HOMICÍDIO: A ÚLTIMA ETAPA DO CICLO DE VIOLÊNCIA …
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO – UFMT
NÚCLEO INTERINSTITUCIONAL DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA E CIDADANIA
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS - ICHS
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA
HOMICÍDIO: A ÚLTIMA ETAPA DO CICLO DE VIOLÊNCIA
CONTRA A MULHER
ANA PAULA DE FARIA CAMPOS
CUIABÁ-MT
2014
ANA PAULA DE FARIA CAMPOS
HOMICÍDIO: A ÚLTIMA ETAPA DO CICLO DE VIOLÊNCIA
CONTRA A MULHER
Monografia apresentada à Coordenação do Curso de Especialização em Gestão de Segurança Pública, como requisito obrigatório para a conclusão do curso e obtenção do grau de Especialista em Gestão de Segurança Pública.
Orientadora: Prof.ª. MsC. Vera Lúcia Bertoline
CUIABÁ-MT
2014
HOMICÍDIO: A ÚLTIMA ETAPA DO CICLO DE VIOLÊNCIA
CONTRA A MULHER
ANA PAULA DE FARIA CAMPOS
Monografia submetida à Banca Examinadora, composta pelos membros
abaixo subscritos e julgada adequada para a concessão do Grau de
ESPECIALISTA EM GESTÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA.
Nota obtida pelo (a) aluno (a) 9,5
Cuiabá-MT, 08/12/2014
BANCA EXAMINADORA:
Prof.ª. MsC. Vera Lúcia Bertoline
Orientadora/Presidente da Banca
Prof.. MsC. Almir Balieiro
Membro
Prof. Dr. Naldson Ramos da Costa
Coordenador do Curso
DEDICATÓRIA Dedico esta, bem como todas as minhas demais conquistas, aos meus pais, Berenice e Noel; a minha irmã Marcela, ao meu companheiro Daniel Firmo e aos meus preciosos filho e sobrinhos: Daniel Hamid, Carol e Felipe.
AGRADECIMENTO
À Universidade Federal de Mato Grosso e a todos os professores que ministraram este curso de Especialização. À Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso, pela oportunidade. À minha orientadora, pela forma profissional, segura e carinhosa com a qual me distinguiu ao longo do desenvolvimento deste trabalho. A todos os que direta ou indiretamente contribuíram para a realização desta pesquisa, em especial aos meus amigos da DEDMCI, DEDM e DEHPP: as Delegadas Daniela Maidel, Jozirlethe Criveletto e Silvia Pauluzi; a Investigadora Núbia Reis; e ao Escrivão de Polícia Bento Roseno.
RESUMO
As agressões contra a mulher, em regra, seguem um padrão que dá origem ao
ciclo: começa com a violência psicológica, quando o agressor procura retirar a
autoconfiança e autoestima da mulher; evoluindo-se com a violência física e até o
homicídio, por isso, quando a mulher vítima procura ajuda, obtendo a resposta
adequada do Estado, salvaguarda-se sua vida. Desta forma, se o ciclo de
violência não é rompido, o caminho é a morte da mulher. Este trabalho procura
analisar os homicídios dolosos consumados de mulheres em situação de violência
doméstica ou familiar, ocorridos no período compreendido entre 2011 a 2013, nos
municípios de Cuiabá e Várzea Grande-MT, bem como, detectar a utilização ou
não dos instrumentos jurídicos, notadamente os preconizados pela Lei n.
11.340/06, anteriormente ao evento que culminou com a morte da vítima. O
desenvolvimento do trabalho foi realizado através de pesquisas bibliográficas e
coleta de dados nas instituições jurídico-policiais.
Palavras-chave: Mulher; Violência; Homicídios.
ABSTRACT
Assaults against women, as a rule, follow a pattern that gives rise to the cycle:
begins with psychological violence when the abuser seeks to remove the self-
confidence and self-esteem of women; is evolving with physical violence and even
murder, so when the woman victim seeks help, getting the proper response from
the State, safeguarding up your life. Thus, if the cycle of violence is not broken, the
path is the woman's death. This paper analyzes the murders accomplished women
in situations of domestic or family violence, occurred in the period 2011-2013, in
the cities of Cuiabá and Lowland Great-MT, as well as detect the use or not of
legal instruments, notably those established by Law n. 11.340 / 06, prior to the
event that led to the death of the victim. The development work was carried out
through literature searches and data collection in the legal and law enforcement
institutions.
Keywords: Women; Violence; Homicides
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BO – Boletim de Ocorrência
CPMI - Comissão Parlamentar Mista de Inquérito
DEDM – Delegacia Especializada de Defesa da Mulher
DEDMCI - Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, Criança e Idoso
DEHPP – Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IP – Inquérito Policial
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada
JECrim – Juizado Especial Criminal
OMS – Organização Mundial de Saúde
ONU – Organização das Nações Unidas
PLS – Projeto de Lei do Senado Federal
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNPM – Plano Nacional de Política para Mulheres
POLITEC – Polícia Técnica Científica
SESP – Secretaria de Segurança Pública
SPM – Secretaria Especial de Política para Mulheres
LISTA DE FIGURAS - GRÁFICOS
Gráfico 1 Motivação do Crime ............................................................................... 37
Gráfico 2 Letalidade da Violência Doméstica ou Familiar Contra a Mulher nos
anos de 2011 a 2013 ............................................................................................ 39
Gráfico 3 Letalidade de Mulheres em Situação de Violência Doméstica ou
Familiar, por Município e Anos Estudados. ........................................................... 40
Gráfico 4 Sexo dos Agressores ............................................................................. 40
Gráfico 5 Idade das Vítimas e Suspeitos/Réus ..................................................... 43
Gráfico 6 Situação Ocupacional das Partes .......................................................... 44
Gráfico 7 Cor do Agressor .................................................................................... 45
Gráfico 8 Cor da Vítima ......................................................................................... 45
Gráfico 9 Natureza do Relacionamento entre as Partes ....................................... 47
Gráfico 10 Meio Empregado ................................................................................. 48
Gráfico 11 Dia de ocorrência de Homicídios Íntimos ............................................ 49
Gráfico 12 Situação Processual ............................................................................ 49
Gráfico 13 Situação dos Suspeitos/Réus .............................................................. 50
Gráfico 14. Há nos Autos Relatos de Violência Entre as Partes, Anterior ao Evento
Morte? ................................................................................................................... 51
Gráfico 15. Há Registro de Ocorrência Policial, Referente a Violência Doméstica,
Contra o Agressor e Atinente à Vítima que Posteriormente Viria Assassinar? ..... 52
Gráfico 16. Vítima Requereu Medidas Protetivas de Urgência ao Juízo Contra o
Agressor? .............................................................................................................. 53
LISTA DE FIGURAS - TABELAS
Tabela 1: Homicídios Dolosos Ocorridos em Cuiabá e Várzea Grande ................ 34
Tabela 2: Homicídios de Mulheres ........................................................................ 35
Tabela 3: Letalidade de Mulheres em Situação de Violência Doméstica ou
Familiar, por Município e Anos Estudados ............................................................ 38
Tabela 4: Número de Homicídios Ocorridos em Cuiabá e Várzea Grande nos
Anos de 2011 a 2013 e Sua Relação com a Violência Doméstica ou Familiar
Contra a Mulher .................................................................................................... 39
Tabela 5: Idade das Vítimas e Suspeitos/Réus..................................................... 43
Tabela 6: Natureza do Relacionamento ................................................................ 46
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11
1 A LEGISLAÇÃO E A QUESTÃO DE GÊNERO ................................................. 15
1.1 A Questão de Gênero no Brasil e a Lei n. 11.340/06 ...................................... 17
1.2 O Chamado Ciclo da Violência Doméstica...................................................... 24
1.3 Homicídio de Mulheres ................................................................................... 25
1.4 Feminicídio: Projeto de Lei do Senado nº 292/2013 ...................................... 29
2 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS...................................................... 31
2.1 A Coleta de Dados .......................................................................................... 31
2.2 Homicídios Femininos ..................................................................................... 35
2.3 Motivação do Crime 36
2.4 Letalidades de Mulher em Situação de Violência Doméstica ou Familiar ....... 39
2.5 São os Homens que Mais Agridem ................................................................. 40
2.6 Agressores e Vítimas São na Maioria Jovens ................................................. 42
2.7 Agressores e Vítimas São na Maioria Pardos ................................................. 44
2.8 Natureza da Relação entre Vítima e Agressor ................................................ 46
2.9 Meio Empregado ............................................................................................. 48
2.10 Processos e Condenações ........................................................................... 49
2.11 Utilização ou Não dos Instrumentos Jurídicos, Notadamentente os
Preconizados Pela Lei n. 11.340/06 ...................................................................... 51
2.12 Associação entre Procedimento Criminal Anterior e Taxa de Homicídio de
Mulheres ............................................................................................................... 54
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 55
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ........................................................................... 59
11
INTRODUÇÃO
A acepção de violência contra a mulher é entendida como qualquer
conduta baseada no gênero, que acarrete ou seja passível de causar dano,
sofrimento ou morte nas esferas física, sexual, patrimonial ou psicológica à
mulher, tanto no âmbito público quanto no privado.
A Organização das Nações Unidas (ONU) principiou seus esforços contra
esse tipo de violência nos anos 50 do século passado, e entre os anos de 1949 e
1962, com a criação da Comissão de Status da Mulher, estabeleceu uma série de
tratados fundamentados na Carta das Nações Unidas. Tal Carta, assevera
explicitamente os direitos iguais entre homens e mulheres, bem como na
Declaração Universal dos Direitos Humanos, que por sua vez, afirma que
quaisquer direitos e liberdades humanos devem ser aplicados igualitariamente a
homens e mulheres, sem diferenciação de qualquer natureza.1
Desde então, mundialmente, várias ações têm sido conduzidas, para o
fomento dos direitos da mulher, e no Brasil, uma cadeia de medidas protetivas
está sendo utilizada buscando a solução dessa problemática.
As reflexões que conduziram a escolha do tema tem origem na vivência
profissional da pesquisadora na Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso, há pouco
mais de onze anos atuando como Delegada na Delegacia Especializada de
Homicídios e Proteção à Pessoa da capital e nas Delegacias Especializadas de
Defesa da Mulher de Cuiabá e Várzea Grande-MT.
A partir da investigação de crimes envolvendo violência doméstica e
familiar contra a mulher, a predominância dos chamados “crimes passionais”
dentre os homicídios de mulheres, bem como a escassez de estudos mais
aprofundados sobre a questão na região metropolitana de Cuiabá, que ficam
despercebidos diante do quadro de preponderante vitimação de homens,
consolidaram a decisão para realizar tal pesquisa.
Dos crimes previstos no ordenamento penal brasileiro, foi eleito o crime de
homicídio consumado, o tipo penal a ser estudado, pois obrigatoriamente, deve
1 PINAFI, Tânia. Violência contra a mulher: políticas públicas e medidas protetivas na contemporaneidade. 2007. Disponível em: <www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/ materias/anteriores/edicao21/materia03> Acesso em: 18 abr. 2014.
