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Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO DESAPROPRIAÇÃO Delimitação do valor da indenização por desapropriação. SERVIDORES PÚBLICOS Impossibilidade de acumulação de cargos se a jornada semanal ultrapassar 60h. Restituição de valores recebidos. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Fracionamento da contratação para burlar a licitação. Revisão das sanções impostas em sede de recurso especial. DIREITO CIVIL RESPONSABILIDADE CIVIL Utilização indevida da imagem da pessoa em propaganda político-eleitoral. Danos morais por encerramento de curso de graduação. Ausência de coleta das células-tronco no momento do parto e aplicação da perda de uma chance. CONDOMÍNIO Rateio das despesas feitas para ajuizar ação contra um dos condôminos. Inviabilidade de ação de prestação de contas ajuizada por condômino. DIREITO NOTARIAL E REGISTRAL PROTESTO DE TÍTULO Responsabilidade pela baixa após o pagamento DIREITO EMPRESARIAL RECUPERAÇÃO JUDICIAL Magistrado não pode fazer análise da viabilidade econômica do plano de recuperação judicial. DIREITO PROCESSUAL CIVIL COMPETÊNCIA Análise do “caso Portuguesa”. EXECUÇÃO FISCAL Extinção da execução por abandono da Fazenda Pública. PROCESSO COLETIVO Termo inicial dos juros de mora na ACP.

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Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO

DESAPROPRIAÇÃO Delimitação do valor da indenização por desapropriação. SERVIDORES PÚBLICOS Impossibilidade de acumulação de cargos se a jornada semanal ultrapassar 60h. Restituição de valores recebidos. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Fracionamento da contratação para burlar a licitação. Revisão das sanções impostas em sede de recurso especial.

DIREITO CIVIL

RESPONSABILIDADE CIVIL Utilização indevida da imagem da pessoa em propaganda político-eleitoral. Danos morais por encerramento de curso de graduação. Ausência de coleta das células-tronco no momento do parto e aplicação da perda de uma chance. CONDOMÍNIO Rateio das despesas feitas para ajuizar ação contra um dos condôminos. Inviabilidade de ação de prestação de contas ajuizada por condômino.

DIREITO NOTARIAL E REGISTRAL

PROTESTO DE TÍTULO Responsabilidade pela baixa após o pagamento

DIREITO EMPRESARIAL

RECUPERAÇÃO JUDICIAL Magistrado não pode fazer análise da viabilidade econômica do plano de recuperação judicial.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

COMPETÊNCIA Análise do “caso Portuguesa”. EXECUÇÃO FISCAL Extinção da execução por abandono da Fazenda Pública. PROCESSO COLETIVO Termo inicial dos juros de mora na ACP.

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DIREITO PENAL

CRIME CONTINUADO Inexistência de continuidade delitiva entre roubo e extorsão. EFEITOS DA CONDENAÇÃO Perda do cargo, função pública ou mandato eletivo (art. 92, I, do CP). INVASÃO DE DOMICÍLIO (ART. 150 DO CP) Configura invasão de domicílio a invasão de gabinete de Delegado de Polícia. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL (ART. 184 DO CP) Regras sobre procedimento e perícia. LEI DE DROGAS A condenação pelo art. 28 da LD gera reincidência.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

COMPETÊNCIA Tortura cometida contra brasileiro no exterior. CITAÇÃO POR EDITAL Oitiva de policiais como prova antecipada de prova urgente (art. 366 do CPP).

DIREITO ADMINISTRATIVO

DESAPROPRIAÇÃO Delimitação do valor da indenização por desapropriação

Nas desapropriações para fins de reforma agrária, o valor da indenização deve ser contemporâneo à avaliação efetivada em juízo, tendo como base o laudo adotado pelo juiz para a fixação do justo preço, pouco importando a data da imissão na posse ou mesmo a da avaliação administrativa.

De fato, a avaliação efetivada em juízo, ordinariamente, deverá se reportar à época em que for realizada – e não ao passado – para fixar a importância correspondente ao bem objeto da expropriação, haja vista que exigir que esses trabalhos técnicos refiram-se à realidade passada (de anos, muitas vezes) pode prejudicar a qualidade das avaliações e o contraditório.

Quando o art. 26 do DL 3.365/41 afirma que a indenização, em regra, deverá corresponder ao valor do imóvel apurado na data da perícia, ela está se referindo à avaliação judicial.

STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1.459.124-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, 18/9/2014 (Info 549).

CONCEITO DE DESAPROPRIAÇÃO Desapropriação é:

o procedimento administrativo

pelo qual o Poder Público transfere para si

compulsoriamente

a propriedade de bem pertencente a terceiro,

por razões de utilidade pública,

de necessidade pública ou

de interesse social,

pagando, por isso, indenização prévia, justa e, como regra, em dinheiro.

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Trata-se de forma originária de aquisição de propriedade, porque não provém de nenhum título anterior. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE DESAPROPRIAÇÃO O procedimento administrativo de desapropriação divide-se em duas fases: a) Fase declaratória; b) Fase executória. a) Fase declaratória Inicia o procedimento de desapropriação. É publicado um ato de declaração expropriatória (decreto ou lei expropriatória). O Poder Público declara formalmente sua intenção de transferir a propriedade do bem para o seu patrimônio ou para o de pessoa delegada, declarando ainda a existência da utilidade ou necessidade pública, ou do interesse social relacionado com aquele bem. b) Fase executória Começa logo após a fase declaratória. Após declarar interesse no bem, o Poder Público faz uma avaliação administrativa do preço do imóvel e toma as medidas necessárias para transferi-lo ao seu patrimônio. A transferência do bem poderá ocorrer por duas formas: b.1) Via administrativa: quando o expropriado aceita o valor oferecido pelo Poder Público como indenização pelo bem. Chamada de “desapropriação amigável”; b.2) Via judicial: quando o expropriado não aceita o valor oferecido pelo Poder Público. Neste caso, encerra-se a etapa administrativa e o Poder Público terá que ajuizar uma “ação de desapropriação”. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO Conceito Trata-se de ação proposta pelo Poder Público contra o expropriado que não concordou com o valor oferecido como indenização pela desapropriação de seu bem. Na petição inicial deve constar o valor da indenização oferecida ao expropriado. Perícia O juiz, quando recebe a Inicial, já determina a realização da prova pericial sobre o bem. Contestação A contestação somente poderá versar sobre:

vício do processo judicial (questões processuais);

impugnação do preço (valor da indenização). Imissão provisória na posse Em regra, a posse do Poder Público sobre o bem somente ocorre quando tiver terminado o processo de desapropriação e paga a indenização. No entanto, o juiz pode determinar a imissão provisória na posse, ou seja, que o Poder Público fique com a posse do bem mesmo antes do processo chegar ao final. Requisitos para a imissão provisória Para a imissão provisória na posse são necessários dois requisitos:

urgência da medida;

depósito do valor do bem, segundo critérios definidos na lei. Cumpridos os requisitos acima, é direito subjetivo do expropriante a imissão provisória.

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Sentença O juiz, com base no laudo pericial, fixará na sentença o valor da justa indenização. A sentença que julga a desapropriação gera os seguintes efeitos:

autoriza a imissão definitiva na posse;

constitui título hábil para o registro da propriedade do bem no Registro de Imóveis. Valor da indenização

O Decreto-Lei n. 3.365/41 determina que o valor da indenização será calculado com base no preço do imóvel no momento da perícia (avaliação). Veja:

Art. 26. No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado.

A avaliação de que trata esse artigo é a administrativa ou a judicial? Em outras palavras, o valor da indenização a ser paga será calculado com base no preço do imóvel no momento da avaliação administrativa ou judicial? Avaliação judicial. Nas desapropriações para fins de reforma agrária, o valor da indenização deve ser contemporâneo à avaliação efetivada em juízo, tendo como base o laudo adotado pelo juiz para a fixação do justo preço, pouco importando a data da imissão na posse ou mesmo a da avaliação administrativa. De fato, a avaliação efetivada em juízo, ordinariamente, deverá se reportar à época em que for realizada – e não ao passado – para fixar a importância correspondente ao bem objeto da expropriação, haja vista que exigir que esses trabalhos técnicos refiram-se à realidade passada (de anos, muitas vezes) pode prejudicar a qualidade das avaliações e o contraditório. Logo, quando o art. 26 do DL 3.365/41 afirma que a indenização, em regra, deverá corresponder ao valor do imóvel apurado na data da perícia, ela está se referindo à avaliação judicial.

SERVIDORES PÚBLICOS Impossibilidade de acumulação de cargos se a jornada semanal ultrapassar 60h

Importante!!!

Mudança de entendimento!

É vedada a acumulação de dois cargos públicos quando a soma da carga horária referente aos dois cargos ultrapassar o limite máximo de 60 horas semanais.

No caso concreto, a servidora acumulava dois cargos públicos privativos de profissionais de saúde e a soma da carga horária semanal de ambos era superior a 60 horas. A servidora foi notificada para optar por um dos dois cargos, tendo se mantido inerte. Diante disso, foi demitida de um deles por acumulação ilícita de cargos públicos. A servidora impetrou mandado de segurança, mas o STJ reconheceu que a demissão foi legal.

STJ. 1ª Seção. MS 19.336-DF, Rel. originária Min. Eliana Calmon, Rel. para acórdão Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 26/2/2014 (Info 549).

É possível que a pessoa acumule mais de um cargo ou emprego público? Em regra: NÃO. A CF/88 proíbe a acumulação remunerada de cargos ou empregos públicos.

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Exceções: a própria CF/88 prevê exceções a essa regra. Veja o que dispõe o art. 37, XVI:

XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: a) a de dois cargos de professor; b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;

No caso dos servidores públicos federais, importante mencionar que o tema foi regulamentado pela Lei nº 8.112/90:

Art. 118. Ressalvados os casos previstos na Constituição, é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos. (...) § 2º A acumulação de cargos, ainda que lícita, fica condicionada à comprovação da compatibilidade de horários.

Parecer-AGU nº GQ-145/1998: Com o objetivo de disciplinar a matéria, a Advocacia Geral da União (AGU) emitiu o parecer nº GQ-145, vinculante, afirmando que o servidor somente poderá acumular cargos se houver compatibilidade de horário e desde que a jornada máxima não ultrapasse 60 horas semanais. Assim, para a AGU, mesmo que exista compatibilidade de horários, se a jornada semanal ficar acima de 60 horas, a acumulação não seria permitida, considerando que o servidor estaria muito cansado e isso atrapalharia seu desempenho funcional, em prejuízo ao princípio constitucional da eficiência. TCU Acórdão 2.133/05 A jurisprudência do TCU também tem se manifestado no mesmo sentido da AGU, admitindo como limite máximo em casos de acumulação de cargos ou empregos públicos a jornada de trabalho de 60 horas semanais. É o caso, por exemplo, do Acórdão 2.133/05. Os servidores não concordaram com este entendimento e recorreram à Justiça para que pudessem manter a acumulação de cargos mesmo se a jornada semanal for superior a 60 horas. O STJ acolheu o pedido dos servidores? É possível que o servidor acumule dois cargos públicos mesmo que a soma das jornadas ultrapasse 60 horas semanais? NÃO. O STJ decidiu que é vedada a acumulação de cargos públicos quando a soma da carga horária referente aos dois cargos ultrapassar o limite máximo de 60 horas semanais. Segundo o STJ, como a possiblidade de acumulação é exceção, esta acumulação de cargos deve ser interpretada de forma restritiva. Ademais, a acumulação remunerada de cargos públicos deve atender ao princípio constitucional da eficiência. O servidor precisa estar em boas condições físicas e mentais para bem exercer as suas atribuições, o que certamente depende de adequado descanso no intervalo entre o final de uma jornada de trabalho e o início da outra, sendo isso impossível em condições de sobrecarga de trabalho. Observa-se, assim, que a jornada excessiva de trabalho atinge a higidez física e mental do profissional de saúde, comprometendo a eficiência no desempenho de suas funções. Obs: o julgado acima tratava especificamente de impetrante que era servidora da área de saúde. No entanto, penso que o entendimento vale também para as demais hipóteses de acumulação previstas nas alíneas “a” e “b” do inciso XVI do art. 37 da CF/88.

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SERVIDORES PÚBLICOS Restituição de valores recebidos

Importante!!!

I – Se o servidor público recebe valores por força de decisão administrativa posteriormente revogada: NÃO é devida a restituição ao erário dessa quantia. Há boa-fé do servidor.

II – Se o servidor público recebe valores por força de decisão judicial posteriormente revogada: É devida a restituição ao erário dessa quantia. Não há boa-fé.

III – Se o servidor público recebe valores por sentença judicial transitada em julgado. Posteriormente, esta sentença é desconstituída em ação rescisória: NÃO é devida a restituição da quantia. Há boa-fé.

STJ. 1ª Seção. EAREsp 58.820-AL, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 8/10/2014 (Info 548).

RECEBIMENTO DE VALORES POR MEIO DE DECISÃO ADMINISTRATIVA

Se o servidor público recebe valores por força de decisão administrativa posteriormente revogada, tal quantia poderá ser exigida de volta pela Administração Pública? NÃO. O STJ possui entendimento pacífico no sentido de que é incabível a restituição ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da Administração Pública. Em virtude do princípio da legítima confiança, o servidor público, em regra, tem a justa expectativa de que são legais os valores pagos pela Administração Pública, porque jungida à legalidade estrita. Assim, diante da ausência da comprovação da má-fé no recebimento dos valores pagos indevidamente por erro de direito da Administração, não se pode efetuar qualquer desconto na remuneração do servidor público a título de reposição ao erário. STJ. 1ª Seção. REsp 1.244.182-PB, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 10/10/2012 (recurso repetitivo). Posição do TCU sobre o tema Vale a pena conhecer também o entendimento do TCU, que é parecido com o do STJ, apesar de um pouco mais rigoroso com o servidor ao exigir que o erro seja escusável.

