GESTÃO DO CONHECIMENTO NO SETOR PÚBLICOºblico_Artigo... · sobre a Falta de Estudos em Gestão...

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1 GESTÃO DO CONHECIMENTO NO SETOR PÚBLICO Adriana Salgueiro 1 , Alexandre Lauria 2 , Antonio João Azambuja 3 , Rony Corrêa 4 1 Caixa Econômica Federal (CEF), Brasília, Brasil 2 Exército Brasileiro Hospital das Forçadas Armadas (HFA), Brasília, Brasil 3 Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasília, Brasil 4 Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap), Brasília, Brasil Resumo O artigo aborda a Gestão do Conhecimento no Setor Público. Os autores analisaram quinze artigos da European Conference e Journal of Knowledge Management. Com o estudo foi possível identificar os métodos de pesquisa utilizados, temas abordados e as palavras-chave nos artigos analisados. Foi realizada uma comparação entre conceitos, questões críticas abordadas e lacunas comuns relatadas nas pesquisas. No item 1, os autores descrevem sobre a Falta de Estudos em Gestão do Conhecimento no Setor Público, no item 2, estão descritos os Fatores Críticos de Sucesso para a implantação da Gestão do Conhecimento nas organizações públicas, no item 3, os autores abordam a importância da Transferência do Conhecimento e no item 4, abordam o tema Gestão do Conhecimento nas empresas públicas. Entre os vários artigos analisados é possível identificar a escassez de estudos sobre a Gestão do Conhecimento no Setor Público. A maioria dos estudos tem como foco o setor privado, com técnicas que nem sempre são adequadas para o setor público. Palavras-chave: Gestão do Conhecimento, Transferência do Conhecimento, Práticas de Gestão do Conhecimento, Setor Público, Administração Pública, Organizações Públicas

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GESTÃO DO CONHECIMENTO NO SETOR PÚBLICO

Adriana Salgueiro 1 , Alexandre Lauria 2,

Antonio João Azambuja 3, Rony Corrêa 4

1Caixa Econômica Federal (CEF), Brasília, Brasil

2Exército Brasileiro – Hospital das Forçadas Armadas (HFA), Brasília, Brasil

3Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasília, Brasil

4 Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap), Brasília, Brasil

Resumo

O artigo aborda a Gestão do Conhecimento no Setor Público. Os autores

analisaram quinze artigos da European Conference e Journal of Knowledge

Management. Com o estudo foi possível identificar os métodos de pesquisa

utilizados, temas abordados e as palavras-chave nos artigos analisados. Foi

realizada uma comparação entre conceitos, questões críticas abordadas e

lacunas comuns relatadas nas pesquisas. No item 1, os autores descrevem

sobre a Falta de Estudos em Gestão do Conhecimento no Setor Público, no

item 2, estão descritos os Fatores Críticos de Sucesso para a implantação da

Gestão do Conhecimento nas organizações públicas, no item 3, os autores

abordam a importância da Transferência do Conhecimento e no item 4,

abordam o tema Gestão do Conhecimento nas empresas públicas. Entre os

vários artigos analisados é possível identificar a escassez de estudos sobre a

Gestão do Conhecimento no Setor Público. A maioria dos estudos tem como

foco o setor privado, com técnicas que nem sempre são adequadas para o

setor público.

Palavras-chave: Gestão do Conhecimento, Transferência do Conhecimento,

Práticas de Gestão do Conhecimento, Setor Público, Administração Pública,

Organizações Públicas

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1. Introdução

A Gestão do Conhecimento (GC) é o processo pelo qual a organização

gera riqueza, a partir do seu conhecimento ou capital intelectual, com o

entendimento de que a riqueza acontece quando uma organização utiliza o

conhecimento para criar processos mais eficientes e efetivos. Assim, o capital

intelectual ou o conhecimento tornam-se foco central do conceito apresentado,

significando qualquer coisa que possa ser valorizada pela organização que

esteja contida nas pessoas, ou seja, que possa ser derivada dos processos, de

sistemas e da cultura organizacional (BUKOWITZ, e WILLIAMS, R., 2002).

Em sentido geral, independentemente do tipo de organização,

Knowledge Management (KM) pode ser vista como uma coleção de processos

que governa a criação, disseminação e utilização do conhecimento para atingir

plenamente os objetivos da organização (DAVENPORT e PRUSAK, 2000).

As Organizações Públicas (OP) podem ser conceituadas como

organizações que têm como objetivo prestar serviços para a sociedade; são

sistemas dinâmicos, extremamente complexos, interdependentes e inter-

relacionados que envolvem informações e seus fluxos, estruturas

organizacionais, pessoas e tecnologias (DIAS, 1998). No contexto das

organizações públicas, a Administração Pública Federal (APF) é

tradicionalmente rotulada de ineficiente e pouco produtiva, sendo entendida

como um obstáculo para o desenvolvimento socioeconômico do país. Nesse

contexto, GC emerge como estratégia fundamental para reversão desta

percepção, exercendo papel preponderante para nortear as ações do Estado

em prol do interesse público.

Para o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (2005) o

conceito de GC para as OP é mais do que o agrupamento de projetos,

metodologias e ferramentas para criar, disseminar e aplicar conhecimento.

Significa compromisso com a transparência; foco nos processos em vez de

hierarquia; uso e reuso eficaz de informações, conhecimentos, boas práticas de

gestão; visão integradora; uso eficaz de novas Tecnologias de Informação e

Comunicação (TIC) e foco nas necessidades dos cidadãos.

