Governo precisa de medidas de consolidação de 1% do PIB · Proposta de Orçamento seri conhecida...

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11-10-2016 Mário Centeno garante que vai continuar a aumentar rendimentos e reduzir o défice. Proposta de Orçamento seri conhecida na sexta-feira. PRIMEIRA LINHA ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2017 Governo precisa de medidas de consolidação de 1% do PIB A redução do défice estrutural em 0,6% do PIB como exigido por Bruxelas e prometido pelo Governo no Verão exige medidas de consolidação orçamental de montante superior. Governo tem margem nas regras para aliviar pressão. RUI PERES JORGE [email protected] p ara reduzir o saldo or- çamental estrutural em 0,6 pontos de PIB, como recomendado pela União Europeia (UE) e prome- tido pelo Governo no Verão, o Mi- nistério das Finanças tem de encon- trar medidas de consolidação orça- mental que poderão chegar quase a 1% do PIB. . Estes números ilustram a tare- fa impossível a que o Governo se propõe para 2017: construir um or- çamento que prometa a redução si- gnificativa do défice público combi- nada com Bruxelas ao mesmo tem- po que alega virara página da auste- ridade e promete mais devoluções de rendimentos. Vamos por partes. De acordo com os últimos cálcu- los do Conselho das Finanças Públi- cas, sem medidas adicionais de po- lítica que serão tomadas este ano, o défice orçamental em 2017 pioraria em cerca de uma décima do PIB ou qualquercoisa como180 milhões de euros. A degradação é o resultado de dois efeitos contrários. Pela positi- va, o Orçamento recebe a ajuda da retoma económica que produz mais receita fiscalen3duzês despesas so- ciais. Pela negativa, as contas sofrem com o efeito desfasado de medidas de política econóMica tomadas em anos anteriores. Os exemplos mais imediatos deste segundo efeito são a reposição de salários de funcioná- rios públicos e a redução do IVA na restauração, mas a estes juntam-se outras pressões como despesa adi- cional com PPPjá no terreno, efei- tos do envelhecimento nos gastos com saúde e segurança social, ou menos receita de I RC em 2017 (an- tecipando- a para este ano) decor- rente de medidas como a revalori- zação de activos das empresas ou o recente perdão fiscal. Segundo as úl- timas estimativas do CFP, publica- das em Setembro, a manutenção das actuais políticas sem a ajuda da retomaeconómicaconduziria a um agravamento do défice público de 0,4%a 0,5% do PIB, qualquer coisa como 700 a 900 milhões de euros. Isto significa que para cumprir coma redução do défice estrutural (o que desconta o efeito da retoma da economia) de 0,6% do PIB (cer- ca de L100 milhões de euros) como combinado no Verão, o Governo precisa de encontrar medidas de consolidação orçamental dessa di- mensão, adicionadas do esforço ne- cessário para compensar as pres- sões do passado. Ou seja, qualquer coisa como 1% do PIB, ou1.800 mi- lhões de euros. É sobre este cenário que Mário Centenoeasuaequipa têm de cons- truir o Orçamento do Estado para 2017, prevendo as novas devoluções de rendimentos que estão a ser ne- gociadas à esquerda, como aumen- tos de pensões acima da inflação, que complicarão ainda mais as contas. Assim se percebe que nas nego- ciações entre PS, PCP e Bloco se adopte um princípio de compensa- ção orçamental das medidas para 2017, o que explica os vários aumen- tos de impostos indirectos na calha queo Negócios jáavançou (com des- taque para um novo imposto sobre o património e outro sobre produ- tos alimentares nocivos àSaúde) ou a eliminação faseada da sobretaxa de IRS. Governo 03171 margens Nas suas contas, o Governo conta com duas possíveis almofa- das nas regras, E possível que em vez reduzir o défice orçamental em 0,6 pontos em 2017, o Executivo possa ficar pelos 0,4 pontos, usan- do uma cláusula de flexibilidade prevista aos países com défices in- feriores a 3% do PIB e fora do cha- mado Procedimento dos Défices Excessivos (PDE) - algo que espe- ra conseguir este ano. Além disso, o Executivo poderá fazer passar o Orçamento em Bru- xelas (terá que ser validado até ao fi- nal do mês) com uma redução esti- mada do défice estrutural pelo ser- viços da Comissão de apenas 0,1 ou 02 pontos, o que implicaria o envio a Lisboa de um aviso sério para mo- nitorização das contas, mas pouco mais.

