Hayek versus Polanyi: Espontaneidade e Desígnio no Capitalismo
-
Upload
rafael-galvao -
Category
Documents
-
view
499 -
download
0
description
Transcript of Hayek versus Polanyi: Espontaneidade e Desígnio no Capitalismo
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE ECONOMIA DE SÃO PAULO (FGV – EESP)
RAFAEL GALVÃO DE ALMEIDA
HAYEK VERSUS POLANYI Espontaneidade e Desígnio no Capitalismo
São Paulo Novembro de 2010
2
RAFAEL GALVÃO DE ALMEIDA
HAYEK VERSUS POLANYI Espontaneidade e Desígnio no Capitalismo
Monografia apresentada à Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, como requisito para a conclusão do curso de graduação em Ciências Econômicas Campo de conhecimento: História do Pensamento Econômico Orientador: Ramón Vicente García Fernández
São Paulo Novembro de 2010
3
RESUMO
Este trabalho dedica-se a introduzir o conceito de ordem espontânea, seu desenvolvimento
através de diversas escolas de pensamento econômico e a importância para a sociedade atual.
É falado sobre a importância de Friedrich Hayek, já que ele tem o modelo mais conhecido de
ordem espontânea, como ele começou a elaborá-lo a partir da sua pesquisa sobre o papel da
informação na economia e sua maturação em Direito, Legislação e Liberdade. Como
contraponto ao modelo hayekiano, incluem-se críticas ao conceito e se analisa o trabalho de
Karl Polanyi. Ele divergia de Hayek sobre o papel do mercado na sociedade, ao afirmar que a
sociedade se protege da invasão do mercado nas demais esferas sociais através do processo de
duplo movimento. Por fim, conclui-se que a ordem espontânea existe, que o duplo
movimento, porque inicia-se com indivíduos antes de tomar forma legislativa, tem as
características necessárias para ser considerado um tipo de ordem espontânea e que o
anarquismo político é degenerativo como programa de pesquisa.
Palavras-chaves: ordem espontânea, duplo movimento, Friedrich Hayek, Karl Polanyi,
conhecimento tácito, mão invisível
4
ABSTRACT
This work is dedicated to introduce the concept of spontaneous order, its development
through many schools of economic thought and its importance to today’s society. It is talked
about the importance of Friedrich Hayek, since he has the most known model of spontaneous
order, how he started to elaborate from his research about the role of the information on the
economy and his maturation in Law, Legislation and Liberty. As a counterpoint to the
hayekian model, it is included criticism to the concept and the work of Karl Polanyi is
analyzed. He diverged from Hayek about the role of the market in the society, when he
affirmed that society protects itself from the invasion of the market in the other social spheres,
through the process of double movement. Lastly, it is concluded that there is spontaneous
order, that double movement, because it is started with the individuals before taking
legislative form, has the necessary characteristics to be considered a type of spontaneous
order and that political anarchism is degenerative as research program.
Keywords: spontaneous order, double movement, Friedrich Hayek, Karl Polanyi, tacit
knowledge, invisible hand
5
ÍNDICE
Desenvolvimento histórico e teórico ..........................................................................................6 1. Introdução...........................................................................................................................6 2. Definição do termo .............................................................................................................6 3. O conceito na história .........................................................................................................8
3.1. Escola de Salamanca ...................................................................................................9 3.2. Século XVIII .............................................................................................................10 3.3. Iluminismo escocês ...................................................................................................12 3.4. Adam Smith e a mão invisível...................................................................................13 3.5. A Escola Austríaca ....................................................................................................14
4. Teoria dos jogos ...............................................................................................................15 Hayek e a ordem espontânea ....................................................................................................17
1. Breve biografia pessoal e intelectual ................................................................................17 2. A guerra de Hayek contra o socialismo: O debate do cálculo econômico .......................19 3. O papel do indivíduo ........................................................................................................23 4. Liberdade e informação ....................................................................................................25 5. A ordem espontânea para Hayek em Direito, Legislação e Liberdade ............................26
A intervenção humana na ordem atual .....................................................................................30 1. Crítica plural à ordem espontânea ....................................................................................30 2. O pensamento de Karl Polanyi .........................................................................................32
Conclusão .................................................................................................................................38 Bibliografia...............................................................................................................................43
6
DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO E TEÓRICO
Nenhum corpo existente de leis pode ser construído apenas por puro raciocínio abstrato, porque a imensa complexidade de um processo legal torna impossível representar seus elementos em poucas máximas simples.
Sir Matthew Hale, parafraseado por Norman Barry1.
Sabemos mais do que podemos dizer [que sabemos]. Michael Polanyi.
1. Introdução
O que têm em comum um movimento de preços numa feira de tomates de mesma qualidade,
um grupo de skatistas que usam uma área para andar de skate e não trombam entre si
frequentemente (KLEIN, 2006), regras sobre como pegar lenha após uma tempestade em um
vilarejo costeiro da Inglaterra (SUGDEN, 1989) e uma vizinhança segregada com moradores
tolerantes (BOWLES, 2003, p. 56)? Todos esses resultados surgiram da interação de
indivíduos que estavam pensando em si mesmo e assim eles puderam criar uma organização
adequada para seus fins entre si. Essa é a definição mais concisa de ordem espontânea, a
idéia de que muitas instituições surgem naturalmente na sociedade, sem interferência de um
poder superior, comumente identificado como o governo, mas sim através de interações
individuais. A mais famosa metáfora é a de Adam Smith, em que se referindo aos resultados
industriais explica que “é só levado a um fim que não era parte de sua intenção” (SMITH,
2003, p. 203). O termo “ordem espontânea” foi primeiramente usado pelo economista
Wilhelm Röpke (BLADEL, 2004).
2. Definição do termo
1 Está implícito que todas as traduções foram feitas pelo autor.
7
Uma das características da teoria da ordem espontânea é que não há teoria sistematizada da
ordem espontânea. Os autores, tanto defensores quanto críticos, falam sobre “conceito”,
“idéia”, “doutrina” da ordem espontânea, mas nenhum deles utiliza a palavra “teoria”. O
único elemento que é consenso para todos os estudiosos do tema é que deve ser incorporado o
individualismo metodológico, no sentido de se utilizar o indivíduo como base para a análise.
Para Barry (1982), uma teoria da ordem espontânea precisa englobar individualismo
metodológico, racionalismo construído por um processo natural e lei natural, embora não no
sentido racionalista, isto é, no sentido de se permitir a intervenção pró-ativa do Estado na
economia2.
Enquanto isso, Mulligan (2004)3 organiza fatos estilizados que caracterizam ordem
espontânea, nas ciências sociais (ou na sociedade) entre eles, a) referência proeminente aos
costumes passados (path dependence) e respeito pela tradição; b) acumulação de um grande
número de pequenas mudanças incrementais; c) valorização da neutralidade, o que permite
aos indivíduos escolher livremente de acordo com suas preferências; d) foco no planejamento
individual dos processos, não do resultado; e) algum nível de incerteza para deixar que o
resultado final seja determinado pelos participantes; f) e um tipo de seleção natural entre as
instituições.
Por fim, um conceito relativamente ignorado na definição de ordem espontânea refere-se ao
conhecimento tácito, conceito elaborado por Michael Polanyi (2009), irmão de Karl Polanyi.
Neste trabalho, ele inicia com uma discussão sobre o papel do Estado no progresso científico,
2 Hayek faz uma distinção eloquente entre esses dois em seu ensaio Individualism: True and False em seu livro Individualism and Economic Order. 3 Mulligan cita sete características em seu artigo, mas considerei que a primeira e a sexta característica eram praticamente idênticas.
8
narrando como, devido às doutrinas de Lysenko, a pesquisa científica na União Soviética
ficou extremamente prejudicada; não houve nenhum progresso a não ser na área relativa à
indústria bélica e nuclear (que, a propósito, não estavam sob o efeito das doutrinas
lysenkoistas). Isso ocorreu porque a busca pelo progresso científico deixou de ser um fim em
si mesmo. Isso, para ele, prejudica o desenvolvimento científico porque pressupõe que um
corpo de governo como o Estado consegue ter domínio sobre a direção do progresso
científico. Não pode ocorrer isso, porque, para Polanyi, o conhecimento adquirido através de
vias não-técnicas, como experiência e até intuição, é tão importante quanto o teórico, ou
explícito, como ele próprio coloca: “uma teoria matemática só pode ser construída se for
precedida de elementos que contenham conhecimento tácito” (POLANYI, 2009, p. 21), como
o conhecimento válido do problema, a capacidade do cientista de persegui-lo, guiado pel seu
senso de se aproximar da solução e antecipação das implicações, ainda, indeterminadas no
fim. E como o conhecimento tácito difere de um cientista para outro, há a possibilidade de
renovar e desenvolver o conhecimento científico, em que os cientistas vigiam uns aos outros
(princípio do controle mútuo), sem precisar de uma autoridade central, embora ela esteja
presente quando for útil; o ponto principal é que, com a presença do conhecimento tácito, os
agentes têm a oportunidade de se organizarem independentemente, o que favorece a criação
de uma ordem espontânea.
3. O conceito na história
A noção de ordem espontânea pode ser traçada até alguns filósofos da antiguidade4. Boehm
(1994) afirma que há indícios de idéias semelhantes em Aristóteles e Tomás de Aquino. Mas
os primeiros esboços de uma teoria de ordem espontânea surgiram na Espanha do século XVI.
4 O antigo economista Monchretién amaldiçoou Platão e Aristóteles por acreditarem que certas coisas podiam ser organizadas sem planejamento.
9
3.1. Escola de Salamanca
A chamada Escola de Salamanca, um centro do escolasticismo espanhol durante os séculos
XVI e XVII foi conhecida por suas análises econômicas da época. A escola escolástica estava
alinhada com o pensamento comercial nascente da época. Como era o período de transição
final do feudalismo para o capitalismo pós-medieval, os comerciantes precisavam legitimar
suas práticas. Nos países protestantes, a própria Reforma já provia uma legitimação ao elevar
a categoria do comerciante, como já foi largamente estudado (e.g. A Ética Protestante e o
Espírito do Capitalismo, de Weber). Nos países católicos, o comerciante ainda era visto como
um profissional inferior, assim como foi durante todo o período medieval, mas a Escola de
Salamanca possibilitou uma legitimação para as atividades comerciais no contexto católico.