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Para a administração pública brasileira, GC pode ser conceituada como

um método integrado de criar, compartilhar e aplicar o conhecimento para

aumentar a eficiência; melhorar a qualidade e a efetividade social; e contribuir

para a legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade na administração

pública e para o desenvolvimento brasileiro (BATISTA, 2006)

Embora muitas práticas de compartilhamento e transferência de

conhecimento já existam em algumas organizações, a gestão do conhecimento

é pouco utilizada pelas instituições do setor público no Brasil. Para Batista

(2006) isso acontece porque as práticas de gestão do conhecimento não são

gerenciadas de maneira interligada com a finalidade clara de melhorar o

desempenho organizacional, sem haver um alinhamento com a missão, a visão

de futuro e as estratégias organizacionais.

Para Mendes (2009), a implantação da GC no Setor Público (SP) exige

reflexão e a produção de metodologias específicas, voltadas para as suas

necessidades. Deve ser encarada, portanto, como política pública estratégica e

de longo prazo, que supera os limites temporais de governos e mesmo do

desenho institucional estrito do Estado como ente político, assumindo,

obrigatoriamente, os cidadãos como foco, colaborador e partícipe dessa ação,

na direção da democracia participativa. Assim, GC no SP deve ser implantada

de forma articulada e não como mais um modismo. Deve ganhar

permeabilidade e permanência na estrutura do estado, não se confundindo

como ação política de governo específico.

Um direcionador principal para a adoção de diversas iniciativas de GC

no SP é a mudança da cultura organizacional. Quatro questões críticas

precisam ser enfrentadas: i) aumentar a eficiência em todos os serviços

públicos; ii) desenvolver novos ou consolidar sistemas desatualizados para

melhorar o desempenho geral e capitalizar sobre uma base de conhecimento

mais ampla, mais integrada e de fácil acesso; iii) melhorar a responsabilização

pela tomada de decisões e a mitigação do risco, viabilizar a resolução de

questões com maior rapidez, apoiada por acesso à informação integrada e

transparente em todas as fronteiras organizacionais; iv) oferecer serviços

melhores e com mais baixo custo, por meio do reforço com parcerias e com

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maior capacidade de resposta, demonstrando claramente um maior retorno

sobre a destinação do dinheiro dos contribuintes (RIEGE e LINDSAY, 2006)

Este artigo pretende abordar assuntos associados à agenda de GC no

SP, a partir da análise de publicações recentes, realizadas no ano de 2015, no

European Conference e Journal of Knowledge Management. O artigo abordará

as lacunas existentes quanto à realização de estudos sobre GC no Setor

Público, bem como os fatores críticos de sucesso para a implantação de GC

nas OP. Destaque será dado quanto à temática transferência do conhecimento,

com ênfase na abordagem das relações Universidade x Empresa x Governo,

assim como para as redes de compartilhamento, como prática fundamental de

GC. O estilo cognitivo dos líderes será visto como um papel fundamental para o

sucesso de práticas de GC na criação do conhecimento no SP. Por último, será

feito recorte para abordar o tema GC nas empresas públicas brasileiras.

2. Metodologia

A metodologia é o estudo da organização, dos caminhos a serem

percorridos, para se realizar uma pesquisa ou um estudo, ou para se fazer

ciência (FONSECA, 2002).

Os integrantes da equipe realizaram uma análise de conteúdo de 16

artigos da European Conference e Journal of Knowledge Management. Na

análise de conteúdo procurou-se identificar os seguintes itens, em cada artigo:

i) quais são os problemas de pesquisa; ii) quais são as perguntas da pesquisa,

iii) quais os objetivos do artigo; iv) que contribuição procuram dar à literatura; v)

quais são as palavras-chave e os conceitos; e vi) quais os resultados

encontrados.

Os autores utilizaram os seguintes métodos de pesquisa nos artigos

estudados:

Estudo empírico;

Estudo de caso;

Questionário (survey);

Revisão de literatura;

Revisão sistemática da literatura;

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Estudo de casos múltiplos;

O método de pesquisa predominante foi o survey, ocorrendo em 31%

dos artigos, seguido por estudo de caso e revisão de literatura, ambos com

incidência de 25% dos artigos, conforme apresentado na Figura 1 e 2.

Figura 1 - Metodologia utilizada nos artigos

Figura 2 - Percentual das metodologias encontradas

Pesquisa empírica: pode ser entendida como uma pesquisa que

necessita de comprovação prática de algo, por meio de experimentos ou

observação de determinado contexto para coleta de dados em um ambiente

estabelecido. A pesquisa empírica pode ancorar e comprovar no campo da

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experiência uma atividade conceitual. A observação e experimentação empírica

fornecem dados para sistematizar uma teoria. A pesquisa empírica não se

sustenta dissociada da teoria, serve para fundamentar os experimentos

realizados e dados observados ou coletados em campo.

Estudo de caso: segundo Yin (2005, p. 32), o estudo de caso é um

estudo empírico que investiga um fenômeno atual dentro do seu contexto de

realidade, quando as fronteiras entre o fenômeno e o contexto não são

claramente definidas e no qual são utilizadas várias fontes de evidência.

O estudo de caso tem sido um instrumento de pesquisa para as ciências

sociais, uma vez que pode ser útil para pesquisas com diferentes finalidades,

entre elas:

a) estudar situações da realidade onde os limites não estão claramente estabelecidos;

b) retratar posição do contexto no qual está sendo realizada a pesquisa; e

c) esclarecer as variáveis causais de um fenômeno em ambientes complexos que não permitem a utilização de experimentos e levantamentos.

Questionário (survey): é uma técnica de pesquisa que engloba um

conjunto de perguntas que serão submetidas a um grupo de pessoas com a

finalidade de coletar informações sobre o conhecimento do tema pesquisado.

Vantagens do questionário: i) alcance maior dos participantes, pode ser

disponibilizado on-line, ii) baixo custo de pessoal, uma vez que o questionário

não demanda o treinamento por parte do pesquisador, iii) sigilo nas respostas,

iv) as respostas não tem influência externa dos participantes, pode ser

individual.