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Page 1: Governo precisa de medidas de consolidação de 1% do PIB · Proposta de Orçamento seri conhecida na sexta-feira. PRIMEIRA LINHA ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2017 Governo precisa de

11-10-2016

Mário Centeno garante que vai continuar a aumentar rendimentos e reduzir o défice. Proposta de Orçamento seri conhecida na sexta-feira.

PRIMEIRA LINHA ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2017

Governo precisa de medidas de consolidação de 1% do PIB

A redução do défice estrutural em 0,6% do PIB como exigido por Bruxelas e prometido pelo Governo no Verão exige medidas de consolidação orçamental de montante superior. Governo tem margem nas regras para aliviar pressão.

RUI PERES JORGE [email protected]

para reduzir o saldo or-çamental estrutural em 0,6 pontos de PIB, como recomendado

pela União Europeia (UE) e prome-tido pelo Governo no Verão, o Mi-nistério das Finanças tem de encon-trar medidas de consolidação orça-mental que poderão chegar quase a 1% do PIB. .

Estes números ilustram a tare-fa impossível a que o Governo se propõe para 2017: construir um or-çamento que prometa a redução si-gnificativa do défice público combi-nada com Bruxelas ao mesmo tem-po que alega virara página da auste-ridade e promete mais devoluções de rendimentos. Vamos por partes.

De acordo com os últimos cálcu-los do Conselho das Finanças Públi-cas, sem medidas adicionais de po-lítica que serão tomadas este ano, o défice orçamental em 2017 pioraria em cerca de uma décima do PIB ou qualquercoisa como180 milhões de euros.

A degradação é o resultado de dois efeitos contrários. Pela positi-va, o Orçamento recebe a ajuda da retoma económica que produz mais receita fiscalen3duzês despesas so-ciais. Pela negativa, as contas sofrem com o efeito desfasado de medidas de política econóMica tomadas em anos anteriores. Os exemplos mais imediatos deste segundo efeito são a reposição de salários de funcioná-rios públicos e a redução do IVA na restauração, mas a estes juntam-se outras pressões como despesa adi-cional com PPPjá no terreno, efei-tos do envelhecimento nos gastos com saúde e segurança social, ou menos receita de I RC em 2017 (an-

tecipando- a para este ano) decor-rente de medidas como a revalori-zação de activos das empresas ou o recente perdão fiscal. Segundo as úl-timas estimativas do CFP, publica-das em Setembro, a manutenção das actuais políticas sem a ajuda da retomaeconómicaconduziria a um agravamento do défice público de 0,4%a 0,5% do PIB, qualquer coisa como 700 a 900 milhões de euros.

Isto significa que para cumprir coma redução do défice estrutural (o que desconta o efeito da retoma da economia) de 0,6% do PIB (cer-ca de L100 milhões de euros) como combinado no Verão, o Governo

precisa de encontrar medidas de consolidação orçamental dessa di-mensão, adicionadas do esforço ne-cessário para compensar as pres-sões do passado. Ou seja, qualquer coisa como 1% do PIB, ou1.800 mi-lhões de euros.

É sobre este cenário que Mário Centenoeasuaequipa têm de cons-truir o Orçamento do Estado para 2017, prevendo as novas devoluções de rendimentos que estão a ser ne-gociadas à esquerda, como aumen-tos de pensões acima da inflação, que complicarão ainda mais as contas.

Assim se percebe que nas nego-ciações entre PS, PCP e Bloco se

adopte um princípio de compensa-ção orçamental das medidas para 2017, o que explica os vários aumen-tos de impostos indirectos na calha queo Negócios jáavançou (com des-taque para um novo imposto sobre o património e outro sobre produ-tos alimentares nocivos àSaúde) ou a eliminação faseada da sobretaxa de IRS.

Governo 03171 margens Nas suas contas, o Governo

conta com duas possíveis almofa-das nas regras, E possível que em vez reduzir o défice orçamental em 0,6 pontos em 2017, o Executivo

possa ficar pelos 0,4 pontos, usan-do uma cláusula de flexibilidade prevista aos países com défices in-feriores a 3% do PIB e fora do cha-mado Procedimento dos Défices Excessivos (PDE) - algo que espe-ra conseguir este ano.

