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Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Julgados não comentados por terem menor relevância para concursos públicos ou por terem sido decididos com base em peculiaridades do caso concreto: REsp 1.391.198-RS; REsp 1.174.811-SP; REsp 1.442.343-RS; AgRg no REsp 1.439.516-PR; REsp 1.172.929-RS; REsp 1.179.342-GO; Leia-os ao final deste Informativo. ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO FGTS Responsabilidade pelos extratos das contas vinculadas DIREITO CIVIL DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA (I)Legitimidade da pessoa jurídica para recorrer contra a decisão que determina a desconsideração. Fixação individualizada dos danos morais por morte de parente. RESPONSABILIDADE CIVIL Fixação individualizada dos danos morais por morte de parente. Termo inicial da prescrição nas ações de indenização do seguro DPVAT. ALIMENTOS Possibilidade de adjudicação dos direitos hereditários do alimentante para pagamento de pensão alimentícia. Direito do Consumidor RESPONSABILIDADE POR VÍCIO DO PRODUTO Dano moral decorrente de carro 0km que apresentou inúmeros problemas. Veículo importado que não poderia ser abastecido com combustível nacional. Direito Ambiental RESPONSABILIDADE POR DANO AMBIENTAL Responsabilidade por dano ambiental é objetiva, sob a modalidade do risco integral. DIREITO PROCESSUAL CIVIL PROCESSO ELETRÔNICO Ilegalidade da Resolução do Tribunal que imponha à parte o dever de digitalização do processo. EXECUÇÃO Bens do devedor solidário não podem responder pela execução se ele não constou no título executivo. EXECUÇÃO FISCAL Reunião de execuções fiscais propostas contra o mesmo devedor. Remessa necessária no caso de entença que julga procedente exceção de pré-executividade.

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Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Julgados não comentados por terem menor relevância para concursos públicos ou por terem sido decididos com base em peculiaridades do caso concreto: REsp 1.391.198-RS; REsp 1.174.811-SP; REsp 1.442.343-RS; AgRg no REsp 1.439.516-PR; REsp 1.172.929-RS; REsp 1.179.342-GO; Leia-os ao final deste Informativo.

ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO

FGTS Responsabilidade pelos extratos das contas vinculadas

DIREITO CIVIL

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA (I)Legitimidade da pessoa jurídica para recorrer contra a decisão que determina a desconsideração. Fixação individualizada dos danos morais por morte de parente. RESPONSABILIDADE CIVIL Fixação individualizada dos danos morais por morte de parente. Termo inicial da prescrição nas ações de indenização do seguro DPVAT. ALIMENTOS Possibilidade de adjudicação dos direitos hereditários do alimentante para pagamento de pensão alimentícia.

Direito do Consumidor

RESPONSABILIDADE POR VÍCIO DO PRODUTO Dano moral decorrente de carro 0km que apresentou inúmeros problemas. Veículo importado que não poderia ser abastecido com combustível nacional.

Direito Ambiental

RESPONSABILIDADE POR DANO AMBIENTAL Responsabilidade por dano ambiental é objetiva, sob a modalidade do risco integral.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PROCESSO ELETRÔNICO Ilegalidade da Resolução do Tribunal que imponha à parte o dever de digitalização do processo. EXECUÇÃO Bens do devedor solidário não podem responder pela execução se ele não constou no título executivo. EXECUÇÃO FISCAL Reunião de execuções fiscais propostas contra o mesmo devedor. Remessa necessária no caso de entença que julga procedente exceção de pré-executividade.

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Direito Penal

ESTATUTO DO DESARMAMENTO (LEI 10.826/2003) Porte ou posse de arma de fogo quebrada. LEI MARIA DA PENHA (LEI 11.340/2006) Descumprimento de medida protetiva de urgência não configura crime de desobediência

Direito Processual Penal

AÇÃO PENAL PRIVADA Queixa-crime. PRISÃO PREVENTIVA Prisão domiciliar do CPP Direito Penal e Processual Penal Militar

COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR Crime de desacato contra militar da Marinha do Brasil em atividade de patrulhamento naval

Direito Previdenciário

TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO Vínculos concomitantes e aproveitamento das contribuições em regimes diversos. Direito Internacional

DIVÓRCIO REALIZADO NO BRASIL E BENS SITUADOS NO ESTRANGEIRO Ação de divórcio de pessoas domiciliadas no Brasil e bens situados no estrangeiro

DIREITO ADMINISTRATIVO

FGTS Responsabilidade pelos extratos das contas vinculadas

Súmula 514-STJ: A CEF é responsável pelo fornecimento dos extratos das contas individualizadas vinculadas ao FGTS dos trabalhadores participantes do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, inclusive para fins de exibição em juízo, independentemente do período em discussão.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 14/08/2014.

FGTS FGTS é a sigla para Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. O FGTS foi criado pela Lei n.º 5.107/66 com o objetivo de proteger o trabalhador demitido sem justa causa. Atualmente, o FGTS é regido pela Lei n.º 8.036/90. Em que consiste o FGTS? O FGTS nada mais é do que uma conta bancária, aberta em nome do trabalhador e vinculada a ele no momento em que celebra seu primeiro contrato de trabalho. Nessa conta bancária o empregador deposita, todos os meses, o valor equivalente a 8% do salário pago ao empregado, acrescido de atualização monetária e juros.

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Assim, vai sendo formado um fundo de reserva financeira para o trabalhador, ou seja, uma espécie de “poupança” que é utilizada pelo obreiro quando fica desempregado sem justa causa ou quando precisa para alguma finalidade relevante assim considerada pela lei. Se o empregado for demitido sem justa, o empregador é obrigado a depositar, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, uma indenização compensatória de 40% do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros (art. 18, § 1º da Lei n.º 8.036/90). O trabalhador que possui conta do FGTS vinculada a seu nome é chamado de trabalhador participante do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. O trabalhador poderá levantar (“sacar”) o valor depositado em sua conta do FGTS? SIM, mas somente em algumas situações previstas na Lei. O art. 20 da Lei n.º 8.036/90 prevê as hipóteses em que o trabalhador poderá movimentar a sua conta vinculada no FGTS. São exemplos:

Se o trabalhador for despedido sem justa causa;

Se se aposentar;

Se ele (ou algum dependente) for acometido de neoplasia maligna (câncer), HIV ou outra doença grave;

Se houver necessidade pessoal, cuja urgência e gravidade decorra de desastre natural. Qual é o papel da Caixa Econômica Federal no FGTS? A Caixa Econômica Federal exerce o papel de agente operador do FGTS (art. 4º da Lei nº 8.036/90). Dentre outras funções, cabe a CEF:

centralizar os recursos do FGTS;

manter e controlar as contas vinculadas

emitir extratos individuais correspondentes às contas vinculadas (art. 7º, I). A CEF exerce a função de agente operador desde o início do FGTS, ou seja, desde que o Fundo foi criado em 1966?

NÃO. A CEF assumiu esse papel com a edição da Lei n. 8.036/90, que substituiu a Lei n. 5.107/66. O art. 7º da Lei nº 8.036/90 estabeleceu o seguinte:

Art. 12. No prazo de um ano, a contar da promulgação desta lei, a Caixa Econômica Federal assumirá o controle de todas as contas vinculadas, nos termos do item I do art. 7º, passando os demais estabelecimentos bancários, findo esse prazo, à condição de agentes recebedores e pagadores do FGTS, mediante recebimento de tarifa, a ser fixada pelo Conselho Curador.

Desse modo, a CEF somente passou a centralizar os recursos do FGTS, controlar as contas vinculadas e emitir extratos dessas contas a partir de maio de 1991. Antes, o controle das contas do FGTS era pulverizado em diversas instituições financeiras. Assim, existiam contas de FGTS em diversos bancos, sendo cada um deles responsável por isso.

No momento em que ocorreu a centralização das contas do FGTS na CEF, os bancos depositários tiveram que emitir um extrato das contas vinculadas que estavam sob sua responsabilidade. Esses extratos foram

fornecidos à CEF. Essa obrigação foi prevista no art. 24 do Decreto n. 99.684/90, que regulamentou a Lei do FGTS:

Art. 24. Por ocasião da centralização na CEF, caberá ao banco depositário emitir o último extrato das contas vinculadas sob sua responsabilidade, que deverá conter, inclusive, o registro dos valores transferidos e a discriminação dos depósitos efetuados na vigência do último contrato de trabalho.

De quem é a competência para julgar as ações envolvendo FGTS? Depende:

Se a ação for proposta pelo trabalhador contra o empregador envolvendo descumprimento na

aplicação da Lei n. 8.036/90, a competência será da Justiça do Trabalho;

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É da competência da Justiça Estadual autorizar o levantamento dos valores relativos ao PIS/PASEP e FGTS, em decorrência do falecimento do titular da conta (Súmula 161-STJ);

Se a ação for proposta pelo trabalhador contra a CEF em sua atuação como agente operadora dos recursos do FGTS, a competência será da Justiça Federal considerando que a CEF é uma empresa pública federal (art. 109, I, da CF/88).

Súmula 82-STJ: Compete à Justiça Federal, excluídas as reclamações trabalhistas, processar e julgar os feitos relativos à movimentação do FGTS.

Algumas vezes o trabalhador precisa dos extratos analíticos de sua conta de FGTS para pleitear algum direito relacionado com o FGTS. A CEF tem o dever de fornecer esses extratos? SIM. A CEF, por ser a agente operadora do FGTS, é responsável pelo fornecimento dos extratos das contas individualizadas vinculadas ao FGTS dos trabalhadores participantes do Fundo. Se o trabalhador quiser extratos referentes a períodos anteriores a maio de 1991, a responsabilidade continua sendo da CEF? SIM. Mesmo tendo assumido o papel de agente operador do FGTS apenas em maio de 1991, a CEF é responsável por fornecer os extratos do FGTS de todo e qualquer período de existência do Fundo, ainda que anteriores a essa data. Isso porque no momento em que ocorreu a centralização, os bancos depositários tiveram que fornecer à CEF o extrato das contas vinculadas que estavam sob sua responsabilidade. Logo, deveria a CEF ter armazenado todos esses dados. Além disso, caso a CEF não tenha esses extratos, ela poderá, na qualidade de gestora do Fundo, por força de lei, requisitá-los dos bancos que administravam essas contas. Confira novamente o teor da súmula para ver se agora ela ficou mais clara: A CEF é responsável pelo fornecimento dos extratos das contas individualizadas vinculadas ao FGTS dos trabalhadores participantes do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, inclusive para fins de exibição em juízo, independentemente do período em discussão. É comum o trabalhador precisar dos extratos de sua conta de FGTS para ações judiciais? SIM. É relativamente comum (ou pelo menos já foi mais frequente). Isso porque foram propostas milhares de ações na Justiça Federal nas quais os trabalhadores que tinham contas vinculadas de FGTS pediam que fossem revistos os índices de correção monetárias que foram aplicados nos valores depositados. Exemplo: há alguns anos foi identificado que, no período de janeiro de 1989 e abril de 1990, os valores depositados nas contas vinculadas de FGTS foram corrigidos com base em índices percentuais inferiores àqueles que seriam devidos. Logo, as pessoas ingressam em juízo contra a CEF pedindo a revisão dessa correção (são as chamadas ações de expurgos Inflacionários do FGTS - Plano Collor e Plano Verão). Ocorre que os autores não têm os extratos de suas contas do FGTS. Por isso, pedem que a CEF apresente em juízo esses documentos para que fique provado o erro na correção monetária. Algumas vezes a CEF alegava que não tinha responsabilidade pela apresentação desses extratos. A jurisprudência rechaçava esse argumento e, agora, com a Súmula 514 do STJ, essa obrigação fica ainda mais clara e consolidada.

Súmula 249-STJ: A Caixa Econômica Federal tem legitimidade passiva para integrar processo em que se discute correção monetária do FGTS. Súmula 210-STJ: A ação de cobrança das contribuições para o FGTS prescreve em trinta (30) anos.

Em quais concursos essa nova súmula é mais provável de ser cobrada? Concursos federais (Juiz Federal, DPU, AGU e Procuradoria Federal).

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DIREITO CIVIL

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA (I)Legitimidade da pessoa jurídica para recorrer contra a decisão que determina a deconsideração

Tema polêmico!

Em uma execução proposta pelo credor contra a empresa devedora, se o juiz determinar a desconsideração da personalidade jurídica e a penhora dos bens dos sócios, a pessoa jurídica tem legitimidade para recorrer contra essa decisão, desde que o recurso seja interposto com o objetivo de defender a sua autonomia patrimonial, isto é, a proteção da sua personalidade. No recurso, a pessoa jurídica não pode se imiscuir indevidamente na esfera de direitos dos sócios ou administradores incluídos no polo passivo por força da desconsideração.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.421.464-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24/4/2014 (Info 544).

Obs: vale ressaltar que existem inúmeros precedentes do STJ em sentido contrário, ou seja, defendendo a ilegitimidade da pessoa jurídica nesse caso.

