Criação da Equipe Vocacional Paroquial, mais que um meio para a Pastoral Vocacional
Grande Ensaio Equipe Leste 1 - Programa Vocacional 2015
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EnsaiodePesquisa-AçãoVocacional2015
Oentrelaçardedezvozes
ArtistasOrientadores:DanielFreitas,EvaFigueiredo,IgorGasparini,MiguelPrata,NinaGiovelli,OsvaldoPinheiro,
PaulodeTarso,RafaelTruffauteRonaldeMonezzi
CoordenadordeEquipe:RobsonAlfieri
CoordenadorRegional:JoséRomero
Equipamentos:CEUAricanduva,
CEUFormosa,TeatroZanoniFerrite,BibliotecaCassianoRicardo,BibliotecaAdelphaFigueiredoeBibliotecaAfonso
Taunay
SÃOPAULO2015
2
ÍNDICE
1. PREFÁCIO–ROBSONALFIERI...............................................................03
2. ENSAIO–A.O.MIGUELPRATA...............................................................05
3. ENSAIO–A.O.IGORGASPARINI.............................................................11
4. ENSAIO–A.O.RONALDEMONEZZI......................................................17
5. ENSAIO–A.O.NINAGIOVELLI................................................................21
6. ENSAIO–A.O.RAFAELTRUFFAUT.......................................................28
7. ENSAIO–A.O.EVAFIGUEIREDO............................................................32
8. ENSAIO–A.O.OSVALDOPINHEIR0......................................................38
9. ENSAIO–A.OPAULODETARSO............................................................42
10. ENSAIO–A.ODANIELFREITAS..............................................................49
3
PREFÁCIO
Durantetodooanode2015,houveumatentativainfinitaderegistraros
encontrosdoProgramaVocacionalatravésdeumimagem/fotoquesintetizasse
a comunhão entre o artista vocacionado, o artista orientador e a processo
criativo que os rodeava.No princípio, era apenas a captura de uma fotografia,
depoisestafotocomeçouatransformaroencontroemumaobradeficção,eao
mesmo tempo um registro da realidade e um autorretrato. O objeto era o
processo criativo, o vocacionado, o artista e o “fotógrafo” em transformação.
Peter Urmenyi diz que: “A fotografia é a poesia da imobilidade: é através da
fotografiaqueosinstantesdeixam-severtalcomosão”.Oregistroimagéticonão
davacontadaimensidãodoqueacontecianoespaçodecriação,noentanto,ele
tentavacapturarosentimentoexplodidonapele/corpodequemestavaatrás,ao
ladoenafrentedacâmera.
Apartirdessadeliciosaaventura,aequipeLeste1decidiuentãoutilizar
esse sentimento imortalizado como um disparador para aquilo que fervilhou
durantetodooano.Comoseafotografiapossibilitasseaaberturadeumportal
dopassadonãotãolongínquo.
Somos10artistasdescobrindojuntosemisturadososabordoencontro.
NOTAPARAOLEITOR:Destacamosalgunsassuntosaolongodetodooensaio,colorindootextoconformelegendaabaixo:
-Contexto
-ProcessoArtístico-Pedagógicoem2015
-FormaçãoeEmancipação
-Interlinguagens
-Referências
-Questionamentos
4
5
Prólogo(ouintermezzo)
Em2014,atuandonoCEUFormosaemmeuprimeiroanonoPrograma,
orientavaapenasumaturma,queseencontravaduasvezesporsemanaprafazer
teatro. Em 2015 no Zanoni Ferrite, foram três. Três caminhos, três processos
criativos, com todas suas crises, erupções, tempestades, calmarias, ódios e
amores. Tudo triplo. Ainda participando do Grupo de Trabalho Vocacional
Memória,realizamosumencontropúblico,novaspublicaçõesnoBlog,acriação
deumapáginanoFacebook,umaentrevistaeoprincípiodaorganizaçãodeum
acervodoPrograma.Tudoisso,emaismuitasreuniões,ocupações,assembleiase
açõesemequipe.
Experimentareiiniciaresseensaioapartirdapergunta:comoeuaguentei
esseano inteiro,aindadivididoemoutros trabalhos, irnos encontros, reuniões e
açõeseaindaestarcomalgumasaúdeemdezembroeescrevendonovascartasde
intençãoparaseguircomtudoisso?Tragoparapertodestaperguntaàquefiza
todosvocacionadosnoiníciodoano:Oqueeuvenhofazeraqui?Ampliandopara:
OqueseguememovendoparapertodessePrograma?Nomeiodesuascondições
decontrataçãoeestruturadetrabalho.
Percorrerão este ensaio, imagens, fotografias, realizadas pelo
Coordenadordessaequipeepelosprópriosvocacionadosaolongodoano.
Atravessandoaescrita,algumasinterferênciasdefragmentosdamemória
doprogramaemitálico.
6
Toda-via,prosseguir
PorMiguelPrata
(ositensnãoestãoemordemdeimportância)
1. UMAQUESTÃODEEXPERIMENTAÇÃO
De certa forma, os lugares que ainda preservam alguma liberdade em
processoscriativos,estãoemambientesdeformação.Háquesereconhecerque
nesses casos, muitas vezes (conhecemos também, infelizmente, exceções), se
carregamenoscompromissosparaacriaçãoartística.Nãoexisteanecessidade
de comercializar sua obra, seja diretamentepara opúblico, seja indiretamente
pelo incentivo público. Estamos resumindo um pouco superficialmente a
questão,mas partiremos do princípio que no ambiente da formação, a criação
artísticatemcomomaiordoscompromissos,arelaçãocomaprópriaformação,
ouseja,umcompromissocomodesconhecido,comoquemoveeformaoser,ou
seja,édeterminadamaisporfatoresinternosqueexternos.
Nesse sentido, pude caminhar com as turmas por diversos caminhos,
experimentar novas práticas com a ação teatral, diálogos inesperados com a
dança, outras possibilidades cênicas que nem sempre se refletem na obra
apresentada ao final do ano, mas mobilizam um trabalho de 8 meses. Ainda
assim,podesetambémousarnessaobrafinal,umadireçãoassinadaporquem
nunca dirigiu, figurinos de figurinistas sem cursos prévios, trilhas sonoras de
músicos inesperados, iluminações de atores apaixonados, dramaturgias
incidentais e atuações de grande intensidade de crianças, jovens, adultos e
velhos,madurosounãonotratamentocomacena.
Na fundação do Teatro Vocacional a gente partiajustamentedasdiferençasqueexistiamentreoteatroprofissionaleonãoprofissional.NosajudoumuitooestudoteóricodoalemãoManfredWekerth, que trabalhava com Brecht e escreveu o livrointeressantíssimo Diálogos sobre a encenação. Para o TeatroVocacional,sentíamosanecessidadedenosdebruçarmossobreospontospositivostantodoteatroamadorquantodoprofissional.Agente percebe que várias coisas consideradas negativas para oteatro profissional podem ser consideradas positivas para oamador, ou vocacional. A longevidade do trabalho do teatroamador, por exemplo, pode levar a necessidade não de se
7
apresentar,masdeaprofundarotrabalhosobreumtema.Ocorpodoatortambéméumaquestãofundamental.CELSOFRATESCHI.1
2. UMAQUESTÃOPOLÍTICA- LongotrechocomMariaTendlau:
Como foi conformado o projeto, num processo muito
coletivo de investigação – em que cada orientador tentavatranspor sua experiência de criação conforme ocorria nos seusrespectivos grupos teatrais profissionais e compartilhava suasdescobertas, conquistas e malogros, com uma equipe deorientadoresbastanteinteressadanadescobertadeprocedimentosque garantissem um aprendizado a partir da experiência dacriação–eramuitodifícil estabeleceraprioriumroldepráticascomuns.Oqueregiaestainvestigaçãoeraaavaliaçãosistemáticade seus resultados e a disposição para a correção dos desvios,mirandoumprincípioúnico:oteatropodesercompreendido,comoconformação, tradução estética, de um olhar critico para arealidade,atravésdapráticadacriação.Oquefacilita,ameuver,a tradução mercadológica deste enunciado são duascaracterísticas de seu modo de ação: primeiro o fato do TeatroVocacionalatenderumpúblicoqueéalvoparaaçõesde inclusãosocial e de controle de “risco social”; e segundo, por utilizar aformapedagógica, ou seja, estabelecer processos deaprendizado,numarelaçãoorientador-orientado,indivíduo-grupo.Cria-seassimumprojetoquepodesersimplesmentetraduzidonumarelaçãodeatendimento (e não de co-investigação, de co-criação) a umapopulação especialmente relevante para as diversas ações decontrolesocial.2
1EncontropúblicorealizadonoTendaldaLapaemagostode2014.Verentrevistacompletaemhttps://vocacionalmemoria.wordpress.com/2014/10/29/encontro-publico-com-celso-frateschi/2Entrevistacompletaemhttps://vocacionalmemoria.wordpress.com/2014/10/29/entrevista-com-maria-tendlau/
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- Ação de toda equipe de artistas do Programa em apoio a ação dos
estudantessecundaristas.
VERLINKhttps://www.facebook.com/robson.alfieri.5/videos/10206906739020049/?
theater3. UMAQUESTÃODEESTARENTREASLINGUAGENS
VERLINKhttps://www.facebook.com/ronalde.monezzi/posts/1046746825369350
Noiníciodoano,pudemosemnossasreuniõesdeequipeconversarmuito
sobreomodocomocadaartistaconduzia(ouplanejavaconduzir)seuprocesso,
ecomoissosedavaemdiferenteslinguagens.Apartirdoslimitesdecriaçãode
cada uma delas, íamos questionando nosso modo próprio de pensar cada
encontro e uma forma que às vezes se cristaliza e enrijece no pensar um
processoartísticoemdeterminadalinguagem.
