Gestão de Sistemas Fluviais

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS CAPÍTULO 4 – BASES ECOLÓGICAS PARA A GESTÂO DE SISTEMAS FLUVIAIS 1. INTRODUÇÃO Os sistemas fluviais formam unidades indissociáveis e inter-dependentes com as respectivas bacias hidrográficas (Hynes, 1975; Cummins, 1992; Petts, 1994). Os processos ecológicos e alterações (de origem natural ou antrópica) que decorrem nas bacias hidrográficas, reflectem-se nos ecossistemas fluviais, de tal forma que é possível avaliar o estado ecológico da bacia hidrográfica e dos corredores fluviais (e respectivos desajustamentos provocados por práticas incorrectas do seu uso), através da avaliação da qualidade biológica da água (Hellawell, 1996), da integridade biótica das comunidades aquáticas (Karr, 1991) ou da saúde do ecossistema (‘ecosystem health’: Karr & Dudley, 1981; Calow, 1992; Norris & Thoms, 1999). As inter-acções entre os dois ecossistemas são tão fortes que a gestão de ecossistemas dulçaquícolas é de facto uma gestão integrada de bacias hidrográficas (Werritty, 1996). O aumento do interesse na gestão da água prende-se com a crescente escassez da sua quantidade e qualidade, face ao aumento e diversificação do seu uso, de tal forma que, num horizonte de cerca de 25 anos, a quantidade disponível de água doce poderá constituir um recurso limitante do desenvolvimento humano (Wetzel, 1993). A conservação de ecossistemas aquáticos está, assim, intrinsecamente ligada à compatibilização presente e futura dos seus usos (ou seja, às formas da sua gestão), de modo que sejam também garantidos objectivos de uso não utilitário e não consumptivo, relacionados com a conservação dos habitats, das espécies, das comunidades e do funcionamento dos ecossistemas. Os últimos vinte anos produziram uma base teórica bastante sólida no que respeita ao conhecimento do funcionamento ecológico dos sistemas fluvais, pelo menos de zonas temperadas (e.g. Calow & Petts, 1994; Cummins, 1994; Harper & Ferguson, 1996). Em paralelo, ocorreu uma verdadeira explosão nos tipos, formas e perspectivas de avaliar a qualidade biológica e ecológica da água e dos ecossistemas fluviais, resultante da progressiva perda dessa mesma qualidade (e.g. Boon & Howell, 1996). Os dois conjuntos de Maria Teresa Ferreira, Departamento de Engenharia Florestal do Instituto Superior de Agronomia 120

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

CAPÍTULO 4 – BASES ECOLÓGICAS PARA A GESTÂO DE SISTEMAS FLUVIAIS♣

1. INTRODUÇÃO Os sistemas fluviais formam unidades indissociáveis e inter-dependentes com as

respectivas bacias hidrográficas (Hynes, 1975; Cummins, 1992; Petts, 1994). Os processos

ecológicos e alterações (de origem natural ou antrópica) que decorrem nas bacias

hidrográficas, reflectem-se nos ecossistemas fluviais, de tal forma que é possível avaliar o

estado ecológico da bacia hidrográfica e dos corredores fluviais (e respectivos

desajustamentos provocados por práticas incorrectas do seu uso), através da avaliação da

qualidade biológica da água (Hellawell, 1996), da integridade biótica das comunidades

aquáticas (Karr, 1991) ou da saúde do ecossistema (‘ecosystem health’: Karr & Dudley, 1981;

Calow, 1992; Norris & Thoms, 1999). As inter-acções entre os dois ecossistemas são tão

fortes que a gestão de ecossistemas dulçaquícolas é de facto uma gestão integrada de bacias

hidrográficas (Werritty, 1996).

O aumento do interesse na gestão da água prende-se com a crescente escassez da sua

quantidade e qualidade, face ao aumento e diversificação do seu uso, de tal forma que, num

horizonte de cerca de 25 anos, a quantidade disponível de água doce poderá constituir um

recurso limitante do desenvolvimento humano (Wetzel, 1993). A conservação de

ecossistemas aquáticos está, assim, intrinsecamente ligada à compatibilização presente e

futura dos seus usos (ou seja, às formas da sua gestão), de modo que sejam também

garantidos objectivos de uso não utilitário e não consumptivo, relacionados com a

conservação dos habitats, das espécies, das comunidades e do funcionamento dos

ecossistemas.

Os últimos vinte anos produziram uma base teórica bastante sólida no que respeita ao

conhecimento do funcionamento ecológico dos sistemas fluvais, pelo menos de zonas

temperadas (e.g. Calow & Petts, 1994; Cummins, 1994; Harper & Ferguson, 1996). Em

paralelo, ocorreu uma verdadeira explosão nos tipos, formas e perspectivas de avaliar a

qualidade biológica e ecológica da água e dos ecossistemas fluviais, resultante da progressiva

perda dessa mesma qualidade (e.g. Boon & Howell, 1996). Os dois conjuntos de

♣ Maria Teresa Ferreira, Departamento de Engenharia Florestal do Instituto Superior de Agronomia

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conhecimentos (do funcionamento dos ecossistemas e da avaliação do seu estado ecológico)

são os pilares sobre os quais assentarão as formas e planeamento da gestão ecológica de

sistemas fluviais nas próximas décadas.

2. FUNCIONAMENTO DE ECOSSISTEMAS FLUVIAIS

Podemos considerar que oito grandes teorias norteiam presentemente a ecologia e

gestão de sistemas fluviais. Estas teorias são conjuntos coesos de postulados, formulando

concepções de conjunto sobre os processos e funções que decorrem nos ecossistemas

aquáticos, ou seja, o seu funcionamento. A partir das concepções de funcionamento

formuladas, é possível prever a resposta do ecossistema face a alterações humanas e bem

assim, predizer a sua resposta a soluções de gestão e recuperação.

A maior parte destas teorias foram propostas nos anos oitenta, em grande parte a partir

de estudos ou conceitos embrionares surgidos nos anos setenta. Estas teorias não são

antagónicas, mas completam-se nas várias facetas de um poliedro de muitas faces cuja forma

representa a realidade ecológica, global e dinâmica. O quadro teórico final de funcionamento

dos ecossistemas fluviais passará pela aglutinação e integração destas várias facetas da

realidade ecológica.

2.1. A teoria do sistema fluvial a quatro dimensões (Ward, 1989)

Os sistema fluviais são interactivos ao longo de três dimensões espaciais: a

longitudinal (entre a cabeceiras e afluentes e o rio principal), a transversal (entre o corredor

fluvial e o seu vale de cheia), e a vertical (entre leito do rio e o aquífero). A quarta dimensão –

o tempo – configura a escala temporal. A escala temporal é crítica porque determina toda uma

multitude de diferentes processos em curso, desde os derivados das variações hidrológicas

intra-anuais e inter-anuais, até aos que se relacionam com o desenvolvimento das bacias

hidrográficas à escala planetária (Figura 4.1).

Os sistemas fluviais desenvolveram-se e funcionam em resposta a padrões e processos

dinâmicos que ocorem ao longo destas quatro dimensões. Para a compreensão dos

ecossistemas fluviais e sua gestão e recuperação, é necessária esta aproximação holística da

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realidade ecológica espacio-temporal, considerando as perturbações alóctones como forças

desruptivas destas quatro vias de interacções.

Figura 4.1. As quatro dimensões do sistema fluvial: longitudinal, transversal, vertical e lateral.

Extraído de Boon (1992)

2.2 A teoria do sistema fluvial multiescalonado (Frissell et al, 1986)

As bacias hidrográficas compreendem uma rede hierárquica de afluentes e respectivas

bacias de drenagem. Os afluentes são constituídos por segmentos fluviais; cada segmento é

constituído por troços fluviais em sequência, definidos como um conjunto de habitats (função

de variáveis como a profundidade, o tipo de fluxo, a velocidade de corrente e o substrato do

leito), cuja sequência e proporção lhe conferem individualidade. Cada unidade habitacional

por sua vez pode apresentar vários microhabitats, de carácter e duração efémeros. A multitude

de processos e funções ecológicas decorrentes no sistema fluvial existem enquadrados nesta

hierarquia de escalas (Frissell et al., 1986).

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O termo escala refere-se a um dado período de tempo ou a um dado espaço, e o

processo de escalonamento à mudança de escala espacial ou temporal. Geralmente, são

consideradas como as mais importantes as escalas adoptadas por Frissel et al. (1996), ou seja,

bacia hidrográfica, segmento fluvial, troço fluvial e habitat fluvial, mas frequentemente são

igualmente consideradas nos extremos deste série a região e o micro-habitat (e.g. Schiemer,

2000). Quando se muda de escala espacial igualmente mudam os processos morfodinâmicos e

factores de controle que regem o sistema fluvial e a escala temporal a que estes se processam

(Quadro 1).

