INFORMAÇÃO CLASSIFICADA...terminologia anglo-saxónica -, a primeira imagem que surgirá na mente...
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CEDIS Working Papers | Direito, Segurança e Democracia | ISSN 2184-0776 | Nº 31 | maio de 2016
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DIREITO, SEGURANÇA E
DEMOCRACIA
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INFORMAÇÃO CLASSIFICADA PAULO MANUEL MARQUES LUCAS CORREIA DE BRITO Mestrando em Direito e Segurança
RESUMO O trabalho apresentado teve como principal objectivo desenvolver um estudo amplo
relativamente à temática da Informação Classificada e a sua relação com a Segurança
Nacional.
Num contexto Geopolítico e Geoestratégico cada vez mais complexo, reflexo de um
mundo em acelerada e permanente mutação, é fundamental reflectir sobre as medidas
preventivas e as estratégias a adoptar pelos Estados no sentido de garantirem mais e
melhor segurança para os seus cidadãos. Nesse sentido houve um esforço para ao longo
da elaboração deste estudo alertar sobre os riscos potenciais e iminentes que o Estado
corre no actual contexto global e, despertar consciências para a importância fundamental
que os Serviços de Informações e a Informação Classificada têm na prevenção desses
riscos.
Só através de Serviços de Informações bem equipados, providos das condições e
meios necessários para a produção de Informações de qualidade e confiáveis, é possível
criar as bases para uma maior Segurança Nacional progressivamente mais eficiente e
capaz de prevenir e evitar ameaças, oferecendo aos cidadãos maiores níveis de confiança
nas Instituições do Estado.
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O Estado deve ser garantia de Segurança para os seus cidadãos; esse pacto de
confiança depende em larga medida do empenho das instituições em promover e investir
em maior Segurança. Assim, um dos pontos fulcrais que se visa alertar neste trabalho é
precisamente a necessidade imperativa de reformar os Serviços de Informações,
fornecendo-lhes todas as condições necessárias para que desenvolvam as suas
actividades com cada vez maior eficiência. Ignorar esta realidade é ignorar a realidade do
mundo contemporâneo, correndo o Estado grandes riscos, pois sem Informação não existe
Segurança possível.
PALAVRAS-CHAVE Informação Classificada, Serviços de Informações, Ameaças, Segurança Nacional, Estado.
ABSTRACT The paper presented had as its main goal to develop a wide study about the issue of
Classified Information and its relation with National Security.
In an increasingly complex Geopolitical and Geostrategic environment, reflection of
a world in accelerated and permanent mutation, it is crucial to reflect on the preventive
measures and the strategies to be adopted by States so they can guarantee more and better
security for their citizens. In that sense there was an effort throughout the process of drawing
up this study to warn of the potential and imminent risks involving the State on the current
global environment and, raise awareness to the prime importance of Intelligence Services
and Classified Information in preventing those risks.
Only through well-equipped Intelligence Services, provided with the necessary
conditions and means for the production of reliable quality Information, it is possible to create
the basis for a greater National Security progressively more efficient and capable of
preventing and avoiding threats, offering to the citizens greater levels of confidence in State
Institutions.
The State must be a security guarantee for its citizens; that confidence pact depends
to a large extent on the commitment of the Institutions in promoting and investing in greater
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Security. Thus, one of the key points this paper aims to alert is precisely the imperative need
of reforming the Intelligence Services, supplying them with all the necessary conditions so
they can develop their activities with increasingly efficiency. To ignore this reality is to ignore
the reality of contemporary world, with the State taking great risks, for without Information
there is no possible Security.
KEYWORDS Classified Information, Intelligence Services, Threats, National Security, State.
INTRODUÇÃO A Informação classificada configura uma matéria amplamente percepcionada como de vital
ou especial relevância para a segurança nacional dos Estados Soberanos.
A própria natureza da matéria em causa abrange um largo espectro de conceitos, temáticas, e
definições associadas. Não será pois descabido iniciar esta abordagem explicando, de forma
genérica, a natureza fundamental do conceito de informação classificada nas suas diferentes
expressões.
De um modo geral e sintético o termo informação liga-se intimamente com conhecimento.
Dir-se-á que quem acede a um maior número de informação detém maior conhecimento; no plano
da política de um Estado isso traduz-se na obtenção de vantagens relativamente a outros Estados,
vantagens essas que podem ser de natureza política, militar, económica ou, tecnológica. A
vantagem, ou vantagens – conforme o caso –, reside geralmente na manutenção da segurança do
Estado ou, a ser possível, no aumento dos níveis dessa segurança. Toda a importância da
segurança centra-se no facto de esta ser um meio fundamental para a produção de ordem social;
manutenção e/ou aumento dos níveis de bem-estar social – uma sociedade segura apresenta
maiores níveis de bem-estar -; permite defender e garantir a soberania e independência dos
estados; e igualmente prever eventuais ameaças com origem no interior ou no exterior do Estado.
A prevenção de ameaças contribui decisivamente para a segurança de um Estado e por isso
assume nesse âmbito um papel central; uma prevenção eficaz permite encetar todas as acções
necessárias para impedir ou combater de forma eficaz qualquer ameaça, tal só é possível através
de um bem montado e eficaz serviço de informações. Há ainda que considerar que outra parte
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fulcral do conceito de segurança assenta na defesa dos interesses fundamentais do Estado,
geralmente enunciados pela própria lei, tais como: a independência nacional, a unidade e
integridade e a segurança interna e externa do Estado, a defesa das instituições constitucionais, os
recursos afectos à defesa e à diplomacia, a população e o território nacional, os recursos
económicos e estratégicos, bem como o potencial científico nacional.
Por outro lado a segurança só poderá ser garantida de forma eficaz na medida em que a
informação que a apoia seja classificada.
A classificação remete para uma outra face da informação; aquela em que pelo seu grau de
relevância – maior ou menor –, ou mesmo de eventual perigosidade para a segurança do Estado e
defesa dos seus interesses fundamentais obriga a protecção contra divulgação não autorizada. Isto
equivale a dizer que apenas pessoas credenciadas e especialmente autorizadas podem aceder a
informações classificadas e, que em caso de violação desta norma resulta a aplicação das sanções
legalmente previstas.
Considerando estas breves notas introdutórias chega-se facilmente a uma primeira
conclusão: Sem Informação não existe Segurança; são conceitos indissociáveis. Sendo certo que
nem só da Informação se constrói a segurança, restam poucas dúvidas que esta constitui um dos
seus pilares fundamentais. E para que a articulação entre Informação e Segurança se efectue de
forma eficaz, a primeira nunca poderá ser de livre acesso ao público em geral, sob pena de
comprometer seriamente a posição do Estado na vertente interna, bem como no plano externo.
Assim terminarei esta introdução apresentando a definição genérica do conceito de Informação
Classificada e, do mesmo conceito adequado à realidade nacional pois é esse o caso que motiva o
desenvolvimento deste estudo.
Assim por Informação entenda-se:
“É todo o conhecimento que possa ser comunicado, independentemente do meio que se utilize, ao
qual tenha sido atribuído um grau de classificação de segurança e que, assim requer protecção
contra divulgação não autorizada”.
Já Informação Classificada Nacional:
“É toda a Informação, independentemente do formato material ou modo de transmissão, cuja
divulgação poderá acarretar consequências geralmente adversas para o Interesse Nacional ou, o
de quaisquer países aliados ou organizações internacionais que Portugal integre.”1
1 Definições segundo a apresentação “Segurança da Informação Classificada”; CMG Eduardo Manuel Pires Coelho
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CAPÍTULO I: Análise da Informação Classificada: Produção de
Informações A informação como foi referido no capítulo introdutório deste trabalho consiste em todo o
conhecimento que possa representar vantagens para os interesses fundamentais do Estado, ora
esse conhecimento pode ser comunicado/transmitido e/ou armazenado, ou seja há toda uma
infinidade de meios para a transmissão da informação. É sobre esse ponto, dos meios de
transmissão que me irei debruçar neste primeiro capítulo. Entendo que a compreensão dos meios
de transmissão é um ponto de partida fundamental para o entendimento da Informação Classificada
no seu sentido global. Comecemos pois por analisar mais detalhadamente este ponto.
Se imaginarmos a estrutura de um Estado e, sabendo previamente que as informações são
geralmente obtidas pelos Serviços de Informações – “Intelligence Services”, recorrendo à
terminologia anglo-saxónica -, a primeira imagem que surgirá na mente do cidadão comum será a
do clássico espião que trabalha infiltrado nas estruturas de segurança de um Estado estrangeiro
procurando obter informações sensíveis, que tornem a posição desse Estado vulnerável num ou
mais pontos e que, dessa forma isso se traduza nalgum tipo de vantagem para o Estado que serve,
sobre o outro Estado. Este cenário embora não totalmente falso, transmite uma visão redutora da
realidade compreendida pela produção de informações e, também não descreve de forma correcta
e rigorosa a produção de informações no caso de Portugal.
