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Informativo 952-STF (25/09/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 952-STF Márcio André Lopes Cavalcante Julgamentos que ainda não foram concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: RE 1100353 AgR-ED/SC; ARE 1165456 AgR/SE. ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO NEPOTISMO O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política, como são os cargos de Secretário Estadual e Municipal. CONCURSO PÚBLICO Não se anula prova prática de taquígrafo pelo simples fato de o edital prever que o ditado seria feito com velocidade crescente e, no dia do teste, o ditado ter sido feito de forma decrescente. DIREITO PENAL LEI DE LICITAÇÕES Não compete ao assessor jurídico averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça. ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES (LEI 9.472/97) É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de transmitir sinal de internet como provedor sem autorização da ANATEL (art. 183 da Lei nº 9.472/97)? DIREITO ADMINISTRATIVO NEPOTISMO O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política, como são os cargos de Secretário Estadual e Municipal Importante!!! O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política, como são os cargos de Secretário Estadual e Municipal. Mesmo em caso de cargos políticos, será possível considerar a nomeação indevida nas hipóteses de: • nepotismo cruzado; • fraude à lei e • inequívoca falta de razoabilidade da indicação, por manifesta ausência de qualificação técnica ou por inidoneidade moral do nomeado. STF. 1ª Turma. Rcl 29033 AgR/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/9/2019 (Info 952).

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Informativo 952-STF (25/09/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

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Márcio André Lopes Cavalcante Julgamentos que ainda não foram concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: RE 1100353 AgR-ED/SC; ARE 1165456 AgR/SE.

ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO

NEPOTISMO O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política, como são os cargos de Secretário

Estadual e Municipal.

CONCURSO PÚBLICO Não se anula prova prática de taquígrafo pelo simples fato de o edital prever que o ditado seria feito com velocidade

crescente e, no dia do teste, o ditado ter sido feito de forma decrescente.

DIREITO PENAL

LEI DE LICITAÇÕES Não compete ao assessor jurídico averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos

autos, decreto que a reconheça.

ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES (LEI 9.472/97) É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de transmitir sinal de internet como provedor sem

autorização da ANATEL (art. 183 da Lei nº 9.472/97)?

DIREITO ADMINISTRATIVO

NEPOTISMO O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política,

como são os cargos de Secretário Estadual e Municipal

Importante!!!

O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política, como são os cargos de Secretário Estadual e Municipal.

Mesmo em caso de cargos políticos, será possível considerar a nomeação indevida nas hipóteses de:

• nepotismo cruzado;

• fraude à lei e

• inequívoca falta de razoabilidade da indicação, por manifesta ausência de qualificação técnica ou por inidoneidade moral do nomeado.

STF. 1ª Turma. Rcl 29033 AgR/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/9/2019 (Info 952).

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Nepotismo O STF possui uma súmula vinculante proibindo a prática de nepotismo. Relembre:

SV 13-STF: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Etimologia A palavra nepotismo “vem da raiz indo-europeia nepot, que significa neto e, também, sobrinho, uma ambiguidade que se transmitiu ao latim, língua na qual nepos, nepotis também denotava tanto neto como sobrinho. (...) A palavra nepotismo surgiu nos primeiros séculos do cristianismo, quando os papas, que não tinham filhos ou não admitiam tê-los, concediam os melhores empregos e os favores de Estado a seus sobrinhos, que com frequência eram, na realidade, seus filhos ilegítimos.” (https://patrialais.blogspot.com/2010/11/ etimologia-das-palavras-nepotismo.html) Significado atual Nepotismo significa “proteção”, “apadrinhamento”, que é dado pelo superior para um cônjuge, companheiro ou parente seu, contratado para o cargo ou designado para a função em virtude desse vínculo. Isso ofende a moralidade. Não precisa de lei formal O nepotismo é vedado em qualquer dos Poderes da República por força dos princípios constitucionais da impessoalidade, eficiência, igualdade e moralidade, independentemente de previsão expressa em diploma legislativo. Assim, o nepotismo não exige a edição de uma lei formal proibindo a sua prática, uma vez que tal vedação decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da CF/88 (STF Rcl 6.702/PR-MC-Ag).

