Harvey+e+a+Pós-Modernidade

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ANAIS DO III CONGRESSO INTERNACIONAL DE PSICOLOGIA e IX SEMANA DE PSICOLOGIA 18 a 21 Setembro de 2007 ISSN: 1678352X 1 HARVEY E A PÓS-MODERNIDADE Andressa Fernanda Augustin 1 - Universidade Estadual de Maringá Michelle Aparecida dos Santos 2 - Universidade Estadual de Maringá Paulo Sérgio Pereira Ricci 3 - Universidade Estadual de Maringá Palavras-Chave: Pós-Modernidade; Subjetividade; Harvey. Entender a Pós-modernidade é um critério básico para a investigação na ciência psicológica, pois o homem, e conseqüentemente sua subjetividade, estão sendo constituídos no dado contexto histórico. Tal contexto, na atualidade, configura-se com o sistema econômico capitalista, o qual é sustentado pela ideologia neoliberal e pela forma de pensamento pós-moderna. Esse pós-modernismo contrasta com o pensamento iluminista moderno, o qual permitia o conceito de verdades universais e focava a busca do conhecimento através da razão. O contraste também se mostra em relação ao estruturalismo, que limita o homem aos sistemas e estruturas, como a política, a educação, a religião. Assim, no estruturalismo as verdades são ainda consideradas universais, quando referenciadas a estruturas ou sistemas. Essas formas de pensamento faziam parte da modernidade, na fase industrial do capitalismo. No final do século XX ocorreram muitas mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais do mundo contemporâneo, as quais geraram emergência de uma condição pós-moderna. O pensamento pós-moderno, ou pós-estruturalista, coloca justamente a universalidade do conhecimento em xeque. A partir daí a própria realidade é colocada em dúvida, pois ela é considerada complexa o bastante a ponto de não ser passível de conhecimento. A multiplicidade ganha espaço, os desejos transformam-se em necessidades, o conhecimento que se sobressai é o parcial e dependente da perspectiva de cada um. O capitalismo é sustentado pela ideologia neoliberal, a qual contrasta com a política do bem estar social, que, por sua vez, corresponde em uma intervenção do Estado na pretensa melhoria das condições sociais. Contrasta também com a economia planificada. O neoliberalismo é a favor da economia concorrencial, que por sua vez traz consigo a 1 Graduanda do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e participante do Grupo de Estudo “Neoliberalismo e a constituição da subjetividade” coordenado pela Profª Ms. Lenita Gama Cambaúva. Endereço: Rua Saldanha Marinho, 356. apto 1202. CEP 87030-070. zona 07. Maringá – PR. E- mail: [email protected] 2 Graduanda do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e participante do Grupo de Estudo “Neoliberalismo e a constituição da subjetividade” coordenado pela Profª Ms. Lenita Gama Cambaúva. Endereço: Rua Avenca, 889. CEP 87065-360. Maringá PR. E-mail: [email protected] 3 Graduando do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e participante do Grupo de Estudo “Neoliberalismo e a constituição da subjetividade” coordenado pela Profª Ms. Lenita Gama Cambaúva. Endereço: Rua Quintino Bocaiúva, 1270. Ed. Village Verde. apto 13. bloco C. CEP 87020-160. Maringá – PR. E-mail: [email protected]