Em Portugal os serviços especializados na produção de informações são o Serviço de Informações
da República Portuguesa (SIRP), que por sua vez conduz e coordena, através dos respectivos
directores, as actividades do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), e do Serviço
de Informações de Segurança (SIS) – ver alínea a), do Art.º 19 da Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de
Novembro; em alteração à anterior Lei-Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa
(Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro) -, não obstante estes gozarem de autonomia administrativa e
financeira – ver Art.º 16, da Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de Novembro.
O SIRP representa o órgão máximo dentro do ordenamento legal nacional atribuído de
capacidade de coordenação e condução, relativamente à produção de informações, a sua finalidade
nessa matéria encontra-se devidamente definida na Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro – ver Art.º 2 -
(Lei Quadro do Serviço de Informações da República Portuguesa); no que respeita à produção de
informações propriamente dita apresenta maior relevância o estabelecido no n.º 2 do referido artigo,
que passo a citar:
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“Aos Serviços de Informações incumbe assegurar, no respeito da Constituição e da Lei, a
produção de informações necessárias à salvaguarda da independência nacional e à garantia da
segurança interna”.
Analisando o texto citado além de definir claramente a quem assiste a competência para a
produção de informações, e os moldes legais a que a actividade obedece, a última parte explicita
bem o carácter de defesa dos interesses fundamentais do Estado que as Informações assumem. É
ainda de realçar que devido ao carácter potencialmente sensível das informações produzidas, o
SIRP encontra-se na dependência directa do Primeiro-Ministro.
As competências do Primeiro-Ministro face aos Serviços de Informações encontram-se
definidas pelo Art.º 17 da Lei n.º4/2004, de 6 de Novembro; contudo as partes do referido artigo que
melhor explicitam a dependência dos Serviços de Informações relativamente ao Primeiro-Ministro
são, nomeadamente as alíneas c), d), e, e), que passo a citar:
Alínea c) “Nomear e exonerar o Secretário-Geral (SIRP) ”;
Alínea d) “Nomear e exonerar, ouvido o Secretário-Geral (SIRP), o director do Serviço de
Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e o director do Serviço de Informações de Segurança
(SIS) ”;
Alínea e) “Controlar, tutelar e orientar a acção dos serviços de informações”;
Após esta primeira análise da temática da produção de informações, do órgão responsável
por essa actividade (SIRP), e da relação institucional entre esta e o Primeiro-Ministro em harmonia
com o ordenamento legal em vigor, importa agora analisar com algum pormenor os Serviços que
recolhem as Informações propriamente ditas, antes de estas serem transmitidas pelo SIRP ao
Primeiro-Ministro ou, às entidades que por este lhe forem indicadas, através do seu Secretário-
Geral – ver Art.º 19, n.º 3, alínea c); Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de Novembro -, nomeadamente
o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e o Serviço de Informações de Segurança
(SIS).
O SIED e o SIS, não obstante constituírem ambos serviços de informações, têm funções e
atribuições destintas em matéria de produção de Informações. Tais funções e atribuições
encontram-se sumariamente definidas, respectivamente, nos Artigos 20 e 21 da Lei Orgânica n.º
4/2004, de 6 de Novembro.
Citando pela ordem referida são-nos apresentadas, pela Lei, as seguintes definições:
Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED)
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“O Serviço de Informações Estratégicas de Defesa é o organismo incumbido da produção de
informações que contribuam para a salvaguarda da independência nacional, dos interesses
nacionais e da segurança externa do Estado Português.”
Serviço de Informações de Segurança (SIS)
“O Serviço de Informações de Segurança é o organismo incumbido da produção de informações
que contribuam para a salvaguarda da segurança interna e a prevenção da sabotagem, do
terrorismo, da espionagem e a prática de actos que, pela sua natureza, possam alterar ou destruir
o Estado de direito constitucionalmente estabelecido.”
Como se pode facilmente constatar e, tal como já antes havia sido referido, tanto o SIED
como o SIS são serviços cuja actividade se dedica à produção de informações, contudo também se
verifica que as informações produzidas servem propósitos destintos ainda que em comum tenham
sempre o facto de se destinarem, em última análise, à salvaguarda dos interesses fundamentais do
Estado.
Vejamos então; o SIED dedica a sua actividade à recolha/produção de informações com
relevância para a segurança externa do Estado, nesse sentido procura obter informação
privilegiada, que permita avaliar o grau de possíveis ameaças terroristas e, nesse sentido, contribuir
para a sua prevenção; identificar e monitorizar redes internacionais de crime organizado –
narcotráfico, imigração ilegal, tráfico de seres humanos destinados a redes de prostituição,
proliferação nuclear bem como de outras armas de destruição massiva (químicas e biológicas) -;
acompanhar de forma permanente a segurança dos cidadãos portugueses residentes no
estrangeiro; alertar atempadamente sempre que os interesses nacionais do Estado possam estar
potencialmente comprometidos; salvaguardar todas as matérias prioritárias da política externa
portuguesa – política, recursos energéticos e tecnológicos, economia, e defesa.
É importante referir que além das atribuições genericamente referidas pelo Art.º 20 da Lei
Orgânica n.º 4/2004, de 6 de Novembro, foram adicionalmente introduzidas alterações pela Lei de
Segurança Interna n.º 53/2008, de 29 de Agosto que atribuem ao SIED outras funções
complementares à sua actividade principal, legalmente definida e anteriormente descrita.
Dessas alterações resultam a participação do SIED noutros órgãos de segurança,
nomeadamente o Conselho Superior de Segurança Interna (CSSI), o Gabinete Coordenador de
Segurança (GCS), e a Unidade de Coordenação Antiterrorista (UCAT). Esta alteração legislativa
traduz-se na prática num alargamento do raio de acção do SIED ainda que apenas de forma
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complementar à segurança interna. Enquanto serviço de segurança externa cabe-lhe agora produzir
e fornecer todas as informações necessárias sobre ameaças externas, susceptíveis de
comprometer a manutenção da segurança interna.2
É a partir deste ponto que falaremos do SIS pois é a este serviço que cabe a salvaguarda
da segurança interna do Estado português.
O SIS representa o serviço de informações especializado na produção de informações
destinadas à salvaguarda da segurança e manutenção da ordem interna do Estado, essa missão
implica por ordem natural que a acção do SIS se destine a possibilitar sempre a prevenção de
incidentes. A produção de informações mais do que intervenção consiste fundamentalmente na
prevenção, como aliás veremos mais adiante, já que pela ordem constitucional portuguesa os
Serviços de Informações não têm capacidade de intervenção efectiva relativamente a acções de
segurança.
As informações produzidas pelo SIS destinam-se a monitorizar fenómenos de natureza
criminal de modo a prevenir que os mesmos cheguem a concretizar-se e, dessa forma coloquem
em risco a ordem interna do Estado. Assim matérias como sabotagem, terrorismo, espionagem, ou
a prática de quaisquer outros actos que possam alterar ou destruir o Estado de direito estão
englobadas na acção preventiva dos Serviços de Informações para que os mesmos possam assim
garantir a segurança interna do Estado.
A acção preventiva de fenómenos ou acontecimentos potencialmente perigosos ou de risco
para a segurança do Estado, levam a que o SIS assuma um papel fundamental de apoio às decisões
tomadas em matéria de segurança e, de aconselhamento no campo da investigação criminal. Assim
mais que um instrumento de produção de informações é um importante instrumento de
aconselhamento estratégico ao serviço da administração do Estado.
A orgânica, missão e fins do SIS encontram-se legalmente definidas no quadro da Lei n.º
9/2007, de 19 de Fevereiro – ver Artigos 33 a 37.
Após analisar as estruturas orgânicas e as atribuições e fins do SIED e o SIS poder-se-á
concluir sem grande dificuldade que ambos representam serviços públicos destinados à produção
de informações e, que embora tenham missões aparentemente diferenciadas quanto às suas áreas
de intervenção, na verdade acabam por formar um sistema que actua em regime de
complementaridade e cooperação. Uma reflexão que decorre da análise que se vem desenvolvendo
ao longo deste trabalho, realça o facto de que segurança externa e interna não configuram
2 Informação extraída do website do SIED: http://www.sied.pt/missaovv.html
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realidades assim tão distantes, em rigor verifica-se que estão intimamente ligadas num sistema de
interdependência em que as falhas de uma acabarão por ter repercussões na defesa da outra,
assim a partilha de informações entre serviços representa a única forma viável de garantir a
segurança do Estado – externa ou interna -, bem como de assegurar um Sistema de Informações
eficiente e confiável.