Princípio da autonomia patrimonial As pessoas jurídicas são sujeitos de direitos. Isso significa que possuem personalidade jurídica distinta de seus instituidores. Assim, por exemplo, não é porque o sócio morreu que, obrigatoriamente, a pessoa jurídica será extinta. De igual modo, o patrimônio da pessoa jurídica é diferente do patrimônio de seus sócios. Ex1: se uma sociedade empresária possui um veículo, esse automóvel não pertence aos sócios, mas sim à própria pessoa jurídica. Ex2: se uma sociedade empresária possui uma dívida, este débito deverá ser pago com os bens da própria sociedade, não podendo para isso, em regra, ser utilizado o patrimônio pessoal dos sócios. Vigora, portanto, o princípio da autonomia patrimonial entre os bens do sócio e da pessoa jurídica. Desconsideração da personalidade jurídica O ordenamento jurídico prevê algumas situações em que essa autonomia patrimonial pode ser afastada. Tais hipóteses são chamadas de “desconsideração da personalidade jurídica” (disregard of legal entity ou teoria do superamento da personalidade jurídica). Quando se aplica a desconsideração da personalidade jurídica, os bens particulares dos administradores ou sócios são utilizados para pagar dívidas da pessoa jurídica. Por que foi idealizada essa teoria da desconsideração da personalidade jurídica? A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas sempre foi um instrumento muito importante para o desenvolvimento da economia e da atividade empresarial. Isso porque serviu para estimular os indivíduos a praticarem atividades econômicas, uma vez que, constituindo pessoas jurídicas, as pessoas físicas sabiam que apenas o patrimônio da sociedade empresária responderia pelas dívidas em caso de insucesso. Com isso, as pessoas físicas ficavam mais seguras, já que, mesmo que o empreendimento não prosperasse, elas não perderiam também o seu patrimônio pessoal não investido na sociedade. Ocorre que alguns indivíduos começaram a abusar da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, utilizando-a como um meio de praticar fraudes. A pessoa jurídica, após adquirir diversas dívidas, transferia todo lucro e patrimônio para o nome dos sócios e, com isso, não tinha como pagar os compromissos assumidos, não sobrando bens da sociedade que pudessem ser executados pelos credores. Percebendo esse abuso, a jurisprudência passou a permitir a desconsideração da personalidade jurídica nessas hipóteses. Posteriormente, foram editadas leis prevendo expressamente a possibilidade da desconsideração.

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Histórico da desconsideração da personalidade jurídica no Brasil CC-1916: não previa a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica. Na década de 60, Rubens Requião foi um dos primeiros doutrinadores brasileiros a defender a

aplicação da teoria no Brasil, mesmo sem previsão legal. CDC em 1990: primeira lei a prever a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica no

Brasil (art. 28).

Lei n. 8.884/94 (antiga Lei Antitruste): previu a desconsideração.

Lei n. 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais): também disciplinou a desconsideração. Código Civil de 2002: trouxe previsão expressa no art. 50.

Desconsideração da personalidade jurídica no CC-2002 A desconsideração da personalidade jurídica, no âmbito das relações civis gerais, está disciplinada no art. 50 do CC:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Desse modo, na desconsideração da personalidade jurídica, o juiz, mediante requerimento, autoriza que os bens particulares dos administradores ou sócios sejam utilizados para pagar as dívidas da pessoa jurídica, mitigando, assim, a autonomia patrimonial. Momento da desconsideração Segundo a jurisprudência do STJ, a desconsideração da personalidade jurídica, uma vez respeitado o devido processo legal, não precisa ser requerida mediante ação autônoma. Assim, o juiz pode determinar, de forma incidental, nos autos da execução singular ou coletiva, a desconsideração da personalidade jurídica. Caso o magistrado determine a desconsideração da personalidade jurídica de forma incidental, por meio de decisão interlocutória, o recurso cabível será o agravo de instrumento.

Feitas as devidas considerações, imagine a seguinte situação: A empresa “X” foi condenada a pagar 100 mil reais a João. Foi iniciado o cumprimento de sentença e tentou-se, sem sucesso, a penhora de bens da pessoa jurídica para pagar a dívida. Diante das tentativas frustradas de penhora, João requereu a desconsideração da personalidade jurídica da pessoa jurídica para alcançar o patrimônio de seus sócios⁄administradores. O juiz deferiu o pedido e determinou, em consequência, a inclusão dos sócios no polo passivo do cumprimento de sentença e a penhora on line de dinheiro depositado nas contas bancárias das pessoas físicas. Contra essa decisão, a pessoa jurídica (empresa “X”) interpôs agravo de instrumento. Os sócios atingidos não recorreram. O Tribunal de Justiça não conheceu do recurso alegando que a decisão judicial que determinou a desconsideração atinge o patrimônio dos sócios (e não da pessoa jurídica). Logo, não haveria interesse processual da empresa de recorrer. Para o TJ, quem deveria ter recorrido eram os sócios. A questão chegou até o STJ. A pergunta a ser respondida é a seguinte:

A pessoa jurídica tem legitimidade para recorrer contra a decisão que determina a desconsideração de sua personalidade jurídica com o objetivo de atingir o patrimônio dos sócios? SIM. A pessoa jurídica tem legitimidade para impugnar decisão interlocutória que desconsidera sua personalidade para alcançar o patrimônio de seus sócios ou administradores, desde que o faça com o intuito de defender a sua regular administração e autonomia – isto é, a proteção da sua personalidade –, sem se imiscuir indevidamente na esfera de direitos dos sócios ou administradores incluídos no polo

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passivo por força da desconsideração.

Segundo o art. 50 do CC, verificado “abuso da personalidade jurídica”, poderá o juiz decidir que os efeitos de certas e determinadas relações obrigacionais sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. O referido abuso, segundo a lei, caracteriza-se pelo desvio de finalidade da pessoa jurídica ou pela confusão patrimonial entre os bens dos sócios/administradores com os da pessoa moral.

Assim, a desconsideração da personalidade jurídica, em essência, está ligada à concepção de moralidade, probidade, boa-fé a que submetem os sócios e administradores na gestão e administração da pessoa jurídica. Vale também destacar que, ainda que a concepção de abuso nem sempre esteja relacionada a fraude, a sua figura está, segundo a doutrina, eminentemente ligada a prejuízo, desconforto, intranquilidade ou dissabor que tenha sido acarretado a terceiro, em decorrência de um uso desmesurado de um determinado direito.

Desse modo, a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica é uma decisão judicial que atinge (afeta) não apenas os interesses dos credores e das pessoas físicas, mas também da própria sociedade jurídica que está sendo acusada de ser indevidamente manipulada.

Logo, a pessoa jurídica tem interesse de recorrer nesse caso, desde que seja capaz de demonstrar que a pertinência de seu intuito, ou seja, que está defendendo a sua autonomia patrimonial (a proteção de sua personalidade jurídica).

TEMA POLÊMICO Percebe-se que a Min. Nancy Andrighi construiu uma tese interessantíssima para assegurar a legitimidade da pessoa jurídica em tais casos, ressaltando que essa só existe nas hipóteses em que for defendida, no recurso, a própria autonomia patrimonial da sociedade empresária. Apesar disso, podemos encontrar inúmeros julgados do STJ em sentido contrário, ou seja, negando a legitimidade da pessoa jurídica para recorrer contra essa decisão. Confira:

(...) 7. Desse modo, não há como reconhecer interesse à pessoa jurídica para impugnar decisão que atinge a esfera jurídica de terceiros, o que, em tese, pode preservar o patrimônio da sociedade ou minorar sua diminuição; afinal, mais pessoas estariam respondendo pela dívida contra ela cobrada originalmente. 8. Em casos análogos, a jurisprudência do STJ tem afirmado que a pessoa jurídica não possui legitimidade nem interesse recursal para questionar decisão que, sob o fundamento de ter ocorrido dissolução irregular, determina a responsabilização dos sócios (EDcl no AREsp 14.308/MG, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 27.10.2011; REsp 932.675/SP, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ 27.8.2007, p. 215; REsp 793.772/RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 11.2.2009). (...) (STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1307639/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 17/05/2012).

Penso que a posição pela ilegitimidade deve prevalecer, sendo majoritária e consolidada.

RESPONSABILIDADE CIVIL Fixação individualizada dos danos morais por morte de parente

Na fixação do valor da reparação pelos danos morais sofridos por parentes de vítimas mortas em um mesmo evento, não deve ser estipulada de forma global a mesma quantia reparatória para cada grupo familiar se, diante do fato de uma vítima ter mais parentes que outra, for conferido tratamento desigual a lesados que se encontrem em idêntica situação de abalo psíquico, devendo, nessa situação, ser adotada metodologia de arbitramento que leve em consideração a situação individual de cada parente de cada vítima do dano morte.

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A fixação de valor reparatório global por núcleo familiar, justificar-se-ia apenas se a todos os lesados que se encontrem em idêntica situação fosse conferido igual tratamento.

STJ. Corte Especial. EREsp 1.127.913-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 4/6/2014 (Info 544).

Imagine a seguinte situação hipotética: João e Pedro eram colegas e morreram em um acidente de helicóptero causado por uma falha mecânica. João tinha dois herdeiros: um filho e a esposa. Pedro, por outro lado, possuía quatro filhos adultos, além da esposa. As famílias das duas vítimas contrataram um mesmo escritório de advocacia que ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra a empresa de táxi aéreo. Fixação do valor dos danos morais O juiz julgou procedente a ação e condenou a empresa de táxi aéreo a pagar:

500 salários mínimos para os familiares de João (esposa e filho);

500 salários mínimos para os familiares de Pedro (esposa e mais quatro filhos). Segundo deixou claro na sentença, esse valor a ser pago pela condenada seria global para cada família:

A esposa e o filho de João receberiam 250 salários mínimos cada um;

A esposa e os quatro filhos de Pedro receberiam 100 salários mínimos cada um. O critério adotado pelo magistrado para fixar a indenização está correto? NÃO. Na fixação do valor da reparação pelos danos morais sofridos por parentes de vítimas mortas em um mesmo evento, não deve ser estipulada de forma global a mesma quantia reparatória para cada grupo familiar se, diante do fato de uma vítima ter mais parentes que outra, for conferido tratamento desigual a lesados que se encontrem em idêntica situação de abalo psíquico. Em outras palavras, no caso concreto, mesmo tendo as vítimas morrido no mesmo evento, cada familiar de uma receberá 250 salários mínimos de indenização e cada familiar da outra terá direito a apenas 100 salários mínimos. Há, portanto, uma diferença de tratamento injustificável. Logo, na presente situação, o juiz deveria ter adotado uma metodologia de arbitramento que levasse em consideração a situação individual de cada parente de cada vítima do dano morte. Em suma, o magistrado deveria ter fixado um valor de indenização individual, igual para cada um dos parentes dos falecidos, já que não havia, no caso concreto, nada que justificasse uma diferença de tratamento. Sobre o tema, importante explicar um interessante conceito: O que é o chamado “prejuízo de afeição”? Conforme explica o Min. Paulo de Tarso Sanseverino, o “prejuízo de afeição” (préjudice d'affection) é o dano extrapatrimonial sofrido pelos familiares da pessoa morta. Trata-se do dano moral povocado em decorrência da morte do ente querido, cujo sofrimento é incomensurável, bastando pensar na dor dos filhos menores com a perda do pai em acidente de trabalho, no sofrimento psíquico da esposa com a morte do marido em um desastre aéreo, no vazio existencial dos pais com o óbito de um filho em um acidente de trânsito. Busca-se com a indenização um paliativo para o sofrimento psíquico ensejado pelo evento danoso, sendo esse o ponto nuclear do conceito de dano moral stricto sensu (voto do Ministro no EREsp 1.127.913-RS). O prejuízo de afeição é um da moral que atinge as vítimas por ricochete considerando que a vítima direta é o falecido e seus familiares são afetados reflexamente pelo evento.

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RESPONSABILIDADE CIVIL Termo inicial da prescrição nas ações de indenização do seguro DPVAT

O prazo prescricional no caso de ação de indenização do DPVAT é de 3 anos (Súmula 405-STJ).

O termo inicial do prazo prescricional é a data em que o segurado teve ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez.

Em regra, a pessoa somente tem ciência inequívoca da invalidez permanente com o laudo médico que atesta essa situação. Assim, em regra, o termo inicial do prazo é a data do laudo.

Exceção: nos casos de invalidez permanente notória, a ciência inequívoca da invalidez não depende de laudo médico. Dessa forma, em caso de invalidez notória, o termo inicial do prazo é a data da invalidez (em geral, a data do acidente).

STJ. 2ª Seção. REsp 1.388.030-MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/6/2014 (recurso repetitivo) (Info 544).

NOÇÕES GERAIS O que é o DPVAT? O DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestres) é um seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas, transportadas ou não. Em outras palavras, qualquer pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por sua carga, em vias terrestres, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso abrange os motoristas, os passageiros, os pedestres ou, em caso de morte, os seus respectivos herdeiros. Ex: dois carros batem e, em decorrência da batida, acertam também um pedestre que passava no local. No carro 1, havia apenas o motorista. No carro 2, havia o motorista e mais um passageiro. Os dois motoristas morreram. O passageiro do carro 2 e o pedestre ficaram inválidos. Os herdeiros dos motoristas receberão indenização de DPVAT no valor correspondente à morte. O passageiro do carro 2 e o pedestre receberão indenização de DPVAT por invalidez. Para receber indenização, não importa quem foi o culpado. Ainda que o carro 2 tenha sido o culpado, os herdeiros dos motoristas, o passageiro e o pedestre sobreviventes receberão a indenização normalmente. O DPVAT não paga indenização por prejuízos decorrentes de danos patrimoniais, somente danos pessoais. Quem custeia as indenizações pagas pelo DPVAT? Os proprietários de veículos automotores. Trata-se de um seguro obrigatório. Assim, sempre que o proprietário do veículo paga o IPVA, está pagando também, na mesma guia, um valor cobrado a título de DPVAT. O STJ afirma que a natureza jurídica do DPVAT é a de um contrato legal, de cunho social. O DPVAT é regulamentado pela Lei nº 6.194/74. Qual é o valor da indenização de DPVAT prevista na Lei? • no caso de morte: R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de invalidez permanente: até R$ 13.500,00 (por vítima) • no caso de despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como reembolso a cada vítima. Como a pessoa obtém a indenização do DPVAT? A pessoa deverá procurar uma das empresas seguradoras que seja consorciada ao DPVAT e apresentar a documentação necessária. Para requerer o seguro DPVAT não é necessário advogado, despachante ou qualquer outra ajuda de terceiros.