Pordiversasdemandasnãopudemosseguirnessesdebates,porémcreio
que essa relação inter-linguagens da equipe se expôs commais vigor em uma
açãocoletivanaBibliotecaAdelphaFigueiredo,juntandoartistasorientadorese
vocacionadosdediversaslinguagensnumaaçãocomum.
Anovadistribuiçãoporterritóriostambémpermitiuumencontrocoma
orientadora de dança que atua também no Teatro Zanoni Ferrite, abrindo a
9
possibilidadededeslocamentosde vocacionadospor entre as linguagens eum
fortalecimento da ação do Vocacional no espaço, culminando em um final de
semanaemquemaisdemilpessoascompareceramaoteatroparaverteatroe
dança.
Corpo:moradademinhaloucura3
4. UMAQUESTÃODEAMOR(oudetudooqueco-move)
VER(ecuidarde)CORPOSEMDESCOBERTA
3TrechodapeçaAquisevestealoucura,deumadasturmasdoVocacional2015noTeatroZanoneFerrite.
Umaequipegrandedezartistas
cincoequipamentosquatrolinguagensumagrandeescuta.
Seguir...
10
Euqueagradeçodeestaraqui.Ficofelizqueexistaessemovimentodentro
do Vocacional. Significa que o programa está vivo, apesar de todas as
dificuldadesquevocêstêm.Nanossaépoca,nóstambémtivemosdificuldades.E
comoéimportanterecuperararelevânciadoteatrocomoatividadehumanae
divulgá-lo,deixá-loabertoporaí.Existeafelicidadeespecialemestaraquino
Tendal.Foiemocionanteentraraquidepoisde25anos,depoisdainvasãoouda
ocupação.Umprazer.Vouchorarsozinhoaqui.Obrigadopelapresença.CELSO
FRATESCHI.4
A igualdade é fundamental e ausente, ela é atual e intempestiva, sempre
dependendoda iniciativasde indivíduos egruposque, contrao cursonatural
dascoisas,assumemoriscodeverificá-la,deinventarasformas,individuaisou
coletivas,desuaverificação.Essalição,elatambém,émaisdoquenuncaatual.
JACQUESRANCIÈRE.5
4Entrevistajácitada.5RANCIÈRE,Jacques.Omestreignorante:cincoliçõessobreaemancipaçãointelctual.BeloHorizonte:EditoraAutêntica,2011.
Comunhão.(Parausarumcapítulodeumrussofamosonoteatro)
11
Claro-EscuroPorIgorGasparini
Apósótimaexperiênciaem2014noCEUFormosa,emquetrabalheicom
corpos bastante distintos e com variadas potencialidades, do jovem ao idoso,
Vocacionadoscomesemexperiênciaemdança,eatéportadoresdenecessidades
especiais, decidi dar continuidade aosprocessosneste equipamentono anode
2015.Estaheterogeneidadeapresentouamimumapaletademuitascores,cada
corpo com seu potencial criativo, com sua história de vida, com sua vontade
comunicativa,dançando...Eestedesafiosemantevevivodurantetodooano,com
alguns remanescentes do ano anterior, e outros novos, igualmente disponíveis
paraodesenvolvimentodosprocessosartísticosemdança.
Ofatodeternaequipeartistasorientadoresdediferenteslinguagensfez
com que o diálogo se potencializasse nesta direção, e isso está diretamente
relacionado à minha atuação: tanto em 2014, em que nosso processo se
aproximoudasartesvisuais,quantoem2015,emquenosaproximamosdotexto
edaliteratura.
Em 2014, desenvolvi alguns processos criativos e a pintura norteou a
investigação. Inspirados ora pela música, ora por técnicas variadas entre as
danças urbanas e contemporâneas, ora por laboratórios, ora por experiências
bastante individuais, tentamos descobrir um corpo-pincel. E, com ele, muitas
telasforampintadas:comenoprópriocorpo,nocorpodooutro;chão,paredes,
objetos e teto; dentro e fora do espaço dos encontros; no teatro; na gestão. O
corpo-pincel, por ser mídia de si mesmo
(Teoria Corpomídia de KATZ e GREINER,
1998), desenhou sua história. E cada
Vocacionado pintou suas memórias e
imprimiu nos gestos toda a sua
experiência pessoal. A cada encontro
foram desenvolvidas novas iniciativas de
trabalho, novos disparadores; partes do
corpo tornaram-se pincéis; e cada um
trouxecadavezmaistintaparanossagrandetela.
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Jáem2015,partimosdestecorpo-pincel,descobertoetrabalhadonoano
anterior, para buscar novas possibilidades de experiência e, desta vez,
encontramosnotexto,enapalavra,grandepartedamotivaçãoparaestadança.
CadaVocacionado foi estimuladoa trazerum
texto (poesia, conto, prosa, poema, entre
outros)que fossesignificativoparaele,queo
tocassedealgumaforma.Apartirdisso,todos
passaram a “dançar esses textos”, tanto
individual, quanto coletivamente, dialogando
nãoapenascomsuaprópriaescolha,mascom
asdosdemaistambém.Cadapoemafoi lidoe
dançado, debatido e resignificado, palavras
foram destacadas, interpretadas... E assim,
nosso processo foi sendo construído, em
diálogodiretocomestaliteratura.
“Poesiaébrincarcompalavras;comosebrincacombola,papagaio,pião;
Sóquebola,papagaio,peãodetantobrincarsegastam.Aspalavrasnão;
quandomais se brinca com elas,mais novas ficam. Comoa água do rio
queéáguasemprenova;comocadadiaqueésempreumnovodia;Vamos
brincardepoesia?”–JoãoPauloPaes6
E passamos a pensar então na Mostra de Processos. “O processo se
engendra de maneira cooperativa, com a participação de todos os artistas
envolvidos, que atuam conjuntamente no decorrer da própria pesquisa de
linguagem. As opções cênicas, nesse caso, não surgem como determinações
vindas de fora, mas de dentro das experimentações, possibilitando uma
investigaçãocoletivadecaráterprocessual” (DESGRANGES,2012,p.205).Esse
trechoextraídodolivro“AInversãodaOlhadela:alteraçõesnoatodoespectador
teatral”resumebemaminhaatuaçãocomosArtistasVocacionados.Emnenhum
momento busquei impor algo (de fora), mas eles próprios foram encontrando6OstrechosdestacadosemitálicosãoalgunsdostextosselecionadospelosVocacionadosparao
desenvolvimentodenossapesquisaClaro-Escuro.
13
caminhos(dedentro)quesurgiramapartirdasvárias inquietaçõescorporaise
reflexivasdesenvolvidas ao longodo ano.Oque temove?Qual a busca?Quais
questõeslheinquietam?Eapartirdisso,trabalhamosmuitopelaimprovisação,
tentandoaomáximodiversificarosdisparadoresdessadança,sempreatrelado
àssensaçõeseàindividualidade.
Vejo o Vocacional potencializando processos artísticos colaborativos,
vistoqueháa constituiçãodeumcoletivodeartistasem trabalhoconjuntode
investigação.Edestainvestigaçãodiretamenterelacionadaàpesquisadostextos,
percebeu-se que parte deles tinha uma temática mais alegre, enquanto outra
parteeramaisdensaepesada.Destadualidadesurgiuotemadenossamostra:
Claro-Escuro.
A partir disso, dividimos então os textos “claros” e os textos “escuros”,
selecionandopalavrasqueos representassemparaodesenvolvimentode cada
cena:
Claro: espelho, poesia, bravura, alegria, brincar, sensível, morangos e
branco.
Escuro: espelho, dor, tristeza, lágrimas, solidão, caverna, tempestade,
gritarepreto.
14
Gostaria de destacar também que houve, neste ano, um princípio de
emancipação de parte dos Vocacionados que, por estudarem juntos na EMEF,
formaramumgrupoparaapresentaçõesdiversasemeventospromovidospela
própria Escola como Feiras Culturais e Show de Talentos. Este grupo de
adolescentesseorganizouemhoráriosdistintosdasorientaçõesdoVocacional,
ensaiaram por conta, e foram respaldados pela Coordenação do CEU que os
apoiou, cedendo espaçopara que ensaiassem.Eles criaram sozinhosuma cena
completa que foi algumas vezes apresentada. Sob a minha orientação, e
utilizando dos conhecimentos adquiridos ao longo do ano, puderam dar um
passo além, que acredito que deva ser destacado justamente por ser um dos
pilaresdestePrograma.Tenhoentãoincentivadoquecontinuemseencontrando,
mesmonoperíododerecesso,paraque,quemsabe,nãosurjadaí,umgrupode
dança.
"Emcadapassopercorremosdiversoscaminhos,emcadagiroviajamoso
mundo,emcadaolhartransmitimosdesejos,emcadatoquemultiplicamos
sensações, em cada queda transcendemos a emoção, em cada dança
sonhamos;comospésnochão"-RinaldoDonizetedeFreitas
GostariadedestacaraindaaAçãoCulturalquenossaEquiperealizouna
BibliotecaAdelphaFigueiredo,vistoqueofocodesteencontrofoi justamenteo
diálogodasvárias linguagensque compunhamnossogrupodeorientadores.A
partirdasobrasdosartistasvocacionadosdeartesvisuaisdoCEUAricanduva,
que foram expostas como em uma galeria no piso superior da biblioteca, o
encontrotevetotalliberdadeparaquecadaumseexpressassedamaneiralivre:
tocandouminstrumento,cantando,dançando,atuando,pintando...Comalgumas
poucas indicaçõesqueafixamosnasparedescomodisparadores,ecomaúnica
regra de não poder falar, houve um lindo momento de compartilhamento
artístico, sem julgamento, em que cada vocacionado pôde experimentar das
váriaslinguagens,nãonecessariamenteasua,expressarseusdesejos,dandovoz
ao seu interior. O rastro deste encontro ficou impregnado nas paredes, com
frasesepalavrasque foramescritasdochãoao teto,umamarcapotentedeste
encontronaqueleespaçoeemcadacorpoqueestevepresente.