A conclusão desta análise ao sistema de produção de informações nacional permite assim
concluir que foi com vista a esse objectivo, de criar uma rede de informações alargada e eficaz, que
foi criada a estrutura do SIRP, que agrega o SIED e o SIS em regime de cooperação e partilha de
informações e, igualmente coordena e conduz a actuação de ambos os serviços sob a lógica de um
sistema integrado. Só assim é possível assegurar efectivamente a salvaguarda da segurança
externa e interna do Estado português.
A título meramente explicativo e de modo a que a missão do SIRP (SIED+SIS) fique totalmente
clara cita-se uma lista, que enumera todas as actividades criminosas ou potencialmente perigosas,
genericamente referidas atrás, apenas, como ameaças à segurança do Estado e dos seus
interesses fundamentais. Tal definição é por si só muito vaga e desse modo pouco esclarecedora
para quem pretenda compreender pormenorizadamente a temática que vem sendo desenvolvida.
Assim torna-se fundamental clarificar, uma a uma, quais são efectivamente as ameaças – ameaças
reais - que têm sido inúmeras vezes referidas; são pois as que passarei a citar:
I. Espionagem Clássica;
II. Espionagem Económica;
III. Crime Organizado;
IV. Extremismos Ideológicos e Religiosos;
V. Branqueamento de Capitais;
VI. Tráfico internacional de Armas de Destruição Massiva (ADM), e Proliferação das mesmas;
VII. Tráfico de Seres Humanos (Redes de Prostituição e Migrações Ilegais);
VIII. Cibercrime;
IX. Novas Formas de Crime.3
Por fim é importante referir os moldes em que actuam os Serviços de Informações e as
restrições legais a que estão obrigados, para tal é necessário recorrer à consulta da Lei Orgânica
n.º 4/2004, de 6 de Novembro e, à Lei n.º 9/2007, de 19 de Fevereiro. Após esta breve análise
3 Listagem das ameaças combatidas em regime de cooperação e complementaridade pelo SIS e o SIED, segundo o website do SIS: http://www.sis.pt/quemsomos.html
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verificar-se-á porque antes referi que não obstante o sistema de informações integrado nacional,
SIRP (SIED+SIS), estar atribuído de funções de fundamental relevância para a segurança do
Estado, para a qual contribui activamente, não possui no entanto capacidade de intervenção
efectiva em matéria de acções de segurança no terreno, isto porque tais atribuições lhe estão
legalmente vedadas.
Assim de acordo com o Capítulo I, do Anexo à Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de Novembro,
intitulado “Princípios Gerais” iremos encontrar entre os Artigos 3 a 5 todas as normas que
estabelecem, respectivamente, os limites relativamente ao exercício da actividade, à actuação, e
ao acesso de dados dos Serviços de Informações. Irei dar maior enfoque apenas às partes mais
expressivas dos artigos mencionados, aquelas que exprimem claramente a intenção do legislador
de salvaguardar os limites ao exercício de funções dos Serviços de Informações e, que comprovam
a afirmação de que os Serviços de Informações actuam única e exclusivamente ao nível da
produção de informações, nenhuma outra função de intervenção no combate às ameaças, à
segurança do Estado, lhe é permitida.
Vejamos então:
Art.º 3, n.º 1; relativamente ao “Limite das Actividades dos Serviços de Informações”
– “Não podem ser desenvolvidas actividades de pesquisa, processamento e difusão de informações
que, envolvam ameaça ou ofensa aos direitos, liberdades e, garantias consignados na Constituição
e na Lei.”;
Este ponto demonstra bem que embora a produção de informações represente um
instrumento de grande importância para a segurança nacional, a actividade está sujeita a fortes
restrições de natureza legal e constitucional de modo a prevenir qualquer espécie de eventuais
abusos de poder, que possam colocar em causa os princípios fundamentais do regime democrático
ou mesmo ameaçá-lo, no caso de violações aos direitos, liberdades e garantias,
constitucionalmente consagrados e assegurados aos cidadãos.
Art.º 4; “Delimitação do âmbito de Actuação”
1 – “Os funcionários ou agentes, civis ou militares, dos serviços de informações previstos na
presente lei não podem exercer poderes, praticar actos ou desenvolver actividades do âmbito ou
competência específica dos tribunais ou das entidades com funções policiais.”
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2 – “É expressamente proibido aos funcionários e agentes, civis ou militares, dos serviços de
informações proceder à detenção de qualquer indivíduo ou instruir processos penais.”;
Este artigo representa certamente a expressão máxima da ausência de capacidade
legalmente atribuída, aos Serviços de Informações, para agirem activamente no terreno, em acções
de combate à criminalidade ou ameaças à segurança do Estado, como órgão equiparado às forças
de segurança (PSP, GNR, PJ), ou forças armadas (Exército, Marinha; Força Aérea); é agora
praticamente irrefutável que a sua actividade se cinge apenas a produzir informações que
posteriormente serão comunicadas ao Primeiro-Ministro e, caso se justifique, este irá comunicar a
outros membros da administração do Estado. Em caso de crise eminente, no limite, poderão apenas
transmitir as informações relevantes às forças de segurança competentes, conforme o caso e o seu
nível de gravidade ou perigosidade para que estas possam proceder a todas as acções necessárias
quer à prevenção, quer ao combate às ameaças que se apresentem. Contudo o acesso de agentes
das forças de segurança a informações classificadas obedece também a um processo devidamente
regulamentado, ou seja não ocorre livremente, como iremos verificar no próximo artigo em análise.
Art.º 5; “Acesso a dados e informações”
1 – “Os funcionários e agentes, civis ou militares, que exercem funções policiais só poderão ter
acesso a dados e informações na posse dos serviços de informações desde que autorizados por
despacho do competente membro do Governo, sendo proibida a sua utilização com finalidades
diferentes da tutela da legalidade democrática ou da prevenção e repressão da criminalidade.”
2 – “O funcionário ou agente, civil ou militar, que comunicar ou fizer uso de dados de informações
com violação do disposto no número anterior será punido com prisão até 3 anos, se pena mais
grave não lhe for aplicável, independentemente da medida disciplinar que ao caso couber.”
Em suma, apenas com uma autorização governamental poderão as forças de segurança
aceder a informações classificadas, o que se justifica plenamente pelo carácter altamente sensível
deste material. Um erro de manipulação ou transmissão, uma divulgação feita sem observância a
estritos protocolos de segurança, ou mesmo a apropriação por parte de um agente corrupto ou ao
serviço de outras entidades ou instituições exteriores ao Estado, poderiam resultar em crises ou
situações de alto risco para a segurança externa ou interna, com consequências de difícil previsão.
É pois fundamental eliminar o maior grau de risco possível e, tal só é possível através de regras e
normas devidamente enquadradas legal e constitucionalmente. Por outro lado o disposto no n.º 2
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revela um outro instrumento que permite reforçar a segurança das informações classificadas contra
situações como as anteriormente descritas, nomeadamente a coacção legal. Ao estabelecer um
quadro legal com penas de prisão, potencialmente gravosas para o indivíduo que incorra em
violação dos dispostos da Lei, o legislador está implicitamente a passar uma mensagem que visa a
dissuasão de eventuais situações que se enquadrem nesse panorama.
A partir da análise feita aos artigos supra mencionados, conseguimos já ter uma ideia
bastante completa dos moldes em que os Serviços de Segurança desenvolvem a sua actividade.
Nada neste campo é tomado de forma leviana, quer do lado da recolha e produção de informações,
quer do lado que corresponde à forma de produção e seus limites, entidades acreditadas para
aceder às informações e, em que moldes o podem fazer. Voltando um pouco ao início deste capítulo
em que se abordou a imagem de que as informações classificadas, segundo a percepção da
generalidade dos indivíduos, é feita por espiões infiltrados nas fileiras do “inimigo”, que andam
armados e têm capacidade de intervir directamente no terreno em caso de ameaça, verifica-se que
tal cenário não só não corresponde à realidade do Estado Português, como em termos gerais
configura uma hipótese fictícia na generalidade dos Estados Ocidentais. Verifica-se ainda que é
uma área altamente regulamentada em que nada se processa de forma linear ou aleatória, há
normas e protocolos rígidos que têm que ser escrupulosamente respeitados, sob pena da aplicação
de sanções legais severas. Os agentes e funcionários dos Serviços de Informações estão obrigados
ainda a um código profissional que lhes atribui deveres e obrigações de carácter especial,
nomeadamente: agir e manter total sigilo sobre a sua actividade, e obedecem a um regime de
exclusividade e total disponibilidade; acrescem ainda os deveres profissionais básicos de todos os
funcionários ao serviço do Estado: Isenção, Zelo, Obediência, Lealdade e Correcção.
