Homossexualidade e Paiderastia Em Thomas Mann
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7/24/2019 Homossexualidade e Paiderastia Em Thomas Mann
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Homossexualidade e Paiderastia em Thomas Mann
Daniel BarboUniversidade Federal de Alagoas
RESUMOA inteno deste artigo , por um lado, analisar como o escritor alemo Thomas Mannconceituou o termo amor proibido ou homoerotismo em uma carta escrita a um amigoem !"#$ e, por outro, %a&er um levantamento ou leitura dos elementos da cultura grega,especialmente do homoerotismo ateniense, 'ue do os %undamentos gerais da obraMorte em (ene&a, publicada em !"!#) *ste empreendimento remete a uma tenso ou
polival+ncia entre identidades erticas diversas no continuumentre a vida e a obra doautor alemo, das categorias do homoerotismo -paiderastia e homosse.ualidade/ 0heterosse.ualidade)
PALAVRAS-CHAVE1istria, 2iteratura, 3ultura 4rega)
ABSTRACTThe intent o% this article is, %irst, to anal5&e ho6 the 4erman 6riter Thomas Mann
conceptuali&ed the term 7forbidden7 loveor homoeroticism in a letter 6ritten to a %riendin !"#$ and, secondl5, to surve5 the elements o% 4ree8 culture, especiall5 the Athenianhomoeroticism, that give the general bac8ground o% the 6or8 Death in (enice,
published in !"!#) This enterprise re%ers to a tension or versatilit5 bet6een variouserotic identities in the continuumbet6een li%e and 6or8 o% the 4erman author, %rom thecategories o% homoeroticism -paiderastia and homose.ualit5/ to heterose.ualit5)
KE!OR"S1istor5, 2iterature, 4ree8 3ulture)
#ntrodu$%o
Uma sucesso de literatos do sculo 9:9 e in;cio do sculo 99 < per;odo em
'ue, segundo os estudos sobre o homoerotismo do psicanalista =urand5r Freire 3osta, se
%irmou no imagin>rio social a noo de uma personalidade ou per%il psicolgico
comum a todos os homosse.uais -3?@TA, !""#!#/, entre os 'uais podemos citarv>rios autores 'ue compuseram redes liter>rias respons>veis pela veiculao de
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mltiplas representaCes homoerticas < contribuiu, com suas obras, para a produo
histrica dessa nova %igura da Modernidade, participando da construo, atravs de suas
representaCes liter>rias do homoerotismo, desse per%il ou ess+ncia do homosse.ual)
este per;odo, %ormaramEse pelo menos tr+s redes liter>rias %undamentais uma
%rancesa -1onor de Bal&ac!, 3harles Baudelaire, 4ustave Flaubert, Marcel roust,
Andr 4ide, Arthur Gimbaud, aul (erlaine/, uma britHnica -4rupo Uranista Iilliam
=ohnson 3or5, 2ord Al%red Douglas, Montague @ummers, =ohn Francis Blo.am, 3harles
Jains =ac8son, =ohn 4ambril icholson, Gev) *) *) Brad%ord, =ohn Addington
@5monds, *dmund =ohn, =ohn Mora5 @tuartEKoung, 3harles *d6ard @a5le, Fabian @)
Ioodle5, *d6ard 3arpenter, ?scar Iilde, *d6ard Morgan Forster, Gichard Ac8erle5/ e
uma alem -4oethe, =ohn 1enr5 Mac8a5, *lisar von Jup%%er, Adol% Brand, Thomas
Mann/) * para tal, estes literatos retomam, em alguma medida, o mundo grego antigo)
As representaCes homoerticas e.pressas nestas diversas obras liter>rias ao longo de
mais de um sculo so respostas ao problema do amor entre homens colocado pela
sociedade moderna, o 'ue lhes con%ere uma consider>vel carga pol;tica, posto 'ue, em
boa medida, %a&em um uso pol;tico do classicismo como uma espcie de arma no
territrio ertico da modernidade) :nvariavelmente, todos os escritores mencionados t+m
como modelo ou %onte de inspirao, em proporCes diversas, o homoerotismo cl>ssico)
este te.to, proponho %a&er algumas observaCes sobre a conceituao de
homoerotismo e.posta pelo escritor alemo Thomas Mann) A respeito dos dados
biogr>%icos do autor, remeto 0 importante obra de Anthon5 1eilbut, *ros e literatura)
2imitoEme a alguns dados apenas, importantes para o 'ue proponho analisar)
ascido em 2Lbec8 em !NO, Mann tornouEse um grande romancista,
novelista, cr;tico social e ensa;sta) *m !", %ora um dos signat>rios da petio contra o
ar>gra%o !NO 'ue penali&ava as relaCes homosse.uais na Alemanha, petio proposta
pelo Iissenscha%lichE1umanitPres Jomitee -3omit+ 3ient;%icoE1umanit>rio/, sediadoem Berlim, tendo Magnus 1irsch%eld como um de seus dirigentes) * seu trabalho,
segundo 3olm Tib;n,
dos Buddenbroo8s, publicado em !"$$, at Feli. Jrull, publicado em !"OQ, est>
mergulhado no homoerotismo) ? destino de muitos de seus heris < 1anno
Buddenbroo8s, Tonio JrRger, Aschenbach, 1ans 3astorp, Adrian 2ever8uhn, Feli.