Quadro 4.1. Desenvolvimento espacial e temporal das várias escalas consideradas para ecossistemas fluviais (com base em Habersbeck, 2000, adaptado)

ESCALA ESPACIAL (km) TEMPORAL (alterações

morfológicas) Regional-continental >1000 Unidades de tempo geológicas Bacia ou sub-bacias hidrográficas

100-10000 Unidades de tempo geológicas

Seccional (segmento) 1-100 10-1000 anos Local (troço e habitat) 0.01-1 0.1-10 anos Pontual (micro-habitat) 0.001-0.01 < 1 ano

A teoria do sistema fluvial multiescalonado considera os seguintes postulados: cada

componente do sistema fluvial é uma parte constituinte e um todo, expressos num dado

contexto, temporal; os padrões, processos e interacções que decorrem no sistema fluvial

podem ser expressos a diferentes escalas espaciais e temporais e estão interligados; as

relações entre os processos ecológicos e os padrões que estes criam mudam de acordo com a

escala espacial considerada; os níveis de organização do ecossistema localizados nas escalas

superiores influenciam as propriedades e processos ecológicos que decorrem nas escalas

inferiores enquanto os que decorrem nestas tem uma menor capacidade de influenciar as

escalas superiores (Allan et al., 1997).

Só é possível uma visão ecológica real do ecossistema quando se integram as várias

escalas embora a escolha da escala ou escalas de trabalho dependa dos objectivos deste. De

acordo com Verdonshoot (2000), os dados biológicos (espécies, comunidades) ou ecológicos

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(processos, padrões) devem ser recolhidos a uma escala imediatamente inferior àquela em que

a questão ou objectivo é formulado.

Diferentes comunidades e processos biológicos estão primariamente associados a

escalas diferentes, dependendo do tempo e do ciclo de vida das espécies. Por exemplo, as

comunidades de peixe reflectem sobretudo a escala do segmento fluvial, embora

evidentemente, escalas maiores e menores intervenham igualmente na sua estruturação e

frequentemente, pode ser observada uma interpenetração da influência das várias escalas, por

exemplo, os salmonídeos seleccionam pontos específicos da malha habitacional do rio (escala

habitat) com temperatura ou velocidade da corrente inferiores aos que caracterizam a

generalidade do troço ou segmento fluvial onde se encontram, de escala superior.

A resposta dos organismos a alterações é evidentemente também dependente da escala

e pode variar desde horas (e.g. variação diária do plâncton) a milhões de anos (especiação e

dispersão geográfica de espécies piscícolas), dependendo do tipo de comunidade e da resposta

em jogo- ecológica, comportamental, fisiológica ou genética. Frissell et al. (1986) constroem

a partir da sua divisão hierárquica um contínuo de sensibilidade de habitats à perturbação e

tempo de recuperação face à perturbação. Os microhabitats são estruturas efémeras e muito

susceptíveis à perturbação e as bacias hidrográficas o contrário. Contudo, eventos de pequena

escala que perturbam microhabitats não se reflectem sobre as escalas superiores mas eventos

que perturbem as escalas superiores reflectem-se nas escalas inferiores (por exemplo, um

corte raso de uma área florestada afecta todo um segmento enquanto uma árvore que caiu no

rio afecta apenas os habitats logo a jusante.

2.3. A teoria do mosaico dinâmico (Townsend, 1989)

Esta teoria, que apresenta várias facetas, das quais as mais conhecidas são o conceito do

“Habitat Template” de Southwood (1977) e o conceito de “Patch Dynamics” de Townsend

(1989), refere-se ao funcionamento ecológico das populações/espécies e as suas interacções

bióticas e abióticas, à escala espacial do habitat fluvial. Este conjunto teórico postula que,

com base nos processos e funções ecológicas que decorrem entre as populações das várias

espécies e entre estas e o habitat, é possível predizer padrões ecológicos deles resultantes, e

concretamente os seus parâmetros indicadores, como a riqueza, a diversidade, a presença de

estrategas K ou r, ou a presença de espécies raras.

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2.4. A teoria do contínuo lótico (Vannote et al., 1980)

Todos processos ecológicos ocorrentes num sistema fluvial se encontram estruturados

de acordo com a hierarquia da rede hidrográfica. O conceito do contínuo lótico (Vannote et

al., 1980) propõe um quadro teórico holístico para o funcionamento ecológico dos sistemas

fluviais entre as cabeceiras e a foz, considerando o rio e a sua bacia hidrográfica como uma

unidade funcional, com as suas comunidades variando e sendo susbtituidas gradual e

longitudinalmente de acordo com gradientes igualmente longitudinais de características

físicas e químicas do sistema (Figura 4.2).

As cabeceiras são frequentemente constituídas por rios de pequena dimensão rodeados

por áreas florestais, com corrente rápida e turbulenta, fundos rochosos, águas transparentes,

bem oxigenadas e com poucos nutrientes. A vegetação é muito pouca e uma camada de

perifiton cobre os substratos. O rio depende em termos alimentares dos materiais fornecidos

pelas zonas terrestres envolventes, pelo que as comunidades de invertebrados de fundo são

constituídas por trituradores (que trituram folhas e outros detritos grosseiros) e colectores (que

colectam detritos mais finos, arrastados pela corrente ou depositados entre as pedras), sendo

os raspadores menos abundantes (que raspam o perifiton e as superfícies das plantas) e

havendo poucas condições para os predadores (que predam outros invertebrados) se

estabelecerem. Em Portugal, os peixes típicos destas zonas são as trutas e os escalos.

Nos cursos médios, o vale alarga e aumenta a contribuição da bacia hidrográfica em

materiais mais finos e nutrientes (Figura 4.2). A corrente não é tão forte, o rio forma um curso

sinusóide na planície, o leito apresenta já muitas zonas de deposição de areias e de materiais

finos, pelo que a vegetação e o perifiton são abundantes nas margens e no leito. Assim, os

invertebrados são dominados por colectores e por raspadores, com trituradores e predadores

em menor proporção. Estes rios são habitados por ciprinídeos como a boga, o barbo e o

ruivaco.

Nos cursos de planície, já meandrizados e de grande desenvolvimento do corredor

fluvial, a massa de água é grande e pouco turbulenta, mas turva, com muitos materiais finos

em suspensão e nutrientes (Figura 4.2). Como a profundidade aumenta, as plantas estão

circunscritas às zonas marginais e na massa de água domina o plâncton. O fundo está coberto

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de depósitos finos e é dominado por colectores de depósito e seus predadores. Os peixes mais

frequentes desta zona são a carpa comum, o barbo, a enguia e a tainha.

Largura relativa do canal

1

2

3

4

5

6

7

8

12

11

10

9

CPOM

CPOM

FPO

M

FPOM

Figura 4.2. O conceito do contínuo lótico, RC, de Vannote at al. (1980). Relações teóricas gerais entre o número de ordem (hierarquia) do sistema fluvial, as entradas de materiais alimentares (fontes energéticas)

e as comunidades fluviais no quadro conceptual delineado pelo RC. Extraído de Ferreira (2000).

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A teoria do contínuo lótico (Vannote et al., 1990) postula: que os organismos e

características de cada troço lótico evoluiram em concerto com o arranjo mais provável das

condições físicas e químicas determinadas pela geologia e geomorfologia da bacia de

drenagem e do corredor fluvial; que os locais a jusante dependem em grande parte da

ineficiência alimentar dos locais a montante e dos excedentes nutritivos oriundos do meio

terrestre; e que a estrutura das comunidades (nomeadamente dos produtores primários e dos

macroinvertebrados) se modificam ao longo de um contínuo entre as cabeceiras e a foz, em

resposta a gradientes longitudinais igualmente contínuos das contribuições relativas das fontes

alimentares endógenas e exógenas.

2.5. A teoria da espiral de nutrientes (Elwood , Newbold, O’Neill & vanWinckle, 1983)

Os rios são um vector de transferência de materiais entre as cabeceiras e o vale. Este

movimento contínuo unidireccional de materiais orgânicos e inorgânicos (Elwood et al.,

1983; Pinay et al., 1990). Durante esta deslocação, os materiais em movimento são

absorvidos, utilizados, decompostos e reutilizados, numa contínua transformação entre

componentes orgânicas e inorgânicas.

Elwood et al. (1983) definiram o comprimento de cada espiral de reciclagem de

materiais como a distância média percorrida por um átomo de nutriente (P, N) durante o seu

ciclo de transformações mineral-orgânico-mineral, no seu movimento para jusante (Figura

4.3). Medições deste comprimento indicam desde 100 m para espirais curtas até mais de 10

km para espirais longas (Newbold et al., 1981).

O comprimento da espiral está associado ao número de vezes que o mesmo átomo é

utilizado em dada zona fluvial, e logo, à produtividade dessa zona. Um parte dos processos

pode ocorrer nos ecótonos laterais, sobretudo nos cursos médios e finais, em zonas de grande

interacção com o vale de cheia (Figura 4.3).

Alterações dos ecótonos laterais induzem alterações no comprimento das espirais de

nutrientes e na grandeza do material reciclado. A retenção, utilização e remineralização dos

nutrientes dependem também da distribuição, densidade, tamanho, justaposição e diversidade

do mosaico de habitats. A estabilidade do mosaico habitacional está também genericamente

relacionada com a retenção do material orgânico no rio e na planície aluvial.

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Figura 4.3. A espiral de nutrientes de Elwood et al. (1983). Extraído de Pinay et al. (1990).

