FRANCO, T.B. (1998) as Organizações Sociais de Saúde e o SUS

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    As Organizações Sociais e o SUS. 

    O Governo Federal, impossibilitado de confrontar a opinião pública e rever a legislação do SistemaÚnico de Saúde, construída na "Constituição Cidadã" em 1988, propõe a reforma administrativa da

     saúde e tenta ampliar a ação do mercado no setor, através da proposta das Organizações Sociais. 

    Túlio Batista FrancoPsicólogo sanitarista

    Mestrando em saúde coletiva pela UNICAMP 

    Introdução 

    Para falar das Organizações Sociais e gestão dos equipamentos públicos de saúde,como é a proposta do Ministério da Administração e Reforma do Estado, énecessário recorrermos aos seus antecedentes para visualizar o cenário e as forçaspolíticas implicadas na questão. Neste texto, discutimos primeiro as origens

    contemporâneas do projeto neoliberal que datam da década de 40, no períodoimediato do pós guerra. Após disputar a hegemonia do modelo econômico, naretomada do desenvolvimento nos países centrais, e ser derrotado neste propósito,pelo fato dos dirigentes da época haverem optado pelo modelo keynesiano, aproposta neoliberal entra numa fase de "latência" e ressurge com força na décadade 80. Neste período, ganha fôlego suficiente para hegemonizar as políticaspúblicas nos países desenvolvidos e em efeito dominó, na periferia do capitalismo.

    O Brasil foi um dos últimos países da América Latina a adotar o receituárioneoliberal ditado pelos países desenvolvidos e agências internacionais definanciamento e fomento do desenvolvimento. Esse atraso pode ser consideradopela efervescência política da década de 80, onde as forças democráticas e

    populares disputavam projetos próprios para os rumos do país, com razoávelinserção social. Na década de 90, as propostas de desregulamentação econômica eredução do estado se viabilizam, por fatores que vão desde as pressões geradas apartir da globalização da economia até uma dada conjuntura política interna quealtera a correlação de forças e coloca no centro do poder, grupos favoráveis e atémesmo subservientes ao capital internacional. 

    A Reforma Administrativa do Estado, é uma pequena fatia do universo neoliberal noqual vivemos e que tomou conta da vida nacional. O que se pretende aqui, é aadaptação da gestão do estado à concepção de "estado mínimo", onde suasfunções se restringem àquelas ligadas aos negócios jurídicos, de segurança eadministração próprias do governo. A reforma administrativa para o setor saúde,

    pode-se concluir, não saiu da cabeça iluminada de alguns burocratas de plantão nopalácio, é a materialização da proposta neoliberal que se tem para o país,direcionada então para a mercantilização do setor saúde.

    A Reforma Administrativa na saúde, esbarra num grande obstáculo: a legislação doSistema Único de Saúde, que foi obra coletiva, conquistada na Constituição Federalpor um poderoso movimento popular na década de 80. O SUS conta com grandeaudiência junto à população. Princípios como universalidade de acesso,integralidade das ações, equidade e municipalização da saúde, foram apropriadaspelo imaginário popular. Por estes motivos, evitando um confronto direto e deconjunto, as reformas no setor saúde vêm tangencialmente. A criação da figura dasOrganizações Sociais - OS - joga em dois sentidos. De um lado, tenta dar aparência

    de uma proposta com uma faceta "popular", quando admite que qualquerOrganização não Governamental - ONG - ou Associação de Usuários, pode sehabilitar a assumir um estabelecimento de saúde, desde que seus estatutos

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    estejam adequados aos critérios impostos pela Medida Provisória que cria as OS,inclusive constem que estas entidades "não têm fins lucrativos", mas por outrolado, a proposta é clara ao definir que estas entidades são de "direito privado". Anatureza privada das OS define seu caráter e abre a possibilidade de maiorparticipação portanto, do setor privado na gestão da saúde.

    A Medida Provisória que cria as OS é de outubro de 1997, estando ainda recente,suas repercussões só se farão sentir no decorrer de 1998/99. No entanto, já énotório que a proposta terá impacto efetivo pois são várias entidades hospitalarespúblicas que já na primeira hora buscaram se habilitar à gestão de umaOrganização Social. Procuramos ao final, discutir as possíveis repercussões junto aoSistema Único de Saúde da implementação desta proposta. Como parâmetro paradiscutir esta questão, utilizamos os princípios e diretrizes do Sistema Único deSaúde, e agregamos aos referenciais do SUS, a visão de um modelo assistencialque idealmente procura se articular a partir de alguns princípios, que colocam comoprincipal objetivo do sistema, a resolução dos problemas de saúde, a partir dasnecessidades do usuários. Em resumo, agir em defesa da vida, acima de tudo,numa perspectiva usuário centrada. Esses parâmetros não são apenas teóricos,

    têm referências também em evidências empíricas de gestão e assistência queforam implantadas por diversos municípios nos últimos anos. Ao final, ficam clarosos limites das Organizações Sociais para a construção de um sistema de saúde combase nos princípios declarados pelo SUS.

    Este texto apresenta subsídios a esta discussão, que deverá continuar ao longo dotempo, para conclusões definitivas a partir da experiência em curso deimplementação da proposta do Ministério da Administração e Reforma do Estado -MARE - e a inserção das Organizações Sociais na gestão da saúde.

    O Neoliberalismo: Antecedentes da proposta de reformas edas Organizações Sociais. 