!ara uma breve an>lise das obras Le Pre Goriot -!SQ!SO/ de 1onor de Bal&ac e The Picture ofDorian Gray -!"$/ de ?scar Iilde, ver BAGB?, #$!$)
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Jrull < %oram moldados por suas homosse.ualidades in'uietas e amb;guas) -T:BV,
!""WSEW/
*m !"$O, casouEse com J>tia ringsheim, de cuXa unio nasceram os %ilhos
*ri8a, Jlaus, 4olo -Yngelus 4ott%ried Thomas/, Moni8a, *lisabeth e Michael) Temas
como incesto, homoerotismo, geronto%ilia e suic;dio marcaram a histria da %am;lia)
*m !"#", em reconhecimento de suas obras Buddenbroo8s -!"$!/ e A
montanha m>gica -!"#Q/, bem como de suas numerosas estrias curtas, recebeu o
r+mio obel de 2iteratura)
A &is%o de Thomas Mann so're o homoerotismo( Carta a Carl Maria !e'er )*+,.
ara uma narrativa da vida de Thomas Mann, nas prprias palavras do autor,
devemos nos debruar sobre suas cartas) *las %ornecem os mais ;ntimos vislumbres de
sua vida, de sua mente e de seu o%;cio) @ua %ilha *ri8a estima 'ue ele tenha escrito mais
de #$ mil) -I:@T?, !""$ .iii, .iv/
*m oQ de Xulho de !"#$, o autor escreveu uma carta ao poeta alemo 3arl
Maria Ieber para agradecer as cr;ticas 'ue o poeta havia %eito 0 obra Morte em (ene&a)? contedo da carta esclarece alguns elementos importantes a respeito das relaCes
entre a obra, a vida do autor e seu mundo intelectual) -I:@T?, !""$ "SE"N/
Mann revela a Ieber 'ue o 'ue ele almeXava 'uando se dedicou a escrever
Morte em (ene&a nada tinha a ver com homoerotismo) ? tema original de seu conto,
escreveu Mann, era a Zpai.o como con%uso e como um despirEse de dignidade[
-I:@T?, !""$ "Q/, uma tentativa de descrever o 'ue ele sentiu ao ler a histria de
um 4oethe idoso absolutamente determinado a se casar com uma garota muito Xovem, a
'ual no lhe 'ueria, apesar de toda a vergonha em 'ue isso implicava para a poca)
1istria contada em versos no %amoso poema *legia a Marienbad) *ntretanto, a ideia
original modi%icouEse radicalmente no desenrolar da escrita) Mann acrescenta 'ue
o 'ue %oi adicionado ao am>lgama na poca %oi uma e.peri+ncia de viagem l;rica epessoal, a 'ual me obrigou a transportar as coisas para um e.tremo ao introdu&ir omotivo do amor proibido))) -I:@T?, !""$"O/
S
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@egundo Gitchie Gobertson, entre #W de maio e $# de Xunho de !"!!, o ano
anterior ao da publicao de Morte em (ene&a, Thomas Mann, sua esposa e seu irmo
haviam %eito uma viagem a (ene&a) *sta teria sido a e.peri+ncia l;rica e pessoal
mencionada por Mann na carta de !"#$) *.atamente como o personagem Aschenbach,
Mann vivenciara a %ascinao por um belo garoto polon+s 'ue brincava na praia)
-G?B*GT@?, #$$Q"O/) *is o mote da obra o tema e.tremo do homoerotismo, o seu
prprio amor Zproibido[)
ara e.pressar este sentimento, este deseXo, esta %ace de sua e.ist+ncia, Mann
recorreu 0 tradio do 3lassicismo de Ieimar -especialmente @chiller e 4oethe/, uma
das clivagens culturais de seu mundo intelectual) aul Bishop -#$$QSW/ argumentou
'ue o classicismo e.ercera muito maior in%lu+ncia sobre o autor do 'ue o Gomantismo,
a psican>lise, Iagner, @chopenhauer ou iet&sche) Foi a partir de um hori&onte cultural
grego 'ue Mann pode criar uma representao do 'ue ele chamou de amor proibido)
a se'u+ncia da carta, Mann se propCe a no encerr>Ela sem %a&er uma
re%le.o a respeito de sua Ztend+ncia emocional[) *le apresenta uma e.plicao para o
homoerotismo) As bases %undamentais de sua e.plicao so compostas por elementos
da cultura grega)
Mann considera natural o deseXo ertico entre dois homens, colocandoEo em p
de igualdade com o deseXo ertico entre pessoas de se.os opostos) A
contranaturalidade, a nica ra&o pela 'ual poder;amos coloc>Elo abai.o da variedade
mais comum do deseXo ertico, um termo, argumenta o autor, 'ue 4oethe X> h> muito
tempo reXeitou com bons %undamentos) -I:@T?, !""$ "O/ Mann revela 'ue ao
escrever Morte em (ene&a havia lido A%inidades *letivas de 4oethe mais de cinco
ve&es) -I:@T?, !""$ "Q/ * prov>vel 'ue Bishop esteXa correto 'uando a%irma
'ue a estria do ardente deseXo de Aschenbach por Tad&io %oi em parte baseada no amor
tardio de 4oethe pela Xovem Ulri8e von 2evet&o6) -#$$QSW/A lei natural da polaridade -masculino%eminino/, a%irma Mann, no se sustenta
incondicionalmente\ o macho no precisa necessariamente ser atra;do pela %+mea) * a
e.peri+ncia re%uta a ideia de 'ue uma atrao pelo mesmo se.o esteXa necessariamente
relacionada com a Ze%eminao[) or este motivo, no se pode sugerir 'ue homens
como Michelangelo, Frederico, o 4rande, Iinc8elmann, lato, @te%an 4eorge %ossem
ou so e%eminados) -I:@T?, !""$ "O/
esta carta, Mann ainda di& 'ue Znestes casos vemos a lei natural dapolaridade simplesmente %alhando e 'ue se pode observar uma masculinidade to
Q