O questionário pode ter questões abertas e fechadas. Nas questões

abertas solicita-se aos participantes para que publiquem as suas próprias

respostas, questões subjetivas. Nas questões fechadas, são questões

objetivas, onde os respondentes têm uma lista de alternativas para escolha

como resposta.

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Revisão literatura: é o processo de busca, análise e descrição de um

corpo do conhecimento em busca de uma resposta específica. Visa demonstrar

o estágio atual da contribuição acadêmica sobre determinado assunto. Permite

uma visão global das pesquisas já realizadas, direcionando para pesquisas

futuras. A revisão de literatura busca estudar as publicações de pesquisadores

sobre um determinado assunto, para conhecê-los, realizar uma análise e

categorização da pesquisa, para evidenciar a relevância das pesquisas

realizadas e pesquisas futuras sobre o assunto. Esta etapa é considerada

como uma das mais importantes de um projeto de pesquisa (Silvia, 2005, p.

37), essencial para o referencial teórico, para a estruturação das hipóteses e

organização do material que fará parte do projeto de pesquisa.

Revisão sistemática da literatura: é um método científico para busca e

análise de artigos de uma determinada área da ciência. É uma forma de

pesquisa que utiliza como fonte de dados para a pesquisa a literatura sobre

determinado tema. É útil para integrar informações de um conjunto de estudos

realizados separadamente sobre determinado assunto. O resumo dos

diferentes estudos com a revisão sistemática de literatura permite agrupar os

resultados relevantes encontrados, não ficando limitada às conclusões dos

artigos estudados. A revisão bibliográfica é considerada um passo inicial para

qualquer pesquisa científica (WEBESTER e WATSON, 2002). Desenvolvida

com base em material já elaborado como livros, artigos e teses (GIL, 2007), a

pesquisa bibliográfica possui caráter exploratório, pois permite maior

familiaridade com o problema, aprimoramento de ideias ou descoberta de

intuições, complementa Gil (2007).

Estudo de casos múltiplos: é um método de estudo de caso, quando o

estudo necessita utilizar um projeto de múltiplos casos (YIN, 2005). Qualquer

utilização de projetos de casos múltiplos deve seguir uma lógica de replicação,

e não de amostragem, e o pesquisador deve escolher cada caso com critério.

Os casos devem funcionar de uma maneira semelhante aos experimentos

múltiplos, com resultados similares ou contraditórios previstos explicitamente

no princípio da investigação. O método de estudo de casos múltiplos possibilita

pesquisar um fenômeno em seu contexto na realidade com uma análise flexível

dos resultados.

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Este método foi utilizado porque tenta examinar um fenômeno em seu

contexto de vida real (YIN, 2005) e permite uma análise mais flexível dos

resultados (ROESCH, 2005).

Os temas abordados nos artigos analisados estão apresentados na

Figura 3. O tema com maior predominância foi “Compartilhamento de

conhecimento”, seguido por “Framework” e “Parcerias”.

Figura 3 - Temas abordados nos artigos

As palavras-chave que aparecem o maior número de vezes nos artigos

são: knowledge management, public sector, Malasya (figura 4). A análise das

palavras-chave permitiu identificar um número relevante de estudos de GC do

setor público na Malásia. A mesma ênfase quanto à concentração de estudos

na Malásia, foi confirmada na pesquisa realizada por Massaro et al. (2015), que

indicou a Ásia como sendo a região mais estudada na temática setor público,

com a Malásia se destacando como o segundo país mais estudado, ficando

atrás apenas da Índia, ambos os países com foco de estudo bastante

concentrado em universidades e centros de pesquisa. Tal concentração é

resultado de políticas públicas ativas voltadas à promoção da GC.

Especificamente, na Malásia, o Governo conduz um programa intensivo para

melhorar a qualidade da educação – Plano Estratégico Nacional de Ensino

Superior – até o ano 2020, tendo como pilar principal o ensino e a

aprendizagem.

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Figura 4 - Palavras-chave encontradas nos artigos

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3. Resultados

Dos artigos analisados, foram identificados como assuntos relevantes a

falta de estudos sobre gestão do conhecimento no setor público, fatores críticos

de sucesso para implantação de GC nas Organizações Públicas, transferência

de conhecimento, estilo cognitivo e gestão do Conhecimento nas Empresas

Públicas brasileiras.

3.1. Falta de estudos sobre Gestão do Conhecimento no Setor Público

Embora a GC tenha sido amplamente discutida por muitos acadêmicos e

profissionais, há relativamente pouca informação sobre a GC no setor

público. Do total de artigos analisados nesta pesquisa, 53%, indicam haver

alguma lacuna quanto à existência de estudos que abordem GC nas OP.

De acordo com Riege e Lindsay (2006), as teorias de gestão do

conhecimento e os frameworks aplicados ao setor público não são bem

compreendidos, visto a existência de poucas evidências na literatura. Para

Vesperi. et al (2015), não existem muitas pesquisas com foco nas relações

entre GC e as universidades públicas. Dalmarco. et al (2015), argumenta que

mesmo com a importância do desenvolvimento econômico e tecnológico

emergindo das economias, as discussões sobre relações entre universidades-

empresas se iniciaram tardiamente.

Segundo Batista (2015), a maioria das iniciativas para o

desenvolvimento de estudos de GC para desenvolver, partilhar e extrair

resultados estão focados no setor privado.

O principal objetivo da GC no setor público é promover a melhoria da

eficácia e da viabilidade do conhecimento em uma organização pública. Porém,

o setor público possui um contexto de pesquisa diferenciado, pois as metas

organizacionais em uma organização pública são mais difíceis de medir, bem

como essas organizações sofrem mais influências políticas no seu ambiente

organizacional.