Além disso, o Executivo poderá fazer passar o Orçamento em Bru-xelas (terá que ser validado até ao fi-nal do mês) com uma redução esti-mada do défice estrutural pelo ser-viços da Comissão de apenas 0,1 ou 02 pontos, o que implicaria o envio a Lisboa de um aviso sério para mo-nitorização das contas, mas pouco mais. ■

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De onde vem e para onde vai o orçamento do próximo ano

Pensões e salários pressionam a despesa de um orçamento que tem de garantir quase dois mil milhões de euros de consolidação. Em compensação, o Governo quer criar novas receitas sobre o consumo e no património. Saiba o que já está em cima da mesa.

DESPESA

Pensões e salários recuperam valor A estratégia de recuperação de rendimentos deverá pesar no orçamen-

to através da redução da receita de impostos sobre o trabalho, do au-

mento real de pensões e até da eliminação dos cortes.

RECEITA

Imobiliário e consumo são aposta do Governo Um novo imposto sobre o património imobiliário e mais impostos sobre

o consumo, incluindo uma nova tributação sobre o açúcar dos refrige-

rantes estarão entre as novas fonte de receita fiscal no OE 2017.

A MACHADADA QUE FALTAVA NA SOBRETAXA Tal como estava previsto, a sobre-

taxa será extinta em 2017, retiran-

do receita aos cofres do Estado. A

dúvida agora, que António Costa

não dissipou ontem, é saber se é

logo em Janeiro ou algures duran-

te o ano. Em 2016, os rendimento

entre sete mil e 20 mil euros paga-

ram ainda 1% de sobretaxa, valor

que chega aos 3,5% para salários

acima de 80 mil euros. O Governo

quer ainda permitir que despesas

com refeições e transporte ou com

material escolar, que actualmente

não podem ser deduzidas, possam

contar para o IRS. O mesmo acon-

tecerá com as despesas com trans-

portes públicos. Além disso, já

anunciou que os casais poderão op-

tar pela tributação conjunta, mes-

mo que entreguem a declaração

fora do prazo.

AUMENTO REAL DAS PENSÕES É o principal foco de pressão dos

partidos que suportam o governo:

as pensões devem ser aumenta-

das em dez euros brutos. Enquan-

to o PCP pede um aumento para todos, o BE insiste nesse valor até

aos 838,44 euros, com actualiza-

ções ao nivel da inflação para pen-

sões acima desse valor. O impac-to orçamental das duas propostas não varia muito, rondando os 400

milhões de euros, o que compara

com os pouco mais de 100 mi-

lhões que custaria a actualização

automática que consta da lei.

ELIMINAÇÃO DA CES Em linha com os compromissos

assumidos, o Governo tem de eli-

minar os cortes nas pensões aci-

ma dos 4.611,22 euros. o que de-

verá eliminar cerca de 20 milhões

em receita.

SALÁRIOS POR INTEIRO Os cortes salariais dos vencimen-

tos de funcionários públicos e tra-

balhadores do Estado superiores

a 1.500 euros estão a ser progres-

sivamente eliminados, mas só se-

rão pagos por inteiro a partir des-

te mês. No próximo ano, serào pa-

gos sem cortes logo a partir de Ja-

neiro, o que implica um aumento

homólogo nas despesas com pes-

soal: as contas apresentadas em

Março pelo Conselho de Finanças

Públicas apontavam para uma di-

ferença bruta de 344 milhões de

euros. Além disso, os sindicatos

vão tentar descongelar comple-

mentos salariais.

NOVA REFERÊNCIA PARA APOIOS SOCIAIS

Indexante de Apoios Sociais,

que estava congelado desde 2009

nos 419,22 euros, vai ser actuali-

zado ao nivel da inflação. Deste

valor dependem inúmeros apoios

em diferentes áreas, da seguran-

ça social à educação. A inflação

deve subir 0,7% este ano. cAP/FL

400 MILHÕES DE EUROS É o custo aproximado de um aumento de 10 euros para todas as pensões proposto pelo PCP. A medida está em negociação.

200 MILHÕES DE EUROS É objectivo máximo de receita a alcançar através do novo imposto sobre o património que será cobrado em paralelo com o IMI.

16 CÊNTIMOS POR LITRO É a taxa máxima que está a ser preparada para bebidas açucaradas, como refrigerantes. Sumos e néctares ficarão a salvo.

