Im Possibili Dade

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E se uma leitura de Ana apontasse para uma poética da impossibilidade? Lembra da insistência dela nessa palavra? O que há de mais forte no poema senão uma tentativa sempre frustrada? A crença inicial numa possibilidade, motivada pelo desejo, a colocação do poema num campo de possibilidades diante da linguagem e da vida (folha branca e limpa, vida branca e limpa), o mudo convite como um campo puro de potencialidades; ao mesmo tempo um reconhecimento de uma impossibilidade de dizer, a trombada no muro branco? O poema assume o seu fracasso quanto à tarefa de conciliar som e sentido e novamente se recolhe – humildemente, a virtude mais difícil – ao silêncio, deixando que a partir dessa cisão os sentidos proliferem. Olha a ética do poema, o assumir a linguagem em sua proliferante escassez. Por que escrever senão para assumir a impossibilidade de dizer? E uma conversa, por exemplo, para que serviria senão para assumir que somos incapazes de ser responsivos, que a preocupação e os temas são subjetivos, tão entranhados em cada um, embora a relação pareça possível? Por que a relação a dois ou três senão para aprender que o outro nunca é o um, que é impossível obedecer ao “se coloque no meu lugar”, embora possamos achar que chegamos perto. Por que não a solidão essencial como maneira de preparar-se para uma relação mais humana com o outro, que também fracassará, mas da qual retornaremos mais sensíveis, no seu sentido mesmo de frágeis e irremediavelmente sós (“viver quase a sós atrai, pouco a pouco, os irremediavelmente sós”) E daí a ideia de que somos totalmente responsáveis pela nossa subjetividade, no sentido de que a beleza ou a decrepitude de um objeto depende somente daquilo que somos (entre esse verbo aquilo que construímos ao longo da existência). - Uso algumas palavras que só assim significam.

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E se uma leitura de Ana apontasse para uma poética da impossibilidade? Lembra da insistência dela nessa palavra? O que há de mais forte no poema senão uma tentativa sempre frustrada? A crença inicial numa possibilidade, motivada pelo desejo, a colocação do poema num campo de possibilidades diante da linguagem e da vida (folha branca e limpa, vida branca e limpa), o mudo convite como um campo puro de potencialidades; ao mesmo tempo um reconhecimento de uma impossibilidade de dizer, a trombada no muro branco? O poema assume o seu fracasso quanto à tarefa de conciliar som e sentido e novamente se recolhe – humildemente, a virtude mais difícil – ao silêncio, deixando que a partir dessa cisão os sentidos proliferem. Olha a ética do poema, o assumir a linguagem em sua proliferante escassez. Por que escrever senão para assumir a impossibilidade de dizer? E uma conversa, por exemplo, para que serviria senão para assumir que somos incapazes de ser responsivos, que a preocupação e os temas são subjetivos, tão entranhados em cada um, embora a relação pareça possível? Por que a relação a dois ou três senão para aprender que o outro nunca é o um, que é impossível obedecer ao “se coloque no meu lugar”, embora possamos achar que chegamos perto. Por que não a solidão essencial como maneira de preparar-se para uma relação mais humana com o outro, que também fracassará, mas da qual retornaremos mais sensíveis, no seu sentido mesmo de frágeis e irremediavelmente sós (“viver quase a sós atrai, pouco a pouco, os irremediavelmente sós”) E daí a ideia de que somos totalmente responsáveis pela nossa subjetividade, no sentido de que a beleza ou a decrepitude de um objeto depende somente daquilo que somos (entre esse verbo aquilo que construímos ao longo da existência). - Uso algumas palavras que só assim significam.