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  • Revista Nures n 5 Janeiro/Abril 2007 http://www.pucsp.br/revistanures Ncleo de Estudos Religio e Sociedade Pontifcia Universidade Catlica SP

    Revista Nures http://www.pucsp.br/revistanures

    Historiografia e Religio

    Eduardo Basto de Albuquerque Livre Docente em Histria UNESP Assis [email protected].

    Resumo: Examina as abordagens da religio realizada pelo campo de saber histrico. Percorre a historiografia tradicional da religio e identifica suas vertentes. Demonstra a fratura dessa historiografia realizada pelos recortes temticos experimentados pelas correntes historiogrficas como a dos Annales e da Histria Nova. Conclui pelo exame das perspectivas atuais da histria cultural e a do imaginrio quanto religio. Palavras-chave: Histria e religies - Histria das Religies. Abstracts: This article examines the views of the religion accomplished by the field of knowing historical. It travels the traditional historiography of the religion and it identifies its slopes. It demonstrates the fracture of that historiography accomplished by the thematic cuttings tried by the historiography average as the one of Annales and of the New History. It ends for the exam of the current perspectives of the cultural history and the one of the imaginary with relationship to the religion. Keywords: History and religions - History of Religions.

    Introduo

    Este artigo pretende apresentar algumas das questes das complexas relaes entre

    Histria e Religio que nos ltimos duzentos anos viram a constituio, a fama e o ocaso da

    disciplina Histria das Religies que almejava interpretar estas relaes.

    Predominaram no sculo XIX as ideologias evolucionistas e naturalistas que

    discutiram qual era o lugar de cada religio numa escala ascendente composta por etapas a

    serem superadas. A nomenclatura das diversas correntes interpretativas variava, mas

    envolvia o animismo, o naturalismo, o politesmo e o monotesmo. O embate previa

    tambm o fim do monotesmo e o triunfo da razo com a crescente secularizao, o

    predomnio do atesmo militante e a vitria do anti-clericalismo.

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    Inseridas dentro neste amplo conjunto de concepes, as cincias histricas ficaram

    marcadas por duas posturas fundamentais e, por vezes, opostas. A primeira considerava

    legtima a pesquisa histrica fundada em documentos que comprovassem todo raciocnio e

    toda concluso obtida pelo historiador. A segunda postura a que tentava abstrair os dados

    empricos, s vezes sem ignor-los, e buscava alcanar alguns resultados que no estavam

    explcitos neles. Ao mesmo tempo, no panorama intelectual havia a compreenso que o

    processo histrico era complexo e necessitaria, para sua maior compreenso, de abordagens

    ancoradas em alguma atitude inaugural, como a sociolgica, a antropolgica, a econmica,

    a psicolgica, entre outras e onde diminusse o privilgio do evento poltico e dos

    indivduos, predominante no pensamento historiogrfico.

    A historiografia tradicional das religies

    As questes tericas e metodolgicas pensadas sobre Religio e Histria no sculo

    XIX compunham a historiografia tradicional, e tratou a religio de trs maneiras

    fundamentais.

    1) A primeira maneira a que se convencionou ser a Histria das Religies.

    Identificamos, nos incios do sculo XX, dois grandes modelos de Histria das Religies:

    um almejando a confirmao de crenas que os dados histricos pudessem trazer para o

    cristianismo e o outro, afirmando que ela ajudaria no desaparecimento da religio que

    ocorreria fatalmente com a expanso do progresso da cincia e da indstria.

    O primeiro modelo detectava para os estudiosos os "defeitos" e a correo da

    disciplina e mapeava seus fundamentos. A argumentao exemplar identificada que a

    Histria das Religies se basearia em trs princpios: 1 Propugnaria a idia que uma fora

    divina produziria resultados difusos no mundo e na humanidade, conduzindo tudo para

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    outro estado ou fim tico. 2 Tal fora, atravs da evoluo, conduziria o menos para o

    mais, o baixo subiria para o alto, o simples se tornaria complexo. 3 Conseqentemente,

    todas as religies e todas as formas de sentimento religioso se encaminhariam para

    ascenso crescente 1.