12
ser registrado junto a uma Delegacia de Polícia, portanto, tornando as estatísticas
oficiais, muito próximas da realidade. Destes homicídios, foram escolhidos apenas
os dolosos, ou seja, aqueles onde há intenção de matar ou se assume o risco de
que tal resultado ocorra.
Ainda, diante da amplitude do tema, optou-se pelo seguinte recorte:
homicídios dolosos, ocorridos em situação de violência doméstica ou familiar
contra a mulher, conforme previsto na Lei n. 11.340/2006, conhecida como Lei
Maria da Penha.2
Homicídios de mulheres fazem parte da realidade e do imaginário brasileiro
há séculos, como mostra variada literatura de caráter jurídico, sociológico,
histórico, revistas, notícias de jornal, dramaturgia, televisão, música popular, e a
presente pesquisa.
Recente pesquisa realizada pelos Institutos Data Popular e Patrícia Galvão,
com apoio da Secretaria de Políticas para as Mulheres, e divulgada em agosto de
2013, sob o título “Percepções sobre a violência e assassinatos de mulheres”,
revelou significativa preocupação da sociedade com a violência doméstica e os
assassinatos de mulheres pelos parceiros ou ex-parceiros no Brasil. A pesquisa
traz vários resultados importantes. A temática dos assassinatos de mulheres tem
grande relevância por não ser usualmente tratada nesse tipo de estudo.
No imaginário da população, a violência contra a mulher não se resume a
agressões físicas, o que, evidentemente, já é bastante grave, mas inclui os
homicídios de mulheres. Nesta pesquisa, 92% concordam que, quando as
agressões contra a parceira ocorrem com frequência, podem terminar em
homicídio, e mais da metade acredita que o medo de ser morta faz com que uma
mulher não termine uma relação em que é vítima de violência. Além disso, há
uma percepção quase generalizada de que os homicídios de mulheres têm se
tornado mais frequentes e mais cruéis. Embora 57% acreditam que a punição dos
assassinos das parceiras é maior hoje do que no passado, 85% acham que a
2 BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8
o do art. 226 da Constituição Federal, da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm%=clnk. Acesso: 02 set 2014.
13
Justiça não pune de maneira adequada homens que assassinam suas
companheiras.
Dentre todos os resultados, o que chamou mais atenção desta
pesquisadora foi que 85% dos entrevistados concordam que mulheres que
denunciam seus parceiros correm mais riscos de sofrer assassinatos. Desta
forma, com base na análise dos dados das cidades de Cuiabá e Várzea Grande,
pretende-se demonstrar se esta percepção da sociedade condiz com a nossa
realidade.
Em especial, com esta pesquisa, buscou-se analisar se os dispositivos
legais instituídos pela Lei n. 11.340/2006, como pedido de medidas protetivas,
instauração de inquéritos policiais e/ou processos crimes, prisões preventivas
etc., foram previamente utilizados nos casos de homicídios dolosos de mulheres.
Com base, nos dados colhidos pretende-se investigar a questão da violência
doméstica e familiar e suas relações de poder.
O presente trabalho está estruturado da seguinte maneira: o capítulo um
apresenta algumas considerações sobre as legislações que disciplinam as
infrações contra a mulher; o capítulo dois faz uma análise da pesquisa
desenvolvida e discute os instrumentos jurídicos colocados a disposição das
vítimas, notadamente depois da promulgação da Lei n. 11.340/06 e sua utilização
antes do evento morte; em seguida são apresentadas as considerações finais do
trabalho.
Foram utilizadas diferentes fontes de pesquisa: 1. Todos os Boletins de
ocorrência (BO’s) e Inquéritos Policiais da Delegacia de Homicídios que atende
Cuiabá e Várzea Grande, no período compreendido entre os anos de 2011 a
2013; 2. Uma amostra estatisticamente representativa dos Processos Judiciais
dos Tribunais do Júri de Cuiabá e Várzea Grande–MT; 3. Sistema SROP, de
registros de boletins de ocorrências da Secretaria de Estado de Segurança
Pública de Mato Grosso e; Sistema Apolo de Informações do Tribunal de Justiça
de Mato Grosso, visando identificar possíveis denúncias da vítima contra o
homem que posteriormente a assassinou.
Buscou-se auxílio em literaturas críticas relacionadas ao tema dispostos
em livros, revistas, jornais, sites, trabalhos encontrados na internet e em
bibliotecas.
Inicialmente foi formulada a hipótese:
14
Há uma baixa associação entre a instauração de procedimento penal
(Inquérito Penal e/ou processo crime) nas fases iniciais do ciclo de violência
contra a mulher e a taxa de homicídio de mulheres na região metropolitana de
Cuiabá, nos anos de 2011 a 2013.
Este trabalho ainda tem como objetivos:
a) Entender o contexto que envolve a máxima violência contra a mulher: seu
assassinato;
b) Caracterizar a vítima e o(a) agressor(a) e a relação entre os envolvidos,
considerando o tipo penal homicídio;
c) Investigar a associação entre a existência de procedimento penal (IP e/ou
processo crime), nas fases iniciais do ciclo de violência contra a mulher, e a
taxa de homicídio de mulheres na região metropolitana de Cuiabá, no
período de 2011 a 2013.
O foco do estudo se situa em um ponto de confrontação extrema com os
Direitos Humanos: o assassinato de mulheres discrimina e radicaliza ao não
reconhecer a mulher como sujeito de direitos inerentes à sua dignidade, como “o
direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”, conforme enuncia o art. 3º da
Declaração Universal de 1948.3 (UNESCO, 1948).
A violência contra a mulher baseia-se nas relações de poder e
desigualdade entre os sexos. É resultado de uma cultura machista que identifica o
masculino como forte e superior e, por conseguinte, atribui às mulheres o papel
de sujeitos socialmente inferiores, passíveis das mais perversas formas de
exploração e opressão. Tal violência está enraizada na cultura brasileira. É esta
que precisa ser alterada. Visando a equidade entre homens e mulheres, políticas
públicas transversais constituem um caminho para alterar a violência em geral e a
violência contra as mulheres em especial.
3 BRASIL. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Rio de Janeiro: UNESCO, 1948.
15
1 A LEGISLAÇÃO E A QUESTÃO DE GÊNERO
Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, países que
participaram da guerra e outros resolveram se unir para criar um novo organismo
internacional, que tivesse por objetivo promover a paz e a conservação dos
direitos fundamentais do homem, substituindo o órgão conhecido como Liga das
Nações, que demonstrou ser ineficiente para evitar guerras, pela Organização das
Nações Unidas - ONU. Em 10 de dezembro de 1948, através da resolução n. 217
A (III), a ONU cria um dos mais importantes documentos da história da
humanidade, a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Vale lembrar, que ao
se referir homem neste contexto se refere ao ser humano, independente do sexo.4
Esse documento, como bem se pode verificar em seu preâmbulo, tem
como objetivo reafirmar os direitos humanos fundamentais, buscando a
maximização da dignidade e o valor da pessoa humana, elencando
características de igualdade de direitos do homem e da mulher, tentando
promover melhores condições de vida e garantias mínimas para toda a
sociedade.
Para a ONU, violência contra a mulher pode ser definida da seguinte
maneira:
Qualquer ato de violência baseado na diferença de gênero, que resulte em sofrimentos e danos físicos, sexuais e psicológicos da mulher; inclusive ameaças de tais atos, coerção e privação da liberdade seja na vida pública ou privada
5.
Piovesan (1997) comenta que a violência contra o sexo feminino é um sério
problema de saúde pública, sendo uma manifestação de transgressão e violação
dos direitos humanos. Aborda ainda, que para ela existem três manifestações de
violência: psicológica; física; e abuso sexual. Sendo que qualquer uma destas
formas de violência têm como consequências sérias, implicações para a saúde
sexual, psicológica e física da mulher.6
4 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 2ed. São Paulo: Max Limonad, 1997. p. 97.
5 ONU. Organização das Nações Unidas. Conselho Social e Econômico das Nações Unidas. Relatório do Trabalho de Grupo na Violência contra a Mulher. Viena: Nações Unidas, 1992.
6 PIOVESAN, Flávia. Op. cit.,p. 97.
16
A violação dos direitos humanos da mulher também pode se manifestar de
forma institucional, ou seja, quando os benefícios oferecidos pelo Estado através
de suas instituições públicas, são oferecidos de maneira e condições
inadequadas, ineficientes, tendo como consequência danos físicos ou
psicológicos para a mulher.7
Na procura de diminuir a violação dos direitos humanos foram criados
acordos internacionais, tais como:
a) Convenção de Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra
a Mulher – conhecida como a Lei Internacional dos Direitos da Mulher, publicada
em 1979.8 No texto deste documento se pode encontrar a definição da
discriminação contra a mulher, e o conjunto de ações estabelecidas para que os
países que dela fazem parte combatam a discriminação contra a mulher;
b) Declaração da Eliminação da Violência contra a Mulher – documento
criado em 1993, pela ONU9, foi o primeiro documento internacional criado
exclusivamente com o objetivo de combater a violência contra a mulher. Tal
documento afirma que a violência contra a mulher viola e ofende os direitos
humanos da mulher em suas características fundamentais de liberdade.
c) Plataforma por Ação de Beijing – conhecida também como a Quarta
Conferência Mundial da Mulher, foi realizada em 199510, neste momento a
atenção mundial está voltada para a condenação da violência contra a mulher,
principalmente na violência que utiliza alegações baseadas em tradições,
costumes e religião.
No Brasil, o Congresso Nacional, através da promulgação do decreto
legislativo nº 27 de 1992, aprovou o texto da Convenção Americana de Direitos
7 DIAS, Maria Berenice. A lei Maria da Penha na justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
8 BRASIL. Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres. Ratificação e adesão pela Resolução n. 34/180, da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 18 de dezembro de 1979. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/mulher/lex121.htm%2BLei+Internacional+dos+Direitos+da+Mulher,+publicada+em+1979=clnk. Acesso: 02 set 2014.
9 ONU. Organização das Nações Unidas. Declaração sobre a eliminação da violência contra as mulheres. Proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas na sua Resolução n. 48/104, de 20 de Dezembro de 1993. Disponível em: http://direitoshumanos.gddc.pt/3_4/IIIPAG3_4_7.htm%2BDeclara%C3%A7%C3%A3o+da+Elimina%C3%A7%C3%A3o+da+Viol%C3%AAncia+contra+a+Mulher%2B1993%2BONU=clnk. Acesso: 02 set 2014.
10 VIOTTI, Maria Luiza Ribeiro. Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial Sobre a Mulher. Departamento de Direitos Humanos e Temas Sociais do Ministério das Relações Exteriores. Brasília: Ministério das Relações Exteriores, 1995.
17
Humanos, também conhecido, como Pacto de São José da Costa Rica11. Neste
documento o governo brasileiro tenta criar mecanismos de proteção e aplicação
dos direitos humanos de forma mais efetiva no Brasil.
1.1 A Questão de Gênero no Brasil e a Lei n. 11.340/06
A expressão gênero começa a ser utilizada pelas feministas americanas e
inglesas nos anos 80 do século passado, para explicar a desigualdade entre
homens e mulheres viabilizada em discriminação e opressão das mulheres.
