GEOPOLÍTICA NA REDE POLÍTICA – O LUGAR COMO RECURSO … · 2012-09-24 · A geopolítica se...

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1 GEOPOLÍTICA NA REDE POLÍTICA – O LUGAR COMO RECURSO NOS ESPAÇOS DO AGRONEGÓCIO Luciano Bomfim do Nascimento Universidade Federal Fluminense [email protected] Resumo O objetivo deste trabalho é desenvolver um ensaio teórico que aborda o lugar como um recurso de poder. Essa discussão é feita através da análise do espaço como um ente inerentemente instável; instabilidade espacial como um a priori na construção/reorganização de redes políticas, recompondo os espaços do agronegócio. A partir disso, a análise do território agroindustrial, através dessas redes, permite identificar uma gama de estratégias usadas pelos atores do agronegócio, possibilitando-nos compreender melhor o processo de (re) produção desses espaços. Palavras chave: Lugar. Estratégia. Recurso. Introdução O objetivo deste trabalho é desenvolver um ensaio teórico que aborda o lugar como um recurso de poder, aprofundando a discussão iniciada por nós Nascimento (2010), que trata da análise da geopolítica na rede política. Esse aprofundamento será feito através da análise do espaço como um ente inerentemente instável; instabilidade espacial como um a priori na construção/reorganização, respectivamente, de redes políticas e/ou de resistências. Estas últimas, redes de resistências, foge ao objetivo deste trabalho. Sendo analisada em um outro momento. Tais redes foram analisadas por nós (NASCIMENTO, 2010) possuindo um caráter dialético. O espaço agroindustrial sendo reflexo da rede política, isto é, do seu conteúdo e forma. A rede política sendo vista neste trabalho como uma metáfora espacial/representacional (NASCIMENTO, no prelo) nos possibilitando compreender melhor o processo de (re) produção dos espaços agroindustriais, as tensões dai decorrentes que ganham forma em movimentos de contra espaço, assim como as estratégias usadas por esses movimentos e pelos atores responsáveis pela produção desses espaços. Redes políticas e complexos agroindustriais A singularidade e especificidade dos lugares refletem a produção do espaço que melhor corresponda à acumulação capitalista, sendo produzido de forma diferenciado e

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GEOPOLÍTICA NA REDE POLÍTICA – O LUGAR COMO RECURSO NOS ESPAÇOS DO AGRONEGÓCIO

Luciano Bomfim do Nascimento Universidade Federal Fluminense

[email protected]

Resumo O objetivo deste trabalho é desenvolver um ensaio teórico que aborda o lugar como um recurso de poder. Essa discussão é feita através da análise do espaço como um ente inerentemente instável; instabilidade espacial como um a priori na construção/reorganização de redes políticas, recompondo os espaços do agronegócio. A partir disso, a análise do território agroindustrial, através dessas redes, permite identificar uma gama de estratégias usadas pelos atores do agronegócio, possibilitando-nos compreender melhor o processo de (re) produção desses espaços. Palavras chave: Lugar. Estratégia. Recurso. Introdução O objetivo deste trabalho é desenvolver um ensaio teórico que aborda o lugar como um

recurso de poder, aprofundando a discussão iniciada por nós Nascimento (2010), que

trata da análise da geopolítica na rede política. Esse aprofundamento será feito através

da análise do espaço como um ente inerentemente instável; instabilidade espacial como

um a priori na construção/reorganização, respectivamente, de redes políticas e/ou de

resistências. Estas últimas, redes de resistências, foge ao objetivo deste trabalho. Sendo

analisada em um outro momento.

Tais redes foram analisadas por nós (NASCIMENTO, 2010) possuindo um caráter

dialético. O espaço agroindustrial sendo reflexo da rede política, isto é, do seu conteúdo e

forma. A rede política sendo vista neste trabalho como uma metáfora

espacial/representacional (NASCIMENTO, no prelo) nos possibilitando compreender

melhor o processo de (re) produção dos espaços agroindustriais, as tensões dai decorrentes

que ganham forma em movimentos de contra espaço, assim como as estratégias usadas por

esses movimentos e pelos atores responsáveis pela produção desses espaços.