CAPÍTULO II: Informação Classificada: Tipos de Documentos,
Armazenamento, e Transmissão No capítulo anterior sobre a Produção de Informações, bem como na introdução deste
trabalho, foram abordados alguns aspectos fundamentais para alicerçar uma base sólida para a
boa compreensão da temática que constitui o objecto deste estudo. Seria impossível falar de
Informações Classificadas e segurança das mesmas sem demonstrar de forma fundamentada quais
os agentes, meios e processos que permitem a obtenção do valioso conhecimento contido nessas
informações, e as Leis que orientam o modo como essa obtenção se processa. Foi um capítulo
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extenso, e julgo que apresentou de forma clara e coerente os aspectos fundamentais da matéria
abordada, pelo que não irei explorar mais essa parte neste trabalho.
Irei agora abordar a forma sob a qual as informações produzidas, pelos serviços
competentes, se apresentam antes de serem transmitidas ou, o formato que permite a sua
armazenagem e posterior transmissão aos órgãos competentes.
Em termos gerais uma informação pode ser obtida por recurso as diversas técnicas, sejam
escutas telefónicas, vigilância informática ou videovigilância – nas suas formas mais actuais e
sofisticadas -, seja através de espionagem ou recurso a informadores, numa perspectiva mais
básica - em termos de percepção sublinhe-se - pois qualquer dos métodos referidos implica grande
precisão e coordenação na sua execução, já que a sensibilidade inerente á produção de
informações não admite falhas.
Dito isto não será demasiado difícil compreender que os tipos de documentos onde as
informações são armazenadas e transmitidas são tão diversos como, documentos em formato papel
(Cartas, Impressos, Mapas, Gráficos, ou quaisquer outras reproduções visuais em papel); ou
documentos gravados em formato digital (CD’s, DVD’s, Dispositivos de Armazenamento de Dados
– PC, Pen, Disco Externo -, Documentos Electrónicos - pdf., docx., wmv., mp3, etc.), ou analógico
(Gravações convertidas em fitas de cassete Áudio ou Vídeo ou, já pouco comum, em Disco de Vinil).
Na actualidade são os formatos digitais que predominam, quer pela sua maior capacidade
de armazenamento de dados, quer pela maior rapidez e facilidade de transmissão, os formatos
analógicos estão cada vez em maior desuso pois, na generalidade dos casos, para que seja
possível transmitir a informação nos aparelhos modernos surge a necessidade de recorrer a
programas informáticos ou outros aparelhos, que permitam convertê-la em formato digital.
Uma vez introduzidos os conceitos básicos de formatos de armazenamento e transmissão de
informações, importa reter que independentemente do formato em que se apresente – gravação
analógica ou digital, ou qualquer outra forma física - ou das suas características, a Informação é
sempre referida como Documento. É este termo que engloba todo o tipo de informações atrás
referidos, sem quaisquer restrições.
Uma nota final nesta matéria é a que farei sobre a Transmissão de informações; já atrás
foram referidos alguns pontos indicativos sobre esta fase de produção de informações, contudo é
importante que não se confunda de modo algum o que é um Documento (Armazena Informação) e,
o que é um Meio de Transmissão (Reproduz a Informação contida no Documento).
Insisto nesta última parte pois existem casos de dispositivos que simultaneamente recolhem,
armazenam e transmitem Informações; nesse sentido os computadores (PC’s) são o caso mais
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representativo pois possuem discos rígidos incorporados que permitem executar todas as acções
descritas. Igualmente são o dispositivo que opera a reprodução da maioria dos dispositivos atrás
descritos – CD’s, DVD’s Pens, Documentos Electrónicos, etc.
Mas no caso, por exemplo de uma gravação analógica em formato vídeo, ou áudio, já se
requer outro tipo de equipamentos como os tradicionais leitores de cassetes áudio ou VHS; na
ausência destes torna-se necessário recorrer a dispositivos de conversão desses formatos para
formato digital e, só então posteriormente a informação poderá ser transmitida ou enviada por
computador.
Por fim há que não esquecer os Rádios, que possibilitam a transmissão em tempo real de
ondas sonoras, sejam efeitos de voz, ou qualquer outro tipo de código sonoro encriptado.
Após dedicar alguma ponderação aos meios de transmissão e de armazenamento de dados
(Informações), encontramo-nos perante um novo dilema; a Segurança das Informações
Classificadas.
Todos os documentos ou os dispositivos que os armazenam e transmitem são vulneráveis
e susceptíveis de sofrer ataques com vista ao desvio de informações, caso por exemplo dos
Ciberataques que actualmente através da Internet conseguem, muitas vezes, penetrar os sistemas
de segurança informáticos apesar de todos os apertados protocolos de segurança adoptados e,
assim roubar Informações das bases de dados. Não raras vezes além do roubo de Informações,
ocorre que o próprio sistema informático dos Serviços de Informações pode ser derrubado
(“hackeado”), comprometendo seriamente os interesses de segurança do Estado.
Entramos assim no próximo capítulo deste estudo.
CAPÍTULO III: Informação Classificada: Sobre a sua Segurança A Segurança da Informação Classificada é um dos aspectos mais importantes quando se
considera toda a actividade de produção de informações.
É um objectivo que procura por todos os meios disponíveis garantir que a Informação
Classificada seja protegida contra ameaças que comprometam os seus “pilares fundamentais”, os
traços que conferem o eventual grau de classificação às informações, nomeadamente a sua
Confidencialidade, a sua Integridade, e a sua Disponibilidade. Analisemos então cada um destes
aspectos para a sua melhor compreensão no âmbito deste trabalho.
A Confidencialidade é o primeiro aspecto abordado e quase que se confunde com o próprio
conceito de Classificação, são contudo termos destintos. A Confidencialidade é uma das
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características englobadas no conceito de Informação Classificada, é condição fundamental que
contribui para a sua consubstanciação e posterior segurança.
Em geral a Confidencialidade prende-se com o acto de assegurar que somente indivíduos
ou entidades credenciadas, e devidamente autorizadas, podem aceder às informações.
Em termos legais a acessibilidade a dados (informações) encontra-se devidamente regulada nos
termos do Art.º 43 da Lei n.º 50/2014, de 13 de Agosto; que altera e republica a Lei n.º 9/2007, de
19 de Fevereiro (“Estabelece a orgânica do Secretário-Geral do SIRP, do SIED, e do SIS, e a
revogação os Decretos-Lei n.º 225/85, de 4 de Julho e n.º 254/95, de 30 de Setembro”).
O referido Art.º 43, precisamente intitulado “Acesso aos Dados”, estabelece no seu ponto
n.º 1 que “…nenhuma outra entidade externa ao SIED ou ao SIS pode aceder a dados e informações
armazenados nas respectivas bases de dados.”; a excepção a esta norma encontra-se prevista pelo
n.º 2 do artigo, e determina as condições em que as informações poderão ser fornecidas a outros
órgãos legalmente previstos (Forças de Segurança, ou Militares), e de acordo com o texto referido
tal situação só poderá ocorrer “Por despacho do Primeiro-Ministro e, quando ouvido o conselho de
fiscalização do SIRP…”
Para melhor compreensão das excepções legalmente previstas, relativamente ao acesso a
dados e informações, dever-se-á consultar o Art.º 5, do Capítulo I intitulado “Princípios Gerais”, em
anexo à Lei n.º 4/2004, de 6 de Novembro (Lei Quadro do Sistema de Informações da República
Portuguesa); o Art.º 5 intitulado de forma similar ao Art.º 43 da Lei n.º 50/2014, de 13 de Agosto,
como “Acesso a Dados e Informações” estabelece o seguinte no seu ponto n.º 1:
“Os funcionários e agentes, civis ou militares, que exercem funções policiais só poderão ter acesso
a dados e informações na posse dos serviços de informações desde que autorizados por despacho
do competente membro do Governo, sendo proibida a sua utilização com finalidades diferentes da
tutela da legalidade democrática ou da prevenção e repressão da criminalidade.”