    Quando o inglês Friedrich von Hayek publicou seu livro "O Caminho da Servidão"em 1944, considerado o manifesto fundador do neoliberalismo, pensava ele emdisputar a hegemonia do modelo econômico a ser implantado nos países centrais,no pós guerra. E o que propunham os neoliberais em relação à gestão do estado,no quadro em que se encontrava o mundo naquele período? "O ‘saneamento’ ,encarnado em medidas como: redução da despesa pública; redefinição (elimitação) das funções do Estado; redução do número de funcionários públicos epara-públicos; revisão dos sistemas previdenciários, bem como de toda a legislaçãosocial; desregulamentação e privatizações, submetendo serviços públicos àconcorrência; ajuste fiscal" .

    "O Caminho da Servidão" tinha como alvo a doutrina keynesiana para direção doestado e gestão econômica. Esta propunha a planificação e intervenção estatal naeconomia, no sentido de se estabelecer o mínimo de regulação que impedisse o"caos econômico" gerado pela concorrência desenfreada entre os donos do capital epor outro lado, protegesse parte da população dos efeitos colaterais da economiacapitalista, garantindo aos pobres, os serviços públicos minimamente essenciais. Aorganização deste modelo que regulasse ainda, o nível de atividade econômica(inclusive o emprego) deveria utilizar de instrumentos monetários e o ordenamentoda despesa pública para alcançar seus objetivos.

    As propostas de um "Estado de Bem Estar" vinham sendo gestadas desde o iníciodeste século em função das crises cíclicas da economia capitalista, e ganha maiorfôlego após a grande crise do capital em 1929. 

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    Após a II guerra mundial, verifica-se portanto uma situação de disputa entre osdois modelos - o neoliberal e o welfare state - por qual hegemonia econômica iriase impor ao mundo, a partir dos países desenvolvidos. Neste quadro, o partidotrabalhista inglês vence as eleições em 1945. Partidário de uma política econômicaque contemplasse as questões de ordem social e uma economia regulada peloestado, sua alçada ao centro de poder na Inglaterra, contribui decididamente para

    o arquivamento das propostas de Hayek. Assim, as propostas de um Estado deBem-estar se tornam hegemônicas na Inglaterra, contribuindo decididamente paraque as idéias reformistas em curso naquele país tenham adesão nos demais países,criando uma hegemonia mundial em torno desta política.

    O "Estado de Bem Estar" ou de "Estado desenvolvimentista" no caso latino-americano, ganha o mundo e se impõe como modelo capitalista hegemônico. Pormais de trinta anos, pareceu que as idéias neoliberais haviam sido arquivadas.Mostraram porém que não foram esquecidas. A recessão econômica do início dosanos 70, cria um ambiente propício a que final desta década e nos anos 80, omodelo neoliberal ressurge com força em diversos países de ponta do capitalismo eganha amplos espaços com a crise de financiamento crônica dos países periféricos.

    Assim, assiste-se à implantação do modelo neoliberal na Inglaterra, a partir dogoverno de Margaret Thatcher que tem início em 1979, nos EUA com Reagan em1980 e na Alemanha com Helmut Kolhl em 1982. Na América Latina, inicia-se aimplantação do neoliberalismo primeiro no Chile, ainda no governo Pinochet e naArgentina, no período do regime militar, em ocasião da gestão de Martinez de Hozà frente da área econômica do governo. Segue a onda neoliberal através de"pacotes" econômicos editados pela Bolívia em 1985, México em 1988, com Salinasde Gortari; Argentina, novamente em 1989 com Menen; Venezuela com CarlosAndrés Perez em 1989, Fujimori no Peru em 1990. 

    Como um germe que se mantém latente e depois ressurge com toda sua forçadestrutiva, o projeto neoliberal avança sobre o planeta, como uma onda que toma

    conta da vida econômica, política, cultural, influencia o modo de vida e as relações.Vira modismo, questiona valores, muda comportamentos. No que diz respeito aoestado e à economia, segue trabalhando basicamente o binômio: privatizar edesregulamentar. As duas diretrizes, que se transformam rapidamente em políticasde governo, são faces da mesma moeda. Desregulamentar , para dar "liberdade" aocapital de atuar livremente e deixar que a "mão invisível do mercado" atue como afonte reguladora por excelência da economia. Assim, fica a população à mercê dasleis e dinâmicas mercantis que lhes são impostas. Privatizar , para restringir a açãodo estado, àquilo que lhe é próprio, sua atribuição exclusiva, o cuidado com osnegócios jurídicos, da segurança e administração das coisas próprias do governo.Desta forma, a ação do mercado fica libre não apenas ao setor da produção debens e o comércio, mas também ao segmento que diz respeito aos serviços,

    inclusive os que são hoje oferecidos pelo governo.

    A Reforma Administrativa no Brasil 

    No que diz respeito ao Brasil, a implantação de um novo modo de conduzir oestado, a economia e a sociedade, nos moldes do projeto neoliberal, teve início nogoverno Collor em 1990, e continuidade no atual governo de Fernando HenriqueCardoso. 

    Aqui, o projeto foi conduzido de forma complementar, de um lado, pela via daprivatização, primeiro das empresas e num segundo momento dos serviços e deoutro lado, por mudanças intrínsecas no aparelho de estado, através da reforma

    administrativa. 

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    O discurso oficial no primeiro momento das privatizações, dizia que as atividadessociais seriam as grandes beneficiárias do enxugamento do estado, podendo ogoverno economizar divisas se livrando de outras atividades, e então aplicar oexcedente de recursos em programas sociais. Porém, com o tempo, de forma àsvezes sutil, ganha corpo também a proposta de privatização das atividades sociais,ou parte destes serviços. Saúde, educação, previdência, para ficar nas principais,

    estão no alvo da política de privatização.

    No que diz respeito à reforma do estado e tendo o MARE (Ministério daAdministração e Reforma do Estado) como principal propositor e protagonista dareforma, pretende o governo, constituir um estado gerencial, enxuto, que repassasuas tarefas produtivas e de prestação de serviços para terceiros, entidadesprivadas que possam conduzir estas atividades. 

