Fórum - 300

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3 2 4 PÁGINA PÁGINA PÁGINA FÓRUM Suplemento do jornal unesp Junho 2014 Artes plásticas no Acre Ueliton Santana Notas em trânsito – sobre adversidades e diversidades culturais Júlio Martins Entrevista com Mariana Fernandes As coisas saem de nós assim como nós saímos das coisas Kamilla Nunes Orbis descriptio, Anna Bella Geiger No campo das artes plásticas, o Brasil também se mostra um espaço desigual. Por um lado, há nomes que integram o círculo internacional de galerias, como Beatriz Milhazes e Adriana Varejão, cujas obras ultrapassam o milhão de dólares. Por outro, inúmeros criadores ficam à margem do mercado, principalmente se vivem em locais distantes do eixo Rio–São Paulo. Realizado em março, o evento “Longitudes” trouxe para a capital paulista artistas, professores e pesquisadores de todo o país a fim de debater essa situação. O objetivo principal foi avaliar a formação do profissional da área diante do atual cenário. Esta edição apresenta as ideias da organizadora do evento, Mariana Fernandes, e de três dos participantes do encontro, que, a partir da análise de questões específicas, como o circuito artístico de seus Estados, contribuem para a compreensão e a busca de soluções para a situação nacional. (As gravações das palestras e a publicação de textos, direta ou indiretamente ligados ao evento, estão disponíveis em <www.seminariolongitudes.com> . Outro canal de comunicação é o e-mail <longitufes@ ananue.com> . ) ARTE DA FORMAçãO

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Suplemento do Jornal Unesp - Junho 2014

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  • 32 4pginapgina pgina

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    Suplemento do jornal unesp Junho 2014

    Artes plsticas no AcreUeliton Santana

    Notas em trnsito sobre adversidades e diversidades culturaisJlio Martins

    Entrevista com Mariana Fernandes

    As coisas saem de ns assim como ns samos das coisasKamilla Nunes

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    No campo das artes plsticas, o Brasil tambm se

    mostra um espao desigual. Por um lado, h nomes que

    integram o crculo internacional de galerias, como Beatriz

    Milhazes e Adriana Varejo, cujas obras ultrapassam o

    milho de dlares. Por outro, inmeros criadores ficam

    margem do mercado, principalmente se vivem em locais

    distantes do eixo RioSo Paulo. Realizado em maro, o

    evento Longitudes trouxe para a capital paulista artistas,

    professores e pesquisadores de todo o pas a fim de

    debater essa situao. O objetivo principal foi avaliar a

    formao do profissional da rea diante do atual cenrio.

    Esta edio apresenta as ideias da organizadora do

    evento, Mariana Fernandes, e de trs dos participantes

    do encontro, que, a partir da anlise de questes

    especficas, como o circuito artstico de seus Estados,

    contribuem para a compreenso e a busca de solues

    para a situao nacional.

    (As gravaes das palestras e a publicao de textos,

    direta ou indiretamente ligados ao evento, esto

    disponveis em .

    Outro canal de comunicao o e-mail .)

    Arte dA formAo

  • 2 Frum Junho 2014

    Jlio Martins curador e historiador. Foi responsvel pelo

    mapeamento de Minas Gerais e Esprito Santo pelo programa

    Rumos Artes Visuais do Instituto Ita Cultural SP (20112013) e

    curador geral do Museu Inim de Paula, Belo Horizonte (20082011).

    Este artigo est disponvel no Debate acadmico do Portal Unesp,

    no endereo .

    preciso discutir como e pArA quem os ArtistAs so formAdosMARIANA FERNANDES Por Oscar DAmbrosio

    pesquisadora e crtica, mariana fer-nandes foi a organizadora do even-to Longitudes: a formao do artista contemporneo no Brasil, realizado

    nos dias 29 e 30 de maro na casa do povo, em so paulo (sp). Atualmente, desenvolve pesquisa em polticas culturais na universi-dade de so paulo (usp).

    Jornal Unesp: O que a motivou a rea-lizar o evento?