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Tais características tendem a dificultar o compartilhamento de

conhecimento nessas organizações. Segundo Massaro (2015), o setor público

tem divisões de trabalho específicas que são um desincentivo para a partilha

de conhecimentos. Para uma organização ser bem sucedida, especialmente na

prestação de serviços ao público, todos os funcionários devem ser

responsáveis pelo gerenciamento de todos os tipos de conhecimento que estão

disponíveis na organização (SYED, 2004).

Batista (2015) ressalta ainda que o conhecimento é cada vez mais visto

como um recurso estratégico que deve ser usado para alavancar resultados em

todos os tipos de organizações. Apesar dos esforços das organizações neste

caminho, e o fato da GC ter sido tema de discussão entre a academia e o

ambiente profissional, são poucas as informações sobre a GC no setor público,

apresentando uma lacuna neste campo de estudo.

Puntillo (2015) ressalta que existe uma escassez de estudos focados

sobre o papel do gestor para alcançar uma melhoria de desempenho, bem

como existem ainda poucos estudos com foco na avaliação da capacidade de

gestão para alcançar os objetivos atribuídos, sobre o papel desempenhado no

processo de gestão pela GC e sobre a capacidade dos gestores em gerir o

conhecimento e de atingir os objetivos organizacionais.

Benitez (2015) sinaliza também a falta de estudos sobre a GC aplicada

especificamente no ensino superior, bem como a utilização de modelos de GC

desenvolvidos para empresas do setor privado, empregados nas universidades

devido à escassez de estudos nesta área.

As principais causas para a existência destas lacunas são abordadas

por Massaro (2015) por meio de seis questões fundamentais:

escassez de autores com alta especialização sobre o tema e um

número expressivo de autores com apenas uma contribuição para o corpo do

conhecimento;

baixa cooperação internacional entre os autores;

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especialização de alguns periódicos no campo e a necessidade de

um trabalho de divulgação mais amplo;

regionalização do estudo de GC;

elevada concentração de papéis em um grupo limitado de tópicos; e

carência de contribuições mais significativa para a GC.

Segundo Batista (2015), apesar do número considerável de papers

sobre GC no setor público do Brasil e de outros lugares, há uma escassez de

artigos que incidem sobre o grau de formalização e externalização de GC nas

organizações da Administração Pública Federal (APF).

3.2. Fatores críticos de sucesso para implantação de GC nas Organizações Públicas

Por meio do estudo realizado nesta pesquisa, pode-se constatar que,

muito embora a literatura enumere diversos benefícios que podem ser obtidos

a partir da adoção de Programas de GC nas Organizações Públicas (OP), há

uma falta de consciência sobre GC em tais organizações (MORA-SOTO et al.,

2015).

O estudo da GC no setor público merece uma agenda própria, visto a

sua organização específica com diferentes preocupações quanto à eficácia,

além de possuir diferentes níveis de representatividade, accoutability e

capacidade de resposta (MASSARO, DUMAY e GARTATII, 2015). Mesmo

considerando a relevância da agenda, existem poucos estudos com foco em

GC no setor público, se comparados com o foco no setor privado.

Há muitos estudos que analisam fatores específicos para o sucesso da

implementação de programas de GC. Segundo Mitre et al. (2015), a avaliação

de tais fatores específicos deve ser considerada uma ferramenta estratégica

para as OP para dirigir com eficiência a implementação de um Programa de

GC nessas organizações. Para uma implementação efetiva de modelo de GC,

essencial se faz avaliar os fatores-chave associados às dimensões culturais,

estratégicas e tecnológicas.

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A dimensão cultural, apresentada na pesquisa de Mitre et al. (2015), é

caracterizada pela confiança, colaboração e receptividade. Uma cultura que

suporta GC é aquela que valoriza o conhecimento e incentiva a sua criação,

compartilhamento e aplicação. Um ambiente de colaboração proporciona

oportunidades para pessoas com conhecimento compartilharem conhecimento

de forma aberta, promovendo o sucesso na gestão de programas de GC. A

dimensão estratégica é caracterizada pelo alinhamento fundamental que deve

existir entre as estratégias de GC e os Objetivos Organizacionais. A dimensão

tecnológica envolve mensuração, processos de negócio e infraestrutura

tecnológica e suas atividades influenciam as pessoas, umas às outras, a

trabalhar como pilotos da infraestrutura que viabilizam os Programas de GC

nas OP.

A avaliação dos fatores críticos em cada uma das dimensões analisadas

na pesquisa realizada por Mitre et al. (2015) resultou em conclusões

relevantes, quais sejam: i) o reuso do conhecimento está fortemente

relacionado à dimensão cultural, associado à confiança, transparência,

honestidade, colaboração, profissionalismo, flexibilidade, comprometimento,

aprendizado, inovação e expertise; ii) o uso das bases existentes de

conhecimento é um elemento prático para uma boa administração e para o

reuso do conhecimento; iii) GC pode minimizar a duplicação de esforços e

promover serviços conscientes disponíveis aos cidadãos; iv) a cultura

organizacional que suporta o compartilhamento, uso e reuso do conhecimento,

tem sido identificada como um habilitador de GC; v) um ambiente no qual as

pessoas não se sintam obrigadas a compartilhar o conhecimento, mas no qual

tenham constante desejo de aprender conjuntamente para se complementarem

mutuamente, se faz necessário; vi) a infraestrutura tecnológica, provê as bases

de controle para a avaliação do sucesso das iniciativas de GC, ao tempo que

detecta oportunidades de realinhamento das estratégias organizacionais de

GC; vii) atividades de mensuração de GC oferecem um tipo de controle

estratégico para os gestores, para melhorar a tomada de decisão e para

regular o uso do ativo do conhecimento. Assim, importante se faz um plano de

avaliação de GC que dimensione o seu valor. Por meio dessa avaliação é

possível detectar que tipo de habilidades técnicas e infraestrutura adequada

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são necessárias para as iniciativas de GC; viii) políticas públicas, assim como

legislação e framework normativo são tidos como facilitadores da GC para o

largo desenvolvimento de iniciativas que encorajem as atividades do

conhecimento, como compartilhamento e programa de avaliação; ix) a

liderança no nível executivo, representada como apoio aos definidores de

políticas é necessária para o desenvolvimento de políticas relacionadas à TIC.