Este artigo é absolutamente fulcral pois complementa a legislação contida no Art.º 43 da Lei n.º
50/2014, de 13 de Agosto já que, não só reforça o carácter de exclusividade que os Serviços de
Informações detêm relativamente ao acesso a dados e informações, como determina quais as
outras entidades externas que poderão fazê-lo (“Funcionários e agentes, civis ou militares, que
exercem funções policiais…”), em que situações poderão fazê-lo (“…desde que autorizados por
despacho do competente membro do Governo…”; neste caso o Primeiro-Ministro, ver n.º 2, Art.º 43
da Lei n.º 50/2014), bem como os fins a que se poderão destinar e respectivos limites legais
(“…sendo proibida a sua utilização com finalidades diferentes da tutela da legalidade democrática
ou da prevenção e repressão da criminalidade.”).
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Finalmente no que à Confidencialidade diz respeito, é necessário destacar que, sendo um
aspecto central da segurança da informação classificada, foram legalmente previstos mecanismos
para obrigar ao respeito desta regra pelos funcionários ou agentes dos Serviços de Informações.
Em caso de violação dos dispostos nos artigos legais que estruturam o acesso a dados e
informações, que obrigam os funcionários ou agentes dos Serviços de Informação ao dever de
sigilo, conforme previsto no n.º 1 do Art.º 28 da Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro (Lei-Quadro do
SIRP), serão aplicadas sanções judiciais, com penas até 3 anos de prisão ou penas eventualmente
mais graves, conforme a gravidade da violação ocorrida. Encontram-se artigos que enquadram essa
matéria nas Leis anteriormente mencionadas, nomeadamente no n.º 2 do Art.º 28 da Lei n.º 30/84
(“Dever de Sigilo); no n.º 2 do Art.º 5 da Lei Orgânica 4/2004 (“Acesso a Dados e Informações”), em
ambos os casos o modelo sancionatório aplicado é idêntico e similarmente definido: “…a violação
do disposto no número anterior será punido com prisão até 3 anos, se pena mais grave não lhe for
aplicável…”; ora esta situação aplica-se quer em caso de violação do dever de sigilo, quer no caso
de acesso ou divulgação indevida de dados ou informações classificadas. Independentemente da
situação que se verifique, qualquer dos casos configura em última análise uma violação ao princípio
da Confidencialidade e, nesse sentido comprometem potencialmente a segurança das informações
classificadas.
A Confidencialidade não encerra contudo em si mesma a única característica fundamental
da segurança das informações classificadas, há outras que já atrás foram mencionadas, e é sobre
essas que agora importa tecer algumas considerações.
Falarei agora sobre a Integridade das informações, este aspecto tem grande relevância pois
tem como finalidade assegurar que as informações produzidas são verosímeis e confiáveis, ou seja
deve garantir que são informações de qualidade comprovada pois, em caso contrário, uma má
informação ou falsa podem conduzir a situações de risco.
Cabe aos Serviços de Informações no exercício das suas actividades adoptar os métodos
de recolha e produção de informações mais adequados e, garantir que estes asseguram
informações tão fiáveis quanto possível. Na prossecução desse objectivo as informações serão tão
fiáveis quanto maior for a sua complementaridade, relativamente ao cruzamento das mesmas entre
serviços (SIED e SIS). Informações recolhidas e produzidas em âmbitos de actuação diferenciados
mas, que sendo cruzadas se confirmam e, eventualmente até se complementam, serão
seguramente mais verosímeis e permitem um alargamento do raio de acção da Segurança do
Estado; caso já citado é a cooperação entre o SIED, que actua no âmbito da segurança externa, e
o SIS que procura garantir a segurança interna. O cruzamento de dados e informações entre ambos
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os serviços permitem alargar o combate às ameaças à Segurança do Estado já que, existem
ameaças externas que podem ter repercussões na segurança interna e vice-versa; este “modus
operandi” garante ainda uma visão mais ampla das potenciais ameaças, através de informações
mais completas e detalhadas.
Finalmente resta referir a questão da Acessibilidade às informações e dados, ou a quem
estão disponíveis. Neste ponto é possível voltar atrás, ao ponto sobre a Confidencialidade, e
recapitular essa matéria em termos de legislação, pois já foi referido quem pode aceder às
informações e sob que condicionantes.
A Acessibilidade (disponibilidade) tem como fim assegurar em primeira instância que, só
aqueles devidamente autorizados podem aceder às informações e dados; nesse sentido reveja-se
o disposto pelo n.º 1 do Art.º 43, da Lei 9/2007, que estabelece o seguinte:
“Sem prejuízo do disposto na Lei-Quadro do SIRP sobre fiscalização e do acesso do Secretário-
Geral, através dos directores dos centros de dados, nenhuma entidade estranha ao SIED ou ao SIS
pode ter acesso directo aos dados e informações conservados nos respectivos centros de dados.”
É facilmente perceptível que em termos gerais só os agentes ou funcionários do SIED ou do
SIS podem aceder a informações ou dados classificados, contudo é importante referir novamente
a excepção legalmente prevista a esta regra, nomeadamente a que se encontra definida pelo n.º 1
do Art.º 5, da Lei Orgânica 4/2004:
“Os funcionários e agentes, civis ou militares, que exercem funções policiais só poderão ter acesso
a dados e informações na posse dos serviços de informações desde que autorizados por despacho
do competente membro do Governo, sendo proibida a sua utilização com finalidades diferentes da
tutela da legalidade democrática ou da prevenção e repressão da criminalidade.”
Ou seja excepto os membros dos próprios Serviços de Informações, só podem aceder a
informações ou dados classificados, membros das Forças de Segurança, policiais ou militares,
desde que autorizados por despacho de membro competente do Governo, que neste caso é o
Primeiro-Ministro.
Em segunda instância a Acessibilidade (disponibilidade) tem que estar assegurada aos
agentes devidamente autorizados mas, sublinhe-se, tal deve ocorrer sempre que for necessário.
O aspecto da necessidade deve ser abordado com algum cuidado, sob pena de se ignorar o seu
alcance, para que tal não ocorra voltemos ao n.º 1 do Art.º 5, da Lei Orgânica 4/2004,
nomeadamente ao seu excerto final:
“…sendo proibida a sua utilização com finalidades diferentes da tutela da legalidade democrática
ou da prevenção e repressão da criminalidade.”
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Ora quanto á necessidade de acesso, verifica-se que esta se prende com determinadas
condições específicas, nomeadamente a tutela da legalidade democrática ou a prevenção e
combate à criminalidade; revendo as partes iniciais deste estudo podemos ligar esta conclusão aos
factos já constatados, que os Serviços de Informações têm como finalidade a defesa da segurança
e da ordem interna do Estado, em suma dos seus interesses fundamentais.
O artigo deixa claro que nenhum outro fim além dos referidos é admitido como condição válida de
acesso a informações ou dados classificados, daí quem se tenha sublinhado que a informação deve
estar acessível/disponível, aos agentes devidamente autorizados, não sempre, mas sempre que
necessário - sempre que a situação o justifique e consequentemente o autorize – e se observadas
todas as condições legais.
Algumas ameaças directas à Segurança das Informações Classificadas a ter em conta são
desastres naturais, falhas técnicas, falhas humanas, ou questões sociais; dentro destas categorias
é possível enumerar uma série de possíveis acontecimentos, desde um sismo, um ciberataque,
utilização negligente, até um atentado terrorista; apenas para referir algumas possibilidades que
obrigam a planear protocolos de segurança que permitam manter seguras as informações
classificadas. Regressamos novamente à dialéctica Segurança/Informações Classificadas, uma
não existe sem a outra, se por um lado as informações são uma das bases da segurança, por outro
não é menos verdade que sem segurança não há informações que a possam garantir. Neste campo
tudo ocorre num sistema interdependente, como um ciclo contínuo de causa e efeito, em que um
problema numa área específica – uma falha – poderá afectar o funcionamento eficaz do sistema no
seu todo.
Por isso em conclusão reafirmo que - após analisados todos os aspectos relevantes -
Confidencialidade, Integridade e Acessibilidade (disponibilidade) configuram os 3 pilares
fundamentais onde assenta a Segurança das Informações Classificadas.
CAPÍTULO IV: Informação Classificada: As dimensões dos
Níveis de Segurança; da Classificação e dos seus Agentes A classificação de informação é um processo que obedece a parâmetros rigorosamente
estabelecidos e, divide-se em diferentes níveis de segurança. Analisemos pois esse processo mais
detalhadamente.
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A matéria que dá origem à informação classificada é organizada por níveis, ou seja a
importância e potencial perigosidade ou gravidade de uma determinada informação são os
principais factores considerados para a atribuição do nível de classificação à informação em causa.
Os referidos níveis são mais propriamente designados como graus de classificação.
