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III SEMINÁRIO INTERNACIONAL ENLAÇANDO SEXUALIDADES 15 a 17 de Maio de 2013
Universidade do Estado da Bahia – Campus I Salvador - BA
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO E PEDAGOGIA
Gleiton Silva de Sales1
Resumo: Sabe-se que alguns temas são dignos de adentrarem o currículo escolar,
entretanto, outros temas tão importantes quanto o conhecimento da cultura escolar não
conseguem espaço naquele território contestado. Isto ocorre da Educação Básica ao
Ensino Superior. Nesse contexto cabe analisar, por exemplo, o que os professores na
sua formação inicial aprendem sobre gênero. Assim, este estudo em andamento tem
como foco principal levantar as representações sociais de gênero dos estudantes de
Pedagogia, na etapa final do curso (7º semestre), oferecido pela Universidade do Estado
da Bahia. Como forma de produção dos dados utilizou-se o questionário e a entrevista
semi-estruturada. A intenção é compreender como o curso de Pedagogia da
UNEB/Campus XIII tem de alguma maneira preparado os profissionais para a sua
atuação futura, na perspectiva de gênero. Entende-se que nesse contexto a Teoria das
Representações Sociais subsidiaria tal estudo sobretudo porque possibilita o
entendimento das relações entre o conhecimento de um dado grupo e suas efetivas
ações. Como resultados preliminares encontramos nas falas dos professores
depoimentos que revelam uma ausência de discussões sobre gênero durante a
graduação, revelam também resistência ao tratamento do tema como algo a ser discutido
nos espaços escolares; indicam, por fim, urgência na reestruturação curricular do curso.
Palavras-chave: Pedagogia; Representações Sociais; Gênero.
Contextualização
Analisar as propostas assumidas nas formações de professores ainda é algo
recente na nossa história da educação brasileira, sobretudo quando consideramos que as
teorias críticas, especialmente aquelas que estudam o currículo, datam do final da
década de 60 do século passado. Compreender o conhecimento como construto social
possibilitou uma investida que a teoria crítica possibilitou sobre os conteúdos que
adentram às escolas. Questionamentos e dúvidas, enfrentamentos e posicionamentos é o
que herdamos desse período de mobilização social em que minorias sociais surgem
exigindo visibilidade. Negros, mulheres, gay, lésbicas solicitam além de espaço, um
outro currículo, uma nova representação.
1 Professor Auxiliar da Universidade do Estado da Bahia – UNEB. Pesquisador do Grupo de Pesquisa
Educação, Formação de Professores e Contemporaneidade. E-mail: [email protected]
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No campo do gênero a sua maior influência nasce com a teoria feminista, a qual
problematiza o carater biologizante nos discusos direcionados ao gênero. Ainda assim,
percebe-se que na atualidade algumas discussões não “merecem” ser tocadas nos
espaços escolares. A questão do gênero é uma delas. Em numerosos encontros com
professores em formação continuada tivemos a oportunidade de ouvir depoimentos que
assumiam uma postura de despreparo dos professores. Nesse contexto, o estudo sobre o
qual formação os estudantes das licenciaturas estão tendo na perspectiva de gênero
nascia da inquietação que as desigualdades de gênero apresentavam no contexto escolar,
nas falas dos professores com os quais tive a oportunidade de estar junto como
formador de professores, nas políticas públicas assumidas pelo Estado, nos fatos
trazidos pela imprensa.
Assim, este texto pretende levantar algumas reflexões sobre a formação de
professores, especificamente no curso de Pedagogia na perspectiva de gênero. O
objetivo da pesquisa é trazer as representações sociais que os estudantes de Pedagogia
constroem no seu percurso formativo, tomando como fonte de dados entrevistas semi
estruturadas e análise documental.
O percurso tomado aqui inicia-se com um breve breve histórico do curso de
Pedagogia, a sua inserção, assim como seu decurso, no município de Itaberaba-Ba. Em
seguida discute-se a Teoria das Representações Sociais, justificando nesse contexto a
nossa opção metodológica, problematiza-se também o conceito de gênero e divulga-se,
por fim, as análises sobre os dados obtidos no estudo, ainda que de forma inconclusiva.
A Pedagogia no Campus XVI da UNEB
Constantemente na atualidade tem se questionado para que formar pedagogos,
qual a sua função social, qual a sua identidade. Longe de responder exaustivamente a
essas questões, queremos aqui trazer alguns contornos da Pedagogia para pensar qual
formação é assumida na atualidade, inclusive quando se trata das questões de gênero e
sexualidade, especialmente no curso oferecido pelo Departamento de Educação no
Campus XIII da UNEB.