2.6. A teoria da perturbação intermédia (Ward & Stanford, 1983b)

Esta teoria propõe que nos sistemas fluviais existe uma permanente situação de

instabilidade que maximiza a diversidade, uma ideia proposta originalmente por Connell

(1978). Esta instabilidade reflecte-se na elevada resiliência (ou capacidade de recuperação)

das comunidades aquáticas, num dado espaço e num dado instante. A elevada resiliência da

maior parte dos ecossistemas fluviais configura a sua meta-estabilidade.

Um desenvolvimento interessante desta teoria consiste na abordagem das

consequências da introdução de descontinuidades no sistema fluvial (e.g. barragens), em

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termos da estrutura das comunidades e processos ecológicos decorrentes. Assim, a posição da

descontinuidade ao longo do contínuo lótico é determinante do tipo e da grandeza das suas

consequências em termos das comunidades e processos ecológicos afectados (Ward &

Stanford, 1983a), expressos em parâmetros como a riqueza, a razão matéria orgânica

particulada grosseira/fina ou a biomassa de macrófitos. A alteração destes parâmetros pode

ser expressa em termos da grandeza da alteração e da distância ao número de ordem fluvial

recriado durante a perturbação (Pinay et al., 1990).

2.7. A teoria da pulsação de cheias (Junk , Bayley & Sparks, 1989)

Num rio de planície, podem ser distinguidas várias zonas aquáticas e semi-aquáticas,

incluindo o rio principal e os seus tributários, braços laterais conectados permanentemente ao

rio principal e antigos braços de rio separados e que só ocasionalmente durante as cheias

ficam ligados ao sistema, zonas aquáticas mais afastadas, mais ou menos incorporadas no

meio terrestre e que há muito tempo se separaram do rio e zonas de alagados freatófitos.

Existe uma conectividade hidrológica entre todos estes sub-sistemas, quer superficial

(permanente ou temporária) quer via subterrânea (Schiemer, 2000).

A conexão lateral hidrológica e a dinâmica do fluxo e refluxo hídricos, geram um

fluxo dinâmico de nutrientes e matéria orgânica viva ou morta, que determina a conexão e

características dos habitats existentes e respectivas condições tróficas. A disrupção destas

trocas laterais complexas de água e materiais (e.g. por incorporação de diques laterais), altera

profundamente os sub-componentes ecossistémicos envolvidos, com consequências a nível

das populações de muitas espécies.

As cheias são um aspecto crucial deste conceito. Representam um fluxo de novas fontes

alimentares e a conexão aos habitats incorporados há tempo no meio terrestre, mantendo-os e

renovando-os em termos geomórficos, físico-químicos e biológicos. Quanto mais

espacialmente gradual for o ecótono entre o rio e os habitats na planície de cheia, ou seja, a

zona de transição entre o meio aquático e o terrestre, maior a interacção e os processos de

troca de materiais e organismos e a necessidade de uma conexão dinâmica e meta-estável

(Schiemer, 2000).

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2.8. A teoria da descontinuidade serial expandida (Ward & Standford, 1983a; 1995)

Uma forma de classificação fluvial largamente expandida é a agregação da sequência

de segmentos fluviais em três grandes tipos/zonas: as cabeceiras (zonas de erosão e extracção

de materiais), o curso médio (zona de transição ou de transferência de materiais) e o curso

final de planície (zona de deposição). Esta divisão muito simples apresenta uma base sólida

em termos de processos geomorfológicos e explica grande parte das alterações do sistema

fluvial ao nível da bacia hidrográfica. Nesta teoria, as três zonas apresentam diferente

magnitude na importância das interfaces vertical, temporal e lateral (Figura 4.4). A zona

média, com os seus canais múltiplos e ilhas, é muito importante no aumento da

heterogeneidade habitacional, na influência da zona ripária e na diversidade dos estados de

sucessão. A ilhas criam zonas de retenção de nutrientes e de matéria orgânica que contribuem

para o aumento da resiliência do rio a perturbações naturais e antropogénicas (Petts, 2000).

Para dado sector, o mosaico de habitats (‘patches’) difere na escala a que se exprime, e

nas fronteiras e interacção com os meios envolventes - terrestre, hiporreico e fluvial -, a

montante e a jusante. A grande diferença entre as três zonas reside na diferente justaposição,

diversidade e densidade do mosaico de habitats (Pinay et al., 1990). Os processos produtivos

dominantes podem ser autotróficos ou heterotróficos conforme a zona fluvial em questão, e

em função da retenção ou exportação das várias fontes de matéria orgânica morta. Os

processos autotróficos tendem a dominar a zona média enquanto os processos heterotróficos

tendem a dominar genericamente o sistema fluvial.

3. ACTIVIDADES HUMANAS E ALTERAÇÕES DO FUNCIONAMENTO DOS ECOSSISTEMAS FLUVIAIS

Durante toda a história humana, as interacções do homem com os rios visaram criar ou

manter confinamentos da água para uso ou protecção das sociedades humanas. Durante

centenas de anos, mas em particular nos últimos cem, os progressos da engenharia avaliaram-

se pela intensificação do controle humano sobre os recursos hídricos, nomeadamente a

garantia do fornecimento adequado de água em qualidade e quantidade, o controle das cheias

e da erosão e o controle da poluição.

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Figura 4.4. O conceito da descontinuidade serial de Ward & Stanford (1995). Adaptado de Petts

(2000)

Contudo, hoje mais do que nunca, as reservas de água são insuficientes para a crescente

procura humana, é reconhecido que nunca será possível o controle total das cheias e das secas,

todas as massas de água apresentam cada vez mais um grau qualquer de poluição. A nível

mundial, os bons pesqueiros e as espécies apreciadas declinam, um sinal da crise profunda

dos ecossistemas (Karr & Chu, 2000).

O biota das bacias hidrográficas é o produto de milhões de anos de alterações

geológicas e de evolução biológica. A sua existência representa o ‘integral’ das condições

que governam os recurso hídricos, uma matriz biológica complexa que evoluiu em conjunto

com os processos biogeoquímicos que deram forma aos recursos hídricos. De facto, as

comunidades biológicas reflectem a qualidade da gestão de recursos hídricos na bacia de

drenagem melhor do que qualquer medida físico-química, porque integram um espectro total

de factores biogeoquímicos. Gerir e conservar correctamente as comunidades aquáticas

implica/reflecte uma boa gestão de recursos hídricos e, em consequência, a garantia e

protecção dos usos humanos do sistema, incluindo potabilidade, pesca, actividades

recreativas, fluxos de água, navegabilidade, hidroenergia (Karr, 1998).

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A Figura 4.5 representa os cinco grupos de factores ambientais que determinam a

integridade biótica de cada ecossistema fluvial, de acordo com Karr & Chu (2000): i) os

factores associados às características do canal; ii) as fontes de energia que penetram no

sistema a partir de montante, da bacia de drenagem e da atmosfera; iii) a qualidade e

características geoquímicas da água; iv) o regime de caudais, líquido e sólido, que ocorrem

em cada local fluvial; e v) as interacções bióticas tais como predação, competição ou efeitos

patogénicos.

Figura 4.5. Os cinco grupos de factores que influem na integridade biótica dos sistemas fluviais de acordo com Karr & Chu (2000)

Estes grupos de factores não são estanques, antes formam uma teia multivariada de

influências. Por exemplo, o teor de matéria orgânica caracteriza a qualidade da água de dado

sistema fluvial, mas é também umas das suas fontes de energia.

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A maior parte destes factores podem ser naturais ou ter origem em actividades humanas.

Por exemplo, a matéria orgânica que caracteriza dado local pode provir da folhada ripária ou

de um efluente urbano. Uma espécie nova para a comunidade pode ter migrado de uma bacia

hidrográfica adjacente ou ter sido introduzida pelo Homem. Assim, a influência das

actividades humanas pode processar-se em vários factores e grupos de factores e globalmente

afectar toda a teia de processos e funções decorrentes no ecossistema.

Diferentes factores intervêm de forma diferente em diferentes sectores do sistema

fluvial e a predicatibilidade da sua acção e consequências resulta do próprio funcionamento de

cada sistema fluvial, que se encontra estabelecido no quadro teórico descrito no capítulo

anterior. Por exemplo, uma barragem, que interrompe o contínuo fluvial, apresenta

consequências importantes na espiral de nutrientes, mas esta interrupção e respectivas

consequências serão diferentes em diferentes troços fluviais, tal como postula a teoria da

descontinuidade serial. A construção de diques laterais e a canalização de um segmento

fluvial interrompe a pulsação das cheias num rio de planície e afecta o segmento fluvial em

questão, mas não a respectiva bacia de drenagem, cujo processos e funções ecológicos se

processam num nível espacio temporal diferente.

O Quadro 4.2 sistematiza as principais actividades humanas que interferem com os

factores que determinam a integridade biótica, bem como os seus principais e comunidades

afectadas (Wright et al., 2000). A qualidade da água e as fontes energéticas são

tradicionalmente as agressões sobre as quais se concentra o esforço de controle, porque

geralmente estão associadas a fontes pontuais poluidoras e como tal mais fáceis de quantificar

(sobretudo em termos químicos) e de resolver tecnicamente, porque se trata de situações em

que mais directamente se pode responsabilizar o utilizador e porque afectam os usos futuros

da água pelo homem. É hoje óbvio que, apesar de todos os esforços desenvolvidos, não se

verifica uma melhoria significativa na qualidade dos sistemas fluviais, porque outras

alterações ocorrem em simultâneo e sob diferentes formas, não sendo quantificáveis por

elementos físico-químicos.