    Uma das questes importantes da historiografia tradicional era a sua preocupao

    com as origens das instituies e das crenas da humanidade. Buscar a origem da religio

    era um anseio dos partidrios evolucionistas do mtodo comparativo. Pensadores como

    Troeltsch, Von Harnack, Loisy, Blondel, entre outros, cada um sua maneira e tendo como

    base um projeto diferente, procuraram transformar o mtodo histrico em veculo para

    estabelecer a verdade do cristianismo 2 .

    Salomo Reinach 3 representa o segundo modelo de abordagem da Histria das

    Religies, no incio do sculo vinte. Para ele, a histria da humanidade se caracterizaria

    pela laicizao progressiva a ser realizada.

    Ambos os modelos tinham em comum construes grandiosas que no so mais

    correntes entre os estudiosos da Histria das Religies. O gnero Histria das Religies

    sobrevive com alguns pressupostos mais modestos e poucas renovaes, sem as ousadias

    dos cem anos anteriores. A comparao hoje discretamente utilizada. Possivelmente, o

    setor com maiores renovaes seja o das religies orientais, pois num campo estacionado

    por dcadas, foram aplicadas reflexes geradas em outros lugares da historiografia.

    A publicao de obras voltadas para a Histria das Religies moda das antigas

    Histrias Gerais, popularizou o gnero hoje. Citemos somente dois: Uma Histria de Deus

    1 HUBY, Jos (org.). Christus: histria das religies. So Paulo: Saraiva, 1956, vol. 1, p.59. 2 ROSA, Guglielmo Forini. Mythe et science dans la philosophie de la religion de lge moderne. In Revue de lHistoire des Religions. Paris : 2003, 220 / 2. 3 REINACH, Salomon. Orpheus: Histoire gnrale des religions. Paris : Librairie dducation Nationale, 1930.

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    de Karen Armstrong4 e o Livro das Religies de Jostein Gaarder e outros5. Outros manuais

    poderiam ainda ser relacionados, inclusive aqueles mais militantes na defesa de uma

    posio poltica ou religiosa. Note-se que tais manuais gerais da Histria das Religies se

    situam na historiografia tradicional, com poucas incurses comparativas e se distanciando

    das abordagens renovadas da historiografia feita pelos historiadores.

    2) A segunda maneira de tratamento da religio pela historiografia tradicional seria

    atravs da histria dos pases, onde ela considerada como fazendo parte da histria das

    instituies e das relaes com os Estados.

    3) A terceira maneira de tratamento das religies na historiografia tradicional

    atravs do gnero milenar Histria da Igreja. Desde os anos vinte foi reconhecido, por

    alguns historiadores eclesisticos, que a Histria da Igreja se concentrava nos grandes

    personagens, nos dogmas, nas instituies, nas estruturas, na hierarquia, na santidade

    canonizada e nas teologias oficiais, com nfase em suas relaes com os governos,

    deixando de lado movimentos de idias, descrio de prticas e piedades populares,

    atividades missionrias etc. A particularidade da Histria da Igreja defendida por Joseph

    Lortz que a encara como participante da Teologia, meio pedaggico para a

    conscientizao da f catlica, atravs de personalidades que vivem a espiritualidade.6

    A renovao historiogrfica: os Annales.

    Voltada para si prpria, a historiografia tradicional se valia de conceitos poucos

    elaborados para explicar o processo histrico. Desde os anos vinte, surgiram novas

    preocupaes historiogrficas, fecundadas pela proximidade intelectual com a economia, a

    4 ARMSTRONG, K. Uma histria de Deus. So Paulo: Companhia das Letras, 1994. 5 GAARDER, J. e outros.O livro das religies. So Paulo: Companhia das Letras, 2000. 6 LORTZ, Joseph. Histoire de lglise. Paris: Payot, 1962, p.6.

