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    IMPROVISAO DAS ORIGENS LINGUAGEM TEATRAL:PRINCPIOS DE PRTICAS CONTEMPORNEAS

    Jorge Wilson da Conceio*

    Resumo Este artigo apresenta um percurso da improvisao que culmina em seu lugar de destaque em prticas con-

    temporneas de teatro. Nesse processo, enfocamos os principais acontecimentos que promoveram mudanas no pensar

    e fazer teatro de suas pocas. Abordamos os experimentos de Jaques Copeau, com jogos e sua busca por um teatro vivo,

    aos moldes da commedia dellarte, bem como sua influncia em autores importantes, entre eles Viola Spolin.Outro pontoimportante do trabalho a apresentao de grupos brasileiros que vm desenvolvendo propostas de espetculo de im-

    provisao ea partir da passamos a apresentar o estudo de princpios da improvisao teatral que determinam essa nova

    esttica e o trabalho do ator-jogador. Alm disso, abordamos tambm o papel da plateia no processo de renovao teatral.

    Ao tratarmos do jogo de improvisao e de seus princpios, traremos as falas de duas especialistas em jogo de improvisa-

    o que contribuem com esta discusso com seus relatos de experincia e estudos sobre espetculo de improvisao.

    Palavras-chave: teatro contemporneo, improvisao, jogos teatrais, princpios da improvisao, espetculo de im-

    provisao.

    Improvisation from origin to theatrical language:principles of contemporary practices

    Abstract This article presents the trajectory of improvisation which ends in its distinction position in theatrical contem-

    porary practices. In this journey we focus the main movements responsible for changing the way of thinking and doing

    theatre. We present Jaques Copeaus experiments with games and his efforts for creating a live theatre based on impro-

    visation which would be similar to commedia dell arte, as well as his influence toward some important authors, as Viola

    Spolin for instance. Another relevant point here is the work of some Brazilian groups who develop proposals of plays by

    the use of improvisation. The study also shows the principles of the Mach of Impro which establishes this new theatricalaesthetics and the work of actor-players. Besides, the work also talks about the role of the audience in the theatrical re-

    newal. When we deal with improvisation and its principles, we bring up the speeches of two specialists in improvisational

    games which contribute to this debate with their experience and study on improvisational reports.

    Keywords: contemporary theatre, improvisation, theater games, principles of improvisation, improvisational play.

    * Mestre em Educao, Arte e Histria da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) e integrante do Grupo de Pesquisaem Mediao Cultural Contaminaes e Provocaes Estticas da UPM.

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    INTRODUO

    Neste artigo, apresento um breve percurso da improvisao teatral, culminando em seu lugar de

    destaque no teatro contemporneo, propondo uma nova esttica teatral com base na criao do

    espetculo ao vivo e com a coautoria do pblico. Na sequncia, aponto alguns princpios do jogo deimprovisao, trazendo excertos das entrevistas com as especialistas em improvisao que fizeram

    parte da pesquisa.

    Este estudo tem origem na pesquisa de mestrado intitulada Vamos cena: quem, onde e o que:

    um estudo sobre jogos teatrais e a prtica de professores de arte na escola pblica, desenvolvida no

    Programa de Ps-Graduao em Educao, Arte e Histria da Cultura da Universidade Presbiteriana

    Mackenzie, uma investigao sobre a prtica de professores de arte, com formao em Artes Cnicas/

    Teatro e que atuam em escolas pblicas estaduais da cidade de Guarulhos.

    O ponto de partida para esta anlise foi o sistema de jogos de Viola Spolin. A partir da, realiza-

    mos um estudo dos universos do jogo ldico e do jogo de improvisao, que foi condio sine qua

    non para uma melhor compreenso de aspectos particulares do universo de jogos de improvisao

    e da proposta de jogos teatrais. Alm das referncias tericas que deram embasamento pesquisa

    e buscando dilogo com prticas contemporneas de uso do jogo de improvisao em espetculos

    teatrais, realizamos entrevistas com duas especialistas em improvisao: a atriz e palhaa-atleta da

    Cia. do Quintal, Rhena de Faria, que tambm ministra cursos de improvisao; e a atriz, jogadora e

    rbitro de Impro1, tambm pesquisadora teatral e professora da Universidade Federal de Minas

    Gerais, Mariana Muniz (2004), que desenvolveu seu estudo de doutorado, intitulado La improvisa-

    cin como espectculo: principales experincias y tcnicas aplicadas a la formacin del actor-im-provisador em la segunda mitad del siglo XX, na Universidade de Alcal, na Espanha.

    Os estudos sobre teatro, improvisao e jogos teatrais apontaram aspectos importantes do uso

    da improvisao no teatro ao longo da histria, bem como caractersticas e princpios que permi-

    tem o entendimento da improvisao como linguagem, e no como recurso para se chegar a uma

    cena pronta de espetculo.

    No confronto com as experincias relatadas pelos professores de arte, foi possvel constatar ou

    no a familiaridade deles com o sistema de Viola Spolin ou com outras propostas de jogo de impro-

    visao, observando o maior ou menor domnio de aspectos particulares dos jogos teatrais.