    Qual o pano de fundo da Reforma Administrativa do Estado? A discussão que temsustentado este debate, parte do pressuposto de que o estado está falido, dado aoseu endividamento, à crise fiscal e por conseqüência, há neste momento uma baixacapacidade de investimento. Além deste fator, contribui com o argumento liberal o

    cenário internacional de globalização da economia, em que os outros países eprincipalmente os de primeiro mundo, têm vendido o receituário do "estadomínimo" e "livre mercado". Outra questão importante, colocada pelo atual governoé o do esgotamento da administração burocrática inaugurada com a constituição de1988, caracterizada pela normatização das atividades do estado, definição doquadro funcional estável, regulação dos negócios da administração direta e indiretaatravés de legislação específica que diz respeito ao cuidado com as finançaspúblicas. Esta, considerada excessivamente "amarrada", impossibilitando aeficiência e eficácia da administração e empresas estatais. Os principais alvosdestas críticas são a necessidade de concursos públicos para ingresso no quadro deservidores do estado, a estabilidade no emprego e a lei de licitações, entre outrasquestões. 

    A Proposta do MARE de reforma administrativa, parte do pressuposto de que asatividades do estado se dividem em três níveis ou categorias sendo: 

    - Núcleo Estratégico, que abrangeria o Legislativo, Judiciário, Presidência daRepública, o primeiro escalão dos Ministérios e o Ministério Público. Isto seriaconsiderado de propriedade estatal. 

    - Atividades Exclusivas do estado, quais sejam: Regulamentação, Fiscalização,Fomento; Segurança Pública, Seguridade Social Básica; seriam de propriedadeestatal, na modalidade das agências executivas (autarquias ou fundaçõesintegrantes da administração pública federal). 

    - Serviços Não Exclusivos: Universidades, Hospitais, Centos de Pesquisa, Museus,seriam públicos, não estatais, na modalidade proposta de Organizações Sociais. 

    A Reforma Administrativa do Sistema de Saúde 

    Em outubro de 1995, o ministro da Administração Federal e Reforma do Estado,Luiz Carlos Bresser Pereira, apresenta a proposta de Reforma Administrativa doSistema de Saúde do Brasil, no Colóquio Técnico prévio à XXV Reunião do ConselhoDiretivo do CLAD. A sua proposta de reforma, contem os seguintes pressupostos:"Primeiro, pressupõe-se que a descentralização permite um controle muito melhor

    da qualidade e dos custos dos serviços prestados localmente. Segundo, que adescentralização acompanhada de controle social por parte da comunidade atendidapelo serviço torna-se duplamente efetiva. Terceiro, que a separação clara entre a

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    demanda e a oferta de serviços permite, entre os fornecedores dos serviçosmédico-hospitalares, o surgimento de um mecanismo de competiçãoadministrada altamente saudável. Quarto, que o sistema de encaminhamento viapostos de saúde e clínicos gerais evitará uma grande quantidade de internaçõeshospitalares inúteis. Quinto, que, a partir da efetiva responsabilização dos prefeitose dos Conselhos Municipais de Saúde, a auditoria realizada pelo Ministério da Saúde

    nos hospitais passará a ter caráter complementar à auditoria permanente realizadaa nível municipal, onde, de resto há muito mais fiscalização e participaçãocomunitária". 

    Estes pressupostos tratam na verdade, de uma dada avaliação que se faz doSistema Único de Saúde, lugar comum em todos os debates onde a saúde públicano Brasil e o SUS são objeto de análise. Há no entanto uma questão nova posta nodocumento do MARE, qual seja: a discussão em torno de demanda X oferta deserviços e a sua separação como impulsionadores de uma certa "competiçãoadministrada". Sugere o documento que se desloque o eixo do modeloassistencial, da oferta de serviços oferecidos pelo poder público, para um modelocentrado na demanda em que o mercado assume um papel relevante. Esta sem

    dúvida é a principal questão em jogo com a proposta, que coloca a idéia de comoserá realizada a inserção do mercado no sistema de saúde. A competiçãoadministrada, como sugere a proposta do MARE para a saúde, combina um mix demercado com o mínimo de regulação do estado, que poderá se dar de diversasformas, entre elas, através da definição de clientela, protocolos de atendimento eoutros instrumentos em geral, limitantes de direitos, podendo inclusive, tentarinserir o co-pagamento de procedimentos. A estas alturas, na proposta do MAREpara a reforma administrativa do sistema de saúde, os princípios do SUS são solenee convenientemente esquecidos. 

    O documento do Ministério conclui com a proposta das Organizações Sociais comoum dos locus operacionais da reforma, dando-lhe materialidade. Diz assim o

    documento: "Os hospitais públicos deverão, em princípio, ser transformados emorganizações sociais, ou seja, em entidades públicas não-estatais de direito privadocom autorização legislativa para celebrar contrato de gestão com o poder executivoe assim participar do orçamento federal, estadual ou municipal". 

    As Organizações Sociais 

    As Organizações Sociais foram criadas através da Medida Provisória No. 1.591 de 9de outubro de 1997. Poderão abranger o setor de atividades não exclusivas doestado (ensino, pesquisa, tecnologia, meio ambiente, cultura e saúde), a partir datransformação de instituições públicas em pessoas jurídicas de direito privado semfins lucrativos. Poderão assumir a forma de fundações de direito privado ou de

    associação civil sem fins lucrativos. Na sua gestão, poderão: 

    1. Contratar pessoal sem concurso público seguindo as normas do mercado detrabalho e adotando a CLT . Não estão livres portanto do empreguismo efavorecimento de todo tipo conhecido na política. O principal argumento contrário aesta liberalidade administrativa diz respeito à possibilidade das OS servirem parapendurar supostos "cabos eleitorais" no período pós-eleitoral, como é comum nahistória brasileira. 