A Escola de Salamanca nunca sistematizou suas idéias, mas seus escritos demonstravam
entendimento avançado dos processos econômicos, como na teoria do valor5, quando eles
verificaram que o influxo de metais preciosos das colônias espanholas aumentava o nível de
preços em toda a Europa, e as contínuas intervenções na quantidade de moeda, disse o jesuíta
português Luis de Molina, apenas “faziam com que público ficasse pior” (apud BARRY,
1982). O principal reabilitador da teoria econômica escolástica, Schumpeter afirma que “o
que faltava (neles) era o conceito de margem” (idem).
Outro aspecto importante para se entender porque o escolasticismo de Salamanca pode ser
considerado um precursor do conceito de ordem espontânea é a ênfase no indivíduo, fato tão
5 Para Diego de Covarrabias, “o valor de um artigo não depende de seu valor natural, mas da estimação dos homens, mesmo que seja falha” (apud BARRY, 1982).
10
salientado por Hayek. Eles eram antimonopolistas porque acreditavam que o monopólio do
mercado explorava os consumidores.
3.2 Século XVIII
Durante o século XVIII, houve dois eventos muito importantes para a tradição da ordem
espontânea: o primeiro foi o reconhecimento da common law, o direito consuetudinário, como
o sistema legal da Grã-Bretanha, que baseia a jurisprudência nos costumes e regras de bolso,
graças aos esforços do jurista sir Matthew Hale. Hoje em dia, há vários estudos sugerem que a
common law foi um elemento fundamental para possibilitar os países anglo-saxões se
desenvolverem, em contraposição ao direito romano, codificado.
O segundo foi a revolução científica, pela qual vários progressos científicos permitiram uma
maior compreensão do mundo e entre eles se destaca a física newtoniana. Uma característica
importante do modelo newtoniano é que permitia dar uma explicação racional da natureza
sem intervenção do homem, como colocou Bianchi (1988):
A ampla disseminação da física newtoniana faz com que a natureza seja encarada como um sistema de forças plenamente articulado, passível de entendimento, mensuração e manipulação [...] o Tableau Economique, do Dr. Quesnay, de 1758, embora inspirado no movimento de circulação do sangue, explicita de forma inequívoca uma concepção mecanicista da economia. Num quadro de três colunas, com seis pontos de partida e chegada, o domínio econômico é apresentado como um conjunto harmônico, em que cada parte cumpre uma função insubstituível na manutenção do todo. É o universo-máquina, o universo-relógio de funcionamento impecável, decomponível em elementos de extrema complexidade, mas, em princípio, acessível aos sentidos e mensurável. Abandona-se em definitivo a pretensão medieval de conhecer essências e causas finais, ao mesmo tempo em que a matemática é mantida como a grande ferramenta de trabalho, na prática das ciências empíricas (BIANCHI, 1988, p. 76, grifo acrescentado).
11
Em 1705, o médico holandês radicado na Inglaterra Bernard de Mandeville chocou a opinião
pública com seu poema The Grumbling Hive6. A polêmica reside no fato de que Mandeville
nos conta a história de uma colméia na qual suas habitante aladas eram interesseiras,
invejosas, egoístas, verdadeiras patifes, mas que os vícios naturais de cada uma contribuíam
para a prosperidade global da colméia.
Muitas interpretações já foram feitas sobre esta obra. Barry (1982) reconhece que é difícil
encaixar Mandeville em um grupo de pensadores. Como a obra dele tem uma natureza
satírica, ele não tinha muita preocupação em ser cientificamente claro. É possível deduzir que
Mandeville desafiou a noção de que boas leis fazem bons cidadãos, que data desde
Aristóteles7, ao propor que “a noção moderna de que regras certas de governança podem fazer
com que motivos egoístas possam promover bem-estar geral” (BOWLES, 2003, p. 475),
enfatizando o papel das instituições8.
Basicamente ele acreditava numa sociedade mista em que o governo poderia fazer com que o
egoísmo humano inato trabalhasse a favor da sociedade, porém considerava que “o indivíduo
era logicamente anterior à sociedade” (DUMONT, 1977, p. 65) e, ao separar a economia da
moral. Para ele existe um mecanismo automático do sistema econômico que conduz ao bem
público e, quando ele não pudesse ser demonstrado, em outras palavras, falhava, o mecanismo
moral reafirmaria seu poder e autorizaria a intervenção política para o restabelecimento da
ordem (idem, p. 79).
O autor deduz em seu argumento uma equivalência entre dois sistemas, o moral e o econômico, que representam duas visões do sistema social. No sistema social da moralidade, vemos que os sujeitos ou agentes internalizam
6 Comumente mal-traduzido como A Fábula das Abelhas, que é o título do livro posterior dele, sobre o mesmo assinto. A tradução literal seria A Colméia Barulhenta. 7 Aliás, o primeiro a desafiar esse conceito foi Maquiavel, em sua obra-prima O Príncipe. 8 Ele mesmo considerava a moralidade algo “desenvolvido por políticos habilidosos para fazer com que os homens fossem úteis e tratáveis uns com os outros” (apud BARRY, 1982).
12
a ordem social sob a forma de regras morais, cada uma definindo sua conduta indiretamente, ao se referir à sociedade como um todo. No sistema econômico, pelo contrário, cada sujeito define sua conduta apenas relativa a seu próprio interesse, e assim a sociedade não é nada mais que o mecanismo – ou a Mão Invisível – pelo qual os interesses se harmonizam. Este mecanismo estava implícito no início e que, uma vez descoberto, como por Mandeville, justifica condutas egoístas e não sociais de todos. (idem, P. 75).
Portanto, pode-se concluir que no sistema econômico, Mandeville acreditava numa ordem
espontânea, porém de nada valeria se não tivesse instituições morais fortes, e, para ele, essas
podiam ser construídas. Talvez Mandeville se aproxime mais do paradigma neoclássico do
que da escola austríaca.
3.3. Iluminismo escocês
O iluminismo escocês foi o maior propagador do individualismo como base da metodologia
(embora ainda não seja exatamente o individualismo metodológico), e tem seus principais
expoentes David Hume, Adam Ferguson e Adam Smith. A sociedade seria explicada em
termos de impulsos naturais, como auto-interesse e instinto, com pouca ou nenhuma
interferência de um planejador.
David Hume, um dos mais abrangentes filósofos do Iluminismo escocês, era também um
cético, principalmente em relação à razão humana. Ele não acreditava muito na idéia de que
regras poderiam ser criadas e impostas para melhoria da sociedade e acreditava que isso só
ocorreria se as regras que servem ao interesse das pessoas fossem observadas e estudadas.
Porém essas regras surgiriam espontaneamente, no sentido de Hayek, em suas palavras, “auto-
interesse é a verdadeira origem [da determinação] das regras de propriedade, direito e
obrigação” (apud BARRY, 1982).
13
Outro expoente importante é Adam Ferguson, considerado o pai da sociologia moderna. Em
sua obra An Essay on Civil Society, ele defende que a sociedade comercial surgiria
espontaneamente, através do ajustamento das reações das pessoas às circunstâncias. Sua
descrição está na segunda seção do terceiro livro, chamada The history of political
stabilishments, e se encaixa muito bem com as definições modernas de ordem espontânea. Ele
busca descrever como a sociedade evolução, desde o estágio da barbárie até a sociedade
comercial, mas, diferente de Hobbes, não há contrato social, apenas através do intercâmbio e
combinação de seus interesses. Como ele mesmo falou, “nenhuma constituição é formada por
acordo, nenhum governo é copiado de um plano” (FERGUSON, p. 228).
Ainda assim há uma mistura curiosa em Ferguson; seu pensamento não inclui apenas uma ética voluntária que enfatiza a atividade e a benevolência [...], mas também um reconhecimento do fato que os homens são geralmente governados pelo auto-interesse e que o interesse público é alcançado assim que cada pessoa se importar com seu próprio bem-estar. Isto reforça a opinião de Hayek que a teoria da ordem espontânea não depende necessariamente de um axioma de auto-interesse, mas apenas da idéia de que estruturas sociais agregadas e ordenadas podem ser traçadas das ações de indivíduos que não tinham a intenção de criá-las assim (BARRY, 1982).
Ainda assim, Ferguson era cético em relação ao resultado social decorrente; ele acreditava
que a sociedade comercial poderia alienar o homem dos valores éticos, como espírito público
e cavalheirismo, enfim, que o auto-interesse não conseguiria sozinho segurar uma sociedade.
3.4. Adam Smith e a mão invisível
Adam Smith é outro grande pensador que, se fossem empilhados todos os livros e artigos que
tentam interpretar sua obra, daria para se ter um prédio de uns 10 metros. Sendo partidário do
iluminismo escocês, ele demonstra sua sabedoria em duas obras: Teoria dos Sentimentos
Morais e A Riqueza das Nações, e o ponto que une ambas é a análise das paixões humanas e
como isso explica a sociedade. A ordem é criada, independente da vontade dos estadistas ou
14
mercantes, mas só poderia se tornar uma ordem boa se o Estado pudesse calibrá-la. Camargos
(2001) comenta que:
Se o estadista optasse pela abordagem de Smith, deveria, primeiramente, ter o conhecimento histórico do contexto da nação que dirige para aprender o comportamento da população face às suas motivações e levar em consideração que: 1) o resultado social beneficente é essencialmente auto-regulado pelas forças do mercado e as instituições sociais; e 2) nas eventuais, mas prováveis, falhas de mercado, é dever do Estado adiantar-se nos ajustes e aprimoramentos institucionais que se fizerem necessários para atenuá-las e corrigi-las. De outra forma, a mão invisível do mercado explana o resultado social beneficente, mas sob o auxílio da mão benevolente e justa do Estado. E é claro, todos estes termos devem ser apreendidos segundo o que foi exposto por Smith. (CAMARGOS, p. 134, grifo no original).
Portanto, Adam Smith, diferente de Hobbes e Mandeville, e também de Hayek, acreditava que
a intervenção estatal deve vir após a criação por ordem espontânea, não antes.
Após a introdução do utilitarismo, o programa de pesquisa da ordem espontânea foi deixado
de lado durante quase todo o século XIX. O utilitarismo, como colocado por Jeremy Bentham,
e os dois Mill pregava que o objetivo do governo era aumentar o bem-estar da sociedade
através da elaboração de leis e instituições. Entre os que continuavam a acreditar na
espontaneidade como a melhor resposta aos problemas, estavam os seguidores de Fréderic
Bastiat e Herbent Spencer, mas, no final do século XIX, surgiu a Escola Austríaca, de Carl
Menger, que renovou o interesse pelo tema.