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Caso a pessoa beneficiária do DPVAT não receba a indenização ou não concorde com o valor pago pela seguradora, ela poderá buscar auxílio do Poder Judiciário? Sim. A pessoa poderá ajuizar uma ação de cobrança contra a seguradora objetivando a indenização decorrente de DPVAT. Qual é o prazo para as ações decorrentes do DPVAT? A ação de cobrança do seguro obrigatório DPVAT prescreve em 3 anos (Súmula 405-STJ). INVALIDEZ

O que é invalidez permanente para fins do DPVAT? Em um primeiro momento, a Lei nº 6.194/74 não previu o que seria invalidez permanente. Diante dessa lacuna, o Conselho Nacional de Seguros Privados – CNSP, como já dito acima, elaborou uma tabela com diversas situações que caracterizavam invalidez permanente. A MP 451/2008 e posteriormente a Lei nº 11.945/2009 acrescentaram, então, um anexo à Lei nº 6.194/74, prevendo expressamente, por meio de uma tabela, situações caracterizadoras de invalidez permanente.

Essa lista prevista no anexo da Lei nº 6.194/74 é exaustiva ou exemplificativa? Exemplificativa. Segundo afirmou, com acerto, o Min. Paulo de Tarso Sanseverino, não é possível prever, por meio de uma listagem de situações, todas as hipóteses de invalidez permanente, total ou parcial, de forma que em última análise incumbe ao intérprete a definição do conteúdo daquele conceito jurídico indeterminado. Noutras palavras, as situações previstas na lista elaborada pelo CNSP, assim como as presentes no anexo à Lei 6.194/74, constituem rol meramente exemplificativo, em contínuo desenvolvimento, tanto pela ciência como pelo direito. Portanto, o não enquadramento de uma determinada situação na lista previamente elaborada não implica, por si só, a não configuração da invalidez permanente, sendo necessário o exame das peculiaridades de cada caso concreto. STJ. 3ª Turma. REsp 1.381.214-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 20/8/2013 (Info 530). Vimos acima, que a ação de cobrança do seguro obrigatório DPVAT prescreve em 3 anos (Súmula 405-STJ). A partir de quando se inicia a contagem desse prazo? O termo inicial do prazo prescricional é a data em que o segurado teve ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez. Em outras palavras, conta-se da data em que a pessoa teve ciência de que estava inválido permanentemente. Nesse sentido, existe um enunciado do STJ:

Súmula 278-STJ: O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral.

Quando se considera que a pessoa teve ciência inequívoca da invalidez?

REGRA: a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de laudo médico. Assim, para efeitos de início do prazo prescricional, considera-se que o segurado somente tem ciência da invalidez permanente quando é produzido um laudo médico atestando essa condição. EXCEÇÃO: o prazo prescricional se inicia mesmo sem ter sido feito laudo médico se a invalidez permanente for notória. Dessa forma, em caso de invalidez notória, o prazo prescricional tem início na data da invalidez (e não na data do laudo). É o caso, por exemplo, de um acidente no qual a vítima teve amputada suas duas pernas.

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Resumindo:

Prazo para a ação de indenização DPVAT: 3 anos.

Início do prazo em caso de invalidez permanente: data do laudo médico (regra geral).

Início do prazo em caso de invalidez permanente notória: data da invalidez.

ALIMENTOS Possibilidade de adjudicação dos direitos hereditários do alimentante

para pagamento de pensão alimentícia

É possível a adjudicação em favor do alimentado dos direitos hereditários do alimentante, penhorados no rosto dos autos do inventário, desde que observado os interesses dos demais herdeiros, nos termos dos arts. 1.793 a 1.795 do CC.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.330.165-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/5/2014 (Info 544).

ADJUDICAÇÃO Antes de explicar o julgado, vamos relembrar em que consiste a chamada “adjudicação”. O que acontece com o bem penhorado? Se o bem penhorado for dinheiro, ele é transferido ao credor, quitando-se a obrigação. Se o bem penhorado for coisa diferente de dinheiro, ele poderá ser: a) adjudicado; b) alienado por iniciativa particular; c) alienado em hasta pública; d) concedido em usufruto ao exequente. Quando acontece uma dessas quatro situações acima, dizemos que houve a “expropriação”, conforme previsto no art. 647 do CPC:

Art. 647. A expropriação consiste: I - na adjudicação em favor do exequente ou das pessoas indicadas no § 2º do art. 685-A desta Lei; II - na alienação por iniciativa particular; III - na alienação em hasta pública; IV - no usufruto de bem móvel ou imóvel.

Vamos ver apenas a primeira hipótese: adjudicação (inciso I) A adjudicação ocorre quando a propriedade do bem penhorado é transferida ao exequente ou aos terceiros legitimados.

Art. 685-A. É lícito ao exequente, oferecendo preço não inferior ao da avaliação, requerer lhe sejam adjudicados os bens penhorados. § 1º Se o valor do crédito for inferior ao dos bens, o adjudicante depositará de imediato a diferença, ficando esta à disposição do executado; se superior, a execução prosseguirá pelo saldo remanescente. § 2º Idêntico direito pode ser exercido pelo credor com garantia real, pelos credores concorrentes que hajam penhorado o mesmo bem, pelo cônjuge, pelos descendentes ou ascendentes do executado. § 3º Havendo mais de um pretendente, proceder-se-á entre eles à licitação; em igualdade de oferta, terá preferência o cônjuge, descendente ou ascendente, nessa ordem. (...)

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DIREITOS HEREDITÁRIOS Qual é a natureza jurídica dos direitos hereditários? São considerados bens imóveis (art. 80, II do CC):

Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais: II - o direito à sucessão aberta.

Os direitos hereditários podem ser penhorados? SIM, desde que tenham cunho patrimonial (STJ. 3ª Turma. REsp 1105951/RJ, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 04/10/2011). Ex: O pai de João morre e deixa um carro para ele e seu irmão. João possui dívidas de pensão alimentícia. O alimentado (credor) poderá requerer ao juiz que determine a penhora, no rosto dos autos do inventário, dos direitos hereditários que João (alimentante/devedor) possui sobre o carro. Após os direitos hereditários terem sido penhorados, o alimentado (credor) poderá pedir a adjudicação? SIM. É possível a adjudicação em favor do alimentado dos direitos hereditários do alimentante, penhorados no rosto dos autos do inventário, desde que observado os interesses dos demais herdeiros, nos termos dos arts. 1.793 a 1.795 do CC. O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei (art. 591 do CPC). Desde a abertura da sucessão, ou seja, desde a morte do falecido, a herança por ele deixada transfere-se automaticamente ao patrimônio dos herdeiros como bem imóvel indivisível. A adjudicação de bem imóvel é uma técnica legítima de pagamento prevista expressamente no CPC, conforme vimos acima. Logo, conclui-se que os direitos hereditários do alimentante podem ser adjudicados para a satisfação de crédito alimentar, nos termos do art. 685-A do CPC, desde que sejam, obviamente, respeitados os direitos dos demais herdeiros sobre o bem.

DIREITO DO CONSUMIDOR

RESPONSABILIDADE POR VÍCIO DO PRODUTO Dano moral decorrente de carro 0km que apresentou inúmeros problemas

É cabível dano moral quando o consumidor de veículo automotor zero quilômetro necessita retornar à concessionária por diversas vezes para reparar defeitos apresentados no veículo adquirido.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.443.268-DF, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 3/6/2014 (Info 544).

RESPONSABILIDADE POR VÍCIO DO PRODUTO Veículo importado que não poderia ser abastecido com combustível nacional

O consumidor tem direito à indenização por danos morais e materiais pelo fato de ter adquirido no mercado nacional um veículo 0km que apresentou inúmeros problemas obrigando o adquirente a retornar à concessionária, recorrentemente por mais de 30 dias, para sanar panes decorrentes da incompatibilidade, não informada no momento da compra, entre a qualidade do combustível necessário ao adequado funcionamento do veículo e a do combustível disponibilizado nos postos nacionais.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.443.268-DF, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 3/6/2014 (Info 544).

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Imagine a seguinte situação adaptada: Em 2010, João comprou, na concessionária, uma picape off road importada 0km. Alguns dias depois, João abasteceu o veículo em sua fazenda com diesel de baixa qualidade, recomendado apenas para uso no meio rural. O carro começou a apresentar inúmeros problemas, obrigando o comprador a ter que ir até a concessionária inúmeras vezes sem conseguir resolver a situação. Verificou-se, posteriormente, por meio de perícia, que o veículo vendido exigia, para seu perfeito funcionamento, o uso de um tipo de combustível que ainda não era comercializado no Brasil em 2010. João ajuizou ação de indenização pedindo a restituição do valor pago e compensação pelos danos morais sofridos. O STJ concordou com o pedido do consumidor? SIM. O consumidor tem direito à indenização por danos morais e materiais pelo fato de ter adquirido no mercado nacional um veículo 0km que apresentou inúmeros problemas obrigando o adquirente a retornar à concessionária, recorrentemente por mais de 30 dias, para sanar panes decorrentes da incompatibilidade, não informada no momento da compra, entre a qualidade do combustível necessário ao adequado funcionamento do veículo e a do combustível disponibilizado nos postos nacionais. Segundo o STJ, houve, no caso, vício do produto (art. 18 do CDC). O vício do produto ocorre quando o produto não se mostra adequado ao fim a que se destina, incompatível com o uso a que se propõe. Se o veículo não podia ser abastecido com os combustíveis vendidos no Brasil, esse automóvel se torna impróprio ao consumo a que se destina (art. 18 do CDC). Vale ressaltar que o fato de o consumidor ter abastecido o veículo com combustível de baixa qualidade recomendado para a utilização em meio rural não isenta a empresa do dever de indenizar. Isso porque o veículo em questão foi projetado para uso off-road. Portanto, é de se admitir que houvesse uma razoável expectativa do consumidor de que habitualmente, ou ao menos eventualmente, ele iria ter que abastecer o veículo com os combustíveis disponíveis em meio rural. Isso corresponde, afinal, ao uso normal que se pode fazer do produto adquirido, dada a sua natureza e finalidade. Assim, é de admitir que o consumidor deveria ter sido, pelo menos, informado de forma adequada, no momento da compra, que o veículo não poderia ser abastecido com combustível recomendado para a utilização em meio rural. Essa era uma informação que poderia interferir decisivamente na opção de compra do bem e não poderia, por isso, ser omitida, sob pena de ofensa ao dever de ampla informação.

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DIREITO AMBIENTAL

RESPONSABILIDADE POR DANO AMBIENTAL Responsabilidade por dano ambiental é objetiva, sob a modalidade do risco integral

Importante!!!

O particular que deposita resíduos tóxicos em seu terreno, expondo-os a céu aberto, em local onde, apesar da existência de cerca e de placas de sinalização informando a presença de material orgânico, o acesso de outros particulares seja fácil, consentido e costumeiro, responde objetivamente pelos danos sofridos por pessoa que, por conduta não dolosa, tenha sofrido, ao entrar na propriedade, graves queimaduras decorrentes de contato com os resíduos.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.373.788-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 6/5/2014 (Info 544).