Maciel Junior define da seguinte maneira:
Gênero faz parte de uma identidade operacional que nos marca como membros de uma categoria e nosso corpo atua grande parte desta identidade por meio do uso da fala, de roupas e gestos, delimitando um eu muito menos intrínseco do que performático: um desempenho dirigido para a situação e para a audiência.
12
Gênero relaciona-se com feminismo, mas não é sinônimo de mulher ou
feminismo. As relações de gênero podem ser estudadas a partir da identidade
feminina e masculina. Gênero significa relações entre homens e mulheres. Uma
análise de gênero pode se limitar a descrever essas relações. O feminismo vai
além ao mostrar que essas relações são de poder e que produzem injustiça.
Para Jane Souza:
O conceito de gênero surgiu entre as estudiosas feministas para se contrapor à ideia de essência, recusando assim qualquer explicação pautada no determinismo biológico, que pudesse explicar os comportamentos de homens e mulheres, empreendendo desta forma, uma visão naturalizada, universal e imutável dos comportamentos. Tal determinismo serviu muitas vezes para justificar as desigualdades entre ambos, a partir de suas diferenças físicas. O que importa, na perspectiva das relações de gênero, é discutir os processos de construção ou
11
BRASIL. Decreto legislativo nº 27 de 1992. Aprova o texto da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto São José) celebrado em São José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, por ocasião da Conferência especializada Interamericana sobre Direitos Humanos. Brasília: Presidência da República, 1992. Disponível em: http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?decreto+legislativo++27+de+1992=clnk. Acesso: 02 set 2014.
12 MACIEL JUNIOR, Plíneo de Almeida. Homem entrevista homem, mulher entrevista homem: questões de gênero nos procedimentos de pesquisa. 2008. Disponível em: <www.fazendogenero8.ufsc.br/sts/ST33/Maciel_Jr-Souza_33.pdf> Acesso em: 2 mar. 2008
18
formação histórica, linguística e social, instituídas na formação de mulheres e homens, meninas e meninos.
13
Gênero é uma divisão pertinente ao feminino e masculino. Respeita as
diferenças biológicas entre os sexos, admite a desigualdade, mas não como
pretexto para a violência, para a exclusão e para a disparidade de chances na
educação, no trabalho e na política. É uma maneira de raciocinar que proporciona
mudanças nas relações sociais e por decorrência, nas relações de poder. É um
meio para entender as relações sociais e de modo particular, as relações entre
homens e mulheres.
Um dos problemas na tentativa de instalação na sociedade, de relações
igualitárias no Brasil é o rompimento das heranças e costumes, enraizado na
sociedade, das relações patriarcais em que grande parte das famílias foi formada.
A continuação desta dinâmica fez surgir um cenário propício para a vitimização da
mulher, onde a sociedade valorizava as ações dos homens e em muitos casos
menosprezavam as qualidades das mulheres.14
A expressão gênero vem se incorporando nos instrumentos normativos
internacionais e na legislação dos países. No Brasil, foi introduzida na Convenção
de Belém do Pará (Decreto n. 1.973, de 01/08/199615), para conceituar a violência
contra a mulher como qualquer ato ou conduta baseada no gênero. Não há
definição de gênero, mas do contexto deduz-se o conceito de relação de poder.
Com a criação, no Brasil, da Secretaria de Políticas Públicas para as
Mulheres, em 2003, fortaleceu-se a perspectiva de gênero em todas as políticas
públicas.
A questão de violência elencada aponta para a necessidade de
maximização das ações governamentais voltadas na perspectiva de gênero,
procurando apresentar novas soluções e dinâmicas mais eficientes de combate a
este tipo de violência. Procurando uma valorização, e ao mesmo tempo,
13
SOUZA, Jane Felipe. Gênero e Sexualidade nas Pedagogias Culturais: Implicações para a Educação Infantil. 1995. Disponível em: <http://www.ced.ufsc.br/~nee0a6/SOUZA.pdf>. Acesso em: 2 nov. 2014
14 CONNELL, R. W. Políticas da masculinidade. 28ed. São Paulo: Revista Educação e realidade. 2005.
15 BRASIL. Decreto nº 1.973, de 1º de agosto de 1996. Promulga a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do Pará, em 9 de junho de 1994. Brasília: Presidência da República, 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/D1973.htm%2BDecreto+n.+1.973,+de+01/08/1996=clnk. Acesso: 02 set 2014.
19
possibilitando um novo aprendizado para homens e mulheres, de convivência
harmônica e igualitária para os membros da sociedade.16
A definição de gênero ainda está em concepção. A identificação sexual,
anteriormente bipartida: masculino e feminino, expandiu-se para abarcar lésbicas,
transexuais, homossexuais, travestis, etc., que não se reconhecem como homens
ou mulheres. Na atualidade, entende-se que o suposto sexo biológico e a
identidade subjetiva nem sempre coincidem.
A Lei n. 11.340 foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no
ano de 2006, em 07 de agosto. Ela traz mudanças significativas, buscando maior
rigor nas ações contra a violência doméstica ou familiar praticada contra a mulher.
A Lei Maria da Penha recebeu este nome em homenagem a Maria da
Penha Maia Fernandes, brasileira, moradora da cidade de Fortaleza, que durante
vários anos sofreu com agressões de seu então marido Marcos Antônio Herredia
Viveiros. Estas agressões chegaram ao ponto de em 1983, o seu marido, tentar
matá-la por duas vezes, uma com arma de fogo, deixando-a paraplégica, na
segunda tentou assassiná-la por eletrocussão e afogamento. Sendo que só após
estes episódios Maria da Penha tomou coragem para denunciar Marcos Antônio,
seu marido.17
O seu art. 1º. Amplia os mecanismos de proteção a mulher, conforme se
pode observar a seguir:
Art. 1º. Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar
18.
Já nos art. 2º e 3º são destacados os direitos a vida, a não discriminação,
assegurando direito a vida entre outros. Tais artigos podem ser observados a
seguir:
16
NATIVIDADE, Cláudia. Violência de gênero: mulheres autoras transformando uma medida alternativa em oportunidade. 2008. Disponível em: <www.fmdv.org> Acesso em: 25 fev. 2014.
17 MIRANDA, Dayse (Orgs.). O Progresso das Mulheres no Brasil. São Paulo: UNIFEM, 2006. p. 21.
18 BRASIL. Lei 11.340/2006. Op. cit., p. 01.
20
Art. 2º. Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. Art. 3º. Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. § 1º. O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 2º. Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.
19
A violência doméstica é um problema universal que aflige
indiscriminadamente mulheres em todo o país. É doença que não diferencia nível
social, econômico, religioso ou cultural específicos. Suas consequências são
perniciosas: proporciona sofrimento indescritível às suas vítimas, bem como pode
lhes ocasionar danos físicos e mentais cujos efeitos podem ser permanentes.
A violência familiar ou doméstica contra a mulher é considerada uma
violação dos direitos humanos. São levadas em consideração no momento da
apuração do crime, as características particulares em que ocorreu a violência. O
art. 5º da referida lei aborda o que é considerado violência contra a mulher:
Art. 5º. Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
20
A violência cometida contra mulheres é denominada como violência de
gênero porque se correlaciona à posição de submissão da mulher na sociedade,
que constitui na razão implícita do número estarrecedor de casos de agressões
físicas, sexuais, psicológicas, morais e econômicas (patrimoniais), cometidos em
19
BRASIL. Lei 11.340/2006. Op. cit., p. 1 20
Idem, p. 2.
21
desfavor de mulheres, tornando visível a desigualdade de poder entre homens e
mulheres, mormente nas relações domésticas.
Vale lembrar, que para a Lei sob análise, as relações pessoais independem
da escolha sexual dos envolvidos.
O art. 7º faz uma definição sobre algumas ações que podem ser
consideradas como violência doméstica ou familiar contra a mulher:
Art. 7º. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
21
A Lei Maria da Penha determina que exista uma integração entre os órgãos
de Segurança Pública de atendimento a mulher, visando coibir e diminuir o
número de casos de violência contra o sexo feminino. Define também, entre
outras medidas a inclusão da mulher, vítima de violência, em programa de
proteção buscando a preservação da integridade física e psicológica da vítima.
Determina ainda, que na hipótese de ameaça ou de violência contra a
mulher, a autoridade policial que receber qualquer informação de ocorrência
contra a mulher adotará, imediatamente, as medidas legais cabíveis.
21
BRASIL. Lei 11.340/2006. Op. cit., p. 2.
22
Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências: I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário; II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal; III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida; IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar; V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.
22
O art. 12 estabelece também outros procedimentos para a autoridade
policial, conforme se observa abaixo:
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal: I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada; II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias; III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência; IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários; V - ouvir o agressor e as testemunhas; VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele; VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público. § 1º. O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter: I - qualificação da ofendida e do agressor; II - nome e idade dos dependentes; III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida. § 2º. A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1º o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida. § 3º. Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.
23
A Lei Maria da Penha também estabelece medidas protetivas para a vítima
contra o agressor, conforme se depreende do art. 22:
22
BRASIL. Lei 11.340/2006. Op. cit., p. 3. 23
Idem, p. 4.
23
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei n. 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
24
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios. § 1º. As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público. § 2º. Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6º da Lei n. 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso. § 3º. Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial. § 4º. Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no Código de Processo Civil, caput e nos §§ 5º e 6º do art. 461 da Lei n. 5.869,
25 de 11 de janeiro de 1973.
26
A Lei Maria da Penha procurou estabelecer medidas de combate às ações
de violência contra a mulher de forma, oferecendo aos órgãos de segurança
pública mecanismos para a proteção da mulher de uma forma ainda não vista na
história do Brasil.27
24
BRASIL. Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Dispõe sobre registro, posse e
comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – SINARM, define crimes e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 2003. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm. Acesso: 02 set 2014.
25 BRASIL. Lei nº 5.8569 de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Brasília: Presidência da República, 1973. disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm%2BLei+n.+5.869,+de+11+de+janeiro+de+1973=clnk. Acesso: 02 set 2014.
26 BRASIL. Lei 11.340/2006. Op. cit., p. 7.
27 CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. Violência doméstica: análise da Lei Maria da Penha, n. 11340/2006. Salvador: Podivm, 2007. p. 07.
24
1.2 O Chamado Ciclo da Violência Doméstica
As mulheres vitimadas pela violência doméstica nem sempre sofrem
agressão constante, nem a violência acontece ocasionalmente; em regra,
funciona como um sistema circular – o chamado ciclo da violência doméstica –
que apresenta, como modelo, três fases:
1. Fase de aumento da tensão: as tensões diárias acumuladas pelo(a)
agressor(a) que este(a) não consegue solucionar, criam um ambiente de perigo
iminente para a vítima que, muitas vezes, é culpabilizada por tais tensões. Sob
qualquer desculpa o(a) agressor(a) direciona todas as suas tensões sobre a
vítima. E as desculpas, que podem ser muito simples, são usualmente situações
do dia a dia, como exemplo, culpar a vítima de não ter preparado a refeição, de
ter se atrasado a chegar a casa ou a um encontro, de ter relações extraconjugais,
etc.