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HARVEY E A PÓS-MODERNIDADE Andressa Fernanda Augustin1 - Universidade Estadual de Maringá Michelle Aparecida dos Santos2 - Universidade Estadual de Maringá Paulo Sérgio Pereira Ricci3 - Universidade Estadual de Maringá Palavras-Chave: Pós-Modernidade; Subjetividade; Harvey. Entender a Pós-modernidade é um critério básico para a investigação na ciência psicológica, pois o homem, e conseqüentemente sua subjetividade, estão sendo constituídos no dado contexto histórico. Tal contexto, na atualidade, configura-se com o sistema econômico capitalista, o qual é sustentado pela ideologia neoliberal e pela forma de pensamento pós-moderna. Esse pós-modernismo contrasta com o pensamento iluminista moderno, o qual permitia o conceito de verdades universais e focava a busca do conhecimento através da razão. O contraste também se mostra em relação ao estruturalismo, que limita o homem aos sistemas e estruturas, como a política, a educação, a religião. Assim, no estruturalismo as verdades são ainda consideradas universais, quando referenciadas a estruturas ou sistemas. Essas formas de pensamento faziam parte da modernidade, na fase industrial do capitalismo. No final do século XX ocorreram muitas mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais do mundo contemporâneo, as quais geraram emergência de uma condição pós-moderna. O pensamento pós-moderno, ou pós-estruturalista, coloca justamente a universalidade do conhecimento em xeque. A partir daí a própria realidade é colocada em dúvida, pois ela é considerada complexa o bastante a ponto de não ser passível de conhecimento. A multiplicidade ganha espaço, os desejos transformam-se em necessidades, o conhecimento que se sobressai é o parcial e dependente da perspectiva de cada um. O capitalismo é sustentado pela ideologia neoliberal, a qual contrasta com a política do bem estar social, que, por sua vez, corresponde em uma intervenção do Estado na pretensa melhoria das condições sociais. Contrasta também com a economia planificada. O neoliberalismo é a favor da economia concorrencial, que por sua vez traz consigo a 1 Graduanda do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e participante do Grupo de Estudo “Neoliberalismo e a constituição da subjetividade” coordenado pela Profª Ms. Lenita Gama Cambaúva. Endereço: Rua Saldanha Marinho, 356. apto 1202. CEP 87030-070. zona 07. Maringá – PR. E-mail: [email protected] 2 Graduanda do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e participante do Grupo de Estudo “Neoliberalismo e a constituição da subjetividade” coordenado pela Profª Ms. Lenita Gama Cambaúva. Endereço: Rua Avenca, 889. CEP 87065-360. Maringá – PR. E-mail: [email protected] 3 Graduando do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e participante do Grupo de Estudo “Neoliberalismo e a constituição da subjetividade” coordenado pela Profª Ms. Lenita Gama Cambaúva. Endereço: Rua Quintino Bocaiúva, 1270. Ed. Village Verde. apto 13. bloco C. CEP 87020-160. Maringá – PR. E-mail: [email protected]

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ideologia de liberdade, competição e individualidade tanto no setor do mercado quanto no das relações interpessoais. O presente trabalho tem como objetivo uma análise preliminar do pensamento pós-moderno como expressão das transformações sócio-econômicas do mundo contemporâneo. O autor em questão é David Harvey (1935 -). Harvey é um autor britânico Ph.D em Geografia pela Universidade de Cambridge e professor de Antropologia na Universidade de Nova Iorque (CUNY) desde 2001. Seu entendimento a respeito da pós-modernidade tem contribuído para o debate político e social, trazendo à tona a crítica do capitalismo e de sua ideologia neoliberal. Em seus estudos afirma que as noções de tempo e espaço se modificam de acordo com as mudanças das condições materiais. Seu referencial teórico é o materialismo-histórico-dialético, que permite tanto uma análise social a partir das relações econômicas, como também, uma visão crítica do contexto no qual vivemos. O presente trabalho baseia-se principalmente na leitura e discussão do livro “A condição pós-moderna” de David Harvey (1994), da obra “A condição política na pós-modernidade: a questão da democracia” da autora Madalena G. Peixoto (2004), e do artigo "Fundamentos do pós-modernismo: a Psicologia em questão" das autoras Lenita G. Cambaúva e Marli A. C. Sanches, cujo referencial teórico e objetivos não se afastam do que foi previamente explicitado. Partindo de tal referencial teórico, Harvey explica o quanto o capitalismo leva à aniquilação do espaço geográfico visando à sua própria produção e reprodução. O autor diferencia algumas propriedades da modernidade e pós-modernidade. Caracteriza a modernidade como fordista, onde o capital era fixo na produção, o mercado era estável e a padronização e homogeneização faziam parte do sistema. Fatores econômicos como o desenvolvimento tecnológico, a globalização crescente, o consumo de serviços, a produção de informações, e a acumulação flexível de capital, propriamente toyotistas, levam à ideologia neoliberal e ao pensamento pós-moderno (PEIXOTO, 2004). Harvey frisa essa acumulação flexível, apresentando o que ele denomina de economia de cassino, na qual o capital é fictício, ou seja, o capital é representado em títulos, ações e crédito, sendo ele um dinheiro virtual, sem respaldo na riqueza real. Esse dinheiro mais do que nunca se traduz em mercadoria. Com dinheiro real pode-se alugar ou comprar dinheiro virtual. Assim tudo passa a ser visto como mercadoria, inclusive as relações pessoais, o que resulta em um grande processo de reificação, em que o homem passa a ser visto como mero objeto O resultado disso é a ruína dos valores morais e da ciência, a subordinação da ética em relação à estética, a importância da imagem e a intensa efemeridade e fragmentação que substituíram as verdades eternas que caracterizaram a modernidade, levando a desconfiança na ciência. Assim se cria um sistema que beneficia poucos ao custo de muitos, o que Harvey chama de “acumulação por desapossamento”, através da qual as elites político-econômicas aumentam seus benefícios à custa das classes baixa e média, o que gera a imensa discrepância entre as classes sociais. O autor faz um paralelo das propriedades pós-modernas com a política de Ronald Reagan aplicada na década de 80 nos Estados Unidos. Reagan foi eleito em um contexto de Guerra Fria e do Vietnã, em que os EUA se mostravam em declínio econômico e desemprego crescente. Objetivava a derrota do comunismo, e para isso gerou gastos imensos com a indústria bélica. Reagan propunha reduzir ao máximo a interferência do Estado em