3.5. A Escola Austríaca
Carl Menger, em sua obra Problems in Sociology and Economics, contrariando o pensamento
corrente, dizia que “o comportamento [dos agregados sociais] é explicável apenas em termos
15
individualistas... Língua, religião, lei, até mesmo o Estado [...] não se pode falar que houve
ação proposital da comunidade para estabelecer essas coisas” (apud BARRY, 1982)9.
O foco de toda a escola austríaca está no indivíduo. “Apenas o indivíduo é real; a sociedade é
o efeito líquido de ações individuais” (CLARK, 1993), e é, portanto o indivíduo que melhor
pode escolher o resultado social, ou seja, se cada indivíduo agir em seu próprio proveito, o
resultado social será benéfico. Assim ele não deve sofrer interferência em suas ações, por isso
os austríacos vêem o governo com tantas suspeitas. Para eles, o governo jamais deve interferir
no processo de decisão do indivíduo, coagi-lo, porque o resultado social será sub-ótimo. Na
verdade, uma vertente de pensadores ainda mais radicais se separou da escola austríaca e
criou a escola anarcocapitalista, que prega a eliminação do governo para o funcionamento
correto da sociedade de mercado.
Assim, sendo influenciado pela escola austríaca, Hayek pôde criar um sistema no qual o
conceito de ordem espontânea pode ser crucial para a manutenção da sociedade,
diametralmente oposto ao de pensadores como Karl Polanyi, mas por enquanto apenas vou
citar o fato; o desenvolvimento do argumento dos dois autores estará nas próximas seções. Por
fim, será discutida a importância do conceito de ordem espontânea para a teoria dos jogos.
4. Teoria dos jogos
Desde os jogos mais simples até os mais complexos que são utilizados para modelagem
computacional, é necessário que pelo menos dois agentes interajam10, e se alcança um
9 Um ponto a favor de se considerar a linguagem como surgida de um processo espontâneo é o fracasso de uma língua construída, como o esperanto, de se difundir. 10 Embora existisse no começo os jogos com um jogador, em que este “jogava” contra a natureza, não são mais ensinados aos graduandos.
16
resultado que não tem interferência externa. Um exemplo básico é o jogo do dilema dos
prisioneiros. O resultado é que se os dois prisioneiros cooperam, eles ficariam melhor, mas
como o incentivo à não cooperar é muito grande, suas situações finais acabam sendo de fato
piores. Não se tem objetivo nesse jogo, apenas o resultado11. Um dos formalizadores da teoria
dos jogos, Oskar Morgensten era um economista contemporâneo de Hayek, e o sucedeu na
diretoria do instituto que o último ajudou a fundar e, apesar de nunca se referir como
economista da escola austríaca, é considerado por várias vertentes desta escola como um
inovador da área. Schotter escreveu que “em termos econômicos [a teoria de Von Neumann-
Morgensten] deve ser apreciada como um marco na evolução da Escola Austríaca” (apud
FOSS, 1999).
Como a interação social dos indivíduos nesses jogos não tem objetivo definido, isto é
extremamente útil para se fazer simulações. Uma simulação não tem um objetivo definido,
apenas testa o que acontece se uma variável de um modelo for modificada. Os modelos
econômicos de agentes computacionais fazem exatamente isso. Vriend relata que Hayek dizia
que “para entender um rato e porque ele faz o que faz, devemos nos tornar como um rato”
(VRIEND, 2002), e num modelo computacional pode-se simular o que um rato teórico faria12,
embora ainda haja dúvidas se este tipo de modelagem é tecnicamente formal.
11 Jogos com objetivo seriam os leilões, por exemplo, que obrigatoriamente necessitariam de um desenhista. 12 Vriend também realça que os modelos são abstrações da realidade, não uma replicação dela.
17
HAYEK E A ORDEM ESPONTÂNEA
Pode ser de longe a mais difícil e a não menos importante tarefa da razão humana compreender racionalmente suas próprias limitações. Friedrich Hayek A civilização avança graças à ampliação do número de operações importantes que podemos realizar sem pensar. Alfred North Whitehead
Friedrich Hayek foi sem dúvida o maior propagador do conceito de ordem espontânea. Mas,
para entender como se originou, é necessário pesquisar sua biografia, entender o que ele tinha
em mente para chegar a esse tópico.
1. Breve biografia pessoal e intelectual
Friedrich Augustus von Hayek nasceu em 1899, numa família de intelectuais. Seu pai era
botânico e professor na Universidade de Viena e era primo em segundo grau de Ludwig von
Wittgenstein. Após servir no exército Austro-Húngaro, durante a Primeira Guerra Mundial,
matriculou-se na Universidade de Viena, onde iniciou seus estudos em Direito. Em 1921
doutorou-se em Direito e em 1923, em Ciência Política. Nesse período, ele entrou em contato
com as idéias de Ludwig von Mises, que rejeitava o socialismo como alternativa para reduzir
e reverter a pobreza austríaca do pós-guerra (um dos motivos primários que levou Hayek a
estudar Economia).
Seu interesse em economia monetária levou-o a se tornar o primeiro presidente do
Österreichisches Institut für Konjunkturforschung (Instituto Austríaco para Pesquisa dos
Ciclos de Comércio), que mais tarde serviu para propagar a teoria austríaca dos ciclos de
18
comércio. Em 1931, ele assumiu uma cadeira na London School of Economics, instituição na
qual ficaria quase duas décadas. Estando nessa escola, ele entrou em controvérsia com Keynes
e Sraffa, em relação à política monetária. Ele também se envolveu na controvérsia do cálculo
econômico em regimes socialistas, de onde começou a desenvolver suas teorias sobre a
importância da informação como elemento constitutivo no mercado.
Após a publicação da Teoria Geral de J. M. Keynes (1936), Hayek ficou fora de cena por
alguns anos, período no qual publicou sua Pure Theory of Capital (1941), que procurava dar
um novo entendimento ao papel do investimento e do capital na economia. Hayek só voltou a
aparecer para o público em geral quando foi publicado O Caminho para a Servidão, em 1944.
Neste livro, Hayek defendia o mercado livre e procurava dar um embasamento econômico à
guerra contra o fascismo. Foi também durante esse período que ele compilou o livro
Individualism and Economic Order (1948), que organizava as primeiras idéias do conceito de
ordem espontânea.
Em 1950, ele se mudou para a Universidade de Chicago, e permaneceu lá até 1962, quando se
mudou novamente, desta vez para a Universidade de Freiburg. Durante esse período, até
1974, ele ficou relativamente esquecido. Nesse período, ele desenvolveu trabalhos em
psicologia, no qual ele explorou transversalidades entre esta ciência, economia e direito, como
em The Counter-Revolution of Science (1952), The Theory of Complex Phenomena (1964), no
qual ele desenvolve estudos em complexidade e ordem espontânea. Também, em 1973, ele
começa a escrever a sua magna-opus Law, Legislation and Liberty, que seria completado em
1979, com três volumes.
19
Como já foi dito, Hayek era apenas um intelectual não muito badalado, especialmente entre os
economistas, cuja atenção nesses anos estava voltada aos teóricos macroeconômicos da época,
como Friedman e Lucas, ou aos microeconomistas que desenvolveram a abordagem neo-
walrasiana, como Arrow, Debreu ou Hahn. Isso mudou quando Hayek recebeu o prêmio
Nobel de Economia em 1974, dividido juntamente com Gunnar Myrdal, “pelo trabalho
pioneiro na teoria monetária e flutuações econômicas e pela análise penetrante da
interdependência de fenômenos econômicos, sociais e institucionais.”13 A sua palestra se
denominou A Pretensão do Conhecimento, no qual ele alerta para a atitude “cientista” (que
ele descreveu anteriormente em The Counterrevolution of Science), na qual alerta que os
economistas, na ânsia de copiar os procedimentos de ciências como a física14, acabaram
contribuindo mais do que deveriam para a crise da década de 1970. Hayek reafirmou sua
teoria de que os preços representam essencialmente informação, e que esta é escassa, e que a
economia clássica trabalha com variáveis em que é difícil ou até impossível obter informação
precisa. Ele também afirma que a economia é uma ciência em que se deve considerar
“fenômenos de complexidade organizada”, cujas estruturas “não dependem apenas das
propriedades dos elementos individuais de que elas são compostas, e da frequência relativa
com que eles ocorrem, mas também na maneira que os elementos estão conectados” (Hayek,
1974). E, Hayek declara, esses fenômenos são impossíveis de serem totalmente computados
por um único observador.
2. A guerra de Hayek contra o socialismo: O debate do cálculo econômico
13 http://nobelprize.org/nobel_prizes/economics/laureates/1974/index.html ; o interessante é que Myrdal era um dos mais conhecidos teóricos social-democratas, ficando indignado com o fato de ter que dividir o prêmio com alguém com visões tão opostas à dele, tanto é que ele só fez sua palestra sete meses depois de Hayek. Isso também originou a observação irônica de que a economia é a única ciência que dá um Nobel para duas pessoas que falam coisas opostamente diferentes (a redundância é intencional). 14 Atualmente, com os avanços na física quântica, muitos físicos passaram a contestar a solidez da física como ciência exata.
20
Para entender como Hayek deu origem ao conceito de ordem espontânea, é necessário discutir
sobre uma controvérsia que se deu durante a década de 1930: o debate do cálculo econômico
em uma economia planejada.
O debate começou um pouco antes do início da Primeira Guerra Mundial, mas tomou força
quando Ludwig von Mises publicou em 1920 um artigo em que afirmava categoricamente que
é impossível uma economia planejada funcionar eficientemente. Caldwell (2003) afirma que o
teórico que Mises tinha em mente era Otto Neurath, que afirmava que o planejamento
econômicos dos tempos de guerra poderia ser levado adiante em tempos de paz, através de um
sistema de “contas nacionais” (não relacionado com o termo atual) que faria com que
atendesse objetivamente as necessidades de cada pessoa, física ou jurídica; em tal situação, e
que o dinheiro seria dispensável e uma economia poderia funcionar sem moeda. Como Mises
era um teórico monetário, e um dos fundamentos da Escola Austríaca é que a moeda emergiu
através de um processo de ordem espontânea, ele rechaçou esse argumento (o argumento de
uma economia sem moeda também não teve boa acolhida entre outros socialistas).