Súmula 249 do TCU: É dispensada a reposição de importâncias indevidamente percebidas, de boa-fé, por servidores ativos e inativos, e pensionistas, em virtude de erro escusável de interpretação de lei por parte do órgão/entidade, ou por parte de autoridade legalmente investida em função de orientação e supervisão, à vista da presunção de legalidade do ato administrativo e do caráter alimentar das parcelas salariais.

Posição da AGU Vejam a posição da AGU, que trilha no mesmo sentido do STJ, acrescentando, no entanto, que o pagamento indevido pode ocorrer, além da interpretação errônea, pela má aplicação da lei ou erro da Administração:

Súmula 34 da AGU: É incabível a restituição de valores de caráter alimentar percebidos de boa-fé, por servidor público, em virtude de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração.

RECEBIMENTO DOS VALORES POR MEIO DE DECISÃO JUDICIAL

Se o servidor público recebe valores por força de decisão judicial posteriormente revogada, tal quantia poderá ser exigida pela Administração Pública? SIM. É devida a restituição ao erário dos valores de natureza alimentar pagos pela Administração Pública a servidores públicos em cumprimento a decisão judicial precária posteriormente revogada.

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O STJ entende que, neste caso, não se pode falar em boa-fé do servidor, considerando que ele sabia que poderia haver alteração da decisão que tinha caráter precário (provisório). (STJ. 1ª Seção. EAREsp 58.820-AL, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 8/10/2014). O servidor público recebe valores por sentença judicial transitada em julgado. Posteriormente, esta sentença é desconstituída em ação rescisória. O servidor deverá devolver as quantias percebidas? NÃO. A jurisprudência do STJ firmou o entendimento no sentido de que não é devida a restituição dos valores que, por força de decisão transitada em julgado, foram recebidos de boa-fé, ainda que posteriormente tal decisão tenha sido desconstituída em ação rescisória (STJ. 1ª Turma. AgRg no AREsp 2.447/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 17/04/2012). O entendimento consolidado segundo o qual é legítimo o desconto de valores pagos em razão do cumprimento de decisão judicial precária, posteriormente revogada, não tem aplicação neste caso, porque aqui o pagamento decorreu de sentença judicial definitiva, que só depois foi desconstituída em ação rescisória (STJ. 1ª Turma. AgRg no AREsp 463.279/RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 02/09/2014).

SITUAÇÃO TERÁ QUE DEVOLVER?

I – Servidor recebe por decisão ADMINISTRATIVA depois revogada: NÃO

II – Servidor recebe por decisão JUDICIAL não definitiva depois reformada: SIM

III – Servidor recebe por sentença TRANSITADA EM JULGADO e que posteriormente é rescindida:

NÃO

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Fracionamento da contratação para burlar a licitação

Para a condenação por ato de improbidade administrativa no art. 10, é indispensável a demonstração de que ocorreu efetivo dano ao erário.

O Prefeito que contrata, sem licitação, empresa para fornecer material para o Município burlando o procedimento licitatório por meio da prática conhecida como fracionamento do contrato, comete ato de improbidade administrativa (art. 10, VII).

Para o STJ, em casos de fracionamento de compras e contratações com o objetivo de se dispensar ilegalmente o procedimento licitatório o prejuízo ao erário é considerado presumido (in re ipsa), na medida em que o Poder Público, por força da conduta ímproba do administrador, deixa de contratar a melhor proposta, o que gera prejuízos aos cofres públicos.

Segundo o art. 21, I, da Lei 8.429/92, o autor do ato de improbidade somente poderá receber a sanção de ressarcimento ao erário se ficar comprovada a efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público. Tratando-se de fracionamento de licitação, o prejuízo ao patrimônio público é presumido, de forma que o autor do ato de improbidade poderá ser condenado a ressarcir o erário.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.376.524-RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 2/9/2014 (Info 549).

Art. 10 da Lei de Improbidade

O art. 10 da Lei n. 8.429/92 elenca condutas que configuram atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário. Confira o que diz o caput:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

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Elemento subjetivo Os atos de improbidade do art. 10 são os únicos que podem ser praticados na forma culposa. Nos arts. 9º e 11, exige-se dolo. Já no art. 10, o ato de improbidade estará caracterizado caso o agente tenha atuado com dolo ou culpa. Efetivo dano Segundo entende o STJ, para a condenação por ato de improbidade administrativa no art. 10, é indispensável a demonstração de que ocorreu efetivo dano ao erário (STJ. 1ª Turma. AgRg no AREsp 18.317/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 05/06/2014). Erário X Patrimônio público A doutrina faz diferença entre os conceitos de erário e patrimônio público. Erário são os recursos financeiros dos cofres públicos (aspecto econômico). Patrimônio público, por sua vez, é uma expressão mais ampla e abrange não apenas os bens de conteúdo econômico (recursos financeiros), incluindo outros valores e direitos, como os bens artísticos, estéticos, históricos ou turísticos. Apesar de essa distinção ser comum na doutrina, o STJ não a adota em seus julgados quando trata sobre o tema improbidade administrativa. Assim, você irá encontrar acórdãos falando em prejuízo ao erário e prejuízo ao patrimônio público como se fossem expressões sinônimas. Desse modo, em concurso público no qual se exija o entendimento do STJ, será correta a alternativa que afirme que o art. 10 da lei de improbidade administrativa exige efetivo dano ao erário ou efetivo dano ao patrimônio público. Por outro lado, pode ser que lhe indaguem em uma prova discursiva ou oral a distinção entre erário e patrimônio público. Exemplo de improbidade do art. 10: Prefeito e servidores do município, em conluio, desviaram sacos de cimento, adquiridos pela municipalidade para obras públicas, distribuindo tais materiais a particulares e convocando o servidor responsável pelo almoxarifado para assinar as notas fiscais dos sacos como se os tivesse recebido (STJ. 1ª Turma. REsp 1197136/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 03/09/2013). Imagine agora a seguinte situação: O Prefeito contratou, sem licitação, uma empresa para fornecer areia para o Município a fim de que fossem realizadas obras públicas. Ocorre que, para fugir da licitação, o Prefeito fracionou as compras, ou seja, realizou várias compras separadas para que sempre ficasse abaixo do limite previsto no art. 24, II, da Lei n. 8.666⁄93. Em outras palavras, a compra era de grande porte e não poderia ser feita por dispensa de licitação (art. 24, II), mas ele dividiu (fracionou) em várias pequenas compras para burlar a exigência de licitação. Esse Prefeito foi acusado da prática de improbidade administrativa, tipificada no inciso VII do art. 10:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

Houve, no caso, prejuízo ao erário? Como o MP irá demonstrar isso? SIM. O prejuízo ao erário, na situação narrada, é presumido (in re ipsa). Para o STJ, em casos de fracionamento de compras e contratações com o objetivo de se dispensar ilegalmente o procedimento licitatório, o prejuízo ao erário é considerado presumido (in re ipsa), na medida em que o Poder Público, por força da conduta ímproba do administrador, deixa de contratar a melhor proposta, o que gera prejuízos aos cofres públicos (STJ. 2ª Turma. REsp 1280321⁄MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 06⁄03⁄2012).

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Assim, a indevida dispensa de licitação, por impedir que a administração pública contrate a melhor proposta, causa dano in re ipsa, descabendo exigir do autor da ação civil pública prova a respeito do tema (STJ. 2ª Turma. REsp 817.921⁄SP, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 27⁄11⁄2012). O Prefeito (sujeito ativo do ato de improbidade) poderá ser condenado a ressarcir o erário?

SIM. Segundo o art. 21, I, da Lei n. 8.429/92, o autor do ato de improbidade somente poderá receber a sanção de ressarcimento ao erário se ficar comprovada a efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público:

Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta lei independe: I - da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de ressarcimento;

No caso concreto, como se trata de fracionamento de licitação, o prejuízo ao patrimônio público é presumido, de forma que o autor do ato de improbidade poderá ser condenado a ressarcir o erário.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Revisão das sanções impostas em sede de recurso especial

As penalidades aplicadas em decorrência da prática de ato de improbidade administrativa podem ser revistas em recurso especial desde que esteja patente a violação aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

O STJ entende que isso não configura reexame de prova, não encontrando óbice na Súmula 7 da Corte (A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial).

STJ. 1ª Seção. EREsp 1.215.121-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/8/2014 (Info 548).

Imagine a seguinte situação adaptada: João foi réu em uma ação de improbidade administrativa, tendo sido condenado às seguintes sanções (art.

12 da Lei n. 8.429/92):

Perda dos bens acrescidos ilicitamente ao seu patrimônio;

Ressarcimento integral do dano;

Perda da função pública;

Suspensão dos direitos políticos por 8 anos;

Pagamento de multa civil de 3 vezes o valor do acréscimo patrimonial. O condenado interpôs apelação afirmando que as sanções impostas foram excessivas, violando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. O Tribunal de Justiça, no entanto, manteve a sentença na íntegra, razão pela qual João interpôs recurso especial alegando que o acórdão não levou em consideração a extensão do dano e o proveito econômico

ocorridos no caso concreto, afrontando, assim, o parágrafo único do art. 12 da Lei n. 8.429/92:

Art. 12. (...) Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

O STJ poderá rever as sanções impostas ou tal pedido implica reexame de prova, encontrando óbice na Súmula 7 da Corte (A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial)? O STJ poderá conhecer do recurso. É possível, em sede de recurso especial, a revisão das sanções impostas por improbidade administrativa, desde que violados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

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EXERCÍCIO DA ADVOCACIA E CARGOS PÚBLICOS Incompatibilidade ou impedimento para o exercício da advocacia

Compete exclusivamente à OAB averiguar se o caso é de incompatibilidade ou de impedimento para o exercício da advocacia e decidir em qual situação devem ser enquadrados os ocupantes de cargos ou funções referidos nos arts. 28 a 30 do Estatuto da Advocacia.

STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1.448.577-RN, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 7/8/2014 (Info 549).

Incompatibilidade e impedimento para o exercício da advocacia

O Estatuto da OAB (Lei n. 8.906/94) prevê determinadas situações em que a pessoa não poderá exercer a advocacia. Tais hipóteses são divididas em dois grupos:

INCOMPATIBILIDADE IMPEDIMENTO

Trata-se de uma proibição TOTAL. Isso significa que a pessoa não poderá exercer a advocacia em nenhum caso. As hipóteses estão previstas no art. 28. Exs: magistrados, membros do MP, militares, policiais, gerentes de instituições financeiras.

Trata-se de uma proibição PARCIAL. Isso significa que a pessoa não poderá exercer a advocacia em determinadas situações. As hipóteses estão previstas no art. 30. Ex: os servidores da administração pública contra a Fazenda Pública que os remunere.

Imagine agora a seguinte situação: Determinado servidor público tentou fazer sua inscrição na OAB, tendo sido negada sob o argumento de que o cargo que ele desempenhava enquadrava-se como uma hipótese de incompatibilidade (art. 28), ou seja, uma proibição total. Diante disso, ele impetrou mandado de segurança afirmando que a interpretação dada pela OAB estava equivocada e que a situação se amoldava à hipótese de impedimento (art. 30), de forma que ele poderia sim obter a inscrição. O STJ concordou com o argumento do autor? NÃO. Segundo o STJ, compete exclusivamente à OAB averiguar se o caso é de incompatibilidade ou de impedimento para o exercício da advocacia e decidir em qual situação devem ser enquadrados os ocupantes de cargos ou funções referidos nos arts. 28 a 30 do Estatuto da Advocacia.

DIREITO CIVIL

BEM DE FAMÍLIA Desconsideração da personalidade jurídica e impenhorabilidade do bem de família dos sócios

A desconsideração da personalidade jurídica de sociedade empresária falida que tenha sido decretada em decorrência de fraude contra a massa falida não implica, por si só, o afastamento da impenhorabilidade dos bens de família dos sócios.

Em outras palavras, o simples fato de ter sido decretada a desconsideração da personalidade jurídica, por si só, não permite que seja penhorado o bem de família pertencente aos sócios, salvo se os atos que ensejaram a desconsideração também se ajustarem às exceções legais previstas no art. 3º da Lei n. 8.009/90. Tais exceções devem ser interpretadas restritivamente, não se podendo, por analogia ou esforço hermenêutico, apanhar situações não previstas em lei, de modo a superar a proteção conferida à entidade familiar.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.433.636-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/10/2014 (Info 549).