Veja como o tema já foi cobrado em prova: (Cespe – Delegado de Polícia – PE/2016) Segundo o STF, a vedação ao nepotismo decorre diretamente de princípios constitucionais explícitos, como os princípios da impessoalidade, da moralidade administrativa e da igualdade, não se exigindo a edição de lei formal para coibir a sua prática. (CERTO) Elementos objetivos O Min. Dias Toffoli definiu quatro critérios objetivos nos quais haverá nepotismo. Veja: a) ajuste mediante designações recíprocas, quando inexistente a relação de parentesco entre a autoridade nomeante e o ocupante do cargo de provimento em comissão ou função comissionada; b) relação de parentesco entre a pessoa nomeada e a autoridade nomeante; c) relação de parentesco entre a pessoa nomeada e o ocupante de cargo de direção, chefia ou assessoramento a quem estiver subordinada e d) relação de parentesco entre a pessoa nomeada e a autoridade que exerce ascendência hierárquica ou funcional sobre a autoridade nomeante. STF. 2ª Turma. Rcl 18564, Relator p/ Acórdão Min. Dias Toffoli, julgado em 23/02/2016.

A questão dos CARGOS POLÍTICOS. Imagine a seguinte situação adaptada: João, Prefeito do Município de Mesquita (RJ), nomeou Marcos para o cargo de Secretário Municipal Executivo do Gabinete do Prefeito.

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Ocorre que Marcos é filho do Vice-Prefeito do Município. Diante disso, o Ministério Público ajuizou ação contra a nomeação alegando que ela afronta a SV 13. A questão chegou até o STF? Esta nomeação, por si só, afronta a SV 13? NÃO.

O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política, como são os cargos de Secretário Estadual e Municipal. Mesmo em caso de cargos políticos, será possível considerar a nomeação indevida nas hipóteses de: • nepotismo cruzado; • fraude à lei e • inequívoca falta de razoabilidade da indicação, por manifesta ausência de qualificação técnica ou inidoneidade moral do nomeado. STF. 1ª Turma. Rcl 29033 AgR/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/9/2019 (Info 952).

Veja outros julgados sobre o tema:

A nomeação do cônjuge de prefeito para o cargo de Secretário Municipal, por se tratar de cargo público de natureza política, por si só, não caracteriza ato de improbidade administrativa. STF. 2ª Turma. Rcl 22339 AgR/SP, Rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgado em 4/9/2018 (Info 914).

Em regra, a proibição da SV 13 não se aplica para cargos públicos de natureza política, como, por exemplo, Secretário Municipal. Assim, a jurisprudência do STF, em regra, tem excepcionado a regra sumulada e garantido a permanência de parentes de autoridades públicas em cargos políticos, sob o fundamento de que tal prática não configura nepotismo. Exceção: poderá ficar caracterizado o nepotismo mesmo em se tratando de cargo político caso fique demonstrada a inequívoca falta de razoabilidade na nomeação por manifesta ausência de qualificação técnica ou inidoneidade moral do nomeado. STF. 1ª Turma. Rcl 28024 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 29/05/2018.

CONCURSO PÚBLICO Não se anula prova prática de taquígrafo pelo simples fato de o edital prever que o ditado seria feito com velocidade crescente e, no dia do teste, o ditado ter sido feito de forma decrescente

Em concurso para taquígrafo, não se anula prova prática de registro taquigráfico pelo simples fato de o edital prever que o ditado seria feito com velocidade variável e crescente e, no dia do teste, o ditado ter sido realizado de forma decrescente.