O Departamento de Educação do Campus XIII (DEDC XIII) localiza-se no
município de Itaberaba, situado em Região da Chapada Diamantina, denominada de
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Piemonte Paraguaçu. A região da Chapada Diamantina, localizada no “coração da
Bahia”, apresenta topografia diversificada e é responsável por nascentes que dão origem
a 90% dos rios que formam as bacias do Paraguaçu, do Jacuípe e do rio de Contas,
abrigando ainda os três pontos mais altos de todo o Estado: o Pico das Almas, com
1.958 metros de altitude, o do Itobira, com 1.970m, e o dos Barbados, com 2.080m.
Todas estas características fazem da Chapada Diamantina uma região
internacionalmente renomada por suas belezas naturais.
Sua organização, a partir das discussões nos territórios de Identidades do
Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que divide o Estado da Bahia em 26
grandes territórios, conta com um total de 26 municípios: Abaíra, Andaraí, Barra da
Estiva, Boninal, Bonito, Ibicoara, Iraquara, Itaetê, Jussiape, Lençois, Marcionilio Souza,
Morro do Chapéu, Mucugê, Nova Redenção, Novo Horizonte, Palmeiras, Piatã, Rio de
Contas, Seabra, Souto Soares, Utinga, Wagner, Iaçu, Itaberaba, Serrinha e Conceição do
Coité.
A ocupação das terras que hoje compõem o Parque Nacional da Chapada
Diamantina, criado em 1985 por Decreto Federal, deu-se a partir da exploração direta
do diamante, a partir de 1820 e da dizimação da população indígena (maracás) existente
na região.
Sua história está intrinsecamente ligada ao processo da “corrida do diamante”
que durou cerca de 20 anos e resultou no esgotamento da lavra e o conseqüente
desmoronamento da economia e decadência das 28 cidades da região. Proclamada a
República, a região foi palco de disputa dos coronéis que intensificaram as guerras para
ampliação de seus latifundios e de poder político. Horácio de Matos foi um dos coronéis
mais temido da região.
Atualmente, o contexto social da região ainda apresenta elementos do
coronelismo, como a baixa renda per capita e o altíssimo grau de riqueza concentrada
nas mãos de poucas famílias.
O município de Itaberaba sofreu influência desse processo histórico da Chapada
Diamantina, e hoje, busca sustentar a sua economia a partir, sobretudo da fruticultura.
Limita-se com as cidades de Rui Barbosa, Iaçu, Ipirá e Boa Vista do Tupim, e de acordo
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com a estimativa do Censo 2010, Itaberaba possui uma população total de 61.623
habitantes em uma área de unidade territorial de 2.357 km². Seu índice de
desenvolvimento humano é igual a 0.638, ocupando no ranking baiano a 147º posição.
É uma cidade de médio porte, considerada como central para as cidades do seu entorno,
atendendo as demandas também dos municípios que fazem parte da Chapada
Diamantina. Possui diversas indústrias e abarca mais de mil estabelecimentos
comerciais. A agricultura destaca-se como atividade econômica de grande importância,
sobretudo pela cultura do abacaxi. O município é considerado um dos bolsões de
sucesso para a fruticultura baiana. Possui neste setor experiência de exportação para a
Europa, sendo área principalmente de culturas irrigadas2.
No campo da educação, Itaberaba possui seis escolas estaduais de Ensino
Fundamental e Médio, sendo que uma delas oferece cursos técnicos. No âmbito
municipal, existem duas escolas públicas de Educação Infantil e Séries Iniciais, quatros
creches e mais vinte e nove escolas também de Ensino Fundamental, localizadas em
áreas urbanas do município e seis em áreas rurais, além das escolas ligadas à rede
privada de ensino.
O alto número de escolas públicas e privadas, municipais ou estaduais, aponta
que parte significativa dos professores que nelas atuam nos Anos Iniciais e
Coordenação Pedagógica, têm formação em Pedagogia, o que evidencia a contribuição
que o DEDC XIII, através do seu Curso de Pedagogia, vem dando no desenvolvimento
sócio-econômico do território.
Associado a este aspecto, está o índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB) que, embora inferior à média brasileira é um pouco superior à média do Estado,
o que impõe à Universidade, uma responsabilidade ainda maior frente a necessidade de
ofertar cursos de formação de professores, com qualidade, que representem um
diferencial no processo de qualificação da educação do município, contribuindo para a
reversão do seu quadro de baixo desenvolvimento educacional.