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Imagine a seguinte situação adaptada: João e Pedro eram sócios da sociedade empresária “X”, que acabou indo à falência. Durante o processo de falência, ficou constatado que houve abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade (houve fraude contra credores), razão pela qual o juiz decretou a desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 50 do CC. Diante disso, o magistrado determinou a penhora dos bens dos sócios. Quanto à Pedro, não havia nenhum bem em seu nome. No entanto, no que se refere a João, conseguiu-se a penhora do único imóvel que possuía, um apartamento onde vivia com sua esposa e filhos. João pediu o levantamento da penhora alegando justamente que o referido imóvel era bem de família. O juiz, contudo, negou o pleito afirmando que o bem de família pode ser penhorado quando há fraude contra credores ou fraude à execução. Agiu corretamente o juiz? A penhora que recaiu sobre esse imóvel deve ser mantida? NÃO. Isso porque o imóvel onde ele mora é considerado bem de família, sendo impenhorável, conforme

previsto no art. 1º da Lei n. 8.009/90. As únicas hipóteses em que é possível a penhora do bem de família estão elencadas no art. 3º, dentre as quais não se inclui a fraude contra credores ou fraude à execução. Assim, segundo decidiu o STJ, a desconsideração da personalidade jurídica de sociedade empresária falida que tenha sido decretada em decorrência de fraude contra a massa falida não implica, por si só, o afastamento da impenhorabilidade dos bens de família dos sócios. A desconsideração da personalidade jurídica, de um modo geral, não pode, por si só, afastar a impenhorabilidade do bem de família, salvo se os atos que ensejaram a disregard também se ajustarem às

exceções legais previstas no art. 3º da Lei n. 8.009/90. Embora o instituto da desconsideração da personalidade jurídica se apresente como importante mecanismo de recuperação de crédito, combate a fraude e, por consequência, fortalecimento da segurança do mercado, esses nobres propósitos não se sobrepõem aos valores legais e constitucionais subjacentes à proteção do bem de família. Mesmo que a pessoa tenha praticado fraude à execução ou fraude contra credores, tal circunstância, por si só, não se encontra prevista no art. 3º como exceção à regra legal da impenhorabilidade de bens de família.

Vale ressaltar, por fim, que a proteção legal conferida pela Lei n. 8.009/90, consectária da proteção constitucional e internacional do direito à moradia, não tem como destinatária apenas a pessoa do devedor; na verdade, protege-se também a sua família quanto ao fundamental direito à vida digna.

RESPONSABILIDADE CIVIL Utilização indevida da imagem da pessoa em propaganda político-eleitoral

Configura dano moral indenizável a divulgação não autorizada da imagem de alguém em material impresso de propaganda político-eleitoral, independentemente da comprovação de prejuízo.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.217.422-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 23/9/2014 (Info 549).

Imagine a seguinte situação adaptada: Determinado candidato ao cargo de vereador preparou um folheto para a sua campanha no qual ele aparecia entregando um diploma de conclusão de curso profissional a João. Ocorre que João não autorizou a utilização de sua imagem na campanha. Ele terá direito de ser indenizado por isso? SIM. Configura dano moral indenizável a divulgação não autorizada da imagem de alguém em material impresso de propaganda político-eleitoral, independentemente da comprovação de prejuízo.

Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 12

Em se tratando de direito à imagem, a obrigação da reparação decorre do próprio uso indevido da imagem (direito personalíssimo), não sendo necessário discutir se há ou não, no caso concreto, prova da existência concreta de prejuízo, uma vez que o dano se apresenta in re ipsa. No caso, existe o direito à indenização mesmo que a referida propaganda não tenha finalidade comercial ou econômica, mas sim meramente eleitoral. Apenas a título de curiosidade, na situação concreta, o STJ manteve a condenação do vereador ao pagamento de 10 mil reais de indenização.

RESPONSABILIDADE CIVIL Danos morais por encerramento de curso de graduação

É cabível indenização por danos morais ao aluno universitário que fora compelido a migrar para outra instituição educacional pelo fato de a instituição contratada ter extinguido de forma abrupta o curso, ainda que esta tenha realizado convênio, com as mesmas condições e valores, com outra instituição para continuidade do curso encerrado.

Obs: ressalte-se que o tema não é tranquilo e que existe julgado da 4ª Turma entendendo, com base nas peculiaridades do caso concreto, que não seria devida a indenização: STJ. 4ª Turma. REsp 1094769/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 18/03/2014.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.341.135-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 14/10/2014 (Info 549).

STJ. 4ª Turma. REsp 1094769/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 18/03/2014.

Imagine a seguinte situação adaptada: João era acadêmico do curso de administração da Faculdade particular “X”. Quando estava no 4º período, foi informado que o curso de administração seria extinto e que havia sido feito um convênio com outras duas Instituições para abrigar os alunos da Faculdade “X”. João não concordou com aquilo e ajuizou ação de indenização por danos morais contra a Faculdade. Alegou que, em consulta ao site do ENADE verificou que as notas das universidades conveniadas eram menores do que a da ré. Citada, a Faculdade defendeu a licitude de seu procedimento, pois agiu devidamente amparada no princípio da autonomia universitária, previsto no art. 53, I, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Afirmou, ainda, que o encerramento das suas atividades não gerou danos aos alunos, pois foram realizados convênios com outras entidades em que lhes foram garantidas as mesmas condições de pagamento. Segundo o STJ, o aluno tem direito de ser indenizado? A 3ª Turma do STJ decidiu que SIM. É cabível indenização por danos morais ao aluno universitário que fora compelido a migrar para outra instituição educacional pelo fato de a instituição contratada ter extinguido de forma abrupta o curso, ainda que esta tenha realizado convênio, com as mesmas condições e valores, com outra instituição para continuidade do curso encerrado. De fato, é possível a extinção de curso superior por instituição educacional, no exercício de sua autonomia universitária, desde que forneça adequada e prévia informação de encerramento do curso (art. 53 da Lei

n. 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação). No entanto, para o STJ, na situação em análise, a instituição educacional, ao extinguir de forma abrupta o curso oferecido, agiu com excesso no exercício do direito, dando ensejo à reparação pelos danos morais sofridos, nos termos do art. 187 do CC. STJ. 3ª Turma. REsp 1.341.135-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 14/10/2014 (Info 549).

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O tema é tranquilo no STJ? NÃO. Em um outro precedente da 4ª Turma, com algumas peculiaridades, a Corte entendeu que não era devida a indenização. Afirmou-se que a instituição educacional privada de ensino superior goza de autonomia universitária, nos termos do art. 207 da CF/88, motivo pelo qual seria possível, ante a inviabilidade de determinado curso, proceder à sua extinção, conforme preceito constante do art. 53, I, da Lei nº 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. No caso concreto, os Ministros entenderam que não se verificou defeito na prestação de serviços, haja vista que a extinção de cursos é procedimento legalmente previsto e admitido, não sendo dado atribuir-se a responsabilização à universidade por evento sobre o qual não há qualquer participação ou influência da desta (ausência de alunos e não obtenção, pela aluna, de aprovação), mormente quando cumpre todos os deveres ínsitos à boa-fé objetiva. Na relação jurídica estabelecida com seu corpo discente, consoante atestado pelas instâncias ordinárias, a instituição de ensino forneceu adequada informação e, no momento em que verificada a impossibilidade de manutenção do curso superior, ofereceu alternativas à aluna, providenciando e viabilizando, conforme solicitado por esta, a transferência para outra faculdade. STJ. 4ª Turma. REsp 1094769/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 18/03/2014.

RESPONSABILIDADE CIVIL Ausência de coleta das células-tronco no momento do parto e aplicação da perda de uma chance

Tem direito a ser indenizada, com base na teoria da perda de uma chance, a criança que, em razão da ausência do preposto da empresa contratada por seus pais para coletar o material no momento do parto, não teve recolhidas as células-tronco embrionárias.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.291.247-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 19/8/2014 (Info 549).

Coleta e armazenamento de células-tronco após o parto Atualmente, têm sido cada vez mais comum os serviços de coleta e armazenamento de células-tronco do cordão umbilical. Explicando melhor: existem determinadas empresas que, logo após o parto, coletam o cordão umbilical, levam-no até o laboratório e lá as células-tronco são separadas e congeladas. Caso a própria criança ou algum parente próximo tenha determinados tipos de doença, existe a possibilidade de que essas células-tronco sejam utilizadas para auxiliar no tratamento. Imagine agora a seguinte situação adaptada: Mônica estava grávida e decidiu contratar os serviços de uma empresa de coleta e armazenamento de células-tronco do cordão umbilical. Assim, foi assinado um contrato e a empresa se comprometeu a enviar uma enfermeira no dia do parto para recolher o cordão umbilical a fim de coletar a armazenar as células-tronco. Ocorre que, no dia do nascimento, a enfermeira da empresa não compareceu e a coleta do cordão umbilical não foi possível. Diante disso, o filho recém-nascido do casal, representado por seus pais, ajuizou ação de indenização por danos morais contra a empresa. A empresa contestou o pedido afirmando que não há direito à indenização porque se está diante de um dano hipotético, já que somente se poderia falar em dano concreto se o menor viesse a ter necessidade das células-tronco embrionárias não colhidas.

Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 14

A questão chegou até o STJ. O recém-nascido terá direito de ser indenizado pela falha da empresa? SIM. Tem direito a ser indenizada, com base na teoria da perda de uma chance, a criança que, em razão da ausência do preposto da empresa contratada por seus pais para coletar o material no momento do parto, não teve recolhidas as células-tronco embrionárias. No caso, a criança teve frustrada a chance de ter suas células embrionárias colhidas e armazenadas para, se eventualmente fosse preciso, fazer uso delas em tratamento de saúde. Para o STJ, não se está diante de situação de dano hipotético (o que não renderia ensejo a indenização), mas sim de caso claro de aplicação da teoria da perda de uma chance. A responsabilidade é por perda de uma chance por serem as células-tronco, cuja retirada do cordão umbilical deve ocorrer no momento do parto, o grande trunfo da medicina moderna para o tratamento de inúmeras patologias consideradas incuráveis. É possível que o dano final nunca venha a se implementar, bastando que a pessoa recém-nascida seja plenamente saudável, nunca desenvolvendo qualquer doença tratável com a utilização das células-tronco retiradas do seu cordão umbilical. O certo, porém, é que perdeu, definitivamente, a chance de prevenir o tratamento dessas patologias. Essa chance perdida é, portanto, o objeto da indenização. A título de curiosidade, no caso concreto, o STJ fixou a indenização em R$ 60.000,00. O que é a teoria da perda de uma chance? Trata-se de teoria inspirada na doutrina francesa (perte d’une chance). Na Inglaterra é chamada de loss-of-a-chance. Segundo esta teoria, se alguém, praticando um ato ilícito, faz com que outra pessoa perca uma oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar um prejuízo, esta conduta enseja indenização pelos danos causados. Em outras palavras, o autor do ato ilícito, com a sua conduta, faz com que a vítima perca a oportunidade de obter uma situação futura melhor. Com base nesta teoria, indeniza-se não o dano causado, mas sim a chance perdida. A teoria da perda de uma chance é adotada no Brasil? SIM, esta teoria é aplicada pelo STJ, que exige, no entanto, que o dano seja REAL, ATUAL e CERTO, dentro de um juízo de probabilidade, e não mera possibilidade, porquanto o dano potencial ou incerto, no espectro da responsabilidade civil, em regra não é indenizável (REsp 1.104.665-RS, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 9/6/2009). Em outros julgados, fala-se que a chance perdida deve ser REAL e SÉRIA, que proporcione ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação futura esperada. (AgRg no REsp 1220911/RS, Segunda Turma, julgado em 17/03/2011) O dano resultante da aplicação da teoria da perda pode ser classificado como dano emergente ou como lucros cessantes? Trata-se de uma terceira categoria. Com efeito, a teoria da perda de uma chance visa à responsabilização do agente causador não de um dano emergente, tampouco de lucros cessantes, mas de algo intermediário entre um e outro, precisamente a perda da possibilidade de se buscar posição mais vantajosa, que muito provavelmente se alcançaria, não fosse o ato ilícito praticado. (REsp 1190180/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/11/2010) “A perda de uma chance, caracterizada pela violação direta ao bem juridicamente protegido, qual seja, a chance concreta, real, com alto grau de probabilidade de gerar um benefício ou de evitar um prejuízo, consubstancia modalidade autônoma de indenização.” (Prova do TJDFT 2014 CESPE).

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CONDOMÍNIO Rateio das despesas feitas para ajuizar ação contra um dos condôminos

O condômino que tenha sido demandado pelo condomínio em ação de cobrança deve sim participar do rateio das despesas do litígio contra si proposto.

Ex: condomínio contrata advogado para ajuizar execução contra condômino inadimplente; as despesas referentes à contratação do causídico serão rateadas entre todos, inclusive o condômino executado, que também irá pagar sua quota para custear tal gasto.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.185.061-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/9/2014 (Info 549).

Imagine a seguinte situação adaptada: O Edifício “X” é um pequeno condomínio edilício no qual há 10 unidades autônomas (apartamentos). João, um dos moradores, está devendo vários meses da taxa condominial. Diante disso, na assembleia geral ficou decidido que o condomínio iria contratar um advogado para ajuizar execução cobrando as quotas atrasadas de João. O advogado cobrou do condomínio R$ 2.000,00 de honorários contratuais para ajuizar a ação contra João. Para custear essas despesas com o advogado, a assembleia aprovou uma quota de R$ 200,00 por cada unidade autônoma. João se revoltou e disse que não deveria entrar no rateio dessa quota extra, já que ela se destinava a custear uma ação judicial contra ele mesmo, ou seja, estaria pagando para entrarem com uma execução contra ele. O STJ concordou com o argumento de João? NÃO. O condômino que tenha sido demandado pelo condomínio em ação de cobrança deve sim participar do rateio das despesas do litígio contra si proposto. Segundo o inciso I do art. 1.336 do CC, um dos deveres do condômino é o de contribuir para as despesas do condomínio na proporção da sua fração ideal.

De igual forma, o art. 12 da Lei n. 4.591/64 estabelece que cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo a quota-parte que lhe couber em rateio. Para o STJ, tais dispositivos não fazem ressalva de qualquer espécie acerca do rateio. Ao contrário, excluem qualquer possibilidade de recusa ao pagamento. Em outras palavras, o condômino deve pagar porque a legislação assim determina e não traz qualquer exceção nesse sentido.