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programas sociais e ao mesmo tempo ainda reduzir os impostos das classes mais altas da sociedade norte-americana da época, sendo ambas características do neoliberalismo. A essa política deu-se o nome de “economia vodu”– ou como Harvey denomina, a economia de cassino (PEIXOTO, 2004, p. 63) – da mágica, do dinheiro virtual. Em Reagan também pode-se observar a supervalorização da imagem, esta mais importante que a demonstração de ética e moralidade. Outra reflexão apresentada por Harvey repousa justamente nas conseqüências que a economia capitalista traz no que se diz respeito ao tempo e espaço. A aplicação de novas tecnologias, por exemplo, pode ser considerado um fator que contribuiu na aceleração da noção de tempo. Uma expressão disso seria a aceleração da produção e, consequentemente, do consumo, a qual leva a conseqüências diferentes em cada setor da sociedade. Para os trabalhadores, por exemplo, acelerar a produção implica não somente no uso de tecnologias, mas também em intensificação do trabalho. Já para os setores de comunicação e de distribuição de mercadoria, a aceleração do consumo é o que importa. Daí surgem técnicas que levam a circulação de mercadorias com maior velocidade. (TILL; PIRES; KAZ, 2003). A descartabilidade da moda e dos produtos, e o papel engrandecido da publicidade também contribuem, em muito, na aceleração do consumo. Isso significa uma sociedade acostumada com o que é descartável, jogando fora o tempo todo não só objetos, como também valores, estilos de vida e relações com o outro. Isso explica a flexibilidade desse homem em questão. Quanto às transformações espaciais, essas se refletem também nos sistemas de comunicação, os quais tornam a distância quase que irrelevante. Aí entra, contraditoriamente, a característica neoliberal da valorização do local e do particular. Isso significa dizer que quanto menos importantes são as barreiras espaciais, mais importantes se tornam as particularidades locais. (TILL; PIRES; KAZ, 2003). Outra implicação espacial a ser explorada que é indicada por Harvey é o simulacro, o qual permite a experiência virtual de estar em qualquer lugar do mundo (ou em qualquer época) a qualquer momento. Os conceitos de Harvey nos deixam claro o quanto são variáveis essas concepções de tempo e espaço e o quanto elas são dependentes das relações econômicas de cada sociedade. Justamente por essa sua visão que Peixoto (2004) caracteriza Harvey, bem como Jameson, como autores que superaram a dicotomia moderno/pós-moderno, nos mostrando a fluidez e tenuidade entre esses conceitos. A questão final é que David Harvey entende que o neoliberalismo naturaliza as desigualdades e contradições inerentes ao capitalismo, o que cria um ambiente em que os civis não acreditam em seu poder de transformação a partir de ações coletivas (PEIXOTO, 2004). Portanto, o autor afirma que não há possibilidade de transformação enquanto for mantida a idéia de que as desigualdades são naturais, pois se pensa que não há como transformar algo que não é produto da sociedade em questão. Contudo isso não significa dizer que o autor não vê possibilidades de transformação social, o que iria contra seu referencial teórico do materialismo histórico dialético. O que Harvey propõe é o conhecimento a respeito do capitalismo pós-industrial e de suas conseqüências acerca da subjetividade dos indivíduos. Tal conhecimento permite desmascarar as ideologias que sustentam o sistema e que disfarçam as discrepâncias sociais, além de ter em vista o resgate do homem como um sujeito histórico e social. A partir daí se faz possível a cultura de

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resistência, pois a partir do momento em que se evidencia a existência da luta de classes e a fonte das diferenças sociais, a transformação passa a ser cabível.

Referências Bibliograficas: CAMBAÚVA, Lenita Gama; SANCHES, Marli Aparecida Calça. Fundamentos do pós-modernismo e do neoliberalismo: a Psicologia em questão. 2005 HARVEY, David. A condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 4. ed. São Paulo: Loyola, 1994. PEIXOTO, Madalena Guasco. A condição política na pós-modernidade. A questão da democracia. São Paulo: EDUC: FAPESP, 2004 TILL, Joy; PIRES, Julie; KAZ, Stela. Resumo comentado do capítulo 17. A compreensão do tempo-espaço e a condição pós-moderna. 2003. Disponível em: <http://joytill.com.br/at_acad/harvey/index.htm> Acesso em: 23 abr. 2007.