2 Informações retiradas do Projeto de Reconhecimento de Curso de Pedagogia, construído pelo seu
Colegiado de Curso em 2012.
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O DEDC XIII surge então, com o compromisso social de responder a esta
demanda, não só do município de Itaberaba, mas também daqueles que integram o
território de identidade onde ele se localiza.
Ainda de acordo com o Projeto de Reconhecimento de Curso, criado em 1989,
através da Lei 5.563, com a denominação de Faculdade de Formação de Professores de
Itaberaba, este Departamento teve a sua denominação e natureza jurídica alteradas em
1990, passando a denominar-se Centro de Ensino Superior de Itaberaba - CESI, como
uma das Unidades de Ensino da UNEB, aplicando-se-lhe o disposto nos artigos 4º e 11º
da Lei Delegada nº 66, de 01 de junho de 1963.
Com a reestruturação das universidades estaduais, decorrente da lei nº 7.176 de
10 de setembro de 1997 e ainda em consonância com o Decreto nº 7.223/1998, o Centro
de Ensino Superior de Itaberaba passou a ser denominado de Departamento de
Educação – Campus XIII da UNEB.
Inicialmente, ainda como Centro de Ensino Superior, foi ali oferecido o curso de
Pedagogia, com habilitação em Magistério para as Classes de Alfabetização e
Magistério das Matérias Pedagógicas do 2º Grau, por autorização do CONSEPE,
através da Resolução nº 20/1990 e reconhecido pelo Dec. Est. no 7.407/98, publicado no
Diário Oficial de 14.08.98. Esta última habilitação teve seu oferecimento suspenso,
através da Resolução nº 216/98 do CONSEPE, sendo substituída pela habilitação em
Educação Infantil e Magistério do Ensino Fundamental nas Séries Iniciais, criada pela
Resolução 217/98 do CONSEPE.
Doze anos depois desta implantação, foram também criados os cursos de Letras
– Língua Portuguesa e Literaturas, reconhecido através do Dec. Est. nº 12.951/2011 e
História, que se encontra em processo de reconhecimento, sendo implantados nos anos
de 2003.2 e 2005.2, respectivamente. Além disso, em 2004, o Curso de Pedagogia com
habilitação em Educação Infantil e Magistério do Ensino Fundamental nas Séries
Iniciais passou a denominar-se Pedagogia: Docência e Gestão dos Processos
Educativos, autorizado pelo CONSU através da Resolução nº 273/2004. Esta alteração
foi decorrente de um processo de redimensionamento curricular, com a finalidade de
melhor adequação do Curso às diretrizes curriculares nacionais do CNE.
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A consolidação desses cursos tem se dado, não só pelo preenchimento das vagas
disponibilizadas anualmente nos processos seletivos, mas também, pelas ações de
pesquisa e extensão por eles desenvolvidas, atendendo, por exemplo, um total de 653
alunos matriculadosno ano de 2012.
No campo da pós-graduação, o Departamento já ofereceu cursos na modalidade
lato sensu, sendo: Especialização em Política do Planejamento Pedagógico: Currículo,
Didática e Avaliação (2001 - 2007) e Especialização em Filosofia, Estudos Culturais e
Pesquisa em Educação (2000 - 2002).
O acolhimento à demanda por formação e qualificação de profissionais, aliada à
importância das ações que vem sendo desenvolvidas pelo Departamento em mais
significativa em Itaberaba, sobretudo, pelo atendimento aos alunos oriundos de vários
municípios, influenciando diretamente na realidade sócio-econômica e cultural da
região.
As atividades do DEDC XIII são desenvolvidas em dois prédios localizados à
Avenida Luís Viana Filho, s/nº, Bairro Batalhão, com uma área construída de 1.737, 40
m² e uma área não-construída de 1.525 m². No Prédio 1 estão localizados os setores
administrativos e pedagógicos, salas de aula, banheiros, auditório, biblioteca,
laboratório de informática e o Núcleo de Pesquisa e Extensão (NUPE).
Também tem sido parâmetro para a auto avaliação do DEDC, os resultados do
ENADE obtidos pelos alunos dos vários cursos de graduação do Campus. Nos anos de
2005 e 2008 o curso de Pedagogia participou da avaliação onde obteve o conceito 3 nos
dois períodos.