Tais iniciativas devem ser legitimadas pela conexão entre a GC e os objetivos

organizacionais e por um forte suplemento de política do bem-estar; x)

problemas como ausência de legislação, estatuto ou framework normativo que

suportem as iniciativas de GC podem ser causados pela ignorância sobre a

relevância e os benefícios de GC. Por essas razões, fatores institucionais e

organizacionais como normas, regulação, recursos, planos, padronização,

processos, nível de centralização e jurisdição são tão relevantes para a melhor

adoção de iniciativas de GC.

Outro fator relevante no processo de implementação e sustentação de

GC nas OP, diz respeito à necessidade de medição do conhecimento nessas

Organizações. GC não pode provar seu valor se o sucesso não for mensurável.

A implementação de GC pode ser vista como uma decisão de investimento e,

portanto, o desempenho de seu resultado deve ser avaliado e medido. Uma

adequada ferramenta de medição de desempenho de GC deve ser capaz de

indicar melhoras nos programas de GC.

Ademais, a mediação do conhecimento nas OP apresenta benefícios.

Alguns deles são destacados por Mitre et al. (2015), tais como: o alinhamento

da gestão do conhecimento com os objetivos estratégicos, a redução da taxa

de corrupção, a redução de custos e tempo dos processos de trabalho e a

melhoria da percepção dos cidadãos, que passam a ter acesso ao resultado da

melhoria da eficiência e da qualidade dos serviços públicos.

3.3. Transferência de conhecimento

De acordo com Davenport e Prusak (1998) a transferência do

conhecimento envolve duas ações que são a transmissão (que emite ou que

apresenta o conhecimento a um receptor potencial) e a absorção por parte da

pessoa ou do grupo. Transferir conhecimento consiste em transformar

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conhecimentos individuais em conhecimentos coletivos, isto é, conhecimento

organizacional. Davenport e Prusak (1998) afirmam que diferente dos ativos

materiais, que diminuem à medida que são usados, os ativos do conhecimento

aumentam com o uso, gerando novas idéias e, conseqüentemente, novos

conhecimentos. E quando esses conhecimentos são compartilhados

permanece com o doador ao mesmo tempo em que enriquece o recebedor.

Os benefícios de compartilhar conhecimento são reais e tem sido

documentados de várias formas, mas é fato que a sua eficácia para o trabalho

do conhecimento varia consideravelmente de organização para organização

(SVEIBY e SIMONS, 2002). Isto se dá em razão dos processos de criação e

transferência do conhecimento se mostrar mais eficazes do que outros para a

criação de valor.

Considerando a importância da transferência do conhecimento, buscar

meios para apoiar tal processo é condição relevante para as organizações,

sejam elas públicas ou privadas. Para Bukowitz e Williams (2002), a tecnologia

está interferindo nas diferenças entre os tipos de conhecimento, visto que

sustentam a transferência do conhecimento desconhecido, aumentando o

leque de perspectivas do compartilhamento de conhecimento.

Nos tópicos seguintes, serão discutidas as práticas de transferência

inovadoras ou menos convencionais registrado pelos artigos analisados.

3.3.1. As relações Universidade x Empresa x Governo na transferência do conhecimento

Considerando a importância do desenvolvimento econômico e

tecnológico nos países de economias emergentes, pesquisas que investigam

as relações universidade-indústria têm sido amplamente discutidas. O papel

dos atores – universidade, indústria e governo – e os canais de transferência

de conhecimento - conferências, contatos informais, artigos, patentes,

pesquisas conjuntas têm guiado as pesquisas sob diferentes abordagens.

As universidades e outras Instituições de Educação Superior (IES) têm

sido consideradas como fontes chave para a utilização do conhecimento em

prol do crescimento econômico, por meio de atividades de comercialização e

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transferência do conhecimento, o papel das universidades não se restringe à

criação do conhecimento, mas também ao de transferir o conhecimento dentro

da comunidade e da sociedade, com o objetivo único de criar valor. Esta

situação é bem conhecida como “terceira missão” da Universidade, na qual é

possível considerar um conjunto de atividades por meio do qual as

universidades e Instituições de Pesquisa interagem diretamente com

empresas, provendo uma nova forma de contribuição que vem acompanhada

das outras missões tradicionais das universidades, como “ensinar’ e

“pesquisar’.

Uma das formas mais relevantes de transferência de conhecimento e

tecnologia para a sociedade e para o mercado, de maneira consistente, se dá

por meio da criação de Spin Off acadêmicos, que é uma forma particular de

empresa, criada para combinar duas formas diferentes de conhecimento:

pesquisa (economicamente valiosa) e empreendedorismo, com diferentes

características, tais como propensão a risco, trabalho por objetivos e avaliação

econômica de vantagens, caracterizando Spin Off como organizações

particularmente complexas (VESPERI, RENA e GENTILE, 2015). Isto porque

do ponto de vista organizacional, há um problema em criar novos processos de

aprendizagem que se iniciam a partir de competência e experiência de uma

única pessoa, no caso, representada por um pesquisador acadêmico. Em

contrapartida, Spin Off não responde exatamente à lógica empresarial, mas se

mostra como mecanismo necessário para que as universidades e outras IES

possam vender e transferir o próprio conhecimento para a comunidade

empreendedora, apresentando-se como um instrumento de conhecimento,

fortemente influenciado pelo contexto local, mas ao mesmo tempo capaz de

influenciar esse contexto.