Contrariamente, Mises afirma que “quando não há um mercado livre, não há mecanismo de
preço; sem um mecanismo de preço, não há cálculo econômico” (MISES, 1920), ou seja,
apenas num mercado que não fosse controlado por um poder como o Estado é que os agentes
poderiam livremente estabelecer preços, fazer transações e alcançar estabilidade, algo que um
planejador central socialista jamais poderia fazer.
Hayek, quando entrou para a universidade, era um socialista fabiano mas, após conhecer
Mises, tornou-se um liberal e, durante a década de 1930, engajou-se em dois debates: um
sobre teoria do capital e ciclos econômicos contra Keynes e Sraffa, o qual não obteve bons
resultados, e no do cálculo econômico. Ele foi o editor de Collectivist economic planning:
21
Critical studies on the possibilities of socialism, um livro que procurava refutar o
planejamento econômico central.
O argumento dos socialistas da época era que o governo socialista podia emular as qualidades
que eles consideravam positivas do mercado através do poder do governo voltado para a
promoção do bem-estar do trabalhador numa sociedade, teoricamente, sem classes. Henry
Dickinson acreditava que, através do modelo walrasiano, poder-se-ia calcular quantidades e
preços ótimos em qualquer economia, tanto socialista quanto capitalista. O problema, então,
do planejador central era simplesmente montar o modelo (CALDWELL, 2003). Mas o
economista socialista pioneiro foi Oskar Lange. Em seu livro On the economic theory of
socialism, ele argumentava que se preços fossem entendidos como custos de oportunidade,
isto é, “termos no qual alternativas são fornecidas”, a fixação de preços seria apenas uma
peculiaridade do sistema capitalista. Então, numa economia socialista, os preços seriam dados
por um certo “comitê de planejamento central”. Com isso, as firmas não existiriam para
maximizar lucros, mas para fornecer bens à sociedade seguindo o critério “a cada um segundo
sua necessidade”, e o mecanismo de entrada e saída de firmas seria emulado por meio de
expansão ou contração da atividade. Problemas na fixação de preços seriam corrigidos por
meio de tentativa-e-erro. Haveria também um mercado de bens de consumo livre, mas um
mercado de bens de capital controlado, o que eliminaria a desigualdade de renda. Interessante
notar que, posteriormente, Lange se dedicou ao estudo da estatística15 e da cibernética, pois
ele acreditava que avanços na ciência da computação permitiriam ao planejador fazer um
sistema de equações computacional que simplesmente resolveria o “sistema de equações de
15 Ele se tornou posteriormente um dos pais da econometria. Para uma defesa do ponto de vista marxista, ver COTTRELL & COCKSHOTT (1993).
22
uma economia”. Uma tentativa de levar a cabo essa idéia foi o projeto Cybersyn, que foi
desenvolvido durante o governo de Salvador Allende no Chile16.
Em sua resposta, Hayek17 colocou a dificuldade de se obter a informação necessária para tal
empreendimento, de como formular as equações, de como o sistema era incapaz de se adaptar,
enfim, seria um esforço completamente infrutífero tentar fazer um modelo walrasiano
completo da economia para criar artificialmente um sistema socialista de preços justo para a
nação. Em seus dois artigos, Economics and Knowledge (1937) e The Use of Knowledge in
Society (1945) ele argumenta que nenhum planejador central tem informação suficiente para
decidir o que é melhor para a sociedade, porque, “o conceito de equilíbrio [geral] é de
nenhuma significância” (HAYEK, 1937). O problema surge com a expressão “informação
dada”, que é um conceito relevante para modelos teóricos, mas não se aplica à realidade.
Então, Hayek começou a desenvolver uma teoria com ausência de um equilíbrio geral na
economia. Faltaria ao planejador central não só saber as quantidades necessárias para o
cálculo, mas também quais delas seriam relevantes.
Sua mais conhecida investida contra o pensamento socialista foi o livro O Caminho da
Servidão (1944). A tese principal do livro é que se a sociedade entregar o controle dos meios
de produção ao Estado, mesmo que em condições democráticas, vai acabar levando
ultimamente à perda de liberdades individuais e dominação da ideologia estatista, porque a
ideologia estatista teria que passar por cima do indivíduo para realizar suas políticas. Para ele,
a liberdade individual é inviolável18, porque só através dela uma sociedade com um mercado
16 Para mais informações, ver MEDINA (2006). 17 Ele também colocou o problema de incentivos, abrindo caminho para a pesquisa da teoria da escolha pública, que não é o foco do presente trabalho. 18 Para ele, uma das funções necessárias do Estado é garantir a liberdade individual, ao, por exemplo, impedir energicamente a formação de monopólios (diferente do que vários economistas austríacos argumentam, Hayek admitia a possibilidade de monopólios, talvez seja por isso que ele afirmou que “nada tenha sido mais prejudicial
23
competitivo pode florescer. Embora neste livro ele não tenha tocado muito na questão do
conhecimento, seus pressupostos estão implícitos, como quando fala que a concorrência é um
método de coordenação de esforços, sem intervenção coercitiva (HAYEK, 1990, p. 58).
O saldo do debate foi que Lange provou que uma economia socialista planificada poderia
funcionar teoricamente, tanto é que posteriormente, em 1967, ele escreveu que simplesmente
“podia-se colocar as equações simultâneas num computador eletrônico e obteríamos a solução
em alguns segundos” (LANGE, 1967, p. 158). Porém, pode parecer fácil falar, mas a crítica
de Hayek ainda é relevante na era da economia digital. Medina (2006), ao comentar sobre o
fracasso do projeto Cybersyn, fala que “[o] Trabalho, não se comportou como um fator de
produção, mas como um corpo de indivíduos auto-conscientes capazes de criticar e resistir ao
sistema.” Como o mercado é um sistema no qual os indivíduos estariam mais preparados a
reagir em resposta a choques imprevistos, ainda seria melhor do que uma economia planejada.
E então, como o mercado é uma ordem que não necessita de um planejador, seria capaz de se
auto-regular, com isso lançando com isso as bases do conceito de ordem espontânea, que ele
desenvolveria em alguns anos após o fim da Segunda Guerra Mundial.
3. O papel do indivíduo
Na visão econômica de Hayek, o indíviduo tem um papel importante, como se fosse um tijolo
na construção de um prédio. De acordo com Caldwell, Hayek tinha uma noção de
individualismo metodológico bem diferente do modelo neoclássico. Ele, Hayek, não
acreditava que o Homo oeconomicus deveria ser adotado como base de análise teórica, por ser
irreal e levar ao conceito de competição perfeita que, na opinião dele, empobrecia a análise
à causa liberal... do que o laissez-faire” (HAYEK, 1990, p. 39). Caldwell (2003) sugere que Hayek não aprovaria eventos como a mal-fadada privatização russa pós-soviética.
24
econômica ao induzir a um entendimento falho de competição. Para Hayek o indivíduo não é
perfeitamente racional, não tem informação incompleta, mesmo que persiga seus próprios
interesses não precisa ser sempre considerado egoísta, seus gostos e preferências não são
estáveis; e o individualismo deveria levar a uma teoria da sociedade (CALDWELL, 2002, p.
289, 290). Apenas duas proposições pertencentes ao conceito de Homo oeconomicus são
mantidas: a idéia a origem dos gostos e preferências não é importante, pelo menos para a
maior parte da análise econômica, e a visão de que no indivíduo é onde começa a análise
social.
Caldwell também argumenta que Hayek não era muito focado no individualismo, preferindo a
análise social de agregados por meio do processo evolucionário de ordem espontânea; nessa
perspectiva “os indivíduos estão lá, mas eles são mantidos implicitamente” (ibid.). Hayek
escreveu poucos textos que falavam diretamente sobre o individualismo19, mas a preocupação
dele com o indivíduo é patente.
Em seu artigo Individualism: True and False, ele argumenta que o termo “individualismo” é
passível de muita distorção, a ponto de ele declarar: “quase me arrependo de relacionar um
termo tão abusado e pouco entendido com os ideais em que acredito” (HAYEK, 1980, p. 3).
Neste artigo ele também afirma que a primeira coisa a ser dita sobre o verdadeiro
individualismo é que é “uma teoria da sociedade, uma tentativa de enterender as forças que
determinam a vida social do homem” (ibid., p. 6, grifo no original). Ele utiliza esse argumento
para refutar o que considera um conceito errôneo de individualismo, o que postula que os
indivíduos devem ser considerados como unidades isoladas, sendo autossuficientes. Essa
noção de individualismo possibilita entender o indivíduo como um agente que interage com
19 Caldwell diz que ele só cita o termo “individualismo metodológico” apenas uma vez em toda a sua obra.
25
todos a sua volta e essa interação é o que possibilita a formação de um sistema complexo
através do processo de ordem espontânea, daí a importância implícita do indivíduo na obra de
Hayek. Galeotti (1985, p. 178) escreve que “A teoria social de Hayek afirma que o indivíduo
isolado, sem regras e elos que agem como ligações com o contexto e o ambiente, perderia sua
identidade e entendimento comum; daí, a liberdade resultante seria desprovida de qualquer
significância.”
Aliás, a importância do indivíduo se verifica porque, para Hayek e para a Escola Austríaca em
geral, o equílibrio ocorre no nível individual, só tem um significado claro quando “aplicado às
ações de um indivíduo” (HAYEK, 1980, p. 36). De fato, Ludwig Lachmann, outro
representante Austríaco, escreveu que “a noção de equilíbrio geral deve ser abandonada, mas
a de equilíbrio individual é para ser retida a todos os custos. É simplesmente equivalente à
ação racional” (apud CLARK, 1994). As ações de um indivíduo devem estar em equilíbrio
com as de outro, porque só assim as transações podem ocorrer e a ordem social se realizar.
A análise social, então, só ganha sentido se considerar a sociedade como um sistema
complexo, como se fosse um sistema orgânico20, chegando a um resultado através das
interações e o mercado é um dos lugares onde os agentes interagem, e mudanças no
conhecimento relevante e informações fazem com que ocorram mudanças na ordem social,
que será o próximo tópico.
4. Liberdade e informação
Como a quantidade de conhecimento relevante é diferente para cada indivíduo, Hayek conclui
que,
20 Como discutiu-se na apresentação dos modelos de jogos evolucionários e computacionais, no primeiro capítulo.
26
...praticamente todo indivíduo tem alguma vantagem sobre todos os outros porque ele possui uma [quantidade] de informação única à qual pode dar um bom uso, mas cujo uso pode ser feito apenas se as decisões a esse respeito são deixadas para ele ou se são feitas com sua cooperação ativa (HAYEK, 1948, p. 80).
