser utilizadas. As mais comuns são os blogs institucionais ou pessoais, ou ainda wikis e redes sociais.

A seguir apresentarei duas iniciativas que funcionam como mecanismos de publicação de REA: a School of Open da P2PU (Peer to Peer University) e a plataforma Connexions.

249

P2PU – School of Open

A P2PU é formalmente uma organização sem fins lucrativos registrada na Califórnia. Seu trabalho é reconhecido como um projeto educacional aberto, que organiza a aprendizagem fora do contexto da educação formal. A P2PU é também uma comunidade de pessoas comprometidas com a inovação na educação e interessadas em utilizar um modelo educacional aberto, baseado em tecnologias, para ampliar o acesso ao conhecimento. Todos podem contribuir para a melhoria das tecnologias oferecidas pela P2PU e tornarem-se colaboradores. Os REA disponibilizados na plataforma da P2PU possui licença livre CC-BY-SA, que permite o uso, a adaptação e redistribuição de todo o seu conteúdo, desde que sob a mesma licença. Portanto, a P2PU permite a prática dos 4Rs dos REA.

Figura 6 – Home page da P2PU – https://p2pu.org/en/

Um dos projetos da P2PU é a School of Open, que é coordenada pela P2PU e o Creative Commons1714. O objetivo é facilitar o processo de compartilhamento de conteúdos educacionais sem o infringimento de direitos autorais. Essa plataforma é baseada em software livre e permite a criação e compartilhamento de cursos diretamente na plataforma, já licenciados com a mesma licença aplicada ao site da P2PU. O principal objetivo da School of Open é disseminar o que significa ‘abertura’ na educação a partir das novas tecnologias e licenças livres, além de operar por meio do ensino e aprendizagem por pares, com o apoio das pessoas envolvidas na comunidade de interesse, que atuam como voluntárias.

250

Por meio da School of Open, o professor pode criar seus cursos em vários idiomas, inclusive no português brasileiro. Para cada curso criado fica automaticamente disponível um mecanismo de fórum de discussão aberto.

Figura 7 – Exemplo de página de criação de curso da School of Open – P2PU

O processo de criação de cursos na School of Open é bastante simples: dá-se um título ao curso e insere-se o conteúdo como se fosse um documento do Word. O curso fica como rascunho e uma vez terminada a sua edição, o usuário seleciona ‘publicar’. O curso fica então automaticamente disponibilizado na plataforma e na Internet para ser acessado livremente a partir de qualquer localização. Uma vez que o curso está publicado, o autor pode solicitar a revisão ou sugestões quanto ao mesmo aos seus pares da comunidade School of Open da P2PU. Pode também receber e oferecer ‘badges’18, que atestariam o engajamento do usuário com o curso, com a comunidade ou atividades afins.

Connexions

Connexions19 é a plataforma da Rice University20, baseada em software livre, que permite a busca por REA e o compartilhamento de conteúdos educacionais. A plataforma pode ser utilizada

251

tanto por professores para publicar conteúdo quanto por estudantes para encontrar REA em assuntos de interesse. Os REA podem ser publicados em vários idiomas, inclusive em português. Os REA publicados na plataforma Connexions possuem uma licença Creative Commons CC-BY, que permite a prática dos 4Rs dos REA.

Figura 8 – Home page da plataforma Connexions – http://cnx.org

Basta que o usuário se cadastre gratuitamente na plataforma para contribuir com conteúdo, cuja publicação será ou não autorizada pela equipe do Connexions, para verificar a intencionalidade da mesma. Esse conteúdo pode ser disponibilizado em módulos, e não precisa ser cursos completos. Uma vez publicados, os REA podem ser visualizados no site e descarregados (download) em vários formatos, incluído o PDF e o EPUB. Além disso, é possível a criação de livros didáticos e apostilas, cujas cópias impressas podem ser solicitadas no site por um custo baixo21. Apesar de a plataforma Connexions estar em língua inglesa, seu uso é bastante intuitivo, e a disponibilização dos REA é feita pela Internet, sendo o acesso livre aos mesmos a partir de qualquer localização.