UM NOVO IMPOSTO SOBRE O PATRIMÓNIO Deverá ser uma das medidas

mais emblemáticas do próximo

Orçamento do Estado. Trata-se

de criar um novo imposto, que

será cobrado em paralelo com o

actual IMI e que incidirá sobre a

totalidade do património de cada

contribuinte. Foi dito inicialmen-

te que não abrangeria valores

patrimoniais tributários globais

abaixo de 500 mil euros e que a

indústria ficaria a salvo. O valor

não estará ainda fechado, mas

deverá haver tratamento dife-

renciado para o património dos

cônjuges, arrendamento e das

empresas. De tudo isso depende-

rá a receita, sendo que o objecti-

vo inicial era arrecadar entre 100

e 200 milhões de euros.

UMA "FAT TAX" PARA BEBIDAS AÇUCARADAS Será outra inovação fiscal e no cam-

po dos impostos indirectos onde o

primeiro-ministro avisou que have-

rá aumentos. Esta taxa deverá in-

cidir sobre bebidas açucaradas,

como refrigerantes. Sumos, nécta-

res e bebidas doces à base de leite

deverão ficar a salvo. O plano em

cima da mesa é que existam dois

escalões, até um máximo de 16,44

cêntimos por litro, o que significa

mais cinco cêntimos numa lata de

bebida. De acordo com o Jornal

Económico, o objectivo de receita

anda pelos 100 milhões de euros.

NOVA TRIBUTAÇÃO PARA ALOJAMENTI. LOCAL Aqui a ideia é aproximar a tribu-

tação do alojamento local - o ar-

rendamento temporário de habi-

tação para turistas - ao que a lei

prevê para a habitação perma-

nente. Isso significará um aumen-

to significativo, já que os senho-

rios tradicionais pagam hoje em

dia uma taxa autónoma de 28%

sobre as rendas, enquanto o alo-

jamento local paga pela categoria

13 do IRS, mas apenas sobre 15%

dos seus proveitos - o resto con-

sideram-se custos da actividade.

Não sendo ainda conhecidos os

contornos da medida, também

não há qualquer estimativa de re-

ceita a obter com esta alteração.

MAIS IMPOSTOS SOBRE O CONSUMO Na sua recente entrevista ao Pú-

blico, António Costa foi muito cla-

ro. Se, por um lado, o Governo ex-

clui mexidas no IVA, por outro é

certo que apostará noutros im-

postos sobre o consumo para con-

seguir receita. "Impostos espe-

ciais sobre o consumo que depen-

dem de escolhas individuais: pro-

dutos de luxo, tabaco, álcool", dis-

se, sem contudo explicar qual será

o caminho escolhido pelo Goven-

ro. Combustíveis, tabaco, alcoól

IABA (bebidas alcoólicas) ou 15V

são aumentros recorrentes, todos

os anos, e este não deverá ser

uma excepção. FL/CAP

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PRIMEIRA LINHA ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2017

Oito propostas para melhorar a justiça fiscal (sem rebentar o défice)

1~1

Este escalão e respectiva taxa

tem mais em vista a captação

de receita fiscal, com prejuízo

para a igualdade vertical.

ANTÓNIO MARTINS Fiscalista e professor universitário

Dividir em dois o terceiro escalão do IRS

Seria importante uma reformulação dos

escalões e taxas do IRS, em particular o 30

escalão, que tem uma taxa marginal de

37% que se aplica a partir dos 20.100 eu-

ros de rendimento tributável. É uma taxa

elevada e desajustada, até se comparar-

mos com outros países europeus, em que

taxas deste nível percentual se aplicam a

rendimentos bastante mais altos. No con-

fronto com Espanha ou Itália, por exem-

plo, 37% é uma taxa marginal já relativa-

mente elevada e que em Portugal, de fac-

to, se aplica a uni nível de rendimentos

baixo e que não deveria suportar taxas

deste montante.

O escalão seguinte, de 45% é já para ren-

dimentos acima dos 40.200 euros. Este

escalão e respectiva taxa tem mais em vis-

ta a captação de receita fiscal, com prejuí-

zo para a igualdade vertical. O problema.

naturalmente, é que há receita fiscal subs-

tancial neste intervalo e seria necessário

ir compensá-la a algum lado. A não ser que

se admita baixa da despesa.