Ribeiro (2002) analisou a obra de Hayek sobre a ótica da teoria da informação21 e concluiu
que, pelo processo de interação mercadológico, o nível de informação de uma sociedade é
aumentado. O mercado seria um processo de descoberta e o sistema de preços a sua
linguagem. Como há um feedback negativo, quando o indivíduo não tem suas expectativas
realizadas, e um custo enorme de ajustamento22, opta-se várias vezes por restringir a
liberdade, existindo um trade off entre lucratividade e nível de certeza, ou seja, quanto maior
a certeza, menor o nível de lucros. Como é colocado, “A restrição à liberdade reduz
informações inesperadas; portanto, protege o estoque de informações do observador, mas
restringe o conhecimento do mundo exterior” (RIBEIRO, 2002, p. 115). Hayek basicamente
acreditava que a liberdade suprida pelo mercado faria com que os custos decorrentes da
presença mínima, ou até mesmo ausência de interferência governamental fossem suprimidos.
5. A ordem espontânea para Hayek em Direito, Legislação e Liberdade
O primeiro volume de Direito, Legislação e Liberdade (DDL) foi publicado em 1973 e
representa a tentativa de Hayek de criar diretrizes para uma sociedade baseada no liberalismo.
A importância dessa obra para o presente trabalho é que nela há uma definição mais
amadurecida de ordem espontânea e sua aplicação para aquilo que Hayek tinha em mente
como modelo de sociedade.
21 Devido aos seus estudos sobre conhecimento e informação durante o período de debates das décadas de 1930 e 40, Hayek, como já demonstrado, desenvolveu trabalhos precursores da teoria da informação. 22 Nas palavras citadas pelo autor, “o mapa não é o território”, ou seja, teria que haver uma mudança muito grande no “mapa”, isto é, a reação do indivíduo frente a mudanças no “território”, isto é, condições econômicas.
27
Para Hayek, existem duas maneiras de considerar as estruturas das atividades humanas: o
racionalismo construtivista e evolução da sociedade. Ele considera a primeira perspectiva
como sendo imprópria para a análise social. O racionalismo construtivista23 teria sua origem
no pensamento de Descartes, mas sua origem pode ser traçada até a filosofia grega antiga24.
Para Descartes “a razão se definia como dedução e lógica a partir de premissas explícitas,
ação racional veio também a significar apenas aquela ação inteiramente determinada pela
ação conhecida e demonstrável” (HAYEK, 1985, p. 4). Com isso, podemos inferir que uma
instituição elaborada de acordo com um planejamento matemáticamente25 explícito deveria
ser superior. A ação racional e intencional do ser humano poderia criar instituições melhores e
substituir as antigas que, derivadas de costumes e tradições, seriam deixadas de lado se não
pudessem ser incluídas, pois elas também seriam derivadas de um planejamento antigo e que
provavelmente estaria ultrapassado.
É exatamente por isso que Hayek rejeita esse modo de pensar, explicando que muitas
instituições da sociedade resultavam, na verdade, “de costumes, hábitos ou práticas” (p. 5).
Devido ao fato de que a sociedade é regida por fenômenos complexos, é impossível ter
controle sobre todos os fatos relevantes26.
Para fazer uma explicação melhor sobre o desenvolvimento das instituições, ele recorre à
teoria da evolução darwiniana27 como modelo para explicar a formação de instituições, um
modelo de evolução cultural. Como os organismos evoluíram de acordo com as condições
23 Termo criado por Hayek e usado como umbrella term apenas, pelo que parece, pelos seus seguidores. 24 Principalmente Aristóteles, que pregava a superioridade da razão sobre os sentidos (ver RIBEIRO, 2002). 25 Lembrando que Descartes também era matemático e é creditado por ter elaborado o plano cartesiano e a geometria analítica. Levar para a política os seus avanços na área matemática seria meramente um passo lógico de sua filosofia. 26 Como foi discutido anteriormente. 27 Ou, como diria Caldwell, lamarckiana, embora Hayek tenha se referido à darwiniana.
28
ambientais únicas e complexas e seria impossível prever a direção da linha evolucionária28,
ele fez uma adaptação para explicar a cultura e instituições. Na sociedade, as condições são
dadas pelo ambiente e pelo desenvolvimento das normas e são transmitidas de indivíduo para
indivíduo, de geração em geração, e a permanência de uma instituição é justificada pela
utilidade que gera ao grupo. As normas que regem a sociedade podem ou não ser verdadeiras
no sentido cartesiano, não há como saber exatamente (ibid. p. 15).
Com isso Hayek conclui que há uma falsa dicotomia entre “artificial” e “natural” existente
desde os filósofos gregos29. Porém, essa dicotomia é falsa no sentido em que existe uma
terceira categoria de fenômenos que, utilizando as palavras de Adam Ferguson, “são resultado
de ação humana, mas não de intenção humana” (ibid. p. 17; original30, FERGUSON, p. 222).
Para Hayek, pode se dividir o conceito de ordem em dois tipos, emprestando os termos
gregos: taxis, para designar ordenamento planejado, chamado por nós de “organização”, e
kosmos, chamada por nós de “ordem espontânea” ou até mesmo “organismo”. As
organizações seriam criadas por intervenção e planejamento humano, e seriam exógenas às
interações sociais. Um exemplo disso seria a organização de um exército, é impossível fazer
com que os soldados ajam independemente um do outro sem sofrerem grandes baixas. Por
outro lado, a ordem espontânea é o foco de Hayek. A importância do conceito reside no fato
de que, como já foi explicado ao longo do trabalho, a ordem é obtida através da interação
individual de milhares de indivíduos, sem que isso crie uma situação de anarquia.
Ambas as ordens devem cooperar,
28 Hayek provavelmente consideraria projetos como a série Futuro Selvagem não muito diferentes da astrologia. 29 Os termos gregos eram physis e thesis (ou nomó), que significavam, respectivamente, “por natureza” e “por convenção”. 30 Na verdade, Ferguson atribui essa frase ao cardel Jean Gondi de Retz (1612-1679).
29
“Não há dúvida de que para muitas tarefas limitadas a organização é o método mais poderoso de coordenação eficaz, porque nos permite adaptar muito mais plenamente a ordem resultante aos nossos desejos, enquanto nas ocasiões em que, dada a complexidade das circunstâncias a serem consideradas, temos de confiar nas forças que propiciam uma ordem espontânea, [pois] nosso poder sobre o conteúdo específico dessa ordem é necessariamente limitado” (ibid. p. 48).
Porém, para Hayek, as organizações estão integradas numa ordem espontânea maior e mais
complexa que forma a sociedade e é essa complexidade, Hayek argumenta, que faz com que o
programa racionalista construtivista falhe em produzir uma sociedade livre.
30
A INTERVENÇÃO HUMANA NA ORDEM ATUAL
A sociedade do século XVIII resistiu, inconscientemente, a qualquer tentativa de transformá-la em mero apêndice do mercado. Karl Polanyi. Não há ordem espontânea. Warren Samuels.
Falamos até aqui sobre a ordem espontânea, que, para seus defensores, emerge naturalmente.
Sendo essa uma afirmativa ampla e que envolve vários aspectos da vida, ela não pode ser um
consenso. O que se exporá nesse capítulo será o contraponto a essa perspectiva: a visão de que
as instituições surgem fundamentalmente como resultado de um processo de criação do
próprio homem31. Desde que Adam Smith enunciou seu princípio da mão invisível, sempre
houve críticos a esse conceito. Malthus, em seu livro Principles of Political Economy,
escreveu que é impossível para um governo deixar estritamente que as coisas tomem seu
curso natural. Além disso, ele também argumentava que a existência de eventos de excesso de
oferta, ou superprodução, evidenciam as limitações do mercado em se auto-regular
(HODGSON, 1996, p. 67).
1. Crítica plural à ordem espontânea
Marx (1996) afirma que, para que o processo de acumulação primitiva consiga se efetivar e
expandir a acumulação capitalista, é necessário criar uma legislação específica. “A burguesia
nascente precisa e emprega a força do Estado para ‘regular’ o salário, isto é, para comprimi-
lo dentro dos limites convenientes à extração de mais-valia, para prolongar a jornada de
trabalho e manter o próprio trabalhador num grau normal de dependência” (MARX, 1996, p.
359). Portanto, à medida que o governo vai sendo cada vez dominado pela burguesia, mais as
31 Embora nesse capítulo não seja analisado o planejamento econômico “racionalista construtivista”.
31
leis vão moldando a sociedade à imagem capitalista, na qual “a situação do trabalhador,
qualquer que seja seu pagamento, alto ou baixo, tem de piorar” (idem, p. 275). Nessa visão, o
mercado não é criado por meio de um processo de ordem espontânea, mas impera a imposição
dos mecanismos capitalistas.
Bromley (2006) considera as instituições como sendo a arquitetura da existência social e
argumenta que, de forma um tanto hostil, o conceito de ordem espontânea não passa de “um
mecanismo de conto de fadas” (p. 41)32. “Todo mercado é uma construção social, e mudanças
nos parâmetros que o constroem – novos arranjos institucionais – também são criações
humanas” (p. 33). Para ele, de maneira semelhante à defendida por Hayek, a ação coletiva
também é importante para as relações de mercado e sociais em geral, “a economia está
sempre no processo de se transformar” (p. 40)33 e também rejeita a abordagem de equilíbrio
geral. Porém, a ação coletiva só pode florescer sob um regime legal, com participação ativa
do governo, para garantir direitos de propriedade e criar novas instituições econômicas.
Devido à complexidade e à existência de outros tipos de transações além da barganha, a saber,
as gerenciais e de racionamento (seguindo a classificação proposta por Commons), o governo
deve interfirir, criando instituições para lidar com elas34. Por isso, “as instituições constituem
uma ordem construída” (p. 41). Também “costumes evoluem para leis quando há razões
suficientes para essa evolução” (p. 48). Diferente do que é comumente argumentado, Bromley
sugere que as instituições não servem apenas para limitar a ação humana, mas também servem
para expandi-la, criando um novo campo de ação humana, em outras palavras, elas podem
aumentar, ao invés de diminuir, a liberdade do indivíduo.
32 Tanto é que o autor não pára para analisar o conceito e suas implicações, trata-o como algo, de certa forma, não importante para o pensamento econômico, apenas um erro, na melhor das hipóteses. 33 O que também pode ser inferido do pensamento de Hayek. 34 Porém, Bowles (2002) construiu um modelo que indica que os direitos de propriedade podem ter surgido espontaneamente, sem interferência de um governo.