    1 - Impro a forma curta para espetculo de improvisao, que tem suas origens nas propostas do Theatresportde Keith Johnstone e doCatch de Impro, criado pela IneditThtre, na Frana, que prope uma disputa de improvisao teatral entre duas equipes de jogadores.Voltaremos a tratar desse assunto ao longo do texto.

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    IMPROVISAO O CAMINHO DA RENOVAO TEATRAL

    A origem da improvisao no est ligada ao teatro, e sim aos ritos religiosos da Antiguidade.Sandra Chacra (2007) chega a afirmar que o ato de improvisar remonta origem do homem e que

    todas as formas de arte passaram pelo processo improvisacional.Mas, como forma teatral, o grande acontecimento cnico que fez uso da improvisao foi acommedia dell arte, um teatro vivo, popular, que se contraps ao teatro erudito de sua poca, no

    qual os atores improvisavam a partir de um esquema, de umassunto.Os atores usavam mscara erepresentavam um nico personagem ao longo de suas vidas.

    As improvisaes, segundo Chacra (2007, p. 30), eram caracterizadas por enorme vitalidade e

    liberdade, apoiadas exclusivamente na arte do ator. Ela refora que esse ator era dotado de umatcnica apurada, de criatividade e conhecimento de msica e lnguas, de modo que no se tratava

    de atores improvisados, mas sim de atores que exercitavam sua tcnicaallimproviso. A comme-

    dia dellarteinfluenciou o gnero cmico no teatro e, mais tarde, a prtica teatral, com uso da im-provisao, bem como todo o teatro ocidental.

    Desde ento muita coisa aconteceu. A improvisao passou a ser vista com outros olhos. Graas commedia dellarte, improvisar ganhou statusde importncia no teatro moderno, passando porvrios nomes importantes, como Stanislavski, Meyerhold, Eugnio Barba, Grotovski, Peter Brook e

    tantos outros que se debruaram sobre a prtica do teatro com uso da improvisao, na segundametade do sculo XIX e no XX. A improvisao passou por um relevante processo de ressignificaona cena teatral.

    Entre esses grandes nomes do teatro, Muniz (2004) destaca a importncia de Jaques Copeau,para a retomada da improvisao no teatro e para as prticas de teatro de improvisao,sobre o

    qual falaremos adiante.Copeau, que foi contemporneo de Stanislavski, Meyerhold, Gordon Graic, Dalcroze, entre ou-

    tros, destacou-se na rea da pedagogia teatral, ainda que tenha atuado como ator, diretor, profes-

    sor, dramaturgo, cengrafo e crtico teatral. Para ele, a verdadeira questo do trabalho do ator eraa simplicidade.

    Segundo Muniz (2004), para Copeau, o ator deveria ocupar lugar de destaque em relao aos

    outros elementos do teatro, processo que ele denominava protagonismo do ator, e buscava libertaresse ator dos vcios de representao da poca, de modo a restabelecer o contato com sua ingenui-

    dade e simplicidade. Contudo, o foco de Copeau no era apenas o ator, mas tambm o pblico,como escreve Muniz (2004, p. 107): Na busca da simplicidade, da ingenuidade, da recuperao dasurpresa e encantamento por parte do pblico, Copeau define o espetculo teatral em dois elemen-

    tos bsicos: o ator e o pblico.Copeau via a improvisao como a sada para a renovao teatral de seu tempo. Por isso, buscava

    desenvolver um tipo de teatro que acontecesse all improviso. Para fugir das questes impostas pelo

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    teatro comercial e com a certeza de que era necessrio pensar o trabalho do ator como um trabalhode grupo, ele criou a Companhia Vieux Colombier. Sua ambio era conceber um novo tipo de com-dia, a Nova Comdia Improvisada, inspirado na commedia dellarte. Bastante interessado na relaodo ator com o pblico, sua ideia era criar com seus atores personagens arqutipos, como na comme-dia dellarte, mas contextualizados em sua realidade e capazes de desenvolverem situaes das maisdiversas na prtica da improvisao, podendo transitar entre a comdia ou o drama.

    Copeau, na primeira metade do sculo XX, passou a investigar o jogo infantil e acreditava que oator deveria jogar como uma criana. Por isso, desenvolveu uma srie de jogos e passou a exploraressa prtica com seus atores.

    Muniz (2004, p. 117) aponta essa inovao pedaggica de treinamento do ator por meio de jogoscomo o ponto de partida para vrias outras iniciativas que viriam depois, entre as quais as de ViolaSpolin e Johnstone:

    O vnculo entre improvisao e jogo, vislumbrado por Copeau no incio do sculo XX, ser recupera-do por muitos pedagogos e coletivos criadores da segunda metade do sculo passado. A importn-

    cia do jogo no trabalho de formao do ator, e principalmente na formao do ator improvisador,

    ser recuperada por Johnstone, Viola Spolin, entre muitos outros.

    Apesar dessas importantes investigaes com uso da improvisao no teatro por parte de gran-des nomes do teatro mundial, o grande acontecimento ligado improvisao no cenrio teatral,depois da commedia dellarte,deu-se com os movimentos de vanguarda do teatro, entre as dcadas

    de 1950 e 1970, em especial com os grupos e intelectuais do teatro off-off-broadway, nos EstadosUnidos.Com o auge dos movimentos sociais e polticos, era preciso pensar um tipo de teatro que tirasse

    o espectador da posio cmoda e passiva de observadores do fazer artstico. O apelo para um te-atro engajado politicamente fez com que o objetivo do teatro fosse estabelecer uma parceria coma plateia na construo do espetculo. Isso implicaria romper com a tradio, abrir espaos e propornovos paradigmas.