Em suma, o desdobramento em dois do terceiro escalão, com a introdução, para

um deles, de uma taxa mais baixa, traria

uma maior justiça fiscal.

Discriminar positivamente as pensões

No modelo extinto com a entrada em vigor do

IRS. as pensões estavam sujeitas. na sua maio-

ria, apenas a Imposto Complementar. Foi isso

que justificou a criação da categoria H. Nela se

previu a incidência real, e se consagrou, através

da dedução específica, um tratamento positivo

diferenciado em relação aos rendimentos de tra-

balho dependente. Ao longo dos tempos, por va-

riadas razões. essa diferenciação positiva foi-se

diluindo, até se extinguir. Tecnicamente, a cate-

goria H pode ser absorvida pela A. pois nada as

distingue. Em nome da equidade impunha-se,

porém, a distinção. Hoje, sabe-se que as presta-

ções pagas a título de pensão estão, em regra,

muito distantes do que os trabalhadores aufe-

rem na vida activa. Numa fase da sua vida em

que a capacidade para substituir ou gerar novas

fontes de rendimentos está diminuída, senão

mesmo extinta. A situação de reforma e, com ela.

a concomitante velhice, é uma causa de diminui-

ção da capacidade contributiva expressamente

prevista na LGT, masque o IRS deixou, inexplica-

velmente, de ter em conta. Reporia a categoria

H numa situação próxima da originária, dando

às pensões. através da modulação da dedução

específica, uma discriminação positiva. A "mos-

sa" na receita que a medida poderia provocar,

seria colmatada com o alimento de 1 ou 2% so-

bre os rendimentos hoje tributados a 28%.

6é As prestações pagas a título de

pensão estão, em regra, muito

distantes do que os trabalhadores

auferem na vida activa. (...) Reporia a dedução específica da categoria H

numa situação próxima à originária.

MANUEL FAUSTINO Consultor fiscal. ex-director do IRS

66 IRS, com mais escalões, sem

aumento de taxa máxima; e um

imposto sobre os beneficiários de

transmissões gratuitas de

património, que tenha em conta o

rendimento anual.

ANA PAULA DOURADO Professora da Faculdade de Direito de Lisboa. Vice-presidente do IDEFF

Progressividade pela via certa

Apela-se agora à redistribuição. É preciso lem-

brar que vínhamos construindo um sistema

fiscal, não fora a crise; que as sobretaxas são

patrióticas e temporárias; que o imposto pes-

soal e o imposto sobre o património têm fun-

ções de redistribuição; que esta exige o respei-

to pela capacidade contributiva; que a tributa-

ção estática dos imóveis pode ser redistribu-

tiva, mas dificilmente observa tal capacidade.

porque é cedular, ignora o resto do patrimó-

nio; que a justiça na lei escrita só o é se efecti-

va, apesar da mobilidade: Tiebout e Dépardieu

já nos contaram esta narrativa, votaram com

os pés. A redistribuição justifica a progressivi-

dade. Esta só pode ser concretizada pelo IRS e

a tributação dinâmica do património, numa vi-

são conjunta do acréscimo patrimonial: IRS.

com um maior número de escalões, sem au-

mento de taxa máxima; e um imposto sobre

os beneficiários de transmissões gratuitas de

património, que tenha em conta o rendimen-

to anual. Em substância são a mesma medida,

ambos impostos sobre acréscimo patrimonial.

A progressividade cedular é o novo best prac-

tice à portuguesa. É regressiva ou confiscató-

ria, não progressiva. Progressividade sobre

parcelas: rendimento, imobiliário, a despesa

nas tributações autónomas, penal izadoras de

despesas avulsas. A rejeitar.

Rever o regime de residentes não habituais

Reveria o "regime fiscal dos residentes nào

habituais" tendo em conta a experiência re-

sultante da sua aplicação e considerando a

necessidade de assegurar. por questões de

justiça e equidade. que não se deve discri-

minar favoravelmente os "residentes não

habituais", relativamente aos outros resi-

dentes. em atividades em que não há carên-

cia de profissionais qualificados (o que ex-

plica a sua emigração) e em que nào for in-

questionável o "elevado valor acrescenta-

do" dos primeiros. Quanto às medidas en-

quadradas nesse regime e legalmente clas-

sificadas como destinadas a evitar a dupla

tributação internacional através do método

da isenção (art.() 81.0 do Código do IRS),

deve assegurar-se que delas não resulta o

contrário, ou seja unia dupla não tributação.