32
Em uma linha de argumentação parecida, Sandefur (2009a) conclui que não há como
distinguir realmente entre ordem construída, ou idealizada por meio do ‘racionalismo
construtivista’, e ordem espontânea, porque essa avaliação depende do ponto de vista do
observador. Ele dá um exemplo: uma escola tem que construir caminhos num gramado para
os alunos se movimentarem de um lugar para outro. Normalmente um arquiteto planejaria os
caminhos de acordo com o que achar melhor, mas um arquiteto confiante nos princípios de
Hayek esperaria um ano para observar onde a grama estaria mais pisoteada pelo ir e vir
espontâneo dos alunos para só então despejar o concreto. O problema é que o arquiteto tem
que despejar o concreto algum dia e, no momento em que ele fizer isso, ele poderá ser
considerado um ‘racionalista construtivista’ que interfere na ordem criada espontâneamente.
Para Sandefur, o grande problema da ordem espontânea é que, apesar de ser um excelente
conceito descritivo, não tem poder normativo algum e não há como condenar a coerção,
porque a coerção pode estar presente em arranjos ditos espontâneos. “A razão pela qual
planejamento centralizado e coerção governamental são errados não é porque eles perturbam
a ordem espontânea e sim porque a liberdade é um bem, um bem para o qual todos têm o
direito de ter.” (SANDEFUR, 2009b)35.
2. O pensamento de Karl Polanyi
Karl Polanyi nasce em 21 de outubro de 1886, em Viena, antigo Império Austro-Húngaro,
filho de pais húngaros, também intelectuais nobres. Seus irmãos também foram intelectuais,
sendo que o mais conhecido foi Michael Polanyi, citado anteriormente. Em 1909, forma-se
em Direito pela Universidade de Budapeste, e dedicou-se à economia e filosofia após isso.
Durante a primeira guerra mundial entra no exército austro-húngaro como oficial. Depois da
35 Curiosamente, as visões ideológicas desses três autores, Marx, Bromley e Sandefur, são bem diferentes. O primeiro escreve com base na economia política socialista, o segundo com base no institucionalismo antigo e o terceiro no conservadorismo clássico americano.
33
guerra, envolve-se em debates econômicos, como jornalista e economista. Com a ascensão do
fascismo em seu país, muda-se para a Inglaterra, e lá, durante a década de 1940, começa a
escrever A Grande Transformação. Diferente de Hayek, que tem uma obra muito mais difusa,
a popularidade de Polanyi se concentra nessa única obra, embora ele tenha escrito mais livros
(e também esta é a única obra de Polanyi traduzida para o português).
Para Polanyi, uma economia de mercado “é uma economia dirigida pelos preços do mercado e
nada além dos preços do mercado” (POLANYI, p. 62). Porém, ele argumenta que nenhuma
sociedade teve sua economia controlada pelo mercado até a Revolução Industrial. A economia
era parte da sociedade, por isso não haveria propensão a buscar exclusiva e principalmente
lucros, mas haveria também uma preocupação social com a situação de todos os membros;
dentro dessa perspectiva, não seria correto falar em uma propensão natural à barganha, tal
como sugerira Adam Smith. A troca entre as sociedades teria começado através
principalmente da guerra e da pirataria, mas teria evoluído para o mercado, uma forma de
adquirir bens mais pacífica em vários casos. Polanyi enfatiza que os mercados existem desde
as economias primitivas, porém seu papel estava controlado pela sociedade. Mas
posteriormente, com o desenvolvimento da sociedade de mercado, o fenômeno se inverteu,
“em vez de a economia estar embutida nas relações sociais, as relações sociais estão
embutidas na economia” (idem, p. 77).
O mercado auto-regulado estava fora das preocupações dos formuladores de política até o fim
do século XVIII, e só pode ser formulado quando a parte econômica se separou da sociedade,
conforme referenciado no parágrafo anterior. Isso só foi possível graças à transformação da
terra, do trabalho e do dinheiro em mercadorias, mercadorias que Polanyi denomina como
fictícias, pois “não foram feitas para serem compradas e vendidas”. Isso também enfatiza a
34
artificialidade da economia de mercado, que só poderia ser alcançada através de mudanças
institucionais dirigidas pelo governo. O argumento da espontaneidade do mercado é utilizado
para justificar aqueles que detêm o poder no mercado (CLARK, 1993) e para obter uma
desculpa para o excesso de desigualdade em uma sociedade. No fim, o mecanismo de
mercado auto-regulado seria “uma ofensa à liberdade e dignidade humana”
(THOMASBERGER, 2006).
Polanyi não hesitou em falar o quanto o pensamento econômico liberal fracassou no
entendimento da Revolução Industrial, de como ela separou a economia da sociedade.
“Animada por uma fé emocional na espontaneidade, a atitude de senso comum em relação à
mudança foi substituída por uma pronta aceitação mística das consequências sociais do
progresso econômico, quaisquer elas fossem” (POLANYI, p. 51, grifo nosso). A linha de
argumentação de Polanyi é semelhante àquela dada por Marx, citada anteriormente36, já que
assim como Marx, utiliza a sociedade inglesa de meados do século XIX como ponto de
análise.
Para Polanyi, a sociedade comercial moderna não surgiu de um processo evolucionário, mas
de uma imposição das classes mais ricas. Ele reconstrói a história britânica, porque lá é onde
que foi desenvolvida a sociedade comercial e a Revolução Industrial. A começar pelo século
XVI, nos cercamentos foi onde surgiram as primeiras sementes da Revolução Industrial, na
medida em que terras eram cercadas, acabando com as terras comuns, para a criação de
pastagens. Posteriormente, criou-se uma abundância de lã que seria usada, posteriormente,
36 Embora Polanyi critique os marxistas por terem uma abordagem semelhante à liberal para analisar o fenômeno (ver POLANYI, 1947). Polanyi também parece ter rejeitado a teoria do valor objetivo, fundamento da economia marxista, quando falou que a maior contribuição do utilitarismo seria “que o valor provinha da utilidade” (POLANYI, 2000, p. 146), o que faz sentido quando ele trata das mercadorias fictícias.
35
para fomentar a Revolução Industrial a partir do setor têxtil, ao custo do desmonte do sistema
anterior.
Nesse ponto, Polanyi aponta que, graças à intervenção estatal, a Inglaterra pôde suportar o
processo de transição provocado pelos cercamento, socorrendo as vítimas e impondo
legislação (e até mesmo desrespeitando-a) para poder controlar o processo. Porém essas ações
da Coroa prejudicavam aos capitalistas, que necessitavam do livre-comércio, e eles chegaram
ao poder com Cromwell. Existia uma clara contradição entre progresso econômico e
desarticulação social, a transição estava impondo um custo considerável sobre a sociedade
inglesa através do desmonte de velhas instituições e criação de novas.
Porém, mesmo na Revolução Industrial, a sociedade não permaneceu passiva em relação às
mudanças, houve “um movimento bem estruturado para resistir aos efeitos perniciosos de
uma economia controlada pelo mercado” (idem, p. 98). Esse processo, de impor restrições,
quer seja pela regulação ou outros instrumentos com ou sem a presença do poder estatal, às
mercadorias fictícias, à medida que o comércio nacional e internacional vai se desenvolvendo,
é chamada de duplo movimento, “a auto-organização da sociedade, algumas vezes com a
ajuda do governo e outras vezes sem, para proteger o povo e a terra contra as forças
desintegradoras do sistema de mercado” (Gregory Baum, Karl Polanyi on Ethics and
Economics, apud ÖZEL, 2007). E através do duplo movimento, o custo de transição da
sociedade poderia atingir níveis suportáveis, que não precisassem envolver a sociedade em
uma conflagração, como uma guerra civil ou outro tipo de crise social37.
37 Obviamente, houve registros de agitação social na Inglaterra do século XIX, mas, em nenhum momento, houve ameaça de guerra civil, nem de guerra mundial, conforme Polanyi demonstra no início do livro. O conceito de duplo movimento deve ter alguma influência de Marx, porém para este autor a sociedade capitalista iria se enfraquecer e cair em si mesma devido às suas contradições, à medida que o proletariado fizesse uma revolução para tomar os meios de produção (MARX, p. 381). A história demonstrou que a reação capitalista era muito mais eficiente em atender as demandas da sociedade por causa, exatamente, do duplo movimento, que
36
Para Polanyi, o mercado auto-regulado só começou a tomar força com Quesnay e os
fisiocratas38, mas foi a partir de John Townsend e sua Dissertation on the Poor Laws que o
tema se tornou relevante. Nesta obra ele demonstrou que havia equilíbrio entre predador e
presa num ilha do Pacífico39 e que isso deveria ser aplicado à sociedade, e ela precisaria do
mínimo de governo, pois as necessidades humanas regulariam a si mesmas e aos habitantes, é
o que haveria de ser natural. (Porém, como Polanyi explica e foi referenciado no primeiro
capítulo deste trabalho, a ascenção de Bentham e dos utilitaristas colocou o laissez-faire de
lado, para dar prioridade à intervenção ativa)
Assim, lentamente o liberalismo se tornou em um credo. Começou apenas como uma tentativa
de eliminar algumas leis e regulamentações na produção até atingir a economia inteira. Mas,
repetindo, nada disso evoluiu naturalmente. “As décadas de 1830 e 1840 [sic] presenciaram
não apenas uma explosão legislativa que repelia as regulamentações restritivas, mas também
um aumento enorme das funções administrativas do estado” (idem, p. 170). Havia
participação firme do estado para atingir um nível de regulação que tornasse o laissez-faire
um princípio ativo da economia. Definitivamente um paradoxo, que “foi sobrepujado por um
outro. Enquanto [que] a economia laissez-faire foi o produto da ação deliberada do estado, as
restrições subsequentes ao laissez-faire se iniciaram de maneira espontânea. O laissez-faire
foi planejado; o planejamento não” (idem, p. 172). No fim, Polanyi conclui, os liberais
tiveram que se voltar contra o liberalismo. O duplo movimento estava funcionando a todo
vapor.
permitiu que a sociedade capitalista e um mercado relativamente aberto existisse, pelo em alguns países. Também, ironicamente, a história demonstrou que os regimes socialistas caíram em si mesmo por causa de suas contradições muito mais rapidamente do que os regimes capitalistas. 38 Ver capítulo 1 deste trabalho, embora Mandeville fosse o primeiro a causar agitação com essa idéia (ver KAYE, 1922. Eram comuns as fogueiras feitas com exemplares de seu livro). Porém os fisiocratas foram os primeiros a aplicar em políticas públicas. 39 Precedendo o conhecido modelo Lotka-Volterra na biologia.