    O entendimento de que era preciso desconstruir a figura do pblico de teatro, tirando-o da po-sio de receptores, ouvintes do espetculo teatral, e extraindo dele uma participao mais visceral

    no ato cnico, participando, colaborando, ajudando a dar forma proposta teatral, fez com quemuitos pressupostos estruturais do teatro fossem repensados.

    O palco Italiano foi deixado de lado, e a quarta parede, posta abaixo. A separao palco-pla-teia, que colaborava imensamente para uma postura passiva dos membros da plateia e que traziaum peso histrico de lugar onde se vai para ver, abolida, e o teatro passa a acontecer na rua, empraas etc. O texto passa a ganhar outra conotao que no apenas a da pea escrita: a de umconjunto de sinais, signos, e smbolos, verbais e no verbais, presentes em um espetculo (CHA-CRA, 2007).

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    O texto precisa dar brecha interveno do pblico ou ser produzido junto com o pblico, inloco,para garantir uma relao de coautoria no espetculo. Alm disso, preciso diminuir a distn-

    cia entre fico e realidade, quebrando com a ideia de personagem de fico, a fim de estreitar oslaos de relacionamento ator/plateia.

    O teatro de vanguarda americano rompe com todas essas questes do teatro tradicional, comoaponta Desgranges (2006, p. 58):

    Um teatro, at ento, centrado no texto (na fbula), em uma ao dramtica bem delineada, na

    construo de personagens de fico, e no convite ao espectador a assistir uma histria que trans-

    correria em cena, viu, a partir desse perodo, serem ampliados seus pressupostos constituidores,

    convenes que definiam a maneira com que artistas e espectadores deveriam relacionar-se, e que

    estabeleciam o que todos deveriam esperar de um encontro teatral.

    O teatro e o ator passam, mais do que nunca, a se valer da improvisao como recurso de elabo-rao da cena na relao com a plateia, a qual participa e direciona, tambm por uso de improvisa-o, uma vez que convidada a entrar em uma histria que no conhece.

    medida que esse espectador vai entendendo seu papel, vai ocupando o espao que lhe dadoenquanto o espetculo acontece. o chamado Teatro Participao. Entre os principais representan-tes desse movimento podemos apontar: Living Theater, Open Theater, Bread and Puppet, Firehouse

    Theater, Performance Group, San Francisco Mime Troup e Teatro Campesino.Esses grupos, segundo Chacra (2007), transformaram o teatro em verdadeiro acontecimento

    coletivo. E, apesar de a contestao poltica no ter mais foras na atualidade, a participao dopblico continuou a ser investigada por vrios outros grupos e encenadores, influenciando todo oteatro ocidental.

    No teatro brasileiro, podemos ver essa influncia nos trabalhos de Jos Celso Martinez Corra,com o Te-Ato(cujo teatro tambm est fortemente ligado ideia de ritual), e Augusto Boal, com oTeatro do Oprimido, os quais entendem o fenmeno teatral como resultado de coautoria com o

    pblico.Todas essas mudanas reforam a ideia do teatro como algo vivo e em processo constante de

    transformao, como uma busca de respostas s questes impostas pela sociedade e pela pocaem que vivemos ou como forma de rompermos com a arte comercial ou congelada no tempo e noespao.

    Sem dvida alguma, como escreve Guenun (2004, p. 153): O teatro quer ser repensado, relan-ado, retomado. No podemos nos satisfazer com sua letargia e aceitar sua extino. Cada qualpode inventar os meios dessa recuperao, que so incontveis. E a improvisao teatral tem se

    constitudo como elemento fundamental nessa buscar por reinventar os meios.

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    ESPETCULO EM PROCESSO ATOR E PBLICO NA CONSTRUO DA CENA

    Como vimos, as pesquisas de Copeau, bem como as experincias do Teatro Participao, fizeramcom que a improvisao voltasse a ter espao de destaque no teatro, como j havia acontecido com

    a commedia dellarte. Desde ento, outras tantas experincias tm revelado a potncia da improvi-sao no como meio, mas como fim de uma proposta cnica.Muitos grupos passaram a trabalhar com a ideia de espetculo em processo, ou seja, o espetcu-

    lo deve ser construdo em conjunto com o pblico. Essa coautoria j era percebida, por exemplo, noTeatro Frum, que prope a interferncia do pblico para a construo de um possvel novo desfe-cho para o espetculo.

    Apesar de contar uma histria com texto e marcaes definidas, ao final, o coringa2do jogoquestiona quem assiste sobre outra sada para o final trgico do protagonista, e quem propuseruma alternativa convidado a representar o papel do protagonista. Alm de possibilidades de cena

    com pessoas da plateia, o espetculo, como o prprio nome diz, prope um frum de discussosobre o tema apresentado. Entretanto, no Teatro Frum ainda h um espetculo pronto, ensaiado,que apresentado ao pblico.