    Mariana Fernandes: Tudo comeou com uma pesquisa de mestrado sobre mercado de arte. Observei que a arte contempornea, com outros setores da cultura, assim como da economia, obte-ve um crescimento exponencial no Brasil e no mundo. O aumento excepcional no preo das obras de arte e o crescimento no volume de vendas, principalmente na Europa e nos EUA, e, agora, tambm na China, desencadeou uma demanda por novos artistas no mundo inteiro. O fato que, apesar do crescimento do mercado de arte ter gerado muito dinheiro, no se pode dizer que o artista desfrute de uma situao privilegiada.

    JU: Como foi concebida a organizao do Seminrio?

    Mariana: Foram convidados artistas, professores e/ou pesquisadores das cin-co regies brasileiras a fim de iniciar com os participantes uma discusso que vise a construir um panorama do que, nos l-timos anos, entendemos ser a formao do artista visual. Buscamos colocar em contato a pluralidade de pensamentos so-bre a formao artstica dos palestrantes e ouvintes. Foram realizadas mesas sobre a profissionalizao do artista, ou o que torna o artista profissional; o artista e seu mbito de atuao; o artista e a ampliao do circuito; a arte na universidade; o artis-ta enquanto produtor de si; e disparidades regionais. O objetivo era trazer questes mais gerais e abstratas sobre a formao do artista contemporneo, indagando quem, como e para quem esto sendo for-mados os artistas, enfocando questes pouco enfocadas.

    JU: Qual a sua avaliao das discusses?Mariana: Acredito que existe hoje um

    retorno dos artistas academia. No se trata, porm, daquilo que ocorreu no pas-sado. Com o fim das academias de arte no final do sculo XIX, h atualmente uma re-academizao, no para aprender tcnicas especficas, mas para saber como construir um discurso sobre a prpria obra. Nossa

    Belo Horizonte / Paris, 2009-2014. Stpha-ne Vigny

    Sans titre (assiette) consiste num prato decorativo de cermica quebrado e refei-

    to em seguida, colado maneira museolgica utili-zando chicletes. ...pratos que eu vi na casa da sua me, na parede da sala, que tambm existem aqui na Frana. Esta mutao de um objeto funcional em objeto decorativo me pareceu curiosa. Foi pra mim uma surpresa feliz me dar conta que este tipo de prtica decorativa poderia ter uma dimenso universal, se pensa que sempre se trata de uma coisa muito localizada que pertence a uma nica regio do mundo. Eu penso que o fenmeno local o mesmo em todos os lugares e que a nossa concepo do universal que difere. (Iluminuras 3. Belo Horizonte: nunc, 2013). A sentena de Vigny reverte a ordem com que geralmente pensamos a dialtica entre universal e local. Assim entendido, seriam as nossas projees de universalismo, im-plicando em projetos, expectativas e domnios, o grande fator de diferenciao. Pratos decorativos estampam pinturas de cenas alpinas, europeias,

    de suposto refinamento. Fornecem dados sobre noes de bom gosto e imaginrio colonizado. O gesto de quebrar e recompor esse objeto com precariedade pode ser lido em dilogo com duas importantes matrizes culturais brasileiras, a an-tropofagia e a gambiarra, sob a perspectiva de um artista estrangeiro.

    Ouro Preto MG, 2011. Advnio LessaPensar a arte contempornea como um fenme-

    no sempre, necessariamente, contextual. Durante as viagens pelo Programa Rumos Artes Visuais, procuramos rearticular nossas sensibilidades a cada contexto visitado. Qual ideia e prtica de arte

    contempornea construda em cada circunstn-cia, complexa, singular? A obra de Advnio Lessa me desmobilizou, meu vocabulrio no alcanaria a potica de um artista que produzia objetos em escala humana com razes e madeiras ensinado pelas prprias rvores, por sonho. Sem conhecer Krajcberg ou qualquer referncia da histria da arte, o artista recebia mensagens da natureza so-bre como deveria trabalhar suas peas. Fiquei absolutamente seduzido.