Após a apresentação dos dados acima, resta-nos questionarmos como o Curso de
Pedagogia tem apresentado/discutido as desigualdades de gênero, entendida neste
trabalho como fonte de reprodução de um quadro maior de desigualdades sociais. Quais
são as representações de gênero que orientam o trabalho dos futuros profissionais que
frequentam este curso? Como se sentem diante do currículo percorrido em termos de
preparação para tratar as questões que envolvem o gênero em sala de aula?
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Representações Sociais e Gênero
A Teoria das Representações Sociais (TRS) nesse caso surge como uma
ferrramenta muito importante, sobretudo porque concebe o conhecimento de uma
maneira nova, abordando –o de um prisma mais integrativo considerando, por exemplo,
os aspectos afetivos e sociais na sua produção.
Para Ornellas(2007) a representação social é um conhecimento do senso comum
e é formada em razão do cotidiano do sujeito, daí a importância de se debruçar sobre
aquelas representações que orientam as ações dos professores frente aos conflitos de
gênero. Daí também nasce o valor em questionarmos como os discursos científicos nos
componentes curriculares tem influenciado aquelas ações.
Ainda para a autora acima citada os estudos desenvolvidos nos últimos trintas
anos que utilizam as representações sociais reportam-se ao conceito cunhado por
Moscovici (1978) tomando como ponto de partida a sua obra La psychanalyse, son
image et son public.
Nas palavras do próprio Moscovici encontramos:
Por representações sociais, entendemos um conjunto de conceitos,
proposições e explicações na vida cotidiana no curso de comunicações
interpessoais. Elas são o equivalente, em nossa sociedade, aos mitos e
sistemas de crenças das sociedades tradicionais; podem também ser
vistas como a versão contemporânea do senso comum (ORNELLAS
apud MOSCOVICI, 2007, 168).
O conceito carrega muitas influencias, destacando como principais a psicologia e
a sociologia. Moscovici defende que o conceito é híbrido, não pertencendo a uma unica
área do conhecimento, porque a sua origem está vinculada tanto à sociologia quanto à
psicologia, o que torna a representação social como um conceito psicossocial. Um outro
fator que traduz a complexidade do conceito reside no fato de que os conceitos das
representações referem-se a fenômenos e não a objetos como costumeiramente acontece
em outras áreas.
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Pode-se dizer que a representação social, ao estudar o sujeito em
processo de interação com outros sujeitos, expressa uma espécie de saber
prático de como os sujeitos sentem, assimilam, aprendem e interpretam o
mundo, inseridos no seu cotidiano, sendo, portanto, produzidos
coletivamente na prática da sociedade e no decorrer da comunicação
entre os sujeitos (ORNELLAS, 2007, 169).
Ao citar Jodelet (2001), Maria de Lourdes Ornellas traz a ideia de que as
representações sociais devem ser estudadas articulando elementos afetivos, mentais e
sociais e integrando, ao lado da comunicação e da linguagem, as relações sociais que
afetam as representações e a realidade material, social e ideal sobre as quais elas
intervirão.
No processo de identificação da natureza complexa das representações sociais
cabe estabelecer um intercâmbio entre intersubjetividades e o coletivo, entendendo que
este saber nasce de uma relação infinita entre processos cognitivos, emocionais, sociais.
Entender como os graduandos percorrem esses processos é o foco principal deste
trabalho, como já foi assinalado.
Para tanto, lançamos mão de alguns conceitos produzidos dentro da teoria das
representações sociais, a saber: objetivação e ancoragem.
Os processos de objetivação e ancoragem estão intrinsecamente ligados,
complementando um ao outro, e são modelado através da relação entre os fatores sociais
e a atividade cognitiva dos sujeitos.
Por meio da objetivação o que é abstrato se torna concreto. Esse processo
envolve três etapas. Na primeira, chamada de construção seletiva, as informações e as
crenças acerca do objeto da representação sofrem um processo de seleção, de onde são
retirados os elementos que formam os fatos do senso comum. Ele ocorre de acordo com
as normas e valores grupais. Na segunda etapa temos a esquematização estruturante ou
núcleo figurativo que corresponde à organização dos elementos constituintes das
representações em um padrão de relações estruturadas. A terceira e última é a
naturalização, a qual confere realidade plena ao que era uma abstração, em que os
conceitos se constituem em entidades autônomas, adquirindo materialidade. Agora os
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conceitos tornam-se equivalentes à realidade e o abstrato torna-se concreto através da
sua expressão em imagens ou metáforas.