    Atualmente, existem vrios grupos e companhias que se valem da improvisao como propostade espetculo em processo. Muitosdelespartem de umaestrutura de jogos de improvisao.

    Aproximando essa categoria de jogo dos jogos esportivos, nasceu, no bojo de algumas compa-nhias, o teatro improvisado no formato desportivo, conhecido tambm como Catch de Improvisa-o, cujos cones so: o Indit Thtre (Frana); o TheatreSport(Canad e muitos outros pases, in-

    cluindo Brasil); a Liga Profesional de Improvisacin LPI (Argentina); o Mamut (Chile); aImproMadri(Espanha); Action Impro(Colmbia); Complot/Escena(Mxico); e Loose Moose Theatre(Canad). Alm disso, encontramos tambm festivais de improvisao, como o Match de Improvi-sao3, espetculo em que equipes de lugares ou pases se encontram para uma disputa de im-provisao, que jogado em diversos pases.

    No Brasil, j temos alguns grupos que vm desenvolvendo essa proposta. Merecem destaquepelo trabalho renomado que vm realizando, bem como pela pesquisa nesse tipo de teatro, que vm

    2 - Coringa a denominao dada ao jogador que faz a mediao com o pblico, provocando e incentivando que algum da plateiaencontre outro desfecho para o destino do personagem oprimido, alm de questionar se h ou no possibilidade de mudarmos essahierarquia social de opressores e oprimidos, o que faz surgir o frum.

    3 O Match de Improfoi criado por Robert Gravel e Yvon Leduc e baseia sua tcnica nas pesquisas do mestre ingls Keith Johnstone.Depois de vrias experincias com a improvisao teatral, por um grupo de atores do Teatro Experimental de Montreal, surgiu a ideia deuma pea teatral que, como um esporte, fosse nica e irrepetvel em cada representao. Criou-se, assim, no ano de 1977, um espetcu-lo esportivo-teatral baseado no hquei sobre gelo, que, com regras apropriadas e dentro de um marco adequado, gera um estado decompetio: nascia, assim, o Match de Improvisao, transformando-se em um sucesso imediato. Logo o jogo conquistou os pases daEuropa e Amrica do Sul, transformando-se em um xito mundial (Disponvel em: . Acesso em: 20 out. 2009).

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    se propondo a fazer: o Teatro Esporte4(SP); a Liga Profissional de ImprovisaoLPI(BH); e a Ciado Quintal(SP). Alm desses ncleos, podemos mencionar ainda a Cia Imprpria(Ouro Preto) e aCia Acmica(Ouro Preto).

    Em 2009, aconteceu em Belo Horizonte o Fimpro5, o Match de Improvisaono Brasil6. Igual-mente importante de mencionarmos neste trabalho so as pesquisas no Brasil sobre Impro, comoas realizadas pelas professoras Mariana Muniz (UFMG, e que participa deste estudo), Vera Acthkin(PUC SP) e Pita Beli (Furb).

    Vera Acthkin (2005) realizou pesquisa de mestrado intitulada O Teatro-Esporte de Keith Johnsto-ne e o ator: da idia ao a improvisao como instrumento de transformao para alm do

    palco, que estuda as questes histricas das origens do Teatro-Esporte e do mtodo de improvisa-o criado por Keith Johnstone, alm dos fundamentos do mtodo. Ela concluiu seu doutorado quetrata da relao do mtodo com o ator e a relao ator-pblico no espetculo, analisando o Teatro-Esporte como uma escola de teatro para os atores e suas possibilidades como instrumento de for-

    mao de e do pblico de teatro, sob o ttulo O Teatro-Esporte de Keith Johnstone: o improviso,o ator e o pblico.

    Pita Beli (Patrcia Borba) realizou as pesquisas Improvisao e treinamento do ator um percursohistrico, mestrado, em 2005, e O mtodo de improvisao de Keith Johnstone e sua utilizao comoferramenta para a criao teatral, doutorado em andamento.

    Podemos afirmar com este estudo que os jogos de improvisao so um dos pilares das propos-tas de espetculo contemporneas. E com isso possvel reavaliarmos a relevncia do sistema deSpolin para essas prticas.

    Mariana Muniz, por exemplo, ao participar da nossa pesquisa de mestrado, foi questionada se o

    sistema de jogos da Viola Spolin tem servido como referncia para a formao e o treinamento emjogos de improvisao, e respondeu-nos que sim: Sempre serviu, Johnstone fala que no conheciao trabalho de Spolin quando escreveu Impro, isso teria que ser melhor avaliado, no sei... Na Espa-nha, onde aprendi, eles tambm no conheciam. No entanto, est tudo conectado.

    Ainda que haja a necessidade de maior aprofundamento na anlise de aspectos do sistema deSpolin que precisam ser confrontados com paradigmas atuais, o que no nos propusemos a fazer aqui,observa-se na fala de Muniz que os jogos teatrais ainda so o alicerce do treinamento do ator-jogador.

    4 O TheatreSportfoi criado pelo canadense Keith Johnstone e chegou ao Brasil como Teatro Esporte, em 1997, por intermdio de VeraAchatkin, jogadora, diretora e professora na Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC).