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pronunciada 'ue mesmo em termos erticos somente o masculino tem importHncia e
interesse)[ -I:@T?, !""$ "O/ *le v+ com naturalidade e com uma boa dose de
instrutiva signi%icHncia, com uma boa dose de alta humanidade, a ternura de uma
masculinidade madura por uma masculinidade am>vel e %r>gil)
Mann con%essa 'ue seu interesse algo dividido entre as duas %ormas b>sicas
de organi&ao social a %am;lia e associaCes de homens) or instinto e convico, est>
inclinado a ter uma %am;lia, a ter %ilhos e a am>Elos) *sta %orma de organi&ao social
ele denomina Zburguesa[) As coisas seriam vistas um tanto di%erentemente, entretanto,
se %]ssemos %alar de erotismo, de aventuras intelectualmente sensuais no burguesas)
-I:@T?, !""$ "W/
Tendo como base os di>rios do autor alemo, 1ermann Jur&8e observou 'ue
Mann descreveu tr+s ocasiCes em 'ue se viu em in'uietaCes homoerticas) Uma delas
envolvia seu prprio %ilho Jlaus, cuXos relatos nos di>rios esto datados em
pro.imidade a $Q de Xulho de !"#$, data da carta a 3arl Maria Ieber) Z*stou %eli& por
ter um belo garoto como %ilho[, escreve em #Q de de&embro de !"!) ZJlaus muito
charmoso[, em #$ de abril de !"!") o dia $O de Xulho de !"#$, o di>rio revela
ZAmando Jlaus durante estes dias[\ Z*issi#, 'ue me encanta bem agora[, em !! de
Xulho\ Z*ncanto por *issi, 'ue em seu banho terrivelmente atraente) Acho bastante
natural 'ue eu esteXa apai.onado pelo meu %ilho) *issi deitado lendo na cama com seu
torso moreno nu, 'ue me desconcertava[, em #O de Xulho\ Z?uvi barulho no 'uarto dos
garotos e *issi surpreso e completamente nu em %rente 0 cama de 4olo agindo
tolamente) Forte impresso de sua prEmasculinidade, corpo relu&ente) :n'uietao[)
-JUG^J*, #$$#SQWEN/
Jur&8e lembra 'ue Thomas Mann, numa palestra pro%erida em Berlin em !"##,
cuXo t;tulo era Von deutscher Republik -Da Gepblica alem/, considerava 'ue a
sociedade estava comeando a ameni&ar a maldio de desonra e calnia 'ue pesavasobre o %en]meno -do homoerotismo/, a consider>Elo com mais calma e a %alar de suas
ambiguidades de um modo mais humano) Jur&8e a%irma 'ue, de %ato, entre os anos de
!"#$ e !"S$, houve consideravelmente mais declaraCes pblicas sobre este tema por
parte de Thomas Mann do 'ue em 'ual'uer outro per;odo de sua vida) -JUG^J*,
#$$#SQS/
*sta percepo e descrio da masculinidade esto muito pr.imas do modelo
grego de masculinidade) As suas caracter;sticas so muito similares, por e.emplo, 0s da#*issi era o apelido de Jlaus Mann)
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relao erastsermenos na Atenas 3l>ssica -paiderastia/) * esta percepo est>
claramente mani%esta em Morte em (ene&a)
1oXe, a cr;tica e os mtodos da antropologia e da histria no dei.am dvidas
acerca da demonstrao de 'ue no havia homossexualidade na Grcia
Antiga. Desde pelo menos a dcada de 1970, a nova histria da
ertica grega e sua aordagem construcionista e identit!ria "! vem
superando a ine#ca$ e e%uivocada aordagem essencialista. A &orma
de rela'o homoertica melhor documentada entre os gregos era a
estaelecida pelo v(nculo entre um adulto masculino )erasts* e um
"ovem )ermenos* pertencentes + classe dos cidados das
aristocracias de virtualmente todas as pleis. s gregos chamavam
esta rela'o de paiderastia, %ue possu(a dois aspectos inter-
relacionados o pedaggico e o ertico. corte"o de um "ovem por
parte de um cidado era socialmente aceito, em visto e esperado
nos c(rculos aristocr!ticos.
/sto se explica por%ue a cultura grega, di&erentemente da
cultura ocidental moderna, no conceia no'es de orienta'o sexual
)heterossexual, homossexual, issexual* como identi#cadores sociais.
s gregos no distinguiam comportamentos ou dese"os erticos em
&un'o do gnero dos participantes da rela'o, mas em &un'o do
papel %ue cada um desempenhava no ato ertico %uem penetrava e
%uem era penetrado.
ato ertico era polari$ador e hier!r%uico no mundo grego.
2le dividia, classi#cava e distriu(a os parceiros em duas categorias
distintas e radicalmente opostas, o papel ativo e o passivo. 2stas
categorias eram social e politicamente articuladas, expressando as
rela'es de poder. /sto implicava em %ue cidados masculinos
adultos, os %uais exerciam papel pol(tico ativo, podiam ter rela'es
erticas leg(timas, exercendo origatoriamente o papel ertico ativo,
com pessoas de status sociopol(tico in&erior, ou se"a, mulheres,
garotos, estrangeiros ou escravos, os %uais no possu(am
participa'o pol(tica direta. 2staelecia-se, assim, uma isomor#a
entre o papel ertico de um indiv(duo e seu status sociopol(tico. A
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autoridade e o prest(gio do cidado masculino adulto expressam-se
em sua precedncia sexual 3 em seu poder de iniciar um ato sexual e
em seu direito de oter pra$er por meio desse ato.