Redes políticas e complexos agroindustriais A singularidade e especificidade dos lugares refletem a produção do espaço que melhor

corresponda à acumulação capitalista, sendo produzido de forma diferenciado e

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estratificado e incorporado a uma dinâmica de acumulação maior. O espaço no atual

estágio do capitalismo é produzido para que possibilite essa acumulação. Há um encaixe

quase perfeito entre desenvolvimento do sistema capitalista e a produção do seu

correlacionado espaço que se dá, dentre outras coisas, através dessa diferenciação

espacial, revelando a importância do espaço e da Geografia Política na atual fase do

desenvolvimento capitalista (SOJA, 1993 e JONHSTON, 1994).

Se o espaço é produzido de forma diferenciada e estratificada, sua produção se dá

justamente pelas decisões dos atores dessas mais diversas escalas. A diferenciação se dá

pelas práticas espaciais diferenciadas dos atores territorializados (assunto que será

desenvolvido num outro trabalho). Se essas decisões forem tomadas em conjunto

estando sendo negociada e compartilhada, a articulação dessas escalas e a produção

desse espaço podem estar se dando através de redes políticas. Entender a organização

desses espaços é compreender essas decisões e redes políticas/de interesses

(NASCIMENTO, 2010).

As redes políticas se caracterizam como um conjunto de relacionamentos relativamente

estáveis, de natureza não-hierárquica e interdependentes, conectando uma variedade de

atores que compartilham interesses relativos à política e que trocam recursos com o

objetivo de atingir esses interesses, reconhecendo que a cooperação é a melhor maneira

de atingir objetivos comum (BÖRZEL, 2008).

Tais redes possuem a vantagem de facilitar uma interação rápida e fluente entre estas e

os partidos, atores econômicos e atores sociais. Ademais tem o mérito de estar

circunscrito a determinada matéria e reunir os organismos interessados em chegar a

resultados concretos, com a consequência de que as negociações costumam ser ágeis e

de duração limitada.

As redes políticas se diferenciam tanto do corporativismo quanto do mercado.

Diversamente dos pactos corporativistas ou das negociações com grupos de pressão,

não se trata de uma concertação de interesses contrapostos, convocada, avalizada e

implementada pela hierarquia de uma instância estatal. Diversamente do mercado, as

redes não se apoiam no equilíbrio espontâneo de alguma “mão invisível”, mas apontam

deliberadamente para um resultado intencional de interesses compartilhado por todos

(LECHNER, 1996).

No presente trabalhos usamos o conceito de rede política como uma aliança de atores

políticos em que são geridos, negociados, acertados, compartilhados e veiculados fluxos

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de interesses, ordens, comandos, regulamentos e decisões políticas, assim como, uma

estratégia de coordenação e administração desses fluxos capaz de formar uma arena

política e lhe conferir visibilidade, num processo ativador e de recomposição do

território (LIMA, 2005). Desse modo, os atores estão conformados em redes políticas

que sinalizam fluxos imateriais constitutivos da dinâmica do território. Logo, a rede

política no território agroindustrial tem um importante papel na construção de espaços,

sendo por eles definida e transformada.

Como redes políticas são passíveis de uma análise crítica, mais que um instrumento,

elas funcionam como viés na investigação do objeto de estudo em que as relações de

poder se constituem como determinante da (re) produção do território. Analisando as

redes políticas, podemos identificar quais são os interesses, ordens etc. que estão sendo

negociados e veiculados, porque através delas podemos observam-se interesses

escamoteados no processo de construção do território. Dessa forma, a rede política é um

instrumento de identificação dos interesses que estão por trás das redes de atividades

produtivas de determinados território.