CONDOMÍNIO Inviabilidade de ação de prestação de contas ajuizada por condômino

O condômino, isoladamente, não possui legitimidade para propor ação de prestação de contas, pois a obrigação do síndico é de prestar contas à assembleia, nos termos do art. 22, §1º, "f", da Lei nº 4.591⁄1964.

Faltará interesse de agir ao condômino quando as contas já tiverem sido prestadas extrajudicialmente, porque, em tal hipótese, a ação judicial não terá utilidade.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.046.652-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/9/2014 (Info 549).

Imagine a seguinte situação adaptada: João é proprietário e morador de uma unidade autônoma no condomínio edilício “X”. Determinado dia, João ajuizou ação de prestação de contas contra o condomínio pedindo que ele fornecesse cópia das autorizações dadas pelos condôminos e do rateio das despesas feitas para a aquisição de novos elevadores para o prédio.

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Em contestação, o condomínio, representado pelo síndico, afirmou que as contas já foram prestadas para a assembleia geral do condomínio e que ele não tem dever de prestar contas para o condômino individualmente considerado. A tese do condomínio é correta? SIM. O condômino, isoladamente, não possui legitimidade para ajuizar ação de prestação de contas contra

o condomínio. Isso porque, nos termos do art. 22, §1º, “f”, da Lei n. 4.591/1964, o condomínio, representado pelo síndico, não tem obrigação de prestar contas a cada um dos condôminos, mas sim a todos, perante a assembleia dos condôminos.

Art. 22. (...) § 1º Compete ao síndico: (...) f) prestar contas à assembleia dos condôminos.

No mesmo sentido é o art. 1.348, VIII, do CC:

Art. 1.348. Compete ao síndico: (...) VIII - prestar contas à assembleia, anualmente e quando exigidas;

Assim, o condômino, embora titular do interesse gerido por outrem, não tem legitimidade para, individualmente, ajuizar ação de prestação de contas contra o síndico. Logo, como o condomínio já prestou contas à assembleia e esta as aprovou, o condomínio cumpriu sua obrigação legal. O condômino, individualmente, não possui direito de exigir novamente prestação de contas. Se esse condômino entende que a aprovação das contas pela assembleia foi irregular, a única saída que lhe resta é ajuizar uma ação de anulação da assembleia/deliberação social. Não cabe ao condômino sobrepor-se à assembleia, que se traduz no órgão supremo do condomínio, pois através de suas deliberações é que se manifesta a vontade da coletividade dos condôminos sobre todos os interesses comuns. E se o condomínio não tivesse prestado contas à assembleia? Nesse caso, o condômino também não poderia ajuizar ação de prestação de contas. Ele deveria convocar a assembleia geral, como determina o art. 1.350, §§ 1º e 2º, do Código Civil:

Art. 1.350. Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembléia dos condôminos, na forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger-lhe o substituto e alterar o regimento interno. § 1º Se o síndico não convocar a assembléia, um quarto dos condôminos poderá fazê-lo. § 2º Se a assembléia não se reunir, o juiz decidirá, a requerimento de qualquer condômino.

Resumindo: O condômino, isoladamente, não possui legitimidade para propor ação de prestação de contas, pois a obrigação do síndico é de prestar contas à assembleia, nos termos do art. 22, §1º, "f", da Lei nº 4.591⁄1964. Faltará interesse de agir ao condômino quando as contas já tiverem sido prestadas extrajudicialmente, porque, em tal hipótese, a ação judicial não terá utilidade.

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DIREITO EMPRESARIAL

RECUPERAÇÃO JUDICIAL Magistrado não pode fazer análise da viabilidade econômica do plano de recuperação judicial

Importante!!!

O juiz pode recusar-se a homologar o plano de recuperação judicial alegando que ele não tem viabilidade econômica, mesmo já tendo sido aprovado em assembleia e estando formalmente perfeito?

NÃO. Se o plano cumpriu as exigências legais e foi aprovado em assembleia, o juiz deve homologá-lo e conceder a recuperação judicial do devedor, não sendo permitido ao magistrado se imiscuir (intrometer) no aspecto da viabilidade econômica da empresa.

O magistrado não é a pessoa mais indicada para aferir a viabilidade econômica do plano de recuperação judicial.

O juiz deve exercer o controle de legalidade do plano de recuperação, analisando se há fraude ou abuso de direito. No entanto, não cabe a ele fazer controle sobre a viabilidade econômica do plano.

No mesmo sentido são os enunciados 44 e 46 da I Jornada de Direito Comercial do CJF/STJ.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.319.311-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/9/2014 (Info 549).

RECUPERAÇÃO JUDICIAL A recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e, com isso, sejam preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores. A recuperação judicial consiste, portanto, em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano com o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência. FASES DA RECUPERAÇÃO De forma resumida, a recuperação judicial possui 3 fases: a) Postulação: inicia-se com o pedido de recuperação e vai até o despacho de processamento; b) Processamento: vai do despacho de processamento até a decisão concessiva; c) Execução: da decisão concessiva até o encerramento da recuperação judicial. JUÍZO FALIMENTAR

A Lei n. 11.101/2005, em seu art. 3º, prevê que é competente para deferir a recuperação judicial o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil. A falência e a recuperação judicial são sempre processadas e julgadas na Justiça estadual. PLANO DE RECUPERAÇÃO Em até 60 dias após o despacho de processamento da recuperação judicial, o devedor deverá apresentar em juízo um plano de recuperação da empresa, sob pena de convolação (conversão) do processo de recuperação em falência. Este plano deverá conter: discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a serem empregados (art. 50); demonstração de sua viabilidade econômica; e laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional

legalmente habilitado ou empresa especializada.

Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 18

Os credores analisam o plano apresentado, que pode ser aprovado ou não pela assembleia geral de credores. Credores são avisados sobre o plano, podendo apresentar objeções Após o devedor apresentar o plano de recuperação, o juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do plano e fixando o prazo para a manifestação de eventuais objeções. Desse modo, os credores serão chamados a analisar esse plano e, se não concordarem com algo, poderão apresentar objeção. O prazo para os credores apresentarem objeções é de 30 dias. Se não houver objeção dos credores Caso nenhum credor apresente objeção ao plano no prazo fixado, considera-se que houve aprovação tácita. Nessa hipótese, não será necessária a convocação de assembleia-geral de credores para deliberar sobre o plano. Se houver objeção por parte dos credores Havendo objeção de algum credor, o juiz deverá convocar a assembleia-geral de credores para que ela decida sobre o plano de recuperação apresentado. A assembleia-geral, após as discussões e esclarecimentos pertinentes, poderá: a) aprovar o plano sem ressalvas; b) aprovar o plano com alterações; c) não aprovar o plano.

Se o plano não for aprovado: o juiz decreta a falência (salvo na hipótese do art. 58, § 1º).

Se o plano for aprovado: o juiz homologa a aprovação e concede a recuperação judicial, iniciando-se a fase de execução. Atenção: no regime atual, o plano de recuperação é aprovado pelos credores e apenas homologado pelo juiz.

ASPECTOS QUE SÃO ANALISADOS PELO JUIZ PARA HOMOLOGAÇÃO DO PLANO

Como vimos acima, o magistrado é quem homologa o plano e concede a recuperação judicial. Isso está

previsto expressamente no caput do art. 58 da Lei n. 11.101/2005:

Art. 58. Cumpridas as exigências desta Lei, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor cujo plano não tenha sofrido objeção de credor nos termos do art. 55 desta Lei ou tenha sido aprovado pela assembleia-geral de credores na forma do art. 45 desta Lei.

Indaga-se, no entanto, o seguinte: O juiz pode recusar-se a homologar o plano de recuperação judicial alegando que ele não tem viabilidade econômica, mesmo já tendo sido aprovado em assembleia e estando formalmente perfeito? NÃO. Se o plano cumpriu as exigências legais e foi aprovado em assembleia, o juiz deve homologá-lo e conceder a recuperação judicial do devedor, não sendo permitido ao magistrado se imiscuir (intrometer) no aspecto da viabilidade econômica da empresa. A aprovação do plano pela assembleia representa uma nova relação negocial que é construída entre o devedor e os credores. Se os credores aceitaram a proposta e ela preenche os requisitos legais, não cabe ao juiz indeferir a recuperação judicial. Além disso, o magistrado não é a pessoa mais indicada para aferir a viabilidade econômica do plano de recuperação judicial. Isso porque a análise do possível sucesso ou não do plano proposto é não é uma questão jurídica propriamente dita, mas sim econômica e que está inserida na seara negocial da recuperação judicial, o que deve ser tratado entre devedor e credores.

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Cram down é possível; o contrário não A Lei permite que o magistrado conceda a recuperação judicial mesmo tendo o plano sido recusado pela assembleia. Isso está previsto no art. 58, § 1º e é chamado de cram down. No entanto, o contrário não é possível, ou seja, o juiz não pode indeferir a recuperação judicial cujo plano foi aprovado pela assembleia, considerando que isso significaria a quebra (falência) da empresa, o que vai de encontro com o objetivo da

Lei n. 11.101/2005, que é o de que reerguer a sociedade empresária. Controle de legalidade Assim, podemos concluir que o magistrado deve exercer o controle de legalidade do plano de recuperação, analisando se há fraude ou abuso de direito. No entanto, não cabe a ele fazer controle sobre a viabilidade econômica do plano. Enunciados 44 e 46 da I Jornada de Direito Comercial Vale ressaltar, por fim, que a decisão do STJ está de acordo com os enunciados 44 e 46 da I Jornada de Direito Comercial CJF/STJ. Veja:

Enunciado 44: A homologação de plano de recuperação judicial aprovado pelos credores está sujeita ao controle de legalidade. Enunciado 46: Não compete ao juiz deixar de conceder a recuperação judicial ou de homologar a extrajudicial com fundamento na análise econômico-financeira do plano de recuperação aprovado pelos credores.

DIREITO NOTARIAL E REGISTRAL

PROTESTO DE TÍTULO Responsabilidade pela baixa após o pagamento

Importante!!!

Após o pagamento do título protestado, o credor que foi pago tem a responsabilidade de retirar o protesto lavrado?

NÃO. Após a quitação da dívida, incumbe ao DEVEDOR providenciar o cancelamento do protesto, salvo se foi combinado o contrário entre ele e o credor.

No regime próprio da Lei 9.492/1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.339.436-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/9/2014 (recurso repetitivo) (Info 549).

O que é um protesto de título? Protesto de títulos é o ato público, formal e solene, realizado pelo tabelião, com a finalidade de provar a inadimplência e o descumprimento de obrigação constante de título de crédito ou de outros documentos de dívida.

Regulamentação: o protesto é regulado pela Lei n. 9.492/97.

Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 20

Procedimento até ser registrado o protesto do título: 1) O credor leva o título até o tabelionato de protesto e faz a apresentação, pedindo que haja o protesto

e informando os dados e endereço do devedor; 2) O tabelião de protesto examina os caracteres formais do título; 3) Se o título não apresentar vícios formais, o tabelião realiza a intimação do suposto devedor no

endereço apresentado pelo credor (art. 14); 4) A intimação é realizada para que o apontado devedor, no prazo de 3 dias, pague ou providencie a

sustação do protesto antes de ele ser lavrado;

Após a intimação, poderão ocorrer quatro situações: 4.1) o devedor pagar (art. 19); 4.2) o apresentante desistir do protesto e retirar o título (art. 16); 4.3) o protesto ser sustado judicialmente (art. 17); 4.4) o devedor ficar inerte ou não conseguir sustar o protesto.

5) Se ocorrer as situações 4.1, 4.2 ou 4.3: o título não será protestado; 6) Se ocorrer a situação 4.4: o título será protestado (será lavrado e registrado o protesto). Imaginemos que o devedor foi intimado (etapa 4), mas não pagou nem conseguiu sustar o protesto. O que aconteceu então? O título foi protestado. Após um tempo, esse devedor quis comprar um carro financiado, no entanto, não conseguiu porque o banco constatou a existência desse título protestado e, por essa razão, não liberou o crédito. O devedor decidiu, então, pagar o título protestado. Com o pagamento do débito, será possível retirar a anotação desse título protestado? SIM. Após o pagamento do título protestado, o credor que foi pago tem a responsabilidade de retirar o protesto lavrado? NÃO. Após a quitação da dívida, incumbe ao DEVEDOR, providenciar o cancelamento do protesto, salvo se foi combinado o contrário entre ele e o credor.

Segundo o STJ, a Lei n. 9.492/97 não impõe ao credor o dever de retirar o protesto. Veja:

Art. 26. O cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada.

Desse modo, quando o art. 26 da Lei n. 9.492/1997 fala que o cancelamento do registro de protesto pode ser solicitado por qualquer interessado, a melhor interpretação é a de que o principal interessado é o devedor, de forma que a ele cabe, em regra, o ônus do cancelamento. Esse entendimento vale mesmo que se trate de uma relação de consumo, ou seja, que o devedor seja um consumidor e o credor um fornecedor? SIM. Cabe ao devedor que paga posteriormente a dívida o ônus de providenciar a baixa do protesto em cartório, sendo irrelevante se a relação era de consumo (STJ. 4ª Turma. REsp 1.195.668/RS, Rel. p/ Acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 11/9/2012).

