Furto de Coisa Abandonada

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Tese de furto de coisa abandonada desenvolvida pela Defensoria Pública de Criciúma/SC

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I Ningum pode ser punido por crime doloso sem vontade e conscincia de pratic-lo

Nada obstante tenha sido o Apelante condenado pela suposta prtica de um furto, ser preciso reformar a sentena condenatria, posto no estar provada a ocorrncia do delito.

No depoimento prestado na fase inquisitorial, o Apelante asseverou:

(...) que o declarante afirma que hoje estava no Centro da Cidade, com sua bicicleta, quando, ao passar por um prdio que est desativado, viu que havia uma janela com vidro quebrado; que olhou para o interior do Prdio pela janela e viu que tinha em cima de um mvel um saco de alinhagem sendo que abriu o mesmo e viu que continha pedaos de fios de cobre; que ento pegou o saco e colocou na garupa de sua bicicleta (...); que o declarante informou que tinha pego tal material do Prdio no Centro da Cidade, Prdio este que est abandonado (...) (grifou-se).

Tal depoimento foi ratificado em Juzo:

(...) Juiz: O senhor acusado de ter tentado subtrair pedaos de fio de cobre l do antigo BESC, verdade isso? Ru: , eu peguei, tava na janela solta, n. Juiz: O senhor pegou? Ru: Peguei. Juiz: Mas como assim, o prdio tava aberto? Ru: Tava o vidro quebrado, uma janela dessa a; tava sem o vidro e bem nas costas da janela tem uma pia e o saco estava em cima da pia, metade pra fora e metade pra dentro; s passar ali botei a mo no saco e peguei. Juiz: O prdio estava desativado? Ru: Sim, estava desativado. Juiz: Ento, o senhor pegou para si, no entendeu como furto ento? Ru: No, passei ali peguei, tava solto. Juiz: O que o senhor ia fazer com esses fios? Ru: Ia vender. Juiz: O senhor usurio de drogas? Ru: Sim. Promotor: Da Rua, quando o senhor tava de bicicleta no era visvel esse saco, era? Ru: Era. Promotor: Era visvel? Ru: Sim. Promotor: E esse local tava o que, fechado, em obras, abandonado? Ru: T abandonado, vidro quebrado, t bem. Promotor: Tinha mais coisa alm desse saco de cobre? Ru: Eu s peguei o saco, no vi se tinha mais coisa. Promotor: No viu mais alguma coisa que tava l? Ru: S peguei o saco que tava na janela (...). Promotor: Era o que, retalho de fio, fio novo? Ru: Fio velho. Defensor: O senhor pensou que fosse lixo, alguma coisa desse tipo? Ru: , tava ali, metade pra dentro, metade pra fora, saco de alinhagem todo sujo, eu puxei, n.

Nota-se, pois, que o prdio em questo estava abandonado. Inclusive, como dito pelo policial que registrou a ocorrncia de fl. 03, a construo era do Banco BESC, antiga instituio financeira que, sabidamente, foi incorporada pelo Banco do Brasil em abril de 2009, o que causou o abandono dos investimentos na aludida propriedade, j que, na mesma rua, havia outro Banco do Brasil funcionando plenamente.

Ademais, pelo teor de suas declaraes em Juzo, nota-se que o tal saco contendo os fios de cobre estava solto, metade para dentro e metade para fora da construo aparentemente abandonada pelo antigo proprietrio.

Diante de um tal quadro, seria legtimo supor que um saco contendo fios de cobre no interior de um prdio abandonado (meio para dentro e meio para fora, para ser mais preciso) no tenha dono (res delericta ou res nullius).

O Apelante, assim, agiu em erro, eis que desconhecia a elementar do tipo coisa alheia.Em casos tais, incide o quanto disposto no artigo 20 do Cdigo Penal: O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punio por crime culposo, se previsto em lei.

Assim, se algum delito foi cometido, no estava abarcado por sua conscincia e vontade. E, sem isso, no h dolo e nem crime. E, no havendo a previso do delito na modalidade culposa, a sua absolvio a nica medida possvel.

Neste sentido, j se manifestou o Tribunal de Justia de Santa Catarina:

FURTO QUALIFICADO TENTADO - CONCURSO DE PESSOAS - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - AGENTES QUE SUPEM TRATAR-SE A RES DE COISA ABANDONADA - ERRO SOBRE ELEMENTO CONSTITUTIVO DO TIPO LEGAL QUE EXCLUI O DOLO - EXEGESE DO ART. 20, CAPUT, DO ESTATUTO REPRESSOR - SENTENA ABSOLUTRIA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO (TJSC, Apelao Criminal n. 2005.024172-8, de Xanxer, rel. Des. Jos Gaspar

Ante o exposto, deve a sentena condenatria ser reformada por este E. Tribunal, a fim de que seja reconhecido o erro de tipo e absolvido o Apelante. 2Defensoria Pblica do Estado de Santa Catarina - Ncleo de CricimaRua Raymundo Procpio Nunes, 150, Sala Comercial n 02, Centro Comercial Santos Dumont, Pinheirinho

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