37
No fim, Polanyi irá argumentar que esse processo de duplo movimento foi o que destruiu a
sociedade criada no século XIX, danificada durante a Primeira Guerra Mundial e solapada
durante a Grande Depressão e a ascenção do fascismo e do socialismo, que seriam realizações
do duplo movimento. Portanto, o mercado auto-regulado seria um construto racionalista40
(idem, p. 290).
“A história econômica mostra que a emergência de mercados nacionais não foi, de forma alguma, o resultado da emancipação gradual e espontânea da esfera econômica do controle governamental. Pelo contrário, o mercado foi a consequência de uma intervenção consciente, e às vezes violenta, por parte do governo que impôs à sociedade a organização do mercado” (idem).
E foi a ideologia de mercado que, para o autor, ao recusar-se a reconhecer a realidade
sociedade41, possibilitou a abertura de caminhos para o facismo e o socialismo chegassem ao
poder, porque estes reconheciam a realidade da sociedade e, para isso, eles rejeitam o
postulado da liberdade. O mercado estava ameaçando tanto a sociedade que ela preferiu trocar
a liberdade autônoma e pessoal pela proteção do Estado. Polanyi argumenta que uma
sociedade na qual o mercado volta a participar da esfera social é possível preservar todas as
liberdades, incluindo as que são defendidas pelos liberais, de forma coletiva, com a inclusão
de todos indivíduos na sociedade, moldada pela vontade e desejos humanos. Esta seria a real
Grande Sociedade.
40 Qualquer semelhança com o conceito de “racionalismo construtivista” de Hayek pode não ser mera coincidência. 41 Quando Thatcher disse que “não existe essa coisa de sociedade”, era exatamente isso a que Polanyi se referia. O liberalismo tende a considerar a sociedade como uma multiplicidade, isto é, apenas o indivíduo tem existência real, e as ordens sociais são resultado das interações individuais (CLARK, 1993).
38
CONCLUSÃO
Por fim, chega-se à conclusão deste trabalho e se pergunta novamente a questão: porque
comparar dois autores tão distintos? Tanto Hayek quanto Polanyi eram contemporâneos
durante a era final do Império Austro-Húngaro (Hayek era austríaco e Polanyi húngaro);
ambos serviram no Gemeinsame Armee durante a 1ª Guerra Mundial e começaram a estudar
economia para tentar prover soluções para a pobreza da região vienense, em que havia um
contraste entre a erudição e opulência das classes altas e pobreza nas classes baixas, durante o
pós-guerra; ambos se identificaram com a resposta socialista durante o início da década de
1920, sendo que posteriormente tomaram caminhos diferentes. Ambos adotaram o
expressivismo alemão, que, de acordo com Özel, estuda as instituições como realizações de
expressões sociais42. Ambos tiveram que se exilar da sua terra natal e adotaram a Inglaterra
como morada e, posteriormente, a América do Norte. Ambos publicaram suas obras-primas
em 1944, eram ardentes defensores da democracia e estudaram a mudança institucional,
evitando cair naquilo que Midgley chamou de “mito da escada rolante43”, de que toda
mudança, tanto biológica quanto tecnológica, é também moral e destina a humanidade ao
progresso, “um processo inexorável de melhorias” (MIDGLEY, p. 6). Migone (2006) resumiu
bem porque as comparações entre ambos são relevantes,
“... além do fato de que ambos se ateram à suas teoria a ponto de aceitarem as consequências mais duras sem fazer concessões, como será explicado abaixo... as tradições polanyiana e hayekiana representam dois pólos de tensão inerente no [sistema de] mercado capitalista moderno: a necessidade de conciliar liberdade individual com estabilidade social, assegurar a acumulação de capital e a
42 Ver Özel (2007) para mais detalhes. 43 Apesar de que ambos sugeriam políticas que melhorariam a situação humana, como em Direito, Legislação e Liberdade, e o último capítulo de A Grande Transformação, eles não colocavam suas sugestões como movimentos naturais da humanidade; lembrando que a ordem espontânea nos deu costumes como o sati e o duplo movimento nos deu o fascismo.
39
reprodução da classe trabalhadora, tudo de acordo com as restrições da democracia liberal e economia de mercado” (MIGONE, p. 106)
Isso também evidencia as disparidades entre os dois falantes de língua alemã. Hayek era um
defensor intransigente do sistema de mercado livre, defendia a intervenção mínima do Estado
em todas as áreas da sociedade (porém é comumente confundido com um neoclássico),
embora ficasse longe de ser um representante da encarnação mais radical do liberalismo, o
anarco-capitalismo. Para Hayek, um Estado forte era um Estado mínimo, a economia poderia
prover um nível de bem-estar maior se não houvesse interferência na economia, nem mesmo
para a criação de moeda (Hayek propôs um sistema complexo em que os bancos iriam
competir pela criação de moeda, em Desestatização do Dinheiro). Hayek também rejeitou a
idéia de justiça social por completo, o que é uma consequência lógica e inegável de sua
filosofia44. Michael Polanyi (1949) criticou-o por “falar a uma sociedade apavorada com o
desemprego enquanto [ele, Hayek] fica indiferente a esse problema.”
Polanyi, por outro lado, era um socialista não-marxista; ele defendia que se a sociedade
deixasse o mercado se auto-regular, estaria cavando a própria cova. Seu principal argumento
era que a sociedade se defende da intrusão do mercado nas esferas da vida social através do
processo de duplo movimento, e esse argumento sobreviveu até mesmo a falhas de sua
abordagem. A principal falha é que descobertas arqueológicas45 após a Segunda Guerra
Mundial dificultaram sua argumentação sobre o papel do mercado nas sociedades antigas, já
que essas descobertas denunciavam um mercado bem mais desenvolvido e até mais auto-
44 “Para Hayek, as reivindicações por ‘justiça social’ não estão de acordo com a disciplina adquirida sobre a qual se constrói a riqueza da sociedade. O exame que ele faz do conceito de ‘justiça social’ leva-o a rejeitar totalmente essa noção enquanto sóldo princípio da ação [...] ‘Justiça social’ não é, de forma alguma, a expressão inocente da boa vontade para com os menos afortunados que normalmente aparenta ser, mas sim a demanda, por parte de grupos específicos, de uma posição privilegiada. Talvez pior que isso, na opinião de Hayek, é ela oposta da verdadeira justiça, que é orientada por regras gerais aceitas por todos e imparcial quando diante dos diversos indivíduos e grupos.” (BUTLER, 1987, 107-108). 45 Hejeebu & McCloskey (1999) citam vários estudiosos das culturas antigas que encontram pouca evidência de preços largamente administrados. North (1977) reconsidera o exemplo dos Kula, que Polanyi usou, e dá uma interpretação diferente, baseado em estudos posteriores.
40
regulado do que ele supunha. Polanyi era um primitivista, que acreditava que “fatores
culturais dominavam a economia e em sociedades antigas, a economia estava inserida no resto
da sociedade e servia para outros propósitos além da geração de lucros” (MUUKONEN,
2009), e o primitivismo é largamente rejeitado hoje em dia. Peter Drucker, um dos maiores
teóricos em administração e amigo pessoal de Polanyi, observou que, no fim de sua vida, ele
se tornou um homem bastante desapontado (CARLSON, 2006).
Este trabalho conclui que há, de fato, instituições que surgem através do processo de ordem
espontânea, mesmo que não exista uma definição única de ordem espontânea. Utilizando-se
novamente da definição de Adam Ferguson que, apesar de ter sido proposta no século XVIII,
é a mais simples e explicativa das definições, ordem espontânea seria o processo pelo qual
certas instituições surgem através da ação humana, mas não de sua vontade. Isso porém não
nos permite determinar até que ponto as instituições são criadas por um processo de ordem
espontânea, isto é, que partes da sociedade devem ser deixadas para se auto-regularem e que
partes devem ter intervenção ativa do governo ou qualquer outro mecanismo de coerção,
como cooperativas46?
Porém, uma última conclusão é que nada deve ser subestimado; o mercado, se estiver
funcionando relativamente bem, até mesmo quando apresenta um certo nível de falhas de
mercado, realmente é um lugar no qual trocas pacíficas e justas para as partes podem se
realizar sem qualquer intervenção, como diria Coase. A principal decorrêcia dessa visão é que
isso permite aos indivíduos agirem independentemente uns dos outros, ou seja, isso dá
liberdade para agir como eles bem entenderem, o que emanicipa o indivíduo. Talvez seja por
isso que socialistas como Lange defenderam uma certa autonomia aos mercados, a ponto de
46 Boehm (1994, p. 300) menciona que a única instituição a qual pode se afirmar que há consenso em dizer que surgiu e evoluiu por ordem espontânea é a linguagem.
41
considerar o mercado “um mecanismo de computação [de preços] da era pré-eletrônica”
(LANGE, 1967), e que seus defensores defendam o livre mercado tão intransigentemente. E
devido a essa necessidade de preservar a autonomia individual, a sociedade se organizaria
para deixar o mercado na sua área designada, ocorrendo o processo de duplo movimento,
descrito por Polanyi47. Mecanismos de planejamento e coerção não são exclusividade apenas
do governo, como bem colocou Sandefur (2009), em seu exemplo comparando o governo que
determina que os empregados devem ter um plano de saúde e o executivo que determina que
seus empregados devem ter o mesmo, e a necessidade de governos é imprescindível48.
Como foi proposto anteriormente, um dos maiores defeitos da argumentação de Karl Polanyi
é a confiança no primitivismo. Apesar disso, em Sociologia, o duplo movimento não é
rejeitado por nenhuma das escolas rivais ao primitivismo; mais ainda, pode se argumentar que
o duplo movimento é um tipo específico de ordem espontânea, porque a contestação e a
resistência à penetração do mercado na vida social começam de forma descentralizada, nos
indivíduos e, a partir de mecanismos de propagação, como os estudados em BOWLES (2002),
que os indíviduos se dirigem a um ponto focal em questão e podem demandar proteção, seja
através de revolução ou legislação49. O reconhecimento de que o duplo movimento é
espontâneo poderia auxiliar a tapar buracos nas teorias dos dois austro-húngaros: o duplo
movimento teria uma base bem mais sólida do que o primitivismo e haveria uma justificativa
para dar espaço a questões sociais na teoria de Hayek, porque a demanda por justiça social
surgiria espontâneamente, de acordo com as suas próprias diretrizes.