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A solução jurídica acima aplica-se também no caso de inscrição em cadastros de inadimplentes (exs: SERASA/SPC)? NÃO. A posição acima explicada vale apenas para os casos de cancelamento de título protestado. Na hipótese de devedor inserido em cadastro de inadimplentes (ex: SERASA, SPC), a solução é diferente. Veja:

CADASTRO DE INADIMPLENTES REGISTRO DE PROTESTO

Se a dívida é paga, quem tem o dever de retirar o nome do devedor do cadastro (ex: SERASA)? O CREDOR (no prazo máximo de 5 dias). Fundamento: art. 43, § 3º do CDC (por analogia).

Se o título é pago, quem tem o dever de retirar o protesto que foi lavrado? O próprio DEVEDOR.

Fundamento: art. 26 da Lei n. 9.492/1997

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

COMPETÊNCIA Análise do “caso Portuguesa”

O Juízo do local em que está situada a sede da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) é o competente para processar e julgar todas e quaisquer ações cujas controvérsias se refiram apenas à validade e à execução de decisões da Justiça Desportiva acerca de campeonato de futebol de caráter nacional, de cuja organização a CBF participe, independentemente de as ações serem ajuizadas em vários Juízos ou Juizados Especiais (situados em diversos lugares do país) por clubes, entidades, instituições, torcedores ou, até mesmo, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública.

STJ. 2ª Seção. CC 133.244-RJ, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 11/6/2014 (Info 549).

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: A Portuguesa (time de futebol) foi rebaixada para a série B do Campeonato Brasileiro em virtude de ter sido punida com a perda de pontos pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva – STJD. Vários torcedores da Portuguesa e o Ministério Público de São Paulo propuseram inúmeras ações judiciais, em diversas partes do país, contra a Confederação Brasileira de Futebol – CBF, organizadora do campeonato, pedindo a anulação da decisão do STJD (que, ressalte-se, não é integrante do Poder Judiciário, sendo um tribunal da Justiça Desportiva). Diante disso, a CBF suscitou, no STJ, conflito positivo de competência, pedindo que seja reconhecida que a competência para julgar a lide é da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, local onde está situada a CBF. Fundamento utilizado pelos torcedores para proporem as ações em seus domicílios Os torcedores que ajuizaram as ações contra a decisão do STJD propuseram as demandas em seus próprios domicílios (ex: São Paulo). Para tanto, eles alegaram que a CBF é fornecedora de serviços (art. 3º,

da Lei n. 10.671/2003) e, portanto, os torcedores são consumidores, razão pela qual o foro competente é o do seu domicílio (art. 101, I, do CDC). Veja os dispositivos invocados:

Lei n. 10.671/2003 (Estatuto do Torcedor):

Art. 3º Para todos os efeitos legais, equiparam-se a fornecedor, nos termos da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, a entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo.

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CDC

Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, sem prejuízo do disposto nos Capítulos I e II deste Título, serão observadas as seguintes normas: I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor;

O STJ concordou com a tese dos torcedores?

NÃO. O 3º da Lei n. 10.671⁄2003 realmente equipara as entidades que organizam as competições desportivas a fornecedores. Tal equiparação, por outro lado, sugere, implicitamente, que os torcedores são equiparados a consumidores para efeito de aplicação do Estatuto do Torcedor. Até aqui tudo bem. O problema é que, segundo entendeu o STJ, nas ações que os torcedores propuseram pedindo a anulação do rebaixamento da Portugesa, eles não estão pleiteando direitos próprios de consumidor, já que estão questionando uma decisão do STJD, que não se confunde com a CBF e que não é a entidade responsável pela organização da competição, não podendo, portanto, ser considerado fornecedor de serviços. Em outras palavras, os torcedores estão impugnando uma decisão do STJD, que não se enquadra no conceito

de fornecedor do art. 3º da Lei n. 10.671/2003. O Ministro Relator lembrou que já havia precedente do STJ nesse sentido, onde restou consignado:

“(...) por ser o Superior Tribunal de Justiça Desportiva, nos termos do art. 52 da Lei 9.615⁄1998, órgão integrante da Justiça Desportiva com competência para processar e julgar as questões previstas nos Códigos da Justiça Desportiva, constata-se que ele não se enquadra nem no conceito de fornecedor previsto no art. 3º do CDC nem no conceito de fornecedor por equiparação previsto no art. 3º do Estatuto do Torcedor. (...) (Trecho do voto da Min. Nancy Andrighi no CC 40.721/RJ, julgado em 23/06/2004)

Além disso, para o STJ, o art. 101, I, do CDC, confere aos consumidores a possibilidade de acionar, em seus próprios domicílios, os fornecedores de serviços ou de produtos quando se tratar de ação de responsabilidade. No entanto, no caso presente, as ações não veiculam pretensão de responsabilidade civil ou criminal, sendo demandas que pretendem a desconstituição de ato jurídico praticado pela Justiça Desportiva. Em suma, não se trata de ações de responsabilidade, razão pela qual não se amoldam à hipótese do art. 101, I, do CDC. Desse modo, como não se aplica o art. 101, I, do CDC, deverá incidir, no caso, a regra geral de competência trazida pelo art. 94 do CPC, segundo o qual, não havendo previsão específica, as demandas devem ser propostas no foro do domicílio do réu. Como a ação é proposta contra a CBF (pessoa jurídica), aplica-se, ainda, o art. 100, IV, “a”, do CPC, que tem a mesma solução:

Art. 100. É competente o foro: (...) IV - do lugar: a) onde está a sede, para a ação em que for ré a pessoa jurídica;

Em virtude do exposto, o STJ entendeu que a competência para decidir esse litígio deveria ser da 2ª Vara Cível do Foro Regional da Barra da Tijuca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, porque no seu território está sediada a CBF, que, em última análise, é a entidade responsável pela organização do campeonato nacional de futebol e que tem a incumbência de executar as decisões do STJD. Por que a competência, em vez de ser do Foro Regional da Barra da Tijuca, não é do Juizado Especial do Torcedor também localizado no Rio de Janeiro? A competência de Vara Cível não pode ser afastada em prol da competência de Juizado Especial. Segundo o Min. Relator, quando concorrem, no deslinde de competência, Vara Cível, que é o mais, de competência mais ampla, com procedimento regido pelo Código de Processo Civil, e Juizado Especial, de

competência menor, com procedimento regido pela Lei n. 9.099⁄95, prevalece a competência da

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primeira, porque a competência deste, do Juizado Especial, menos ampla, cabe na da Vara Cível. Além disso, o Juizado Especial do Torcedor do RJ se localizada na Ilha do Governador, de forma que não se situa nos limites territoriais do foro de domicílio do réu, assim entendido o local da sede da entidade. Conforme já explicado acima, o núcleo da controvérsia em causa não diz respeito, primariamente, a torcedor, mas sim aos interesses do próprio clube (Portuguesa) e da entidade organizadora e patrocinadora do evento (CBF). Submeter a presente controvérsia, de dimensões nacionais, ao Juizado Especial, não resolveria de modo uniforme e definitivo a lide, considerando as limitações recursais que são inerentes ao sistema do Juizado e que não existem no sistema geral do CPC. Ex: se a causa fosse julgada pelo Juizado, não haveria possibilidade de o acórdão da Turma Recursal ser impugnado mediante recurso especial. Pelo exposto, o STJ declarou o Juízo da 2ª Vara Cível do Foro Regional da Barra da Tijuca como sendo o competente para processar e julgar todas as ações (atuais ou futuras) relacionadas com a decisão do STJD que tirou 4 pontos da Portuguesa e a rebaixou para a Série B do Campeonato Brasileiro de Futebol de 2014.

EXECUÇÃO FISCAL Extinção da execução por abandono da Fazenda Pública

Em uma execução fiscal, o juiz determinou a intimação da Fazenda Pública para que se manifestasse se possuía ainda interesse no prosseguimento do processo, sob pena de extinção do feito. Mesmo tendo sido regularmente intimada, a Fazenda Pública permaneceu inerte. Nesse caso, se o devedor não tiver apresentado embargos à execução, o magistrado poderá, de ofício, extinguir a execução sem resolução do mérito por abandono do autor, nos termos do art. 267, III, do CPC.

Não se aplica o raciocínio presente na Súmula 240 do STJ, ou seja, não é necessário que haja requerimento do executado para que o juiz extinga a execução.

STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1.450.799-RN, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 21/8/2014 (Info 549).

Imagine a seguinte situação hipotética: O Município ajuizou execução fiscal contra João. Citado, o executado não pagou nem ofereceu bens em garantia. Logo, também não ofereceu embargos à execução. Tentou-se penhorar bens do devedor, mas nenhum foi localizado. Diante disso, o juiz determinou a intimação do Município para que se manifestasse se possuía ainda interesse no prosseguimento do processo, sob pena de extinção do feito. Mesmo tendo sido regularmente intimada, a Fazenda Pública permaneceu inerte. O que o juiz deverá fazer? Extinguir o processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, III, do CPC:

Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: III - quando, por não promover os atos e diligências que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;

Para que o juiz extinga o processo, será necessário requerimento do executado? Aplica-se a Súmula 240 do STJ (“A extinção do processo, por abandono da causa pelo autor, depende de requerimento do réu.”)? NÃO. Não é necessário requerimento do réu. Não se aplica a Súmula 240 do STJ. Em outras palavras, o juiz poderá extinguir a execução ex officio. O raciocínio que levou o STJ a editar a Súmula 240 é o de que o réu também tem direito à resolução do

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mérito, ou seja, mesmo o autor tendo abandonado a causa, pode ser que o requerido queira continuar com o processo para que nele fique decidido que o pedido do requerente não tem razão. Dessa forma, o magistrado não pode ignorar e passar por cima desse possível interesse do réu. No caso em tela, contudo, esse argumento não se aplica porque o executado que não apresenta embargos à execução não está discutindo a pretensão do autor. Em outras palavras, ele não manifestou interesse em que o mérito da causa seja julgado, podendo, portanto, o magistrado extinguir desde logo o processo. Ao contrário, se o executado houvesse apresentado embargos, o juiz somente poderia extinguir a execução sem resolução do mérito se o devedor concordasse (aí sim, seria aplicável a Súmula 240-STJ).

PROCESSO COLETIVO Litisconsórcio entre Ministérios Públicos

Importante!!!

A Lei e a jurisprudência admitem o litisconsórcio ativo facultativo entre Ministérios Públicos.

No caso concreto, o STJ admitiu que o MPF, o MPE e o MPT ajuizassem uma ACP em litisconsórcio. Na situação examinada, a UFRN, por meio do seu hospital universitário, prestava serviços médicos à população. Ocorre que os médios que desempenhavam suas funções não eram concursados. O Estado do RN fez um convênio com a Universidade e contratava médicos de uma cooperativa para lá trabalharem. Diante disso, o MPF, o MPE e o MPT ajuizaram, em litisconsórcio ativo, ACP contra a Cooperativa, a União, a UFRN e o Estado do RN, pedindo que o contrato fosse rescindido e que fosse realizado concurso público para preencher as vagas de médicos. O STJ entendeu que seria possível o litisconsórcio ativo nesta ACP, considerando que ela visava a tutela de interesses difusos que estavam inseridos nas atribuições dos três Ministérios Públicos.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.444.484-RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 18/9/2014 (Info 549).

É possível que dois Ministérios Públicos ingressem, em conjunto, com uma ação civil pública? SIM. Apesar de existirem importantes vozes em sentido contrário, a Lei e a jurisprudência admitem o litisconsórcio ativo facultativo entre Ministérios Públicos. Isso está expressamente previsto no art. 5º, § 5º,

da Lei n. 7.347/85:

§ 5º Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei.

O litisconsórcio ativo facultativo entre os ramos do Ministério Público da União e os Ministérios Públicos dos Estados, em tese, é possível, sempre que as circunstâncias do caso recomendem, para a propositura de ações civis públicas que visem à responsabilização por danos morais e patrimoniais causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e paisagístico, à ordem econômica e urbanística, bem como a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, inclusive de natureza trabalhista. Essa atuação conjunta deve-se ao cunho social do Parquet e à posição que lhe foi erigida pelo constituinte (de instituição essencial à função jurisdicional do Estado), incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. O Plenário do STF já reconheceu, em tese, a possibilidade de litisconsórcio entre o MPF e o MPE: ACO 1.020/SP, Rel. Min. Carmen Lúcia, julgado em 08/10/2008.

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Caso concreto (com adaptações) Na situação examinada pelo STJ, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, por meio do seu hospital universitário, prestava serviços médicos à população. Ocorre que os anestesiologistas que desempenhavam suas funções não eram concursados. O Estado do RN fez um convênio com a Universidade e contratava médicos da cooperativa para lá trabalharem. Diante disso, o Ministério Público Federal, o Ministério Público Estadual e o Ministério Público do Trabalho ajuizaram, em litisconsórcio ativo, ação civil pública contra a Cooperativa, a União, a UFRN e o Estado do Rio Grande do Norte, pedindo que o contrato fosse rescindido e que fosse realizado concurso público para preencher as vagas de médicos. O STJ entendeu que seria possível o litisconsórcio ativo facultativo entre o MPF, o MPE e o MPT nesta ação civil pública, considerando que ela visava à tutela de interesses difusos que estavam inseridos nas atribuições dos três Ministérios Públicos. Com efeito, os contratos com as cooperativas eram assinados pelo Estado do RN, os serviços eram desempenhados no hospital da Universidade Federal e, segundo o MPT, estaria havendo uma “terceirização ilícita e privatização do serviço público essencial na área da saúde, em favor de grupo de profissionais reunidos em verdadeira empresa de fornecimento de mão-de-obra, sob a forma de cooperativa de trabalho, cuja finalidade consiste em manipular e monopolizar a atividade profissional de saúde especializada para obter vantagens financeiras para seus integrantes, em flagrante afronta ao preconizado no Enunciado da Súmula n. 331 do TST”. Ressalte-se que, no caso concreto, o STJ reconheceu que a competência seria da Justiça Federal comum.