15
Paraencerrar,aindapensandonaMostradenossoprocesso,acreditona
importânciadeumtrabalhoquepromovaumdiálogocomopúblico,queolevea
refletir, pensar, questionar. Não defendo que deva haver um entendimento
completodaobra,maseu,enquantoartista,devoapresentarcaminhosparaque
opúblicopossaencontrarsuasformasdeinterpretação.Eomeioutilizadopara
essacomunicaçãoéocorpo,mídiadesimesmo,queporsisó, jáapresentaum
fluxoconstantedetrocadeinformações,segundoaTeoriaCorpomídia.
A comunicação ocorre permanentemente na relação entre corpo e
ambiente. Todo corpo, humano ou não, existe e pode ser chamado de corpo
quandopuderseridentificadoporumacoleçãocircunscritadeinformaçõesque
não para de se transformar. “Meio e corpo se ajustam permanentemente num
fluxo inestancável de transformações emudanças” (KATZ eGREINER, 1998, p.
91).Acomunicaçãoéentãotecidaporesseajustecontínuodetransformações.
Sendo cada corpo uma mídia de si mesmo, isto é, do conjunto
circunstancial de informações que o torna corpo e que nunca se completa, é
possívelafirmarqueosprocessosdecomunicaçãonoambientenãoseestancam,
vistoqueo fluxodetrocasentreamboséconstante.Énofluxocomunicacional
que corpo e ambiente lidam com as informações, e elas buscam a sua
sobrevivência através da adaptação e da reprodução. É neste ponto que se
inscreveomeumomentoprofissionalatualemuitodoquevejocomopotencial
nosVocacionados,poiscadacorpoquechegaàsorientaçõesjátrazconsigotoda
asuacoleçãodeinformações,dehistórias,dememórias.
Oquevemdedentro?Oquevocêdesejaexpressarcomsuadança?Qualé
essa dança interior? Consequentemente, o objetivo foi então o de mostrar o
potencial de cada corpo, individualmente, compensando a heterogeneidade
inerente à realidade do nosso grupo: lendo, escrevendo, falando, dançando...
Claro-Escuro conseguiu desenvolver sua forma de escrita em dança e que eu
esperopoderternovaspáginas,ouumanovaedição,em2016.
“Apoesianão é sentimento,mas experiência, e quepara escreverum só
verso é preciso ter visto muitas cidades, homens e coisas, conhecer os
animais, sentir comovoamospássarose saberquemovimento fazemas
flores ao se abrirem pela manhã; é preciso ter lembrança de mulheres
sofrendonahoradoparto,depessoasmorrendo,decriançasdoentes,de
16
diferentes noites de amor; e depois é preciso esquecer tudo isso, esperar
quetudoissoseincorporeaonossosangue,aonossoolhar,quetudoisso
fiquefazendopartedenós”.–R.M.Rilke
Referências:
DESGRANGES,F.AInversãodaOlhadela:alteraçõesnoatodoespectadorteatral.
SãoPaulo:HucitecEditora,2012.
KATZ,H.;GREINER,C.Anaturezaculturaldocorpo.InLiçõesdeDança3.Org.:
SilviaSoterRobertoPereira.RiodeJaneiro:Univercidade,1998.
17
Interdisciplinaridade:ArtesVisuais,Teatro,Dança,MúsicaeLiteraturacomoeixosde
processoscriativos.
PorRonaldeMonezzi
A educação atual ainda se preocupa na sua maior parte, com o
desenvolvimento cognitivo e técnico do aluno, a absorção de informações, ou
seja, a formação de um indivíduo voltado para o exercício de uma profissão
específica,comprojeçãonomercadodetrabalho.Confereseàeducaçãoatualum
sentidoutilitaristaetecnicista,característicasvoltadasparaainformação.
Naeducação tradicional, contextosvoltadosparaavalorizaçãodenossa
cultura, sensibilidade, do lúdico, costumes regionais, da criatividade, são
deixados em segundo plano a favor da democratização do ensino e de uma
cultura educacional que privilegia a globalização e a massificação de ideias
estabelecidas para o desenvolvimento socioeconômico do país. As artes como
meiospossíveisdemelhoriasocial,aindasãoconsideradascomoformaçõesnão
tão necessárias ao desenvolvimento humano e, destamaneira, carecemde um
tratamentodiferenciadonãoamparadopelaeducaçãobásica.
Consequentemente,cadavezmaisasociedadetransbordasedetécnicos,
formapessoasmenossensíveis,despreocupadoscomoutro,comobem-estardo
planeta e das pessoas a sua volta e cada vez menos, estabelece os futuros
apreciadoresdearte,estudiososnaárea,docentesdeensinoartísticorepletosde
umidealhumanitárioeformadordapersonalidade.
O filósofo Gusdorf (2006) admite que a interdisciplinaridade permite
reagruparassignificaçõesdoconhecimentoepreservarasua integridade,pois
revisitaahistóriadahumanidadecomointuitodecumpriresteobjetivo.Oautor
vêna interdisciplinaridadea capacidadede reunirde formaordenadao saber,
sem aumentá-lo de forma desordenada. A interdisciplinaridade confere
qualidadeaosdiversossaberes.Atuanocampodossaberesdeformacentrífuga,
contrariando a força centrípeta que atualmente os acolhe. Ela ordena o
conhecimento,sobaaçãodaconvergênciaepermitereconstituirasuaunidade.
18
A ideia de integração e de totalidade presente na interdisciplinaridade
permite a conciliação de conceitos pertencentes às diversas áreas do
conhecimento,comafinalidadedepromovernovosconhecimentos.
A interdisciplinaridadeadotadopeloProgramaVocacionalem2015,não
somente se reverberou na sua organização e pensamentos nas equipes, mas
tambémnamaneiracomoosvocacionadospassaramapromoverareexplorarão
das fronteiras das Artes Visuais, Teatro, Dança,Música e Literatura existentes
entreelas,comointuitodeorganizarossabereseasparcelasdecontribuiçãode
cada uma das linguagens. A interdisciplinaridade sintetizou as diversas
linguagensemproldestaunidade.Elaseestendeparaaeducação,pelo fatode
permitir a quebra da rigidez dos compartimentos onde as disciplinas ou
linguagens se encontram isoladas nos currículos escolares. Mais que isso, ela
permiteaformaçãodeumaetapasuperiorparaaslinguagens.Elacondensauma
carênciametodológicalegítimaenecessária,poisprocuraaintegraçãocurricular
paraalémda trocade informaçãosobreobjetivos, conteúdos,procedimentose
compatibilizaçãodebibliografiaentredocentes.
Ainterdisciplinaridadeéumfenômenocontínuo,quenuncapara,queestá
emconstantemovimento.AArteéumobjetodeconhecimentodinâmico,devida,
designificados,decriaçãoesensibilização.Por taismotivoséqueambasestão
intimamenteligadas,secompletamesefundem.
Trabalhar de forma interdisciplinar no Programa Vocacional se faz
necessário,poisnãoexisteumefetivoensinodeArteseelenãoproporcionarao
alunoareflexão,aexperimentaçãoeacriação.
Somente a partir de mudanças que levem em consideração as relações
profundas entre as linguagens artísticas, a educação poderá se tornar
significativaetransformadora.
ProcessoArtístico-Pedagógicoem2015https://www.youtube.com/channel/UCHR7DMR4IJDuueJqqtUmVPw
19
“EmArte,procurarnãosignificanada.Oqueimportaéencontrar”. PabloPicasso
20
ReferênciasBibliográficas
LIMA, Sonia Albano; BRAZ, Ana Lucia Nogueira: Interdisciplinaridade:
Arte,linguagenseculturacomoeixosdeprocessoseducativos,artigo,2012.
GUSDORF,G.O gato que anda sozinho. In: Pombo,O.; Guimarães,H.M.;
Levy, T. Interdisciplinaridade - Antologia. Porto: Campo das Letras, p. 13-36,
2006.
LIMA, Sonia Albano. Ambiente musical, pensamento interdisciplinar e
educação. GHIENA, Alejandro Pereira et allium (Ed), Actas del X Encuentro de
Ciencias Cognitivas de la Musica. Buenos Aires/ Argentina: SACCOM
/UniversidadAbiertaInteramericana.ISBNn.978.987.27082.0.7.20-23Julio
de2011,p.911-917.
21
Experimenta-tenta-recebe-doa-expande-recolhe-pausa-articula-gira-desarticula-quebra-vibra-
reage-propõe-escuta-diz-repete-pausa-trasforma
PorNinaGiovelli
“Experimentar”, verbo transitivo e pronominal, que instauramos como
ação principal e como modo de operar das orientações de Dança no Teatro
Zanoni Ferrite. Nos instrumentalizamos como artistas, dando ferramentas e
provocando os artistas vocacionados a experimentarem seus corpos como
potência para assim criarem possibilidades de ter mais autonomia, para que
ampliassem suas as maneiras de operar no mundo, de conviver, de se
experimentaresecolocar,sempreapartirdocorpoedomovimento.
Apropostaerasempreamesma,masabriaparamúltiplaspossibilidades:
experimentar o corpo através da dança, um “programa de experimentação” é
propostoeosvocacionadosentramemdeviresdasrelaçõescomsuassensações,
com o outro, com os espaços do teatro. Nossos encontros funcionavam como
fissuras no tempo e na realidade, sempre apareciam nas conversas e relatos
sensaçõesdedescontinuidadedotempo-espaçoedocorpo.