2. Fase do ataque violento: Existe uma ação agressiva principal de
violência física contra a mulher. Amiúde, esta violência intensa é seguida por
brusca agressão verbal. Normalmente mais curta que as demais fases, perdura,
normalmente de duas a quarenta e oito horas. Nesta fase, a vítima padece os
agravos físicos mais severos. O(a) agressor(a) fere, física e psicologicamente a
vítima, que procura proteger-se, esperando que o(a) agressor(a) pare e não
invista com mais violência. Este ataque pode ser de grande intensidade, podendo
a vítima por vezes ficar em estado bastante grave, necessitando de tratamento
médico, ao qual o(a) agressor(a) nem sempre lhe dá acesso.
3. Fase da lua-de-mel, amorosa ou do apaziguamento: o(a)
agressor(a), depois de a tensão ter sido direcionada sobre a vítima, sob a forma
de violência, revela-se arrependido(a) e promete que não vai voltar a ser
violento(a). Pode evocar causas para que a vítima minimize a conduta violenta,
como por exemplo, ter tido um mau dia, alegar que havia se embriagado ou
consumido drogas; pode ainda invocar o comportamento da vítima como pretexto
para o seu descontrole. Nessa fase, para fortalecer o seu pedido de desculpas,
pode tratá-la com amabilidade e tentar seduzi-la, fazendo-a crer que, de fato, foi
essa a derradeira vez que ele(a) se desequilibrou. A conduta amorosa do
agressor revigora na mulher a esperança de que ele modificará e alguns até
começam a procurar tratamento psicológico ou para alcoolismo. Isto geralmente
25
anima a mulher a cultivar o relacionamento. Mas às vezes não há nenhuma
conduta amorosa na Fase Três, apenas a ausência de violência.
Tal ciclo é experimentado pela vítima em um contínuo de medo,
esperança e amor. Medo, em virtude da violência de que é alvo; esperança,
porque confia no arrependimento e nos pedidos de desculpa que têm lugar depois
da violência; amor, porque não obstante a violência, podem existir momentos
positivos no relacionamento.
O ciclo da violência doméstica distingue-se pela sua constância no
tempo, isto é, pela sua reprodução sucessiva ao longo de meses ou anos,
podendo ser cada vez menores as fases da tensão e de apaziguamento e cada
vez maior e mais aguda a fase do ataque violento. Em circunstâncias limite, o
arremate destes episódios poderá ser o homicídio.28
Fonte: Chauí, 2005.
1.3 Homicídio de Mulheres
Como bem definiu o Relatório Final da Comissão Parlamentar Mista de
Inquérito sobre a Violência contra a Mulher (CPMI) do Congresso Nacional:
28
CHAUÍ, Marilena. Participando do Debate sobre Mulher e violência. In: FRANCHETTO, Bruna, CAVALCANTI, Maria Laura V.C.; HEILBORN, Maria Luiza (org.). Perspectivas Antropológicas da Mulher. 4ed. São Paulo: Zahar, 2005. p. 88.
26
O homicídio é a instância última de controle da mulher pelo homem: o controle da vida e da morte. Ele se expressa como afirmação irrestrita de posse, igualando a mulher a um objeto, quando cometido por parceiro ou ex-parceiro; como subjugação da intimidade e da sexualidade da mulher, por meio da violência sexual associada ao assassinato; como destruição da identidade da mulher, pela mutilação ou desfiguração de seu corpo; como aviltamento da dignidade da mulher, submetendo-a a tortura ou a tratamento cruel ou degradante.
29
Com uma taxa de 4,4 assassinatos em 100 mil mulheres, o Brasil está
entre os países com maior índice de homicídios femininos: ocupa a sétima
posição em um ranking de 84 nações, segundo dados do Mapa da Violência
2012. Nosso país só perde para países como El Salvador, Trinidad e Tobago,
Guatemala, Rússia, Colômbia e Belize (Cebela/Flacso).30
No Brasil, o panorama que mais angustia representantes do Estado
comprometidos em evitar a mais extrema das violências de gênero é o do
homicídio íntimo, aquele perpetrado em situação de violência doméstica. Afora
essa, outras duas situações que distinguem este crime são a prática de violência
sexual ou a tortura e mutilação da vítima antes ou depois do assassinato,
conforme Projeto de Lei do Senado que poderá instituir uma tipificação penal
especial para esse crime: Feminicídio (PLS 292/2013).
Segundo o estudo: “Mapa da Violência 2012: Os novos padrões da
violência homicida no Brasil”, com dados sobre homicídios de mulheres no Brasil
(Instituto Sangari, abril de 2012), de 1980 a 2010 foram assassinadas no país
cerca de 91 mil mulheres, sendo 43,5 mil só na última década. O número de
mortes nesses 30 anos passou de 1.353 para 4.297, o que representa um
aumento de 217,6% nos índices de assassinatos de mulheres.31
De acordo com a pesquisa, de 1996 a 2010 as taxas de homicídios de
mulheres permaneceram estabilizadas em torno de 4,5 assassinatos para cada
grupo de 100 mil mulheres. Entre os homens, só 14,7% dos homicídios
29
BRASIL. Relatório Final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre a Violência contra a Mulher (CPMI) do Congresso Nacional. Publicado em 27 agosto de 2013. Brasília: Congresso Nacional, 2013. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2013/08/divulgado-relatorio-final-sobre-a-violencia-contra-a-mulher-no-brasil%Relatorio+ Final+da+Comisscao+Parlamentar+Mista+de+Inquerito+sobre+a+ViolenCiA+contra+a+Mulher+(CPMI)+do+Congresso+Nacional+strip=1. Acesso: 02 set 2014.
30 WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência 2012. Atualização: homicídio de mulheres no Brasil. Rio de Janeiro: Cebela/Flacso, 2012. Publicado em ago 2012. Disponível em: http://mapadaviolencia.org.br/pdf2012/MapaViolencia2012_atual_mulheres.pdf. Acesso: 03 nov. 2014.
31 WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2012. Caderno Complementar. Homicídio de Mulheres no Brasil. São Paulo: Instituto Sangari, 2012. p. 01.
27
aconteceram na residência ou habitação. Já entre as mulheres, essa proporção
eleva-se para 40%, o que mostra que, para elas, a casa é o local mais perigoso.32
Centrado na problemática da vitimização feminina por homicídios no país,
o documento demonstra que, desconsiderando os 8.219 casos de atendimento
(17,0% do total) no SUS (Sistema Único de Saúde) que não registra o tipo de
relação da vítima com o provável agressor, o estudo permite afirmar que: os pais
são os principais responsáveis pelos incidentes violentos até os 14 anos de idade
das vítimas; até os 04 anos, destaca-se a mãe e, a partir dos 10 anos, a figura
paterna; a partir dos 20 anos da mulher até os 59 anos, o agressor é
majoritariamente o cônjuge e/ou namorado (ou os respectivos ex); a partir dos 60
anos são os filhos que assumem o lugar de autor da violência contra a mulher.33
Elisabete Brasil, em seu trabalho ressalta que é crescente o número de
mulheres que perdem a vida pelos seus maridos ou ex-companheiros. De acordo
com esta pesquisa, aumentou o número de mulheres mortas no Brasil no ano de
2008.34
O Código Penal descreve da seguinte forma o crime de homicídio:
Art. 121 - Matar alguém: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. Caso de diminuição de pena § 1º - Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Homicídio qualificado § 2º - Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. Homicídio culposo § 3º - Se o homicídio é culposo: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. Aumento de pena
32
WAISELFISZ, Julio Jacobo. Op. cit., p. 01. 33
Idem, p. 01. 34
BRASIL. Elisabete. Violência doméstica: 33 mulheres foram assassinadas este ano em Portugal. Publicado em 25 nov. 2013. Disponível em: http://psol50.org.br/site/noticias/2431/violencia-domestica-33-mulheres-foram-assassinadas-este-ano-em-portugal%Elisabete+Brasil%violencia+contra+mulheres=1. Acesso: 02 set 2014.
28
§ 4º - No homicídio culposo, a pena é aumentada de um terço, se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos. § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária.
35
No Estado de Mato Grosso e nas cidades de Cuiabá e Várzea Grande,
infelizmente também o número de homicídios em ambos os sexos tem se mantido
elevado nos últimos anos.36
Foi registrado no período de 2011 a 2013, 1064 (um mil e sessenta e
quatro) crimes de homicídios nas cidades de Cuiabá e Várzea Grande. Sendo que
desses, 84 (oitenta e quatro) vitimaram pessoas do sexo feminino.37
Segundo o Mapa da Violência, elevadas taxas de homicídio costumam ser
entremeadas de elevados níveis de tolerância à violência contra as mulheres e,
em alguns casos, é justamente a consequência dessa negligência. Os meios
pelos quais essa condescendência é exercida podem ser variáveis, mas um
predomina: a culpabilização da vítima como justificação dessa forma aguda de
violência.38
Na avaliação do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, responsável pelo Mapa
da Violência:
Basicamente, o mecanismo de auto justificação de várias instituições, principalmente aquelas que deveriam zelar pela segurança e pela proteção da mulher, coloca a vítima como culpada. A mulher é responsabilizada pela violência que sofre. Este tipo de postura institucional de tolerância à violência e impunidade não só permite como incentiva o feminicídio.
39
35
BRASIL. Código Penal. 3ed. Organização e texto de MIRABETTE, Júlio Fabrini. São Paulo: Atlas, 2000. p. 79.
36 MATO GROSSO. Secretaria Estadual de Segurança Pública. Violência contra mulheres. Cuiabá: Assessoria SESP, 2013. Disponível em: http://www.mt.gov.br/editorias/seguranca-publica/mato-grosso-discute-elaboracao-de-politicas-publicas-de-combate-a-violencia-contra-a-mulher/CUIABA+SESP+violencia +contra+mulheres&=clnk. Acesso: 02 set 2014.
37 MATO GROSSO. Delegacias da Mulher geram 3,3 mil medidas de proteção a vítimas de violência doméstica. DEPM. Publicado em 25 dez 2013. Disponível em: http://www.mt.gov.br/editorias/seguranca-publica/delegacias-da-mulher-geram-33-mil-medidas-de-protecao-a-vitimas-de-violencia-domestica/%Delegacia+Especial+de+Protecao+da+Mulher% DEPM%CuiabA=clnk. Acesso: 02 set 2014.
38 WAISELFISZ, Julio Jacobo. Op. cit., p. 01.
39 Idem, p. 01.
29
A ausência ou precariedade das atuações estatais de enfrentamento à
violência de gênero no campo da judicialização podem cooperar para a efetivação
do crime de homicídio e impunidade dos sujeitos que o cometem. Por sua vez, tal
crime não é compreendido como expressão letal dessa violência, mas ainda
considerado como um crime de menor exigência de intervenção estatal por ser
entendido como um crime “passional”, mero resultado de relações afetivas
desfeitas, neste sentido, a judicialização expressaria a hierarquia e as
desigualdades presentes nas relações sociais entre homens e mulheres.
Esse panorama desafia o poder público, que procura maneiras de
prosseguir na concretização da Lei Maria da Penha e ainda debate formas
originais para suplementar a legislação e reduzir de maneira efetiva o homicídio
de mulheres.