Em especial. no caso de pensões em que.

em convenções para evitar a dupla tributa-

ção, se confere a Portugal. por ser o pais de

residência, a exclusividade de tributação.

abdicando o pais de origem das mesmas de

as tributar, não parece curial que sejam de-

pois totalmente isentas (n.o 6 do referido

art.0 81.0) . É público que a Finlândia e cer-

tamente outros países quererão rever as

convenções celebradas com Portugal por

causa destas isenções.

66 Não se deve favorecer os RNH em actividades em que não há carência

de profissionais qualificados (o que

explica a sua emigração) e em que

não for inquestionável o seu "elevado valor acrescentado".

MANUEL HENRIQUE DE FREITAS PEREIRA Juiz conselheiro jubilado do Tribunal de Contas

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E se fossem eles a mandar? Numa altura em que à esquerda se afinam medidas para redistribuir a carga fiscal de forma mais justa, pedimos a oito reputados especialistas que elegessem uma medida que cumpra os objectivos da equidade, sem comprometer as metas orçamentais. ELISABETE MIRANDA e FILOMENA LANÇA

omodistribuirme-

lhor a carga fiscal entre os contri-buintes, sem so-brecarregar em de-

masia o Orçamento do Fstado? Foi

este o repto lançado pelo Negócios a Ana Paula Dourado, António

Martins, Henrique de Freitas Pe-reira, João Sérgio Ribeiro, João Ta-

borda da Gama, Manuel Faustino,

Miguel Cadilhe e Silvério Mateus, todos reputados fiscalistas. que. pela diversidade das suas forma-ções e origens, asseguram a t rans-versalidade de visões, da academia,

da consultoria fiscal e do Estado. O IRS, uni imposto onde não se

esperam grandes revoluções nes-

ta proposta de Orçamento. foi o

mais citado, nomeadamente atra-

vés da criação de mais escalões que garantam maior progressividade, da alteração da dedução específi-

ca (um abatimento automático ao rendimento bruto) nas pensões e

da revisão dos benefícios fiscais a

estrangeiros e repatriados. O IVA,

o IRC e o I M I sobre os prédios rús-ticos taniliHi estão na berlinda."'

Aumentar a taxa mínima de IVA e reduzir a normal

É sabido que há um problema orçamental do lado da despesa, que é necessárioSerar re-ceita e que. ao mesmo tempo, os impostos estão no limite. Uma hipótese que poderia, ainda assim, assegurar alguma equidade, se-

ria rever as taxas de IVA. E uma primeira me-dida poderia passar pela eliminação da taxa intermédia, aumento da taxa minima e abai-xamento da máxima. Dois pontos percentuais a mais na taxa mínima, por exemplo, seria um ajustamento pequeno, mas com um grande impacto em termos de receita. Seria uma me-dida de equidade fiscal? Há que acabar com alguns mitos, até porque a taxa baixa acaba

por beneficiar quem tem mais rendimentos e, por isso. consome mais. Para uma família mais desfavorecida, seguramente o IVA rela-tivo ao vestuário e muitos outros bens sujei-tos à taxa normal dos 23% pesa mais do que o suportado com o IVA referente aos bens

considerados de primeira necessidade. E até admito que se mantivesse a isenção em al-guns bens essenciais, como o pão. Dois pon-tos percentuais de aumento da taxa reduzi-da teriam um impacto significativo na recei-ta. o que, combinado com a eliminação da taxa intermédia, permitiria baixar a taxa má-xima. acabando por ter um efeito positivo

em temos de equidade fiscal.

66 Há que acabar com alguns mitos, até porque a taxa baixa acaba por beneficiar quem tem mais rendimentos e, por isso, consome mais.

JOÃO SÉRGIO RIBEIRO Fiscalista e professor da Universidade do Minho

66 O objectivo é aliviar as empresas mais pequenas mas lucrativas e que não têm capacidade para

usufruir do chamado planeamento fiscal.