    Porto Velho AC, 2011. Ueliton SantanaMe recordo quando vi o trabalho de Ueliton

    Santana, artista do Acre, formado no Peru. Sua pintura criou uma exigncia em minha aborda-gem. So telas grandes, muito coloridas, com voca-bulrio ecltico, oscilando entre referncias figu-rativas e estilemas abstratos diversos, temas que vo de retratos Santa Ceia. Mas o mais curioso que ele sempre espacializa as pinturas, se enrolan-do nas telas, criando circunstncias em seu ateli, pendurando em uma ponte ou tronco de rvore. A pintura dele desconhece, igualmente, o que possa significar especificidade do meio ou mesmo pin-tura expandida. outra coisa.

    Natal RN, 2013. Erik van der WeijdeSouvenir III um livro de artista que rene

    o arquivo de fotografias de prostitutas feitas por Erik, um holands que vive em Natal. Ele pede s mulheres que fiquem em posies estranhas, que transformam o corpo em objeto, algumas se sen-tem vontade pra posar, outras no. As imagens se distanciam de qualquer seduo. H uma crue-za que torna latentes as questes polticas levan-tadas pelo processo, entre submisso, autoridade, voyeurismo. Contudo, essa perverso s ganha consistncia por se tratar de um olhar estrangeiro.

    preciso pensar a arte contempornea como um fenmeno sempre contextual

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  • 3Junho 2014 Frum

    A ntegra deste artigo est disponvel no Debate acadmico do

    Portal Unesp, no endereo .

    Ueliton Santana dos Santos artista e professor de Arte no

    Instituto Federal de Educao, Cincia e Tecnologia do Acre (Ifac).

    {...}DCADAS DE 1960 e 1970

    Somente na dcada de 1960, com a criao do Estado do Acre, tero incio algumas mudanas no aspecto provinciano das cidades na regio. Em Rio Branco acontece, em 1967, a 1 Exposio de Pin-tura de Artistas Acreanos, promovida pelo jornal Correio do Oeste, com obras de Garibaldi Brasil [...].

    Mas ser na dcada de 1970 que as artes pls-ticas iro alcanar mais visibilidade, com exposi-es do prprio Garibaldi, de Rodolfo Bader e de Hlio Cardone. Em 1977, aps a I Exposio Acre-ana de Artes Plsticas, outros artistas iro se des-tacar, como: Francesco Di Giorgio, Raul Velsquez, Dalmir Ferreira, Gensio Fernandes, Jader Damas-ceno e Kasal, entre outros. Em 1979, acontece o I Salo Universitrio de Artes Plsticas, que teve a participao de Hlio Melo, Tristo Cavalcanti e Danilo de SAcre, entre outros. E, no incio da d-cada de 1980, acontece a II Exposio Acreana de Artes Plsticas, que destaca Janete Pacheco, entre outros. [...] Nesse perodo, vale destacar a atuao de dois artistas, Dalmir Ferreira e Hlio Melo.

    [...]

    DCADA DE 1980[...] Em 1988, criada a Associao de Artistas

    Plsticos do Acre, de que participam Gensio Fer-nandes, Hlio Melo, Babi Franca, Jorge Rivaspla-tas, Pricles Silva, Potysdan Pascoal, Maqueson, Thaumaturgo Filho, Cerezo e Nely Cruz. Tambm surgem os artistas Ivan Campos, Ccero Franca, Gesileu Salvatore, Paulo Flix, Valdenizio Rego, Jaqueline Mesquita, Pedro Arte, Glicrio Gomes.

    [...]DCADA DE 1990[...] Nesse momento, os principais expoentes so:

    Garibaldi Brasil, Rodolfo Bader, Hlio Cardone, Francesco di Giorgio, Gensio Fernandes, Jader Da-masceno, Carlo Mejido, Danilo de S'Acre e outros, e podemos ressaltar a importncia de Dalmir Ferrei-ra como pensador e estimulador das artes plsticas.

    [...] Alguns espaos so criados e outros so fecha-dos, como, por exemplo, o Museu de Belas Artes [...]. Outros artistas ainda jovens que surgem no perodo s ganharam destaque na dcada seguinte, como: Darci Seles, Jorfrannas, Enilson Amorim, Ueliton Santana,

    Artes pLsticAs No AcreUeliton Santana

    Edmilson Caetano, Marciony, Leila Jalul, Natalino Santos.