4ela &un'o pedaggica e pela condi'o de amos na rela'o
decorre %ue o costume grego encora"ava o cidado a 5ca'ar6 seu
ermenos e exigia %ue o "ovem no cedesse &acilmente a essas
investidas. A prpria comunidade examinava seus comportamentos,
mostrando %uem deveria ser louvado ou evitado. costume
considerava uma desgra'a a capitula'o muito r!pida por parte do
"ovem, pois era necess!rio certo intervalo de tempo moralmente
estaelecido. onsiderava tamm uma desgra'a se a rendi'o do
"ovem &osse por medo de resistir a maltrato, por dinheiro ou por
interesse material. "ovem deveria mostrar-se devidamente
desdenhoso de tais ene&(cios, so pena de ser taxado de prostituto.
2sta &ama, no caso de cidades como Atenas, poderia lhe render no
&uturo um processo %ue lhe retiraria os direitos da cidadania.
Dadas as caracter(sticas deste modelo de homoerotismo
expresso pela paiderastia, devemos conse%uentemente demarc!-lo
em rela'o + categoria da homossexualidade, entendida por 8ichel
oucault ):istria da sexualidade a vontade de saer. Graal, 19;;*
como uma identidade constru(da na modernidade oitocentista.
2lementos como a distin'o et!ria, a &un'o pedaggica, a &ronteira
origatria entre atividade e passividade erticas, a isomor#a entre
ertica e pol(tica, o #m do relacionamento estaelecido pela entrada
do "ovem na maturidade e a possiilidade da simultaneidade entre o
casamento e o relacionamento homoertico para o erasts
distinguem claramente as identidades do erastse do ermenosda
identidade do homossexual.
A &orma como a homossexualidade se expressa, especialmente
a partir da dcada de 19
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atividade e passividade erticas, no condiciona a ertica + pol(tica,
no prev um #m para o relacionamento )no uma etapa da vida,
a vida toda* nem simultaneidade entre relacionamento homoertico e
heteroertico. Alm do mais, vista por muitos como um tipo de
erotismo imaturo ou maculado, portanto, no dese"ado e maldito.
Di&erentemente da paiderastia em rela'o a seu tempo histrico, a
homossexualidade ainda no reconhecida como &a$endo parte da
civili$a'o ocidental moderna. =rato, portanto, a paiderastia e a
homossexualidade como identidades. /dentidades so socialmente
constru(das e no essncias dadas pela nature$a. >estes termos e
neste campo de an!lise, a ?nica naturalidade ou essncia de %ue
podemos &alar da u(%ua atra'o tanto entre pessoas de sexo
di&erente %uanto entre pessoas do mesmo sexo. 2sta condi'o
humana, no entanto, est! longe de esgotar as vastas possiilidades
de constru'o de identidades erticas na histria. /sto signi#ca %ue a
identidade de uma pessoa %ue se sente eroticamente atra(da por
outra do mesmo sexo )ou do sexo oposto* depender! da sociedade a
%ual ela pertence. 2sta realidade antropolgica e histrica ignorada
pela aordagem essencialista.
2m termos psicanal(ticos e identit!rios, homoerotismo uma
su"etividade poss(vel do ser humano, uma potencialidade humana.
Ge%iroEme a um sentido espec;%ico da ideia de homoerotismo) A respeito desse termo,
compartilho da clivagem psicanal;tica proposta por =urand5r Freire 3osta em seus
estudos sobre essa categoria) *sse autor chama a ateno para a es%era aut]noma
institu;da pela construo das categorias da se.ualidade no sculo 9:9) ? psicanalista
di&
Teoricamente, como procuro mostrar, homoerotismo pre%er;vel aZhomosse.ualidade[ ou Zheterosse.ualidade[ por'ue tais palavras remetem 'uem asemprega ao vocabul>rio do sculo 9:9, 'ue deu origem 0 ideia do Zhomosse.ual[):sto signi%ica, em breves palavras, 'ue toda ve& 'ue as empregamos, continuamospensando, %alando e agindo emocionalmente inspirados na crena de 'ue e.istem umase.ualidade e um tipo humanos Zhomosse.uais[, independentemente do h>bitolingu;stico 'ue os criou) *ticamente, sugiro 'ue persistir utili&ando tais noCessigni%ica manter costumes morais prisioneiros do sistema de nominao
preconceituoso 'ue 'uali%ica certos suXeitos como moralmente in%eriores pelo %ato deapresentarem inclinaCes erticas por outros do mesmo se.o biolgico) ?ra, com base
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em outras convicCes, sustento 'ue no temos nem motivos ticos nem tericoEcient;%icos consistentes para de%ender a legitimidade dessas opiniCes) esse tpico,advirto, alm do mais, 'ue a carga de preconceito contida no uso de palavras comoZhomosse.ualidade[ ou Zhomosse.ual[ aut]noma em relao 0 inteno moral de'uem as emprega) -3?@TA, !""# !!/
A paiderastia e a homossexualidade so, segundo 3osta, Zduas %ormas de
cristali&ao do imagin>riocultural sore a potencialidade homoertica, e