Quadro 4.2. Sumário de tipos de actividades humanas e seus principais impactes sobre o corredor fluvial e o canal, incluindo os efeitos ecológicos primários destas actividades e as comunidades

biológicas primariamente afectadas. A vermelho indicam-se as actividades humanas tradicionalmente consideradas como influindo na qualidade da água e para as quais é efectuada a avaliação físico-

química de rotina. Adaptado de Wright et al. (2000). PL- plantas aquáticas e galeria ribeirinha; BE-macroinvertebrados e diatomácias bênticas; PI- peixes

ACTIVIDADE PRINCIPAL IMPACTO EFEITO PRIMÁRIO PRINCIPAIS

133

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

HUMANA COMUNIDADES AFECTADAS

REGULARIZAÇÃO Aumento do caudal Instabilidade do substrato do leito PL; BE; PI Redução do caudal Assoreamento PL; BE, PI Constância do caudal Homogeneização e estabilidade do

leito PL; BE

Variações do regime caudal Assincronia das variações naturais PI Variações da curva de

duração anual de caudais

Redução ou inexistência de cheias de limpeza anual do leito e afluência de nutrientes às zonas laterais

PI

INTERVENÇÕES FLUVIAIS

Pontes e estruturas transversais

Perturbação do substrato e dos habitats

BE

Alteração de perfis transversais e longitudinais

Alterações da forma do canal, homogeneização de habitats

PL; BE; PI

Dragagens Perturbação do substrato, assoreamento

PL, BE; PI

Barragens e açudes Alteração regime caudais BE, PI Canais associados à rede

hidrográfica

Alteração regime caudais BE; PI

USO DA ÁGUA Extracção e desvio Variações perímetro molhado e do regime caudal líquido

BE, PI

Transferências de água Alterações do regime de caudal PL; BE; PI Poluição por efluentes

pontuais

Aumento carga orgânica e inorgânica suspensa e dissolvida

PL; BE, PI

USO DA BACIA DE DRENAGEM

Actividades monoculturais e escoamentos

Nutrientes e pesticidas PL; BE; PI

Minas, estaleiros e extracção de inertes

Assoreamento materiais finos Poluição

BE; PI

Urbanização e indúsria Poluição BE, PI

4. QUALIDADE DA ÁGUA

A qualidade da água é o conjunto de concentrações, especiações e partições físicas de

substâncias orgânicas e inorgânicas, bem como a composição e o ‘estado’ do biota aquático

que vive na massa de água (Chapman, 1998). Entende-se por poluição, a introdução directa

ou indirecta pelo Homem de subtâncias ou energia que resultam em efeitos prejudiciais para

os recursos vivos, para a saúde humana, para as actividades piscatórias e de recreio e para os

usos económicos da água. Embora as definições modernas de qualidade da água e de poluição

já contemplem a conservação do biota e do seu bom ‘estado’, ainda se baseiam

estruturalmente a) na ideia da entrada de substâncias ou energia no sistema aquático; b) na

garantia da saúde humana e c) na garantia dos usos futuros da água.

Por avaliação da qualidade da água entende-se assim o processo de avaliação das

características físicas, químicas e biológicas em relação à sua qualidade natural, efeitos nas

134

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

populações humanas e uso económico da água. Quando existe uma colecção de informações

numa malha de locais e recolhidas a intervalos regulares para avaliação da qualidade da água,

estamos na presença de uma monitorização. A qualidade da água no sentido desta definição

tradicional (embora moderna), é avaliada por três formas:

a) Determinação de parâmetros físicos, químicos, bioquímicos e microbiológicos da

água, material particulado e tecidos biológicos;

b) Bioensaios ou biotestes, uma aproximação geralmente laboratorial e ex situ,

destinada a determinar o tipo e grau de acumulação efectiva ou potencial de

substâncias ou energia poluentes nos organismos aquáticos;

c) Bioavaliação, uma aproximação geralmente observacional e in situ, na qual

indicadores ou índices biológicos, baseados em características específicas,

comunitárias, ecossistémicas ou metabólicas, são utilizados na determinação da

qualidade da água.

Durante muito tempo, a monitorização físico-química foi a forma mais apropriada de

detectar os efeitos de actividades humanas nas comunidades aquáticas. Geralmente, a

monitorização é efectuada nas áreas onde ocorrem problemas (mortalidade de peixes,

espumas orgânicas ou inorgânicas, turvação e cheiros da água, etc.) e a avaliação reflecte as

alterações físico-químicas provocadas por fontes poluidoras pontuais ou difusas (indicadas a

vermelho no Quadro 4.2).

A legislação em vigor é o Decreto-Lei nº236/98 de 1/8 estabelece valores máximos

admissíveis ou recomendáveis para os vários parâmetros físico-químicos ou microbiológicos,

de acordo com os tipos do futuro uso humano da água, por exemplo recreio, abastecimento,

industrial ou rega. Este método de avaliação da qualidade é descritivo, e refere-se apenas à

componente água e às substâncias nela dissolvidas e em suspensão.

Esta avalição tradicional da qualidade fluvial tornou-se completamente inadequada na

actualidade, quer devido à especificidade das condições ecológicas de cada massa de água e

suas variações sazonais, quer devido à sua aproximação muito restrita a um ou apenas alguns

aspectos das alterações em curso, apesar da multitude multivariada de agressões que se

exercem sobre os sistemas fluviais (Quadro 4.2). De facto, esta aproximação tradicional

revelou-se de baixa sensibilidade, inadequada na medição de diferentes situações de

perturbação intermédia e incapaz de distinguir variações naturais das antrópicas.

135

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

Contudo, em Portugal, a qualidade da água é ainda hoje avaliada pelas Direcções

Regionais do Ambiente e Ordenamento do Território (DRAOT), apenas por meios físico-

químicos, e por isso verificam-se frequentes desajustamentos entre a legislação e a realidade

ecológica ibérica (nomeadamente piscícola), por exemplo, muitos pesqueiros de elevado valor

encontram-se presentemente classificados como não apresentando vida piscícola devido aos

valores de parâmetros como a temperatura e os cloretos.

Na generalidade dos países europeus é já realizada, em paralelo da avaliação físico-

química, uma avaliação da qualidade da água por via biológica, com base em organismos ou

comunidades indicadoras. A bioavaliação tem a vantagem de integrar de forma cumulativa, o

conjunto de alterações e agressões que afectam dado local , não só na altura da colheita mas

também historicamente.

A Figura 4.6 ilustra a qualidade da água da bacia do Tejo através de indicadores físico

químicos utilizados pelas DRAOT e biológicos utilizados pelo Instituto Superior de

Agronomia. Este tipo de cartas de qualidade de sistemas fluviais é fundamental enquanto

peça de ordenamento piscícola, visto que locais com diferentes graus de degradação devem

ser objecto de diferentes medidas de intervenção, usos e fomento piscícola

A bioavaliação moderna da qualidade fluvial consiste na avaliação do desvio de um

ecossistema de qualidade desconhecida (‘local teste’) em relação ao ecossistema que ocorreria

no mesmo local em condições não alteradas por actividades humanas (‘situação de

referência’) e possuidor de integridade biótica (Karr & Dudley, 1981; Karr, 1991) ou de

qualidade ecológica (Pollard & Huxnham, 1999). Um sistema apresentando elevada

integridade biótica, suporta e mantém um conjunto de comunidades íntegras e equilibradas,

com composição, estrutura e organização funcional típicas do respectivo enquadramento

geomórfico regional. Nesta situação, o ecossistema é auto-sustentável, os seus processos e

funções estáveis, e capazes de reagir a níveis razoáveis de perturbações exógenas.

136

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

Figura 4.6. Imagem global da qualidade dos sistemas fluviais da bacia do Tejo incluindo a informação físico-química e a biológica

Podemos considerar existirem presentemente cinco tipos de avaliação da qualidade

da água e da qualidade de sistemas fluviais:

a) Avaliação por índices biológicos. Esta é a forma mais tradicional de bioavaliação,

refere-se em geral à qualidade da água per se e inclui três tipos de técnicas, que

dominaram até meados dos anos oitenta: i) os índices de sapróbios que usam a

tolerância de cada espécie à poluição aquática, traduzida num valor e peso

137

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

indicadores cujo somatório indica o nível de qualidade; ii) os índices de diversidade,

que utilizam a variação da proporção das espécies na comunidade para indicar o

grau de degradação; e iii) os índices bióticos que combinam os dois anteriores ao

utilizarem a riqueza dos taxa de dada comunidade e a sua tolerância à poluição,

ponderando ambas num valor final (é o caso da Figura 4.

b) Avaliação físico-ecológica. A qualidade física do corredor fluvial pode ser avaliada

por vários métodos, incluindo a análise de características como o tipo e diversidade

de substratos do leito, a cobertura arbórea e abrigos, a morfologia do canal e zona

ripária, os padrões de erosão e sedimentação, etc. Entre os índices mais conhecidos e

utilizados deste tipo, incluem-se o Habitat Suitability Index norte-americano

(USFWS, 1981), o River Habitat Survey inglês (Raven et al., 1997), o GSGK

alemão (Friedrich et al., 1993).

c) Avaliação de componentes do ecossistema. Este tipo de índices avalia o valor de

dado segmento fluvial, em função de espécies e comunidades de elevado valor

conservacionista, independentemente da integridade biótica do próprio sistema.