O grau de classificação determina a importância da informação classificada, fundamenta o
motivo para a respectiva classificação – o fundamento decorre da própria importância da informação
-, e estabelece os níveis de protecção e de restrição de acesso a que a informação está sujeita.
Os graus de classificação dividem-se em Muito Secreto, Secreto, Confidencial, e Reservado;
aplicam-se conforme a eventual Divulgação não Autorizada de uma informação classificada possa
originar ameaças, aos interesses fundamentais do Estado, países aliados ou organizações que este
integre, de natureza Excepcionalmente Graves, Graves, Prejudiciais, ou Desfavoráveis.
Assim de forma mais simplificada a correspondência entre o grau de classificação e o nível de
ameaça pode ser apresentada da seguinte forma:
Ameaças Excepcionalmente Graves – Grau de classificação “Muito Secreto”
Ameaças Graves – Grau de classificação “Secreto”
Ameaças Prejudiciais – Grau de classificação “Confidencial”
Ameaças Desfavoráveis – Grau de classificação “Reservado”
Existe ainda um outro grau de classificação que, embora não constitua de facto um grau, existe
na terminologia aplicada à informação classificada sob a indicação de “Não Classificado”.
O termo Não Classificado aplica-se para designar informações que, sob o ponto de vista da sua
matéria não apresentam ameaças à segurança ou aos interesses fundamentais do Estado. 4Essa
avaliação e posterior atribuição do “grau” “Não Classificado” competem às mesmas entidades que
avaliam e atribuem os demais graus de classificação. Sobre essas entidades falarei mais adiante.
No imediato é interessante observar as equivalências dos graus de classificação atribuídos
pelas Organizações Internacionais que Portugal integra, relativamente aos que são atribuídos na
realidade nacional, e a terminologia utilizada para designar os mesmos.
Foi já referido que em Portugal são utilizados os graus de classificação Muito Secreto, Secreto,
Confidencial e Reservado, para identificar informações com níveis de ameaça Excepcionalmente
4 Graus definidos e estabelecidos oficialmente pelo nº 3.2, do SEGNAC 1 (“Instruções para a Segurança Nacional, Salvaguarda e Defesa das Matérias Classificadas”); Resolução do Conselho de Ministros nº 50/88, de 3 de Dezembro.
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Graves, Graves, Prejudiciais, e Desfavoráveis respectivamente; perante esses níveis de ameaça
as organizações abaixo indicadas utilizam os seguintes graus de classificação:
NATO – Cosmic Top Secret; NATO Secret; Nato Confidential; Nato Restricted;
União Europeia – Trés Secret UE; Secret UE; Confidentiel EU; Restreinte EU;
Agência Espacial Europeia – ESA Top Secret; ESA Secret; ESA Confidential; ESA
Restricted;
Eurofor – Eurofor Top Secret; Eurofor Secret; Eurofor Confidential; Eurofor Restricted;
Após esta breve explicação do processo seguido pela informação até que lhe seja atribuído um
determinado grau de classificação é altura de referir quais as entidades competentes para atribuir
as classificações, em razão do nível de ameaça que determinada informação represente. Assim
como os graus variam de acordo com o nível de ameaça, também as entidades diferem no mesmo
seguimento, dessa forma as competências dividem-se da seguinte forma:
Grau de classificação “Muito Secreto”; atribuído pelo Primeiro-Ministro e demais órgãos
políticos competentes (Ministros, Secretários de Estado, Presidentes dos Governos
Regionais), e pela Autoridade Nacional de Segurança (ANS).
Trata-se das informações que reportam a potenciais ameaças Excepcionalmente Graves,
ou seja as que têm maior importância vital para a segurança do Estado e para a defesa dos
seus interesses fundamentais, assim apenas circulam entre as mais altas esferas da
administração do Estado.
Grau de classificação “Secreto”; este grau pode ser atribuído por membros da administração
pública tais como Directores Gerais (SIRP, SIED, SIS), Chefes de Gabinete de Membros do
Governo, ou mesmo os Autarcas (Presidentes de Câmaras Municipais).
São as entidades competentes para tratar das informações relativas a ameaças Graves,
aquelas que pela sua natureza podem prejudicar ou abalar seriamente a ordem interna do
Estado.
Os Graus de classificação “Confidencial” e “Reservado”, por se relacionarem com questões
de segurança menores, ameaças Prejudiciais ou Desfavoráveis, não requerem a
intervenção das cúpulas da administração do Estado para serem atribuídos. Assim podem
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igualmente os funcionários competentes acima referidos, os que podem atribuir o grau
Secreto, proceder à classificação de informações com estes dois últimos graus.
As competências para classificar informações encontram-se devidamente distribuídas pelas
entidades adequadas, de forma proporcional à importância e ao nível de ameaça que uma dada
informação pode representar, pode dizer-se que a organização das entidades que classificam
informações se faz por escalões. Quanto mais importante e/ou potencialmente perigosa for uma
informação; mais relevância terá que ter a entidade que a classifica, ou seja quanto maior for a
ameaça mais restrito é o núcleo de pessoas que podem classificar e aceder a essas informações.
Este modelo de organização conjuntamente com a legislação em vigor – situação já previamente
analisada -, determinam quem pode aceder a dados e informações classificados, em que
circunstâncias, e sob que condições, destinam-se a prevenir e evitar situações de fuga ou falha de
informação e, consequentemente de segurança.
Tais situações denominam-se Comprometimento de Segurança ou Quebra/Violação de
Segurança, conforme o caso que se verifique. Ambas as situações configuram cenários de elevada
gravidade, sendo certo contudo que uma Quebra ou Violação de Segurança se apresenta como
uma ocorrência muito mais grave do que uma situação de Comprometimento.
Comprometimento de Segurança reporta a uma situação que ocorre quando informações
classificadas são acedidas por indivíduos não autorizados – sem acesso autorizado ou devida
credenciação de segurança -; o conhecimento desses conteúdos por tais indivíduos configura um
elevado risco de divulgação, comprometendo a segurança do Estado. O caso em que matérias
classificadas se tenham extraviado ou sido furtadas de uma área de segurança resultando na sua
perda, ainda que apenas temporariamente, considera-se igualmente como uma situação de
Comprometimento de Segurança.
Por outro lado uma Quebra ou Violação de Segurança dá-se quando acções que não
observam os regulamentos de segurança em vigor resultem num perigo directo e eminente, ou no
total comprometimento das informações ou dados classificados. Se uma informação for furtada e
posteriormente vendida a uma entidade contrária aos interesses do Estado, verifica-se uma fuga de
informação, e assim estamos perante uma situação de Quebra ou Violação de Segurança.
Um último ponto que falta abordar relativamente à Classificação de informações e dados é
a sua durabilidade, ou seja o seu tempo de vida. As informações e dados classificados não
permanecem nessa qualidade “ad aeternum”, existe um período limitado de vigência temporal para
cada grau de classificação atribuído.
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A esse período corresponde um ciclo que a informação percorre desde o momento da sua
Classificação até à sua futura destruição, a ser caso disso. O ciclo referido intitula-se vulgarmente
como “Ciclo de Vida da Informação” e corresponde a 4 etapas; o Registo, a Distribuição, o Arquivo
e, por fim a Destruição; vejamos assim uma a uma, em que se traduzem essas etapas.
Logo que lhe é atribuída um grau de classificação, uma informação ou dado é imediatamente
registado; conforme o grau variam os meios de registo. Estamos pois perante a primeira etapa do
Ciclo de Vida da Informação; o Registo.
Os documentos contendo informações ou dados são registados seguindo um critério
baseado no grau de classificação atribuído, assim os Muito Secretos são registados em Livro de
Registo próprio, de modo a conservar a sua integridade e inviolabilidade o mais possível. Pelo
elevado nível de ameaça que podem representar, e seguindo a mesma linha que orienta que
entidades têm competência para os classificar e aceder, no caso já referido as mais altas figuras do
Estado, também o seu Registo se faz de forma separada dos demais documentos com graus de
classificação inferiores.
Os documentos Secretos, Confidenciais, e Reservados, por representarem ameaças
menores do que os Muito Secretos, e logo por poderem ser acedidos por funcionários de menor
graduação dentro da entidade estatal, são registados por via de Meios Electrónicos. Não exigem
assim um dispositivo de segurança tão restritivo ao acesso como os Muito Secretos, encontrando-
se registados em meios não tão ocultos.
A segunda etapa deste ciclo é a Distribuição, aqui denotam-se novamente diferenças na
forma como os documentos contendo informações são manipulados, de acordo com o seu grau de
classificação.