MIGUEL CADILHE Ex-ministro das Finanças, responsável político pela reforma fiscal de 1989

Introduzir o IRC por escalões

Retomo uma proposta que venho manten-do há vários anos, e que passa por discri-minar mais o IRC a favor das pequenas e médias empresas (PME). criando escalões

de taxas progressivas o mais objectivos

possível em função da dimensão da em-

presa. Teríamos, por exemplo, quatro ou

cinco escalões, com taxas a começar nos

5%. Seria um passo significativo face ao

que existe actualmente, em que apenas

há dois escalões de IRC, claramente insu-

ficientes e com uma fronteira demasiado

baixa entre o primeiro e o segundo esca-lões. A derrama estadual. que incide so-bre sociedades com elevados lucros tribu-

táveis. não entraria nesta equação. uma vez que tem uma lógica diferente. O ob-jectivo, aqui, seria o de aliviar as empre-sas mais pequenas mas lucrativas e que, naturalmente, não têm capacidade para usufruir do chamado planeamento fiscal. Esta diferenciação do IRC deveria ter lu-

gar num quadro de reforço do combate à

economia paralela e à evasão fiscal. Urna

tal conjugação de IRC mais escalonado e menos evadido é parte essencial da pro-posta.

Actualizar o valor fiscal dos prédios rústicos

O nosso património rústico não foi actuali-zado, nem ao nível cadastral. nem de ava-liação. Os valores patrimoniais foram fixa-dos com base nos rendimentos de há 40 ou

50 anos ou mais. Estamos ao nível da Gré-cia que tão criticada tem sido por não ser capaz de fazer um cadastro decente da pro-

priedade imobiliária. E. no entanto. há pré-dios rústicos com valores significativos ou mesmo muito elevados. É verdade que uma boa parte são pequenas courelas, muitas delas abandonadas, mas há algumas cente-nas de milhares de prédios com valores mui-to significativos - um pouco por todo o país mas sobretudo no centro e sul - de altíssi-ma rentabilidade e que praticamente não são tributados, porque têm um VPT ridícu-lo. Uma tributação do património sobre es-ses prédios poderia ajudar a corrigir esta

carga cada vez maior sobre o património ur-bano. Por isso, os prédios rústicos deviam ser objecto de uma avaliação objectiva, que actualizasse os respectivos valores patrimo-niais tributários, através de regras aplicá-veis a todas as situações. Com o novo im-posto sobre o património vai haver ainda uma maior desigualdade. porque os prédios urbanos estão cadastrados e avaliados. ao contrário do que acontece com os rústicos.

uma tributação do património sobre esses prédios poderia ajudar a corrigir a carga cada vez maior sobre o património urbano.

SILVÉRIO MATEUS Advogado e fiscalista. Liderou a comissão de Reforma dos Impostos sobre o Património. em 2003

Proponho que seja de novo consagrada a possibilidade de os

contribuintes que têm processos pendentes nos tribunais tributários os poderem transitar para o Centro de Arbitragem.

JOÃO TABORDA DA GAMA Advogado e fiscalista

Transitar processos pendentes para o CAAD

Um dos entraves à existência de justiça fis-cal em-Portugal é a demora de decisão dos tribunais tributários de primeira instân-cia e o facto de as suas decisões não se-rem publicadas - factos que aproveitam sempre e só ao fisco que já cobrou ou tem o seu crédito garantido. Um princípio de solução tem sido o regime da arbitragem tributária, a funcionar desde 2011. Propo-

nho que seja de novo consagrada a possi-

bilidade de os contribuintes que têm pro-

cessos pendentes nos tribunais tributá-

rios os poderem transitar para o Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) onde, sem custos adicionais, há decisões

em seis meses que são obrigatoriamente

publicadas.

A arbitragem tributária tem já cinco anos,

deu mais do que provas de robustez deon-tológica e técnica, e as suas decisões são

publicadas, conhecidas, escrutináveis - é por isso uma forma eficiente e sem custos

para o erário público de minorar o proble-ma da jurisdição tributária de primeira

instância e trazer mais justiça fiscal aos

portugueses.

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UNIÃO GERAL TRABALHADORES

UNIÃO GERAL DE TRABALHADORES

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PRIMEIRA LINHA ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2017

Patrões têm a garantia de que não pagam imposto sobre património

Novo imposto deverá isentar os imóveis destinados ao desenvolvimento de actividades económicas, segundo as confederações patronais. Governo admite essa preocupação, mas acrescenta que a proposta não está fechada.