Emsuaconferência“Notassobreaexperiênciaeosaberdeexperiência”
JorgeLarrosaBondía,coloca:“somossujeitosultra-informados,transbordantesde
opiniões e superestimulados; sujeitos cheios de vontade e hiperativos. E por isso,
porque sempre estamos querendo o que não é, porque estamos sempre em
atividade, porque estamos sempre mobilizados, não podemos parar. E, por não
podermosparar,nadanosacontece”,sobaressonânciadessaquestãoeengajada
na proposta do Vocacional de instaurar processos artítico-pedagógicos
emancipatório,mevinumprocessodeconstrução-desconstrução-transformação
com os vocacionados, foi um período intenso em que buscamos apenas
experimentar,semtentarproduzir.
Tomamosocorpocomopontodepartida,permanecemosnele,insistimos
(a dança exige um trabalho infinito para que se possa aprofundar e criar
condições - no corpo- para a emergência de poéticas), nos acalmamos,
22
respiramos,nos libertamosda idéiadequeoencontrodeveriaser“produtivo”,
“eficiente”eentãoalgo(nos)aconteceu.
“A experiência é, em espanhol, “o que nos passa”. Em português se diria que a
experiência é “o que nos acontece”; em francês a experiência seria “ce que nous
arrive”;emitaliano,“quellochenossuccede”ou“quellochenosaccade”;eminglês,
“thatwhatishappeningtous”.Aexperiênciaéoquenospassa,oquenosacontece,
oquenostoca.Nãooquesepassa,nãooqueacontece,ouoquetoca.
A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos
acontece. Dir-se-ia que tudo o que se passa está organizado para que nada nos
aconteça.”Bondía.
Partindo dessa idéia de experiência, como possibilidade de que algo nos
aconteçaounostoque,trabalhamosadançacomo“acontecimentonocorpoeno
espaço” que provoca/gera poéticas. “Porqueadançanão éummero reflexoda
realidadequelheéexterior,masésobretudoumprocessodeconstruçãodeformas
esentidosatravésdaaçãodocorpo” (Maria JoséFazendanoprefáciodaedição
portuguesa do livro Poética da Dança Contemporânea de Laurence Louppe),
assim desde o início das orientações fomos trabalhando dança e corpo como
tema e como meio e não como comentário da nossa realidade. E aqui nos
deparamos com um processo intenso de desconstrução de ideologias sobre a
23
dançaedecamadasjáimpressasnoscorposvocacionados,fomostransformando
aospoucos.
“Ao longo do ano, o corpo e os processos de composição individual e
coletiva, avançaramno sentido de construir uma linguagem, ligando as práticas
diárias a uma reflexão consistente. Fomentou uma minuciosa investigação dos
ritmos internos do corpo, das relações que cada um construiu entre o espaço, a
coletividade, a partir dele, seus códigos e tempo próprios, elaborando uma nova
retóricaartística a cada jogo, construção e experimento.O eterno espiral que se
formanessacontínuapesquisaentreosencontroseoscaminhosabordadosatravés
dos jogos de composição, articulação, partituras de movimento, relação entre
corpo e espaço, fez com que cada corpo pudesse abrir canais de percepção e de
troca,umaautonomiaparaaamplificaçãodapossibilidadedadançaacontecerem
umcorpoquedança,nãosóadança.”
“Tornar esse corpo conscienteme permitiu trazer à tona os estudos e as
vivências sobre o movimento do pôr em cena, explorar meios, formas, assim,
associá-losanovasdescobertas,afimdetraçarmapascorporaisparaumanovae
mais gostosa estrutura de entendimento dançante, na prática. Deste modo,
resgatou em mim a importância e o lugar de estar no tempo da ação, um ser
humano inteiro,presente,ativo,dinâmico, emmovimento, emconstantevir-a-ser
elemesmo,quecrianovasmaneirasdeperceberomundodepensararespeitoda
experiênciahumanaparaumaexperiênciamaterialdomovimento.
Aqui, nos encontros, os meus – e da matéria do coletivo - os desejos se tornam
dança,palavras,gestosdocotidianosetornamdança,onão-espetáculodedança.
Neste ano nasceu um novo momento, que ampliou discussões, quebras de
paradigmas, propondo novas ordens, ou mesmo uma “desordenação” necessária
paraacomposiçãodoEXPERIMENTOI.”(relatodeumaartistavocacionada)
24
Comomover?
Comover
Co-mover
Comover
Para que algonosaconteça,nos toque, para que a experiência nos tome
“requer (de nós) um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos
tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para
escutar,pensarmaisdevagar,olharmaisdevagar,eescutarmaisdevagar;parar
para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião,
suspenderojuízo,suspenderavontade,suspenderoautomatismodaação,cultivar
aatençãoeadelicadeza,abrirosolhoseosouvidos,falarsobreoquenosacontece,
aprendera lentidão,escutaraosoutros, cultivaraartedoencontro, calarmuito,
terpaciênciaedar-setempoeespaço.”,citandonovamenteBondía.
Essa disponibilidade é algodifícil de instalar,mas o engajamentoque o
jogoeadançapedem foramapontandocaminhos,paraouvirantesdepropor,
paradarespaçoparaooutro.Nesseaspectogostaríadedestacardoismomentos:
1.oencontroquerealizamosnaBibliotecaAdelphaFigueiredo,umeventointer-
disciplinar que reuniu no mesmo espaço de experimentação as linguagens da
equipe Leste 1 (artes visuais, dança, música e teatro provocamos nos
vocacionados um estado corporal de suspensão do juízo, da vontade, do
automatismo da fala e da ação, abrindo espaço para eles experimentarem e
criarem.
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-Vendaroolhosparaaguçaroutrossentidos(audição,tato,cinestesia);
-Instaurarosilêncioparaabrirocorpoparaoutrasmaneirasdesecomunicar;
-Darespaço,instrumento,conteúdo,meios,entres…
A potência desse encontro materializou de fato um estado de
experimentação nos nossos corpos, algo nos aconteceu. E ao refletir sobre o
encontrocomosvocacionadospensamosemcomoaartepodesernãosóinter-
disciplinar como também indisciplinada: arte como manifesto, como potência,
como experimento, como tentativa, como criação e transformação de nós
mesmos,comomaneiradecriarsentidosdecoletividadeedecriarlinhasdefuga
parapotencializaroutrasrealidades.
2.MostradeProcessosdoTeatroZanoniFerrite;querealizamosemparceria
comogruposdoVocacionalTeatrodessemesmoequipamento.
Oroteirocoreográficoquecriamosfoinadamaisquemaisum“programa
de experimentação”, nosso foco sempre foi o processo e não a criação de um
“produto coreográfico”. Com muito trabalho e concentração os vocacionados
entraramemcenanorisco,nodesconhecido,poistudosedarianaperformance,
nomomento, na experiência.Não tínhamos certezas, aliás estávamos tentando
desestabilizarasnossascertezaseascertezasdopúblico,apoéticaemergiudo
acontecimento coletivo, da escuta; nosso jogo é uma provocação ao jogo do
cardume, estar juntos mas escutando as potências individuais, para assim
criar/transformarcoletivamenteoespaçoatravésdadança.
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“Cadaperformanceéumarespostamomentâneaparaquestõesrecorrentes:
o quê é corpo? (pergunta ontológica); o quê move corpo? (pergunta cinética,
afetiva e energética); o quê o corpo pode mover? (pergunta performativa); quê
corpopodemover?(perguntabio-poéticaebio-política).”colocaaatriz,performer
e professora Eleonora Fabião, perguntas e repostas que nos movem e nos
mantém vivos nessa busca da emancipação através do fazer artístico-
performático.
Voltandoàprimeirapergunta,“oqueécorpo?”,queamplianossabuscade
arte/dança como criaçãodemundo enão como comentáriodemundo, penso
que é uma questão de muitas respostas e que estando mergulhada nesse
processo com os vocacionais e nesse ensaio sigo de olhos fechados, tateando
Fabião que tateia Espinosa: “Corpos são vias, meios. Essas vias e meios são as
maneirascomoocorpoécapazdeafetaredeserafetado.Ocorpoédefinidopelos
afetosqueécapazdegerar,gerir,receberetrocar.(…)umcorponãoéseparável
desuasrelaçõescomomundopostoqueéexatamenteumaentidaderelacional.O
corpo espinosiano não está, e nunca estará, completamente formado, pois que é
permanentementeinformadopelomundo,ou,partedemundoqueé.Inacabado,ou
ainda, inacabável, provisório, parcial, participante – está, incessantemente, não
apenassetransformando,massendogerado.”
Criar corpo propondo esse olhar espinosiano; pensando o corpo como
territóriodepassagem, como lugarde chegada, comoespaçodoacontecer;vai
gerandoemnósumatransformaçãonanossamaneiradesecolocarnomundoe
nosajudaaquestionarasrelaçõesdepoderqueestamosinseridos;terminoessa
reflexãocitandoomanifestoartísticodeAdrianaGrechi(artistadadança):
“Dança para: Intensificar e ampliar a vida. Tornar o corpo poroso. Criar
sentidode comunidade.Reconhecerque euÉumoutro.Retorcer, amassar,
esticar,arranhar,dobrar,atravessaracadadiaumacamadamaisprofunda
da pele. Aceitar que somos vulneráveis. Celebrar e contestar o presente.
Inventarpossíveisfuturoscomuns.”
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Referências:BONDÍALARROSA,Jorge.Notassobreaexperiênciaeosaberdeexperiência.Conferência proferida na UNICAMP dentro do I Seminário Internacional deEducação,2001.COHENBAINBRIDGE,Bonnie.Sensing,FeelingandAction-TheExperientialAnatomyofBody-MindCentering.ContactEditions.2008.FABIÃO, Eleonora. Performance e teatro: poéticas e políticas da cenacontemporânea.Artigoescritoem2009.
LOUPPE,Laurence.Apoéticadadançacontemporânea.Lisboa:EditoraOrfeuNegro,2012.
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Datradiçãoedatransformação
PorRafaelTruffaut
(Última foto do ano do Vocacional TeatronoCEUFormosa.Umvocacionadosozinhono palco em diálogo com a plateia,construindo uma narrativa. Tradição doteatro: um ator, uma plateia e umahistória. Tradição do vocacional: alinguagemesuasproblematizações.)