Já a ancoragem lida com a fase simbólica da representação, em que é trazido
para categorias e imagens conhecidas o que ainda não está classificado e rotulado, isto
é, transformar o que é estranho em algo familiar, ancorar o desconhecido em
representações já existentes. Assim, o novo objeto da representaçõ ganha sentido, o que
é novidade passa a ser parte integrante e se radica nos sistema de pensamento ou em
outras representações, num processo incessante de reconstruções.
Diante o exposto assume-se que a teoria das representações sociais pode
viabilizar a compreensão, transformação e reflexões do sistema de representações
existentes na sociedade, sobretudo frente aos que interferem nas relações e práticas
pedagógicas. Por essas razões tomamos tal teoria na produção do nosso estudo.
Ângela Arruda (2002) ao tratar das das realções entre a TRS e as teorias
feministas aborda inicialmente o constxto no qual surgem tais teorias: transição
padigmática ou crise de paradigma. Ela apresenta afinidades entre a teoria das
representações sociais e as teorias feministas, descrevendo-as em três grandes
dimensões: a dos campos de saber, a conceitual-metodológica e a epistemológica. A
seguir apresentamos um trecho longo mas que representa sobremaneira as relações entre
aquelas teorias.
A dimensão do desenvolvimento dos campos de saber refere-se a
propostas que se integrarão em campos de saber seguindo certas
características e o desenvolvimento que delas advém:
• O fato de que essas teorias não surgem desligadas das realidades
concretas, mas em estreita sintonia com elas, a exemplo do conceito de
gênero, nascido nas entranhas do movimento feminista.
• Não se instalam com tranqüilidade nem em harmonia nas áreas em que
se inserem, mas em conflito com elas, estabelecendo um certo dissenso
nessas áreas. Explicitam, assim, uma vez mais, o quanto os campos de
saber são também campos de disputa, como observou Bourdieu (1983) e
o quanto as propostas dissidentes concorrem para a renovação desses
campos, capitaneadas por minorias ativas (Moscovici, 1979).
• São favorecidas pela transição paradigmática, que abre brechas para
suas incursões, nem sempre aceitáveis para os padrões de ciência da
época e as normas dos campos científicos que penetram.
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• Vivem um período de latência entre o surgimento das idéias inaugurais
e o desenvolvimento da sua aplicação, e o advento da conseqüente
visibilidade. No caso do gênero, o conceito, remodelado pelo pensamento
feminista nos anos 80 (Scott, 1988; Rubin, 1979), como o de
representação social por Moscovici, vive um lapso de tempo até ser
incorporado às ciências sociais.
Quanto à dimensão conceitual de tais teorias, vê-se que elas apresentam
características comuns no que se refere aos objetos a que se aplicam e aos
métodos mais adequados à sua abordagem:
• destinam-se a revelar e/ou conceituar aspectos de objetos até então
subvalorizados pela ciência, considerados como menores (a mulher, o
senso comum);
• tomam seus temas/objetos ao mesmo tempo como processo e produto, o
que exige abordagens mais dinâmicas e flexíveis;
• em conseqüência . e considerando que o método decorre das caracter
ísticas do objeto e da teoria adotada, e busca a reunião desses dois para
Cadernos de Pesquisa, n. 117, novembro/ 2002 gerar o conhecimento .
trabalham com tais objetos/temas de formas não obrigatoriamente
canônicas, ousando metodologias criativas, nem sempre específicas
daquela área disciplinar, e nem sempre consideradas legitimamente
científicas na área.
A dimensão epistemológica abraça perspectivas do conhecer divergentes
daquelas que informavam o paradigma ainda dominante. Nesse sentido,
as teorias feministas e a TRS
• tecem uma crítica ao binarismo que antepõe natureza e cultura, razão e
emoção, objetivo e subjetivo, pensamento e ação, ciência e senso
comum.
Dessa forma, afirmam a importância das dimensões subjetiva, afetiva,
cultural na construção do saber e nas ações humanas, e a importância de
considerá-las na construção do conhecimento e no fazer científico;
• propõem teorias relacionais, em que não se pode conhecer sem
estabelecer relação entre o tema/objeto e o seu contexto. Gênero é uma
categoria relacional, na qual, ao se levar em conta os gêneros em
presença, também se consideram as relações de poder, a importância da
experiência, da subjetividade, do saber concreto. Da mesma maneira, a
TRS não separa o sujeito social e o seu saber concreto do seu contexto,
assim como a construção desse saber não pode se desvincular da
subjetividade (ARRUDA, 2002,132-133).