PROCESSO COLETIVO Termo inicial dos juros de mora na ACP

Importante!!!

Os juros de mora incidem a partir da citação do devedor no processo de CONHECIMENTO da ação civil pública quando esta se fundar em responsabilidade contratual, cujo inadimplemento já produza a mora, salvo se a mora já se configurou em momento anterior à citação.

STJ. Corte Especial. REsp 1.370.899-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 21/5/2014 (recurso repetitivo) (Info 548).

Qual é o termo inicial dos juros de mora no caso de ação civil pública em que se discuta responsabilidade contratual: a data da citação do processo de conhecimento, a data da citação do processo de liquidação ou a data da citação de cada execução individual da sentença coletiva? Os juros de mora incidem a partir da citação do devedor no processo de conhecimento da ação civil pública quando esta se fundar em responsabilidade contratual, cujo inadimplemento já produza a mora, salvo a configuração da mora em momento anterior.

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DIREITO PENAL

CRIME CONTINUADO Inexistência de continuidade delitiva entre roubo e extorsão

Os crimes de roubo e extorsão, embora sejam de mesma natureza, são considerados de espécies diferentes. Por essa razão, não é possível reconhecer continuidade delitiva entre eles, ainda que praticados em conjunto.

STJ. 6ª Turma. HC 77.467-SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 2/10/2014 (Info 549).

Conceito de crime continuado Crime continuado ocorre quando o agente: - por meio de duas ou mais condutas - pratica dois ou mais crimes da mesma espécie - e, analisando as condições de tempo, local, modo de execução e outras, - pode-se constatar que os demais crimes devem ser entendidos como mera continuação do primeiro. O crime continuado é uma ficção jurídica, inspirada em motivos de política criminal, idealizada com o objetivo de ajudar o réu. Ao invés de ele ser condenado pelos vários crimes, receberá a pena de somente um deles, com a incidência de um aumento previsto na lei. Exemplo: Carlos era caixa de uma lanchonete e estava devendo 500 reais a um agiota. Ele decide, então, tirar o dinheiro do caixa para pagar sua dívida. Ocorre que se ele tirasse tudo de uma vez o seu chefe iria perceber. Carlos resolve, portanto, subtrair 50 reais por dia. Assim, após 10 dias ele consegue retirar os 500 reais. Desse modo, Carlos, por meio de 10 condutas, praticou 10 furtos. Analisando as condições de tempo, local, modo de execução, pode-se constatar que os outros 9 furtos devem ser entendidos como mera continuação do primeiro, considerando que sua intenção era furtar todos os 500 reais. Ao invés de Carlos ser condenado por 10 furtos, receberá somente a pena de um furto, com a incidência de um aumento de 1/6 a 2/3. Previsão legal

Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

Natureza jurídica Existem três teorias que foram desenvolvidas para tentar explicar a natureza jurídica da continuidade delitiva:

a) Teoria da unidade real: afirma que todas as condutas praticadas que, por si sós, já se constituiriam em infrações penais, são um único crime. Segundo essa teoria, para todos os efeitos, Carlos praticou apenas um único furto.

b) Teoria da ficção jurídica: sustenta que cada uma das condutas praticadas constitui-se em uma infração penal diferente. No entanto, por ficção jurídica, esses diversos crimes são considerados, pela lei, como crime único. Segundo essa teoria, Carlos praticou 10 furtos, entretanto, considera-se, ficticiamente, para fins de pena, que ele cometeu apenas um.

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c) Teoria mista: defende que se houver crime continuado surge um terceiro crime, resultado do próprio concurso. Segundo essa teoria, Carlos praticou uma nova categoria de crime, chamada de furto por continuidade delitiva.

O Brasil adotou a teoria da ficção jurídica. Requisitos Para o reconhecimento do crime continuado, são necessários quatro requisitos: 1) Pluralidade de condutas (prática de duas ou mais condutas subsequentes e autônomas); 2) Pluralidade de crimes da mesma espécie (prática de dois ou mais crimes iguais); 3) Condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução, entre outras; 4) Unidade de desígnio. 1) Pluralidade de condutas O agente deve praticar duas ou mais condutas, ou seja, mais de uma ação ou omissão. 2) Pluralidade de crimes da mesma espécie O agente deve praticar dois ou mais crimes da mesma espécie. Segundo o STJ e o STF, quando o CP fala em crimes da mesma espécie, ele exige que sejam crimes previstos no mesmo tipo penal, protegendo igual bem jurídico. Desse modo, para que seja reconhecida a continuidade delitiva, é necessário que o agente pratique dois ou mais crimes idênticos (ex: quatro furtos simples consumados e um tentado). Se a pessoa comete um furto e depois um roubo não há continuidade delitiva. Se a pessoa pratica um roubo simples e, em seguida, um latrocínio, igualmente, não haverá crime continuado. Para que haja continuidade, repita-se, é indispensável que os crimes sejam previstos no mesmo dispositivo legal e protejam o mesmo bem jurídico. Nesse sentido, o STJ decidiu: Não há continuidade delitiva entre os crimes de roubo e extorsão, ainda que praticados em conjunto. Isso porque, nos termos da pacífica jurisprudência do STJ, os referidos crimes, conquanto de mesma natureza, são de espécies diversas, o que impossibilita a aplicação da regra do crime continuado, ainda quando praticados em conjunto. STJ. 6ª Turma. HC 77.467-SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 2/10/2014 (Info 549). 3) Condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução, entre outras A doutrina afirma que deve haver uma conexão de tempo, de lugar e de execução entre os crimes para que se caracterize o crime continuado.

3.1 Conexão de tempo (conexão temporal): Significa dizer que, para que haja continuidade delitiva, não pode ter se passado um longo período de tempo entre um crime e outro. Para os crimes patrimoniais, a jurisprudência afirma que entre o primeiro e o último delito não pode ter se passado mais que 30 dias. Se houve período superior a 30 dias, não se aplica mais o crime continuado, havendo, neste caso, concurso material. Vale ressaltar que, em alguns outros delitos, como nos crimes contra a ordem tributária, a jurisprudência admite que esse prazo seja maior.

3.2 Conexão de lugar (conexão espacial): Para que haja continuidade delitiva, os crimes devem ter sido praticados em semelhantes condições de lugar. Segundo a jurisprudência, semelhantes condições de lugar significa que os delitos devem ser praticados dentro da mesma cidade, ou, no máximo, em cidades contíguas.

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3.3 Conexão quanto à maneira de execução (conexão modal): Para que haja continuidade delitiva, os crimes devem ter sido praticados com o mesmo modus operandi, ou seja, com a mesma maneira de execução (mesmos comparsas, mesmos instrumentos etc). 4) Unidade de desígnio Esse quarto requisito não está previsto expressamente no art. 71 do CP. Por isso, alguns doutrinadores afirmam que ele não é necessário. Sobre o tema, surgiram duas teorias: 4.1 Teoria objetiva pura (puramente objetiva): Segundo esta teoria, os requisitos para a continuidade delitiva são apenas objetivos e estão expressamente elencados no art. 71 do CP. Daí o nome: puramente objetiva. Não é necessário que se discuta se a intenção do agente era ou não praticar todos os crimes em continuidade delitiva. No exemplo que demos acima, não interessa discutir se o objetivo de Carlos era praticar um único furto de 500 reais dividido em várias vezes ou se sua intenção era ficar subtraindo o dinheiro da padaria por tempo indeterminado. Essa teoria é minoritária e ultrapassada. 4.2 Teoria objetivo-subjetiva (também chamada de teoria mista): De acordo com esta teoria, os requisitos para a continuidade delitiva são de natureza tanto objetiva como subjetiva. Daí o nome da teoria: objetivo-subjetiva. Os requisitos objetivos estão previstos no art. 71 (mesmas condições de tempo, lugar e forma de execução). O requisito subjetivo, por sua vez, é a unidade de desígnio, ou seja, o liame volitivo entre os delitos, a demonstrar que os atos criminosos se apresentam entrelaçados (a conduta posterior deve constituir um desdobramento da anterior). Conforme explica Nucci: “Somente deveria ter direito ao reconhecimento desse benefício legal o agente criminoso que demonstrasse ao juiz o seu intuito único, o seu propósito global, vale dizer, evidenciasse que, desde o princípio, ou pelo menos durante o iter criminis, tinha o propósito de cometer um crime único, embora por partes. Assim, o balconista de uma loja que, pretendendo subtrair R$ 1.000,00 do seu patrão, comete vários e contínuos pequenos furtos até atingir a almejada quantia. Completamente diferente seria a situação daquele ladrão que comete furtos variados, sem qualquer rumo ou planejamento, nem tampouco objetivo único.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 6ª ed., São Paulo: RT, 2006, p. 405). Essa é a teoria adotada pelo STJ e STF:

(...) O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que para caracterizar a continuidade delitiva é necessária a demonstração da unidade de desígnios, ou seja, o liame volitivo que liga uma conduta a outra, não bastando, portanto, o preenchimento dos requisitos objetivos (mesmas condições de tempo, espaço e modus operandi). 2. No caso, observa-se que o Tribunal a quo, ao aplicar a regra do art. 71 do Código Penal, adotou a teoria puramente objetiva, deixando de valorar os aspectos subjetivos. (...) (REsp 421.246/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 15/12/2009)

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EFEITOS DA CONDENAÇÃO Perda do cargo, função pública ou mandato eletivo (art. 92, I, do CP)

O art. 92, I, do CP prevê, como efeito extrapenal específico da condenação, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo.

Segundo prevê o parágrafo único do art. 92 e a jurisprudência do STJ, esse efeito (perda do cargo) não é automático, devendo ser motivadamente declarado na sentença.

Em outras palavras, a determinação da perda de cargo público pressupõe fundamentação concreta que justifique o cabimento e necessidade da medida.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.044.866-MG, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 2/10/2014 (Info 549).

O art. 92, I, do CP prevê, como efeito extrapenal específico da condenação, o seguinte:

Art. 92. São também efeitos da condenação: I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.

Os efeitos previstos no art. 92, I, do CP são automáticos? Em outras palavras, sempre que houver condenação e forem aplicadas as penas previstas nas alíneas “a” e “b”, haverá a perda do cargo? NÃO. Para que esse efeito da condenação seja aplicado, é indispensável que a decisão condenatória motive concretamente a necessidade da perda do cargo, emprego, função ou mandato eletivo. O parágrafo único do art. 92 expressamente afirma isso:

Art. 92 (...) Parágrafo único. Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença.

Lei de Licitações

A Lei de Licitação (Lei n. 8.666/93) prevê alguns crimes e regras de direito penal. Uma das situações previstas é que, se o réu for condenado por crime da Lei de Licitação, ele perderá o cargo, emprego, função ou mandato eletivo. Desse modo, o condenado, se agente público, receberá uma sanção penal, além de outra de natureza administrativa, devendo ambas ser aplicadas cumulativamente. Veja a redação do dispositivo:

Art. 83. Os crimes definidos nesta Lei, ainda que simplesmente tentados, sujeitam os seus autores, quando servidores públicos, além das sanções penais, à perda do cargo, emprego, função ou mandato eletivo.

Segundo já decidiu o STJ, os efeitos previstos no art. 83 NÃO são automáticos. Assim, para que haja perda do cargo, emprego, função ou mandato eletivo, é indispensável que a decisão condenatória motive concretamente a necessidade do afastamento. Em outras palavras, o STJ afirmou que a exigência contida

no parágrafo único do art. 92 do CP também é aplicada à perda do cargo prevista no art. 83 da Lei n. 8.666/93 (STJ. 6ª Turma. REsp 1.244.666-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 16/8/2012). Cuidado com a Lei de Tortura:

Na Lei de Tortura (Lei n. 9.455/97) também existe a previsão de perda do cargo como efeito extrapenal específico da condenação. Veja:

Art. 1º (...) § 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.

Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 30

Deve-se ter cuidado com essa previsão porque o STJ entende que, na Lei de Tortura, esse efeito da perda do cargo é automático:

(...) A perda do cargo, função ou emprego público é efeito automático da condenação pela prática do crime de tortura, não sendo necessária fundamentação concreta para a sua aplicação. Precedentes. (...) (STJ. 6ª Turma. AgRg no Ag 1388953/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 20/06/2013)

INVASÃO DE DOMICÍLIO (ART. 150 DO CP) Configura invasão de domicílio a invasão de gabinete de Delegado de Polícia

Importante!!!

Configura o crime de violação de domicílio (art. 150 do CP) o ingresso e a permanência, sem autorização, em gabinete de Delegado de Polícia, embora faça parte de um prédio ou de uma repartição públicos.

No caso concreto, dezenas de manifestantes foram até a Delegacia de Polícia Federal cobrar agilidade na conclusão de um inquérito policial. Como não foram recebidos, decidiram invadir o gabinete do Delegado.

STJ. 5ª Turma. HC 298.763-SC, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 7/10/2014 (Info 549).