(Primeira foto do anoVocacional Teatro no CEUFormosa:noprimeiroplano,um tênis de muitas cores.Simbologia, recém batizadapor mim para odesenvolvimentodestetexto,da nova estrutura doVocacional: interlinguagens.Num segundo plano da foto:o palco e os vocacionados.Transformação.)
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Uma cultura tem dois aspectos: os significados e direçõestradicionais, em que seus membros são treinados; e as novasobservaçõese significados,quesãoapresentadose testados.Estessãoosprocessosordináriosdassociedadeshumanasedasmenteshumanas,eobservamosatravésdelesanaturezadeumacultura:queésempretantotradicionalquantocriativa;queétantoosmaisordinários significados comuns quanto os mais refinadossignificados individuais. Usamos a palavra cultura nesses doissentidos: para designar todo um modo de vida – os significadoscomuns; e para designar as artes e o aprendizado – os processosespeciais de descoberta e esforço de transformação da mesma.Alguns escritores usam essa palavra para um ou para o outrosentido,mas insisto nos dois, e na importância de sua conjunção.RaymondWillians,“ACulturaéOrdinária”
Tendomaisdedezanosdeexistência,oprogramavocacional, comoum
programa de cultura, obviamente criou suas raízes e tradições. A divisão das
linguagenseasmostrasdeprocessos forampilares solidificadospor todoesse
tempocomofatoresintrínsecosaoprograma.Oencontrodeumartistadeteatro
com o de música ou de dança se dava, muitas vezes, num esforço entre seus
artistas orientadores ou, numa atitude muito similar ao comportamento
paulistano do “vamosmarcar de se ver”, em promessas de “vamos fazer uma
açãoaí…”
Neste ano, experimenta-se adivisãodeequipespor região,deixandode
ladoadivisãopelaslinguagens.Trêsdemúsica,doisdedança,trêsdeteatro,um
devisuais,umcoordenadordeteatro.Atradiçãosofreumarupturaemdireçãoa
uma transformação. Gera-se uma expectativa de como será as ações e
encaminhamentos deste ano.Mas até omeio do ano, nada e significativo para
detectarumamudança.
(Parêntesesparareforçarumapessoalidade:nadasignificativodentrodo
processodoteatronoCEUFormosaedomeutrabalhonoprograma.Cienteque
estoudoprazerquemeuscolegasdamúsicarelatavamdesairdaestruturaquea
linguagem de música propunha para o programa. Ciente da mobilidade que
vocacionadosdoCEUAlvarengaedoteatroZanonifizeramentreaslinguagens.
Cientes de outras mudanças que me fogem da memória no momento que
escrevo)
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Unsdoismesesantesdo fimdoano, conseguimos realizarumaaçãode
interlinguagens. As obras dos vocacionados de artes visuais seriamo estímulo
paraacriaçãodeoutrasobrascênicas,visuaisoumusicais.Nenhumdenósda
equipeestavaesperandoo resultadocatárticoque foioencontro.Algomudou,
estavamudandodomododediálogoentreaslinguagens.Saímostodoscomuma
sensação de êxtase, sem dar conta do que aconteceu. A transformação da
tradição ocorreu como num parto, teria que ser diferente após esse encontro.
Umamelancoliaveioemseguidaaomeuêxtase:comolidarcomestaaçãocom
ummêsparaoprogramaacabar?Comeceientãoaproblematizaraação.
Portersidoextremamentesensorialeemocional,nãoconseguimosobter
um espaço para construir no dia uma reflexão sobre o processo com os
vocacionados. Jáeradifícildirecionaraatençãoparaasobrasplásticasapósas
manifestações pós-olhos abertos. Quando conseguimos criar uma roda de
conversa,percebiquetivemosmuitasaçõespotentesnodia:osolhosvendados
num espaço estranho, a relação com as obras plásticas, a possibilidade de
experimentar uma linguagem diferente da sua. Mas tudo ficou secundário em
relação ao “rito” que se impôs. Não menosprezando o rito, mas algo dessa
amplitudemereciaumdesdobramentomaior, construirumcaminhoapósessa
ruptura.NasceuoVocacionalinterlinguagensdaequipe,maseleprecisavaandar.
Trêssemanasantesdo fim:deumamaneiramuito informal,a turmado
Zanonivisitaa turmadoFormosa.Apresentaumacenaaquideum,umaalido
outro, mais algumas e bora fazer roda e conversar. Os meninos vão puxando
temas diversos e chegando em reflexões: maneiras de narrar, criação de
figurinos, produção da materialidade, trabalho em coletivo, feminismo,
circulação entre os espaços. Uma reunião de pesquisa-ação entre os
vocacionados.Comotantasquejápudeobservaremoutrasmostrasdeprocesso.
Me peguei sentindo falta dessas reuniões, dessa tradição. Sim, é a formatura
deles, sem nenhum valor depreciativo na expressão. Fomentando a cultura da
região,seemancipandodedirecionamentosdoartistaorientador.
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(Foto“estrangeira”:peloespaço,provavelmentefoialgummomentonoZanoni.Ovãoentrequemage(nopalco)equemobserva(naplateia).Umanarrativanomeio.Qual seria a narrativados vocacionados após a açãode interlinguagens?Qual será a narrativa? Como eles fomentaram processos híbridos após essaexperiência, quais serão os desdobramentos? Proposta (dentre tantasexasperadas pela incerteza da continuidade do programa, da equipe e dosvocacionados): repensar a ação da Adelpha Figueiredo para o início dostrabalhosnoanoquevem.Buscardesdobramentosparaestaação.Transcenderoritoetransformarainterlinguagememalgocomum,ordinário.)
32
ensaiodepesquisa
PorEvaFigueiredo
Na música são sempre muito bem
vistosaquelesmúsicosquetemboa‘leituraa
primeiravista’ouseja,numprimeirocontato
comuma folha cheiade códigose sinais ele
extrai disso, tal como o compositor
concebeu:amúsica.
Masaverdadeéquemesmoomelhor
dos músicos sempre deixa escapar
elementosquenumprimeirocontatonãose
pode extrair de um papel. Elementos que
exigemintimidade,reconhecimentoafetivoe
apropriação.
Este émeu segundo ano no Vocacional e tambémmeu segundo ano na
Biblioteca Cassiano Ricardo, portanto já não se trata mais de uma leitura a
primeira vista sobre o programa, nem sobre o equipamento e quanto menos
sobreocotidianodosprocessos.Nestetempocrieilaços,aprofundeiprocessose
vialçarvootrabalhosdoanoanterior.
Aomesmo tempo, amúsica do vocacional do ano passado emúsica do
vocacional deste ano são completamente diferentes. Este ano estivemos
rompendo, esticando, conectando, celebrando, refletindo e fazendo música, o
cotidiano,naprática,seapresentoudiverso,instigante,apaixonanteedesafiador,
própriodosprocessoscriativosedoprogramavocacional.
O primeiro grande e poderoso contraste deste ano foi a equipe multi-
linguagensquemegerouquestionamentosevontadessobreoprocessocriativo
emmúsica.Estarreunidosemanalmentecomartistasdedança,teatro,visuaise
músicame fezpercorrer os inevitáveis caminhosde semelhanças e diferenças,
sendoasdescobertasdeambososcaminhosmuitoimportantesnocotidianodas
orientações.
33
Os artistas das demais linguagens tem a sorte de sua formação misturar
conteúdos e processos criativos com naturalidade, enquanto na música as
nossasformaçõesnãotemestacaracterística.Nestesentidoovocacionalmúsica
éparamimarealização,amaterializaçãodoqueacreditoemarte/educação,pois
darvoz,potencializareasvezes tãosomentecuidardessesprocessoscriativos
latentes, é um feito que não existe em nenhum outro espaço/proposta em
música.
2015
Esteano,porserosegundo,teveasimultaneidadedecolheitaeplantio.E
éclaroqueessepercursofoifeitoamuitasmãos,asmãosdosvocacionados,dos
coordenadores,dosartistasdaminhaedeoutrasequipesedaparceria,sempre
muitoboa,desteequipamento.
UmdostrabalhosiniciadosnoanopassadofoicontempladocomoVAI.A
banda Alameda dos Anjos gravou seu primeiro CD! Todo esse processo do
Alamedacomcertezadavaumnovoensaiodepesquisa,porissovoueconomizar
palavrasanexandooqueescreviparaelesdepoisdoshowdelançamentodoCD.
Mas sem dúvida esse foi um projeto central nesse ano, estimulandomuito os
demais trabalhos que oriento. Além desta, articulei mais uma ação com outra
política pública, um de meus vocacionados foi Jovem Monitor este ano na
Cassiano, e já conseguiu seguirnoCentroCulturaldaPenhanamesma função.
Ontem quando o encontrei estava muito contente, pois descobriu que “luz
tambémseafina!”epretendiafazercursosdeiluminador.
Aindasobreascolheitas,umeventoquecrieianopassadotevesequencia
neste ano, commais público emais artistas, oQuartaAumentada, toda última
quarta-feira domês. A importância desta continuidade, naminha opinião, é a
própriaconstruçãodamemóriadovocacionalnesteespaço,essasações,quando
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continuadas reverberam, garantindo no ano seguinte demanda, dando
visibilidade e gerando algum tipo de “segurança” por parte do público que
começaacontarcomumaagendafirme.
Agora no assunto dos plantios, surgiram este ano três principais
trabalhos: um grupo de choro, o trabalho autoral do Gabriel Ferreira e a
Orquestra Vocacional. Sobre estes três processos vou me demorar um pouco
mais, pois foram eles o cotidiano do
vocacionalmúsicanaCassiano.
O grupo intitulado Filhos de Eva,
neste ano construiu um repertório
baseadonocuriosogostopessoaldesses4
jovens: o choro! Em algum momento me
questionei sobre o repertório dessas
orientações... se eu estava puxando a
sardinhapraomeulado,poisdefatoeuhavialevadodoischorosparatocarmos.