    5 O Festival Internacional de Improvisao de BH (Fimpro) uma realizao da Liga Profissional de Improvisao de Belo Horizonte,grupo que se dedica improvisao desde 2006, sob coordenao da diretora, atriz, jogadora e professora Mariana Muniz (Disponvelem: . Acesso em: 20 out. 2009).

    6 O primeiro Campeonato Latino-Americano de Match de Improvisaode Belo Horizonte aconteceu em setembro de 2009, dentro doFimpro. Desse festival participaram as selees do Brasil, do Chile, do Mxico e da Argentina, em confrontos cnicos de improvisao, apartir de sugestes de ttulos dadas pelo pblico. Os espectadores tambm votam nas melhores cenas e definem o placar. Uma bandaimprovisa a trilha sonora das cenas. O jogo regido por regulamento internacional, e representantes das diferentes nacionalidades serevezam na arbitragem, a cada partida (Disponvel em: . Acesso em: 20 out. 2009).

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    PRINCPIOS DA IMPROVISAO TEATRAL

    Na busca por entender melhor o universo do jogo de improvisao na pesquisa de mestrado, oestudo prvio sobre o jogo da criana foi fundamental para descobrirmos quais caractersticasdessa categoria de jogo esto presentes no jogo de improvisao e devem ser observadas na prti-ca de jogadores amadores ou profissionais, bem como, e em especial, em propostas de formao emarte por meio do teatro. So elas:

    O carter ldico. Jogo como expresso simblica. Espao de autoexpresso e de relao com o outro. Jogar pelo prazer de jogar. A regra.

    Espao de explorao da criatividade e da imaginao. Aprender fazendo. Meio de desenvolvimento pessoal emocional, psicolgico, social.

    Alm das caractersticas que percebemos no jogo ldico, podemos verificar a natureza do jogode regras nos jogos de improvisao. Um desafio proposto aos jogadores, um problema de atua-o; h uma plateia que assiste, regras estabelecidas pelo grupo e que exploram elementos funda-mentais do fazer teatral.

    Spolin (2003, p. 341) nos apresenta a seguinte definio:

    Improvisao: jogar um jogo; predispor-se a solucionar um problema sem qualquer preconceito

    quanto maneira de solucion-lo; permitir que tudo no ambiente (animado ou inanimado) traba-

    lhe para voc na soluo do problema; no a cena, o caminho para a cena; uma funo predo-

    minante do intuitivo; entrar no jogo traz para pessoas de qualquer tipo a oportunidade de aprender

    teatro; tocar de ouvido; processo, em oposio a resultado; nada de inveno ou de origina-

    lidade ou de idealizao; urna forma, quando entendida, possvel para qualquer grupo de qualquer

    idade; colocar um objeto em movimento entre os jogadores como um jogo; soluo de problemas

    em conjunto; a habilidade para permitir que o problema da atuao emerja da cena; um momento

    nas vidas das pessoas sem que seja necessrio um enredo ou estria para a comunicao; uma

    forma de arte; transformao; produz detalhes e relaes com um todo orgnico; processo vivo.

    Vemos em sua definio as mltiplas potencialidades do jogo de improvisao. Mas importan-te destacar: a ideia de jogo como processo,e no produto; o trabalho de grupo para soluo de umproblema; a importncia da intuio; produo de detalhes e relaes com o todo de forma orgni-ca; a escuta que o jogador deve ter dentro do jogo; e a natureza pedaggica de elementos do fazerteatral.

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    Existem propostas diferentes de jogos de improvisao, como o caso dojogo dramtico (oriundoda Frana), osjogos teatrais(nos Estados Unidos),jogo melodramtico(Itlia), os jogos do teatro dooprimido (no Brasil), entre outros. H em cada uma dessas propostas particularidades que reforama potncia do jogo por diferentes abordagens. Entretanto, h tambm muitos elementos comunsentre elas, uma espcie de espinha dorsal dos jogos de improvisao, um eixo central, uma base. Porisso cabem aqui as seguintes questes:

    Qual a base comum desses jogos? Quais so os princpios dos jogos de improvisao?

    sobre isso que nos debruamos na sequncia deste estudo.

    PRINCPIOS DA IMPROVISAO TEATRAL

    Aqui... agora: o momento do jogo o momento do espetculo. caracterstica do jogo de impro-visao que no haja elaborao para sua realizao ou que haja o mnimo possvel. Trata-se de

    jogos que proponham um problema a ser resolvido, um desafio, um tema a ser trabalhado ou umadificuldade a ser enfrentada etc., e que, em qualquer dessas situaes dadas, os jogadores no te-nham tempo para resolver o como fazer.

    O tempo do grupo, anterior ao jogo, deve ser mnimo, apenas para dar alguma ordem ao jogo,

    podendo at ser permitido que os jogadores combinem alguns elementos da proposta, como oonde vai se passar a ao ou quem sero os envolvidos, quando isso solicitado pelo coordena-dor, mas nunca para planejar a cena antes de comear o jogo.

    Pode haver tempo para os jogadores combinarem? Pode, desde que seja um tempo curto, cincominutos, muitas vezes; o tempo necessrio para a mnima organizao do jogo de que falamos.

    O aqui e agoraresulta na possibilidade e necessidade de dilogo com os elementos que compo-nham ou que penetrem o espao de jogo, como sons que surjam da plateia, pessoas, objetos, umefeito da luz etc.