Os resultados positivos alcançados pelas políticas públicas no embate à
violência contra a mulher, seja no âmbito federal, estadual ou municipal e da
Justiça em geral, contribuem para que se avance na inibição desse tipo de crime
e punição dos agressores. Importante em todo o processo é a denúncia da
vítima/terceiro com a resposta adequada do Estado, que ganha força cada vez
mais pelas campanhas, ações e iniciativas empreendidas no sentido de
disseminar que a violência não é mais aceitável na sociedade brasileira.
A efetiva aplicação da lei, mobilizando operadores do Direito na
compreensão do fenômeno da violência doméstica e familiar, dando celeridade
aos inquéritos e julgamentos dos crimes de gênero, combatendo a impunidade e
responsabilizando os agressores e assassinos de mulheres, foi pensada como
mais uma ferramenta nesse enfrentamento a violência de gênero.
1.4 Feminicídio: Projeto de Lei do Senado nº 292/2013
Previsto como crime específico em países da América Latina, como o
México e Chile, o feminicídio é descrito como o assassinato intencional de
mulheres por homens, em função de seu gênero, em meio a formas de
dominação, exercício de poder e controle sobre suas vidas.
A cidade mexicana de Juárez, na fronteira com os Estados Unidos, foi
citada como símbolo do movimento pela tipificação do feminicídio. Depois de forte
30
aumento do número de homicídios de mulheres, que chegou a quase 300 no ano
de 2003, pressões de órgãos internacionais contribuíram para a criação do tipo
penal no país, diverso do homicídio. Outra importante mudança foi um tratamento
menos tolerante do aparato estatal em relação aos criminosos. Tais crimes nem
sempre eram investigados, e quase sempre envolviam extrema violência, com
estupro seguido de morte, esquartejamento e até destruição dos corpos com cal.
No Brasil tramita o Projeto de Lei do Senado n. 292/2013, que pretende
alterar o artigo 121 do Código Penal para inserir o feminicídio como circunstância
qualificadora dos crimes de homicídios de mulheres com motivação de gênero,
isto é, em quaisquer das seguintes circunstâncias: violência doméstica e familiar;
violência sexual; mutilação ou desfiguração da vítima; com emprego de tortura ou
qualquer meio cruel e degradante.40
Aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado
Federal em abril de 2013, o projeto aguarda votação no plenário.
A proposta para a tipificação do crime no Brasil não inclui previsão de
aumento da pena, na comparação com o homicídio. Sendo, portanto, o principal
objetivo da proposta evidenciar a intolerância com esse tipo de crime e contribuir
para a geração de estatísticas sobre sua ocorrência.
40
BRASIL. PLS. Projeto de Lei do Senado nº 292/2013. CCJ - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Publicado em 02 abr 2014. Brasília: Senado Federal, 2014. Disponível em: http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp%Projeto+de+Lei+do+Senado+n%292/2013+strip=1. Acesso: 02 set 2014.
31
2 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS
Este capítulo apresenta dados estatísticos sobre ocorrências de homicídios
contra a mulher nas cidades de Cuiabá e Várzea Grande-MT, no período de 2011
a 2013.
2.1 A Coleta de Dados
Para entender a dinâmica da investigação em relação aos crimes
cometidos contra a mulher se faz necessário entender os papéis dos órgãos
envolvidos neste processo, entre eles se pode citar a Polícia Militar, Politec e a
Polícia Judiciária Civil.
A Polícia Militar realiza o policiamento ostensivo, ou seja, o policiamento
que procura prevenir a ação criminal. Ao realizar esta função, quase sempre é o
primeiro órgão de segurança pública a chegar aos locais de ocorrências policiais.
À Politec compete realizar os laudos periciais geralmente sobre locais de
crime e objetos, é a chamada Polícia Técnica Cientifica. O trabalho da perícia
criminal é imprescindível à persecução penal. O perito criminal oficial é quem
realiza o exame de corpo de delito e as outras perícias, ou seja, analisa os
vestígios coletados pessoalmente no local de crime, bem como aqueles vestígios
encaminhados pelas autoridades fazendo relação com a ação criminosa.
A Polícia Judiciária Civil é órgão da administração pública cuja função está
definida no artigo 144 da Constituição Federal de 1988.41 E entre suas funções
principais está a de apurar infrações penais, exceto as militares, e exercer o
exercício da polícia judiciária.
À Polícia Judiciária Civil, como a própria nomenclatura do nome já diz,
cabe o persecutio criminis, ou seja, aquele crime que não pode ser evitado ou
prevenido pela polícia de segurança pública, deverá ser apurado através do
conhecido inquérito policial, cujo objetivo é levar ao Judiciário e esse ao Ministério
41
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. emendas Constitucionais de revisão. Brasília: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao.htm=clnk. Acesso: 02 set 2014.
32
Público como titular da ação penal, a apuração do fato criminoso consubstanciado
neste a materialidade e autoria da infração penal.
Em Cuiabá e Várzea Grande as ocorrências de homicídios consumados
são atendidas pela Delegacia Especializada de Homicídio e Proteção a Pessoa –
DEHPP, que por sua vez está estruturada com sete equipes compostas por: 1
Delegado, 2 escrivães e 4 investigadores, cada uma; além do Delegado Titular,
responsável pela coordenação dos trabalhos na Delegacia.
Existem ainda, as Delegacias Especializadas de Defesa da Mulher –
DEDM para investigação dos outros crimes contra as mulheres, entre estes,
enquadram-se os demais crimes especificados pela Lei Maria da Penha. No
Estado de Mato Grosso apenas os municípios de Cuiabá, Várzea Grande,
Rondonópolis, Cáceres e Barra do Garças contam com Delegacias
Especializadas de Defesa da Mulher.
O trabalho foi basicamente desenvolvido com suporte nos boletins de
ocorrência (BO’s) da Polícia Judiciária Civil e Polícia Militar, inquéritos policiais
das Delegacias Especializadas precitadas e Processos Criminais das Varas
Especializadas respectivas.
Crimes contra a vida devem ser informados às Delegacias de Polícia, e no
caso da grande Cuiabá, o registro e atendimento dos crimes de homicídios
consumados são realizados pela Delegacia Especializada de Homicídios e
Proteção à Pessoa (DEHPP), inclusive das vítimas do sexo feminino.
Os BO’s são fundamentais para a elucidação dos crimes, mas infelizmente,
são muito concisos, por vezes incompletos, o que dificulta o trabalho da
investigação policial e para o presente estudo, a organização sistemática das
informações.
Parte dessa deficiência é explicada pela dificuldade em se identificar uma
vítima de homicídio, pois seus documentos nem sempre são encontrados, os
vizinhos não sabem ou dizem não saber seus nomes completos, nem mesmo os
locatários dispõem destes dados. É uma população “sem identidade”. Se esta
obscuridade envolve a vítima, ainda é maior a sombra sobre o agressor. Além da
fuga, contribui o enorme temor de vizinhos e testemunhas em informar qualquer
elemento sobre o crime, receosos de serem descobertos pelos criminosos.
33
Levando em conta estas lacunas, fizemos uma caracterização das vítimas
e agressores(as) do ponto de vista etário, étnico e das relações interpessoais
entre as vítimas e suspeito/as.
No caso de Mato Grosso, a Secretaria de Segurança Pública (SESP)
dispõe de um setor referente às estatísticas que recebe das delegacias, relatórios
informando o número absoluto de casos, o sexo das vítimas e a motivação do
crime indicada a partir das investigações realizadas durante o inquérito policial.
No entanto, não existem dados sistematizados em Mato Grosso sobre
homicídios de mulheres que indiquem a relação existente entre vítima e suspeito.
E a motivação ou causa do crime é indicada no relatório de estatística da DEHPP
sem muitos critérios científicos, desta forma, a classificação resume-se a uma
suposição valorativa; as categorias encontradas foram: passional, álcool, drogas,
ambição, depressão, vingança e rixa, por exemplo, que não sustentam maiores
inferências analíticas.
Ainda não há uma categoria/motivação: violência doméstica ou familiar, da
qual trata a Lei Maria da Penha.
As circunstâncias do crime nem sempre estão descritas nos BO’s, o que
pode ser eventualmente conseguido com o prosseguimento da investigação. De
modo geral, eles contêm informações sobre a pessoa ou pessoas envolvidas, o
local onde ocorreu o fato, nomes de eventuais testemunhas e informações
resumidas das circunstâncias que envolveram a ocorrência. Elementos mais
detalhados, constatados pela Diretoria de Criminalística, através dos peritos
criminais oficiais e pela Diretoria de Medicina Legal, através dos legistas, fazem
parte dos inquéritos e processos criminais posteriormente elaborados.
O conteúdo do inquérito policial indica como é feita a instrução de um
homicídio contra uma mulher, desses procedimentos podem ser retiradas
inúmeras informações, como o tipo de relacionamento existente entre as partes,
fragmentos dos depoimentos e interrogatórios, relatórios de investigação e do
relatório final do Delegado de Polícia que presidiu as investigações e o
encaminhou ao Fórum.
O Fórum de Cuiabá possui duas Varas Especializadas em Violência
Doméstica e Familiar Contra e Mulher e Várzea Grande uma Vara Especializada.
Esta centralização facilitou a coleta de dados, pois é possível consultar a maioria
34
dos processos em trâmite e seus andamentos, com exceção daqueles que correm
em segredo de justiça.
O objetivo da investigação no Fórum através das Varas Especializadas de
Violência e das Varas do Tribunal do Júri foi localizar processos criminais
referentes aos inquéritos que haviam sido examinados na DEHPP, cujas vítimas
eram mulheres e foram assassinadas em circunstâncias de violência doméstica
ou familiar, nos termos da Lei n. 11.340/06 (Lei Maria da Penha).
A pesquisa de campo permitiu identificar e qualificar 41 (quarenta e um)
casos de homicídios ocorridos em situação de violência doméstica ou familiar,
com base em oitenta e quatro (84) inquéritos policiais e trinta e oito (38)
processos criminais, de crimes ocorridos entre os anos de 2011 a 2013.
Dos inquéritos foram observados especialmente os depoimentos das
testemunhas e o relatório final encaminhado ao Fórum. Dos processos criminais,
foi analisada centralmente a fase atual do processo, a situação do réu, se preso
ou solto e dos processos encerrados, a sentença do Júri.
Apenas três (03) dos quarenta e um (41) inquéritos policiais examinados
não foram localizados no fórum, um porque figurava como suspeito pessoa menor
de 18 anos de idade, que possui tramitação processual diversa, e outros dois
porque logo depois de cometerem os homicídios contra as mulheres os suspeitos
se suicidaram.
Finalizada a coleta de informações, foi realizada a tabulação e análise
descritiva dos dados apurados, com a identificação do perfil das vítimas e do
suspeito/réu, horários dos crimes, meios utilizados para consecução do delito e a
verificação da utilização prévia pela vítima dos dispositivos legais preconizados
pela Lei Maria da Penha.
Tabela 1: Homicídios Dolosos Ocorridos em Cuiabá e Várzea Grande
ANO HOMEM MULHER TOTAL %
2011 338 19 357 33,55
2012 319 38 357 33,55
2013 323 27 350 32,89
TOTAL 980 84 1064 100
Fonte: DEHPP, 2014.