Imagine a seguinte situação adaptada: A indústria “X” possuía um terreno que era utilizado como depósito de resíduos tóxicos. Esses restos de material industrial ficavam expostos a céu aberto e o terreno possuía uma cerca, mas não havia fiscalização rigorosa impedindo que pessoas entrassem no local. Determinado dia um garoto de 12 anos que morava em uma chácara nas proximidades, cortou caminho para sua casa passando por dentro do terreno. Ao entrar em contato com o material tóxico, o adolescente sofreu queimaduras de terceiro grau nos pés. O adolescente ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra a indústria. A ré, na contestação, argumentou que a culpa foi exclusiva da vítima já que no local havia cerca e uma placa com os seguintes dizeres: “Cuidado. Presença de material orgânico”. A indústria deverá ser condenada a indenizar o garoto? SIM. Aplica-se no presente caso o princípio do poluidor-pagador, de forma que a indústria tem responsabilidade civil objetiva, sob a modalidade do risco integral. Podemos falar no princípio do poluidor-pagador mesmo o dano sendo causado a uma pessoa? SIM. A responsabilidade civil por danos ambientais, seja por lesão ao meio ambiente propriamente dito (dano ambiental público), seja por ofensa a direitos individuais (dano ambiental privado), é objetiva, fundada na teoria do risco integral, em face do disposto no art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, que consagra o princípio do poluidor-pagador:

Art. 14 (...) § 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

Risco social A responsabilidade objetiva fundamenta-se na noção de risco social, que está implícito em determinadas atividades, como a indústria, os meios de transporte de massa, as fontes de energia. Assim, a responsabilidade objetiva, calcada na teoria do risco, é uma imputação atribuída por lei a determinadas pessoas para ressarcirem os danos provocados por atividades exercidas no seu interesse e sob seu controle, sem que se proceda a qualquer indagação sobre o elemento subjetivo da conduta do agente ou de seus prepostos, bastando a relação de causalidade entre o dano sofrido pela vítima e a situação de risco criada pelo agente. Imputa-se objetivamente a obrigação de indenizar a quem conhece e domina a fonte de origem do risco, devendo, em face do interesse social, responder pelas consequências lesivas da sua atividade independente de culpa.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 15

Qual é o fundamento legal para a teoria do risco? A teoria do risco como cláusula geral de responsabilidade civil restou consagrada no enunciado normativo do parágrafo único do art. 927 do CC, que assim dispôs:

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

No caso de dano ambiental aplica-se a teoria do risco de forma extremada? SIM. No caso de danos ambientais, aplica-se a teoria do risco INTEGRAL. A teoria do risco INTEGRAL constitui uma MODALIDADE EXTREMADA da teoria do risco em que o nexo causal é fortalecido. Assim, o nexo causal não se rompe mesmo que se verifique alguma causa que normalmente seria excludente da responsabilidade (exs: culpa da vítima; fato de terceiro, força maior). Essa modalidade (risco integral) é EXCEPCIONAL, sendo fundamento para hipóteses legais em que o risco ensejado pela atividade econômica também é extremado, como ocorre com o dano nuclear (art. 21, XXIII, “c”, da CF e Lei 6.453/1977). O mesmo ocorre com o dano ambiental (art. 225, caput e § 3º, da CF e art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981), em face da crescente preocupação com o meio ambiente. A indústria proprietária do terreno poderia alegar a culpa exclusiva da vítima? NÃO. Em caso de dano ambiental, a responsabilidade civil é objetiva, na modalidade do risco integral, de forma que não são admitidas excludentes de responsabilidade, tais como o caso fortuito, a força maior, fato de terceiro ou culpa exclusiva da vítima. Assim, a colocação de placas no local indicando a presença de material orgânico não é suficiente para excluir a responsabilidade civil da indústria.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PROCESSO ELETRÔNICO Ilegalidade da Resolução do Tribunal que imponha à parte o dever de digitalização do processo

NÃO é possível que o tribunal local imponha, por meio de resolução, que será de responsabilidade do autor a digitalização dos autos físicos para continuidade da tramitação do processo em meio eletrônico.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.448.424-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 22/5/2014 (Info 544).

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região editou a Resolução n. 17/2010 determinando que, nos processo eletrônicos que tramitassem perante a Justiça Federal da 4ª Região, a parte autora teria o dever de providenciar a digitalização e guarda documentos físicos. Confira a redação da Resolução nesse ponto:

Art. 17 (...) § 2º No juízo competente, a parte autora será intimada para retirar os autos físicos em 30 (trinta) dias, e providenciar a digitalização, ficando responsável pela guarda dos documentos.

Essa determinação foi questionada, sob o argumento de que teria violado a Lei nº 11.419/2006, que trata sobre o processo eletrônico.

O § 2º do art. 17 da Resolução n. 17/2010 é válido? NÃO. Não pode um ato infralegal (resolução de Tribunal) impor à parte autora o dever de providenciar a digitalização das peças dos autos, tampouco o dever de guarda pessoal de alguns dos documentos físicos do processo, ainda que os autos sejam provenientes de outro juízo ou instância.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 16

Veja o que diz a Lei n. 11.419/2006:

Art. 12. (...) § 5º A digitalização de autos em mídia não digital, em tramitação ou já arquivados, será precedida de publicação de editais de intimações ou da intimação pessoal das partes e de seus procuradores, para que, no prazo preclusivo de 30 (trinta) dias, se manifestem sobre o desejo de manterem pessoalmente a guarda de algum dos documentos originais.

O art. 18 da Lei nº 11.419/2006 autorizou que os órgãos do Poder Judiciário regulamentassem a Lei n. 11.419/2006 no âmbito de suas respectivas competências. No entanto, a circunstância de o referido art. 18 da Lei delegar em favor do Judiciário o poder de regulamentá-la não autoriza que o ato infralegal crie obrigações não previstas na lei (que em momento algum impõe à parte autora o dever de providenciar a digitalização dos autos remetidos por outro juízo e de conservar em sua guarda as peças originais). Vale ressaltar que se trata de mudança no entendimento da 2ª Turma do STJ que, no REsp 1.448.424-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 22/5/2014 (Info 524), havia se posicionado em sentido contrário, ou seja, considerando válida a resolução.

EXECUÇÃO Bens do devedor solidário não podem responder pela execução

se ele não constou no título executivo

Os bens de terceiro que, além de não estar incluído no rol do art. 592 do CPC, não tenha figurado no polo passivo de ação de cobrança não podem ser atingidos por medida cautelar incidental de arresto, tampouco por futura execução, sob a alegação de existência de solidariedade passiva na relação de direito material.

Em outras palavras, se o credor tinha dois devedores solidários, mas somente ajuizou ação de cobrança contra um deles, não poderá executar os bens dos dois.

A responsabilidade solidária precisa ser declarada em processo de conhecimento, sob pena de tornar-se impossível a execução do devedor solidário, ressalvados os casos previstos no art. 592 do CPC.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.423.083-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 6/5/2014 (Info 544).

Imagine a seguinte situação hipotética: As empresas “X” e “Y” deviam 500 mil reais para João por conta de um mesmo fato que teve origem comum. Podemos dizer, portanto, que “X” e “Y” são devedoras solidárias de João. A solidariedade passiva está prevista no art. 275 do Código Civil:

Art. 275. O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.

Em nosso exemplo, João ajuizou ação de cobrança apenas contra “X”. Isso significa que renunciou ao direito de cobrar “Y”? NÃO. O parágrafo único do art. 275 explica isso:

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 17

Art. 275 (...) Parágrafo único. Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos devedores.

O juiz proferiu sentença determinando que a empresa “X” pagasse os 500 mil reais cobrados. Como não houve pagamento espontâneo, João deu início à fase de cumprimento de sentença. Apesar disso, não foram localizados bens em nome da empresa “X” para pagar o débito. Nesse caso, é possível que o juiz penhore ou arreste bens da empresa “Y”? NÃO. Os bens de pessoa que não tenha figurado no polo passivo de ação de cobrança não podem ser atingidos por penhora ou por medida cautelar de arresto, sob a alegação de existência de solidariedade passiva na relação de direito material. Conforme vimos acima, o art. 275 do CC afirma é faculdade do credor escolher contra qual ou quais devedores direcionará a cobrança da dívida comum, sendo certo que a propositura da ação de conhecimento contra um deles não implica a renúncia à solidariedade dos remanescentes, que permanecem obrigados ao pagamento da dívida. Ressalte-se, no entanto, que essa norma é de direito material, restringindo-se sua aplicação ao momento de formação do processo cognitivo (fase de conhecimento), quando, então, o credor pode incluir no polo passivo da demanda todos, alguns ou um específico devedor. A sentença somente terá eficácia em relação às pessoas que foram demandados, não alcançando aqueles que não participaram da relação jurídica processual. Estes serão considerados “terceiros”. Sobre o tema, veja o art. 472 do CPC:

Art. 472. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros.

O CPC é expresso ao dizer que o sujeito passivo na execução é o “o devedor, reconhecido como tal no título executivo” (art. 568, I, o CPC). O STJ, como não poderia ser diferente, também decide dessa maneira:

(...) 2. Aquele que não integrou a relação processual da qual decorreu o título executivo judicial não pode ser atingido pela decisão judicial e figurar como executado. (...) STJ. 3ª Turma. REsp 1169968⁄RS, Rel. Min. João Otávio De Noronha, julgado em 12⁄11⁄2013.

Em conclusão, a responsabilidade solidária precisa ser declarada em processo de conhecimento, sob pena de tornar-se impossível a execução do devedor solidário, ressalvados os casos previstos no art. 592 do CPC, que prevê a possibilidade de excussão de bem de terceiro estranho à relação processual. Confira o que diz esse dispositivo:

Art. 592. Ficam sujeitos à execução os bens: I - do sucessor a título singular, tratando-se de execução fundada em direito real ou obrigação reipersecutória; II - do sócio, nos termos da lei; III - do devedor, quando em poder de terceiros; IV - do cônjuge, nos casos em que os seus bens próprios, reservados ou de sua meação respondem pela dívida; V - alienados ou gravados com ônus real em fraude de execução.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 18

Desse modo, o art. 592 do CPC traz exceções nas quais a execução pode recair sobre bens de terceiros. Ocorre que, dentre esses cinco incisos acima listados, não se inclui a possibilidade de executar bens de devedor solidário que não tenha figurado no título executivo.

Ante o exposto, não é possível, em virtude de alegação quanto à eventual existência de solidariedade passiva na relação de direito material, atingir bens de terceiro estranho ao processo de cognição e que não esteja incluído no rol do art. 592 do CPC.

Aplica-se aqui, por analogia, o mesmo entendimento contido na Súmula 268 do STJ:

Sumula 268-STJ: O fiador que não integrou a relação processual na ação de despejo não responde pela execução do julgado.

EXECUÇÃO FISCAL Reunião de execuções fiscais propostas contra o mesmo devedor

Súmula 515-STJ: A reunião de execuções fiscais contra o mesmo devedor constitui faculdade do juiz.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 14/08/2014.

Múltiplas execuções fiscais contra o mesmo devedor Imagine que a Fazenda Pública possui inúmeras execuções fiscais propostas contra um mesmo devedor. Ex: a União propôs 20 execuções fiscais cobrando tributos diversos da empresa “XYZ”. Existe a possibilidade de essas execuções fiscais serem reunidas para tramitarem e serem julgadas em conjunto?

SIM. Trata-se de possibilidade expressamente prevista na Lei n. 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal):

Art. 28. O Juiz, a requerimento das partes, poderá, por conveniência da unidade da garantia da execução, ordenar a reunião de processos contra o mesmo devedor. Parágrafo único. Na hipótese deste artigo, os processos serão redistribuídos ao Juízo da primeira distribuição.

Na prática forense, surgiu a tese de que, apesar de o art. 28 acima transcrito, dizer que o juiz “poderá” ordenar a reunião, na verdade, deve-se interpretar o dispositivo como sendo “deverá”. Isso porque a cumulação das execuções atende aos princípios da economia e da celeridade processual.

A tese acima exposta foi acolhida pelo STJ? O juiz tem o dever de reunir as execuções fiscais propostas contra o mesmo devedor? É obrigatório que o magistrado atenda o requerimento das partes nesse sentido? NÃO. Ainda que existam várias execuções fiscais propostas contra o mesmo devedor e mesmo que a parte requeira a reunião dos processos, a decisão de reuni-los ou não é uma faculdade do juiz. Logo, ele não é obrigado a atender o requerimento da parte. Assim, a reunião de processos contra o mesmo devedor, por conveniência da unidade da garantia da execução, nos termos do art. 28 da Lei 6.830/80, é uma faculdade outorgada ao juiz, e não um dever. O entendimento do STJ é correto uma vez que existem hipóteses em que é inadequada a reunião dos processos considerando que essa medida não traria economia ou celeridade à tramitação. É o caso, por exemplo, de uma das execuções já estar suspensa pela oposição de embargos enquanto que a outra já se encontra em fase bem avançada, com leilão marcado. Nesse sentido: GONÇALVES, Eduardo Rauber. Execução fiscal aplicada. 2ª ed., Salvador: Juspodivm, 2013, p. 79.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 19

EXECUÇÃO FISCAL Remessa necessária no caso de sentença que julga procedente exceção de pré-executividade

Caso o juiz julgue procedente a exceção de pré-executividade e extinga a execução fiscal será obrigatória, em regra, a remessa necessária, aplicando-se por analogia o art. 475, II, do CPC.

Se o executado apresenta exceção de pré-executividade e a Fazenda Pública, ao ser intimada, concorda com o argumento do excipiente, o juiz irá extinguir a execução. Nesse caso, a jurisprudência entende que não haverá reexame necessário porque o Poder Público anuiu.

Se a execução fiscal for extinta porque o Fisco cancelou a inscrição de dívida ativa que lastreava a execução também não haverá reexame necessário porque a própria Fazenda Pública reconheceu que não havia título executivo.

No caso concreto julgado pelo STJ, afirmou-se que não se sujeita ao reexame necessário, ainda que a Fazenda Pública tenha sido condenada a pagar honorários advocatícios, a sentença que extinguiu execução fiscal em razão do acolhimento de exceção de pré-executividade pela qual se demonstrara o cancelamento, pelo Fisco, da inscrição em dívida ativa que lastreava a execução.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.415.603-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 22/5/2014 (Info 544).

É cabível remessa necessária no caso de sentença que julga procedentes embargos à execução opostos pelo executado em execução fiscal? SIM. Essa hipótese está prevista no art. 475, II, do CPC:

Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: (...) II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).