No trabalho anterior (NASCIMENTO, ibidem), chamamos a atenção para o lugar como

um recurso de poder referindo-se aos atores e o seu papel no ordenamento territorial dos

complexos agroindustriais que se dá através de redes políticas. Estas foram vistas por

nós como um processo dialético em que a rede revela interesses e é por esses interesses

revelada; e vinculadas intrinsecamente a categoria de interesses1. No que chamamos de

rede política\de interesses no intuito de melhor compreender o modo como atualmente

os complexos vem sendo espacialmente (re) produzidos cujas atividades produtivas

formam a materialização desses interesses (NASCIMENTO, 2010 b). Atividades que se

aproximam muito dos territórios produtivos da Terceira Itália e, em parte, do

capitalismo cognitivo de que fala Negri (1998) apud Moniéf & Silva, (2003) e Husson,

(2011). Lugar como recurso significando uma estratégia para efetivação de uma rede de

interesses. Sendo tais atividades a materialização dessa rede.

O complexo agroindustrial é um dos meios de produção e estruturação dos espaços

agrários, dentre tantos outros. Segundo Marafon (1988), os fluxos de compra e venda

que os setores realizam entre si determinam a “aliança” estratégica. Nestes arranjos

políticos, as atividades são fortemente interdependentes se encontrando estruturadas em

redes tecnoprodutiva e político-organizacional. Tais estruturas de atividades propiciam

a formação de redes políticas (PAULILLO, 2000).

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Nos complexos agroindustriais, a proximidade, as relações de compra e venda, a

interdependência entre os atores e o seu poder de dominação são os principais aspectos

que determinam a dinâmica das forças sociais envolvidas. Essas relações de poder

podem apresentar uma conformação espacial definida na medida em que se dão as

constantes trocas de bens e serviços e a comutação no mercado de trabalho delineando a

conformação de poder (ou seja, as redes políticas) e caracterizando a nova localização.

Dessa forma, é o mecanismo de governança localizado que determina os arranjos

institucionais, no qual os aspectos determinantes são a articulação dos interesses, a

busca e a distribuição de recursos de poder, formando uma estrutura de poder localizada

(redes políticas) (PAULILLO, ibidem).

Essas redes se formam primeiramente no local, usando dos objetos presente nesse

espaço, assim como do seu sistema de normas e leis para a implementação do seu

ordenamento territorial. Como as relações de poder podem apresentar uma configuração

territorial, para a identificação da rede política /de interesses se faz necessário

identificar as atividades produtivas, os fixos criados em conjunto, etc. O ordenamento

territorial lança pista na identificação da rede.

Essa interdependência articula diversos atores/segmentos envolvidos diretamente e

indiretamente com a produção, como produtores, empresas de sementes, de maquinas e

peças agrícolas, instituições financeiras, laboratórios etc. articulando interesses de

diversos atores. Tal interdependência ganha corpo na forma de atividades desses

complexos através de estratégias de parcerias e alianças desenvolvendo atividades de

pesquisa e novas tecnologias, produção e comercialização; atividade de assistência

técnica, análise de produtos, compra e venda de produtos e mercadorias. Essas

atividades são a materialização desses diversos interesses. Elas representam os acordos

que foram negociados e acordados e que agora estão sendo compartilhados.

Isso significa que essas atividades são minuciosamente planejadas, assim como a sua

coordenação e regulação. Como por exemplo, num espaço de complexo agroindustrial,

de uma forma geral, a criação de produtos e serviços do segmento de insumos com as

empresas de assistência técnica para os produtores de sementes e de grãos e como eles

fazem para regular e coordenar isso, que pode ser por meio de contratos (que nesse caso

já encerra uma relação de poder), pela técnica; estratégias específicas; ou até mesmo por

meio de outras atividades produtivas. Da mesma forma é para a criação de produtos

e/ou serviços: dos laboratórios de análise com as empresas de sementes para os

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produtores de grãos e sementes; das empresas de peças e máquinas agrícolas na

assistência técnica aos produtores; das empresas de adubos com os centros tecnológicos

nos testes de seus materiais; das empresas de acessorias com os bancos; das empresas

que dão assistência técnica às empresas de máquinas e peças agrícolas; dando-nos idéia

das múltiplas relações que possam existir.