    2. Poderá adotar normas próprias para compras e contratos. Embora administradastambém com dinheiro público, ficam livres das normas próprias que regulam asdespesas realizadas com recursos públicos.

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    3. Receberão dotações de recursos orçamentários do governo através dosContratos de Gestão. O contraditório na questão financeira que pesa sobre as OS,diz respeito ao fato de que, apesar de serem entidades de direito privado,receberem recursos orçamentários do tesouro, sem licitação. 

    4. Serão dirigidas por um Conselho de administração ou Curador  composto de 20 a

    40 % de representantes do poder público (como membros natos); 20 a 40% derepresentantes da sociedade civil também como membros natos; 20 a 40% eleitospelos demais integrantes do conselho e 10% indicados ou eleitos. Sobre estacomposição do Conselho de Administração definido pela MP permanecem dúvidascom relação à sua composição, mau definida e imprecisa, o que poderá gerardiferentes interpretações. Outra questão importante, é o fato de que não estáprevisto controle externo das Organizações Sociais. Para haver controle social sobrequalquer órgão ou entidade, é necessário que se construam instrumentos para isso.No Brasil, a legislação do SUS construiu instrumentos para o controle do SUS, a serfeito pela sociedade organizada nos Conselhos, Conferências de Saúde e que aindapoderão lançar mão de inúmeros mecanismos para isto. No entanto, não existeminstrumentos eficazes para o controle da sociedade sobre entidades de direito

    privado, como são as Organizações Sociais. 

    Pesam sobre a proposta das OS o questionamento da sua constitucionalidade. Pornão se tratar de matéria relevante e urgente, por definição do regimento doCongresso Nacional, não poderia ser imposta por MP, mas sim, deveria ser votadapelo Congresso como um Projeto de Lei. 

    Outra questão importante, diz respeito ao fato de que não foram definidos critériospara a escolha das entidades que receberão recursos orçamentários do governo,podendo aí prevalecer o clientelismo ou apadrinhamento. 

    É grave o fato de que as OS como entidades de direito privado, poderão vender

    serviços a terceiros. No caso da saúde, por exemplo, haverá com certeza, destaforma uma clientela diferenciada entre os que podem pagar no ato doprocedimento ou através de seguros/planos privados e aqueles que sãodependentes do sistema SUS. Há grande incerteza em relação à assistência queserá prestada a estes, pelas OS, pelo fato de que, sendo entidades de direitoprivado, a busca pelo lucro com procedimentos de saúde está objetivamentecolocada, podendo assim, favorecer à clientela que assegure o caminho mais fácil etranqüilo para este objetivo.

    O Contrato de Gestão é o instrumento legal que propõe o MARE para regular arelação do estado com a OS. Estes, firmam compromissos administrativos entre aspartes - governo e OS. Dizem respeito também aos recursos a serem repassados,

    assim como metas a serem alcançadas e formas de avaliação de desempenho dasOS. 

    Os Contratos de Gestão surgiram a primeira vez na França, no final dos anos 60,como instrumento que define a relação entre entidades públicas, estabelecendopetições e compromissos entre as mesmas. Foi adotado por diversos países daEuropa e no Brasil foi introduzido em 1992, quando o Governo Federal assinouContrato de Gestão com a Companhia Vale do Rio Doce. Só agora estão sendopropostos para regular a relação entre o poder público e entidades privadas.

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    As Organizações Sociais na Saúde 

    O QUE DIZ O RELATÓRIO DO BANCO MUNDIAL/1993. 

    Em que medida as Organizações Sociais são parte de um conjunto articulado, que

    pretende implantar no Brasil um novo sistema de saúde, seguindo o receituário doBanco Mundial? Para esta análise, devemos nos deter rapidamente sobre odocumento editado pelo Banco Mundial, sob o título "Relatório sobre oDesenvolvimento Mundial 1993: Investindo em Saúde".

    No que diz respeito à gestão dos serviços, o Relatório "recomenda que os países derenda média (como o Brasil) devem concentrar-se em pelo menos quatro áreasbásicas de reforma de políticas: eliminar gradualmente os subsídios públicos aosgrupos mais abastados; ampliar a cobertura do seguro de saúde; dar opção deseguro aos consumidores; e estimular métodos de pagamentos que permitamcontrolar os custos". Na assistência, propõe ações básicas tais como "programaampliado de imunizações, incluindo suplementação de micronutrientes; programas

    sanitários escolares para tratar as verminoses e a deficiência de micronutrientes, etambém para transmitir noções de higiene; programas para esclarecer o públicosobre planejamento familiar e nutrição, sobre a conveniência da automedicação oubuscar tratamento, e sobre o controle de vetores e doenças; programas parareduzir o consumo de tabaco, álcool e drogas; e programas para prevenção daAIDS, com ênfase nas DST". Acrescenta a estas ações, "intervenções clínicas" decinco tipos, divididas nos seguintes grupos: "1. Serviços de assistência à gestante(atendimento pré-natal, no parto e pós-parto); 2. Serviços de planejamentofamiliar; 3. Controle de tuberculose; 4. Controle das DST; e 5. Atendimento dasdoenças graves comuns em crianças pequenas" .