Não se evidencia que isso, em princípio, gere quebra de isonomia entre os candidatos, além de não haver prejuízo, aplicando-se o princípio pas de nullité sans grief.

STF. 2ª Turma. RMS 36305/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 17/9/2019 (Info 952).

Imagine a seguinte situação hipotética: O TST realizou concurso público para o cargo de Analista Judiciário, especialidade taquigrafia, ou seja, o certame era para a função de taquígrafo.

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Taquigrafia Taquigrafia é um método ou técnica por meio do qual o profissional consegue escrever de forma abreviada ou simbólica e, com isso, anotar mais rapidamente aquilo que está sendo narrado ou discutido. O taquígrafo é comum nos Tribunais e também nas Casas Legislativas, locais onde esse profissional anota os debates ou discussões que estão sendo travados. As anotações do taquígrafo transformam-se naquilo que conhecemos como notas taquigráficas. O registro por meio de taquigrafia é previsto no CPC/2015:

Art. 210. É lícito o uso da taquigrafia, da estenotipia ou de outro método idôneo em qualquer juízo ou tribunal.

Art. 460. O depoimento poderá ser documentado por meio de gravação. § 1º Quando digitado ou registrado por taquigrafia, estenotipia ou outro método idôneo de documentação, o depoimento será assinado pelo juiz, pelo depoente e pelos procuradores. (...)

Art. 944. Não publicado o acórdão no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data da sessão de julgamento, as notas taquigráficas o substituirão, para todos os fins legais, independentemente de revisão.

Voltando ao caso hipotético: O certame previa a realização de uma prova prática, na qual haveria um ditado e os candidatos deveriam fazer as anotações utilizando-se das técnicas taquigráficas. João foi reprovado na prova prática. Ele, contudo, não se conformou e impetrou mandado de segurança alegando que houve descumprimento do item 13.4.1 do edital. Isso porque a regra editalícia previa que a prova prática seria realizada por meio de registro taquigráfico de texto a ser ditado em velocidade variável e crescente de 80 a 90 ppm (palavras por minuto). Ocorre que, na prova, o ditado foi feito em velocidade constante e decrescente de 90 a 80 ppm, ou seja, da velocidade maior para a menor. O impetrante alegou que o descumprimento da regra gerou prejuízo a ele, ocasionando a sua reprovação. O autor pediu, portanto, a decretação da nulidade da prova prática. Primeira pergunta: essa pretensão por ser analisada pelo Poder Judiciário? SIM, com toda certeza. Analisar se há compatibilidade entre as previsões editalícias e as questões do certame é uma matéria sindicável pelo Poder Judiciário, ou seja, que pode ser investigada (examinada) pelos magistrados sem que isso signifique substituir a banca examinadora. Segunda pergunta: o pedido do autor foi acolhido? A prova prática foi anulada? NÃO. O STF apontou dois argumentos principais para negar o pedido: 1) não há prova pré-constituída e objetivamente demonstrada no mandado de segurança que evidencie a ocorrência da quebra de isonomia entre os candidatos pela inversão da velocidade; 2) não ficou demonstrado o prejuízo causado aos candidatos impetrantes pela desconformidade da aplicação da prova prática com o edital, condição sine qua non para que seja decretada a nulidade do ato. À luz do princípio pas de nullité sans grief, a declaração de nulidade do ato requer demonstração do prejuízo experimentado pela parte que alega a ocorrência de vício. Alexandre Santos de Aragão explica que a nulidade no âmbito administrativo não deve ser declarada se não houver prejuízo para as partes: “Por derradeiro, cabe uma alusão a figura dos ‘atos administrativos meramente irregulares’. Em não havendo prejuízos a particulares ou a interesses curados pela Administração Pública, não é porque uma

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regra foi descumprida que se há de falar em nulidade. Como dispõe o velho brocardo, não há nulidade se não houver prejuízo (pas de nullite sans grief).” (ARAGÃO, Alexandre Santos de. Curso de Direito Administrativo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 176) Esse postulado pode ser extraído do art. 55 da Lei nº 9.784/99, que regula os processos administrativos no âmbito da Administração Pública Federal:

Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração.