É cabível remessa necessária no caso de sentença que julga procedente exceção de pré-executividade oposta pelo executado em execução fiscal? SIM. O art. 475 do CPC não prevê essa hipótese. No entanto, a jurisprudência admite a remessa necessária nesse caso porque a exceção de pré-executividade não é um instituto disciplinado pela legislação, sendo uma criação jurisprudencial aceita como uma substituta dos embargos à execução. Logo, deve-se conferir a ela a mesma imposição da remessa necessária prevista para os embargos à execução, sob pena de a escolha da exceção de pré-executividade ser uma forma de se burlar o art. 475, II, do CPC. Em suma, caso o juiz julgue procedente a exceção de pré-executividade e extinga a execução fiscal será obrigatória, em regra, a remessa necessária. Se o executado apresenta exceção de pré-executividade e a Fazenda Pública, ao ser intimada, concorda com o argumento do excipiente, o juiz irá extinguir a execução. Nesse caso, também haverá reexame necessário? NÃO. A jurisprudência entende que, se a Fazenda anuiu (concordou) com o pedido feito na exceção de pré-executividade e, com isso, o juiz extinguiu a execução, não haverá reexame necessário. Não há reexame necessário na sentença que extingue execução baseada no cancelamento da CDA A petição inicial da execução fiscal deve ser instruída com a Certidão da Dívida Ativa (CDA). A CDA é um título executivo extrajudicial no qual consta o nome da pessoa que está devendo para o Fisco e o valor do débito, além de outras informações.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 20

Imagine que a Fazenda Pública ajuizou uma execução. O devedor apresentou exceção de pré-executividade alegando que aquela CDA não é válida por qualquer motivo. O Fisco concorda com o pedido e cancela a CDA. Em virtude disso, o juiz julga procedente a exceção de pré-executividade e extingue a

execução fiscal nos termos do art. 26 da Lei n. 6.830/80:

Art. 26. Se, antes da decisão de primeira instância, a inscrição de Divida Ativa for, a qualquer título, cancelada, a execução fiscal será extinta, sem qualquer ônus para as partes.

Nesse caso, não haverá reexame necessário mesmo que a Fazenda Pública seja condenada a pagar honorários advocatícios ao executado/excipiente.

DIREITO PENAL

ESTATUTO DO DESARMAMENTO (LEI 10.826/2003) Porte ou posse de arma de fogo quebrada

Para que haja condenação pelo crime de posse ou porte NÃO é necessário que a arma de fogo tenha sido apreendida e periciada. Assim, é irrelevante a realização de exame pericial para a comprovação da potencialidade lesiva do artefato. Isso porque os crimes previstos no arts. 12, 14 e 16 da Lei 10.826/2003 são de perigo abstrato, cujo objeto jurídico imediato é a segurança coletiva.

No entanto, se a perícia for realizada na arma e o laudo constatar que a arma não tem nenhuma condição de efetuar disparos não haverá crime. Para o STJ, no julgado noticiado neste Informativo, não está caracterizado o crime de porte ilegal de arma de fogo quando o instrumento apreendido sequer pode ser enquadrado no conceito técnico de arma de fogo, por estar quebrado e, de acordo com laudo pericial, totalmente inapto para realizar disparos.

STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 397.473-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/8/2014 (Info 544).

O porte de arma de fogo desmuniciada configura crime? SIM. O porte de arma de fogo (art. 14, Lei 10.826/03) configura crime, mesmo que esteja desmuniciada. Trata-se de posição, atualmente, pacífica tanto no STF como no STJ. Para a jurisprudência, o simples porte de arma, munição ou acessório de uso permitido - sem autorização e em

desacordo com determinação legal ou regulamentar - configura o crime previsto no art. 14 da Lei n. 10.826/2003, por ser delito de perigo abstrato, de forma a ser irrelevante o fato de a arma apreendida estar desacompanhada de munição, porquanto o bem jurídico tutelado é a segurança pública e a paz social. STJ. 3ª Seção. AgRg nos EAREsp 260.556/SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/03/2014. STF. 2ª Turma. HC 95073/MS, red. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki, 19/3/2013 (Info 699). O posse ou porte apenas da munição configura crime? SIM. A posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes. STF. 2ª Turma. HC 119154, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 26/11/2013. STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1442152/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 07/08/2014.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 21

Para que haja condenação pelo crime de posse ou porte é necessário que a arma de fogo tenha sido apreendida e periciada? NÃO. É irrelevante (desnecessária) a realização de exame pericial para a comprovação da potencialidade lesiva do artefato, pois basta o simples porte de arma de fogo, ainda que desmuniciada, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para a incidência do tipo penal. Isso porque os crimes previstos no arts. 12, 14 e 16 da Lei 10.826/03 são de perigo abstrato, cujo objeto jurídico imediato é a segurança coletiva. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1294551/GO, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 07/08/2014. O posse ou porte de arma quebrada configura crime? NÃO. Como vimos acima, não é imprescindível que seja realizada perícia na arma de fogo apreendida. No entanto, se o laudo pericial for produzido e ficar constatado que a arma não tem nenhuma condição de efetuar disparos não haverá crime. É o decidiu o STJ no julgado noticiado neste Informativo:

(...) Sendo a tese nuclear da defesa o fato de o objeto não se adequar ao conceito de arma, por estar quebrado e, consequentemente, inapto para realização de disparo, circunstância devidamente comprovada pela perícia técnica realizada, temos, indubitavelmente, o rompimento da ligação lógica entre o fato provado e as mencionadas presunções. Nesse contexto, impossível a manutenção do decreto condenatório por porte ilegal de arma de fogo. (...) STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 397.473/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/08/2014.

Vale ressaltar, no entanto, que, se a arma quebrada estiver com munição, o agente poderá ser condenado porque o simples porte de munição já configura o delito. Assim, somente a arma quebrada e desmuniciada não configura crime.

LEI MARIA DA PENHA (LEI 11.340/2006) Descumprimento de medida protetiva de urgência não configura crime de desobediência

Importante!!!

O descumprimento de medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei 11.340/2006) não configura crime de desobediência (art. 330 do CP).

STJ. 5ª Turma. REsp 1.374.653-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/3/2014 (Info 538).

STJ. 6ª Turma. RHC 41.970-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 7/8/2014 (Info 544).

Imagine a seguinte situação hipotética: Maria decidiu se separar de João. Este, contudo, continuou a procurá-la insistentemente e a fazer ameaças caso ela não reatasse o relacionamento. Diante disso, Maria procurou a Delegacia pedindo que fossem tomadas providências. A autoridade policial lavrou o boletim de ocorrência e enviou um expediente ao juiz com o pedido de

Maria para que João não se aproximasse mais dela (art. 12, III, da Lei n. 11.343/2006). O juiz deferiu o pedido da ofendida e determinou, como medidas protetivas de urgência, que João mantivesse distância mínima de 500m de Maria e não tentasse nenhum contato com ela por qualquer meio de comunicação (art. 22, III, “a” e “b”). Na decisão, o magistrado consignou, ainda, que, em caso de descumprimento de quaisquer das medidas aplicadas, seria aplicada ao requerido multa diária de 100 reais, conforme previsto no § 4º, do art. 22 da

Lei n. 11.340/2006. João foi regularmente intimado. Apesar disso, uma semana depois procurou Maria em seu local de trabalho, fazendo novas ameaças.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 22

Quais consequências poderão ser impostas a João pelo descumprimento da medida protetiva?

A execução da multa imposta; e

A decretação de sua prisão preventiva (art. 313, III, do CPP). João também poderá ser processado pelo crime de desobediência (art. 330 do CP)? NÃO. O descumprimento de medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei

n. 11.340/2006) não configura crime de desobediência (art. 330 do CP). Não há crime de desobediência quando a pessoa desatende a ordem e existe alguma lei prevendo uma sanção civil, administrativa ou processual penal para esse descumprimento, sem ressalvar que poderá haver também a sanção criminal. Resumindo: Regra: se na Lei, houver previsão de sanção civil ou administrativa para o caso de descumprimento da ordem dada, não se configura o crime de desobediência. Exceção: haverá delito de desobediência se, na Lei, além da sanção civil ou administrativa, expressamente constar uma ressalva de que não se exclui a sanção penal. Ex1: Marcelo foi parado em uma blitz. O agente de trânsito determinou que ele apresentasse a habilitação e o documento do veículo, tendo Marcelo se recusado a fazê-lo. Marcelo não cometeu crime de desobediência porque o art. 238 do Código de Trânsito já prevê punições administrativas para essa conduta (infração gravíssima, multa e apreensão do veículo), sem ressalvar a possibilidade de aplicação de sanção penal. Ex2: Gutemberg foi intimado para testemunhar em uma ação penal, tendo, no entanto, sem justificativa, deixado de comparecer ao ato processual. Gutemberg cometeu o crime de desobediência. O CPP determina que o juiz poderá aplicar multa e condená-lo a pagar as custas da diligência, sem prejuízo do processo penal por crime de desobediência (art. 219). Assim, a Lei (no caso, o CPP) prevê punições civis, ressalvando, no entanto, que elas poderão ser aplicadas juntamente com a condenação criminal. Ex3: Cleôncio foi intimado para testemunhar em uma ação de indenização por danos morais, tendo, no entanto, sem justificativa, deixado de comparecer ao ato processual. Cleôncio não cometeu o crime de desobediência. O CPC prevê que a testemunha faltosa será conduzida coercitivamente e condenada a pagar as despesas do adiamento do ato (art. 412). Contudo, a Lei (no caso, o CPC) não prevê a possibilidade de tais sanções cíveis serem aplicadas juntamente com a punição pelo crime de desobediência.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

AÇÃO PENAL PRIVADA Queixa-crime

Para que o advogado proponha queixa-crime em nome do seu cliente, ele precisa ter recebido procuração com poderes especiais para praticar esse ato.

Se o cliente outorga procuração sem conferir poderes ao advogado para ajuizar queixa-crime, este advogado não pode oferecer substabelecimento a outro advogado mencionando que este terá poderes para propor queixa-crime.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 23

Ora, se o advogado originário não recebeu poderes para ajuizar queixa-crime, ele não poderá substabelecer para outro advogado poderes para propor queixa-crime. Em palavras mais simples, o advogado não pode substabelecer poderes que não recebeu. Apenas os poderes originariamente outorgados podem ser transferidos.

Assim, deve ser tida por inexistente a inclusão, ao substabelecer, de poderes especiais para a propositura de ação penal privada, se eles não constavam do mandato originário.

Portanto, cabe reconhecer a nulidade da queixa-crime, por vício de representação, tendo em vista que a procuração outorgada para a sua propositura não atende às exigências do art. 44 do CPP.

STJ. 6ª Turma. RHC 33.790-SP, Rel. originário Min. Maria Thereza De Assis Moura, Rel. para Acórdão Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/6/2014 (Info 544).

No processo penal, a ação penal é classificada segundo a legitimação ativa, ou seja, de acordo com a pessoa que pode propô-la. Assim, nós temos:

AÇÃO PENAL PÚBLICA AÇÃO PENAL PRIVADA

Divide-se em: a) Ação penal pública incondicionada b) Ação penal pública condicionada c) Ação penal pública subsidiária da pública

Divide-se em: a) Ação penal privada personalíssima b) Ação penal privada propriamente dita c) Ação penal privada subsidiária da pública

A peça acusatória é a denúncia. A peça acusatória é a queixa-crime.

Queixa-crime é... a petição inicial da ação penal privada ajuizada pelo querelante (ofendido ou seus sucessores* do art. 31, CPP) devendo ser subscrita por advogado dotado de procuração com poderes especiais por meio da qual se pede ao juízo competente a instauração de processo penal e a condenação do suposto autor do delito (querelado) a uma sanção penal. * no caso da ação penal privada personalíssima, somente o ofendido pode ajuizar a ação penal e se ele morrer, os seus sucessores não poderão dar continuidade à ação, ocorrendo a extinção da punibilidade. Prazo para oferecer a queixa-crime: Prazo decadencial de 6 meses, contados do dia em que souber quem é o autor do crime. O que importa não é o recebimento da queixa, mas sim a data de seu oferecimento. Assim, a queixa deve ser oferecida em até 6 meses, sob pena de decadência.

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29 (ação privada subsidiária da pública), do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

Requisitos da queixa-crime: Em regra, os requisitos da queixa-crime são os mesmos da denúncia, estando previstos no art. 41 do CPP:

Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 24

Peculiaridades da queixa-crime: Para oferecer queixa-crime é indispensável a capacidade postulatória. Assim, o ofendido terá que contratar um advogado (ou ser assistido por um Defensor Público) para ajuizar a queixa-crime, salvo se o próprio ofendido for advogado (neste caso ele terá capacidade postulatória). Se o ofendido (querelante) for contratar um advogado para que protocolize a queixa-crime, ele deverá outorgar ao advogado uma procuração especial, ou seja, procuração com poderes especiais para este ato. Desse modo, diz-se que não basta a procuração com cláusula ad judicia et extra, sendo necessários poderes especiais. Tal exigência consta de forma expressa no art. 44 do CPP:

Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do instrumento do mandato (obs: instrumento do mandato = procuração) o nome do querelante (aqui houve um equívoco, pois o legislador quis dizer “nome do querelado”) e a menção do fato criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo criminal.

Requisitos da procuração especial Desse modo, para que o advogado protocolize queixa-crime em nome do ofendido, deverá possuir uma procuração especial (procuração específica) que, além dos requisitos normais de uma procuração geral, contenha as seguintes informações: a) Nome do querelado (obs: o art. 44 fala em “nome do querelante”, mas a doutrina e a jurisprudência afirmam que foi um equívoco, já que o nome do querelante já constaria normalmente mesmo que fosse uma procuração geral). b) Menção do fato criminoso. Primeiro ponto muito importante: O que se entende por “menção do fato criminoso”? É necessário que se narre o fato criminoso na procuração para se cumprir o disposto no art. 44?