35
2.2 Homicídios Femininos
A investigação realizada evidencia que nos últimos anos assistiu-se a um
aumento de práticas de assassinato de mulheres, mesmo se levarmos em
consideração o aumento da violência em geral na grande Cuiabá, ainda assim é
alta a taxa de mulheres assassinadas.
Muitos desses crimes se tornam, no cotidiano nacional, episódios banais,
perdendo, portanto, boa parte de sua importância como fato/fenômeno da vida
pública. Além disso, desconsidera-se que os homicídios de mulheres têm em sua
origem uma relação direta entre poder e masculinidade. E essa se constitui na
matriz relacional hegemônica das relações sociais de gênero.
Constatamos, com base nos dados aqui analisados, que a violência não se
limita ao espaço físico da casa, mas ocorre na rua, em áreas de lazer, no local de
trabalho, enfim, em todos os locais em que a mulher exerce suas atividades
cotidianas.
As práticas e pensamentos masculinos, ainda em número significativo, se
mostram resistentes à aceitação e efetivação de novas relações sociais entre
homens e mulheres, apesar de tantos investimentos e esforços contrários já
executados, seja no âmbito de políticas públicas, com a criação das Delegacias
Especializadas de Defesa da Mulher, seja dos novos ordenamentos jurídicos,
como a efetivação da Lei n. 11.340/06 (Lei Maria da Penha).
Tabela 2: Homicídios de Mulheres
ANO
VÍTIMAS VÁRZEA
GRANDE
VÍTIMAS CUIABA TOTAL %
2011 5 14 19 22,62
2012 8 30 38 45,24
2013 10 17 27 32,14
TOTAL 23 61 84 100,0
Fonte: DEHPP, 2014.
36
2.3 Motivação do Crime
Quanto às motivações dos crimes, a principal é a chamada causa privada,
como o ciúme, a separação e a vingança. A tentativa de ruptura da subordinação
da mulher ao homem, interrompendo a dominação afetiva exercida em nome do
amor masculino. O crime é “justificado” pela indiscutível prevalência do afeto-
dominador, o assassino não confere à mulher o que seria, para ela, a felicidade. A
felicidade dele é que conta. Ela não é igual a ele, não tem direito à escolha. Se a
mulher, para realizar seus próprios desejos, contradiz o companheiro, ela paga
com a vida.
A tabela 3 procura estabelecer a motivação dos crimes relacionados ao
estudo na Grande Cuiabá nos últimos anos.
Tabela 3: Motivação dos Homicídios de Mulheres
MOTIVAÇÃO ANO 2011 ANO 2012 ANO 2013 TOTAL
A Apurar 3 2 3 8
Álcool 0 0 1 1
Drogas 6 7 10 23
Outros 0 1 0 1
Passional 0 2 0 2
Rixa 0 4 1 5
Vingança 1 1 1 3
Violência doméstica ou familiar 9 20 12 41
Total Geral 19 37 28 84
Fonte: DEHPP, 2014.
37
Gráfico 1 Motivação do Crime
Fonte: DEHPP, 2014.
A separação, um suposto adultério, a desconfiança da paternidade, a
independência econômica, a mera gravidez, estão na base da maioria dos
assassinatos analisados. O conteúdo das oitivas dos(as) agressores(as) reflete
suas posições. O ciúme, mesmo de um ex-namorados é razão suficiente para
condenar à morte a “mulher infiel”. A mulher torna-se bem permanente do
homem, com quem, um dia, tivera um relacionamento, sendo a morte sua punição
por romper tais vínculos.
Mas existem também aquelas que transcendem os espaços privados e
ocorrem mesmo na condição de intragênero; causas públicas, externas e
urbanas, como os latrocínios, as balas perdidas e o tráfico de entorpecentes;
causas comportamentais, como o alcoolismo, a gravidez; causas patrimoniais; e a
violência sexual, sobretudo o estupro. Todas são enfatizadas a partir dos relatos
como: a resolução de conflitos interpessoais, com o uso da violência fatal.
Muitos acreditavam que com o advento da Lei Maria da Penha o número
de “crimes passionais” iria diminuir de forma drástica, no entanto, não foi o que
aconteceu.
38
Conforme o Mapa da Violência 2012, e a Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios (Pnad/IBGE)42, mesmo depois de o advento da Lei Maria da Penha,
a violência contra a mulher é significativamente expressiva no Brasil. O
decréscimo nas taxas de homicídio no ano de promulgação da Lei Maria da
Penha (2006) e o subsequente aumento dessas mesmas taxas nos anos
seguintes indicariam que as políticas atuais necessitam de constante
monitoramento para a efetiva mudança no quadro de violação dos direitos das
mulheres.
É compreensível a pouca visibilidade dos homicídios cujas vítimas são
mulheres, diante da vitimização prevalente de homens como vítima ou autor do
crime. No entanto, o que chama atenção é que as mulheres, embora em números
absolutos, sejam significativamente menos vitimizadas por homicídios, em valores
percentuais, predominam homicídios decorrentes da violência doméstica ou
familiar, portanto, sendo assassinadas por pessoas próximas, com quem
geralmente mantém ou mantiveram relacionamento afetivo. Logo, a primeira
causa da ocorrência dos homicídios contra mulheres, 41 (quarenta e um) casos é
a violência de gênero, como mostra a tabela 4.
Desta forma, quase metade dos homicídios contra mulheres ocorridos
entre 2011 e 2013, constituíram casos de homicídios íntimos, confirmando a
persistência da vulnerabilidade da mulher no âmbito de suas relações domésticas,
afetivas e familiares.
Tabela 3: Letalidade de Mulheres em Situação de Violência Doméstica ou
Familiar, por Municípios e Anos Estudados
ANO DO CRIME CUIABÁ VÁRZEA GRANDE TOTAL
2011 6 3 9
2012 19 1 20
2013 7 5 12
Total Geral 32 9 41
Fonte: DEHPP, 2014.
42
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PNAD. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Mapa da Violência 2012. Disponível em: http://www.institutoelo.org.br/ site/files/publications/pdf%IBGE%PNAD%Mapa+da+violencia+2012=clnk. Acesso: 02 set 2014.
39
2.4 Letalidades de Mulher em Situação de Violência Doméstica ou Familiar
No triênio estudado, ocorreram oitenta e quatro (84) homicídios com vítima
do sexo feminino, destes, quarenta e um (41) ocorreram em situação de violência
doméstica ou familiar, logo, em 49% dos crimes, o perpetrador é o parceiro, ex-
parceiro ou parente da mulher como é possível identificar na tabela 4.
Tabela 4: Número de Homicídios Ocorridos em Cuiabá e Várzea Grande nos
Anos de 2011 a 2013 e sua Relação com a Violência Doméstica ou Familiar
Contra a Mulher
Homicídios 2011 2012 2013 TOTAL %
Homicídio em Situação de
Violência Doméstica ou Familiar 9 20 12 41 49
Total Homicídio de Mulheres 19 38 27 84 100
Fonte: DEHPP, 2014.
Gráfico 2 Letalidade da Violência Doméstica ou Familiar Contra a Mulher
nos Anos de 2011 a 2013
920
12
41
19
38
27
84
2011 2012 2013 TOTAL
HOMICÍDIO EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA OU FAMILIAR
TOTAL HOMICÍDIO DE MULHERES
Fonte: DEHPP, 2014.
40
Gráfico 3 Letalidade de Mulheres em Situação de Violência Doméstica ou
Familiar, por Município e Anos Estudados
Fonte: DEHPP, 2014.
2.5 São os Homens que Mais Agridem
Gráfico 4 Sexo dos Agressores
4; 10%
37; 90%
FEMININO
MASCULINO
Fonte: DEHPP, 2014.
41
Os boletins de ocorrência nem sempre apontam quem são os suspeitos/as,
eventualmente; com o decorrer das investigações, eles serão descobertos. No
caso dos homicídios íntimos analisados neste trabalho, entre os suspeitos
identificados, 90% são homens.
Damacena faz o seguinte comentário sobre a violência contra a mulher:
Quando se fala em violência contra a mulher, o que vem logo à cabeça é a pura agressão física. No entanto, a violência contra a mulher vai além da física. O tabu trazido pelo colonizador europeu, que prega que a mulher deve estar sempre em sujeição ao homem, que esta deve ser apenas doméstica e procriadora, na verdade agride o potencial humano, pois condena a vítima da sujeição a uma vida mesquinha. Aqui não se faz apologia à rebelião da mulher para com o sexo oposto, não, antes deve haver o respeito mútuo, caso contrário, ambos se anulariam, sobretudo a mulher. É lógico que há de se respeitar povos e culturas em que a sujeição ao homem é natural, um modo de vida, como ocorre em países orientais. Entretanto, mesmo lá, práticas de violência contra a mulher são repudiadas.
43
Grande número de mulheres, sem citarem como queixa principal a
violência física ou psicológica sofrida, muitas vezes, sem saber ao certo das
consequências, procura atendimento clínicos em virtude de violência que está
interiorizada dentro de si. Violência estas que são exteriorizadas por sintomas
clínicos indecifráveis pelos profissionais da área de saúde, que não obtém um
diagnóstico compatibilizado com as queixas trazidas pela paciente. Dessa forma,
não tendo condições de realizarem um atendimento necessário a cura do fator
causador da enfermidade.44
Viterbo Silva (2003) explana que no seu estudo que entre as agressões
físicas sofridas pela mulher, 65,7% foram de parceiros amorosos e ex-parceiros,
13,7% de familiares, 10,6% de conhecidos e 9% de desconhecidos; entre as
agressões psicológicas sofridas pela mulher 68,7% de parceiros e ex-parceiros
amorosos, 1,5% de familiares, 12.9% de conhecidos e 15,2% de desconhecidos.45
Comenta ainda Viterbo Silva que:
43
DAMACENA, Helena. As Multifaces da Violência Contra a Mulher. São Luiz: Jornal Pequeno, 2008. p. 06.
44 FOELKEL, Alessandra. Violência Sexual e Doméstica Contra as Mulheres no Brasil: Reflexões sobre o quadro atual e a atuação de IPAS. Brasília: Fundação Perseu Abramo, 2004.
45 SILVA, Iracema Viterbo. Violência contra mulheres: a experiência de usuárias de um serviço de urgência e emergência de Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 19(Sup. 2):S263-S272, 2003.
42
Devemos reconhecer que há homens que não se encaixam no perfil do agressor machista e tentam combater a prática de subjugar o sexo feminino; por outro lado há sempre um ou outro que manifesta atitudes machistas, sem necessariamente chegar aos extremos. Quando a sociedade entende as multifaces da violência praticada contra a mulher, as máscaras caem, mostrando assim a verdadeira face do agressor: o machismo
46.