Em suma:

Em concurso para taquígrafo, não se anula prova prática de registro taquigráfico pelo simples fato de o edital prever que o ditado seria feito com velocidade variável e crescente e, no dia do teste, o ditado ter sido realizado de forma decrescente. Não se evidencia que isso, em princípio, gere quebra de isonomia entre os candidatos, além de não haver prejuízo, aplicando-se o princípio pas de nullité sans grief. STF. 2ª Turma. RMS 36305/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 17/9/2019 (Info 952).

DIREITO PENAL

ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES (LEI 9.472/97) É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de transmitir sinal de internet

como provedor sem autorização da ANATEL (art. 183 da Lei nº 9.472/97)?

É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de transmitir sinal de internet como provedor sem autorização da ANATEL (art. 183 da Lei nº 9.472/97)?

No STJ: é pacífico que NÃO (Súmula 606-STJ: Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no art. 183 da Lei n. 9.472/1997).

No STF: prevalece que não. Assim, é inaplicável o princípio da insignificância no crime de transmissão clandestina de sinal de internet, por configurar o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, que é crime formal, e, como tal, prescinde de comprovação de prejuízo para sua consumação (STF. 1ª Turma. HC 124795 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 23/08/2019).

Apesar disso, no HC 157014 AgR/SE, julgado pela 2ª Turma do STF em 17/9/2019 (Info 952), houve um empate na votação: dois Ministros entenderam que se deveria reconhecer o princípio e dois outros negaram o HC.

Quando há um empate no julgamento de um habeas corpus, prevalece a decisão mais favorável ao paciente, conforme determina o art. 146, parágrafo único, do Regimento Interno do STF.

Logo, neste caso concreto, o réu foi absolvido por se tratar de delito de bagatela, em razão do mínimo potencial ofensivo da conduta.

STF. 2ª Turma. HC 157014 AgR/SE, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o ac. Min Ricardo Lewandowski, julgado em 17/9/2019 (Info 952)

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Imagine a seguinte situação hipotética: Os fiscais da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) constataram que João mantinha um provedor de internet, via rádio, no qual 22 clientes pagavam a ele mensalmente e recebiam em suas casas o sinal da internet. Ocorre que João não tinha autorização da ANATEL para exploração desse serviço. Foi, então, lavrado auto de infração e encaminhada notícia do fato ao MPF. O Procurador da República denunciou João pela prática do delito do art. 183 da Lei nº 9.472/97:

Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação: Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Segundo a tese do MPF, o provedor de acesso à Internet via radiofrequência (internet via rádio) desenvolve dois serviços: • um serviço de telecomunicações (Serviço de Comunicação Multimídia); e • um Serviço de Valor Adicionado (Serviço de Conexão à Internet). Dessa forma, a chamada “internet via rádio” pode ser considerada também um serviço de telecomunicação. A jurisprudência acolhe a tese do MP? A conduta de transmitir sinal de internet, via rádio, como se fosse um provedor de internet, sem autorização da ANATEL, configura algum crime? Amolda-se ao art. 183 da Lei nº 9.472/97?

No STJ: é pacífico que SIM. A transmissão clandestina de sinal de internet, via radiofrequência, sem autorização da ANATEL, caracteriza, em tese, o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97. Não há se falar em atipicidade do delito pela previsão de que se trata de serviço de valor adicionado, uma vez que referida característica não exclui sua natureza de efetivo serviço de telecomunicação. STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1077499/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 26/09/2017. STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 971.115/PA, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 27/04/2017. No STF: o tema ainda é polêmico. Há decisões afirmando que sim e outras em sentido negativo. Por enquanto, prevalece que pode sim configurar o crime:

O desenvolvimento clandestino de atividade de transmissão de sinal de internet, via rádio, comunicação multimídia, sem a autorização do órgão regulador, caracteriza, por si só, o tipo descrito no artigo 183 da Lei nº 9.472/97, pois se trata de crime formal, inexigindo, destarte, a necessidade de comprovação de efetivo prejuízo. STF. 1ª Turma. HC 152118 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 07/05/2018.