Mas ao longo do processo eles mesmos me tiraram essa dúvida, trazendo
apaixonados um choro atrás do outro para tocarem juntos e comentando o
quantoestavamvislumbradoscomasonoridadedesserepertório.Eufuiapenas
disparadora.Asorientaçõesestiveramcentradasemapenasumgêneromusical
para estesmeninos,masutilizamos este repertório comodesculpa, anteparo e
ponto de partida para inúmeras questões, experimentos, assuntos, discussões,
práticas e conteúdosdamúsicaedavida.Encerramosoano comumshowno
teatrinho da Biblioteca Hans, quando fizemos captação de fotos e vídeos
profissionais,quelogoestarãodisponíveis.Ogrupopretendeensaiarduranteos
meses semvocacionalequase todoselesprestaramconcursonaEMESP.Estes
meninos,sãoemsuamaioriaalunosdaETECdemúsica,ondeaprendemsobre
harmonia, teoria, regência e pratica coral. Em certomomentomedei conta da
importânciadovocacionalmúsica,poisseelestemacessoadiferentesconteúdos
e profissionais da música na ETEC. Me perguntei então: o que os levava a
frequentar regularmenteminhas orientações?A resposta não demorava em se
apresentar na prática do cotidiano... eles deixavam explicito, que tudo o que
fazíamos, falávamos, tocávamosnãosepareciaemnadacomas formaçõesque
estavamfazendoemoutrosespaços.
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O segundo trabalho carrega a duplicidade entre plantio e colheita. Ano
passado,obateristaDaniel Selmerdava
seusprimeirospassosnabateria,comas
minhas preciosas orientações de
clarinetista e cantora! Muitas vezes
ríamos das minhas tentativas de tocar
bateria, e entre uma tentativa e outra,
minha e dele, somado ao infinito
interesse e dedicação dele e também
confiança em mim, esse ano foi diferente! Ele virou Jovem Monitor e pode
comprarcomodinheiroquerecebeumensalmente,ospratosdabateria.Eassim,
desde que vieram os pratos, todos os sábados os pratos da bateria chegavam
antesdemimnaCassiano,eeusubiaasescadascomumatrilhasonoraquefoise
transformando semanalmente. Dos sons desajeitados de quem começa, foi se
configurando uma firmeza de quem alguma coisa já sabe. Assistir essa
transformação ao longo desses dois anos foi muito emocionante. Selmer se
juntouaocriativoGabriel, compositor,cantoreviolonista,quechegouatémim
por conhecer o meu trabalho do ano passado. Gabriel veio assiduamente de
Osasco,construindocomSelmerseuprimeiro trabalhoqueestreouesteano.O
trabalho pretende seguir nas férias, com o apoio dos músicos do Alameda, e
iniciaroanoseguintecomumaformaçãomaior,combaixoeguitarras.
Oterceirotrabalhofoiumexperimento,partindodeumdesejopessoalde
guiar um trabalho de criação coletiva, para fomentar os instrumentistas de
diversosequipamentosquejátinhambagagemnoinstrumento.CrieiaOrquestra
Vocacional,aprincípiocomumviolão,umsaxsoprano,umaflautaeumviolino.
Iniciei essa ideia nos últimos meses do programa, ainda sim conseguimos
compor juntos uma música, num processo de criação que eu já havia
experimentado com um septeto há alguns anos atrás. A ideia central é
cantar/tocarasmelodiaseircriandoconjuntamentetodooarranjo,emsuma,a
própriamúsicasetornaguiadoprocesso.Estetrabalhoeupretendoseguircaso
eucontinuenoprograma,poisoimaginocomoarticuladordentrodovocacional
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música,dandovazãoaumademandaexistentenoprograma,quesãoosmúsicos
combagagemtécnicanoinstrumento.
Por fim, pensando sobre o ano, trago algumas reflexões finais sobre os
assuntosqueestiveramo tempo tododialogandocomaprática.Odia-a-diado
vocacionalé incrível,areflexãocotidiana,acadaencontronósredesenhamoso
queestavasendofeito,osassuntosdamúsica,domundoedavidasemisturam,
naturalcomoaprópriaarte,naturalcomoaprópriavida.AChiquinhaGonzaga,
compositora de choro do séc XIX, trás a tona o feminismo na música, e
derrependesurgeapergunta“existemulherguitarrista?”.Orepertóriodochoro
nosfeztambémsentarcomPicasso,Dali,Kandinsky,FridaeMirónumamesae
situarondeestavaochorinho,imaginarcomoseriamossonsdochorinhoseeles
fossem tocar acompanhando os diálogos que propunham os pintores. Estes e
muitos outrosmomentos commuitos outros assuntos, comquestõesminhas e
deles, foram com certeza fruto do contato com as outras linguagens, que
habilidosas no diálogo com a contemporaneidade, exigiam agora que amúsica
ampliassetodososseusdiálogosapartirdeumrepertórioedesuaspráticas.
O vocacional em minha opinião inaugura na linguagem da música um
caminhonuncaantespercorrido.Osartistasdemúsicanãocontamemformação
algumacomorientaçãoartística.Namelhordashipóteses,algumprofessormais
sensível tedizcoisasquerevelamsobreasuaexpressãoeconduzemparaeste
ouaquelecaminho.Agora,terasortedeumafalasensívelémuitodiferentede
dedicar um ano inteiro para: escutar as expressões artísticas dos indivíduos e
grupos,ampliardiscussões,ampliarreferênciasestéticas,percorrercaminhosde
criação, misturar assuntos que saem dos instrumentos com os assuntos que
saemdavidaedomundo,orientarsobreaspossibilidadesdetrabalho,situarno
tempo e na história os sons, desenvolver no instrumento, experimentar
apresentar-se sem caráter estudantil e principalmente dar voz aos desejos
artísticos.
Nãoraramente,essesdesejossãoabafadosporestaescalaouaoutraque
vocêaindanãodomina,aleituradapartituraqueaindafaltaaprender,aafinação
do instrumento que tem que melhorar e assim o sujeito vai deixando para a
outravidaaideiadeexpressarseusafetoseideias!Ideiaessa,queotrouxepara
pertodamúsicaedepoisétratadacomtantafaltadeatençãopeloseducadores.
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Nessesdoisanosdevocacional,osvocacionadosmetrouxeramprofundas
transformações no meu fazer artísticos, pois ao percorrer com eles esses
caminhosqueovocacional inaugura, é inevitávelqueelesmeorientem, coma
maneira singular e natural como criam, tocam, desfrutam e celebram nossos
momentosjuntos.Talvezporisso,semprequealguémentravanoencontronão
entendiaquemdenóseraomestredoencontro.
Desejo que ano que vem possamos seguir nessa troca sem fim, pois já
estoucuriosaemouvircomoéamúsicadovocacional2016.
ANEXO
Aspalavrasquenãodisseaopúblicoparanãochorar...
OsomdoAlamedadosAnjoséfeitode ímpeto,deafetosedeumadedicaçãosemfim.Éfeitodeamoredemuita,masmuitaamizade!Amizadeestaqueporpresentedodestinopossotambémmeincluir.OsomdoAlamedaéfeitodemuitosmateriais,massobretudoéfeitodesonho!Não só do sonho que elxs realizaram, da gravação do primeiro CD. Masprincipalmentedossonhosdelesparaomundo,agoraparaestessonhosmuitaatenção!Os sonhos deles apagam algumas linhas imaginárias que não deviam existir,linhas que dividem isso daquilo, linhas que dão nó, linhas que apertam... einauguram linhas que ligam, conectam e refazem percursos reinventandocaminhos.Caminhosconstruídoscommuitapoesia!Poesia feitacomaelegânciadequemamapoesia.OAlamedafazmúsicacomoquemnãoesperaummilagre...Entãocontam:1,2,3,4...Emesmosemesperar,(outalvezjustoporquenãoesperam),omilagreacontece!Osomsurpreende,emociona,agitaecalaagente.Sãoartistasemtudo,naslinhasdebaixo,nocabelodesgrenhado,napoesiaquerecitam,nafirmezadosritmos,nosarranjos...Eassimcheiosdequalidadeséqueeles inauguramessanova fase,comumCDpesopesado,feitoamuitasmãos,muitoestudo,muitapoesia,muitovideogame(queeusei)emuitaforça.VidalongaaoAlameda!!!!!
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CARTADEPROCESSO`A(O)SVOCACIONADO(A)S
SãoPaulo,04dedezembrode2015
Prezado(a)sVocacionado(a)sDepoisdetantas intensidades,deumadifícileprazerosaconvivênciateatralasmargens de um rio lamacento e petrificado, por nome Aricanduva, venho pormeio desta saudá-lo(a)s pela feliz oportunidade do encontro e das tantaspossibilidadesdeexistircultivadaspeladedicaçãoepeloamor.Nadamaisameaçadoraverdadedoqueopontodevista.Começo essas poucas palavras dessa forma porque foi o principal caminhotrilhado,portanto,nãopoderiadeixardedizer.Pudemosnestespoucoseintensosmesesdetrabalhoperceberqueavidaandamesmoloucademais,tudoquenoséapresentadojávempronto,aseleçãoestadada e será sempre garantida pela ilusão da verdade que nos fazem engolir eaceitar comonossas, as tais individualidades correm soltas e nos tornam cadavezmaisseresplenosdasdescobertasdeummundofeitodelixoseescorias.Percebemos que em determinados momentos nossos discursos denunciavamnossahipocrisiaeingenuidadeemnecessitarmosacreditaremalgumasverdadesplastificadas, mas o que pude perceber é que nossa existência tem há duraspenas levantado faíscas periféricas que fazem toda diferença e bagunça nessa(dês)ordemecaossocial,equeserperifériconãoéescolha,éumajuntamentodeNÃOSsociaisquenosforamCUSPIDOSnacaraecomorespostadevolvemosque nunca vamos aceitar essa condição de seres rastejantes em definitivo, ediremostambémquecorreremossempreasoltaparaosenfrentamentosdiáriosenecessáriosqueestãoporvir.Queroafirmarmaisumavezafelicidadedonossopontodepartida,poisfomosjunto(a)srevirado(a)spelasmemóriasdeumpassadocadavezmaispresenteepudemos fazer as nossas escolhas coletivas e assim conseguimos jogar para acenaaquelepontodevistaquaseesquecidoouadormecido.Nonossomais recenteeúltimoencontrode2015,dedicadoao improvisoeaoamor,nospalcosdessaAricanduva,pudeperceberaforçaepotênciacoletivadanossacriação,umforteeintensopontodevistasaltouvibranteaosnossosolhos,uma abertura singela e honesta em direção ao encontro reflexivo da nossacondição material, social e espiritual de existir nessa condição de classeexplorada que necessita muito ainda conversar e se entender como CLASSEexplorada,porqueoexploradorfarádetudoparaessemovimentonãoexistireinfelizmente ainda iremos servir a muito patrão safado, rangendo os nossosdentes até a corda se arrebentar, porque na nossa poesia só se respira vidalibertaenadamais.