    No que diz respeito à esfera pública e privada, o Banco Mundial vai direto à idéia da"terceirização" e da "concorrência administrada", argumentando da seguinte forma:"Em muitos países em desenvolvimento os sistemas sanitários administrados pelogoverno são grandes demais e deveriam ser reduzidos. Para tanto, são necessáriosalterações jurídicas e administrativas que facilitem a prestação de serviços pelainiciativa privada (ONG ou entidades com fins lucrativos), e é necessário tambémque as ONG recebam subsídios públicos para prestarem os serviços do pacoteessencial e que haja corte de novos investimentos em hospitais públicos terciários"."A concorrência entre fornecedores de um pacote de serviços de saúde, claramenteespecificados e previamente pagos, contribui para melhorar a qualidade e aumentara eficiência". "Quando o seguro social cobre serviços prestados por hospitais dogoverno, a concorrência com o setor privado pode contribuir para melhorar odesempenho" .

    Este pequeno extrato do comentário de Clóvis R. M. de Lima ao texto de Laurellsobre o Relatório do Banco Mundial, dá a idéia de que a proposta de uma novaNorma como a NOB-96, a Lei dos Planos de Saúde e a MP que cria as OrganizaçõesSociais, se articulam, dando formação a um todo, um novo modelo de sistema desaúde. A proposta de reforma administrativa do MARE adapta o ideário do BancoMundial a um formato brasileiro e lhe dá materialidade. No caso da saúde, isto ficaclaro ao compararmos o texto Relatório com as "novidades" propostas pelo governofederal ao SUS nos últimos anos.

    ENTRE A LEI DOS PLANOS, A NOB-96 E AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS. 

    Após longa discussão, finalmente entre maio e junho de 1998 o governo federalaprova a Lei que regulamenta os planos de saúde. Embora tenha havidocontestação por parte de algumas empresas, sobre as regras estabelecidas, a nova

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    Lei deixa aberto o leque de possibilidades de atuação dos seguros e planos desaúde privados a cinco modalidades diferentes, direcionadas a públicos (diga-semercados) específicos o que arma uma boa base para operação da medicinasupletiva, que hoje já atende a 40 milhões de usuários no país. 

    A Norma Operacional Básica - NOB/96, num primeiro momento parece uma

    proposta exatamente adequada ao SUS e que vem de encontro aos anseios deinversão do modelo assistencial, no sentido de melhor assistir ao usuário. Seuargumento, cria uma nuvem sobre as verdadeiras intenções, quais sejam, a depropor uma subdivisão do atual Sistemam Único de Saúde. Nos diz Emerson Merhyque "No cenário idealizado por este ator (Bloco dirigente atual no exercício dogoverno federal), teremos dois sub-sistemas básicos: o público e o privadosuplementar. O público, e compreendido como o futuro do SUS, será constituídopor uma extensa rede estatal de ações básicas de serviços efetivadas em dois locuscentrais: as unidades básicas de saúde municipais e os programas específicos tipoPSF e ACS, que se articulará com uma ampla rede formada por estabelecimentosde natureza privada ou estatal privatizada (as OS) que irão compor a retaguarda dosistema para fornecer serviços diagnósticos e terapêuticos, ambulatoriais e

    hospitalares, e de urgências e emergências, que implicam em investimentos maisespeciallizados e de custos mais relevantes" . 

    Tendo sido editada a MP que cria as Organizações Sociais, em outubro de 1997,suas repercussões se farão sentir no decorrer de 1998 e nos próximos anos. Noentanto, iniciou-se desde a publicação da MP que cria as OS, um movimentointenso pela incorporação de diversas entidades hospitalares a esta modalidadeadministrativa. 

    Na edição do dia 10.10.97, o jornal "Folha de São Paulo", ao noticiar a publicaçãoneste dia da MP que cria as OS, registra que "com a assinatura da MP pelopresidente Fernando Henrique Cardoso, passam a poder funcionar como OS

    (deverá haver um período de transição até dezembro/97) a Fundação RoquettePinto (TVE) e o Laboratório Nacional de Luz Sincrotron". Continua o jornal "adireção do INCA (Instituto Nacional do Câncer) assinou ontem no Rio um protocolode intenções para ir se adaptando às exigências legais e se transformar em OS". Noano de 97 ainda, estavam se habilitando para se transformarem em OS, o HospitalMaterno Infantil Presidente Vargas e a Fundação Escola de Administração Pública.Na sequência, vieram o anúncio de que 10 hospitais em São Paulo seriamterceirizados, embora não seja citada a forma de terceirização, muitoprovavelmente através de OS. A lista das entidades é a seguinte: Na periferia de SP(Pirajuçara, Pedreira, Grajaú e Itaim Paulista), na Grande SP (nos municípios deCarapicuíba, Itapevi, Itaquaquecetuba, Guarulhos e Itapecerica da Serra) e nointerior (Sumaré), cada um com cerca de 200 leitos. Sabe-se que o hospital de

    Sumaré foi assumido pela Unicamp, em convênio entre a Universidade e aPrefeitura Municipal. 

    Na mesma edição, o jornal noticia que o governo do estado do Rio de Janeiro,pretende neste ano de 1998, terceirizar (também não cita a forma de terceirização,mas certamente através das OS) os serviços em seis hospitais-gerais, são eles:Carlos Chagas, Getúlio Vargas, Rocha Faria, Alberto Schweitzer, Pedro II e AzevedoLima.

    O governo da Bahia está transformando o hospital Roberto Santos, um dos trêsmaiores do estado em Organização Social. O hospital deverá ser assumido por umgrupo de médicos da própria entidade que terá a designação de Instituto de

    Atenção à Saúde, Docência, Pesquisa e Desenvolvimento Social. Anuncia o governo

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    estadual que o novo modelo será implantado em todos os novos hospitaisconstruídos pelo Estado. 

    Este quadro é demonstrativo de uma primeira mostra do apetite que se tem paraterceirizar e agora usando a modalidade de OS, equipamentos de saúde pública. Oimpacto assistencial só será sentido no decorrer do próximo período. No entanto, as

    experiências com equipamentos públicos, administrados por entidades privadas nosetor saúde, têm resultado em redução dos índices de acesso, equidade eresolutividade. Desta forma, contribui para redução do coeficiente de cidadaniaconquistado com o SUS. 