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    demografia, a psicologia, a antropologia e a sociologia, e a religio passou a ser tratada

    outro de modo pelos historiadores. O veculo mais expressivo revista Annales, resposta

    aos desafios intelectuais colocados pelos contatos interdisciplinares para a compreenso

    histrica7.

    Exemplo desta nova abordagem o livro Os Reis Taumaturgos 8 que aproxima

    histria, antropologia e sociologia para abordar os ritos de cura e as legendas formadora do

    maravilhoso monrquico dos reis da Frana e da Inglaterra. Tais elementos, para Bloch,

    tm um sentido e ligao com a conscincia coletiva. O poder miraculoso atribudo aos

    reis estava inserido dentro de um outro contexto: a prpria crena nos milagres, e sua

    manipulao a favor da realeza. Esta realeza santa dominava a conscincia popular e foi

    utilizada e explorada por polticos hbeis, que por sua vez, compartilhavam dessas crenas

    comuns.

    A Nova Histria

    Com as obras de Marc Bloch e Lucien Febvre, a noo de mentalidade se tornou

    desafiadora na historiografia at meados dos anos noventa. Os volumes da coleo

    Histria: novos objetos, novas problemticas, novas abordagens, publicada nos anos 70,

    ampliaram a difuso destas novas preocupaes historiogrficas. O artigo de Dominique

    Julia que trata das relaes entre mentalidade e religio, j indicava a diferena entre a

    Nova Histria e a antiga Histria das Religies. Aps mapear e inventariar o campo, este

    autor considera que a religio explicvel pela organizao social, e constituiria

    7 BURKE, Peter. A Revoluo Francesa da Historiografia: A Escola dos Annales (1929-1989). So Paulo: Editora da UNESP, 1991. 8 BLOCH, Marc. Os reis taumaturgos: o carter sobrenatural do poder rgio: Frana e Inglaterra. So Paulo: Companhia das Letras, 1993.

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    representao destituda de privilgio da verdade como outros produtos culturais. 9 Seja a

    piedade, a teologia ou o clero, ensinam ao pesquisador sobre a condio social de um dado

    momento histrico. Para Julia, a nova historiografia deve realizar a critica da permanncia

    de concepes teolgicas na historiografia10.

    Outro exemplo da tica da Nova Histria a do historiador Jean Delumeau quando

    trata de aspectos da religiosidade catlica em A confisso e o perdo. Nela, aponta que no

    decorrer de suas pesquisas sobre o sentimento de segurana no Ocidente, durante os sculos

    XIV a XVIII, surgiram textos relativos confisso. A Igreja Romana confortava os fiis

    com o "perdo divino" mas lhes exigia uma confisso explcita. Isto gerou uma boa

    quantidade de discursos normativos, indicando para os padres como confessar os fiis e

    para os fiis como se confessarem. Delumeau brilhantemente vai alm da sua

    documentao explicita e indaga: "Mas, num plano bem diverso, ser que se destacou

    suficientemente at o presente o quanto os conselhos dos confessores fizeram progredir

    na psicologia coletiva a imagem moderna do pai? Em sua quase unanimidade, com

    efeito, eles pedem que os confessores sejam pais para os pecadores que acolhem. Ora,

    pai, nesse tipo de discurso, est sempre associado a ternura e perdo. .... H a uma

    contribuio decisiva modificao da imagem paterna, que, acrescentada promoo de

    so Jos na poca clssica, merece ser sublinhada numa histria das mentalidades"11.

    Delumeau, assim, se distancia da historiografia tradicional e percebe que a confisso

    ultrapassava as fronteiras do confessionrio e a dimenso de como a religio se ancorava no

    quotidiano familiar e social. Os exemplos poderiam ser multiplicados, com as obras de

    9 JULIA, Dominique. Histria religiosa. In LE GOFF, J. (org.). Histria: novas abordagens. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 108. 10 Idem, p. 121. 11 DELUMEAU, Jean. A confisso e o pecado. So Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 10.