Para melhor compreender o fenômeno dos Spin Off acadêmicos,

Vesperi, Rena e Gentile.(2015) realizaram um estudo de caso na Universidade

Magna Grécia de Catanzaro, no ano letivo 2014-2015. A universidade

desenvolveu caminhos de transferência de conhecimento voltados para a

criação de Spin off acadêmicos, por meio do Master Spin off, tido como um

curso de formação acadêmica de alto nível em diferentes setores econômicos,

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que combinam cursos tradicionais de treinamento em sala de aula, com visitas

a empresas e desenvolvimento de negócios (business plan).

A educação e a formação durante todo o período do curso convergem,

ao final, para a criação de uma empresa específica (Spin off). Os resultados

desse tipo de experiência tem tornado ainda mais disponível a criação do

conhecimento e o desenvolvimento de empresas, combinando o valor do know-

how, e promovendo a transferência de tecnologia da universidade para os

negócios, representando, ao mesmo tempo, uma nova fonte econômica de

recursos.

Para Dalmarco, Zawislak, Huksink e Brambilla (2015), as diferenças

nas políticas nacionais, pesquisas acadêmicas e o nível tecnológico das

indústrias podem influenciar a forma como os atores estabelecem as relações

entre universidade e indústria e a maneira pela qual o conhecimento pode ser

transferido e compartilhado. A dinâmica veloz de um mundo globalizado impõe

a necessidade de parcerias entre empresas e institutos do conhecimento, visto

que as empresas geralmente enfrentam dificuldades em manter a sua

tecnologia em níveis atualizados, por si mesmas. Quando essa relação não

acontece espontaneamente, um terceiro ator surge como responsável por

estimular a parceria: o governo.

A pesquisa realizada por Dalmarco, et. al (2015) investigou o fluxo de

conhecimento entre empresas e universidades com base em sistemas

nacionais e setoriais sob uma perspectiva de inovação, facilitando o fluxo de

conhecimentos e os consequentes avanços tecnológicos. Para tanto,

realizaram estudos de casos múltiplos, envolvendo dois setores econômicos no

Brasil – setores aeroespacial e horticultura, constatando diferenças no

desenvolvimento e na infraestrutura do conhecimento ao compararem ambos

os setores, refletindo os impactos do sistema nacional e setorial de inovação.

Há um esforço governamental para desenvolver um adequado sistema

setorial e nacional para a inovação. Leis regulatórias, como o direito sobre a

propriedade intelectual, incentivos fiscais para as empresas que inovam e o

estabelecimento de acordos de cooperação técnica para a transferência de

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tecnologia em universidades são recentes (assinados em menos de 10 anos),

levando um tempo maior para ser maturado por empresas e universidades.

Todavia, o sistema nacional e setorial de inovação ainda precisa de

investimentos, de alinhamento de atividades e de um fluxo de conhecimento

adequado que possa estimular atividades inovadoras (DALMARCO et al,

2015).

3.3.2. Parcerias com partes interessadas para a transferência do conhecimento e desenvolvimento de políticas públicas.

Dois dos artigos analisados nesta pesquisa, destacaram a importância

das parcerias baseadas no conhecimento firmadas com stakeholders, para

uma efetiva implementação de GC nas OP. Para Mitre et al. (2015) uma

implementação efetiva de modelo de GC, que auxilie os governos a

desenvolver e a capitalizar as bases de conhecimento oriundas das parcerias

firmadas com os stakeholders, por meio de programas de GC, deve levar em

consideração os fatores-chave associados às dimensões culturais, estratégicas

e tecnológicas, dimensões essas já comentadas nesta pesquisa.

O trabalho desenvolvido por Riege e Lindsay (2006), além de identificar

as questões centrais e os desafios que os governos enfrentam para fornecer

políticas públicas eficazes, também destacou a importância do

desenvolvimento de políticas públicas por meio de parcerias baseadas no

conhecimento com suas partes interessadas. A discussão principal do trabalho

examinou algumas questões, desafios e oportunidades no desenvolvimento de

políticas públicas, propondo alguns modelos práticos para ajudar os governos a

desenvolver e capitalizar parcerias mais eficazes baseadas no conhecimento

das partes interessadas. A partir de ideias extraídas da revisão de literatura,

foram classificadas as partes interessadas sob diversas perspectivas na

tentativa de prover alguma assistência prática aos governos no

desenvolvimento de políticas por meio de parcerias mais eficazes e

estratégicas com as partes interessadas. Isso inclui o uso mais eficaz dos

recursos e uma melhor transferência de conhecimento, facilitando a

responsabilização pública.

19

O potencial de qualidade das parcerias entre governo e partes

interessadas pode ser apresentado como função da capacidade das partes

interessadas em participar efetivamente do desenvolvimento de políticas, e da

eficácia para os esforços realizados pelos governos para endereçar as lacunas

na capacidade de transferir conhecimento através de estratégias

especificamente personalizadas (RIEGE e LINDSAY, 2006). Tais estratégias

podem ser focadas no potencial dos stakeholders para influenciar os

resultados, seja para cooperar ou para ameaçar, cabendo nesse contexto,

estratégias de comunicação diferenciadas.

A capacidade de aprendizagem fomentada pelas parcerias baseadas no

conhecimento e o sucesso na implementação de práticas e técnicas que

habilitam a criação mútua do conhecimento, sua disseminação, transferência e

aplicação, não se mostra apenas como um fator crítico de sucesso, mas

também um fator de diferenciação competitiva. Processos transparentes que

facilitem a transferência eficaz de conhecimento, em uma via de mão dupla,

entre as organizações públicas e as partes interessadas, são fundamentais

para o estabelecimento de parcerias de sucesso, que precisam ser guiadas

pela clara e articulada definição de metas e estratégias de GC, por um plano de

implementação das estratégias de GC selecionadas e sua transparente

mediação. (RIEGE e LINDSAY, 2006).