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Chorei publicamente e vocês assistiram, pois fui tomado de emoção àquelamistura antropofágicade todoo trabalho realizado; infelizmentenem todo(a)sestavam, por isso devo dizer, pois o que nos apresentaram foi extremamentebelo e significativo, revelouo quepedagogicamente estava emdúvida. Sempretenhoessaimpressãoquandoestounafunçãodeprovocadordealgumprocesso,vem certo receio de que talvez os caminhos possam em algum momento seperder. Mas ali pude perceber que não, foi uma experiência linda, por issosegureiaemoçãoenãopudemeconter,chorei,massaibamqueeraumchorodebeleza e alegria, coisabonitadever ede sentir, equandodizempublicamenteque o Vocacional de Teatro e Artes Visuais fizeram total diferença na vida devocês,porqueconseguimosvalorizá-lo(a)snasimplicidade,ficocomasensaçãodedevercumprido,sinaldequeatrocafoiverdadeiraeefetiva.Nadramaturgia,conseguirmosdarosaltoparaalémdoqueseriaseapresentarereforçaras individualidades,porqueapoucaexperiênciaquetenhonoassunto,tem me mostrado que histórias pessoais normalmente tendem a correr esserisco,creioqueissotalvezfoionossograndeacerto,poisconseguimosconversare dialogar com a complexidade dos nossos tempos tão ardilosos e de tantasbarbaridadesnaturalizadas.Emrelaçãoaoresultadoestético,poderíamoseteríamosmuitoaavançar,masotempo não nos permitiu, portanto, fica aqui a alegria da beleza adquirida nocurtoespaçodetempo,agoraétorcerparaquenofuturoprósperoconsigamosdarcontinuidade.Lembro bem de cada um chegando timidamente na sala, alguns ou algumaspouco(a)s com experiência em teatro e a grandemaioria com quase nada, ounada,mas fomosnos entrelaçando e conseguimos uma relação bemhumana ehonesta. Muitas foram às histórias que nos aproximaram: teve a da tatuagemproibida,obilhetedoshownodiaerrado,ofimdeumgrandeamor,aperdadopai,aperdado filho,acondiçãodemulhernummundomachista,a invasãodasala, as brincadeiras, a infância, a sexualidade reprimida, o ser estrangeiro namesmaAmericaetantasetantasoutrashistóriasquenemconsigonomear,masqueficarãovivaseternamenteemnossoscorações.
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DanielFreitas–Artistaorientadordeartesvisuais–CeuAricanduva
Querotambémregistraraparceriacomasoutraslinguagensecompanheiro(a)s.Desegundaasegunda,falávamostantodevocêsqueocruzamentocomamúsica,adança,ocanto,apoesia,aplasticidadeeoamor foraminevitáveisemtodooprocesso.Coma escuta sempre atenta fuime apropriandodomovimentodo(a)s demaisparceiro(a)s.Quandomenarravamalgo,tomavaaquilocomomeuealgumaaçãologoeramovida.Nossoserroseacertosficarãoemdívidacomascontribuiçõesdemuitasvozesepensamentosquenosajudarama lançaroutrosolharesparaoqueestavavivo,pulsandoequenãopoderiateroutroresultadosenãoamorecriação.
OsvaldoPinheiro–Artistaorientadordeteatro–CeuAricanduva
Eprafinalizar,vaionossoobrigadoaosgrandesmestres“PauloFreire,AugustoBoal, Rubem Alves, Viola Spolin, Brecht, Pina Bausch, Calle 13, AO’s,Coordenação,Vocacionado(a)seaosadolescentesquenostomaramasalaàqueledia. Deixo aqui o agradecimento sincero de um tempo heróico, duro, seco ehonesto,defalaspoéticaseligeirasdomestrePauloFreire:
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“Sigamoscomonossotempodeparirasmúltiplasmarchas,todasnecessáriasequevirãoparalouvaredenunciar:Marchadosquenãotemescola,marchadosreprovados, marcha dos que querem amar e não podem, marcha dos que serecusamaumaobediência servil,marchadosque se rebelam,marchadosquequerem ser e estão proibidos de ser, marcha do(a)s marginalizado(a)ssexualmente, marcha das mulheres, marcha dos índios, marcha dos negros,marchadosateusedosquesóqueremapenasesomentevivereamar”.AtéopróximoATO:Todavezquedamosumpassoemqualquerdireçãoomundosaidolugar.Esperoquedepoisdetudo,seponhamemconstanteeeternomovimentar.Fiquemcomosversosdealgunsmomentosdedicadosaoamor,quenosfizerampensar na escuridão da existência, nos tiros às cegas de um fazer dedicado aocoração, sempre ricos de beleza e sensibilidade para a abertura de novas eprofundascrençasquevãoecoarproresto,dosrestos,dosnossoseatéinfinito.EVOÉ!!!
OsvaldoPinheiro
PaulodeTarso–Artistaorientadordemúsica–BibliotecaAfonsoTaunay
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Comoinstrumentalizaruminstrumento,
OuComotransformaruminstrumentonovamenteeminstrumento.
PorPaulodeTarsoLimaBrandão.
TodasascoisascujosvalorespodemserDisputadosnocuspeàdistancia
Servemparaapoesia
OHomemquepossuiumpenteEumaárvore
Serveparapoesia
Terrenode10x20,sujodemato–osqueNelegorjeiam:detritossemoventes,latas
Servemparaapoesia[....]
AscoisasquenãolevamanadaTêmgrandeimportância
(ManueldeBarros,MatériadePoesia)
No geral, as experiências formativas emmúsicas, nos diversos níveis e
espaçosexistentes,desdeprojetosdeiniciaçãoaoscursossuperiores,sebaseiam
no estudo do instrumento musical, no aperfeiçoamento técnico deste e no
aprimoramento da execução por meio de instrumentos. Mesmo quando este
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instrumentoéavoz,ouosrecursoscomposicionais,ouatémesmooslimitesde
uma linguagemeestiloespecífico,aaprendizagememmúsicaévistacomoum
dominar de ferramentas variadas que um dia nos permitirão alavancar nossa
ânsia criativa. O que acontece com frequência, porém, é vermos os artistas e
estudantesdemúsicaabsortostodaumavidanabuscadestedomíniotécnicoe
na perseguição obstinada por desvendar todas as possibilidades destas
ferramentas.Oinstrumentopassa,portanto,aserumfimemsimesmo,omotivo
maior da procuramusical. A expressão artística passa a segundo plano, e não
raro, chega a sumir do olhar domúsico. Dito isso, entretanto, não podemos
negarqueamúsicaenquantoexpressãoartísticaaconteçaquasesempre,poiso
fatodo instrumento ser, de fato, um instrumento enãoum fim, faz comquea
subjetividadesempretranspareçae,muitasvezesacontragostodoartista,revele
muitomaissobreosujeitodoqueestegostaria.*
Uma vez feito esse panorama superficial não é estranho afirmar duas
coisas: primeiro, que o programa vocacional pode representar, dentro da
formação musical, um dos poucos espaços onde há possibilidade de
desconstrução desta lógica que relega a segundo plano o processo criativo,
trazendo para primeiro plano o fazer artístico e a busca criativa de cada
vocacionado; segundo, todos os vocacionados, visto que essa lógica perpassa
quasetodososmeiosdecompreensãomusical,chegaram-meatéaorientaçãona
buscaúnicaeexclusivadeaprenderuminstrumento.Todos,umapósooutro,ao
seremperguntadosomotivodeestaremali, respondiam inicialmente: -quero
aprendertalinstrumento.Algunspoucos,quandoampliavamaresposta,apenas
acrescentavam:-tambémdesejoaprenderpartitura!Muitosinclusivejátocavam
oinstrumentoemquestão,eportanto,respondiamcomaseguintevariação,mas
queengendraomesmosentido:-queroaperfeiçoar-menomeuinstrumentoe
termaisrepertório.Nenhumsurgiuinicialmentecomumainquietaçãoartística,
ou melhor dizendo, nenhum chegou com uma inquietação artística formulada
explicitamente.Pareciaquesóimportavaaquelaferramenta.