É preciso identificas os serviços e produtos específicos nessas relações acima, assim

como os objetos que tenham sido construídos conjuntamente, como silos, armazéns etc.,

as infra-estruturas de produção que podem ser pontes, estradas, hidrelétricas, etc.;

pesquisa e informação, como sementes melhoradas, assistência técnica, análise de

produtos e materiais, etc.; a frequência de compra e venda de produtos e serviços afim

de observar se há regularidades através da/perpassando as empresas; leis que beneficiem

determinadas atividades e/ou atores específicos do agronegócio e/ou apenas alguns

atores. Nessa identificação devem-se observar quais os segmentos, atividades

específicas e empresas beneficiadas. Através dessa identificação se torna possível

revelar a rede de interesses. São estratégias e acordos que precisam ser investigadas para

entender como através dessa criação conjunta essas relações de poder (re) produzem o

território.

Instabilidade espacial e geopolítica na rede política O lugar como um recurso significa uma estratégia (estando os atores presentes/ou

usando diversas escalas) lançada mão na realização dos interesses dos atores

responsáveis pela (re) produção desses espaços agroindustriais. Recurso e estratégia que

vem, dessa forma, repercutir no ordenamento do território.

Desse modo, os atores estão inseridos em diversas escalas para otimizar seus lucros.

Neste sentido, o jogo de escala é um importante meio para entendermos as ações dos

atores e o que os movem em torno de uma geopolítica. O que aqui chamo de geopolítica

na rede política é justamente uma necessidade intrinsecamente espacial. O que seria

algo inerente do sistema capitalista se torna por isso inerente ao próprio espaço. Isto é,

no processo de compartilhamento do que foi negociado e acertado (processo que

caracteriza o conceito de rede política, segundo Jordan & Shubert,1992, Van Waarden

1992, Lechner, 1996 e Lima, 2005) qualquer ator, em função de mudanças internas ou

externas, corre o risco de sair dessa rede política e/ou mudar a sua posição em busca de

lugares que dêem maiores possibilidades de lucro. Ainda mais quando tais mudanças

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lhe conferem outros recursos de poder, alterando sua posição nessa rede e, desse modo,

o exercício do poder.

A geopolítica se revela, portanto, quando os atores usam dos lugares para fazer pressão

na rede. O que é algo perfeitamente constante, porque o espaço é dinâmico e a rede

política é o reflexo do território, que o transforma também. Os lugares são como um

“recurso” de poder que conferem aos atores.

O espaço é empiricamente dinâmico. É o lugar do encontro de trajetórias diferentes, da

coabitação e da coetaneidade. Um espaço do devir. Em que as identidades estão

constituídas, mas também estão em permanente formação. As conexões e ligações estão

em constante refazer. O espaço é instável porque ele é esse lugar dos encontros.

Portanto, ele é um espaço aberto. Nunca fechado (MASSEY, 2009). E é esse devir, essa

abertura, pano de fundo à variação dos interesses divergentes serem arrumados na

geopolítica da rede política e em movimentos de contra-espaço que chamamos de rede

política de resistência, esta última analisada em outro trabalho (NASCIMENTO, no

prelo).

Desse modo, essa instabilidade espacial provoca instabilidade na geopolítica da rede

política. Como a rede política é 'reflexo’ do espaço, dessa instabilidade, ela está em

permanente reorganização. É o que abordamos quando analisamos que a rede política é

dialética (NASCIMENTO, 2009). Ela revela interesses e é por esses interesses revelada.

Organiza o território e é por ele organizada.

Nessas mudanças (instabilidades indicadas), as condições mudam e os interesses,

recursos dos atores mudam também, refletindo no seu poder, papel e ambições na rede

política. Além do mais, os recursos, segundo Raffestin (1993), não são ‘naturais’, são

‘construídos’ de acordo com os anseios (nível de conhecimento e técnica) da sociedade

e, por tanto, ele muda com o tempo, sendo uma produção histórico-social. A rede

política no tempo é o conjunto de várias daquelas mudanças/instabilidades refletindo e

sendo refletida pelas do espaço.