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    Jacques Le Goff, George Duby, Keith Thomas, E. Le Roy Ladurie, Michel Vovelle, entre

    tantos outros.

    Desafios e possibilidades

    Os itinerrios da Histria das Religies ou as vrias possibilidades do tratamento

    histrico do fenmeno religioso, encontram guarida na produo atual.

    Tanto os Annales quanto a Histria Nova inovaram de dois modos o tratamento da

    religio. Primeiramente, no tocante noo de tempo que contrastava com a noo de

    temporalidade das abordagens anteriores da historiografia tradicional, mais circunscritas a

    um tempo breve e bem curto.

    A segunda inovao foi refazer as dimenses do objeto em cada pesquisa sobre a

    religio, por consider-la constituda por mltiplas facetas construdas social e

    historicamente. As categorias de classificao da religio foram repensadas e se enfatizou

    sua ligao com temas como o amor, a mulher, a criana, a famlia, a morte etc. Frente aos

    enfoques tradicionais, a religio deixou de estar isolada dos outros campos de saber e

    perdeu nitidez, mas ganhou em complexidade, porque novas relaes histricas vieram

    tona. Tais abordagens, at meados dos anos noventa, eram caracterizadas pela palavra

    mentalidade, que deixou de ser freqente na historiografia, cedendo o lugar para "cultura" e

    "imaginrio".

    Nos ltimos cem anos, o territrio dos estudos histricos ganhou dimenses mais

    ampliadas. A possibilidade de multiplicidade de abordagens lanou desafios para a anlise

    das religies. Por vezes, se buscou enfocar a religio em conexo com as estruturas sociais.

    Em outras, isto pouco importou, embora presente de maneira implcita. Alguns estudos

    buscam abordar a religio num contexto maior. Outros trabalham um aspecto como a

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    morte12, a feitiaria13 ou o medo14, entre tantos outros, constituindo o que chamado,

    impropriamente, de "o fracionamento do objeto". De qualquer modo, j no predomina a

    historiografia de grandes personagens, batalhas, datas e crenas em combate. Os

    pesquisadores se preocupam com o coletivo e com os indivduos fazendo parte de uma

    coletividade. A abordagem das crenas mudou, saindo da dicotomia ortodoxia e heresia e,

    agora, os historiadores querem saber acerca da interiorizao das atitudes perante situaes

    como a morte e o medo. No lhes mais suficiente explic-las pela "influncia", como

    antigamente. Falam de estruturas. Uns ousam mais, e buscam tais estruturas no

    inconsciente, individual ou coletivo. Outros preferem explic-las na correlao com o

    social e o econmico. Neste vaivm, a religio perdeu seus privilgios e abordada sempre

    em conexo com algum outro campo.

    Atualmente as abordagens histricas da religio se ancoram, de um lado, na histria

    cultural e, de outro, na histria do imaginrio. Tanto uma como outra, fundadas em noes

    ambguas: a histria do imaginrio contempla tanto as imagens quanto a fantasia; a histria

    cultural tomada como sinnimo das altas produes de sentimentos estticos e, tambm,

    de qualquer transformao que o homem realize na natureza e suas criaes espirituais,

    constituindo um mundo prprio, o da cultura. Uma obra ilustra estas novas perspectivas, A

    colonizao do imaginrio, de Serge Gruzinski que desloca a viso eurocntrica sobre a

    conquista mexicana: no busca nem uma apologia militar, nem a viso herica dos

    vencidos, nem a construo de sociedades europias na Amrica, ou sociedades indgenas

    destrudas. Trata de ver os atritos e as interfaces na construo de mundos se valendo, 12 RIES, P. Histria da morte no ocidente. Rio de janeiro: Francisco Alves, 1977. VOVELLE, M. Ideologias e mentalidades. So Paulo: Brasiliense, 1987. 13 GINZBURG, C. Os andarilhos do bem. So Paulo: Companhia das Letras 1988. THOMAS, K. Religio e o declnio da magia. So Paulo: Companhia das Letras, 1991. MANDROU, R. Magistrados e feiticeiros na Frana do sculo XVII. So Paulo: Perspectiva, 1979. 14 DELUMEAU, J. Histria do medo no ocidente. So Paulo: Companhia das Letras, 1989.