no dois nomes para o mesmo re&erente.@ )199tico Zvon[ ao seu nome) 1omem dedicado 0 arte, bastante asctico e
disciplinado) Ainda Xovem, tornouEse vivo) Decide viaXar para (ene&a, para a ilha de
2ido) Durante o Xantar no hotel, ele percebe, numa mesa pr.ima, uma %am;lia polonesa
de e.trao aristocr>tica) *ntre os componentes da %am;lia h> um adolescente vestido
em traXe de marinheiro) Aschenbach, perple.o, constata 'ue o garoto belo) ?uve por
alto seu nome Tad&io)
a encantadora cidade italiana e em seus arrabaldes, Aschenbach, um escritor
consagrado, na casa dos O$ anos, descobre Tad&io, um adolescente, aos seus olhos,
Zbelo como um deus[ -MA, #$$SQS/ 'ue lhe lembrava Zuma escultura grega do
per;odo >ureo[ -MA, #$$SSQ/, Za cabea de *ros, com o re%le.o amarelado do
m>rmore de aros[ -MA, #$$SS/) ?s olhos de Aschenbach viram em Tad&io, alm
da %orma do deus *ros, tambm a de =acinto) ?u pensava 'ue sua %elicidade Zera o
sorriso de arciso debruado sobre o espelho d>gua, a'uele sorriso pro%undo,
en%eitiado, prolongado, com 'ue estende os braos ao re%le.o da prpria bele&a
_)))`)[-MA, #$$SWO/
A pai.o %ulminante) Discreta aos olhos do mundo ao redor, mas
internamente avassaladora) ? romance de Mann e.ala o platonismo em diversas%;mbrias poticas) Tentando tradu&ir a imagem do belo Xovem, Aschenbach divaga
"
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ue disciplina, 'ue preciso de pensamento se e.primiam nesse corpo distendido e naplenitude de sua per%eio Xuvenil Mas a vontade rigorosa e pura 'ue,misteriosamente, conseguira tra&er 0 lu& esta obra de arte divina < ele, o artista, no aconhecia, no lhe era %amiliar o era ela 'ue tambm atuava nele, 'uando, tomadoda mais sbria pai.o, libertava da massa marmrea da linguagem a %orma esguia 'uevisuali&ara em esp;rito e 'ue apresentava 0 humanidade como imagem e espelho dabele&a espiritual :magem e espelho @eus olhos abraaram a nobre %igura l>, 0 beirado a&ul, e num +.tase delirante acreditou captar com esse olhar o Belo em si, a %ormaen'uanto pensamento divino, a per%eio nica e pura 'ue habita o esp;rito e da 'ualse erigira ali uma cpia humana, um s;mbolo leve e gracioso para a adorao) _)))` ?Deus Amor, na verdade, age como os matem>ticos 'ue mostram 0s crianas imagensconcretas das %ormas puras 'ue esto alm de seu alcance\ assim tambm o deus, paranos tornar vis;vel o imaterial, gosta de se utili&ar da %orma e cor de um Xovem humano,'ue ele adorna com todo o re%le.o da bele&a, para %a&er dele um instrumento da
recordao, levandoEnos assim, ao v+Elo, a nos in%lamarmos em dor e esperana)-MA, #$$SON/
Aschenbach < numa praia na ilha de 2ido, a (ene&a 'ue ele tanto amava,
contemplando Tad&io, a materiali&ao diante de seus olhos da idia do belo < entra em
estado de +.tase) ?ndas do deleite homoertico hel+nico invadem seu pensamento e o
arrastam aos muros de Atenas, 0 sombra do pl>tano Zper%umada pelo aroma das %lores
do agnocasto, adornada de est>tuas e oblaCes em honra das nin%as e de A'uel]o)[
-MA, #$$SO/ Mann restitui a Aschenbach -@crates/ o seu Fedro ideali&ado
-Tad&io/
_)))` na relva em suave declive, onde se podia estar deitado mantendo a cabea maisalta, dois homens estavam estendidos, protegidos do calor do dia um velho e umXovem\ um, %eio, o outro, belo\ a sabedoria Xunto 0 graa) * entre amabilidades egraceXos espirituosamente sedutores, @crates instru;a Fedro sobre o deseXo e avirtude) FalavaElhe da c>lida emoo 'ue surpreende o homem sens;vel 'uando seus
olhos se deparam com um s;mbolo da bele&a eterna\ _)))` %alava do temor sagrado 'ueassalta um esp;rito nobre 'uando lhe aparece um corpo divino, um corpo per%eito, decomo ele ento estremece e %ica %ora de si, mal se atrevendo a olhar, venerando a'uele'ue possui a bele&a, disposto mesmo a o%erecerElhe sacri%;cios como a uma est>tuadivina, se no temesse 'ue o tomassem por louco) ois a bele&a, meu caro Fedro, eapenas ela, simultaneamente vis;vel e enlevadora) *la < nota bem < a nica %ormaideal 'ue percebemos por meio dos sentidos e 'ue nossos sentidos podem suportar_)))`)-MA, #$$SO/
o seria e.agero di&er 'ue a e.presso do deseXo homoertico deste romance
de Thomas Mann s %oi poss;vel, s p]de vir 0 lu& e tornarEse um cl>ssico da literatura
!$
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alem, devido a uma tradio secular europia de retomada dos valores da pr>tica
homoertica do classicismo nos limites de c;rculos liter>rios espec;%icos 'ue tentavam
dar va&o, sentido, %orma, e.ist+ncia, 0 persist+ncia -melhor di&er 0 iner+ncia/ desse
deseXo humano) 3omo em muitos outros conhecimentos, para deleite e des%rute de parte
dos modernos, tambm os gregos %oram a %undo no conhecimento da realidade do