Assim, um rio pode apresentar baixa qualidade ecológica e no entanto elevado valor

conservacionista, como é o caso do rio Guadiana. Os índices mais conhecidos deste

tipo são o SERCON inglês (Boon et al., 1998) e o AMOEBA holandês (Brink et al.,

1991). O SERCON, por exemplo, utiliza 5 grupos de atributos ponderados

pericialmente, ao todo 35, divididos em blocos referentes à diversidade,

naturalidade, representatividade, riqueza e raridade, e corrigidos de 8 tipos possíveis

de intervenções negativas e de 11 tipos possíveis de valores conservacionistas.

d) Avaliação por análise multivariada comunitária. A partir do início dos anos

oitenta, foram desenvolvidos índices comunitários baseados no grau de significância

estatística do desvio da composição taxonómica dos locais teste em relação a locais-

tipo não afectados por actividades humanas, cuja agregação é determinada

originalmente pelos taxa aí encontrados. A aproximação multivariada é um modelo

de carácter preditivo e teve origem europeia, sendo o mais conhecido o modelo

RIVPACS no U.K. (já na sua quarta versão: Wright et al., 2000), mas outras

aplicações bem sucedidas são o BEAST canadiano canadiano (Rosenberg et al.,

2000), o AUSRIVAS australiano (Davies, 2000) EKOO holandês (Verdonshoot &

Nijboer, 1997).

138

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

e) Avaliação por índices multimétricos. Igualmente a partir do início dos anos oitenta,

desenvolveram-se nos EUA índices baseados em características ou atributos

(‘métricas’) de uma ou mais comunidades, que apresentam uma resposta preditível e

geralmente de tipo linear, às agressões humanas (Barbour et al., 1999). As

comunidades piscícolas são das mais utilizadas nesta avaliação da qualidade

ecológica.

Cada tipo de massa de água e formas de agressão apresentam métricas potencialmente

diferentes, pelo que para cada região ou massa de água deve ser adaptado o índice

multimétrico respectivo. São utilizadas em geral as seguintes métricas (Thorne & Williams,

1997; Verdonschot, 2000): i) medidas de riqueza e de abundância (e.g. número total de taxa,

abundância de Oligoquetas, percentagem do taxon dominante, etc.); ii) medidas de tolerância

ou intolerância (presença e abundância de dados taxa); iii) medidas funcionais (e.g.

percentagem de detritívoros, percentagem de animais com lesões e parasitas, percentagem de

animais de dada classes de idade, etc.); iv) índices bióticos; v) medidas de diversidade; vi)

medidas de semelhança comunitária ou perda desta. As três primeiras alíneas são as mais

utilizadas.

Em relação aos cinco tipos de métodos apresentados, verifica-se que todos assentam

nas comunidades biológicas à excepção da avaliação físico-ecológica do corredor fluvial. Esta

última demonstrou já a sua utilidade, sobretudo em situações de alterações extensivas

estruturais dos corredores fluviais, contudo, a tendência actual é basear a avaliação da

qualidade ecológica nas componentes bióticas, consideradas o elemento integrador dos

factores de alteração ocorrentes no corredor fluvial e na bacia hidrográfica. O cenário

geomórfico fornece, contudo, dados complementares de inegável interesse.

A avaliação de componentes do ecossistema (vocacionada para quantificar o estatuto

de conservação) e as duas últimas alíneas (vocacionadas para quantificar a qualidade da água

e do ecossistema), representam linhagens paralelas de avaliação da qualidade, embora

complementares. A ideia de estatuto ecológico está associada a aproximações

conservacionistas clássicas, biocêntricas, baseadas em espécies ou comunidades chave, alvo

ou raras a preservar, bem como os seus habitats, em segmentos ou troços fluviais de interesse

especial, que devem ser estatutariamente protegidos, eventualmente através do seu isolamento

ou pelo menos controle dos usos humanos (Boon et al., 2000; Moulton, 2000).

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

O Quadro 4.3 indica as métricas utilizadas num índice multimétrico desenvolvido para

avaliação da qualidade piscícola de sistemas fluviais portugueses (Oliveira e Ferreira, em

publ.).

Quadro 4.3 - Critérios de pontuação para as métricas utilizadas no cálculo do IIB para a bacia do rio Tejo.

Critério de pontuação

Métrica 5 3 1

Número de espécies nativas (% LM)a

≥ 67 33-67 < 33

Indivíduos pertencentes a espécies nativas (%)b

> 90 70-90 < 70

Indivíduos pertencentes a espécies muito tolerantes (%)b

≤ 25 25-60 > 60

Indivíduos pertencentes ao género Rutilus (%)b

> 15 5-15 < 5

Indivíduos pertencentes a espécies invertívoras pelágicas (%)b

≥ 60 20-60 < 20

Abundância de lagostim vermelho Procambarus clarkii c

Ausente Pouco

abundante Muito

abundante Capturas por 100 m2 de área de amostragem (% LM)b, d

≥ 67 33-67 < 33

Indivíduos com anomalias (%)b

< 2 2-5 > 5 aA pontuação depende da largura do rio, LM. b Só se consideraram os exemplares com um comprimento total superior a 5 cm, excepto para espécies de pequeno tamanho como Gambusia holbrooki, onde foram considerados todos os indivíduos capturados. c A concretização desta métrica está ainda em fase de estudo, pelo que não foram lhe foram atribuídos intervalos de valores. No entanto, verificou-se que em troços degradados as capturas de lagostim vermelho tendiam a ser superiores a 10-20 exemplares. d A pontuação depende da largura do rio, LM.

A bioavaliação da qualidade da água por métodos multivariados e da integridade

biótica por métodos multimétricos apresentam ambas um carácter preditivo e baseiam-se

numa concepção ecocêntrica da saúde geral do ecossistema fluvial e das comunidades que

nele habitam. Nesta perspectiva, garantir a saúde ecossistémica e as condições ecológicas o

mais próximo possível das originais significa garantir os processsos e funções que

caracterizam cada ecossistema em particular (tal como teorizado antes) e a sua capacidade de

resiliência a alterações humanas. Um ecossistema saudável e íntegro implica per se a

manutenção das espécies raras. Por outras palavras, se garantirmos a saúde geral do maior

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

número possível de ecossistemas, sem os isolarmos, então a própria resiliência destes garante

a sobrevivência das espécies raras, chave ou de elevado estatuto conservacionista. Trata-se de

uma aproximação convergente com o conceito actual de gestão integrada de bacias

hidrográficas (Werrity, 1996).

5. REGULARIZAÇÃO

5.1. Introdução

Em limnologia, utiliza-se a expressão rios regulados para designar os sistemas fluviais

afectados pela existência de estruturas hidráulicas transversais, provocando alterações maiores

ou menores, e de vários tipos, nos regimes de caudais, nos fluxos de materiais e organismos,

que caracterizavam e estruturavam o ecossistema fluvial original. Contudo, para avaliar estes

efeitos, é necessário primeiro conhecer o funcionamento ecológico dos sistemas fluviais.

A teoria do contínuo lótico criou uma estrutura teórica holística para o funcionamento

ecológico dos sistemas fluviais entre as cabeceiras e a foz, considerando o rio e a sua bacia

hidrográfica como uma unidade funcional, com as suas comunidades a variarem e a serem

substituídas gradual e longitudinalmente de acordo com gradientes, igualmente longitudinais,

de características físicas e químicas do sistema – Fig. 4.2.

Nas cabeceiras, com cursos de água, em geral, de pequena dimensão, rodeados por áreas

florestais, a vegetação rípícola reduzida e uma camada de perifiton cobre os substratos. O rio

depende em termos alimentares dos materiais fornecidos pelas zonas florestais envolventes,

pelo que as comunidades de invertebrados de fundo são constituídas por trituradores (que

trituram folhas e outros detritos grosseiros) e colectores (que colectam detritos mais finos,

arrastados pela corrente ou depositados no fundo), sendo os raspadores menos abundantes

(que raspam o perifiton e as superfícies das plantas e pedras). Os predadores (que predam

outros invertebrados) encontram-se também aí, mas em menor número. Os peixes típicos

destas zonas são as trutas e os escalos.

Nos cursos médios, o vale alarga e aumenta a contribuição da bacia hidrográfica em

materiais mais finos e nutrientes – Fig. 4.2. A corrente não é tão forte, o rio tem um curso

sinusoidal na planície, o leito apresenta muitas zonas de deposição de areias e de materiais

finos, pelo que a vegetação e o perifiton são abundantes nas margens e no leito. Assim, os

invertebrados são dominados por colectores e por raspadores, com trituradores e predadores

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

em menor proporção. Estes rios são habitados por ciprinídeos como a boga, o barbo e o

ruivaco.