3.3.3. As redes de compartilhamento como prática de GC para a transferência do conhecimento.

Como prática de transferência do conhecimento, o artigo de Sindakis,

Depeige e Anoyrkati, (2015) sugere a criação de redes para o

compartilhamento do conhecimento entre os mais variados atores do setor de

transportes. O objetivo, em primeiro lugar, é captar o “conhecimento” dos

usuários e não usuários do transporte público. A ideia disso é entender as

necessidades dos usuários e assim implementar políticas e mudanças nos

serviços para melhor atendê-los e captar novos clientes. Em segundo lugar, o

conhecimento sobre os usuários e não-usuários poderá ser compartilhado

entre os diversos atores do setor de transportes (empresas operadoras,

gestores do serviço público, responsáveis pelas políticas de mobilidade, entre

20

outros) e gerar inovação. Isso se dará através da integração das dimensões do

conhecimento, ampliando, com isso, a capacidade de inovação do setor dos

transportes públicos que será melhorada de forma sustentável e novos

conhecimentos serão integrados, reforçando a competitividade e o crescimento

de empresas.

3.4. Estilo cognitivo

O papel das pessoas e seu estilo cognitivo tornam-se fundamentais na

criação, compartilhamento e exploração dos conhecimentos para os objetivos

organizacionais. Os estilos cognitivos dos líderes têm papel fundamental para o

sucesso das práticas de GC e na criação do conhecimento.

O estudo desenvolvido por Jain (2013) explorou a relação dos estilos

cognitivos de líderes com processos, cultura, medição, tecnologia e liderança

de GC. Este estudo investigou o papel das ferramentas e práticas de GC em

uma grande organização de geração de energia no setor público na Índia e

como os estilos cognitivos dos líderes influenciam as práticas de GC.

Segundo Jain (2013), o conhecimento é um recurso cognitivo que pode

ser influenciado pelos estilos de pensamento dos líderes no contexto

organizacional. Consequentemente, o comportamento de liderança pode ser

destinado para incentivar o uso de conhecimento para o benefício da

organização como um todo e não para a vantagem individual.

As relações entre os estilos cognitivos e as práticas de GC foram

levantadas por meio de uma revisão de literatura. Os resultados do

levantamento apontaram para três tipos de estilos cognitivos, radical, inovador-

colaborador e adaptador.

Após esse levantamento os pesquisadores desenvolveram um

questionário, que foi submetido a uma amostra de gerentes de nível médio e

superior que tinham pelo menos cinco anos na empresa. O questionário de GC

abordava cinco dimensões: o processo de GC, GC de liderança, cultura GC,

tecnologia GC e medição GC.

21

Os resultados apresentados no estudo de Jain (2013) mostram a

relevância do estilo cognitivo adaptador na promoção de conhecimentos e

práticas de gestão. Os resultados mostram ainda um impacto negativo dos

estilos radicais e inovador-colaborador sobre as práticas de GC.

Tais resultados indicam que uma análise do estilo cognitivo dos perfis

de liderança da organização podem se configurar fatores essenciais para o

sucesso das práticas de GC na organização. Desta forma a busca pelo estilo

cognitivo adaptador nas lideranças das organizações se mostra fundamental

para o processo de desenvolvimento organizacional por meio da GC.

3.5. Gestão do Conhecimento nas Empresas Públicas brasileiras.

O trabalho apresentado por Batista e Quandt (2015), mereceu

destaque neste artigo, pois descreve os resultados da pesquisa realizada com

dezesete empresas estatais do setor público brasileiro. O objetivo do estudo

foi identificar como as estatais brasileiras lidam com a conceituação e

implementação da GC, qual é o impacto da formalização e exteriorização dos

programas de GC e os resultados alcançados com as práticas de GC.

As empresas foram classificadas em três grupos de acordo com a fase

de execução do programa de GC (inicial, intermediário e avançado).

Fase Inicial: nesse grupo estão listadas as empresas que: a) a GC não

é considerada como tema estratégico e b) as iniciativas de GC são incipientes

ou não foram implementadas. Este grupo inclui seis empresas: Companhia

Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Companhia de Desenvolvimento do Vale

do São Francisco (Codevasf), Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Companhia

Nacional de Abastecimento (Conab), Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) e

Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobrás).

A GC nesse grupo não é considerada importante pela alta

administração, nem pela gestão intermédia ou funcionários em geral. GC ainda

é considerada um conceito abstrato, discutido por pequenos grupos informais.

Os principais obstáculos para a implementação: apoio e prioridade

dada pela alta administração; recursos humanos dedicados à GC;

22

infraestrutura de TI; processos de trabalho e cultura organizacional;

indicadores e sistema de avaliação, visibilidade e comunicação

interna/externa.

Fase intermédia: nesse grupo estão listadas as empresas que: a)

exibem um considerável grau de compromisso estratégico para GC e b)

iniciativas de GC de curto prazo estão em execução. Seis empresas estão

neste grupo: Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), Caixa Econômica

Federal (CEF), Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), Itaipu

Binacional, Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) e

Telecomunicações Brasileiras S.A. (Telebrás).

As iniciativas implementadas foram: explicitação do conhecimento

dentro de processo, gerenciamento de conteúdo, gerenciamento eletrônico de

documentos e gerenciamento baseado em competências.

São fatores facilitadores para a implementação da GC, por ordem de

importância: acesso a recursos impressos e eletrônicos sobre a GC; programas

de treinamento e desenvolvimento para a equipe de TI e infraestrutura.

São obstáculos para a implementação da GC: dificuldade para capturar

o conhecimento não documentado, tendência de enfatizar a TI em vez do

aspecto humano ou organizacional, ideia de que o governo não prioriza o

conhecimento e a gestão da informação, falta de indicadores e falta de

incentivos para a partilha de conhecimentos.