Em sua defesa, João invocou o princípio da insignificância, considerando que tinha poucos “clientes” (usuários). Tal alegação é aceita pela jurisprudência?

No STJ: é pacífico que NÃO.

Súmula 606-STJ: Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no art. 183 da Lei n. 9.472/1997.

No STF: o tema ainda é polêmico. Há decisões afirmando que sim e outras em sentido negativo. Veja exemplo de decisão recente negando o princípio:

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(...) 1. Inaplicável o princípio da insignificância no crime de transmissão clandestina de sinal de internet, por configurar o delito previsto no art. 183 da Lei 9.472/1997, que é crime formal, e como tal, prescinde de comprovação de prejuízo para sua consumação (HC 142.738-AgR/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 21.6.2018). 2. Orientação reafirmada por este Supremo Tribunal Federal no sentido de que ‘O desenvolvimento clandestino de atividade de transmissão de sinal de internet, via rádio, comunicação multimídia, sem a autorização do órgão regulador, caracteriza, por si só, o tipo descrito no artigo 183 da Lei n.º 9.472/97, pois se trata de crime formal, inexigindo, destarte, a necessidade de comprovação de efetivo prejuízo’ (HC 152.118-AgR/GO, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 17.5.2018). (...) STF. 1ª Turma. HC 124795 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 23/08/2019.

(...) 3. Atividade de transmissão de sinal de internet sem autorização do órgão regulador. 4. Fato típico, crime formal, tipo descrito no artigo 183 da Lei 9.472/1997, para o qual não se exige a comprovação de efetivo prejuízo. 5. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. 6. Revolvimento do conjunto fático-probatório. Precedentes. 7. Agravo regimental desprovido. STF. 2ª Turma. HC 142738 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 04/04/2018.

Desse modo, conforme se percebe pelos julgados acima, a jurisprudência majoritária é no sentido de ser inaplicável o princípio da insignificância. Apesar disso, no HC 157014 AgR/SE, julgado pela 2ª Turma do STF em 17/9/2019 (Info 952), houve um empate na votação: dois Ministros entenderam que se deveria reconhecer o princípio e dois outros negaram o HC. Quando há um empate no julgamento de um habeas corpus, prevalece a decisão mais favorável ao paciente, conforme determina o art. 146, parágrafo único, do Regimento Interno do STF. Logo, neste caso concreto, o réu foi absolvido por se tratar de delito de bagatela, em razão do mínimo potencial ofensivo da conduta. Em suma:

É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de transmitir sinal de internet como provedor sem autorização da ANATEL (art. 183 da Lei nº 9.472/97)? No STJ: é pacífico que NÃO (Súmula 606-STJ: Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no art. 183 da Lei n. 9.472/1997). No STF: prevalece que não. Assim, é inaplicável o princípio da insignificância no crime de transmissão clandestina de sinal de internet, por configurar o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, que é crime formal, e, como tal, prescinde de comprovação de prejuízo para sua consumação (STF. 1ª Turma. HC 124795 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 23/08/2019). Apesar disso, no HC 157014 AgR/SE, julgado pela 2ª Turma do STF em 17/9/2019 (Info 952), houve um empate na votação: dois Ministros entenderam que se deveria reconhecer o princípio e dois outros negaram o HC. Quando há um empate no julgamento de um habeas corpus, prevalece a decisão mais favorável ao paciente, conforme determina o art. 146, parágrafo único, do Regimento Interno do STF. Logo, neste caso concreto, o réu foi absolvido por se tratar de delito de bagatela, em razão do mínimo potencial ofensivo da conduta. STF. 2ª Turma. HC 157014 AgR/SE, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o ac. Min Ricardo Lewandowski, julgado em 17/9/2019 (Info 952)

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LEI DE LICITAÇÕES Não compete ao assessor jurídico averiguar se está presente a causa de emergencialidade,

mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça

Importante!!!