Percebe-se, então, que essas teorias nascem na chamada crise de paradigma e
clamam por um saber prático, vívido, que rompam, inclusive, com as velhas estruturas
hierárquicas da ciência e das sociedades contemporâneas.
Nesse interim, o conceito de gênero trazido pela teoria feminista e tão
importante na visibilidade do tratamento desigual entre homens e mulheres tem
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contribuído enormemente para as pesquisas educacionais. No entanto verificamos
resistência a uma abordagem que leve em consideração ao que já foi produzido quando,
por exemplo, não se chega às escolas o material que ficou conhecido nacionalmente
como Kit Gay.
Algumas primeiras impressões
Com a finalidade de compreender as representações de gênero dos graduandos
em Pedagogia, selecionamos alunos e alunas do 7º semestre, fase final do curso em que
o estudante realiza seu último estágio. Como o desejo era analisar as contribuições do
curso nas discussões de gênero então teríamos que selecionar os informantes da
pesquisa que estivessem na fase final do curso.
Foram realizadas entrevistas semi estruturadas no ano de 2012, com 10
estudantes. Além da entrevista, foi utilizado também um questionário a fim de
relacionar algumas informações como religião, sexo, idade, questões profissionais.
Nas entrevistas buscou-se priorizar a definição de gênero, a preparação para
tratar das questões em sala de aula que pudessem envolver conflitos de gênero, análise
do currículo oferecido pelo curso, trazendo as memórias em que o gênero fosse o foco.
Ao analisar o Projeto de Curso percebe-se a ausência de um componente que
tenha em sua ementa gênero e/ou sexualidade como foco de construção do
conhecimento. Ressalvado o caso de oferecer como componente curricular optativo
quando se tem na instituição algum professor ou professora que por sua formação tenha
interesse pelo tema.
Ao reconhecer que os processos educativos estiveram e estão preocupados em
vigiar, controlar, modelar, corrigir, construir corpos de meninos e meninas, jovens,
homens e mulheres, nota-se um silenciamento que aprova o modelo de disciplinamento
que encontramos.
Nas representações construídas sobre o gênero observa-se um distanciamento
dos fundamentos biologizantes. Contudo, a representação aparece ancorada às vezes na
religião, dando o tom de verdade absoluta. Não tomam o gênero como uma ferramenta
conceitual, política e pedagogia quando querem trazer projetos que analisem
criticamente a sociedade vigente.
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As representações atuais segundo alunos e alunas foram modificadas pela
iniciativa de uma professora que ao tratar da Antropologia pôs em discussão na turma
questões relacionadas ao gênero. Ainda assim, não evidenciam nas suas falas a relação
de gênero a um corpo sexuado. Aliás o gênero se faz num corpo.
Nota-se um pudor e resistência nas respostas dadas ao questionar se aqueles
estudantes se sentiam preparados para tratar das questões de gênero em sala de aula. Ao
que revela leituras não seriam suficientes para mudar suas representações. A ciência, a
religião, o senso comum disputariam essas representações. Entretanto, o moral ainda
orienta as ações quando abordamos o gênero.
Este estudo ainda encontra-se em andamento, tendo como próxima pauta novas
entrevistas neste ano, produzindo assim um conhecimento mais aprofundado daquelas
representações sociais.
Considerações finais
Ainda há muito o que fazer no que se refere à inclusão das contribuições do
feminismo e sobretudo das discussões de gênero nas nossas escolas. A formação
integral do sujeito como propagam as propostas atuais de educação não atingem seus
anseios. Os direitos humanos não são assegurados ao mínimo.
Nesse contexto de desigualdes e negligências, já que muitos alunos e alunas
sofrem dentro das instituições escolares violência de gênero, nós professores devemos
assumir uma nova postura. Nossa formação, desde a inicial não pode ser omissa quanto
a estes aspectos.
A esperança num mundo melhor pode nos guiar. Maior contigente de pesquisa,
de grupos de pesquisa, maior número de eventos pode gerar maiores resultados,
traduzidos em políticas públicas que possam assegur a integridade do ser humano, assim
como seu crescimento potencial.
O material deste estudo evidencia a necessidade de um componente curricular
que trate das questões de gênero, promovendo dessa maneira uma reformulação
curricular.
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Este estudo representa, por fim, mais uma tentativa entre tantas outras de
construirmos uma nova formação para os profissionais de educação levando em
consideração que a instituição escolar deve estar voltada à emancipação do sujeito.
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