CONCLUSÃO

Os REA estão cada vez mais ocupando espaço no cenário educacional brasileiro e mundial. Devido ao conceito de abertura do conhecimento inerente aos REA, eles se tornam elementos fundamentais nas práticas educativas que visam ampliar o acesso ao conhecimento. Para que o

252

movimento REA continue ganhando força, as práticas de reuso e compartilhamento de conteúdos educacionais livres precisam ser disseminadas. Nesse cenário, é fundamental a compreensão dos 4Rs dos REA e do papel inovador das tecnologias educacionais, que permitem a redistribuição dos REA de forma a respeitar os direitos autorais ao mesmo tempo em que impulsionam o acesso a esses recursos educacionais a partir de qualquer localização geográfica. Isso possibilita a troca de práticas pedagógicas e de conhecimentos produzidos por instituições e indivíduos diversos, com o objetivo comum de impulsionar o acesso ao conhecimento.

RESUMINDO E DESTACANDO

Os principais itens abordados neste capítulo referem-se aos 4Rs dos REA22, que são reusar, revisar, remixar e redistribuir. A aplicação de uma licença livre ou a permissão expressa de uso dada pelo autor permite com que um recurso educacional, em qualquer formato ou mídia, seja classificado como um REA.

Um REA que tenha um grau total de abertura pode ser reutilizado, adaptado, traduzido, remixado e redistribuído livremente. O compartilhamento de REA contribui para que haja o livre acesso a materiais educacionais pela web, com isso ampliando o acesso ao conhecimento.

Uma plataforma para se encontrar REA desenvolvida especificamente para a educação básica é a Educopédia, um projeto da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro. Ela disponibiliza REA organizados por currículo e série, para o uso de professores e estudantes. Disponibiliza também materiais de apoio pedagógico para professores, entre outros tipos de recursos pedagógicos.

O professor, ao praticar os 4Rs dos REA, precisará encontrar meios de publicar o conteúdo por ele desenvolvido ou adaptado. Para tanto, além de sites institucionais, blogs, wikis e redes sociais, há plataformas específicas de compartilhamento de REA, como a School of Open e a Connexions, que apesar de serem desenvolvidas em língua inglesa, aceitam REA em português.

Finalmente, há um número crescente de literatura sobre REA no Brasil em português e inglês. Algumas dessas leituras estão descritas abaixo no item conferindo as ideias.

REFERÊNCIAS

BISSELL, A. Permission granted: Open licensing for educational resources. Open Learning, The Journal of Open and Distance Learning, 2009, v. 24, p.97-106

253

HILTON, J. e WILEY, D. The creation and use of Open Educational Resources in Christian higher education, 2010, Christian Higher Education, v. 9, n. 1, p. 49-59

ROSSINI, C. e GONZALEZ, C. REA: o debate em política pública e as oportunidades para o mercado, 2012, In: SANTANA, B., ROSSINI, C. e PRETTO, N.L. (Org.). Recursos Educacionais Abertos: práticas colaborativas e políticas públicas. São Paulo e Salvador: Casa da Cultura Digital e EDUFBA, 2012, 243 p. Disponível em: <http://livrorea.net.br>. Acesso em 4 de março de 2013.

SANTOS, A.I. Open Educational Resources in Brazil: State-of-the-Art, Challenges and Prospects for Development and Innovation, 2011, Moscou: UNESCO, 76p. Disponível em <http://iite.unesco.org/publications/3214695/>. Acesso em 3 de março de 2013.

SANTOS, A.I. Educação Aberta: histórico, práticas e o contexto dos recursos educacionais abertos, 2012, In: SANTANA, B., ROSSINI, C. e PRETTO, N.L. (Org.). Recursos Educacionais Abertos: práticas colaborativas e políticas públicas. São Paulo e Salvador: Casa da Cultura Digital e EDUFBA, 2012, 243 p. Disponível em: <http://livrorea.net.br>. Acesso em 4 de março de 2013.

DEFINIÇÕES E NOTAS EXPLICATIVAS

1 Recursos Educacionais Abertos – São recursos de ensino, aprendizagem ou pesquisa que estejam em domínio público, ou que tenham sido disponibilizados por meio de uma licença de propriedade intelectual que permita o seu uso e adaptação por terceiros (Definição baseada no conceito de REA adotado pela UNESCO, Commonwealth of Learning e Hewlett Foundation.).