NÃO (posição do STJ)

SIM (posição da 2ª Turma do STF)

Não é necessário que se narre o fato criminoso na procuração, bastando que se indique o nome do querelado e o artigo do Código Penal que ele teria praticado. Basta a menção do nomen juris ou do dispositivo penal. Ex1: procuração para oferecer queixa-crime contra Fulano pela prática do crime de injúria. Ex2: procuração para oferecer queixa-crime contra Fulano pela prática do crime do art. 140 do Código Penal.

É necessário que a procuração individualize o evento delituoso, não bastando que apenas mencione o nomen iuris do crime. Ex: procuração para oferecer queixa-crime contra Fulano pela prática do crime de injúria ocorrida no dia XX, por meio de palavras proferidas no lugar YY. Vale ressaltar, no entanto, que não é necessária uma descrição minuciosa, pormenorizada, ou seja, com detalhes.

Consolidou-se nesta Corte Superior de Justiça o entendimento que, na procuração pela qual o ofendido outorga poderes especiais para o oferecimento da queixa-crime, a indicação do dispositivo penal no qual o querelado é dado como incurso satisfaz o requisito previsto no

(...) a ação penal privada, para ser validamente ajuizada, dependeria, dentre outros requisitos essenciais, da estrita observância, por parte do querelante, da formalidade imposta pelo art. 44 do CPP. Esse preceito exigiria constar, da procuração, o nome do querelado e a menção

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 25

artigo 44 do Código de Processo Penal. (...) Exigir que o instrumento de mandato contenha descrição pormenorizada da conduta típica atribuída ao querelado seria fomentar o apego excessivo a formalismo desnecessário, já que tal requisito deve estar contido na própria queixa-crime, peça por meio da qual o ofendido manifesta a sua intenção em submeter o seu ofensor à persecução penal, sob pena de ser considerada inepta, nos termos do artigo 41 do Código de Processo Penal. (STJ. 5ª Turma. HC 119.827/SC, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 15/12/2009)

expressa ao fato criminoso, de modo que o instrumento de mandato judicial contivesse, ao menos, referência individualizadora do evento delituoso e não apenas o nomen iuris. Asseverou-se, por outro lado, não ser necessária a descrição minuciosa ou a referência pormenorizada do fato. (...) (STF. 2ª Turma. RHC 105.920/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 08/05/2012)

Dica: na prática profissional, a fim de evitar problemas, o ideal é que, na procuração, seja feito o relato, ainda que breve, do fato supostamente delituoso praticado pelo querelado. Outra sugestão é no sentido de que o querelante assine, juntamente com o advogado, a queixa-crime. Nesse caso, ainda que se considere que a procuração não atendeu ao art. 44 do CPP, não haverá consequências processuais tendo em vista que, como constará da queixa-crime a descrição do fato criminoso, o ofendido, ao assinar esta petição, estará ratificando tudo aquilo que nela consta. Segundo ponto muito importante: Se o juiz entender que a procuração não atendeu ao art. 44, este vício poderá ser suprido? SIM, este vício poderá ser suprido. Terceiro ponto muito importante: Até que momento este vício poderá ser suprido? Posição até então consolidada no STF: Até então, os julgados do STF sobre o tema afirmavam que a correção deste vício poderia ser feita a qualquer momento, mesmo que já tivesse se passado mais de 6 meses da data dos fatos. Isso porque este vício seria hipótese de ilegitimidade do representante da parte, que, a teor do art. 568 do CPP, pode ser sanada a todo tempo, mediante a ratificação dos atos processuais, sobretudo quando o querelante estivesse presente às audiências, hipótese na qual teria demonstrado a intenção de realmente processar o querelado. Vejamos um precedente neste sentido:

I. Ação penal privada: crime de calúnia (L. 5.250/67: decadência: C.Pr.Penal, art. 44). 1. O defeito da procuração outorgada pelo querelante ao seu advogado, para propor queixa-crime, sem menção do fato criminoso, constitui hipótese de ilegitimidade do representante da parte, que, a teor do art. 568 C.Pr.Pen., "poderá ser a todo o tempo sanada, mediante ratificação dos atos processuais" (RHC 65.879, Célio Borja); 2. A presença do querelante nas audiências que se seguiram ao recebimento da queixa basta a evidenciar o seu interesse na persecução criminal quanto ao fato objeto da ação penal e, em conseqüência, suprir o defeito da procuração. Precedentes. (...) (HC 86994, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, julgado em 14/03/2006)

Posição diferente do STF manifestada em julgado de 2012: No julgado noticiado no Informativo 665, o STF julgou de forma diferente, entendendo que o vício na procuração outorgada pelo querelante ao seu advogado somente pode ser corrigido durante o prazo decadencial, ou seja, até o período máximo de 6 meses contados do dia em que se veio a saber quem é o autor do crime.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 26

Esta ratificação da procuração pode ser feita expressamente, por escrito, ou então pelo comparecimento do querelante às audiências que forem realizadas após o recebimento da queixa, desde que tais audiências ocorram antes de terminar o prazo decadencial de 6 meses. Desse modo, o que mudou no entendimento do STF foi que, agora, não mais se admite a correção do vício na procuração a qualquer tempo, mas sim até antes de ocorrer a decadência. Vejamos um exemplo para melhor entender todo o assunto, que é difícil: José, no dia 10/02/2012, ofende Ricardo afirmando que ele é um “safado, cachorro, sem vergonha”. Ricardo contrata um advogado para ajuizar ação penal privada por injúria (art. 140 do CP) contra José. Na procuração outorgada por Ricardo ao seu advogado, consta que são conferidos poderes ao advogado para que este ingresse com queixa-crime contra José pela prática do crime do art. 140 do CP. Não se menciona nenhuma outra informação sobre o fato, apenas o tipo penal da ação a ser ajuizada e o nome do querelado. Esta procuração atende à exigência do art. 44 do CPP?

Segundo o entendimento do STJ: SIM.

Segundo o entendimento do STF: NÃO. Suponhamos que o juiz adote o entendimento do STF. Logo, a procuração apresenta uma irregularidade. Esta irregularidade pode ser corrigida? SIM. Até que momento?

Segundo o entendimento manifestado em precedentes antigos do STF: a qualquer momento, mediante ratificação dos atos processuais, em especial se o querelante estava presente nas audiências do processo que se seguiram ao recebimento da queixa, o que evidencia o seu interesse na persecução criminal.

Segundo o entendimento manifestado no julgado deste Informativo: o vício da procuração somente poderia ser suprido dentro do prazo decadencial (6 meses), ou seja, até o dia 09/08/2012. Se no dia 10/08/2012, não tiver sido corrigido este vício, ocorre a decadência e a consequente extinção da punibilidade.

Obs: o novo entendimento do STF, manifestado no Informativo 665, é também a posição do STJ, de modo que deve ser a que irá prevalecer na jurisprudência. Outra pergunta sobre o tema: Na procuração especial para o oferecimento da queixa-crime, a assinatura do querelante (ofendido) precisa ter a firma reconhecida? NÃO. Este é o entendimento mais atual do STJ:

À míngua de previsão no Código de Processo Penal sobre a necessidade de reconhecimento da firma do outorgante na procuração para o oferecimento da queixa-crime, por força do disposto no artigo 3º do aludido diploma legal, aplica-se subsidiariamente as disposições do Código de Processo Civil. Com a alteração promovida no artigo 36 do CPC com o advento da Lei n. 8.952/94, pacificou-se neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é desnecessário o reconhecimento de firma em procuração outorgando poderes especiais para a defesa de interesses em juízo. Precedentes. (HC 119.827/SC, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 15/12/2009)

Veja agora seguinte o caso concreto julgado pelo STJ (com adaptações): João outorgou uma procuração ad judicia (poderes para o foro em geral) para o Dr. Roberto (advogado). Dr. Roberto, por sua vez, substabeleceu os poderes que recebeu de João para Dr. Pedro. No substabelecimento, Dr. Roberto fez constar que Dr. Pedro poderia também ajuizar queixa-crime em nome de João. Diante disso, Dr. Pedro propôs uma queixa-crime, em nome de João, contra Antônio.

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 27

Essa queixa-crime é válida? NÃO. O STJ decidiu que é nula a queixa-crime oferecida por advogado substabelecido por outro advogado que recebeu do querelante apenas os poderes da cláusula ad judicia et extra (poderes para o foro em geral), ainda que ao instrumento de substabelecimento tenha sido acrescido, pelo substabelecente, poderes especiais para a propositura de ação penal privada.

A procuração é o instrumento pelo qual uma pessoa nomeia outra de sua confiança como seu representante (procurador), para agir em seu nome em determinada situação. É a procuração que define o conteúdo, os limites e a extensão do poder de representação. O substabelecimento, por sua vez, é um ato de transferência dos poderes outorgados na procuração inicial para que terceira pessoa possa praticar os mesmos atos, ou seja, é o repasse de poderes.

Ora, se o advogado originário não recebeu poderes para ajuizar queixa-crime, ele não poderá substabelecer para outro advogado poderes para propor queixa-crime. Em palavras mais simples, o advogado não pode substabelecer poderes que não recebeu. Apenas os poderes originariamente outorgados podem ser transferidos.

Assim, deve ser tida por inexistente a inclusão, ao substabelecer, de poderes especiais para a propositura de ação penal privada, se eles não constavam do mandato originário.

Portanto, cabe reconhecer a nulidade da queixa-crime, por vício de representação, tendo em vista que a procuração outorgada para a sua propositura não atende às exigências do art. 44 do CPP.

PRISÃO PREVENTIVA Prisão domiciliar do CPP

É possível a substituição de prisão preventiva por prisão domiciliar, quando demostrada a imprescindibilidade de cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos de idade (art. 318, III, do CPP) e o decreto prisional não indicar peculiaridades concretas a justificar a manutenção da segregação cautelar em estabelecimento prisional.

STJ. 6ª Turma. HC 291.439-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/5/2014 (Info 544).

Prisão domiciliar do CPP x Prisão domiciliar da LEP Vale ressaltar que o tema “prisão domiciliar” é tratado tanto no CPP como na LEP, sendo, contudo, institutos diferentes, conforme se passa a demonstrar:

PRISÃO DOMICILIAR DO CPP PRISÃO DOMICILIAR DA LEP

Arts. 317 e 318 do CPP. Art. 117 da LEP.

O CPP, ao tratar da prisão domiciliar, está se referindo à possibilidade do réu, ao invés de ficar em prisão preventiva, permanecer recolhido em sua residência.

A LEP, ao tratar da prisão domiciliar, está se referindo à possibilidade de a pessoa já condenada cumprir a sua pena privativa de liberdade na própria residência.

Trata-se de uma medida cautelar que substitui a prisão preventiva pelo recolhimento da pessoa em sua residência.

Trata-se, portanto, da execução penal (cumprimento da pena) na própria residência.

Hipóteses (importante): O juiz poderá substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:

Hipóteses (importante): O preso que estiver cumprindo pena no regime aberto poderá ficar em prisão domiciliar quando se tratar de condenado(a):

Informativo 544-STJ (27/08/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 28

I - maior de 80 anos; II - extremamente debilitado por motivo de doença grave; III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos de idade ou com deficiência; IV - gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco. Obs: os magistrados, membros do MP, da Defensoria e da advocacia têm direito à prisão cautelar em sala de Estado-Maior. Caso não exista, devem ficar em prisão domiciliar.

I - maior de 70 anos; II - acometido de doença grave; III - com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV - gestante.

O juiz pode determinar que a pessoa fique usando uma monitoração eletrônica.

O juiz pode determinar que a pessoa fique usando uma monitoração eletrônica.

O julgado aqui noticiado refere-se à prisão domiciliar do CPP. Analisando o caso concreto, o STJ afirmou que era possível a substituição de prisão preventiva por prisão domiciliar, porque estava demostrado que a mulher presa precisava cuidar de seu filho de 1 ano de idade (art. 318, III, do CPP) já que o seu companheiro foi preso junto e a criança não tinha com quem ficar. Além disso, a decisão que decretou a prisão não indicava peculiaridades concretas a justificar a manutenção da segregação cautelar em estabelecimento prisional.

DIREITO PENAL MILITAR / PROCESSUAL PENAL MILITAR

COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR Crime de desacato contra militar da Marinha do Brasil em atividade de patrulhamento naval

Atenção. DPU

Compete à Justiça Militar da União processar e julgar ação penal promovida contra civil que tenha cometido crime de desacato contra militar da Marinha do Brasil em atividade de patrulhamento naval.

Obs: existe entendimento em sentido contrário da 2ª Turma do STF.

STJ. 3ª Seção. CC 130.996-PA, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 12/2/2014 (Info 544).

Imagine a seguinte situação adaptada: João estava em uma praia quando foi abordado por militares da Marinha do Brasil que estavam fazendo o patrulhamento naval. O civil acabou ofendendo verbalmente os militares e foi denunciado pelo Ministério Público Militar por desacato (art. 299 do CPM). Segundo o Promotor Militar, trata-se de crime militar com base no art. 9º, III, “d”, do CPM:

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Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: (...) III – os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos: (...) d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquele fim, ou em obediência a determinação legal superior.