Os Muito Secretos quando são movimentados, ou enviados de uma entidade para outra,
apenas o podem ser via Serviço Oficial de Estafetas ou Correio Militar devidamente credenciado.
Resumindo têm que ser enviados através de correio registado, e ser entregues em mão à entidade
oficial competente a que se destinam, sob pena de em contrário se correr um maior risco de extravio,
originando assim uma situação de Comprometimento de Segurança.
Os Secretos, Confidenciais, e Reservados novamente pelo seu carácter de risco menor,
podem ser enviados por Via Electrónica. Para tal recorre-se ao SEIF, um sistema de segurança
electrónica da informação, que permite a movimentação de documentos classificados entre o
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Registo Central Nacional os Sub-Registos dos órgãos de segurança competentes, isto permite uma
agilização substancial do processo de Distribuição.5
A terceira etapa é o Arquivo; é a fase em que os documentos após a sua recepção e registo são
armazenados no Registo Central Nacional, que se encontra na dependência do Gabinete Nacional
de Segurança (GNS), e deste são posteriormente enviados para os Sub-Registos e Postos de
Controlo, conforme a situação que se verifique e se assim for necessário. Em Portugal existe um
total de 44 Sub-Registos e 183 Postos de Controlo.
A organização do Sistema de Registos determina que os Sub-Registos se encontram na
dependência do Registo Central Nacional, e que por sua vez os postos de controlo se encontram
na dependência destes. É nesta rede encabeçada pelo Registo Nacional (GNS) que os documentos
classificados se movimentam (Distribuição), e são Arquivados enquanto se mantenham relevantes
para a segurança e defesa do Estado. O Arquivo de matérias classificadas faz-se em Contentores,
Móveis de Segurança, e Casas Fortes, estes dividem-se em 3 classes a saber:
Classe A – Para guarda de documentos classificados com grau “Muito Secreto”;
Classe B – Para guarda de documentos classificados com grau “Secreto” e “Confidencial”;
Classe C – Para guarda de documentos classificados com grau “Reservado”.6
A quarta e última etapa da vida das informações classificadas é a sua Destruição, em geral esta
ocorre passados 5 anos sobre a permanência dos documentos em Arquivo e destina-se a evitar
acumulação desnecessária de documentos desactualizados e consequentemente considerados
irrelevantes.
Os meios de destruição adoptados mais comuns são o corte em tiras recorrendo a máquina
destruidora de papel, ou a inceneração. Neste campo não existem regras diferenciadas em razão
do grau de classificação.
Já no que toca aos Procedimentos de Destruição, estes variam, e no caso dos documentos
“Muito Secretos”, “Secretos”, e “Confidenciais” obrigam ao preenchimento dos respectivos
Certificados de Destruição. No caso dos graus “Muito Secretos” a sua destruição obedece a
5 Informação extraída do website do Gabinete Nacional de Segurança: http://www.gns.gov.pt/organograma/equipas-multidisciplinares/rc.aspx 6 Ver nº 5.6, do SEGNAC 1 (“Instruções para a Segurança Nacional, Salvaguarda e Defesa das Matérias Classificadas”); Resolução do Conselho de Ministros nº 50/88, de 3 de Dezembro.
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autorização prévia da entidade de origem e os referidos Certificados são documentos oficiais
assinados por 3 pessoas – “Aquela a quem a guarda do documento a destruir está confiada, o
responsável pela segurança, que actuará como testemunha da respectiva destruição, e uma
terceira pessoa desde que credenciada no grau conveniente, com acesso autorizado e não
interveniente no sistema de segurança em causa, de modo a evitar eventuais cumplicidades em
falsas destruições.” – e posteriormente enviados de volta à entidade de origem do documento,
preferencialmente por intermédio das mesmas entidades das quais tenha sido recebido, de modo
a atestar a autenticidade do procedimento de destruição, ou seja que a destruição ocorreu de facto.
Após a sua recepção os respectivos Certificados deverão ser conservados por um período de 10
anos, decorridos os quais deverão também ser destruídos.7
Em relação aos documentos “Secretos” e “Confidenciais”, não se requer autorização prévia de
destruição; os documentos “Secretos” também não obrigam a registo da sua destruição através de
certificado próprio, o registo pode ser feito na ficha de entrada do documento ou numa relação
própria; os documentos “Confidenciais” não obrigam a envio dos certificados de destruição à
entidade de origem mas estes deverão contudo permanecer guardados durante um período de 5
anos. Por fim os documentos “Reservados” dispensam as formalidades previamente descritas,
podem ser destruídos sempre que o responsável directo pela sua guarda e arquivo ache
conveniente, e os certificados de destruição podem ser assinados apenas pelo mesmo
responsável.8
Na recta final deste estudo falta apenas tecer algumas considerações relativamente à entidade
que dirige toda a actividade relacionada com guarda das Informações Classificadas e, logo que
dirige o Registo Central Nacional e, consequentemente os coordena a actuação dos Sub-Registos
e Postos de Controlo.
A entidade em causa é a Autoridade Nacional de Segurança (ANS) à qual, através do Gabinete
Nacional de Segurança (GNS) que dirige, cabe em regime de exclusividade a assegurar a protecção
e salvaguarda das Informações Classificadas.9 O GNS é um serviço central de administração
directa do Estado dirigido por um Director-Geral, que é por inerência a ANS, coadjuvado por dois
Subdirectores-Gerais, competindo a um destes a coordenação do CNCSeg (Centro Nacional de
7 Procedimentos de acordo com os dispostos no nº 7.4.2, do SEGNAC 1 (“Instruções para a Segurança Nacional, Salvaguarda e Defesa das Matérias Classificadas”); Resolução do Conselho de Ministros nº 50/88, de 3 de Dezembro. 8 Resumo dos dispostos pelos números 7.4.3, 7.4.4, e 7.4.5, do SEGNAC 1 (“Instruções para a Segurança Nacional, Salvaguarda e Defesa das Matérias Classificadas”); Resolução do Conselho de Ministros nº 50/88, de 3 de Dezembro. 9 Conforme o disposto no nº 2 do Art.º 1 (intitulado “Natureza”), do Decreto-Lei nº 3/2012, de 16 de Janeiro; Lei Orgânica do GNS.
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Cibersegurança), cargos de direcção superior de 1.º e 2.º grau, respectivamente.10 A sua actividade
desenvolve-se no âmbito da Presidência do Conselho de Ministros, conjuntamente com o Gabinete
Coordenador de Segurança, na directa dependência do Primeiro-Ministro ou membro do Governo
por este apontado. Não obstante a sua estrutura orgânica o GNS goza de autonomia administrativa.
O GNS tem por missão assegurar a segurança da Informação Classificada Nacional, bem como
no âmbito das organizações internacionais que Portugal integra; compete-lhe exercer a atribuição
das devidas credenciais às entidades – agentes civis ou militares, e Serviços de Segurança - para
o acesso às informações e dados classificados.
Integrado no GNS funciona o CNCSeg, cuja missão visa contribuir para que o ciberespaço
possa ser utilizado de forma livre, confiável e segura, através da promoção contínua da
cibersegurança nacional e da cooperação internacional, em articulação com todas as autoridades
competentes.
Compete-lhe ainda proceder à implementação dos protocolos de segurança necessários para
antecipar, detectar, reagir e recuperar de situações de ciberataques iminentes, que ameacem
directamente o regular funcionamento das infra-estruturas vitais, bem como os interesses
fundamentais do Estado.11
Ao nível da sua organização interna o GNS obedece ao modelo de estrutura matricial.12
Finalmente em relação aos Serviços de Informações, às Forças de Segurança, e aos demais
Organismos de Segurança competentes em matéria de protecção e salvaguarda da Informação
Classificada, o GNS deve actuar com estas em regime de Coordenação e tem ainda o dever de
colaborar com estas na prossecução das suas missões e objectivos. Para assegurar que tal seja
possível, e a bem da salvaguarda das funções que lhe estão atribuídas, deverá o GNS estabelecer
protocolos ou quaisquer outras formas de cooperação eficazes com as entidades nacionais ou
estrangeiras que forem relevantes.
O dever de colaboração implica reciprocidade relativamente às instituições abrangidas, assim se
por um lado deverá o GNS cooperar com as entidades de segurança de modo a garantir um
dispositivo de Segurança eficaz e mais completo a nível de Informação, por outro lado o GNS
poderá solicitar toda a colaboração a quaisquer outras entidades de segurança ou serviços de
10 Ver Artigos 3º (“Órgãos”) e 4º (“Director-Geral”) respectivamente, do Decreto-Lei nº 3/2012, de 16 de Janeiro; Lei Orgânica do GNS. 11 Ver Art.º 2 do Decreto-Lei nº 69/2014, de 9 de Maio - Alteração ao Decreto-Lei nº 3/2012, de 16 de Janeiro; Lei Orgânica do GNS. 12 Ver Art.º 5 (“Tipo de Organização Interna”) do Decreto-Lei nº 3/2012, de 16 de Janeiro; Lei Orgânica do GNS.