Buselli comenta que na sua pesquisa, a responsabilidade do marido ou
parceiro como autor principal da agressão contra a mulher, estaria entre 53% e
70% dos casos de violência, excetuando-se o assédio sexual.47
De um modo geral os agressores de mulheres no Brasil apontam as
características das esposas ou companheiras, como a causa de suas explosões
desumanas e violentas. Conforme aborda Damascena estes agressores
geralmente são indivíduos sedutores; não admitem que sejam agressores; são
provenientes de famílias rígidas, seguindo modelos de família tradicionais. Podem
apresentar conduta e sentimentos contraditórios, alternando entre momentos de
violência ou momentos de sedução, ternura e carinho. Quase sempre se dizem
arrependidos após uma agressão, prometendo não mais realizá-las.48
2.6 Agressores e Vítimas são na Maioria Jovens
O crime pode ser cometido contra crianças, pessoas idosas ou adultas.
Matam-se bebês porque choram, por falta de alimento; os pais por vingança.
Mata-se sob efeito de álcool, entorpecentes, ou sem nenhum motivo aparente.
Adultas são mortas por razões afetivas, interpessoais ou pela violência urbana
(bala perdida, entorpecente, etc.).
46
SILVA, Iracema Viterbo. Op. cit., p. 09. 47
BUSELLI, Marina. Homicídios de mulheres no Brasil. Publicado em 06 set 2011. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/saude/2011/09/brasil-combate-a-violencia-contra-mulher%Buselli%2005% violencia+contra+a+mulher=clnk. Acesso: 02 set. 2014.
48 DAMACENA, Helena. Op. cit.,p. 07.
43
Tabela 5: Idade das Vítimas e Suspeitos/Réus
IDADE VÍTIMAS SUSPEITOS/RÉUS
Menor 18 anos 11 1
18 a 24 anos 10 10
25 a 30 anos 6 8
31 a 50 anos 13 19
51 a 60 anos 1 1
Acima de 60 anos 0 1
Não Identificado 0 1
Total 41 41
Fonte: DEHPP, 2014.
Gráfico 5 Idade das Vítimas e Suspeitos/Réus
Fonte: DEHPP, 2014.
As mulheres vítimas são de todas as idades, mas predominam na faixa
etária de 18 a 35 anos, em plena idade economicamente produtiva e com filhos
pequenos. O gráfico 5 acima, mostra a idade das vítimas entre os anos de 2011 a
2013.
Entre as diferenças mais expressivas, observou-se que os agressores
muito embora sejam na maioria jovens, são mais velhos que sua vítima. Estão na
44
faixa etária de 18 a 35 anos. O que confirma a tendência de os jovens
reproduzirem o comportamento violento de gerações mais velhas. Apesar de
constantes denúncias de violência contra a mulher e do incentivo para que não
aceitem ser violentadas, o cenário indica que, se mudou o comportamento
agressivo, não foi suficiente para alterar o quadro de homicídios.
Gráfico 6 Situação Ocupacional das Partes
Fonte: DEHPP, 2014.
Segundo dados colhidos nos IP’s e processos criminais, entre os
agressores e vítimas predominam aqueles, cuja ocupação principal, seja trabalho
o remunerado formal. Dentre os agressores com trabalho formal, haviam pessoas
das mais diversas profissões e graus de escolaridade; destes 03 (três) eram
servidores públicos do Estado de Mato Grosso e um da Prefeitura Municipal de
Cuiabá, contudo, todos da atuavam na área de segurança púbica, dado que por si
já instigaria a realização de uma outra pesquisa mais aprofundada, buscando as
causas desse fato/fenômeno.
2.7 Agressor e Vítima são na Maioria Pardos
Entre as mulheres vítimas de homicídio predominam as de cor parda. Estas
constituem aproximadamente 71% das vítimas, seguidas por 20% de negras e 9%
45
de brancas. Tal proporção de pardos também é observada quando se analisa o
grupo étnico dos agressores identificados. Em relação à cor dos envolvidos, os
dados são pouco reveladores, pois segundo o IBGE (2010), a maioria da
população de Mato Grosso declara-se parda.49
Gráfico 7 Cor do Agressor
Fonte: DEHPP, 2014.
Gráfico 8 Cor da Vítima
Fonte: DEHPP, 2014.
49
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Publicado em 12 jan 2011. Disponível em: http://ibge.gov.br. Acesso: 03 nov. 2014.
46
Vale esclarecer que, diferentemente da pesquisa do IBGE que utiliza a auto
declaração no quesito cor da população, aqui esse dado foi inserido de acordo
com a percepção de cor/etnia do policial que preencheu o boletim de ocorrência.
2.8 Natureza da Relação entre Vítima e Agressor
Analisando qual o tipo de relação que a vitima mantinha com o agressor,
encontramos todas as formas de relacionamento amoroso, como companheiros,
maridos, namorados, bem como nas respectivas condições de ex;
frequentemente em situação de rompimento ou em via de sê-lo, mas também por
inúmeras outras circunstâncias.
Embora perdure a ideologia de que o lar é um lugar de abrigo e boa
convivência entre pessoas, as relações familiares nem sempre são pacíficas.
A tabela 6 mostra a natureza dos relacionamentos das vítimas de
homicídios íntimos nos anos de 2011, 2012 e 2013.
Tabela 6: Natureza do relacionamento
RELACÃO ENTRE AS PARTES TOTAL
Companheira 1
Companheiro 11
Ex-Companheiro 4
Ex-Cunhado 1
Ex-Genro 1
Ex-Namorado 7
Mãe 3
Marido 4
Namorado 5
Padrasto 4
Total Geral 41
Fonte: DEHPP, 2014.
47
Gráfico 9 Natureza do Relacionamento entre as Partes
Fonte: DEHPP, 2014.
De acordo com o material coletado, entre os anos de 2011 a 2013, oitenta
e quatro mulheres foram vítimas do crime de homicídio nas cidades de Cuiabá e
Várzea Grande, sendo que sessenta e sete casos tiveram suas autorias
esclarecidas. E dos homicídios consumados, com autoria conhecida, quarenta e
um desses, ou seja 49%, foram praticados por pessoa com quem a vítima
mantinha ou manteve relação familiar ou íntima de afeto.
A pesquisa evidenciou que ainda persiste a força do patriarcado como uma
instituição que ainda sustenta o controle sobre a posse do corpo feminino,
expresso na capacidade punitiva contra as mulheres. Os casos analisados na
grande Cuiabá, com base nos interrogatórios e na tese de defesa dos acusados,
são exemplares: “ela queria sair de casa”; “ela era a minha mulher”, “matei por
amor”; “matou sob forte emoção”. Esses são os argumentos ainda usados por
assassinos e advogados, sentimentos de posse e de controle que ainda
predominam nos discursos.
Que a mulher vem vencendo diversos obstáculos sociais, culturais, físicos
e intelectuais é facilmente comprovado, no entanto, as formas de agressões e
violação de seus direitos continuam aumentando em termos percentuais nas
estatísticas policiais. Sendo que o seu principal agressor continua sendo o
companheiro de relações amorosas. Aquele que deveria compartilhar de suas
conquistas, celebrar suas vitórias, continua repetindo atitudes machistas
48
persistentes na história da sociedade brasileira e mundial. Nem mesmo novas leis
e penas mais severas têm conseguido diminuir esses índices.
Muitos homens ainda continuam justificando suas ações por se acharem no
direito de dispor das mulheres, como objetos e não como seres semelhantes e
com direitos iguais aos seus. É preciso que o homem da atualidade repense a sua
masculinidade, frente à nova mulher que está se formando.
2.9 Meio Empregado
A análise dos dados contidos nos Boletins de Ocorrência revela a
crueldade dos crimes; aproximadamente 49% são agressões cometidas com a
chamada arma branca (faca, punhal, etc.), mas são também usados outros
instrumentos como arma de fogo, pancadas com qualquer objeto contundente,
além das próprias mãos. O gráfico 10 mostra a relação do meio empregado nos
crimes nos anos de 2011, 2012 e 2013.
Gráfico 10 Meio Empregado
Fonte: DEHPP, 2014.
Nota-se que o uso de arma branca é o que apresenta maior índice, sendo
que no ano de 2012 aconteceram 11 crimes com esse tipo de arma.
49
Gráfico 11 Dia de Ocorrência de Homicídios Íntimos
7
10
3
3
7
8
3
0 2 4 6 8 10 12
Domingo
Sábado
Quarta
Quinta
Segunda
Sexta
Terça
Fonte: DEHPP, 2014.
O gráfico 6 apresenta a distribuição das ocorrências baseadas no dia da
semana em que aconteceram. Analisando o gráfico 6 se pode concluir que o
domingo e o sábado são os dias da semana com maiores índices de ocorrências,
22.18% e 19.87% respectivamente.
2.10 Processos e Condenações
Gráfico 12 Situação Processual
Fonte: DEHPP, 2014.
50
Em regra, o julgamento dos crimes previstos no Código Penal Brasileiro
segue o seguinte caminho: instaura-se um inquérito policial, que gera um
processo, no qual são reunidas evidências a favor e contra o réu, e, finalmente, o
juiz analisa os dados e prolata a sentença. Mas em casos de crimes intencionais
contra a vida (homicídio; induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio; infanticídio
e aborto) a última etapa do julgamento acontece no Tribunal do Júri.
Dos 41 (quarenta e um) casos analisados, 40 investigações policiais já
haviam sido concluídas e os respectivos procedimentos policiais encaminhados
ao Poder Judiciário.
Gráfico 13. Situação dos Suspeitos/Réus
Fonte: DEHPP, 2014.
Dos inquéritos policiais remetidos aos Fóruns Criminais de Cuiabá e
Várzea Grande, 12 (doze) já haviam sido sentenciados, com 100% de
condenação dos réus, variando as penas finais aplicadas entre 15 e 55 anos de
reclusão.
51
Tais diferenças de penas se devem a observância das regras do art. 68 do
Código Penal, que ao nortear a dosimetria das penas, adota o Critério Trifásico de
Fixação da Pena. Na primeira fase o(a) juiz(a) analisa as circunstâncias judiciais,
constantes do art. 59 do CP, e ao final da primeira fase é fixada a pena-base. Na
segunda fase faz-se a análise das circunstâncias legais, circunstâncias
agravantes ou atenuantes previstas nos arts. 61 e segs. do CP, ao final fixa-se
a pena provisória. E na terceira fase tem-se a análise das causas de aumento ou
diminuição de pena, encontradas na parte geral e parte especial do Código Penal;
são expressas por frações (aumenta-se da metade, diminui-se de dois terços,
etc.), assim a pena resultante deste processo será a pena final.
2.11 Utilização ou Não dos Instrumentos Jurídicos, Notadamentente os
Preconizados Pela Lei n. 11.340/06
Gráfico 14. Há nos Autos Relatos de Violência entre as Partes, Anterior ao
Evento Morte?
79%
21%
SIM
NÃO
Fonte: DEHPP, 2014.
Os dados analisados enfatizam que anteriormente ao evento morte, na
maior parte dos casos há um histórico expresso de violência física e psicológica
perpetrados pelos agressores contra as vítimas. Dos quarenta e um (41)
inquéritos analisados, em trinta e dois (32) havia relato de violência anterior e em
52
nove (9) não há relato de violência, o que não é uma afirmativa que a violência
nunca existiu.