    Rhena de Faria, ao participar de nossa pesquisa, nos fala um pouco do que isso representa no

    universo de improvisao do palhao:

    ... se tiver algum na plateia que tem uma risada engraadssima, ou algum que espirrou, um

    avio que passou... um celular que tocou no meio do nmero... Enfim, o lugar do palhao muito

    no aqui e agora. Ele pode at viver uma situao fantasiosa, criar uma situao fictcia, mas como

    se o tempo todo ele dissesse para o pblico: Eu sei que ns estamos aqui. Eu estou brincando de

    fazer isso. Eu no estou fazendo isso de verdade. Eu estou brincando na frente de vocs de que eu

    sou tal coisa. E por esse motivo, o palhao muito permevel a esse aqui, esse agora, a esse pblico.

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    Ao falar de uma risada engraadssima, um espirro, um avio, um celular, ela define bem como ojogador pode enriquecer seu jogo, permitindo ser tocado pelo que est ao seu redor.

    Estado de presena: outra demanda do jogo. Poderamos chamar tambm de estado de jogo,estado de alerta, estado de prontido (para o jogo), que nada mais do que a energia corporal ne-cessria para o jogo, a energia para entrar em cena. O jogador precisa estar inteiro no jogo, comose fosse jog-lo pela ltima vez, ou pela primeira vez. Para isso, cada parte de seu corpo tem queestar acordada e em estado de potncia de movimento; o corpo aquecido em estado de urgncia.

    O aquecimento fundamental para a preparao; cada junta acordada e solta, cada msculoacordado e alongado, articulaes soltas e prontas, o corpo todo aceso. A imaginao e a criativi-dade tambm devem ser aquecidas pela explorao de imagens, na conexo do corpo com o espaofsico (projeo do corpo e da voz no espao) e com espaos imaginrios (projeo para alm doespao fsico), com os objetos, com o outro, os outros, o todo.

    A capacidade de mergulho na preparao e conexo do ator com seu universo energtico, cria-

    tivo e pulsante que o corpo define a qualidade de seu estado de jogo.Motes da improvisao teatral: todo o jogo de improvisao parte de um motivo, um estmulo

    dado por um dos jogadores, pelo coordenador de oficina ou, ainda, pela plateia. o que chamamosde mote da improvisao, ou seja, a base sobre a qual ela ser construda.

    H vrios tipos de mote, e, entre eles, podemos destacar: tema, objeto, ttulo de um filme ou oprprio filme, movimento corporal, atividade ou ao fsica, uma frase, uma tcnica teatral, umaimagem (um quadro, uma foto, um desenho etc.), gnero dramtico (musical, policial, drama, co-mdia, melodrama, tragdia), um sentimento etc.

    Rhena de Faria, em entrevista, nos apresenta dois bons exemplos de mote para improvisao. Oprimeiro o que ela chamou de estado de esprito, de nimo, e que chamei de sentimento; e o se-gundo, um movimento fsico:

    Eu poderia entrar me acabando de chorar [imita choro], at que vem algum e pergunta: O que

    aconteceu? Por que voc est chorando?. Ou no, ela fala: Isso mesmo! Chora mesmo! Porque vo-

    c mereceu!, enfim, seria um mote da improvisao, seria um estado de esprito, de nimo. Ou, s

    vezes, ns j trabalhamos com mote de improvisao fsico, o que a gente chama de motor, motor

    fsico, que quando voc entra na improvisao fazendo um movimento que pode ser altamente

    abstrato, e a vem algum e d um significado ao que eu criei. Eu entro como se eu fosse uma mola,a vem um segundo colega, compra minha idia e faz como se fosse uma mola tambm, at que

    vem o terceiro e mostra pro pblico que aquilo uma linha de montagem.

    A imagem como ponto de partida para o jogo representa amplo territrio de explorao no rela-to que Ingrid Koudela (2007) faz no trabalho intituladoLeitura das pinturas narrativas de PeterBrghel, o velho, no qual ela apresenta sua proposta de sistematizao de procedimentos a partir

    da leitura de imagem como as do pintor Brghel. Nesse trabalho, ela descreve as vrias etapas de

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    jogo, como: leitura da imagem individual e de vrios lugares diferentes da sala; verbalizao daleitura em voz alta e no coletivo; criao de imagens corporais, tendo a obra como referncia; usode jogo tradicional e o jogo teatral Apenas um em Movimento.

    Mariana Muniz, em entrevista, disse-nos que os motes podem ser variados e afirmou j ter vistode tudo. O mais importante para ela a participao da plateia: Sempre vindos do pblico. Esta a grande questo, trazer o pblico como coautor. Pode ser uma palavra, um objeto, um som, umafotografia, j vi de tudo. O mote, inclusive, um ponto-chave para a criao de um novo espetcu-lo de Impro.

    Liberdade para imaginar e criar: podemos dizer que a liberdade de criar e imaginar um pressu-posto do jogo de improvisao. Se no houver liberdade pessoal de jogo, o ator ficar constante-mente submetido a um controle do que dizer, fazer ou de como reagir. Caso o jogador no esteja sesentindo vontade nesse exerccio de se expor, dentro do jogo, ele pode travar. Seu mecanismo decensura pode causar um bloqueio, que Ryngaert (2009, p. 45) v como uma impossibilidade de

    superar a angstia causada pelo olhar do outro ou o sentimento de ser ridculo a seus prpriosolhos, a famosa conscincia de si.