CATARINA ALMEIDA PEREIRA

[email protected] MANUEL ESTEVES

[email protected]

eis dias depois de terem pedido que os imóveis destinados a actividades

económicas fiquem de fora do novo imposto sobre o património, as con-federações patronais dizem que têm garantias genéricas por parte do Governo de que assim será. Mas manifestam dúvidas sobre os ter-mos em que será formulada esta in-tenção, que só serão esclarecidas com a apresentaçãodoOrçarnento do Estado.

Confrontada com as declara-ções das confederações patronais, fonte do Governo confirmou ao Ne-gócios a preocupação do Executivo de não afectara actividade das em-presas. Sem entrar em detalhes, a

mesma fonte lembrou que a pro-posta ainda não está fechada.

Em causa está o novo imposto sobre o património imobiliário, pa-ralelo ao IMI, que será progressivo e incidirá sobre o conjunto do pa-trimónio dos contribuintes. O va-lora partir do qual será aplicado ain-da não é conhecido, sabendo-se apenas que deixará de fora, segura-mente, valor patrimonial tributá-rio inferior a 500 mil euros.

Num comunicado conjunto di-vulgado na semana passada, as qua-tro confederações patronais mos-traram-se contra o aumento da tri-butação sobre imóveis, chamando sobretudo a atenção para a neces-sidade de "distinguir claramente" ocasodos imóveis "destinadosa ac-tividades económicas produtivas e geradoras de investimento" dos restantes.

"Os agentes económicos deten-tores dos imóveis já sãovisados fis- calmente por outras vias, nomea-

damente em sede de I RS e de I RC" e esses mesmos imóveis "são inse-paráveis das actividades económi-casque desenvolvem", argumenta-ram.

Agora, mostram-se mais tran-quilos como novo imposto. "Temos a garantia que o nosso comunicado, nos estritos termos que lá estão, está acautelado", afirmou esta se-gunda-feira António Saraiva, em dèclarações ao Negócios. O objecti-vo é que "os imóveis que se desti-nem à laboração ou que sejam uti-lizados ao serviço da empresa no sentido produtivo estejam livres desse ónus", independentemente da actividade económica Mas "vou aguardar serenamente a proposta do Orçamento [para confirmar] que assim será", acrescentou o pre-sidente da CIP, admitindo dúvidas sobre os detalhes da formulação fi-nal da proposta, que no limite po-dem esclarecer que tipo de imóveis ficam efectivamente isentos.

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Marcelo incentiva acordo de concertação

Decidir com ou sem a concer-tação social "não é a mesma coisa", afirmou Marcelo Rebe-lo de Sousa, numa altura em que a subida do salário míni-mo é contestada pelos pa-trões. Disse-o na inauguração das novas instalações da UGT, consideradas "próprias" pela primeira vez. A sede na Amei-xoeira, muito maior, com três auditórios, resulta de um ne-gócio com o BCP em regime de "leasing" e opção de compra ao fim de 20 anos.

Fotografia: Miguel Baltazar

"Esperamos que um imóvel afecto à produção não venha a ser englobado", refere por seu lado Francisco Calheiros. "Tivemos conversas que indicaram que não era isso que se pretendia. É uma promessa que temos", referiu também ao Negócios o presiden-te da confederação do Turismo (CTP).

João Vieira Lopes revelou a

mesma expectativa, mas menor grau de certeza. "A informação que temos é que não haverá discrimina-ção entre os sectores económicos e que provavelmente não serão taxa-dos os edifícios afectos às activida-des económicas", diSSe o presiden-te da confederação do comércio (CCP). "No entanto, esperamos peláveis% final do orçamento para poder tirara conclusão".

Este fim-de-semana, na China, António Costa garantiu que não ha-verá no próximo ano aumento dos impostos sobre as empresas. e

Temos a garantia que o nosso comunicado, nos estritos termos que lá estão, está acautelado.

ANTÓNIO SARAIVA Presidente da CIP

Esperamos que um imóvel afecto à produção não venha a ser englobaldo. Tivemos conversas que indicaram que não era isso que se pretendia. É uma promessa que temos.

FRANCISCO CALHEIROS Presidente da Confederação do Turismo

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Empresas de fora do novo imposto Patrões dizem que Governo garantiu isenções no património.

Oito propostas para melhorar o sistema fiscal