    Possíveis efeitos das OS junto ao Sistema Único de Saúde -SUS. 

    Aurélio Buarque de Holanda nos conta, em seu precioso verbete, que Sistema é o"conjunto de instituições políticas e/ou sociais, e dos métodos por elas adotados,encarados quer do ponto de vista teórico, quer do de sua aplicação prática". Um

    dos avanços importantes de se constituir um Sistema de Saúde Público no Brasil, apartir da Constituição de 1988, é justamente o fato de articular em torno da"Saúde", todas as organizações e estabelecimentos públicos, com o cuidado deinserir neste sistema, os estabelecimentos privados conveniados ou contratadospelo poder público. Temos assim, uma estrutura com funcionamento definido apartir da legislação infra constitucional e uma mesma normatização. Constituiu-seassim, um conjunto articulado nacionalmente, sob a batuta de um "comando único"em cada esfera de governo, o Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais eSecretarias ou Departamentos Municipais de Saúde, que tem seus mecanismos dedemocracia - principalmente os conselhos de saúde - permeando esta estrutura. 

    Um Sistema idealmente solidário, por considerar a saúde um direito público

    (pertencente a todo povo), e por conseqüência, garantir o acesso universal aosserviços de saúde e a equidade na assistência. Foram definidos para financiar oSUS, recursos do orçamento fiscal, e da seguridade social, que têm suas fontes decaptação específicas definidas na Constituição e legislação específica. Assim,contribuem para o financiamento, todos os cidadãos através da arrecadação deimpostos ou na forma de contribuição social. O Sistema Único de Saúde deveprestar assistência à saúde, sem a necessidade de pagamento prévio, seja no atodo procedimento ou na modalidade de contribuição previdenciaria ou qualqueroutra que possa existir. 

    A única entidade capaz de garantir que este Sistema permaneça funcionando destaforma e garanta os princípios constitucionais que regulam o SUS, é o estado, como

    pensado na Lei Orgânica do SUS, gerido democraticamente e com o controle dasociedade através de organismos de participação direta, como são os Conselhos deSaúde. Assim, quando foi homologada a Constituição de 1988, fez-se estecompromisso, outorgando direitos de cidadania à população brasileira. Em grandeparte, isto foi garantido face à conjuntura política de ascenso dos movimentospopulares urbanos que alimentavam o poderoso "movimento pela reformasanitária", com um congresso portanto, permeável às pressões populares e umcontexto que tinha como pano de fundo o estado de "Bem-estar Social", ou seja, osares neoliberalizantes que já encharcavam a Europa, não haviam chegado até asterras brasileiras. 

    No último período, assistimos a uma grande transformação que marcou os anos 80e 90, onde a intervenção do estado na economia, foi considerada coisa do passadoe inconveniente à integração do país à nova ordem mundial, preconizada pelo"Consenso de Washington" . O progresso e desenvolvimento viriam a partir da

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    implementação de reformas na economia e no estado, que apontassem para a totalliberdade do mercado e enxugamento do estado.

    Como já foi dito antes, a pressão dos países desenvolvidos e suas agências definanciamento, a crise fiscal e de investimentos do Brasil, associado a umaconjuntura interna adversa aos interesses populares, com a eleição de presidentes

    (Collor e FHC) identificados com o projeto neoliberal, alteraram sobremaneira asituação interna, criando uma forte pressão sobre propostas como a do SUS, quetêm no poder público, sua fonte de financiamento e garantias de funcionamento. 

    Este é o caldeirão onde ferve a proposta de Reforma Administrativa do Estado eparticularmente a da Saúde, que tem na constituição das Organizações Sociais umdos pilares de construção desta reforma. A lógica é a de repassar para o sistemaprivado a gestão de equipamentos de saúde. O estado se desobrigando de garantirà sociedade o direito à saúde, de provê-la de recursos para que a assistência possase dar de forma integral, de administrar equipamentos que oferecem estesserviços, condição para que estes funcionamento de acordo com os princípios doSUS.

    Que conseqüências poderiam advir, com a entrada do setor privado na gestão doshospitais públicos (como está na proposta do MARE) através das OS? 

    Seis razões que falam contra a proposta das OS. 

    1.  A quebra do "Sistema", na forma concebida originalmente pelo SUS. 

    Como os hospitais, gerenciados por uma entidade de direito privado, a OS, passaria

    a trabalhar sob a lógica do mercado, há grande possibilidade da cadeia de serviçosque garante ao SUS a condição de SISTEMA, interromper sua linha de transmissão,ou seja, deixar de operar de forma integrada, como o faz hoje. Interrompetambém, o ideal de solidariedade que perpassa o Sistema Único de Saúde. 

    Hoje, o SUS é praticamente refém do setor privado que detém mais de 75% dosleitos hospitalares. Esta correlação foi construída históricamente, inclusive comfinanciamento do governo à construção do setor hospitalar privado. Estes hospitaisna maioria da vezes agem contra o SUS e os usuários do sistema de saúde, namedida que, tendo como objetivo central da sua atividade, o lucro sobre a doença,fazem atendimento seletivo, internando somente os casos onde o tratamento élucrativo. Não garantem sua inserção no sistema de referência e contra-referência

    de uma determinada rede assistencial de saúde por se negarem a uma relaçãoefetiva com a rede básica do SUS. Produzem procedimentos muitas vezesdesnecessários, conduzidos apenas pela lógica da produção/faturamento. Estasituação deverá se agravar mais ainda, na medida em que ocorrer o repasse paraas OS de estabelecimentos hoje sob gestão do poder público. 