    Podemos entender um mecanismo de censura rigoroso como o fruto de uma educao pautadana censura e na reprovao, muito comum tanto na experincia familiar como na escolar; melhordizendo, muito comum em nossa sociedade. a cultura do que Spolin (2003, p. 6) chama de apro-vao/desaprovao, sobre a qual ela escreve:

    O primeiro passo para jogar sentir liberdade pessoal. Antes de jogar, devemos estar livres. ne-

    cessrio ser parte do mundo que nos circunda e torn-lo real tocando, vendo, sentindo o seu sabor,

    e o seu aroma o que procuramos o contato direto com o ambiente. A liberdade pessoal para

    fazer isso leva-nos a experimentar e adquirir autoconscincia (auto-identidade) e auto-expresso.

    A sede de auto-identidade e auto-expresso, enquanto bsica para todos ns, tambm necessria

    para a expresso teatral.

    A espontaneidadea que se refere Spolin, comenta Ingrid Koudela (2002), no diz respeito auma ao livre simplesmente, em uma viso espontanesta do deixar fazer, mas sim a essa liber-dade de ao e estabelecimento de contato com o ambiente.

    Koudela aponta a diferenciao que Spolin faz entre inventividade e espontaneidade, para aautora americana, quando se trabalha somente com associao de ideias, ou seja, a histria, o jogode improvisao permanece ainda no plano cerebral.

    Koudela (2002, p. 51) diz que, para Spolin, a ao espontnea exige uma integrao entre osnveis fsico, emocional e cerebral. A forma com que somos criados e formados, ou seja, o quantofomos permitidos a agir com autonomia, criatividade, imaginao, experimentao do ambiente,das coisas, das relaes, dos sabores etc. reflete em maior ou menor capacidade de criar e imaginare, portanto, jogar livremente.

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    Mariana Muniz (2006), com base nas descobertas do canadense Keith Johnstone, escreveu emseu artigo Tcnica de Impro ou como lanar-se no vazio,sobre a questo do bloqueio da imagi-nao e criao, cujo teor refora o pensamento de Spolin.

    Muniz afirma (2006, p. 12) que os bloqueios da criatividade e imaginao so frutos de uma m

    educao de nosso potencial artstico e, principalmente, do medo do fracasso e da exposio pbli-ca de nosso universo pessoal: Por medo de fracassar, de no ser original, de no ser interessante,censuramos nossa imaginao, pois podemos ser trados, por ns mesmos, revelando aos demaispensamentos obscenos, psicticos, tolos, etc..

    Quanto mais liberdade o jogador sentir, quanto mais rpido reagir aos estmulos e, portanto,conseguir driblar o juiz que existe dentro de nosso crebro, mais rpido ele responder aos estmu-los no jogo de improvisao. Por isso Muniz (2006, p. 18) apresenta a seguinte questo: Mas o que a espontaneidade se no a capacidade de reagir aos estmulos recebidos de maneira rpida e sema interveno dos nossos censores internos?.

    Muniz (2006) ainda afirma que Johnstone prope o desbloqueio da imaginao do ator-jogadorpelo desenvolvimento dos seguintes pontos fundamentais: escuta; rebote; oferta, aceitao e blo-queio; jogo dos status; criao e quebra de rotinas.

    Vamos aqui nos ater aos princpios de escuta eaceitao, oferta erebote, que so mais impor-tantes para nossa investigao.

    Escuta e aceitao: em nossa pesquisa, ao perguntarmos sobre caractersticas da improvisao,Rhena de Faria nos fala de dois princpiosda improvisao teatral: escuta e aceitao. Para enten-der melhor cada um deles, ela nos explica:

    R Eu acho que... os dois primeiros princpios da improvisao, que o b--b para se comear

    a improvisar, a escuta e a aceitao [...]. Escuta seria estar aberto e permevel, poroso e receptivo

    para as proposta que vem. E a aceitao , uma vez que voc est aberto, permevel, poroso s

    coisas que te vm, voc aceitar. Ento no existe o dizer no em improvisao.

    J O aceitar ir para o jogo, no ?

    R Ir para o jogo, e mesmo que voc esteja vivendo uma situao de jogo em que os personagens

    estejam vivendo uma situao de briga, os personagens podem estar brigando; os atores jamais.

    Isso seria aceitao e escuta no sentido de aproveitar o que voc construiu, e usar o que voc cons-

    truiu. Ento, por exemplo, voc abriu uma porta imaginria e entrou no escritrio, eu tenho que ver

    que ali tem uma porta imaginria e entrar no escritrio pela mesma porta que voc abriu. No vou

    atravessar parede (grifo do autor).

    Como podemos ver na fala de Rhena, se no houver abertura por parte dos jogadores para ouviro companheiro e estar aberto s suas propostas, ou seja, aceit-las, embarcar de pronto, sem quererpropor outra ideia melhor ou simplesmente diferente, no possvel haver jogo de improvisao.

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    Em uma situao mais extrema, em uma improvisao entre dois jogadores que no se ouvem, te-ramos dois monlogos.