João cometeu crime militar (art. 299 do CPM) ou crime comum (art. 331 do CP)? Ele será julgado pela Justiça Militar ou pela Justiça Federal comum?

Sobre o tema, existem duas correntes:

1ª) CRIME MILITAR 2ª) CRIME COMUM

O agente cometeu crime militar e será julgado pela Justiça Militar.

O agente não cometeu crime militar e será julgado pela Justiça Federal comum.

Nos termos do art. 9º, III, “d”, do CPM, considera-se crime militar, em tempo de paz, os delitos praticados por civil, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública. A função militar é atribuição específica conferida por lei ao militar, como integrante das forças armadas, exercitadas com características próprias da instituição militar, sobrelevando-se o poder legal conferido à autoridade militar. Vale destacar que, segundo a doutrina, a CF e a legislação infraconstitucional não fazem distinção entre as atribuições primárias e subsidiárias na definição da competência da justiça militar. Nesse contexto, deve-se reconhecer como militar o crime praticado por civil contra militar no exercício das funções que lhe foram legalmente atribuídas, seja ela de caráter subsidiário ou não.

Para que seja considerado delito militar, é necessário que o fato se amolde a uma das hipóteses previstas no art. 9º do CPM. No caso em análise, a situação poderia estar enquadrada na letra “d”, do inciso III do art. 9º do CPM. No entanto, quando a letra “d” fala em “serviço de vigilância”, esta deve ser interpretada sistematicamente, de forma que abrange apenas a vigilância prestada no exercício de atividade própria da função militar. As atividades de fiscalização e policiamento marítimo não se caracterizam como função de natureza militar uma vez que tais atribuições podem ser desempenhadas por outros órgãos estaduais ou federais, como, por exemplo, a Polícia Fluvial, Guarda Costeira e a Polícia Federal. Dessa forma, trata-se de uma atribuição secundária da Marinha. Logo, esse fato não se subsume a nenhuma das hipóteses do art. 9º do CPM, razão pela qual não é crime militar e, por consequência, não é da competência da Justiça Militar seu julgamento. De quem é, então, a competência para julgar esse delito? Justiça comum FEDERAL. Por que da Justiça Federal? Pelo fato de o militar das Forças Armadas ser um agente público da União (art. 109, IV, da CF).

É a posição do STJ. É o entendimento prevalecente no STF. Em sentido parecido, confira a SV 36-STF.

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DIREITO PREVIDENCIÁRIO

TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO Vínculos concomitantes e aproveitamento das contribuições em regimes diversos

O segurado que manteve dois vínculos concomitantes com o RGPS – um na condição de contribuinte individual e outro como empregado público – pode utilizar as contribuições efetivadas como contribuinte individual na concessão de aposentadoria junto ao RGPS, sem prejuízo do cômputo do tempo como empregado público para a concessão de aposentadoria sujeita ao Regime Próprio, diante da transformação do emprego público em cargo público.

STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1.444.003-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 8/5/2014 (Info 544).

Imagine a seguinte situação hipotética: Em 1976, João assumiu emprego público em uma autarquia (universidade estadual). O empregado público é segurado obrigatório do RGPS, ou seja, está vinculado ao regime geral de previdência (RGPS), administrado pelo INSS (art. 40, § 13 da CF/88). Em 1990, foi editada uma lei que transformou o emprego público ocupado por João em um cargo público estatutário. A partir dessa data, João passou a estar vinculado ao regime próprio de previdência social previsto para os servidores efetivos daquela autarquia. Contribuinte individual Vale ressaltar que João, além de trabalhar na autarquia, sempre prestou serviços como “contador” (autônomo). Nessa qualidade, ele, todos os meses, contribuía (pagava contribuições previdenciárias) ao

INSS a título de “contribuinte individual” (art. 12, V, “g”, da Lei n. 8.212/91). Atividades concomitantes prestadas sob o regime do RGPS De 1976 a 1990, João possuía dois vínculos com o RGPS: um na condição de contribuinte individual e outro como servidor público estadual regido pela CLT. A partir de 1990 ele ficou com um vínculo no RGPS (contribuinte individual) e um vínculo no RPPS (cargo público na autarquia). Aposentadoria Agora, João quer descansar e pretende obter duas aposentadorias: uma no regime próprio e outra no RGPS. Ocorre que disseram para ele que, quanto ao período de 1976 a 1990, ele só poderá aproveitar as

contribuições para uma das aposentadorias, com base no art. 96, II da Lei n. 8.213/91:

Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes: (...) II - é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes;

Essa informação é correta? NÃO. O segurado que manteve dois vínculos concomitantes com o RGPS – um na condição de contribuinte individual e outro como empregado público – pode utilizar as contribuições efetivadas como contribuinte individual na concessão de aposentadoria junto ao RGPS, sem prejuízo do cômputo do tempo como empregado público para a concessão de aposentadoria sujeita ao Regime Próprio, diante da transformação do emprego público em cargo público. Em outras palavras, as contribuições do período de 1976 a 1990 poderão ser utilizadas para as duas aposentadorias.

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Mas e o art. 96, II, da Lei n. 8.213/91?

O que o art. 96, II, da Lei n. 8.213/91 proíbe é que o mesmo tempo durante o qual o segurado exerceu simultaneamente uma atividade privada e outra no serviço público seja utilizado para contagem em dobro do tempo no mesmo regime. Em outras palavras, esse período de 1976 a 1990 não poderia ser contado em dobro para conceder aposentadoria no RGPS. O art. 96, II não veda a percepção simultânea de duas aposentadorias em regimes distintos, quando os tempos de serviços realizados em atividades concomitantes sejam computados em cada sistema de previdência, havendo a respectiva contribuição para cada um deles (STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1.335.066/RN, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 06/11/2012). Não há, portanto, violação ao princípio da unicidade de filiação.

DIREITO INTERNACIONAL

DIVÓRCIO REALIZADO NO BRASIL E BENS SITUADOS NO ESTRANGEIRO Ação de divórcio de pessoas domiciliadas no Brasil e bens situados no estrangeiro

Em ação de divórcio e partilha de bens de brasileiros, casados e residentes no Brasil, a autoridade judiciária brasileira tem competência para, reconhecendo o direito à meação e a existência de bens situados no exterior, fazer incluir seus valores na partilha.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.410.958-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 22/4/2014 (Info 544).

Imagine a seguinte situação hipotética: Maria propõe ação de divórcio contra João, processo que tramita em uma vara de família de Porto Alegre. Vale ressaltar que tanto Maria como João são brasileiros e possuem domicílio no país. Além disso, eles se casaram no Brasil. No momento da partilha de bens, o magistrado constata que João possui um apartamento no Uruguai. O juiz brasileiro tem competência para incluir no divórcio e partilha esse imóvel situado no estrangeiro? SIM. Em ação de divórcio e partilha de bens de brasileiros, casados e residentes no Brasil, a autoridade judiciária brasileira tem competência para, reconhecendo o direito à meação e a existência de bens situados no exterior, fazer incluir seus valores na partilha.

O regime de bens, nesse caso, deverá obedecer às leis brasileiras, nos termos do art. 7º, § 4º do Decreto-lei 4.657/1942 (Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro):

Art. 7º (...) § 4º O regime de bens, legal ou convencional, obedece à lei do país em que tiverem os nubentes domicílio, e, se este for diverso, a do primeiro domicílio conjugal.

Além disso, como o casamento ocorreu no Brasil, essa relação jurídica deve ser regida pela lei brasileira, conforme o art 9º da LINDB:

Art. 9º Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem.

O Poder Judiciário brasileiro não tem jurisdição para interferir na esfera jurisdicional de outro país. No entanto, não é esse o caso, porquanto estamos aqui tratando de direitos decorrentes de um ato jurídico celebrado no Brasil e, portanto, regulado pela Lei nacional, o que torna plenamente competente a autoridade judiciária brasileira para definir quais são os direitos das partes envolvidas na demanda, de acordo com o disposto no art. 7º, § 4º e no art. 9º da LINDB.

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EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) (Juiz TJSP 2014 banca própria) No tocante à responsabilidade pelo dano ambiental, pode-se afirmar,

quanto à natureza das responsabilidades civil, administrativa e penal. A) Respectivamente, responsabilidade objetiva, subjetiva e subjetiva. B) Respectivamente, responsabilidade objetiva, objetiva e subjetiva. C) Todas elas são de responsabilidade subjetiva. D) Respectivamente, responsabilidade subjetiva, objetiva e subjetiva. Letra B

2) (Juiz Federal TRF4 2014 banca própria) Sobre a reparação do dano ambiental:

A) Conforme orientação dominante do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar a sua obrigação de indenizar. B) A responsabilidade por dano ambiental pressupõe, além da demonstração de dolo ou culpa, a existência de uma atividade econômica que implique riscos para a saúde e para o meio ambiente, impondo-se ao empreendedor a obrigação de prevenir tais riscos (princípio da prevenção) e de internalizá-los em seu processo produtivo (princípio do poluidor-pagador). C) A orientação dominante do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de não ser possível, em ação civil pública, que a sentença condenatória imponha ao responsável, cumulativamente, as obrigações de recompor o meio ambiente degradado e de pagar quantia em dinheiro a título de compensação por dano moral coletivo. D) Conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça, os atos de polícia podem ser executados pela própria autoridade ambiental, independentemente de ordem judicial, mesmo quando tiverem por objeto a demolição de casa habitada. E) Em nosso sistema jurídico, o princípio da reparação integral do dano ambiental, que permite a responsabilização mediante a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar, tem sua aplicação restrita aos danos que atinjam os recursos hídricos, considerados essenciais à vida. Letra A

3) (Promotor MPSC 2014 banca própria) Para a responsabilização civil em caso de dano ambiental, é

dispensável a comprovação da existência de dolo, sendo necessária, no entanto, a demonstração da culpa, em qualquer uma de suas três modalidades. ( ) E

Gabarito

1. Letra B 2. Letra A 3. E

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JULGADOS NÃO COMENTADOS

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE E COISA JULGADA EM EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLETIVA QUE JULGOU QUESTÃO REFERENTE A EXPURGOS INFLACIONÁRIOS SOBRE CADERNETAS DE POUPANÇA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). A sentença proferida pelo Juízo da 12ª Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília-DF, na ação civil coletiva n. 1998.01.1.016798-9, que condenou o Banco do Brasil ao pagamento de diferenças decorrentes de expurgos inflacionários sobre cadernetas de poupança ocorridos em janeiro de 1989 (Plano Verão), é aplicável, por força da coisa julgada, indistintamente a todos os detentores de caderneta de poupança do Banco do Brasil, independentemente de sua residência ou domicílio no Distrito Federal, reconhecendo-se ao beneficiário o direito de ajuizar o cumprimento individual da sentença coletiva no Juízo de seu domicílio ou no Distrito Federal; os poupadores ou seus sucessores detêm legitimidade ativa – também por força da coisa julgada –, independentemente de fazerem parte ou não dos quadros associativos do IDEC, de ajuizarem o cumprimento individual da sentença coletiva proferida na ação civil pública n. 1998.01.1.016798-9, pelo Juízo da 12ª Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília-DF. Inicialmente, é oportuno elucidar que o Instituto de Defesa do Consumidor – IDEC ajuizou ação coletiva contra o Banco do Brasil, a qual foi distribuída à 19ª Vara Cível do Fórum Central da Comarca de São Paulo. Acolhendo exceção de incompetência aforada pelo próprio Banco do Brasil, ao fundamento de que “o objetivo do IDEC é obter uma única sentença, permitindo a todos o recebimento dos índices expurgados da poupança, sem que cada um dos poupadores tenha que promover sua demanda individualmente”, o Poder Judiciário do Estado de São Paulo concluiu que a ação deveria ter sido proposta na sede do Banco do Brasil, situado no Distrito Federal, em razão de abranger toda uma coletividade de âmbito nacional. O Juízo da 12ª Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília, ao qual foi redistribuída a ação coletiva, proferiu sentença, rejeitando a preliminar de inépcia da inicial, arguida sob o fundamento de não ter sido delimitada a abrangência da ação, reconheceu o âmbito nacional da demanda e o efeito erga omnes da ação, confirmando a competência da Justiça do Distrito Federal para o processamento do feito. Julgado o mérito da causa, o Banco do Brasil foi condenado, de forma genérica, observado o art. 95 do CDC, a incluir o índice de 48,16% no cálculo do reajuste dos valores depositados nas contas de poupança mantidos em janeiro de 1989, até o advento da MP 32/1989, tudo a ser apurado em liquidação de sentença. A referida sentença foi integralmente confirmada pelas instâncias superiores, a despeito da irresignação recursal do Banco do Brasil para restringir os feitos da sentença aos limites da competência territorial, conforme a interpretação do art. 16 da Lei da Ação Civil Pública. Destaque-se que a sentença é clara ao afirmar a sua abrangência nacional e o efeito erga omnes, assertiva que não perde a sua força dispositiva em razão de estar formalmente situada no âmbito da parte da sentença destinada à fundamentação, sem ter sido formalmente reproduzida no dispositivo. Nesse passo, pode-se afirmar que não cabe restringir os efeitos subjetivos da sentença após o trânsito em julgado se na ação civil pública foi pedida eficácia nacional da sentença a ser proferida – motivo esse da declinação da competência da Justiça Paulista para a do Distrito Federal – e se tais razões foram expressamente acolhidas pelo juízo de primeiro grau e confirmadas pelas instâncias superiores, rejeitando-se o pleito de limitação dos efeitos da sentença ao território do Distrito Federal, deduzido precisamente com base no art. 16 (REsp 1.348.425-DF, Quarta Turma, DJe 24/5/2013). Convém ressaltar que a doutrina preceitua ser a coisa julgada um pressuposto negativo endereçado ao juiz do processo futuro – que deve exercer o seu poder-dever de abstenção, sem exercer qualquer juízo de valor acerca da sentença –, pois inclui sob o manto da intangibilidade pan-processual tanto as questões deduzidas como as que poderiam tê-lo sido. Por isso, no plano coletivo, aproxima-se a coisa julgada de uma norma legal e traz embutida ou pressuposta a exegese feita judicialmente, já definida quanto aos seus campos subjetivo e objetivo de aplicação. Ademais, da leitura das decisões que foram prolatadas na ação coletiva, fica nítido que o provimento jurisdicional deve contemplar todos aqueles que mantinham conta de poupança com o Banco do Brasil, e não apenas aqueles poupadores vinculados ao IDEC. Portanto, não há dúvida de que a sentença prolatada na ação coletiva fixou o índice expurgado e abrangeu,

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indistintamente, todos aqueles que mantinham conta de poupança com o Banco, em janeiro de 1989 (Plano Verão). Esclareça-se que, existindo coisa julgada material, só mediante ações autônomas de impugnação – ação rescisória ou querela nullitatis insanabilis –, com amplo contraditório e participação como parte do substituto processual que manejou a ação coletiva, se poderia cogitar sua desconstituição. REsp 1.391.198-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/8/2014.