    2.  A extinção do quadro de servidores públicos da Saúde, nos estabelecimentosgerenciados por OS. 

    O quadro estatutário atual da saúde, será gradativamente extinto para dar lugar aum quadro contratado via CLT. Haverá portanto, uma gradativa substituição doquadro funcional nestes estabelecimentos, com a consequência imediata da falta deestabilidade, abrindo margem para o clientelismo na contratação de pessoal paraestes estabelecimentos sob gestão das OS.

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    O objetivo de se construir um quadro de servidores da saúde, com isonomia, planode cargos e carreiras, ou mesmo de elaborar uma NOB para o RH, como tem sidodiscutido em fóruns de Recursos Humanos da saúde, fica muito mais longínquo se aproposta das OS ganhar contornos nacionais e expansão junto ao SUS. 

    3.  A gestão de RH, desafios atuais e no quadro das OS. 

    Nas OS, a gestão de RH é predominantemente centralizadora, autoritária enormativa. É garantida, através do controle do trabalho por expedientesadministrativos. No entanto, o setor público tem servido de laboratório a novasexperiências de gestão, onde são oferecidos aos recursos humanos, processos detrabalho alternativos, com maior grau de autonomia no exercício profissional,combinada à responsabilização. Algo ainda incipiente e pouco expressivo, mas quedisputa no micro espaço da organização do trabalho, com o modelo tradicional epode inaugurar um modo novo de lidar com os recursos humanos, tão essenciais notrabalho em saúde. No entanto, isto só é possível, em estabelecimentos onde oprofissional opera sob a lógica solidária, sob valores éticos que permeiam a questãoda saúde como direito de cidadania, sob uma nova consciência do papeltransformador do trabalho. A mudança dos hospitais públicos para a gerência deOS, operando sob a lógica do mercado, quebra com esta possibilidade nova,mesmo que experimental, mas rica de objetividades e subjetividades, construtorasde um devir com bases humanitárias e de justiça social. 

    4.  A saúde como direito público, o mercado e a opção das OS. 

    A princípio supõe-se que as OS, de um lado, investidas do ideário mercantilista, ede outro, fazendo a gestão de um estabelecimento hospitalar público, viveria osofrido conflito shakesperiano do "ser ou não ser?", público ou privado?.Ingenuidade de quem pensar assim.

    A OS, vai dividir os serviços que presta, com dois tipos diferentes de clientela: 1. Ousuário dependente do sistema público. 2. O usuário que paga pela assistênciaatravés dos seguros e planos de saúde privados. Operando sob o ideário neoliberal,sendo uma entidade de direito privado, as leis mercantis definirão em muito arelação do hospital sob gestão da OS e os usuários. O mercado é assaz impessoal ecruel para priorizar o lucro através da sua atividade e não a resolução do problemade saúde que aparece, caótico muitas vezes, na unidade assistencial. Estesestabelecimentos naturalmente, darão prioridade ao atendimento à populaçãopagante, reduzindo a oferta de serviços no sistema Universal, contribuindo para ummenor grau de cidadania em relação aos direitos à assistência à saúde. 

    5.  O modelo de assistência e as OS, entre a necessidade e os limites rígidos domercado. 

    Os serviços de saúde, na sua dimensão operacional, são a instância mediadoraentre o que é ofertado e as necessidades de saúde da população, ou seja, é o lugarde encontro entre prestador e usuários. A forma como se dá esse encontro, defineo perfil de assistência que se tem e os resultados são verificados, através daeficácia, resolutividade, satisfação de usuários e trabalhadores e custos dosserviços.

    Um serviço de saúde centrado no usuário, trabalha principalmente a partir darelação que se estabelece entre o profissional e a clientela dos serviços, orientada

    por princípios éticos, ideológicos e de valores que são da instituição, do trabalhadore do usuário, todos envolvidos na relação. Essa mediação é exercida de um lado, eprioritariamente, por uma opção ideológica do entendimento que saúde é direito

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    público e faz parte da construção da cidadania, e de outro lado, secundariamentena maioria dos casos, por uma "razão instrumental" que opera a partir dedeterminados recursos tecnológicos, com o objetivo de resolver o problema desaúde do usuário.

    Nos equipamentos públicos, tem sido possível experimentar modos de operar o

    trabalho, com base nestes parâmetros, e ainda em princípios humanitários e desolidariedade, configurando assim, um modelo assistencial em padrões societáriosque apontam para a construção de um futuro que parte do princípio que a saúde éum direito público. Esse tipo de modelo, operado por esse novo modo de encarar etrabalhar a assistência à saúde, só é possível num sistema que é público eportanto, não vive o seu cotidiano pressionado pelos interesses e a ideologia domercado. 

    Com os hospitais públicos, geridos por entidades de direito privado, as OS, otrabalho em torno de um novo modelo de assistência, que aponte para as diretrizesrelatadas acima, será impossível, dado a natureza mercantil que direciona aassistência. Além disto, a tendência destes estabelecimentos é o de trabalhar

    apenas sob a lógica da "razão instrumental" e conhecimentos bastanteestruturados, bloqueando qualquer possibilidade de mudança no modo de fazersaúde.

    6.  O Controle Social das OS. 

    Há duas razões para se duvidar de que haverá controle social dos estabelecimentosgeridos pelas OS. A primeira delas diz respeito ao fato de que, na Medida Provisóriaaprovada, que cria as OS, não há nenhuma menção ao controle externo dasmesmas. Por serem estabelecimentos regulados através de um contrato de gestãocom o poder público, o seu funcionamento será fiscalizado pelo governo que fará ocontrole da entidade. Pela MP, o Ministério Público só agirá contra os dirigentes dasOS a chamado do governo, limitando assim, a ação controladora da sociedade.