2 Licença livre – É uma licença utilizada para conceder certos direitos de uso para uma produção intelectual, seja ela em qualquer formato ou mídia (texto, áudio, imagem etc). Significa que a obra está aberta para utilização pela sociedade, mas que o autor original da mesma deve sempre ser citado. As licenças mais comuns são a Creative Commons e a GPL (http://www.gnu.org/licenses/gpl.html) para software.

3 Permissão Expressa de uso – É uma permissão para utilização e adaptação do recurso educacional por terceiros, dada de forma clara e objetiva no próprio recurso ou site. Por meio dessa permissão o autor compartilha os direitos de utilização (sem abrir mão da autoria do recurso), compartilhamento e adaptação, como o remix, a produção de traduções ou outras obras derivadas. É o caso de alguns conteúdos disponibilizados no Portal do Professor, para os quais a licença de uso é concedida pelo MEC.

4 Conceito inicialmente desenvolvido por David Wiley no blog post encontrado nesse link http://opencontent.org/blog/archives/355 (acesso em 25/02/2013). Posteriormente Wiley substituiu ‘rework’ (retrabalhar) por ‘revise’ (revisar).

5 Os recursos educacionais da Educopédia (http://www.educopedia.com.br/) possuem licença CC-BY, o que significa que podem também ser modificados e redistribuídos. Porém, essas liberdades não podem ser feitas diretamente na plataforma e a publicação livre e imediata de quaisquer recursos da Educopédia que tenham sido modificados pelo professor deve ser feita por meio de outros canais.

6 Um REA pode ser modificado por professores ou quaisquer usuários do mesmo.

7 O REA revisado pode ser encontrado no site <http://www.ckirner.com/eventos/rea-oa>.

254

8 Plano de Lei n.º 8.035/2010.

9 Publicado em 2011 pela Câmara dos Deputados, submetido à análise pública e emendas antes de ser reescrito e encaminhado ao Senado Federal em 2012 para dar continuidade à votação do Plano de Lei.

10 TIC Educação 2011, p. 100 <http://www.cetic.br/educacao/2011/>.

11 Web 1.0 – Simplisticamente, entende-se por web 1.0 um termo inicial na evolução da World Wide Web, que diz respeito a sites que apresentam informação (conteúdo) ao usuário mas não permitem que os usuários contribuam com esse conteúdo <http://en.wikipedia.org/wiki/Web_1.0>.

12 Web 2.0 – O termo Web 2.0 é utilizado para descrever a segunda geração da World Wide Web – tendência que reforça o conceito de troca de informações e colaboração dos internautas com sites e serviços virtuais. A ideia é que o ambiente online se torne mais dinâmico e que os usuários colaborem para a organização de conteúdo (Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u20173.shtml).

13 Vídeo introdutório ‘O que é Transformação 3.0?’ <http://bit.ly/15iVSgd>. Acesso em 27 de fevereiro de 2013.

14 Essa licença Creative Commons permite o reuso, adaptação e redistribuição do REA desde que não seja para fins comerciais e que a mesma licença de compartilhamento seja mantida no recurso derivado. Para mais informações sobre as licenças Creative Commons consulte: http://creativecommons.org.br/ Acesso em 27 de fevereiro de 2013.

15 Existem outras iniciativas de REA que atendem à educação básica. Mais iniciativas podem ser encontradas na obra “Open Educational Resources in Brazil: State-of-the-Art, Challenges and Prospects for Development and Innovation”, uma publicação da UNESCO, lançada em dezembro de 2011. Link para acesso: http://iite.unesco.org/publications/3214695/ Último acesso em 27 de fevereiro de 2013.

16 Entrevista de Mary Lane Hutner a Paulo Darcie disponível em <http://livrorea.net.br>.

17 Disponível em: <http://creativecommons.org/>

18 Badges são ‘etiquetas’, ‘crachás’ ou ‘emblemas’. Nesse contexto significa um reconhecimento oferecido por uma instituição ou indivíduo.

19 Disponível em: <http://cnx.org>.

20 Disponível em: <http://www.rice.edu/>.

21 Deve-se levar em conta o local da entrega dos REA impressos, que pode significar um aumento de custo.

22 A aula 23 do projeto transformação trata dos 4Rs dos REA. Disponível no YouTube: <http://bit.ly/143WtEh>. Acesso em 18 de março de 2013.