Imagine a seguinte situação adaptada: Dezenas de manifestantes foram até a Delegacia de Polícia Federal cobrar agilidade na conclusão de um inquérito policial. Na recepção da Delegacia, o grupo foi informado que o Delegado somente receberia em seu gabinete para conversar um único representante do movimento. Os manifestantes não aceitaram e, então, invadiram o gabinete do Delegado para protestar. Ressalte-se que não houve nenhum ato de ameaça ou violência por parte dos manifestantes. Os manifestantes cometeram algum delito? Qual? Praticaram invasão de domicílio, crime previsto no art. 150 do CP:

Art. 150. Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

Mas o gabinete do Delegado pode ser considerado “casa”? SIM, o gabinete de Delegado de Polícia, embora faça parte de um prédio ou de uma repartição públicos, pode ser considerada “casa” para fins penais. Isso porque se trata de um compartimento não aberto ao público em geral, salvo com a autorização do seu titular. Assim, enquadra-se no inciso III do § 4º do art. 150:

§ 4º - A expressão "casa" compreende: III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

Para o STJ, sendo a sala de um servidor público um compartimento com acesso restrito e dependente de autorização, e, por isso, um local fechado ao público, onde determinado indivíduo exerce suas atividades laborais, há o necessário enquadramento no conceito de “casa” previsto no art. 150 do CP. Se considerássemos de forma diferente, isso significaria a ausência de proteção à liberdade individual de todos aqueles que trabalham em prédios públicos, já que poderiam ter os recintos ou gabinetes invadidos por terceiros não autorizados a qualquer momento, o que não se coaduna com o objetivo do tipo penal em questão.

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Se tal situação fosse permitida, o próprio serviço público ficaria inviabilizado, pois qualquer cidadão que quisesse protestar poderia ingressar no prédio público, inclusive nos espaços restritos à população, sem que tal conduta caracterizasse ilícito. No caso concreto, quem será competente para julgar esse delito? Justiça Federal, por ter sido praticado contra bem e serviço da União (art. 109, IV, da CF/88).

VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL (ART. 184 DO CP) Regras sobre procedimento e perícia

Importante!!!

O agente que comercializa CD’s ou DVD’s piratas pratica o delito do § 2º do art. 184 do CP.

A ação penal para o crime previsto no § 2º do art. 184 do CP é pública incondicionada e seu procedimento está regulado pelos arts. 524 a 530 do CPP.

Segundo o art. 530-D do CPP, depois da apreensão, será realizada perícia sobre todos os bens apreendidos e elaborado o laudo, que deverá integrar o inquérito policial ou o processo.

De acordo com o STJ, não é razoável exigir minúcias exageradas no laudo pericial, como a catalogação de centenas ou milhares de CD's e DVD's, indicação de cada título e autor da obra apreendida e contrafeita, sendo válida, ainda, a perícia realizada nas características externas do material apreendido.

Além disso, apesar de a redação do art. 530-D do CPP determinar que a perícia deva ser realizada sobre todos os bens apreendidos, o STJ relativiza essa exigência e admite que seja realizada por amostragem e, concluído que há falsidade, revela-se configurado o delito.

STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 276.128-MG, Rel. Min. Walter de Almeida Guilherme (Desembargador Convocado do TJ/SP), julgado em 2/10/2014 (Info 549).

Imagine a seguinte situação hipotética: João foi preso em casa com dezenas de DVD’s piratas que ele estava comercializando. Qual crime, em tese, praticou o agente? Essa conduta amolda-se ao § 2º do art. 184 do CP:

Violação de direito autoral Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. (...) § 2º Na mesma pena do § 1º incorre quem, com o intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente.

Como essa prática é cada vez mais comum, havendo, inclusive, “feiras” fiscalizadas pelo Poder Público onde esse comércio ocorre livremente, a Defensoria Pública alegou que não haveria crime, com base no princípio da adequação social. Essa tese é acolhida pela jurisprudência? NÃO. Tanto o STF como o STJ entendem que é típica, formal e materialmente, a conduta de expor à venda CDs e DVDs falsificados. Em suma, é crime.

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O fato de, muitas vezes, haver tolerância das autoridades públicas em relação a tal prática não significa que a conduta não seja mais tida como típica, ou que haja exclusão de culpabilidade, razão pela qual, pelo menos até que advenha modificação legislativa, incide o tipo penal, mesmo porque o próprio Estado tutela o direito autoral. Não se pode considerar socialmente tolerável uma conduta que causa sérios prejuízos à indústria fonográfica brasileira e aos comerciantes legalmente instituídos, bem como ao Fisco pelo não pagamento de impostos. Nesse sentido: STF HC 98898, julgado em 20/04/2010. Justamente para que não houvesse mais dúvidas, o STJ editou um enunciado:

Súmula 502-STJ: Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no artigo 184, parágrafo 2º, do Código Penal, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas.

Outra tese alegada pela defesa é a de que deveria ser aplicado o princípio da insignificância. Tal argumentação é aceita pelos Tribunais? NÃO. Segundo já decidiu o STJ, não se aplica o princípio da insignificância ao crime de violação de direito autoral. Em que pese a aceitação popular à pirataria de CDs e DVDs, com certa tolerância das autoridades públicas em relação à tal prática, a conduta, que causa sérios prejuízos à indústria fonográfica brasileira, aos comerciantes legalmente instituídos e ao Fisco, não escapa à sanção penal, mostrando-se formal e materialmente típica (AgRg no REsp 1380149/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 27/08/2013). A pena prevista para esse crime é de 2 a 4 anos. Trata-se de reprimenda desproporcional para esse tipo de conduta? NÃO. De acordo com o STJ, não há desproporcionalidade da pena prevista, pois o próprio legislador, atento aos reclamos da sociedade que representa, entendeu merecer tal conduta pena considerável, especialmente pelos graves e extensos danos que acarreta, estando geralmente relacionada a outras práticas criminosas, como a sonegação fiscal e a formação de quadrilha (HC 191568/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 07/02/2013). Qual é a ação penal nos crimes previstos no art. 184 do CP? • Art. 184, caput: ação penal privada. • Art. 184, §§ 1º e 2º (ex: venda de DVD pirata): ação pública incondicionada. • Art. 184, § 3º: ação penal pública condicionada. Regras de procedimento O processo e julgamento dos crimes contra a propriedade imaterial é disciplinado pelos arts. 524 a 530-I do CPP. Estes artigos preveem dois tipos de procedimento: um para o delito do art. 184, caput, do CP e outro para as infrações dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 184 do CP. Delito do art. 184, caput, do CP: aplicam-se as regras dos arts. 524 a 530 do CPP. Delitos dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 184 do CP:

A autoridade policial fará a apreensão dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos (ex: CDs e DVDs piratas), em sua totalidade, juntamente com os equipamentos, suportes e materiais que possibilitaram a sua existência (ex: computador onde eram feitas as cópias das mídias), desde que estes se destinem precipuamente à prática do ilícito;

Na ocasião da apreensão será lavrado termo, assinado por 2 (duas) ou mais testemunhas, com a descrição de todos os bens apreendidos e informações sobre suas origens, o qual deverá integrar o inquérito policial ou o processo;

Depois da apreensão, será realizada, por perito oficial, ou, na falta deste, por pessoa tecnicamente habilitada, perícia sobre todos os bens apreendidos e elaborado o laudo que deverá integrar o inquérito policial ou o processo;

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Este exame técnico tem o objetivo de atestar a ocorrência ou não de reprodução (cópia) feita com violação de direitos autorais. Segundo o STJ, no caso do § 2º do art. 184 do CP, comprovada a materialidade delitiva por meio da perícia, é totalmente desnecessária a identificação e inquirição das supostas vítimas, até mesmo porque este ilícito é apurado mediante ação penal pública incondicionada, dispensando qualquer provocação por parte da vítima.

Caso sejam identificadas as vítimas do delito, os titulares de direito de autor e os que lhe são conexos serão os fiéis depositários de todos os bens apreendidos, devendo colocá-los à disposição do juiz quando do ajuizamento da ação;

O juiz poderá determinar, a requerimento da vítima, a destruição da produção ou reprodução apreendida, salvo se estiver sendo discutido se o material encontrado é ou não ilícito;

O juiz, ao prolatar a sentença condenatória, poderá determinar a destruição dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos e o perdimento dos equipamentos apreendidos, desde que precipuamente destinados à produção e reprodução dos bens, em favor da Fazenda Nacional, que deverá destruí-los ou doá-los aos Estados, Municípios e Distrito Federal, a instituições públicas de ensino e pesquisa ou de assistência social, bem como incorporá-los, por economia ou interesse público, ao patrimônio da União, que não poderão retorná-los aos canais de comércio;

As associações de titulares de direitos de autor e os que lhes são conexos poderão, em seu próprio nome, funcionar como assistente da acusação, quando praticado em detrimento de qualquer de seus associados.

Voltando ao nosso exemplo hipotético: Os peritos fizeram a perícia em apenas alguns DVD’s, por amostragem, e esse exame se limitou a analisar os elementos externos dos DVD's apreendidos, como a impressão da capa, o código de barras, o nome do fabricante etc. A Defensoria Pública questionou a validade dessa perícia, afirmando que o art. 530-D do CPP exige que a perícia seja feita sobre TODOS os bens apreendidos. Além disso, argumentou que deveria também ter sido examinado o conteúdo de cada um dos DVD’s (e não apenas os aspectos exteriores).

A tese da defesa quanto à deficiência da perícia é aceita pela jurisprudência do STJ? NÃO. A lei autorizou menores formalidades para atestar a falsidade da mercadoria, não sendo razoável exigir minúcias exageradas no laudo pericial, como a catalogação de centenas ou milhares de CD's e DVD's, indicação de cada título e autor da obra apreendida e contrafeita, sendo válida, ainda, a perícia realizada nas características externas do material apreendido (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1469677⁄MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 04⁄09⁄2014). Além disso, apesar de a redação do art. 530-D do CPP determinar que a perícia deva ser realizada sobre todos os bens apreendidos, o STJ relativiza essa exigência e admite que seja realizada por amostragem e, concluído que há falsidade, revela-se configurado o delito (AgRg no REsp 1456256⁄MG, Rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora convocada do TJ⁄SE), julgado em 07⁄08⁄2014).

Uma última pergunta sobre um tema correlato e que irão tentar confundi-lo na prova: se João estivesse vendendo programas de computador “pirateados”, o crime também seria o do art. 184 do CP?

NÃO. Neste caso, João teria praticado o delito do art. 12 da Lei n. 9.609/98:

Art. 12. Violar direitos de autor de programa de computador: Pena - Detenção de seis meses a dois anos ou multa. § 1º Se a violação consistir na reprodução, por qualquer meio, de programa de computador, no todo ou em parte, para fins de comércio, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente: Pena - Reclusão de um a quatro anos e multa. § 2º Na mesma pena do parágrafo anterior incorre quem vende, expõe à venda, introduz no País, adquire, oculta ou tem em depósito, para fins de comércio, original ou cópia de programa de computador, produzido com violação de direito autoral.

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LEI DE DROGAS A condenação pelo art. 28 da LD gera reincidência

A condenação por porte de drogas para consumo próprio (art. 28 da Lei 11.343/2006) transitada em julgado gera reincidência. Isso porque a referida conduta foi apenas despenalizada pela nova Lei de Drogas, mas não descriminalizada (abolitio criminis).

STJ. 6ª Turma. HC 275.126-SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 18/9/2014 (Info 549).

Porte de droga para consumo pessoal

A Lei n. 11.343/2006 prevê o crime de posse/porte de droga para consumo pessoal nos seguintes termos:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Tese de que o art. 28 não seria crime Assim que a Lei de Drogas foi editada, Luis Flávio Gomes defendeu a tese de que o porte/posse de droga para consumo pessoal havia deixado de ser crime. Em outras palavras, LFG sustentou que o art. 28 não traria a definição de crime já que ele não prevê pena privativa de liberdade nem multa. Logo, estaria “fora” do conceito de crime trazido pela Lei de Introdução ao Código Penal (DL 3.914/1941):

Art. 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas. alternativa ou cumulativamente.

O STF aceitou essa tese? NÃO. O STF decidiu o art. 28 da Lei de Drogas, mesmo sem prever pena privativa de liberdade, continua sendo crime. Assim, não houve uma descriminalização da conduta (abolitio criminis), mas sim uma despenalização. A despenalização ocorre quando o legislador prevê sanções alternativas para o crime que não sejam penas privativas de liberdade. Confira a ementa do julgado no STF:

(...) 1. O art. 1º da LICP - que se limita a estabelecer um critério que permite distinguir quando se está diante de um crime ou de uma contravenção - não obsta a que lei ordinária superveniente adote outros critérios gerais de distinção, ou estabeleça para determinado crime - como o fez o art. 28 da L. 11.343/06 - pena diversa da privação ou restrição da liberdade, a qual constitui somente uma das opções constitucionais passíveis de adoção pela lei incriminadora (CF/88, art. 5º, XLVI e XLVII). 2. Não se pode, na interpretação da L. 11.343/06, partir de um pressuposto desapreço do legislador pelo "rigor técnico", que o teria levado inadvertidamente a incluir as infrações relativas ao usuário de drogas em um capítulo denominado "Dos Crimes e das Penas", só a ele referentes. (L. 11.343/06, Título III, Capítulo III, arts. 27/30). (...) 4. Soma-se a tudo a previsão, como regra geral, ao processo de infrações atribuídas ao usuário de drogas, do rito estabelecido para os crimes de menor potencial ofensivo, possibilitando até mesmo a proposta de aplicação imediata da pena de que trata o art. 76 da L. 9.099/95 (art. 48, §§ 1º e 5º), bem como a disciplina da prescrição segundo as regras do art. 107 e seguintes do C. Penal (L. 11.343, art. 30).