Nos cursos de planície, já meandrizados e de grande desenvolvimento do corredor

fluvial, a massa de água é grande e pouco turbulenta, mas turva, com muitos materiais finos

em suspensão e nutrientes – Fig. 4.2. Como a profundidade aumenta, as plantas estão

circunscritas às zonas marginais e na massa de água domina o plâncton. O fundo está coberto

de depósitos finos e é dominado por colectores de depósito (que colectam os restos orgânicos

depositados nos fundos) e seus predadores. Os peixes típicos desta zona são a carpa comum, o

barbo, a enguia e a taínha.

O RC é um quadro teórico de trabalho, verificando-se variações regionais nos padrões

descritos. Por exemplo, muitas cabeceiras dos rios alentejanos estão inseridas em zonas não

florestadas, de fraco declive e pouca altitude, com substratos arenosos, apresentando

características mais próximas das da zona média de um rio. No entanto, as investigações dos

últimos vinte anos tem vindo a demonstrar a validade do RC em termos gerais.

5.2. Efeitos ecológicos da regularização

PETTS (1988) sistematizou as alterações ecológicas provocadas por uma barragem em

impactes de três ordens, sendo que os de ordem 1 determinam os de ordem 2 e, por sua vez,

estes determinam os impactes de ordem 3 – Fig. 4.7:

1. Impactes de ordem 1: efeito de barreira às deslocações biológicas de espécies

migradoras e residentes, quer para montante quer para jusante; alterações geralmente

profundas introduzidas no regime de caudais naturais; alterações do tipo

granulométrico, quantidade e locais de deposição da matéria sólida transportada pelo

rio; alterações na qualidade da água a jusante, sobretudo quando as descargas são

hipolimnéticas; variações qualitativas e quantitativas no plâncton, por arrastamento de

espécies a partir da albufeira e devido às alterações na composição química da água.

2. Impactes de ordem 2: alterações frequentes na morfologia do canal fluvial e na

granulometria e mosaico espacial de substratos e habitats do leito fluvial; alterações na

disposição, tipo e quantidade de perifiton, macrófitos e cobertura ripária.

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

3. Impactes de ordem 3: alterações na composição e biomassa de macroinvertebrados;

alterações na composição e biomassa piscícolas.

IMPACTES DE ORDEM 3

IMPACTES DE ORDEM 2

IMPACTES DE ORDEM 1

Figura 4.7 – Alterações ecológicas provocadas pela existência de uma albufeira, de acordo

com PETTS (1988).

A movimentação da ictiofauna migradora fica em geral impossibilitada porque as

passagens para peixes não existem, não funcionam ou são genericamente pouco eficazes para

espécies migradoras como a lampreia e a enguia. No Inverno não se verificam os caudais de

chamariz no estuário que despoletam o início das migrações, em conjunto com o adequado

estímulo térmico e hormonal. As alterações químicas da água são perturbadoras para muitas

espécies como os salmonídeos e os sáveis. Não tem sido usual serem tidas em conta nas

passagens para peixe as espécies residentes no rio durante todo o ano, as quais realizam

também importantes migrações reprodutoras (sobretudo barbo e boga). Algumas eclusas e

ascensores apresentam boas eficácias de passagem para algumas das espécies residentes, por

exemplo bogas, mas as passagens por bacias sucessivas instaladas em pequenas centrais

hidroeléctricas são vocacionadas essencialmente para salmonídeos e provavelmente

desadequadas para estas espécies.

As perturbações do regime de caudais incluem frequentemente grandes e bruscas

flutuações diárias que arrastam peixes e macroinvertebrados, colocam as posturas a seco e

143

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

diminuem a área molhada utilizável do leito (rio Tejo: FERREIRA e OLIVEIRA, 1996). A

probabilidade de ocorrência de grandes caudais é reduzida, acumulando-se materiais finos nos

leitos a jusante, daí resultando a invasão dos leitos por mata ripária e plantas (rio Sorraia:

FERREIRA e MOREIRA, 1990; rio Sado: MORAIS, 1996). Em albufeiras para fins

agrícolas, as derivações de caudal são frequentemente diminutas de Inverno e máximas de

Verão (rio Raia: VIEIRA et al., 1996). Todas estas perturbações resultam na diminuição geral

da riqueza e biodiversidade, no predomínio de espécies ubíquas e tolerantes, cuja densidade e

biomassa aumentam, tendendo a aumentar a proporção de colectores e de raspadores. As

alterações na qualidade da água levam frequentemente a importantes focos de eutrofização a

jusante, com crescimentos intensos de algas e de macrófitos, bem como ao desaparecimento e

substituição de muitas das espécies originalmente associadas ao sistema fluvial.Os postulados

mais importantes do RC são os seguintes: a cada troço de um rio afluem continuamente os

materiais proveniente dos troços a montante e do meio terrestre envolvente e as fontes

alimentares de cada troço são determinadas por este contínuo de transporte de materiais e de

movimentos de montante para jusante. As barragens alteram profundamente este fluxo

contínuo de água e materiais, quer na quantidade, quer na sua proporção.

O tipo, quantidade e proporção relativa das fontes alimentares determinam os grupos

tróficos de macroinvertebrados instalados no leito do rio (os quatro grupos alimentares

anteriormente descritos e na – Fig. 4.2 – e suas divisões) e por isso estes são rotineiramente

utilizados na avaliação da poluição e de alterações ecológicas do sistema. Por exemplo, se

uma pequena albufeira for interposta num sistema de montanha, o fornecimento a jusante de

folhas e restos vegetais pode ser diminuído, mas o perifiton encontrar condições para se

desenvolver e em consequência diminuiriam os trituradores e aumentariam os raspadores

(albufeiras de Poio e Balsemão: CORTES et al., 1997). Se a albufeira não libertar os caudais

ambientais e diminuir drasticamente o fluxo a jusante, podem diminuir os colectores

filtradores (que colectam os restos orgânicos arrastados pela corrente) e aumentam os

colectores de depósito (albufeiras de Furadouro e Gameiro: VIEIRA et al., 1996). Regimes

irregulares de caudais a jusante resultam em geral em diminuição do número de espécies,

aumento da biomassa e dominância de espécies generalistas e ubíquas (albufeira de Belver:

FERREIRA e OLIVEIRA, 1996).

Do que foi exposto resultam duas observações importantes:

144

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

1. O tamanho, local de descarga e regime de descarga da albufeira são determinantes nos

efeitos a jusante. Um pequeno açude com uma capacidade de retenção muito baixa,

apresenta alterações potencialmente menores no sistema fluvial e pode até ser utilizado

localmente para promover os habitats mais remansados. Uma grande albufeira, com

descargas irregulares, altera profundamente o ecossistema fluvial a jusante. Se a água

descarregada for hipolimnética, serão introduzidas no rio a jusante, de repente, durante o

Verão, águas 10 a 15 ºC mais frias, mais condutivas, mais ácidas e com muito menos

oxigénio dissolvido do que as aí existentes.

2. A posição da albufeira na hierarquia do sistema fluvial é igualmente determinante nos

efeitos sobre os ecossistemas – Fig. 4.8. Uma albufeira instalada nas cabeceiras causará a

jusante uma diminuição acentuada do transporte de materiais orgânicos grosseiros

enquanto uma albufeira instalada na planície quase não altera o tipo de materiais

orgânicos transportados e favorece o estabelecimento de plantas ao desenvolver a linha de

margem, que será pouco declivosa. Uma albufeira situada no curso médio aumenta a

biomassa planctónica, mas diminui a diversidade biótica e a heterogeneidade ambiental do

sistema fluvial.

A mitigação dos efeitos da regularização é assim um tema complexo e de respostas

múltiplas, porque estes efeitos processam-se a médio e longo prazo e são frequentemente

imbricados com outras perturbações com origem em actividades humanas (poluição orgânica,

extracção de inertes, sobrepesca de migradores, entre outras). Assim, entre as acções

mitigadoras de âmbito geral a desenvolver, incluir-se-iam:

1. a implementação de regimes de caudais de manutenção ecológica (de variação mensal e

diária) que mimetizem os regimes naturais originais o mais aproximadamente possível;

2. a instalação de passagens para peixes funcionais e bem adaptadas às nossas espécies,

de acordo com cada sistema fluvial;

3. a implementação de descargas epilimnéticas, cuja qualidade da água se aproxima mais

da do rio receptor;

4. a monitorização biológica dos rios regulados e o desenvolvimento de programas de

medidas adaptadas a cada grupo biológico e a cada sistema fluvial.

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

Figura 4.8 – Mudanças relativas no sistema fluvial entre as cabeceiras e a foz de acordo com o RC (linha a cheio) e alterações produzidas pela barragem nas cabeceiras, no curso médio e no curso

final (linhas a tracejado), postuladas por WARD e STANFORD (1983) para os seguintes parâmetros: variação térmica annual, relação CPOM/FPOM, biomassa de plâncton, plantas

aquáticas, diversidade biológica e heterogeneidade ambiental (adaptada de WARD e STANFORD, 1983).