Não se pode exigir do assessor jurídico conhecimento técnico de todas as áreas e não apenas do Direito. No processo licitatório, não compete à assessoria jurídica averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça. Sua função é zelar pela lisura sob o aspecto formal do processo, de maneira a atuar como verdadeiro fiscal de formalidades, somente.

Assim, a assinatura do assessor jurídico na minuta do contrato serve de atestado do cumprimento de requisitos formais, e não materiais.

STF. 2ª Turma. HC 171576/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 17/9/2019 (Info 952).

Imagine a seguinte situação hipotética: Houve uma sequência de chuvas muito fortes que causaram uma série de estragos na cidade, dentre eles a destruição parcial de uma ponte, o que levou o Prefeito a decretar situação de emergência. O Município instaurou um processo administrativo para contratação direta, com dispensa de licitação, de uma empresa para reformar a ponte. João, assessor jurídico do Município, emitiu parecer atestando a regularidade jurídica da dispensa da licitação e aprovando a minuta do contrato, conforme exige o art. 38, parágrafo único da Lei nº 8.666/93:

Art. 38 (...) Parágrafo único. As minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes devem ser previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração.

Durante a execução do contrato, surgiram denúncias no sentido de que a empresa contratada não teria capacidade técnica, que não haveria situação emergencial e que haveria um conluio dos dirigentes da empresa com os administradores públicos. Várias pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público, dentre elas, João. O assessor jurídico foi denunciado como incurso no crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93:

Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

Na denúncia, o Ministério Público alegou que a empresa contratada não atuava na área de construção civil e não detinha qualquer experiência na realização de obras de engenharia. Com relação à conduta imputada ao ex-assessor jurídico, o MP afirmou que ele deveria ter fiscalizado a regularidade da dispensa de licitação e também do contrato, mas, ao contrário disso, avalizou a escolha e o contrato. Por isso, teria atuado com dolo, ao entender como emergencial um contrato pactuado quase cinco meses após o desastre. O advogado defendeu-se argumentando que seu parecer jurídico foi meramente opinativo, sem caráter vinculante e que o Secretário Municipal de Obras emitiu parecer atestando a qualificação técnica da

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empresa escolhida e a urgência da contratação. Argumentou que não cabia ao setor jurídico analisar se as informações atestadas pelo Secretário eram ou não verídicas. A questão chegou até o STF. Houve crime por parte do assessor jurídico? NÃO. Requisitos formais

Não se pode exigir do assessor jurídico conhecimento técnico de todas as áreas e não apenas do Direito. No processo licitatório, não compete à assessoria jurídica averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça. Sua função é zelar pela lisura sob o aspecto formal do processo, de maneira a atuar como verdadeiro fiscal de formalidades, somente. Assim, a assinatura do assessor jurídico na minuta do contrato serve de atestado do cumprimento de requisitos formais, e não materiais. STF. 2ª Turma. HC 171576/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 17/9/2019 (Info 952).