    Outra razão, diz respeito ao fato de que os órgãos de controle social do SUS, osConselhos de Saúde, embora detenham poder para controlar e fiscalizar SistemaÚnico de Saúde, e assim poderão exercer pressão sobre os estabelecimentosadministrados pelas OS, têm limites óbvios quando se trata de uma entidade dedireito privado, e pouco poderão fazer no que diz respeito às ações resultantes danatureza privada destas entidades. 

    Bibliografia: 

    1.  Bandeira Lins, C. F.; As "Organizações Sociais" e o Governo; Jornal Folha deS. Paulo de 13.11.97. 

    2.  Batista, P.N.; O Consenso de Washington; Caderno Dívida Externa nº 6;PEDEX, São Paulo, 1994. 

    3.  Bresser Pereira, L. C. ; Reforma Administrativa do Sistema de Saúde;Trabalho apresentado ao Colóquio Técnico prévio à XXV Reunião doConselho Diretivo do CLAD, Buenos Aires, outubro de 1995. 

    4.  Bresser Pereira, L. C.; Criação das Organizações Sociais; Brasília,1996,mimeo. 

    5.  Bresser Pereira, L. C.; Reforma Social-Democrática; Jornal Folha de S. Paulode 17.10.97. 

    6.  Campos, G.W.S.; A Saúde Pública e a Defesa da Vida; HUCITEC, S. Paulo,

    1994. 

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    7.  Campos, G.W.S.; Reforma da Reforma, repensando a saúde; HUCITEC, S.Paulo, 1992. 

    8.  Cantarino, G. et all; Informação ao Conselho Nacional de Saúde a Respeitoda Proposta de Criação das Organizações Sociais; Brasília-DF- 1997, mimeo. 

    9.  Cecílio, L. C. (Org.); Inventando a Mudança na Saúde, HUCITEC, S. Paulo,1994. 

    10. Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social - CNTSS;Agências Executivas. ‘uma forma de desmontar a previdência social noBrasil’; Cadernos da CNTSS/CUT - setembro de 1997. 

    11. Cruz, Valdo; Governo Valoriza Carreiras ‘Estratégicas’ ; Jornal Folha de S.Paulo, 3.8.97. 

    12. Damé, L.; Deputados Aprovam Contrato de Gestão; Jornal Folha de S.Paulo, 3.7.97. 

    13. Darze, J.; O Ano da Saúde? ; Jornal Folha de S. Paulo 20.5.97. 14. Governo do Estado do Rio Grande do SUL - Secretaria de Administração e

    dos Recursos Humanos/PROCERGS; Contrato de Gestão, texto disponível nainternet na home page: www.procergs.com.br/ 

    15. Jornal Folha de S. Paulo - editoria: 

    - Deputados Federais Indicaram Diretores de Hospitais. (09.08.97) 

    - MP Muda Regime de Funcionamento de Algumas Instituições. (10.10.97) 

    - Principais Pontos do Texto Básico da Reforma Administrativa. (25.11.97) 

    - Rio quer Transferir Gestão a Empresas. (06.12.97) 

    16. Lima, C. R. M. de; "Reforma do Estado e Política de Saúde: Discussão daAgenda do Banco Mundial e da Crítica de Laurell. Saúde em Debate - revistado CEBS nº 49/50; Londrina-PR, 1996. 

    17. Lima, Roni; Estdo diz que há Vagas em Hospital do RJ; Jornal Folha de S.Paulo, 1.7.97. 

    18. Lima, Roni; Projeto Aumenta Eficiência de Hospital; Jornal Folha de S. Paulo,2.7.97. 

    19. Martins, L.; SP pode ter 10 Hospitais Terceirizados; Jornal Folha de S. Paulo,6.12.97. 

    20. Martins, L.; SP quer Terceirizar Dez Hospitais Novos; Folha de S. Paulo de6.12.97. 

    21. Medida Provisória 1591, de 9 de outubro de 1997. 22. Merhy, E.E. et Onocko, R. (Orgs.); Agir em Saúde, um desafio para o

    público; HUCITEC, S. Paulo, 1997. 23. Merhy, E.E., Organizações Sociais. Autonomia por que e para que?; mimeo,Campinas-SP, 1998 

    24. Moraes, R.; Neoliberalismo: O que é e para onde leva; São Paulo, 1998. 25. Nassif, L.; O Novo Modelo de Estado; Jornal Folha de S. Paulo de 24.11.97.  26. Oliveira, J.E.G.; Ainda Há Saída; Jornal Folha de S. Paulo 18.02.97. 27. Projeto de Emenda à Constituição Nº 41, de 1997, "que modifica o regime e

    dispõe sobre princípios e normas da Administração Pública, servidores eagentes políticos, controle de depesas e finanças públicas, e custeio deatividades a cargo do Distrito Federal, e da outras providências". 

    28. Raia, Silviano; Uma Esperança para a Saúde Pública; Jornal Folha de S.Paulo de 11.12.97. 

    29. Raymundo, P.R. e Almeida, W.M. de; "Privaticização"; Jornal Folha de S.Paulo, 27.11.97. 

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    30. Rezende, C.; A Reforma do Estado Brasileiro e o SUS, 1998; texto disponívelna internet na home page: www.datasus.gov.br/cns/temas/ 

    31. Temporão, J. G.; A Reforma Administrativa: proposta governamental; 1996;texto disponível na internet na home page: www.ensp.fiocruz.br/conjuntura/ 

    32. Temporão, J. G.; Reforma Administrativa: uma avaliação preliminar; 1997;idem, ibidem. 

    33. Zeyn, M. K.; Ganhos para a Democracia; Jornal Folha de S. Paulo, 8.12.97. 

     junho de 1998. 

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    Página da 10ª Conferência Nacional de Saúde 

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