146

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ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

5.3. Passagens para peixes

Ao representarem uma barreira à livre movimentação das espécies e materiais que

naturalmente se deslocam ou são deslocados ao longo do sistema fluvial, entre as cabeceiras e

a foz, as barragens constituem importantes factores de alteração, e frequentemente de

degradação, dos ecossistemas e espécies. Foi o desaparecimento em muitos casos, de espécies

piscícolas de grande interesse económico (por exemplo a lampreia, o esturjão, o salmão e o

sável), que suscitou o interesse pela construção de dispositivos de transposição para peixes,

em barragens. Contudo, a construção de passagens para peixes é um fenómeno bastante

recente em Portugal, sendo a mais antiga uma passagem tipo Denil instalada na barragem de

Belver aquando da sua construção em 1947, mais tarde destruída aquando da instalação da

eclusa agora existente.

Existem presentemente 10 passagens para peixes (PPP) instaladas nos cursos de água

principais do país, e pertencentes a três tipos: um ascensor em Touvedo (Lima), passagens por

bacias sucessivas em Penide (Cávado), Coimbra (Mondego) e Grela (Vouga) e eclusas de

Borland em Crestuma-Lever, Carrapatelo, Régua, Valeira, Pocinho (Douro) e Belver (Tejo).

Contudo, em Portugal, o conhecimento incipiente em relação à ecologia e movimentos de

muitas espécies e sobretudo à sua relação eco-hidráulica com o sistema de passagem

escolhido, deu origem à instalação de dispositivos de eficácia desconhecida ou

comprovadamente ineficazes.

Embora existam algumas referências pontuais relativas à ineficácia das eclusas para

peixes, o número de trabalhos em que se procura determinar as causas eco-hidráulicas dessa

mesma ineficácia é muito pequeno. Já nos anos 90, as eclusas de Crestuma-Lever e Belver,

respectivamente nos rios Douro e Tejo, foram objecto de estudo, tendo-se concluído pela sua

baixa eficácia, sobretudo da primeira. Durante 1998-99, foi avaliada a utilização do ascensor

de Touvedo, tendo-se verificado que o número de efectivos que passaram o ascensor

(maioritariamente ciprinídeos), é muito baixo. Entre as razões possíveis para este facto,

contam-se as reduzidas velocidades encontradas no canal colector do ascensor, as variações

bruscas diárias impressas pelo regime de descargas do Touvedo (desvirtuando a sincronia dos

ciclos biológicos naturais) e a existência de leitos de desova activos a montante de Ponte da

Barca, que as espécies podem também utilizar.

147

Page 29: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

É fundamental a implementação de dispositivos de transposição para peixes no maior

número possível de barragens, obrigando-se a entidade gestora a assegurar a sua eficácia eco-

hidráulica e a sua manutenção adequada em termos hidráulicos e biológicos, garantindo

condições de limpeza e os caudais de chamariz certos, nos períodos certos (estes aspectos não

se encontram presentemente regulamentados).

Em relação aos efeitos ecológicos dos pequenos aproveitamentos hidroeléctricos (PAH),

e bem assim de outras obras transversais fluviais, tem sido igualmente citado o efeito barreira

e suas consequências, como sejam a compartimentação de diferentes classes de idade da

mesma espécie a montante e a jusante, desequilíbrios na taxa de recrutamento e na estrutura

etária, e o desaparecimento de certas espécies a montante.

Ao todo, foram realizados estudos em 47 sistemas fluviais afectados por PAH ou outras

pequenas estruturas hidráulicas transversais. No total foram capturadas 10 espécies, sendo

geralmente dominantes o escalo, barbo, boga, ruivaco e truta, ou seja, trata-se de segmentos

fluviais em geral de carácter ciprinícola ou de transição, raramente salmonícolas. Verificou-se

a existência de diferenças estatisticamente significativas nas populações de trutas a montante

e a jusante, quando considerados os PAH sem PPP; e nas populações de enguia pertencentes

aos PAH na sua totalidade, para aqueles que possuíam e aos que não possuíam PPP e para

aqueles que possuíam PPP não eficientes. Nos PAH com PPP consideradas eficientes não se

verificou a existência de diferenças significativas montante-jusante para nenhuma das

espécies. A presença de PAH sem PPP eficientes parece estar relacionada com a existência de

variações intra-específicas nas classes de idade e com uma tendência para a diminuição geral

da diversidade comunitária e penetração do sistema fluvial por espécies exóticas, pelo que é

importante um esforço acrrescido de regulamentação e fiscalização do estabelecimento de

PPP e garantia da sua manutenção e bom funcionamento.

Existem presentemente 24 PAH equipados com passagens para peixes (PPP), todos com

bacias sucessivas. O Quadro 4.4. indica as características eco-hidráulicas recomendadas

aquando da elaboração do projecto de uma PPP e para avaliação da adeuqabilidade de PPP já

em funcionamento. Repare-se que a literatura da especialidade aponta para valores

recomendados de espécies de salmonídeos e de clupeídeos (sáveis) mas são desconhecidos

parâmetros hidráulicos adequados às espécies mais frequentes nestes sistemas fluviais, e que

igualmente necessitam de migrar para realizar as suas desovas.

148

Page 30: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

Quadro 4.4. Características hidráulicas recomendadas para passagens para peixes por bacias sucessivas de acordo com Larinier (1992). (1) salmão e truta marisca (2) truta comum (3) sável (4)

salmonídeos de rio em geral

CARACTERÍSTICAS HIDRÁULICAS UNIDADES VALORES RECOMENDADOS Declive do canal m/m 0,07-0,2

Desnível entre bacias m 0,30-0,40 (1) ± 0,30 (2)

0,15-0,30 (3,4) Comprimento das bacias m 2,0-3,0 (1)

1,2-5,0 (2) 1,5-4,5 (3,4)

Profundidade das bacias m Mínimo 1 (1) Mínimo 0,60 (2)

Altura média da água m 1,0-1,6 Energia dissipada/unidade de volume W/m3 ± 200 (1)

± 150 (2) Caudal m3/s 1 a 5% do caudal do curso

de água Velocidade média m/s Não inferior a 0,1 Área dos orifícios m2 0,10-0,15 (1)

0,05-0,10 (2,4) Altura dos orifícios m 0,15-0,30

Largura dos orifícios m 0,15-0,30 Caudal dos orifícios m3/s ± 25% do caudal escoado

na passagem Carga sobre o descarregador m 0,42-0,75

Largura do descarregador m Não inferior a 0,15 0,30-0,40 (1)

0,20 (2,4) 0,40-0,50 (3)

Com base nas características hidráulicas e de actractividade das PPP, na presença de

obstruções a jusante e no estado de conservação, assoreamento e colmatação das suas bacias,

20% das PPP actuais foram classificadas como apresentando boas condições de passagem,

25% condições aceitáveis, enquanto as restantes são inoperacionais ou apresentam condições

de funcionamento inaceitáveis (Figura 4.9).

5.4. Implementação de regimes de caudais ecológicos

Os métodos de determinação do caudal ecológico estão divididos em três grandes

categorias: métodos baseados em registos históricos de caudais, na relação entre parâmetros

hidráulicos e o caudal e nas relações entre o habitat e o caudal (Jowett, 1997).

149

Page 31: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

Figura 4.9. Localização dos PAH avaliados quanto às condições de funcionamento e ecohidráulicas

(Ferreira et al., 2000)

150

Page 32: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

i) Métodos baseados em registos de caudais

Estes métodos, como o nome indica, baseiam-se em registos históricos de caudais para

definir o regime de caudais ecológicos a manter no curso de água (Gordon et al., 1992). São

específicos para as espécies e locais para os quais foram desenvolvidos

(Orth & Leonard, 1990). Como exemplos temos os métodos de Tennant ou de Montana, Nova

Inglaterra ou do Caudal Aquático Básico (Aquatic Base Flow, ABF), Northern Great Plains

Resource Program (NGPRP), Hope e 7Q10 (Alves, 1993). Recentemente, surgiram alguns

métodos designados por eco-hidrológicos, nos quais se assume que as comunidades

biológicas estão estruturadas em função do regime de caudais do seu passado histórico

próximo pelo que o regime de caudais ecológicos é calculado como o caudal mínimo histórico

de dada secção fluvial.

ii) Métodos baseados na relação entre parâmetros hidráulicos e o caudal

Os métodos desta categoria relacionam os parâmetros hidráulicos associados à

geometria do canal com o caudal. A relação entre o habitat e o caudal obtém-se com base no

estabelecimento de secções transversais onde se determina a largura do canal, profundidades,

velocidades e perímetro molhado. A relação obtida geralmente não tem em conta as

preferências de habitat das espécies ao longo do seu ciclo de vida (Alves, 1993; Jowett,

1997). Entre os métodos pertencentes a esta categoria contam-se o Método do Colorado ou

da Região 2 do U.S.F.W.S., o Método de Idaho, o Método da Região 4 do U.S.F.W.S. e o

Método de Perímetro Molhado (Alves, 1993).

iii) Métodos baseados na relação entre o habitat e o caudal

Os métodos baseados na relação entre o habitat e o caudal utilizam curvas de preferência de

habitat de uma espécie, numa determinada fase do seu ciclo de vida, para estimar a variação

de habitat disponível em função do caudal. De acordo com alguns autores, a base biológica

destes métodos faz deles os mais defensáveis e indicados para a determinação de caudais

ecológicos apesar de outros autores contestarem algumas das premissas biológicas mais

utilizadas pelo método (Jowett, 1997). Como exemplos temos os métodos WRRI Cover,

Washington e Califórnia (também conhecidos por Métodos da Área Preferida), Oregon

(também chamado de Método da Largura Utilizável) e a Metodologia Incremental (Alves,

1993). De entre estes métodos, a Metodologia Incremental é o mais conhecido e nos Estados

151

Page 33: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

Unidos é a metodologia mais comum, sendo reconhecida em 38 Estados e a mais usada em 24

destes (Jowett, 1997).