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6. Ocorrência, pois, de "despenalização", entendida como exclusão, para o tipo, das penas privativas de liberdade. 7. Questão de ordem resolvida no sentido de que a L. 11.343/06 não implicou abolitio criminis (C.Penal, art. 107). (...) (STF. 1ª Turma. RE 430105 QO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 13/02/2007).

Se uma pessoa é condenada, com trânsito em julgado, pelo delito de porte de drogas para consumo

próprio (art. 28 da Lei n. 11.343/2006) e depois pratica outro delito, ele será considerado reincidente na dosimetria desse segundo crime? SIM. A condenação por porte de drogas para consumo próprio (art. 28 da Lei 11.343/2006) transitada em julgado gera reincidência. Isso porque a referida conduta continua sendo crime, tendo sido apenas despenalizada pela nova Lei de Drogas, mas não descriminalizada (abolitio criminis).

DIREITO PROCESSUAL PENAL

COMPETÊNCIA Tortura cometida contra brasileiro no exterior

Importante!!!

Crime de tortura praticado contra brasileiro no exterior: trata-se de hipótese de extraterritorialidade incondicionada (art. 2º da Lei 9.455⁄97).

No Brasil, a competência para julgar será da Justiça Estadual.

O fato de o crime de tortura, praticado contra brasileiros, ter ocorrido no exterior, não torna, por si só, a Justiça Federal competente para processar e julgar os agentes estrangeiros. Isso porque a situação não se enquadra, a princípio, em nenhuma das hipóteses do art. 109 da CF/88.

STJ. 3ª Seção. CC 107.397-DF, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 24/9/2014 (Info 548).

Imagine a seguinte situação adaptada: Dois brasileiros estavam fazendo pesca esportiva no Uruguai quando foram abordados, presos e torturados por policiais uruguaios. Após serem libertados, voltaram ao Brasil e noticiaram o caso às autoridades brasileiras.

Pode ser aplicada a lei brasileira na presente situação? A Justiça brasileira será competente para apurar o crime? Trata-se de hipótese de extraterritorialidade condicionada ou incondicionada? Qual é o fundamento legal no Código Penal? SIM. A lei penal brasileira pode ser aplicada ao caso. Trata-se de hipótese de extraterritorialidade

incondicionada. O fundamento legal não está no Código Penal, mas sim no art. 2º da Lei n. 9.455⁄97 (Lei de Tortura), que é uma previsão específica. Veja o que diz o dispositivo:

Art. 2º O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira.

Extraterritorialidade Extraterritorialidade significa a aplicação da lei brasileira a fatos que ocorreram fora do território nacional, ou seja, no exterior. Daí vem o nome extraterritorialidade (extra = fora).

Em alguns casos, a lei diz que, se determinado tipo de crime acontecer no exterior, a lei brasileira irá ser aplicada sem exigir nenhuma outra condição. A isso chamamos de extraterritorialidade incondicionada. Ex: art. 7º, I, do CP.

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Em outros casos, a lei diz que, se determinado tipo de crime acontecer no exterior, a lei brasileira irá ser aplicada, exigindo-se, no entanto, o cumprimento de certas condições. É o que se denomina de extraterritorialidade condicionada. Ex: art. 7º, II, do CP.

Normalmente, quando se fala em extraterritorialidade, lembra-se apenas do art. 7º do CP. No entanto, como vimos acima, a Lei de Tortura traz importantíssima previsão de extraterritorialidade. Extraterritorialidade na Lei de Tortura O art. 2º da Lei de Tortura traz duas hipóteses de extraterritorialidade:

1ª hipótese: Se o crime de tortura tiver sido cometido contra a vítima brasileira. Trata-se de hipótese de extraterritorialidade incondicionada. Sendo a vítima brasileira, pode ser aplicada a lei brasileira ao caso. 2ª hipótese: Se o agente que praticou a tortura estiver em local sob jurisdição brasileira. Aqui há uma polêmica: Para alguns, trata-se de extraterritorialidade incondicionada. É o caso de Nucci e Habib. Para outros, consiste em extraterritorialidade condicionada. É a posição de Marcelo André Azeredo:

“Entendemos que se trata de extraterritorialidade condicionada. A condição não está prevista na lei especial nem no Código Penal, mas em duas convenções sobre a tortura: Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (art. 12) e a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (art. 5º). Os dispositivos citados condicionam que a lei será aplicada caso não haja extradição. Ou seja, se for caso de extradição, não incidirá a lei do país em que o agente se encontrar.” (AZEREDO, Marcelo André. Direito Penal. Parte Geral. Salvador: Juspodivm, 2012, p. 122). Voltando ao nosso exemplo. Como as vítimas eram brasileiras, trata-se de hipótese de extraterritorialidade incondicionada. Logo, a Justiça brasileira poderá apurar o fato. De quem será a competência para julgar o crime: Justiça Estadual ou Federal?

Justiça ESTADUAL. O fato de o crime de tortura, praticado contra brasileiros, ter ocorrido no exterior, não torna, por si só, a Justiça Federal competente para processar e julgar os agentes estrangeiros. O crime de tortura praticado em território estrangeiro contra brasileiros não se subsume, em regra, a nenhuma das hipóteses de competência da Justiça Federal previstas nos incisos IV, V e V-A do art. 109 da CF/88:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo;

Não se enquadra no inciso IV, considerando que não se tem dano direto a bens ou serviços da União, suas entidades autárquicas ou empresas públicas. Não é caso do inciso V porque, apesar de a tortura ser um crime previsto em tratados internacionais, na situação em tela, o delito foi integralmente praticado em território estrangeiro. Não se trata de crime à distância. Por fim, o deslocamento de competência para a jurisdição federal de crimes com violação a direitos humanos exige provocação e hipóteses extremadas e taxativas, nos termos do art. 109, V-A e § 5º.

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CITAÇÃO POR EDITAL Oitiva de policiais como prova antecipada de prova urgente (art. 366 do CPP)

Importante!!!

O art. 366 do CPP estabelece que, se o acusado for citado por edital e não comparecer ao processo nem constituir advogado, o processo e o curso da prescrição ficarão suspensos.

Esse artigo afirma, ainda, que, nesse caso, o juiz poderá determinar:

• a produção antecipada de provas consideradas urgentes e

• decretar prisão preventiva do acusado se estiverem presentes os requisitos do art. 312 do CPP.

A oitiva de testemunhas pode ser considerada prova urgente para os fins do art. 366 do CPP, desde que as circunstâncias do caso concreto revelem a possibilidade concreta de perecimento.

Segundo decidiu o STJ, se o processo estiver suspenso com base no art. 366 do CPP, e uma das testemunhas for policial, o juiz poderá autorizar que ela seja ouvida de forma antecipada, sendo isso considerado prova urgente. O atuar constante no combate à criminalidade expõe o agente da segurança pública a inúmeras situações conflituosas com o ordenamento jurídico, sendo certo que as peculiaridades de cada uma acabam se perdendo em sua memória, seja pela frequência com que ocorrem, ou pela própria similitude dos fatos.

STJ. 5ª Turma. RHC 51.232-DF, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 2/10/2014 (Info 549).

Se o acusado é citado por edital, mesmo assim o processo continua normalmente? O art. 366 do CPP estabelece que: se o acusado for citado por edital e não comparecer ao processo nem constituir advogado o processo e o curso da prescrição ficarão suspensos. Se o réu comparecer ao processo ou constituir advogado, o processo e o prazo prescricional voltam a correr normalmente. O objetivo do art. 366 é garantir que o acusado que não foi pessoalmente citado não seja julgado à revelia. Qual é o prazo máximo que o prazo prescricional pode ficar suspenso caso o réu não apareça? O art. 366 somente fala que o processo e o prazo prescricional ficam suspensos, sem estabelecer um limite de tempo. O STJ, no entanto, entende que, mesmo sem haver previsão de tempo máximo na lei, o prazo de prescrição não pode ficar suspenso para sempre, sob pena do crime que o acusado estiver respondendo se transformar em imprescritível. Para o STJ, apenas a CF (e não a lei) pode estabelecer casos de imprescritibilidade, o que ela fez somente em dois casos: a) crime de racismo (art. 5º, XLII); b) crime de ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLIV). Seguindo esse entendimento, o STJ editou uma súmula dizendo que o período máximo que o prazo prescricional pode ficar suspenso é o tempo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato do crime descrito na denúncia.

Súmula 415-STJ: O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada.

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A súmula não é tão fácil de entender, mas com um exemplo fica melhor: “João” foi acusado de estelionato (art. 171 do CP). O juiz recebeu a denúncia e determinou sua citação. Como “João” não foi encontrado, realizou-se sua citação por edital. Citado por edital, “João” não compareceu ao processo nem constituiu advogado. Logo, o juiz determinou a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional. Por quanto tempo o prazo prescricional poderá ficar suspenso? A pena do estelionato é de 1 a 5 anos. O prazo prescricional do estelionato, considerando o máximo da pena cominada (imposta), é de 12

anos (art. 109, III, do CP). Assim, o prazo prescricional neste processo de “João” ficará suspenso aguardando ele ser encontrado

pelo prazo de 12 anos. Se, passados os 12 anos, ele não for localizado, o prazo prescricional volta a correr (o que é bom para

“João”). Depois de 12 anos contados do dia em que o prazo prescricional voltou a tramitar, o juiz deverá

declarar a prescrição da pretensão punitiva. Em suma, neste exemplo, para que ocorra a prescrição, deverão ser passados 24 anos: 12 anos em que

o prazo prescricional ficará suspenso e mais 12 anos que correspondem ao prazo para que a prescrição ocorra.

Obs: a 1ª Turma do STF possui um julgado afirmando que o prazo prescricional no caso do art. 366 do CPP ficaria suspenso de forma indefinida (indeterminada): RE 460.971, Re. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, julgado em 13/02/2007. Na prática forense e em provas de concurso, contudo, tem prevalecido a Súmula 415-STJ. Produção antecipada de provas urgentes e prisão preventiva: O art. 366 do CPP afirma, ainda, que se o acusado, citado por edital, não comparecer nem constituir advogado, o juiz poderá determinar:

a produção antecipada de provas consideradas urgentes e

decretar prisão preventiva do acusado se estiverem presentes os requisitos do art. 312 do CPP (o simples fato do acusado não ter sido encontrado não é motivo suficiente para decretar sua prisão preventiva).

Produção antecipada das provas consideradas urgentes: No caso do art. 366 do CPP, o juiz poderá determinar a produção antecipada de provas consideradas urgentes. Para que o magistrado realize a colheita antecipada das provas, exige-se que seja demonstrada a real necessidade da medida. Assim, toda produção antecipada de provas realizada nos termos do art. 366 do CPP está adstrita à sua necessidade concreta, devidamente fundamentada. Nesse sentido, existe, inclusive, entendimento sumulado do STJ:

Súmula 455-STJ: A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no artigo 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo.

A oitiva de testemunhas pode ser considerada prova urgente para os fins do art. 366 do CPP? Sim, desde que as circunstâncias do caso concreto revelem a possibilidade concreta de perecimento. Exemplo: testemunha que exerce função de segurança pública (policial). Se o processo estiver suspenso com base no art. 366 do CPP, e uma das testemunhas for policial, o juiz poderá autorizar que ela seja ouvida de forma antecipada, sendo isso considerado prova urgente.

Informativo 549-STJ (05/11/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 39

Segundo o STJ, o atuar constante no combate à criminalidade expõe o agente da segurança pública a inúmeras situações conflituosas com o ordenamento jurídico, sendo certo que as peculiaridades de cada uma acabam se perdendo em sua memória, seja pela frequência com que ocorrem, ou pela própria similitude dos fatos. Assim, essa peculiaridade justifica que os policiais sejam ouvidos como produção antecipada da prova testemunhal, pois além da proximidade temporal com a ocorrência dos fatos proporcionar uma maior fidelidade das declarações, possibilita o registro oficial da versão dos fatos vivenciados por ele, o que terá grande relevância para a garantia da ampla defesa do acusado, caso a defesa técnica repute necessária a repetição do seu depoimento por ocasião da retomada do curso da ação penal.

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) (Promotor MP/PR 2014 banca própria) Em sede de execução fiscal não embargada, se exige, para a

extinção do feito por abandono da causa, o requerimento da parte contrária, mesmo tendo sido o autor intimado para dar seguimento ao processo sob pena de extinção da demanda. ( )

2) (Promotor MP/PR 2014 banca própria) É admissível o litisconsórcio entre Ministérios Públicos. ( ) 3) (Juiz Federal TRF5 2011 CESPE) Admite-se o litisconsórcio facultativo entre os MPs da União, do DF e

dos estados na ação civil pública em defesa de interesses e direitos relacionados ao ambiente. ( ) 4) (Promotor MP/MS 2013 banca própria) Havendo litisconsórcio facultativo entre o Ministério Público

Estadual e o Federal no ajuizamento da ação civil pública, a competência para julgamento é do juiz estadual do local onde ocorreu o dano. ( )

5) (DPE/MA 2011 CESPE) A jurisprudência do STJ considera, para fins penais, socialmente adequada a venda de CDs e DVDs piratas, devendo a punição contra o agente limitar-se à esfera cível. ( )

6) (Juiz Federal TRF5 2011 CESPE) O comércio de cópias grosseiras de CDs e DVDs em centros urbanos, para o sustento próprio do agente e de sua família, impõe a aplicação dos princípios da insignificância e da adequação social e conduz à atipicidade da conduta, em tese violadora de tipo penal protetivo da propriedade imaterial. ( )

Gabarito

1. E 2. C 3. C 4. E 5. E 6. E