Zbelo[, em sua materialidade, em sua idealidade, em seu potencial pedaggico, em sua
potica\ en%im, em sua humanidade)
*scravo do Zbelo[, sabendo e sentindo Z'ue a nature&a estremece de +.tase
'uando o esp;rito se inclina como vassalo diante da bele&a[ -MA, #$$SO"/,
Aschenbach, e, portanto Mann, tinha a sua disposio, num singular espao de
experinciaS, o platonismo
Assim, a bele&a o caminho 'ue condu& ao esp;rito o homem sens;vel < apenas ocaminho, um meio apenas, pe'ueno Fedro))) * ento, a'uele astuto sedutor e.p]s omais sutil, 'ue o amante mais divino 'ue o amado, pois o deus est> presente noprimeiro, mas no no outro _)))`) -MA, #$$SO/
ZMas nesse est>gio da crise, a e.altao de sua v;tima voltavaEse para a
produo)[ -MA, #$$SO"/ * Aschenbach teve deseXo de escrever) A viso do Zbelo[
materiali&ado, estendido na praia sob seu olhar atento, enseXouElhe o parto das id!ias
a verdade, o propsito 'ue almeXava era trabalhar em presena de Tad&io, tomarcomo modelo ao escrever a %igura do rapa&, dei.ar seu estilo seguir as linhas dessecorpo 'ue lhe parecia divino, transportar sua bele&a ao dom;nio espiritual, tal comooutrora a >guia transportava ao ter o pastor troiano) unca mais sentira o doce pra&erda palavra, nunca estivera to consciente da presena de *ros na palavra como duranteas horas perigosamente deliciosas em 'ue, sentado 0 mesa rstica sob o toldo, diantede seu ;dolo, a msica de sua vo& nos ouvidos, modelava segundo a bele&a de Tad&iosua pe'uena dissertao < a'uela p>gina e meia de prosa burilada, cuXa integridade,nobre&a e vibrante tenso de sentimento iriam despertar em breve a admirao demuitos) -MA, #$$SO"/
*cos do Ban'uete plat]nico ressoam na escrita de Mann) Aschenbach seguia
Tad&io por todos os cantos, pela praia, pelo saguo do hotel, em 2ido, pela raa de @o
Marcos, em (ene&a, nas g]ndolas, pelas vielas, becos, canais, pontes, permitindoEse
sem receio e sem enrubescer as maiores e.travagHncias, %eito um erast!sna captura de
seu er"menos,
S3%) Josellec8, Futuro passado)
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_)))` como na'uela ve& em 'ue, ao voltar tarde da noite de (ene&a, detiveraEse dianteda porta do 'uarto de seu ;dolo, no primeiro andar do hotel, e apoiara a %ronte nadobradia da porta, em pleno del;rio, permanecendo assim por longo tempo, sempoder a%astarEse, correndo o risco de ser surpreendido e apanhado numa situao toabsurda) -MA, #$$SN!EN#/_)))` inmeros heris da Antiguidade aceitavam voluntariamente seu Xugo -do deus
#ros/, pois nenhuma humilhao era considerada como tal, 'uando imposta pelo deus,e atos 'ue seriam reprovados como sinal de covardia, e praticados com 'ual'uer outra%inalidade < cair de Xoelhos, %a&er Xuras, pedidos insistentes, comportarEse comoescravo rio, ainda lhe valiamlouvores) -MA, #$$SN#/
?s deuses gregos povoam a (ene&a de Aschenbach) A estrutura de seus
pensamentos possui uma moldura mitolgica) os primeiros sinais da aurora,
Aschenbach desperta, e como 'ue embalado pela lembrana de seu amor por Tad&io,
totalmente imerso no deseXo 'ue lhe provocava a bele&a do Xovem, aguarda o nascer do
sol) o alvorecer
_)))` um sopro, mensagem alada de paragens inacess;veis, vinha anunciar 'ue *os seerguia de Xunto de seu esposo e acontecia a'uele primeiro e delicado enrubescer das%ai.as mais long;n'uas do cu e do mar, com o 'ual a criao principia a se desvelar
aos sentidos) Apro.imavaEse a deusa, raptora de adolescentes, 'ue arrebatara consigo3lito e 3%alo e 'ue, en%rentando a inveXa de todo o olimpo, des%rutava do amor dobelo rion) -MA, #$$SW#/
? dia nasce e Aschenbach se pergunta sobre a origem do sopro suave e
insinuante) esse momento
*rgueuEse um vento mais %orte e os cavalos de os;don dispararam, empinando,acompanhados pelos touros do deus da cabeleira a&ulada, 'ue investiam bramindo,bai.ando os cornos) *ntre os rochedos amontoados na praia mais distante as ondassaltavam como cabras) Um mundo sacramente deturpado, sob o imprio de ,envolvia o escritor sedu&ido, e seu corao sonhava %>bulas delicadas) Muitas ve&es,en'uanto o sol descambava por tr>s de (ene&a, ele se sentava num banco do par'uepara observar Tad&io 'ue, vestido de branco e usando um cinto colorido, se divertiaXogando bola no p>tio coberto de cascalho, e era =acinto 'ue ele acreditava ver e 'uedeveria morrer por ser amado por dois deuses) @im, sentia a dolorosa inveXa de ^%iropelo rival 'ue abandonava o or>culo, o arco e a c;tara, para Xogar o tempo todo com obelo Xovem\ via o disco, guiado por cime cruel) Atingir a cabea graciosa\ recebia,empalidecendo tambm, o corpo vergado, e a %lor do sangue precioso tra&ia a inscrio