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    para isto, de muitos instrumentos disponveis das Cincias Humanas. exemplar a anlise

    dos sonhos de indgenas que empreende, pois desafia a encar-los como processo de

    interiorizao de novas situaes sociais e religiosas e como re-atualizaes de universos

    culturais (a antiga iniciao xamnica re-expressando a re-insero individual). Gruzinski

    no apresenta uma narrativa homognea, mas pontilhada por vrias expectativas surgidas

    pelo dilogo das fontes com reflexes tericas de leituras sobre o significado possvel de

    ser alcanado pelas Cincias Humanas, sem preocupaes fronteirias disciplinares. 15

    Com a criao da universidade, a partir da dcada de 30, a histria passou a ser um

    campo onde cada vez mais predominam profissionais, mas a principal rea de estudos

    continuou mantendo fidelidade com a preocupao das relaes entre Estado e Igreja.

    Seria preciso um outro lugar para examinar a produo brasileira dos historiadores

    voltada para a religio. Antroplogos e socilogos, em vrias oportunidades, realizaram

    balanos sobre seus estudos sobre as religies. Os historiadores esto ausentes nestas

    recenses. Ademais, ao elaborarem o mapeamento do prprio campo, os historiadores

    silenciam sobre a religio, a histria da Igreja e da religiosidade popular, apesar de

    comparecerem, nestes levantamentos, temticas renovadas na historiografia 16.

    Incorrendo em riscos de superficialidade, poderia apontar que a produo brasileira

    se caracteriza pelos mesmos desafios e possibilidades que o campo internacional coloca: a

    historiografia tradicional questionada e experincias com multiplicidades de abordagens.

    Desde os incios do sculo XX, escreve-se a Histria da Igreja no Brasil adotando-se os

    modelos da historiografia tradicional. Estes vigoram at a dcada de sessenta quando a

    Teologia da Libertao introduziu suas teorias na anlise da histria da Igreja brasileira. Por

    15 GRUZINSKI, Serge. A colonizao do imaginrio: sociedades idndigenas e ocidentalizao no Mxico espanhol. Sculos XVI-XVIII. So Paulo: Companhia das Letras, 2003. 16 FREITAS, Marcos Cezar (org.). Historiografia brasileira em perspectiva. So Paulo: Contexto, 2001.

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    outro lado, as obras mais marcantes de Histria do Brasil, no vis tradicional, enfocavam as

    relaes de Igreja e Estado. Religies indgenas surgiam como curiosidades. J as religies

    dos escravos africanos eram comumente ignoradas e silenciadas pelos historiadores, apesar

    de no inicio do sculo XX se perceber a riqueza religiosa encontrada na sociedade

    brasileira, como descreveu Joo do Rio em As religies do Rio, de 1904.

    Em alguns congressos acadmicos de historiadores, a religio comparece como um

    apndice a ser tolerado. de se notar, ainda, que algumas raras iniciativas procuram sanar

    esta ausncia, em encontros de historiadores17. A Associao Brasileira de Histria das

    Religies, promove anualmente seu encontro e muitas das pesquisas ai apresentadas foram,

    publicadas em forma de livro, pela Editora Paulinas18.

    17 LIMA, Lana Lage e outros. Histria da Religio. Rio de Janeiro: Faperj: Maud, 2002. 18 GUERRIERO, Silas org.). O estudo das religies: desafios contemporneos. So Paulo: Paulinas/ ABHR, 2003. SIERPIERSSKI, D. Paulo e GIL, Benedito M (org.). Religio no Brasil: enfoques, dinmicas e abordagens. So Paulo: Paulinas / ABHR, 2003.