47 Polanyi provavelmente ficaria horrorizado com livros como Freakonomics. 48 Até porque, de acordo com a teoria de evolução cultural hayekiana, pode se sugerir que o Estado evoluiu naturalmente, mas isso já não está no escopo do projeto. 49 Nota-se que aqui também ocorre o dilema de Sandefur aqui, a partir do momento que a ordem espontânea é reconhecida e instituicionalizada (cimentada), ela deixa de ser espontânea.
42
Uma conclusão secundária do trabalho é que, como o Estado é o principal agente capaz de
atender às demandas da sociedade, seja por maior liberdade para a auto-organização dos
mercados ou por uma maior restrição à ação dos mesmos, ele não pode ser desconsidera, o
que faz com programas de pesquisa baseados ou com fim no anarquismo político
(anarcossindicalismo, anarco-primitivismo, anarco-capitalismo, entre outros) sejam
degenerativos, porque se o duplo movimento não ocorrer democraticamente, ocorrerá
autoritariamente, e isso foi o que Polanyi procurour demonstrar em A Grande Transformação,
explicar a ascensão do fascismo e do socialismo como resposta ao fracasso do capitalismo na
década de 1930, por isso a sociedade deve tomar cuidado com o próprio processo de duplo
movimento. Então, o anarquismo deve ser rejeitado como alternativa viável.
Espera-se que esta discussão evolua50 para realmente se entender o que está por trás das
instituições que temos hoje. Sugden (1988) enumera três razões para o estudo desse conceito:
a) através do mecanismo de preço e das convenções existentes em cada lugar, o mercado é um
lugar que esse conceito tem importância fundamental; b) possibilita o entendimento e a
criação de modelos com racionalidade limitada; c) o conceito ajuda a entender de onde
surgem as crenças da sociedade. Esse é um problema que envolve grande parte dos
fundamentos da sociedade e do capitalismo e utilizar argumentos orwellianos de direita boa,
esquerda ruim, e vice-versa, não faz com que o diálogo progrida.
50 Ainda está para ser escrito o livro A Theory of Spontaneous Order.
43
BIBLIOGRAFIA
BARRY, Norman. The Tradition of Spontaneous Order. Literature of Liberty, vol. 5, n. 4,
1982, p. 7-58.
BIANCHI, Ana Maria. A pré-história da economia: De Maquiavel a Adam Smith. São Paulo:
Hucitec, 1988.
BLADEL, John P. Against Polanyi-centrism: Hayek and the re-emergence of “spontaneous
order”. Quarterly Journal of Austrian Economics, vol. 8, n. 4, 2005, pp. 15-30.
BOEHM, Stephan. Spontaneous Order. In: HODGSON, Geoffrey; SAMUELS, Warren,
TOOL, Marc, eds. The Elgar Companion to Institutional and Evolutionary Economics
L-Z. Aldershot: Edward Elgar, 1994, p. 296-301.
BOWLES, Samuel. Microeconomics: Behaviors, institutions and evolution. Princeton:
Princeton University Press, 2003.
BROMLEY, Daniel. Sufficient reason: volitional pragmatism and the meaning of economic
institutions. Princeton: Princeton University Press, 2006.
BUTLER, Eamonn. A contribuição de Hayek às idéias políticas e econômicas de nosso
tempo. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1987.
CALDWELL, Bruce. Hayek and Cultural Evolution. In: MÄKI, Uskali, ed., Fact and Fiction
in economics: models, realism and social construction. Cambridge: Cambridge
University Press, 2002.
______. Hayek and Socialism. Journal of Economic Literature, vol. 35, dezembro de 1997, p.
1856-1890.
44
CAMARGOS, Luiz Rogério. Estado, Mercado e Resultado Social: Reflexões sobre o
paradigma da mão invisível. São Paulo: Annablume, 2001.
CARLSON, Allan. The Problem of Karl Polanyi. The Intercollegiate Review, 2006, p. 32-39.
CLARK, Charles M. A. Spontaneous Order versus Instituted Process: The Market as Cause
and Effect. Journal of Economic Issues, vol. 27, n. 2, 1993, p. 373-385.
COGDON, Lee. Karl Polanyi in Hungary, 1900-19. Journal of Contemporary History, vol.
11, n. 1, janeiro de 1976, pp. 167-183.
COTTRELL, Allin & COCKSHOTT, W. Paul. Calculation, Complexity And Planning:
The Socialist Calculation Debate Once Again. Review of Political Economy, vol. 5, n.
1, julho de 1993, p. 73-112.
DUMONT, Louis. From Mandeville to Marx: The Genesis and Triumph of Economic
Ideology. Chicago: Chicago University Press, 1977.
FERGUSON, Adam. An Essay on Civil Society. Philadelphia: A. Finley, 1819. Edição
eletrônica: Google.
FOSS, Nicolai. Austrian Economics and Game Theory: a Stocktaking and an Evaluation. The
Review of Austrian Economics, vol. 13, n. 1, 2000, p. 41-58.
GALEOTTI, Anna Elisabetta. Individualism, Social Rules, Tradition: The Case of Friedrich
A. Hayek. Political Theory, Vol. 15, No. 2 (May, 1987), pp. 163-181.
HAYEK, Friedrich. Direito, Legislação e Liberdade: uma nova formulação dos princípios
liberais de justiça e economia política. São Paulo: Visão, 1985 (1973)
______. Economics and Knowledge (1937), In: _____. Individualism and economic order.
Chicago: University of Chicago Press, 1980.
______. Individualism: True and False (1945), In: _____. Individualism and economic order.
Chicago: University of Chicago Press, 1980.
______. O caminho da servidão, 5ª ed. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1990 (1944).
45
______. The pretence of knowledge (1974), disponível em
http://nobelprize.org/nobel_prizes/economics/laureates/1974/index.html , acessado em
27 de fevereiro de 2010.
______. The Use of Knowledge in Society (1945), In: _____. Individualism and economic
order. Chicago: University of Chicago Press, 1980.
HEJEEBU, Santhi & MCCLOSKEY, Deirdre. The Reproving of Karl Polanyi. Critical
Review, vol. 13, n. 3-4, 1999, p. 285-314.
HODGSON, Geoffrey Martin. Economics and Evolution: Bringing life back into economics.
Ann Arbor: University of Michigan, 1996.
KAYE, F. B. The Influence of Bernard de Mandeville. Studies in Philology, vol. 19, n. 1,
janeiro de 1922, pp. 83-108.
KLEIN, Daniel B. Rinkonomics: A Window on Spontaneous Order. Economic Affairs, vol.
26, n. 4, 2006, pp. 64-67.
KLEIN, Peter G. Biography of F. A. Hayek (1899-1992), disponível em
http://mises.org/content/hayekbio.asp , acessado em 11 de fevereiro de 2010.
LANGE, Oskar. The Computer and the Market. In: FEINSTEIN, C. H. Socialism, capitalism
and economic growth: Essays presented to Maurice Dobb. Cambridge: Cambridge
University Press, 1967, pp. 158-161.
MANDEVILLE, Bernard de. A Fábula das Abelhas, trad. Josué Jonas de Lima, disponível em
http://economiapoliticabrasil.blogspot.com/2009/03/fabula-das-abelhas-de-
bernard.html , acessado em 19 de outubro de 2009 [1705].
MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. Volume I, Tomo II. São Paulo: Editora
Nova Cultural, 1996. Tradução de Regis Barbosa e Flávio R. Kothe [1867].
MEDINA, Eden. Designing Freedom, Regulating a Nation: Socialist Cybernetics in Allende’s
Chile. Journal of Latin American Studies, vol. 38, p. 571-606.
46
MIDGLEY, Mary. Evolution as a Religion: Strange hopes and stranger fears. London and
New York: Methuen, 1985.
MIGONE, Andrea. Globalization between the Hayekian and Polanyian perspectives:
Spontaneous order or embeddeness? 2006. 334 f. Tese (PhD in Political Science) –
Simon Fraser University, Burnaby, Canada, 2006.
MISES, Ludwig von. Economic Calculation in the Socialist Commonwealth. Disponível em
http://mises.org/pdf/econcalc.pdf , acessado em 15 de fevereiro de 2010 [1920].
MUKKONEN, Martti. Karl Polanyi and the “Double Movement”. In: 9th Conference of
European Sociological Association, 2nd-5th September, 2009, Lisbon.
NORTH, Douglass. Markets and Other Allocation Systems in History: The Challenge of Karl
Polanyi. Journal of European Economic History, vol. 6, p. 703-716.
ÖZEL, Hüseyin. Four Horseman of the Apocalypse! Marx, Weber, Schumpeter and Polanyi.
In: ICAPE: Economic Pluralism for the 21st Century, 2007, Salt Lake City.
POLANYI, Karl. A grande transformação: As origens da nossa época, 9ª ed. Rio de Janeiro:
Campus, 2000 [1944].
______. Our Obsolete Market Mentality: Civilization Must Find a New Thought Pattern
Commentary, vol. 3, 1947, pp. 109-117.
POLANYI, Michael. Review. Economica, vol. 16, n. 63, agosto de 1949, pp. 267-268.
______. The Tacit Dimension. Chicago: University of Chicago Press, 2009.
RIBEIRO, Francisco Carlos. Hayek e a teoria da informação: uma análise epistemológica.
São Paulo: Annablume, 2002.
SANDEFUR, Timothy (a). Some problems with spontaneous order. The Independent Review,
vol. 14, n. 1, verão de 2009.
47
______ (b). Is “know it when I see it” enough? Cato Unbound, 22 de dezembro de 2009,
disponível em http://www.cato-unbound.org/2009/12/22/timothy-sandefur/is-know-it-
when-i-see-it-enough/ , acessado em 25 de março de 2010.
SMITH, Adam. Riqueza das Nações. Tradução de Norberto de Paula Lima. [S. L.]: Hemus
2003.
SUGDEN, Robert. Spontaneous Order. Journal of Economic Perspectives, vol. 3, n. 4, 1989,
p. 85-97.
THOMASBERGER, Claus. The Economic Society: Market results and human purposes. In:
Tenth Annual Conference of the European Society for the History of Economic
Thought (ESHET), Porto, 2006.
VRIEND, Nicolaas J. Was Hayek an Ace?. Southern Economic Journal, vol. 68, n. 4, 2002, p.
811-840.