Fase avançada: nesse grupo estão listadas as empresas que: a) a GC

é parte de sua prioridade estratégica e b) a alta administração e gestores de

nível intermediário veem a GC como importante e os funcionários compartilham

essa visão (pelo menos parcialmente). Este grupo inclui cinco organizações:

Banco do Brasil, Eletronorte, Eletrosul, Furnas e Petrobras.

Em geral, as organizações nesse grupo possuem os objetivos

formalizados e claros sobre os resultados que devem ser alcançados por

iniciativas de GC. Eles enfatizam a preservação do conhecimento

organizacional, a partilha de conhecimentos, a integração de GC com

23

processos de trabalho para inovação e o desenvolvimento de competências

fundamentais. Existe alocação de recursos específicos para iniciativas de GC.

Entre os benefícios do programa de GC, os mais citados são: retenção

de conhecimento; mão de obra mais especializada; melhoria do acesso e da

utilização de inovações; maior partilha de conhecimento; mapeamento,

organização, conservação e difusão de conhecimento crítico; redução de

retrabalho devido à divulgação de ferramentas para o compartilhamento de

conhecimento e retenção; racionalização e otimização de processos;

consolidação de uma cultura de inteligência organizacional e a tomada de

decisões mais ágil.

Entre os facilitadores, envolvidos no início da implementação da GC, em

ordem de importância são: programas de formação de pessoal e

desenvolvimento; acesso aos documentos e recursos sobre GC; infraestrutura

de TI; planos de comunicação bem desenvolvidos para coordenar a execução

das iniciativas; identificação das bases de conhecimentos relevantes na

empresa; acesso a consultores especializados e sistemas de informação para

dar suporte aos processos de GC.

Os obstáculos para a implementação da GC: falta de tempo para

compartilhar conhecimento na rotina de trabalho, dificuldade para capturar

conhecimento não documentado e baixo empenho da alta administração. O

baixo número de obstáculos mencionados por este grupo reforça ainda mais o

ponto de vista da implementação bem-sucedida das práticas de GC entre

estas empresas.

Petrobras, Furnas, Eletronorte e Eletrosul estão entre as cinquenta

maiores empresas controladas pelo Estado no país. Isto sugere que a sua

grande dimensão, juntamente com uma grande autonomia administrativa e

financeira, influencia sua capacidade de implementar métodos de gestão

inovadores, incluindo a GC.

24

4. Conclusão

É consenso entre os vários artigos estudados que há escassez de

estudos sobre a GC na administração pública. Sabe-se que essa ciência é

nova e que a concentração de estudos tem sido no setor privado e que as

técnicas e ferramentas desenvolvidas para este setor não são adequadas ao

setor público devido a fatores como: a) o SP não tem foco no ganho de capital,

b) a estrutura do SP é diferente do privado dificultando o compartilhamento do

conhecimento, necessitando de abordagens diferenciadas, c) organização

administrativa específica com diferentes preocupações quanto à eficácia, além

de possuir diferentes níveis de representatividade, accoutability e capacidade

de resposta e d) falta de consciência sobre o que é GC e os seus benefícios

no SP.

Identificou-se que os fatores críticos de sucesso estão associados às

dimensões culturais, estratégicas e tecnológicas. A cultura que valoriza o

conhecimento e incentiva a sua criação, compartilhamento e aplicação em um

ambiente no qual as pessoas não se sintam obrigadas a compartilhar o

conhecimento, mas no qual tenham constante desejo de aprender

conjuntamente para se complementarem mutuamente. Quanto a estratégia de

implantação, os casos de maior sucesso e resultados positivos estão

associados às entidades que formalizaram os programas de GC e contam com

o apoio dos gestores máximos dessas entidades. E por último, a Infraestrutura

tecnológica provê as bases de controle para a avaliação do sucesso das

iniciativas de GC ao tempo que detecta oportunidades de realinhamento das

estratégias de GC com as organizacionais.

Entre as práticas de gestão do conhecimento destacam-se os Spin Off,

parcerias, redes de compartilhamento e estilo cognitivo dos líderes. Os Spin

Off acadêmicos, que consistem em empresas criadas dentro das universidades

com o objetivo de combinar pesquisas (com valor econômico) e

empreendedorismo, tem o objetivo de tornar ainda mais disponível a criação

do conhecimento e o desenvolvimento de empresas, combinando o valor do

25

know-how, promovendo a transferência de tecnologia da universidade para os

negócios. As parcerias baseadas no conhecimento entre as organizações

públicas e as partes interessadas são uteis para melhorar a implementação de

políticas públicas além de dar maior transparência à ação do Estado. As redes

de compartilhamento, estudada no setor de transportes públicos, tem o

objetivo de captar o conhecimento dos clientes e prováveis clientes

(identificação das necessidades) e compartilhar com todos os atores

envolvidos na cadeia do negócio. Com isso, há ganhos exponenciais de valor

na prestação do serviço pois a todos interessam os dados coletados e

compartilhados. O estilo cognitivo, da liderança da organização, mostrou-se

um dos fatores essenciais para o sucesso das práticas de GC na organização.

Três são os tipos de estilos cognitivos identificados: radical, inovador-

colaborador e adaptador. Desses, os estilos radicais e inovador-colaborador

tiveram impacto negativo sobre as práticas de GC.

Por último, conclui-se que as práticas de GC prosperam melhor em

ambientes onde o nível de formalização e externalização são maiores. Estudo

conduzido com as principais empresas públicas brasileiras revelou que quanto

maior for o patrocínio da alta administração e formalização do programa de GC,

maior será o envolvimento dos funcionários e os benefícios do programa para

os resultados da organização.

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