de seu in%ind>vel lamento))) -MA, #$$SWS/
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A oposio apol;neodionis;aco, tema emblem>tico na obra de iet&sche e um
motivo popularQ no momento da escrita de Morte em (ene&a, tenciona
irremediavelmente o esp;rito do protagonista) 4ustav von Aschenbach, um homem
reservado e srio, um grande escritor, respeitado, com glrias e louvores em sua
pro%isso, amante das artes, dedicandoEse inteiramente a Apolo, o deus da ra&o e do
intelecto) *m (ene&a, entretanto, certo 'ue o deus *ros atingeEo em cheio,
transtornando sua mente e trans%igurando seu esp;rito, lanandoEo a um ltimo,
delicioso e %atal del;rio) uedou sobre o seu ser, a eterna batalha entre a mente e o
corao
_)))` erguiaEse o turbilho de brilho incandescente, ardor e labaredas %lameXantes, e os
corcis sagrados de Apolo se elevavam acima do orbe terrestre, devorando o espaocom seus cascos impacientes) :luminado pelo esplendor do deus, a sentinela solit>ria-Aschenbach/ ali sentada %echava os olhos, dei.ando 'ue a glria lhe beiXasse asp>lpebras) @entimentos antigos, deliciosos tormentos de um corao Xuvenil, 'ue sehaviam e.tinguido em meio 0 severa labuta de sua vida e 'ue ressurgiam agora toestranhamente trans%igurados < ele os reconhecia com um sorriso embaraado eadmirado) 3ismava, sonhava, seus l>bios lentamente articulavam um nome e, aindasorrindo, o rosto voltado para o cu, as mos enlaadas no colo, adormecia de novoem sua poltrona) -MA, #$$SW#/
Tudo indica 'ue Aschenbach %ora contaminado em meio 0 epidemia de clera
'ue assolava (ene&a) rovavelmente, ligado aos del;rios deste mal e aos del;rios de seu
amor por Tad&io, ele teve, certa noite, um intenso e macabro pesadelo) Um pesadelo
muito ba'uiano em sua descrio, para onde con%lui todo o imagin>rio orgi>tico
dionis;aco a apro.imao de uma con%uso de ru;dos, clangores e estridentes ritos de
Xbilo\ o arrulhar constante e en%eitiador de uma %lauta\ Zo deus estranho[\ uma turba
%uriosa de homens, mulheres e animais\ chamas, tumulto e rodas de dana vertiginosas\
vibraCes de pandeiros acima de cabeas Xogadas para tr>s\ o gemer de vo&es\ o brandirde archotes 'ue semeavam centelhas e punhais nus\ o bater raivoso de t;mbales\
serpentes 'ue e.punham as l;nguas b;%idas em meio aos corpos %emininos, seios
erguidos nas mos\ gritos\ homens peludos com chi%res na testa retinindo c;mbalos de
bron&e\ rapa&es aguilhoando bodes\ vapores oprimindo os sentidos\ uma e.citao para
a dana e o sacoleXar dos membros num louco triun%o mult;ssono incessante\ saias e
Q?s tropos empregando deidades cl>ssicas em cen>rios contemporHneos eram populares no momento em
'ue Thomas Mann escreveu Morte em (ene&a a :nglaterra, por e.emplo, 'uase ao mesmo tempo,*d6ard Morgan Forster estava trabalhando numa coleo de pe'uenas estrias baseada na mesma
premissa)
!S
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tnicas de pele de animais\ o bramir e o urrar na descoberta e soerguimento do
gigantesco s;mbolo obsceno de madeira\ treXeitos lbricos e l>bios escumantes numa
e.citao mtua\ o entrearranhar e o sorver do sangue dos membros em orgia\ o
dilaceramento, massacre e voragem de animais\ o in;cio de um acasalamento sem
limites como sacri%;cio ao deus) -MA, #$$SQEW/
Tudo indica 'ue Dioniso, o deus do del;rio e da pai.o, seguiu Aschenbach at
(ene&a com a inteno de arruin>Elo) @ileno, principal seguidor do deus,
metamor%oseiaEse em di%erentes personagens ruivos 'ue constantemente cru&am o
caminho de Aschenbach no desenrolar de todo o tr>gico enredo)
Alm do %undo comum classicista, 4oethe, iet&sche, Freud e Mahler
integram a poli%oniaOdeMorte em (ene&a) A obrasimboli&a pai.o e degradao,#ros
e Thanatos) Aschenbach hipnoti&ado por Tad&io)$ipnos, o irmo g+meo de Thanatos,
anda de mos dadas com#ros)
Con2lus%o3 homossexualidade e homoerotismo
importante voltarmos nas consideraCes sobre a construo de identidades na
histria\ sobre o conceito de homosse.ualidade e a identidade homosse.ual e sobre o
conceito de paiderastia ou homoerotismo grego) A homosse.ualidade e a aiderastia,
como vimos, remetem a pr>ticas, identidades e temporalidades diversas) Meu
argumento 'ue a personalidade Thomas Mann -tendo em vista %ragmentos de seu
di>rio e de uma de suas cartas/ e sua e.presso %iccional -tendo em vista a obra Morte
em (ene&a/ operaram entre estes dois registros de homoerotismo, criando uma tenso
ou uma ambiguidade entre eles no desenrolar de sua vida pessoal, pol;tica, ativista e
art;stica)@abemos 'ue a prpria personade ?scar Iilde e a resposta pblica aos seus
Xulgamentos %oram centrais para a %i.ao da imagem pblica moderna do homosse.ual