Entretanto, são raros os casos em que tais vítimas procuraram utilizar os
instrumentos jurídicos à sua disposição, previstos na Lei n. 11.340/06 (Lei Maria
da Penha). Pois muito embora a violência doméstica estivesse presente na
maioria dessas relações, dos quarenta e um (41) casos analisados, apenas nove
(09) possuíam registro de Boletim de Ocorrência anterior. Sendo importante
ressaltar, que nem todos foram registrados por iniciativa da vítima, mas por
vizinhos, parentes e até terceiros desconhecidos que presenciavam as violências
e acionavam a Polícia Militar.
Gráfico 15. Há Registro de Ocorrência Policial, Referente a Violência
Doméstica, Contra o Agressor e Atinente à Vítima que Posteriormente Viria
Assassinar?
Fonte: DEHPP, 2014.
E destes, em apenas 06 casos houve solicitação de Medidas Protetivas de
Urgência ao Juízo por parte da vítima em desfavor do suspeito.
53
Por outro lado, os suspeitos, na sua grande maioria não possuíam registros
de cometimentos de outros homicídios ou mesmo de outros crimes. Fato que
ressalta que aqui não tratamos de homicídios comuns, mas efetivamente de
assassinatos cometidos em razão do fato da vítima ser mulher, inseridos em
relações de poder, marcadas pela hegemonia masculina.
Antes da promulgação da Lei Maria da Penha era incomum a ocorrência
em que se decretava a prisão preventiva de um suspeito por motivo de violência
doméstica ou familiar, a não ser nos casos de homicídio, e estando presentes os
pressupostos legais exigidos. Depois de a vigência da citada lei, permitiu-se a
decretação de prisões preventivas anteriores à morte em crimes considerados de
“menor gravidade”, como por exemplo, ameaça ou lesão corporal e, sobretudo,
quando o agressor descumpre as medidas protetivas. Contudo, tal instituto tem
sido pouco utilizado.
Gráfico 16. Vítima Requereu Medidas Protetivas de Urgência ao Juízo Contra
o Agressor?
27
66
9 226 15
41
100
quantidade %
histórico nos autos de IP de violência doméstica ou familiar anterior a morte
vítimas que registram bo
requereram medidas protetivas
total de vítimas de homicídio em situação de violência doméstica e familiar
Fonte: DEHPP, 2014.
54
2.12 Associação entre Procedimento Criminal Anterior e Taxa de Homicídio
de Mulheres
Dos 41 casos analisados, em apenas 06 deles a vítima utilizou dos
instrumentos jurídicos preconizados pela Lei n. 11.340/06, em especial o
requerimento de medidas protetivas de urgência ao Juízo em desfavor do
agressor. Desta forma, pode-se concluir que é baixa a associação entre a
existência de procedimento criminal anterior e a taxa de homicídio de mulheres.
Destarte, não condiz com a realidade encontrada nesta pesquisa a
percepção da população, demonstrada na pesquisa realizada pelos Institutos
Data Popular e Patrícia Galvão, sob o título “Percepções sobre a violência e
assassinatos de mulheres”50; de que mulheres que denunciam seus parceiros
correm mais riscos de sofrerem assassinatos, já que no período da pesquisa
foram confeccionados nas Delegacias Especializadas de Defesa da Mulher de
Cuiabá e Várzea Grande mais de 7.800 (sete mil e oitocentas) Medidas
Protetivas; e dessas seis foram assassinadas.
A Lei n. 11.340/06 trouxe modificações positivas a legislação pátria, como a
possibilidade de requerimento de medidas protetivas, que foram efetivadas em
alguns casos, todavia ainda hoje, passados 08 anos de vigência da lei, muitas
mulheres vítimas de violência doméstica ainda não requerem essas medidas e
por vezes nem chegam a registrar um boletim de ocorrência contra o suspeito.
Tal comportamento pode ser associado a diversos fatores, como a
vergonha, o medo de que a violência se agrave; a dificuldade que muitas têm em
revelar as violências sofridas; a culpa por se sentirem responsáveis pela violência
sofrida; dificuldade de lidar com o sentimento de afetividade ainda existente em
relação ao agressor; receio de que o companheiro seja preso e/ou prejudicado no
trabalho e por isso, os filhos sejam afetados financeiramente, entre outros.
50
SILVA, Estela Aparecida da. O poder masculino na relação eu-isso presente na violência doméstica. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2014. p. 10-11.
55
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise de dados indica que apesar dos avanços trazidos pela Lei n.
11.340/06, visando coibir a violência doméstica contra as mulheres, poucas
mudanças foram verificadas em relação à diminuição de homicídios de mulheres
nessas condições, nos municípios e período analisados.
A hipótese que norteou a presente pesquisa foi que há uma baixa
associação entre a instauração de procedimento penal nas fases iniciais do ciclo
de violência contra a mulher e a taxa de homicídio de mulheres na região
metropolitana de Cuiabá, no período de 2011 a 2013, hipótese que foi confirmada.
Desta forma, não condiz com a realidade dos municípios, apresentada nesta
pesquisa, a percepção da população demonstrada na pesquisa realizada pelos
Institutos Data Popular e Patrícia Galvão, sob o título “Percepções Sobre a
Violência e Assassinatos de Mulheres”, de que mulheres vítimas de violência
doméstica que denunciam seus parceiros correm mais riscos de sofrerem
assassinatos.
Constatou-se que a melhoria da qualificação das informações dos
envolvidos na judicialização é fundamental. Se os dados sobre sexo e idade são
consistentes, outros como escolaridade, atividade profissional exercida,
remuneração, situação de ocupação/desocupação no momento do crime e a
relação entre as partes, são elementos essenciais para conhecer a realidade dos
envolvidos no crime, seja vítima, seja autor.
Corrigir a causa “passional” é fundamental para avançar na qualidade dos
registros. A violência de gênero é um conceito muito mais amplo e menos
estereotipado e abrangeria todos os crimes dela resultantes, o que contribuiria
para impedir que homicídios de mulheres ocorridos em situação de violência
doméstica e familiar; violência sexual; mutilação ou desfiguração da vítima; com
emprego de tortura ou qualquer meio cruel e degradante, por exemplo, fossem
classificados em sua causa pela polícia como tendo como causa: “depressão” ou
“rixa”.
Evidente que seria necessário que houvesse capacitação e inclusão de um
projeto de qualificação dos dados, já existente na política de enfrentamento à
56
violência contra a mulher protagonizada pela Secretaria de Política para
Mulheres, cujo objetivo seria garantir a visibilidade aos crimes de gênero.
Com base na pesquisa realizada e dos estudos bibliográficos, pode-se
enunciar algumas considerações: 1) A violência Doméstica e Familiar predomina
dentre os homicídios de mulheres, ou seja, a violência de gênero é a principal
causa de morte de mulheres por homicídio. 2) As relações afetivas também
podem ser letais, especialmente, aquelas produzidas e reproduzidas a partir de
conflitos que resolvem-se frequentemente sob formas violentas. 3) Não é a idade
das partes, a existência de filhos, tampouco o tempo e tipo de relacionamento
entre eles, que desestimula ou promove a prática do homicídio. A
heterogeneidade de idade dos envolvidos, bem como a diferença entre o tempo
dos relacionamentos encontrados, confirmam que a relação desigual, hierárquica,
onde há lugares e papéis de gênero perversamente determinados, é que contribui
diretamente para o exercício da violência e sua fatalidade.
Essa situação é preocupante já que tais homicídios são eventos muitas
vezes evitáveis, que abreviam a vida de muitas mulheres jovens e causam perdas
incalculáveis, assim como implicações adversas para as crianças, para as
famílias e para a coletividade.
Há um recorrente panorama por traz do homicídio de mulheres.
Comparando com o que já foi relatado pela literatura histórica e pelas pesquisas
sobre o tema, vê-se que se repetem as mesmas ações e aparentemente os
mesmos motivos. A variação está na ampliação do rol dos(as) criminosos(as) que
não inclui apenas o marido ou o “amante”, mas todos os tipos de companheiros:
namorados, ex-companheiros, etc., além de outros familiares como mãe,
padrasto, genro, etc. A violência nas relações sociais de gênero atravessa toda a
sociedade, qualquer que seja a posição socioeconômica das pessoas envolvidas.
Fatores como dificuldades econômicas, doenças, a violência em geral, a
injustiça, a educação calcada na violência e castigo, enfim circunstâncias que
pressionam a vida cotidiana da sociedade, levam homens e mulheres a
cometerem homicídios. Carentes de ajuda econômica, psicológica e jurídica,
alguns acabam resolvendo os problemas da pior maneira possível: através do
crime.
Políticas Públicas transversais visando à equidade entre homens e
mulheres constitui um caminho para alterar a violência em geral e, em particular,
57
a violência contra a mulher. Alterar a cultura de subordinação nas relações sociais
de gênero requer uma ação conjunta e transversal. Ao Estado, é de suma
importância estabelecer uma articulação planejada entre os programas de todos
os Ministérios, desde a Justiça, Saúde, Educação, Planejamento, Economia,
Trabalho, etc., pois a desarticulação dos programas os enfraquece e os torna
ineficientes.
Faz-se necessário que as pessoas sejam estimuladas a enfrentar a
violência doméstica e familiar, ainda no seu início, visando a quebra e o
agravamento do ciclo da violência contra a mulher e, em consequência, o número
de homicídios. É salutar que se discuta nos espaços públicos e privados,
institucionalizados ou não, como na família, no trabalho, nos espaços escolares,
nos procedimentos policiais e judiciais, junto aos próprios agressores; a
construção de novas formas de constituições das identidades de gênero e
resoluções de conflitos de maneira pacífica.
Por outro lado, o estudo mostra que as saídas para uma relação violenta
ainda precisam ser mais conhecidas: com exceção da Delegacia da Mulher –
conhecida por quase todos, mas presente em poucos municípios do Brasil, os
serviços de apoio para as mulheres vítimas de violência ainda são pouco
difundidos. Dados como esses reforçam o entendimento de que essa pauta é
muito relevante e que deve, portanto, ser tratada como uma prioridade na agenda
pública.
Fundamentando-se na concepção de que a violência contra as mulheres
é uma questão cultural, social, de segurança pública, de justiça e de saúde e que
isoladamente nenhum profissional ou instituição obterá sucesso no enfrentamento
a tal questão. Entende-se e defende-se que as ações sejam de caráter
multiprofissional e intersetorial pressupondo um trabalho articulado e em rede.
A clareza do trabalho do outro, seja o profissional ou institucional, deve
reconhecer que existem limites e possibilidades em cada qual, e isto pode ser
concretamente um caminho bem sucedido no trabalho em rede e na garantia de
direitos a população atendida.
Destaca-se ainda que o profissional da rede não pode ser reprodutor dos
preconceitos e estereótipos sociais que, ao invés de apoiar, prejudicam o
fortalecimento da mulher no momento em que decide romper o ciclo de violência.
O primeiro passo é demonstrar que existe um sistema de proteção à disposição
58
dela, que envolve não só o serviço de atenção jurídica, mas outros serviços que
podem contribuir para sustentá-la nessa decisão de não mais viver a violência,
porque são muitas as questões envolvidas.
Apesar de todas as análises, às mulheres cabem atitudes positivas que
procurem ressignificar as relações de poder, combatendo as dificuldades e não se
resignando a elas, portanto, não há lugar para uma posição vitimista.
59
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