Masessa ferramentaserveapoesia!Bastoupoucosminutosdeconvívio
entreocoletivoeseusinstrumentospararevelar,nemquefosseumapontinha,
asprocurasartísticasconcernentesa cadaum.Sejapelaescolhadorepertório,
pelas sonoridades buscadas e alcançadas, pela maneira de lidar com as
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dificuldadesqueopróprioinstrumentoproporciona,pelamaneiracomoescutae
se posiciona diante do outro, os sujeitos foram se revelando e com eles suas
vocaçõesartísticase seusdesejosmaisprofundoscomrelaçãoamúsica.E isto
nãoficavaclaroapenasparamim,enquantoorientador,mastambémocoletivo
reconheciaeapontavaistoemcadaumdossujeitospresentes,dandosugestões,
incentivos e celebrando esta diversidade. Ainda sim, esse processo era
inconscienteparaocoletivoetotalmenteobscuroparaosujeito.Ouseja,apesar
deconseguirreconhecercomfacilidadequalidadesartísticasnooutro,quandose
tratava de avaliar a si próprio os sujeitos atribuíam toda sua felicidade e
frustração a boa oumá execução do instrumento. E a busca continuava sendo
para cada um, vencer a dificuldade técnica e desvendar os mistérios do
instrumento, ao invés de saltar emdireção a uma exploração artística apoiada
nosrecursosquecadaumjátinha.
Paramimodesafiopassouaserexatamenteeste:comotransformarum
instrumento novamente em instrumento, ou seja, como revelar para os
vocacionadosqueo instrumentoqueestavaemnossocoloestavasubordinado
asnossasvontadeseinquietaçõesartísticas.Comoexplicarqueorigordoestudo
e o entusiasmo de aproximação ao instrumentomusical dependem sempre do
fimsonoroqueestabelecemoscomometadenossaexpressão?Como fazerver
que o instrumento nada mais é que um objeto que serve a poesia e não seu
determinante? Não me interessava apenas dizer isto explicitamente. Não era
pelapalavraqueessasconstataçõesgerariamseuefeitoapropriado.
Surgiram então, no interior de nossos encontros, duas práticas queme
foramde grandeproveitopara estemeudesafiopessoaldeorientador epelas
quaispudeexplorarseusresultados.Aoperceberpotencialmentequeestasduas
práticas eram, talvez, a solução para os questionamentos queme fazia, tentei
incentivá-lasaomáximo,emborasemmuitoesforço,poiselastinhamumaforça
autônomavindadoprópriocoletivo.Eramelas:oaparecimentodecomposições
dosprópriosvocacionados,quepoucoapoucosesentiramavontadedemostrá-
lasaogrupo,deformaqueacadaencontro,maisvocacionadostinhamvontade
deapresentarsuascomposiçõesantigasenovas;arecepçãoeapropriação,por
partedocoletivo,domaterialautoraltrazido.
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Passamosentãoanosdebruçarsobrecadanovacomposiçãotrazidapelos
vocacionadosnointuitodeelaborar,coletivamente,umarranjoparaelas.Íamos,
através de improvisações, testes e elucubrações tentando definir omáximode
elementos possíveis referentes a sua performance. Introdução, dinâmicas,
contrapontos,partes,entradas,formas,instrumentações,convençõesetudomais
que podíamos lapidar para potencializar o material musical trazido. Cada
vocacionado se via no compromisso de sugerir e complementar com o seu
instrumentoamúsica,deformaqueela,aobramusical,passavaserocentrodo
interesse coletivo. Alguns indícios começaram a aparecer de que a obstinação
pela boa execução do instrumento passara a segundo plano, enquanto que o
interessecriativoeartísticopassavaa figurarcomoprioridade,porexemplo,o
fatodequeemváriasmúsicascertosinstrumentistasresolveramnãotocar,não
por não gostar da música ou por preguiça, mas sim por entender, através da
sensibilidade,queumaformaçãomaisreduzidatinhamaisavercomoqueera
exigido sonoramente por aquela obra, ou então, arriscavam-se em outros
instrumentosaindadesconhecidos,sóparaalcançarotimbrepretendido.
Foi a partir desta dinâmica que acredito ter potencializado os
questionamentos citados anteriormente.Nesse encontro como outro é que os
vocacionados vislumbraram, por um lado, como executores e instrumentistas
que contribuíam na obra do outro, como era possível com elementos simples,
potencializar uma obra e colocar sua identidade artística em benefício do
trabalho alheio. Por outro lado, quando se tratava de uma obra feita por si
mesmo,equecontavacomaparticipaçãodosoutros,ovocacionadodealguma
forma conseguia vê-la de fora, transformada e lapidada, não apenas como um
produto idiossincrático ou de pouco valor, mas como um produto genuíno e
autônomo,quetinhasuapotênciaartísticaprópria,capazdesensibilizá-louma
vez mais, não apenas como criador, mas também agora enquanto expectador
surpreendidodesuaprópriaobra.
SobreissoescreveuovocacionadoLeonardoAugusto:“OMomentomais
marcantequetiveduranteovocacionalfoiquandoouviminhamúsicasertocada
comtodoogrupo”,declarandoquenãoimaginavaqueseutrabalho,surgidode
ideias que ele considerava simples e triviais, pudesse atingir tal resultado
estético.
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Paramim,omomentomaisclarodestesacontecimentos foiamostrade
processo demeio de ano, na biblioteca Affonso Taunay, onde apresentamos o
repertório autoral arranjado em sua totalidade. Ali era nítido os diversos
desdobramentos pessoais e coletivos que certamente vão surgir no processo
artísticodecadaum.Mas,sobretudo,oquemaismeemocionou,foiorespeito,a
capacidadedeescutaecapacidadedeenxergarooutroquetivemosporpartede
todosduranteesteprocesso.
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BrevíssimocomentáriosobreAutonomia.
Outra lógicaeducacionalqueme interessavadesconstruireraa lógica já
implícitada“saladeaula”.Pormaisqueeudeixasseclaroexplicitamentequenão
estávamosno ambiente escolar, e por isso os procedimentos viciados daquele,
não valiam para esse novo espaço, era quase constante a intromissão destes
vícios na linguagem e mesmo na prática dos encontros. Seja tratando-me por
professor ou na solicitação de permissão para ir ao toalete (o que no caso de
indivíduosadultosmeparecebastantesintomático),sejanapassividadecomque
esperavam inicialmente ordens e pedidos para começar o que quer que fosse.
Rapidamente, porém, consegui romper com esta estética e firmamos o acordo
tácitodequeali, naquele ambiente, deveria valeroutrosprocedimentos. Logo
depois de dois meses, os vocacionados já chegavam ao espaço, tiravam e
afinavam seus instrumentos sem que eu tivesse que solicitá-los, antes de
executarasmúsicasseaprontavamedavamascontagens.Arrumavamoespaço
nachegadaenasaída,semnecessidadedeordenamento,eumasériedeoutros
detalhesquecorrespondiammaisaolugarqueoprogramaocupa.Masistopor
sisó,porém,nãoéindícionenhumdoacréscimodeautonomiaporpartedeles.
Issoapenas representavaqueos acordos tácitos e viciososqueantes regiamo
convíviotinhamagorasidossubstituídosporoutrosacordosnovos,porém,que
nãonecessariamenteeramcríticoseconscientes.
Oqueeuqueriaeraqueelestomassemmaisasrédeasdoencontro,que
eles mesmos pudessem gerir, a partir dos seus desejos, os caminhos que
podíamos percorrer para investigar a criação artística. Novamente não me
interessava falar enovamentenãoeraapalavraquedaria contadegerar essa
mudançaefetiva.
Foi então o segundomomento do processo que potencializou estemeu
desafioenquantoorientador.Apartirdoencontroedasintoniafinaquetivemos
noprimeirosemestredoprocesso,osvocacionadospassaramaseencontrarfora
dos horários de orientação, passaram a marcar ensaios, escolher repertórios
próprios, estabelecer metas e construir arranjos de forma autônoma. Quanto
maisissoacontecia,maiseuincentivavaestapráticaeorientavaparaqueelase
fortalecesse. E com isso, passaram a surgir grupos musicais com objetivos
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específicos e buscas estéticas próprias. Os encontros tomaram então outro
caminho,ehouveumamodificaçãobastantegrandecomrelaçãoaorepertório.
Deixamos um pouco de lado as composições autorais e os arranjos feitos no
encontroparatrabalharmaisascoisasqueestesgrupostraziamcomoresultado
deseusencontrosexternos,queeramnamaioriaarranjosnovosdemúsicas já
conhecidas. Ainda que me fosse muito caro o processo ocorrido no primeiro
semestre,notavaapotênciaqueestainstânciaexternatinhanaemancipaçãodos
artistasenvolvidos.Sobretudo,notavacomoeleshaviamdefatoincorporadonas
suas práticas externas, os procedimentos e técnicas trabalhados durante o
primeiro semestre. Nesse sentido, o que agora acontecia era mais um
aprofundamento do que um rompimento do que havia sido feito na primeira
metadedoano.
Paramimacondensaçãodessesegundomomentosedeusimbolicamente
nagravaçãodovídeoclipedamúsica “SegundoSol”deNandoReis,noqualos
vocacionadostomarampartenaconfecçãodetodooprocesso,docomeçoaofim.
Eles escolheram o tema, escreveram o arranjo, definiram as partes e as
instrumentações,captaramas imagenseosom,editaramomaterial.Coube-me
mostrar caminhos, técnicas, recursos e possibilidades para que eles pudessem
alcançarseusobjetivoscriativos.
Notas
*Estaobjeçãomelembra,nomesmosentido,aobjeçãodePauloFreiresobreoensino bancário: “É issoquenos leva,deum lado,à críticaeà recusaaoensino“bancário”, de outro, compreender que, apesar dele, o educando a ele submetidonão está fadado a fenecer; em que pese o ensino “bancário”, que deforma anecessária criatividade do educando e do educador, o educando a ele sujeitadopode,nãoporcausadoconteúdocujo“conhecimento”lhefoitransferido,masporcausadoprocessomesmodeaprender,dar,comosedizna linguagempopular,avolta por cima e superar o autoritarismo e o erro epistemológico [...] Isso nãosignifica, porém, que nos seja indiferente ser um educador “bancário” ou umeducador“problematizador”.(PauloFreire,PedagogiadaAutonomia).
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