E com o tempo (e o tempo não é estático), a configuração naquele momento daquela

rede política não é o somatório e nem a multiplicação desses momentos e sim a

evolução destes. Isto porque, as multiplicações e somatórios desses eventos/momentos

pressupõem uma previsão dos acontecimentos. Eles nos dão uma antecipação dos

resultados. Mas, como o espaço é o “espaço” do devir, aberto, ele é, portanto,

imprevisível e, por isso, se projeta para o futuro e para as mudanças, isto é, para os

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movimentos de contra-espaço (redes políticas de resistências). Então, o evento se

sucede em evolução e não em somatório e multiplicação. O tempo captando a dinâmica

do espaço e vice-versa. Nada estático. É como se a rede política captura-se um instante

daquele momento. Esse instante nos pode se apreendido e representado, isto é,

espacializado.

A referência à espacialidade da rede política requer um melhor esclarecimento, pois

como bem sabemos a representação do espaço não é o próprio espaço (MOREIRA,

2007 e MASSEY, 2009). Isso esclarecido não diverge do que estamos analisando como

sendo o espaço instável, já que este vem de longa data na filosofia e outras áreas

considerado estático/estável e o tempo o seu oposto, o que vem sendo corrigido ao

longo do tempo. Portanto, a representação do espaço indicado é apenas de um instante

desse espaço instável.

Geopolítica na rede política e espaços do agronegócio Desse modo, os lugares, em função da instabilidade analisada, são como um “recurso”

de poder que conferem aos atores. As alterações no equilíbrio de força da rede política

vêm trazer mudanças no território, variando de intensidade conforme tais alterações

nessa relação de poder, pois no processo de compartilhamento do que foi negociado e

acertado qualquer ator, como já analisado, em função de mudanças internas ou externas,

corre o risco de sair dessa rede política e/ou mudar a sua posição em busca de lugares

que dêem maiores possibilidades de lucros, trazendo outros recursos de poder, alterando

sua posição nessa rede e desse modo o exercício do poder.

Como nesses espaços agrícolas temos a presença forte de multinacionais, tradings e

empresas locais com relações bastante estreitas entre si e dependentes de produtos e

serviços de empresas locais e das mais diversas escalas, mudanças nessa relação de

poder trazem profundas alterações no território. Determinadas atividades podem deixar

de existir, ou até mesmo ocorrer à retirada de atores globais e suas atividades para outro

país que possua melhores possibilidades de lucro, causando instabilidade na região de

saída.

A análise da geopolítica na rede política é de extrema importância quando se analisa os

espaços do agronegócio tendo em vista que os produtores, de uma forma geral, são os

que possuem menos recursos de poder econômico comparado às tradings,

multinacionais etc. e, desse modo, qualquer alteração relativa a esses últimos atores

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acarreta grandes transformações no território. Os impactos vão desde a inviabilização da

produção de determinadas culturas e atividade da região, causando instabilidade e

desequilíbrio político-econômico e social na escala local, até a desestabilização de

antigas alianças regionais em detrimento de uma escala em nível global.

Considerações finais A análise da geopolítica na rede política nos torna possível compreender melhor as

estratégias espaciais que os atores fazem uso na (re) produção de seus espaços de

interesses. Estratégias que refletem um espaço dinâmico, revelando, como vimos, a

relação dialética deste com as redes políticas do agronegócio, nos ajudando

compreender melhor esses espaços.

Notas 1O conceito de interesse abordado neste trabalho refere-se a todas as suas dimensões atribuídas, como por exemplo, a dimensão política, econômica, cultural etc. Este conceito sofreu grandes transformações ao longo dos séculos. De início, predominaram os interesses econômicos. Passou por sua primeira sistematização entre os séculos XVII e XVIII, reforçando seu caráter econômico, relacionado às origens dos discursos e legitimação do sistema capitalista. Para, no século seguinte, devido à contestação dos valores capitalista, abranger todas as suas dimensões (HIRSHMAN, 2002).

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