DIREITO TRIBUTÁRIO. DEMORA INJUSTIFICADA DA ADMINISTRAÇÃO NA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE EX-TARIFÁRIO. A concessão do benefício de ex-tarifário alcança a importação realizada entre o pedido do referido benefício fiscal e a sua efetiva concessão, se a administração fazendária demorar injustificadamente a analisar e conceder o benefício. A concessão do benefício fiscal denominado ex-tarifário consiste na isenção ou redução de alíquota do imposto de importação, a critério da administração fazendária, para o produto desprovido de similar nacional, sob a condição de comprovação dos requisitos pertinentes. Sobre o referido benefício cabe uma interpretação sistemática e a incidência do princípio da razoabilidade. É certo que a autorização de desembaraço aduaneiro com suspensão de tributos constitui ato discricionário do Ministro de Estado da Fazenda (art. 12 do Decreto-Lei 2.472/1988), sujeito, portanto, a juízo de oportunidade e conveniência. Porém, a injustificada demora da Administração na análise do pedido de concessão de regime ex-tarifário, por se tratar de importação de mercadoria sem similar nacional, somente concluída após a internação do bem, não pode prejudicar o contribuinte que atuou com prudente antecedência, sob pena de flagrante e direta ofensa ao princípio da razoabilidade. Assim, deve-se assegurar ao requerente a redução de alíquota do imposto de importação, nos termos da legislação de regência. Não haveria lógica em entender de modo diferente, pois acarretaria a situação de o requerente, apesar de iniciar o procedimento para concessão do benefício fiscal, apresentar os documentos exigidos e preencher todos os requisitos necessários, não se beneficiar do ex-tarifário, mas somente abrir portas para que seus concorrentes paguem o imposto de importação com a alíquota reduzida. REsp 1.174.811-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 18/2/2014.

DIREITO TRIBUTÁRIO. PERIODICIDADE DE MULTA POR ATRASO NA ENTREGA DA DIMOF. A multa pela entrega tardia da Declaração de Informações sobre Movimentação Financeira (Dimof) incide a cada mês de atraso – e não por declaração atrasada. Conforme os arts. 57 da MP 2.158-34/2001 e 4º e 7º da Instrução Normativa 811/2008 da Secretaria da Receita Federal, a não apresentação da Dimof até o último dia útil do mês gera multa de R$ 5 mil por mês-calendário de atraso. Isto significa a aplicação de uma multa de R$ 5 mil que se acumula com periodicidade mensal, e não a cada 30 dias. A óbvia intenção do legislador é a de forçar a entrega da declaração o quanto antes, cominando multa que é majorada a cada mês – para cada mês de atraso soma-se uma nova multa – e não a de fixar uma multa para cada conjunto de informações não apresentado – para cada semestre uma multa. Precedentes citados: REsp. 1.216.930-PR, Segunda Turma, DJe 15/3/2011, REsp 1.136.705-RS, Primeira Turma, DJe 1º/7/2010, REsp 1.118.587-SC, Primeira Turma, DJe 6/11/2009. REsp 1.442.343-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 6/5/2014.

DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA SOBRE VERBAS REFERENTES À MIGRAÇÃO DE PLANO DE BENEFÍCIOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. Incide IRPF sobre os valores recebidos como incentivo à adesão ao processo de repactuação do regulamento do plano de benefícios de previdência privada. Consoante entendimento do STJ, constatada a mudança no regulamento do plano previdenciário, se a verba paga como incentivo à migração para o novo regime tem por objetivo compensar uma eventual paridade com os ativos, que foi perdida pelos inativos com a adesão às mudanças do regulamento do fundo de previdência privada, bem como compensar uma eventual paridade com os inativos que permaneceram no regime original, a toda evidência que se submete ao mesmo regime das verbas a que visa substituir.

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Assim, se as verbas pagas aos inativos que não migraram de plano submetem-se ao IRPF e as verbas pagas aos ativos também sofrem a mesma incidência, não há motivos para crer que as verbas pagas aos inativos que migraram de plano devam escapar da incidência do tributo. Essas novas verbas herdam a mesma natureza daquelas que foram suprimidas sendo assim remuneratórias e sujeitas ao imposto de renda. Precedente citado: REsp 1.173.279-AM, Segunda Turma, DJe 23/5/2012. AgRg no REsp 1.439.516-PR, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 6/5/2014.

DIREITO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO APÓS A MIGRAÇÃO ENTRE PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. Havendo transação prevendo a migração de participante ou assistido para outro plano de benefícios de previdência privada, em termos previamente aprovados pelo órgão público fiscalizador, não há direito adquirido consistente na invocação do regulamento do plano primitivo para revisão do benefício complementar, sobretudo se, ao tempo da transação, ainda não forem preenchidas todas as condições para a implementação do benefício previsto no regulamento primitivo. Incialmente, a doutrina esclarece que, com a homologação da transação, há “destruição de toda a relação jurídica”, por isso o “que persiste – no terreno do direito material – é a transação, negócio jurídico”. Ademais, a teor do art. 1.026 do CC/1916 (correspondente ao art. 848 do CC/2002), sendo nula qualquer das cláusulas da transação, nula será esta. Com efeito, apenas mediante o ajuizamento de ação anulatória prevista no art. 486 do CPC, voltada à desconstituição de atos processuais inquinados de qualquer das nulidades estabelecidas nos arts. 145 e 147 do CC/1916 (similares aos arts. 166 e 171 do CC/2002), poderá o interessado obter a revogação de quaisquer atos praticados no desenrolar de procedimento judicial, bem como da sentença homologatória da transação. Uma vez acolhido o pedido anulatório, produzir-se-á o exclusivo e específico efeito de desfazer esse ato, a que corresponde a restituição do interessado ao statu quo ante, ou seja, à situação anterior à sua realização. Ademais, o STJ entende que a transação, com observância das exigências legais, sem demonstração de qualquer vício, é ato jurídico perfeito e acabado, não podendo o simples arrependimento unilateral de uma das partes dar ensejo à anulação do acordo (REsp 617.285-SC, Quarta Turma, DJ 5/12/2005). Além do mais, quanto à possível invocação do diploma consumerista, é de observar que “o ponto de partida do CDC é a afirmação do Princípio da Vulnerabilidade do Consumidor, mecanismo que visa a garantir igualdade formal-material aos sujeitos da relação jurídica de consumo, o que não quer dizer compactuar com exageros” (REsp 586.316-MG, Segunda Turma, DJe 19/3/2009). Com efeito, ainda que perfilhado o entendimento acerca da incidência do CDC, é bem de ver que suas regras, valores e princípios são voltados a conferir equilíbrio às relações contratuais, de modo que, ainda que fosse constatada alguma nulidade da transação, evidentemente implicaria o retorno ao statu quo ante, não podendo, em hipótese alguma, resultar em enriquecimento a qualquer das partes. Noutro giro, a doutrina preceitua que a migração de planos de benefícios geridos pela mesma entidade fechada de previdência privada ocorre num contexto de amplo redesenho da relação contratual previdenciária, com o concurso de vontades do patrocinador, da entidade fechada de previdência complementar, por meio de seu conselho deliberativo, e autorização prévia da Previc (que sucedeu a Secretaria de Previdência Complementar, no tocante à atribuição legal de fiscalização e supervisão das entidades de previdência privada fechada). De mais a mais, havendo a migração de plano de benefícios de previdência privada, não há falar em invocação do regulamento do plano de benefícios primitivo, vigente por ocasião da adesão do participante à relação contratual. Na hipótese em foco, à luz da ab-rogada Lei 6.435/1977 e da LC 109/2001, verifica-se que a legislação de regência, visando ao resguardado do equilíbrio financeiro e atuarial do plano de custeio, sempre previu a possibilidade de alteração do regulamento do plano de benefícios, inclusive dos valores das contribuições e benefícios. Por isso, a teor do parágrafo único do art. 17 e do § 1º do art. 68, ambos da LC 109/2001, só há falar em direito adquirido na ocasião em que o participante preenche todas as condições para o recebimento do benefício, tornando-se elegível ao benefício. Além disso, esses mesmos artigos dispõem expressamente que as alterações processadas nos regulamentos dos planos de benefícios aplicam-se a todos os participantes das entidades fechadas, a partir de sua aprovação pelo órgão regulador e fiscalizador, só sendo considerado direito adquirido do

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participante os benefícios, a partir da implementação de todas as condições estabelecidas para elegibilidade consignadas no regulamento do respectivo plano. REsp 1.172.929-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/6/2014.

DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE CRÉDITO PERTENCENTE À SOCIEDADE ANÔNIMA PARA GARANTIR OBRIGAÇÃO DE SÓCIO. Não cabe bloqueio judicial de parte de crédito cobrado em execução judicial movida por sociedade anônima contra terceiro, na hipótese em que a decisão judicial que o determina é proferida em sede de ação cautelar movida por ex-cônjuge em face do outro ex-consorte, a fim de garantir àquele direito a ações da referida sociedade anônima, quando a participação acionária já se encontra assegurada por sentença com trânsito em julgado proferida em ação de sobrepartilha de bens sonegados. De fato, o reconhecimento posterior do direito à meação de cônjuge em relação às ações sonegadas traz como consequência natural apenas a possibilidade de assunção da condição de acionista da companhia, posição essa que não garante a ele, por si só, direito sobre créditos da pessoa jurídica em face de terceiros. Isso porque nenhum acionista tem direito de apossamento sobre créditos pertencentes à pessoa jurídica, a serem recebidos em ação ajuizada por esta em face de terceiros. Ressalte-se que, nos termos do que dispõe o art. 109, I, da Lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades Anônimas), o que se garante ao acionista é a participação nos lucros sociais da companhia, participação essa que ocorre com o recebimento de dividendos, quando, na forma e no percentual estabelecidos pelo estatuto da sociedade. Aponte-se, ainda, que o direito à percepção dividendos é antecedido por procedimento de relativa complexidade, o que, em princípio, impede que tal direito (o recebimento de dividendos) seja decantado de forma singela de um crédito a ser recebido pela sociedade em ação própria ajuizada contra terceiros. Por outra ótica, mesmo que se buscasse os dividendos recebidos pelo outro ex-consorte relativamente às ações sonegadas, com mais razão o conflito não diria respeito à pessoa jurídica, que efetivamente pagara dividendos a quem figurava como acionista da companhia e não deu causa a possíveis ilegalidades – devendo eventuais prejuízos serem recompostos perante quem, eventualmente, recebeu de forma indevida os dividendos. De resto, a própria Lei das Sociedades Anônimas traz as formas de constituição de garantias incidentes sobre ações da companhia, o que, em princípio, seria suficiente ao acautelamento da eficácia da decisão proferida na sobrepartilha, que é a averbação do gravame nos livros próprios – livro “Registro de Ações Nominativas” ou nos livros da instituição financeira –, como prevê o art. 40, hipótese em que o direito de preferência sobre as ações seria oponível contra terceiros. Por outra linha de fundamentação, reconhecer a condição de acionista de ex-cônjuge, com direito a parcela das ações da companhia, e posteriormente determinar que o patrimônio da própria pessoa jurídica suporte o pagamento dos valores equivalentes ao que teria direito o acionista, implica reconhecer um direito de recesso ou retirada não previsto em lei, mediante uma espécie de dissolução parcial da sociedade, no tocante às ações sonegadas, o que contraria a própria essência das sociedades anônimas. Com efeito, a decisão que determinou à sociedade anônima o pagamento, com patrimônio próprio, dos valores a que faria jus o acionista em razão de ações de que é titular, procedeu, a toda evidência, a uma autorização de retirada ou recesso sem previsão legal, e isso tudo sem observância dos procedimentos mínimos de apuração em balanço especial e no bojo de ação na qual a pessoa jurídica não figurou como parte, circunstância que denuncia a extrapolação dos limites subjetivos da coisa julgada. REsp 1.179.342-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/5/2014.