A determinação de caudais ecológicosem Portugal Continental tem-se baseado no

método dos registos de caudais, assumindo-se que uma dada percentagem do módulo anual

garante o pretendido grau de integridade ecológica. A partir de legislação em vigor desde

1989, os caudais são estabelecidos do seguinte modo:

a) Pequenos aproveitamentos mini-hídricos e outros a norte do Tejo: valor não

inferior a 2,5 a 5% do caudal modular do curso de água, a amnter todo o ano,

sempre que o caudal instantâneo que ocorra em regime natural o permita;

b) Pequenos aproveitamentos hidroagrícolas e outros a sul do Tejo: valor igual ou

superior a 5% do módulo, em ano médio, sempre e só se esse valor for inferior ou

igual ao caudal médio mensal, caso contrário deverá manter-se o caudal médio

desse mês, podendo eventualmente ser um caudal naturalmente nulo.

Para grandes aproveitamento hidráulicos entretanto efectuados ou a efectuar – Enxoé,

Alqueva, Alto Lindoso e Touvedo, têm sido ensaiados e definidos outros métodos

alternativos, caso a caso.

Como se pode constatar, o caudal ecológico praticado é constante, ou seja, não

representa um regime mensal, e não assenta em métodos eco-hidráulicos ou eco-hidrológicos,

pelo que se desconhece se é adequado para a sobrevivência e integridade das espécies

piscícolas. Finalmente, não existe a obrigatoriedade do usufrutuário da obra hidráulica de

demonstrar a sua manutenção, por exemplo, através de um registo constante do caudal

praticado.

6. OBRAS DE ENGENHARIA FLUVIAL E SUAS CONSEQUÊNCIAS ECOLÓGICAS

As obras de engenharia fluvial de maior expressão, e que envolvem mais modificações

directas, incluem alargamento do leito do rio, linearização, construção de aterros e de diques,

protecção de margens, construção de canais, dragagens do leito fluvial, limpeza de vegetação

aquática e da galeria ribeirinha e remoção de obstáculos. Os rios são assim progressivamente

realinhados, estreitados, comprimidos e alterados, com consequências degradadoras para as

suas comunidades piscícolas.

As obras de engenharia fluvial provocam alterações em geral drásticas da morfologia

fluvial, procedendo-se muitas vezes à utilização de maquinaria pesada para movimentações

152

Page 34: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

do solo e alterações da secção fluvial e do perfil do leito. Quando se verificam estas

alterações, o curso de água tende a reagir, procedendo a ajustamentos de maior ou menor

amplitude, até atingir de novo um equilíbrio estável do seu perfil, ou eventualmente entrar em

ruptura.

Por exemplo, a linearização leva em geral a um aumento do declive do fundo devido

ao encurtamento do segmento fluvial, tendo como consequência o incremento da capacidade

de transporte local e do caudal sólido do sistema, podendo desenvolver-se uma frente de

erosão que se desloca para montante. Se ocorrer um aumento de caudal sólido, as zonas de

jusante são alimentadas por um excesso de sedimentos, podendo não ter capacidade de

transporte suficiente, verificando-se fenómenos de deposição generalizada, aumento das cotas

de fundo e dos níveis de cheia. Por sua vez, a erosão a a montante provoca o o rebaixamento

dos níveis de base dos afluentes.

Quanto ao alargamento e aprofundamento de um curso de água, o aumento da secção

de vazão provoca uma redução significativa da velocidade de escoamento e a perda de

capacidade de transporte do sistema, ocorendo deposições de sedimentos com a formação de

estruituras geomórficas associadas, como ilhas ou mouchões, ou padrões geomorfológicos do

tipo entrelaçado, em período de estiagem.

As dragagens e extracções de ineertes podem provocar erosões no leito e nas margens,

se a capacidade de transporte do curso de água não excede a quantidade dos sedimentos

retirados. Quando o material extraído é grosseiro, o equilíbrio da camada superficial do leito

do rio é geralmente rompido, igualmente levando à erosão do leito e à escavação das

fundações de estruturas como pontes e viadutos.

A galeria ripícola e a vegetação aquática são um elemento estrutural determinante da

paisagem e uma componente essencial dos ecossistemas fluviais. Muito mais do que uma

simples componente florística, a mata ripária representa a interface activa entre os

ecossistemas terrestres e aquáticos e desempenha funções fundamentais: fornece habitats

únicos para o biota, fomenta a diversidade e a produtividade biológicas, contribui com matéria

alimentar para o sistema aquático, retem e inactiva os poluentes e nutrientes oriundos de

fontes envolventes, influencia o movimento e migrações de aves e mamíferos, actua como

bioindicador de alterações climáticas e cria zonas de mais valia paisagística (Petts, 1990;

Cortes & Ferreira, 1998).

153

Page 35: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

Entre as características mais importantes da galeria ripícola, incluem-se: a sua

contribuição alimentar para o metabolismo do sistema aquático através da queda da folhada

(Cortes et al., 1995); as suas funções estruturantes de habitats aquáticos através das raízes e

troncos dentro de água e do ensombramento do copado (Gregory, 1992); o seu papel de

filtração de poluentes e nutrientes oriundos do meio terrestre (Pinay et al., 1990); e o seu

papel de regulação das ligações químicas entre a água superficial e o nível freático (Pinay &

Decamps, 1988).

Presentemente, as principais interferências antropogénicas nas galerias ripícolas

portuguesas são as alterações dos perfis transversais e longitudinais dos sistemas fluviais que

decorrem de actividades de reabilitação e uso de margens, incluindo corte e queima de

vegetação e dragagens do leito fluvial. Estas actividades são desenvolvidas tendo por

objectivos a extracção de inertes, a protecção contra cheias, a obtenção de áreas de uso

urbano, agrícola ou animal e ainda de uma forma geral a promoção de locais de lazer e pesca.

De uma forma geral, estas actividades afectam profundamente a conectividade entre os

corredores fluviais e os ecossistemas terrestres envolventes (Piégay & Maridet, 1994)

Para além disso, a regularização fluvial não favorece a existência de ‘caudais de

limpeza’ e consequente arrastamento dos propágulos vegetais, comprometendo o pioneirismo

e a meta-estabilidade da galeria ripícola e favorecendo comportamentos vegetais invasores,

nomeadamente de espécies exóticas (Johnson, 1994), enquanto a abstracção de água para rega

e outros usos humanos diminuem a conexão do sistema fluvial superficial com os níveis

freáticos, com consequente quebra da conectividade vertical (Kondolff, 1995).

Dado que os cursos de água constituem um contínuo fluvial entre as cabeceiras e afoz

em constante ligação com os sistemas laterais e freáticos, os efeitos das obras de engenharia

fluvial podem repercurtir-se em cadeia, através da redução, eliminação ou promoção de

espécies ou grupos de espécies. Pode ainda acontecer que dadas espécies vejam certas partes

do seu ciclo de vida impedido, por exemplo, pela falta de leitos de desova ou por

desaparecimento de abrigos para os juvenis.

As obras de engenharia fluvial podem afectar as comunidades biológicas de forma

directa (corte, destruição, fuga) ou indirecta (por deposição ou erosão excessivas ou

inadequadas de materiais no leito do rio e outras variações associadas ao desajustamento

geomorfológico do sistema). As dragagens, aprofundamento do leito e criação de diques são

as obras qua mais afectam a vegetação aquática e mata ribeirinha, com importantes

154

Page 36: Gestão de Sistemas Fluviais

ESTUDO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO DAS PESCAS CONTINENTAIS PAMAF MEDIDA 4 – IED, ACÇÃO 4.4: ESTUDOS ESTRATÉGICOS

consequências para as comunidades faunísticas que lhes estão associadas, nomeadamente de

aves, mamíferos e peixes. As alterações e intervenções no leito reduzem drasticamente a

fauna de invertebrados que o habita e que constitui a fonte alimentar de muitas espécies de

peixes.

Também as alterações a nível do transporte sólido, deposição de sedimentos, e

aumento de temperatura devido a um aumento da exposição da superfícies aquáticas,

modificam profundamente os habitats aquáticos existentes e alteram as comunidades

piscícolas que sobrevivem, e que sofrem um lento ajustamento paralelo ao da geomorfologia

do canal, em função da capacidade de recolonização dos habitats e troço fluvial afectados.

A re-estabilidade do sistema fluvial, depois da intervenção, depende de vários

factores, incluindo (i) características do próprio sistema, como o caudal, a área drenada e a

sinuosidade, (ii) factores da intervenção, como o comprimento do troço alterado, o declive e o

secção resultantes e medidas mitigadoras efectuadas, e (iii) factores de reacção, como a

capacidade de recuperação da vegetação ribeirinha.

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