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informações, bem como aceder aos locais, equipamentos e suportes que sirvam ao manuseamento
de Informação Classificada, sempre a que achar necessário para salvaguardar o bom desempenho
no exercício das suas funções.13
CONCLUSÃO Assim chegamos ao “terminus” deste breve estudo sobre a Informação Classificada que,
como se pôde observar à medida que fomos avançando nos capítulos e desenvolvendo a sua
análise, configura uma temática muito abrangente, quer em termos das suas áreas de actuação,
quer ao nível das entidades competentes para a sua gestão e guarda, ou ainda pelo regime restritivo
a que está sujeita pela legislação em vigor. Por isso não faria sentido terminar sem fazer algumas
breves reflexões sobre o tema em causa.
Fica clara uma ideia central no âmbito deste estudo: Nada relacionado com esta área é
simples nem pode ser encarado de forma leviana.
Os riscos que a adopção de tal atitude comporta são elevados, e podem causar danos de
enorme magnitude ao Estado, colocando em causa a integridade da sua ordem interna, a segurança
do Regime e da População, e inclusivé a sua própria soberania e independência. O mundo
contemporâneo apresenta novos desafios de Segurança aos Estados, a Globalização e os seus
efeitos trouxeram novas ameaças que vieram alterar profundamente o paradigma da segurança,
até então assente no sistema de equilíbrio de poder bipolar (EUA/URSS) adoptado durante a Guerra
Fria.
Poder-se-á afirmar que o maior impacto sentido desde o advento do actual sistema
Multipolar foi a noção generalizada de que nunca antes o mundo foi um palco tão complexo e
inseguro. Essa percepção é comum tanto aos Estados como à população em geral, e obriga a
algumas considerações de carácter analítico.
Se por um lado no período que intermediou a 2ª Guerra Mundial e o final da Guerra Fria as
ameaças eram relativamente previsíveis, pois centravam-se essencialmente na possibilidade de
conflitos bélicos entre Estados – o caso mais relevante foi a tensão entre os EUA e a ex-URSS,
sobre a qual pairava a ameaça de uma guerra nuclear – que consequentemente abriam espaço à
progressão de actividades de Espionagem e Sabotagem e, mais tarde, até ao início da década de
2000 foram surgindo outras ameaças de carácter transnacional, como o Crime Organizado e o
Cibercrime; por outro lado após os atentados de 11 de Setembro de 2001, o paradigma da
13 Ver Art.º 9 (“Cooperação e Dever de Colaboração”) do Decreto-Lei nº 3/2012, de 16 de Janeiro; Lei Orgânica do GNS.
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segurança sofreu uma nova mutação que trouxe novas ameaças, caso do Terrorismo que se
afirmou como uma das maiores ameaças do mundo moderno e que vem sofrendo alterações
substanciais quanto aos seus métodos de actuação, crescentemente mais sofisticados e
complexos; ou do novo fenómeno da Segurança Energética, que obriga os Estados a repensar as
suas estratégias internacionais tendo em conta a crescente escassez de recursos naturais
(“Commodities”), como o petróleo, a volatilidade que essa situação provoca nos mercados
internacionais e, a forma como isso pode afectar cada Estado individualmente. É seguro afirmar
que o mundo se tornou um local mais inseguro e crescentemente mais imprevisível, assim o tema
da Segurança está na ordem do dia e, nesse sentido os Serviços de Informações contribuem
decisivamente para aumentar o sentimento de Segurança dos Estados, através da produção de
Informações.
A Segurança não é um estado permanente e está longe de estar garantida, partir dessa
premissa configura um erro perigoso e, revela de algum modo uma visão algo “naïve” perante a
realidade global.
A Segurança resulta da soma perfeita entre a actuação e a coordenação de todos os meios
e dispositivos de Defesa dos quais o Estado dispõe; cria-se através da adopção de estratégias
cuidadosamente gizadas, e obtém-se levando a cabo acções selectivas de modo a Prevenir as
diversas ameaças que pairam permanentemente sobre os Estados. Apostar na Prevenção é a
melhor garantia de Segurança, nesse sentido a Informação Classificada e os Serviços de
Informações desempenham um papel fundamental. Só é possível alcançar bons níveis de
Segurança se os Serviços de Informações - as suas instalações bem como todas as actividades
que desenvolvem - estiverem perfeitamente protegidos contra todas as ameaças possíveis, entre
as quais fugas e perdas de Informação Classificada decorrentes de acessos não autorizados. Nesse
sentido e considerando as novas ameaças que rapidamente surgem à Segurança do Nacional, é
fundamental fazer uma reflexão séria sobre que estratégia de segurança o Estado pretende adoptar
para o futuro e, a meu ver, seja qual for o rumo traçado terá sempre que contar com o apoio dos
Serviços de Informações. Assim é absolutamente necessário que se reformem os Serviços de
Informações, dotando-os de mais e melhores meios para que possam reforçar a sua actividade ao
serviço da Segurança Nacional e, consequentemente possam contribuir para prevenir e evitar
quaisquer ameaças que possam surgir.
Termino com uma última reflexão; considerando tudo o que atrás foi dito urge que os
Estados, e no caso de Portugal mais ainda, apostem em reforçar os meios de segurança de que
dispõem, aumentem e melhorem cada vez mais os seus dispositivos de Segurança, entre os quais
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os Serviços de Informações, sob pena de estarem cada vez mais vulneráveis a ameaças como por
exemplo, o progressivo avanço do Terrorismo através dos apelos do autoproclamado “Estado
Islâmico” a uma “Jihad” (Guerra Santa) contra o Ocidente, com vista à sua conquista e islamização.
Os Estados Ocidentais, e particularmente os Europeus, têm adoptado uma estratégia de
redução substancial dos exércitos e dos meios bélicos de defesa à sua disposição; é inegável a
vulnerabilidade em que nos encontramos, com uma capacidade de defesa quase nula contra uma
ameaça ainda mal conhecida e em constante mutação, sem a contribuição inestimável dos Serviços
de Segurança, e da Informação Classificada a vulnerabilidade seria quase total. Por isso parece-
me pertinente que se repensem as estratégias relativamente ao investimento na área da Defesa,
pois sendo certo que a Informação Classificada é fundamental, por si só não garante a Segurança
Nacional. Deixo este último ponto para reflexão dos leitores.
BIBLIOGRAFIA Bacelar Gouveia, Jorge; Santos, Sofia (2015) - “Enciclopédia de Direito e Segurança”
Pires Coelho, Eduardo M. – apresentação “Segurança da Informação Classificada”
Pires Coelho, Eduardo M. – apresentação “Gabinete Nacional de Segurança”
Website GNS - http://www.gns.gov.pt/
Website SIRP - http://www.sirp.pt/cms/view/id/1
Website SIED - http://www.sied.pt/missaovv.html
Website SIS - http://www.sis.pt/missao.html
GNS, Lei Orgânica – Decreto-Lei nº 3/2012, de 16 de Janeiro;
GNS, Primeira alteração à Lei Orgânica – Decreto-Lei nº 162/2013, de 4 de Dezembro;
GNS, Segunda alteração à Lei Orgânica – Decreto-Lei nº 69/2014, de 9 de Maio;
SIRP, Quarta alteração e republicação da Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro - Lei Orgânica
n.º 4/2004, de 6 de Novembro; Lei-Quadro do SIRP;
SIRP, Redacção Original da Lei-Quadro do SIRP - Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro;
SIED, Lei-Quadro do SIRP - Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de Novembro;
SIED, Lei Orgânica do SIRP - Lei n.º 9/2007, de 19 Fevereiro;
SIED, Lei de Segurança Interna - Lei n.º 53/2008, 29 de Agosto;
SIS, Lei-Quadro do SIRP – Lei Orgânica nº 4/2004, de 6 de Novembro;
SIS, Lei Orgânica do SIRP – Lei nº 9/2007, de 19 de Fevereiro;
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SIS, SEGNAC 1 - Resolução do Conselho de Ministros nº 50/88, de 3 de Dezembro;
“Regras relativas a Matérias Classificadas”
SIS, Lei do Segredo de Estado – Lei nº 6/94, de 7 de Abril;
SIS, Lei do Sistema de Segurança Interna – Lei nº 53/2008, de 29 de Agosto.