por volta de !"O) -3AGG?2, #$$O#"O/) *m %ins do sculo 9:9, surgia a identidade
do homosse.ual em oposio 0 identidade do heterosse.ual nesta construo 'ue, desde
Michel Foucault, chamamos de se.ualidade)
O3%) o conceito de Zpoli%onia[ em BAJ1T:, !"Q) T*^^A, !"", p) SW, di& 'ue Za obra sobreDostoivs8i, Ba8htin de%inia o romancista como o criador do romance poli%]nico, o te.to em 'uediversas vo&es ideolgicas contraditrias coe.istem com o prprio narrador, em p de igualdade)[
!Q
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A relao pessoal intensa, X> bem analisada por Anthon5 1eilbut, decorrente da
pai.o de Thomas Mann -!NOE!"OO/ por aul *hrenberg -!NWE!"Q"/ entre !"" e
!"$S uma relao homosse.ual) *ntretanto, sua apro.imao em relao ao
3lassicismo de Ieimar inclinouEo %ortemente 0 esttica e e.peri+ncia do homoerotismo
cl>ssico) Mann incorporou esta esttica tanto te.tual 'uanto pessoalmente, socialmente)
este sentido, o mesmo 'ue X> havia sido observado sobre ?scar Iilde
-BAGB?, #$$""NE""/, pode ser dito sobre Thomas Mann o antigo senso esttico
%ocado na bele&a %;sica do adolescente masculino parece ter %ascinado o autor alemo ao
ponto de se tornar a diretri& ertica %undamental de suas obras, o 'ue combinava
per%eitamente com seu prprio deseXo ertico -por Xovens/ e estilo de vida) Tambm,
estes personagens pro%undamente comple.os de Bal&ac, Iilde e Mann, representando a
sensibilidade homoertica do sculo 9:9 e in;cio do sculo 99 no so %orXados com
base na dicotomia e.trema das categorias erticas da se.ualidade) *sto, sim, a pulsar,
lateXar, no corao 'ue e.atamente dar> vida a essa se.ualidade) @uas caracteri&aCes
bali&amEse, antes, pelas convenCes da esttica e da tica da pederastia cl>ssica)
Ainda 'ue seus di>rios nos mostrem a sua energia ertica em direo a belos
Xovens, corteXandoEos com o olhar atento em v>rios ambientes, %eito um erasts, Thomas
Mann no viveu a sua vida, especialmente depois de !"$O, como um homosse.ual em
sua plenitude\ Z@omente algumas poucas ve&es em sua vida, at onde podemos
veri%icar, ele %e& mais 'ue -apenas/ olhar para outro homem[ -T:BV, !""WSEW/)
Antes, canali&ou esta vivacidade ertica para o seu trabalho %iccional e di>rios) Todavia,
seu casamento heterosse.ual nunca pode, por seu turno, complet>Elo, preench+Elo, em
sua plenitude, posto 'ue amava Xovens) ? 'ue temos no continuumentre sua vida e sua
obra seno uma ambiguidade ou uma polival+ncia entre categorias de homoerotismo, do
cl>ssico ao moderno, e heterosse.ualidade Feito um @crates *n%im, temos a'ui um
dos elos da corrente da cultura pol;tica homoertica, gestada durante os sculos 9:9 e99, 'ue vai da paiderastia 0 homosse.ualidade)
Re4er5n2ias 'i'lio0r64i2as
BAJ1T:, Mi8hail Mi8hailvitch) Problems of Dostoevsky%s Poetics) MinneapolisUniversit5 o% Minnesota ress, !"Q)
!O
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BAGB?, Daniel) 3ultura homoertica entre a 4rcia Antiga e a -s/Modernidadecienti%icismo, literatura e historiogra%ia) Tese de Doutorado, UFM4, #$$")
BAGB?, Daniel) Bal&ac, Iilde e a 3ultura 4rega construCes liter>rias de identidadeshomoerticas no sculo 9:9) Temporalidades E Gevista Discente do rograma de sE
graduao em 1istria da UFM4, vol) #, n) ! S!EQ!, =aneiro=ulho de #$!$)
B:@1?, aul) The intellectual 6orld o% Thomas Mann) :n The &ambrid'e companionto Thomas (ann) 3ambridge Universit5 ress, #$$Q, p) ##EQ#)
3AGG?2, =oseph) Aestheticism, 1omoeroticism, and 3hristian 4uilt in The icture o%Dorian 4ra5) hilosoph5 and 2iterature, #$$O, #" #WES$Q)
3?@TA, =urand5r Freire) ) inocncia e o v*cio estudos sobre o homoerotismo) #fedio, Gio de =aneiro GelumeEDumar>, !""#)
1*:2BUT, Anthon5)#ros and literature) Macmillan, !""W)
JA*, Michael) Modern men mapping masculinit5 in *nglish and 4erman literature,!$E!"S$) 2ondone6 Kor8 3assell, !""")
J?@*22*3J, Geinhart)+uturo passado contribuio 0 an>lise dos tempos histricos,Gio de =aneiro 3ontraponto *d) ucEGio, #$$W)
JUG^J*, 1ermann) Life as a -ork of art) A biograph5) rinceton Universit5 ress,#$$#)
MA, Thomas)(orte em Vene.a,Gio de =aneiro ? 4lobo\ @o aulo Folha de @oaulo, #$$S)
G?B*GT@?, Gitchie) 3lassicism and its pit%alls Death in (enice) :n The &ambrid'ecompanion to Thomas (ann) 3ambridge Universit5 ress, #$$Q, p) "OE!$W)
T*^^A, 3ristvo) A vida poli%]nica de Mi8hail Ba8htin) 3ult Gevista Brasileira de2iteratura, n !$, maio de !"")
T:BV, 3olm) Ih5 should 5ou be the onl5 ones that sin 2ondon Gevie6 o% Boo8s)
(ol) ! o) !N, O september !""W)I:@T?, Gichard\ I:@T?, 3lara -Trad)/Letters of Thomas (ann) !"E!"OO)2os Angeles Ber8ele5, Universit5 o% 3ali%ornia ress, !""$)
!W