Não há indícios de vantagem recebida Além disso, a denúncia não menciona suposta vantagem que o paciente teria obtido no exercício de suas funções, tampouco se o parecer teria sido emitido com a intenção de causar danos ao erário. Em tese, é possível a responsabilização criminal do parecerista, mas não pelo simples fato de ter emitido um parecer, sendo necessário que fique demonstrada a sua participação ativa no esquema criminoso, de modo a, inclusive, dele se beneficiar. Parecer meramente opinativo Vale ressaltar, ainda, que o parecer jurídico é meramente opinativo e, segundo a jurisprudência do STF, o parecer puramente consultivo não gera responsabilização do parecerista: STF. Plenário. MS 24.631, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 1º.2.2008). Ausência de elemento subjetivo Ademais, é vedada a responsabilização penal objetiva, sem comprovação de dolo ou culpa. Para que se configure o crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93, é necessária a comprovação da finalidade específica de favorecimento indevido:

Para a caracterização da conduta tipificada no art. 89 da Lei 8.666/1993, é indispensável a demonstração, já na fase de recebimento da denúncia, do elemento subjetivo consistente na intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem indevida. STF. 2ª Turma. Inq 3965, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 22/11/2016.

Atuação do advogado é resguardada pela ordem constitucional A atuação de advogado é resguardada pela ordem constitucional. Conforme disposto no art. 133 da CF/88, “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Assim, eventual responsabilização penal apenas se justifica em caso de indicação de circunstâncias concretas que o vinculem, subjetivamente, ao propósito delitivo.

Informativo comentado

Informativo 952-STF (25/09/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) O STF tem afastado a aplicação da SV 13 a cargos públicos de natureza política, como são os cargos de

Secretário Estadual e Municipal. ( ) C 2) Em concurso para taquígrafo, deve ser anulada a prova prática de registro taquigráfico caso o edital

preveja que o ditado seria feito com velocidade variável e crescente e no dia do teste o ditado foi realizado de forma decrescente. ( ) E

3) No processo licitatório, não compete à assessoria jurídica averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça. ( ) C

Gabarito

1. C 2. E 3. C

OUTRAS INFORMAÇÕES

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos Julgamentos por meio

eletrônico*

Em curso Finalizados

Pleno - - - - 111

1ª Turma 17.09.2019 - 12 276 95

2ª Turma 17.09.2019 - 0 8 192

* Emenda Regimental 52/2019-STF. Sessão virtual de 13 a 19 de setembro de 2019.

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS 16 A 20 DE SETEMBRO DE 2019

Lei nº 13.872, de 17.9.2019 - Estabelece o direito de as mães amamentarem seus filhos durante a realização de concursos

públicos na administração pública direta e indireta dos Poderes da União. Publicado no DOU em 18.09.2019, Seção 1,

Edição 181, p. 2.

Lei nº 13.871, de 17.9.2019 - Altera a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para dispor sobre a

responsabilidade do agressor pelo ressarcimento dos custos relacionados aos serviços de saúde prestados pelo Sistema

Único de Saúde (SUS) às vítimas de violência doméstica e familiar e aos dispositivos de segurança por elas utilizados.

Publicado no DOU em 18.09.2019, Seção 1, Edição 181, p. 2. Lei nº 13.870, de 17.9.2019 - Altera a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para determinar que, em área rural, para

fins de posse de arma de fogo, considera-se residência ou domicílio toda a extensão do respectivo imóvel. Publicado no

DOU em 18.09.2019, Seção 1, Edição 181, p. 2 Lei nº 13.874, de 20.9.2019 - Institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica; estabelece garantias de livre

mercado; altera as Leis nºs 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), 6.404, de 15 de dezembro de 1976, 11.598,

de 3 de dezembro de 2007, 12.682, de 9 de julho de 2012, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 10.522, de 19 de julho de

2002, 8.934, de 18 de novembro 1994, o Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946 e a Consolidação das Leis do

Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943; revoga a Lei Delegada nº 4, de 26 de setembro de

1962, a Lei nº 11.887, de 24 de dezembro de 2008, e dispositivos do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966; e dá

outras providências. Mensagem de Veto. Publicado no DOU em 20.09.2019, Seção 1-Extra, Edição 183-B, p. 1.

Supremo Tribunal Federal – STF Secretaria de Documentação

Coordenadoria de Divulgação de Jurisprudência [email protected]