    Outro fator importante que ela aponta, que tambm tem a ver com escuta, em seu sentido maisamplo, o aproveitar/usar o que o outro construiu, ou seja, o respeito aos signos estabelecidosdurante o jogo e a sabedoria de tirar proveito deles (aceitao), como no exemplo da porta que foiaberta.

    Muniz (2004) explica que aceitaosignifica o momento em que o ator entra no jogo, quandoele aceita a proposta do colega de cena e embarca nela. Ao aceitar uma proposta, o ator se lana novazio, sem saber o que vai encontrar ou como vai sair de l; o importante que o ator improvise apartir de associaes possveis ou reaes aos estmulos dos outros jogadores.

    Oferta e bloqueio: Muniz (2004) refora a importncia de dois princpios fundamentais na pro-posta de improvisao como espetculo: ofertaebloqueio. Dentro da estrutura de espetculo deimprovisao, qualquer coisa nova que surge no espetculo, seja por parte de um ator ou da plateia

    ou, ainda, uma casualidade, denominada ofertas. Quanto mais participativas e mais interessantesforem as ofertas, mais estimulados sentir-se-o os jogadores. O bloqueio o total oposto da acei-tao, a negao do jogo. Se, ao receber uma proposta de outro jogador, ele nega essa proposta,ignorando-a ou apresentando outra proposta que considera melhor, ele est bloqueando o jogo.

    A oferta que o jogador recebe uma palavra do outro jogador, um barulho que vem da plateia(um beb que chora, um celular que toca, uma risada engraada...) desperta nele livre associaes,que recebem o nome de rebote, outro princpio postulado por Johnstone.

    Segundo Muniz (2006), o importante aproveitar a inrcia e reduzir o tempo do rebote, valori-

    zando a primeira imagem que vier mente.Em seus estudos sobre Impro, bem como seu trabalho com a Liga de Improviacin Madrilea,Muniz (2004, 2006) desenvolveu um esquema do que seria uma situao ideal de trabalho do

    jogador de Impro. O esquema assim apresentado: escuta rebote desenvolvimento dessereboteescutarebotedesenvolvimento desse rebote(e continua enquanto houver im-provisao).

    Ela explica que esse esquema no pretende ser regra, j que as coisas acontecem de forma maiscatica, mas enfatiza a importncia dele para se entender o funcionamento da imaginao, emespecial para jogadores iniciantes.

    CONSIDERAES FINAIS

    Aqui se encerra este artigosobre a improvisao teatral como linguagem e os princpios dos jo-gos de improvisao. H ainda outras questes que merecem destaque, mas que no poderemosabord-las aqui. Trata-se de questes tambm intrnsecas ao jogo de improvisao, como: experin-cia em jogo necessidade ou diferencial?; o papel do coordenadorde oficina o coordenador um

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    jogador?; plateia a potncia do jogo na formao de pblico; e espao cnico a importncia detocar e se tocado. Todos esses temas esto desenvolvidos na pesquisa de mestrado mencionada noincio da introduo deste trabalho. Infelizmente no vamos abord-los aqui, mas fica o convitepara conhecer o estudo na ntegra.

    A improvisao, como pudemos verificar neste trabalho, consagrou-se como linguagem, deixan-do o estigma de algo menor em relao ao espetculo ensaiado que antes lhe era comum. Se antesa improvisao era usada apenas para se chegar cena definitiva e, depois da cena pronta, estavarelegada a uma gag, um gesto diferente, uma flexo da voz, ou no ritmo/tom/intensidade da frasedita, agora ela constitui um fazer teatral que revela a fragilidade do jogador que constri seu gestono momento da representao. O jogador, por sua vez, no se esconde mais atrs de um persona-gem e por isso precisa de um treinamento especfico e uma relao ntima com seus parceiros de

    jogo, com o espao e com o pblico.Apesar de o enfoque deste artigo privilegiar uma prtica contempornea especfica de improvi-

    sao, sabemos que h outras propostas de uso de improvisao, com coautoria do pblico, queno tm como ponto de partida um jogo e que so to relevantes quanto ou at mais interessantes.

    O estudo apresenta princpios que podem ser estendidos a qualquer prtica que pressuponha aconstruo do espetculo como processo: que se d em frente a uma plateia; e que surja da parce-ria entre ator e pblico, resguardadas as devidas particularidades de cada proposta.

    Nestas linhas finais, fica a esperana de que este estudo contribua com as discusses acerca daimprovisao teatral e sua importncia no dilogo com o contemporneo.

    REFERNCIAS

    ACTHKIN, V. O Teatro-Esporte de Keith Johnstone e o ator: da idia ao- a improvisao comoinstrumento de transformao para alm do palco. 2005. Dissertao (Mestrado em Artes Cnicas)Universidade de So Paulo, So Paulo, 2005.

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    GUENUN, D. O teatro necessrio? So Paulo: Perspectiva, 2004.

    KOUDELA, I. Jogos teatrais. So Paulo: Perspectiva, 2002.

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    Historia, Teora e Prctica del Teatro)Universidad de Alcal, Madrid, 2004._______. Tcnica de Impro ou como lanar-se no vazio. A Chuteira, So Paulo, ano 1, n. 2, p. 12,2006.

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