    ANOS 2000 [...]Com o apoio de instituies pblicas e privadas,

    diversos artistas se destacaram, como: Ivan Campos, Ccero Farias, Sales Pires, Gesileu Salvatore, Valdeni-zio Rego, Darcy Seles, Jorfrannas, Enilson Amorim, Luiz Carlos, Marco Lenzio, Ueliton Santana, Edmil-son Caetano, Eliane Rudey, Marciony, Natalino San-tos, Antonio Carlota, Paulo Flix, Carlos Henrique Amorim, Manoel Arte, Antnio de Alcntara (fotgra-fo), Janete Zaire, Glicrio Gomes, Aglaze Damasceno, Sanso Pereira, Nilcinha Jordo, Neli Cruz, Terezinha Monteiro, Jader Damasceno, Fernando da Silva, Fran-cisco de Assis, Celso, Leandro, Daniel Cabral, Cleanto Barbosa, Rosimar, Leila Jalul e Branco, entre outros.

    [...]. Nesse mbito, temos a criao do I Salo Hlio Melo de Artes Plsticas, em 2004 [...].

    [...]Pudemos ver nascer ainda a Usina de Arte Joo Do-

    nato [...]. Algumas aes da Funarte e Minc tambm trouxeram oficinas e cursos e exposies ao Acre [...]. A FAO Faculdade da Amaznia Ocidental abriu em 2006 o curso de Artes Visuais em Rio Branco [...].

    Nesse perodo, tivemos ainda a criao do Sa-lo dos Novos, criado para descoberta de novos ta-lentos, e o Cores da Cidade (concurso de arte em diversas categorias das artes visuais).[...]

    Outra ao que acredito ter tido uma relevncia foi a compra, em 2008, pela Assembleia Legislativa do Acre, de uma coleo de trabalhos de artistas acreanos para compor seu acervo [...] Nesse perodo, pudemos ver mais avanos, a Rede Acreana de Cul-tura publicou o portflio de Artes Visuais do Acre [...].

    Atualmente, temos funcionando um ponto de cultura no SESC, a AAPA [...] funciona com proje-tos e exposies, a Galeria Juvenal Antunes, espao da Fundao de Cultura e Comunicao Elias Man-sour, funciona recebendo exposies locais e nacio-nais [...] e funcionam ainda alguns espaos alterna-tivos em rgo pblicos e privados para exposio.

    Na paisagem de Rio Branco podemos citar a im-portncia da arte pblica, com alguns murais e escul-turas encomendadas pelo governo a artistas de outros Estados [...]. Ao mesmo tempo, sem o apoio do Estado, existe o avano do grafite nos muros de Rio Branco. [...]

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    Na dcada de 1970, artes plsticas tero mais visibilidade

    As artes visuais no Brasil seguem o modelo dos EUA e da Europa e, dentro do Brasil, o padro de So Paulo e Rio

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    proposta olhar para as artes visuais de uma forma autnoma. Diferentemente da msica, as artes visuais no Brasil seguem muito o modelo dos EUA e da Europa e, dentro do Brasil, seguem o padro de So Paulo e Rio de Janeiro. H fomento da arte no Norte e Centro-Oeste, por exemplo, mas feito a partir dos centros financeiros nacionais, que entendem como extico aquilo que diferente. preciso fazer ain-da uma pesquisa sobre esse entendimen-to do extico. Para muitos, por exemplo, o modernismo praticado no Brasil no arte brasileira, pois falta esse componente de exotismo. O modo como a arte brasileira vista no exterior merece anlise. Armando Queiroz, artista, curador e diretor da Casa das Onze Janelas, em Belm (PA), disse, no Seminrio, que Belm, por um lado, dese-ja estar isolada; mas, por outro, desperta a cobia de muitos outros locais. A questo que ser aquilo e se manter assim deman-da um certo afastamento dos outros.

    JU: Quais os prximos passos do Semi-nrio Longitudes?

    Mariana: O projeto continua no mes-trado. Pretendo dar desenvolvimento dia-logando com os participantes do evento, com entrevistas e novos pontos de vista. O essencial que o Seminrio mostrou uma caracterstica diferenciada, pois h muita discusso sobre mercado de arte, curado-ria e profissionalizao do artista, mas, pela primeira vez, uma discusso desse porte fala sobre a formao do artista.

    Oua entrevista completa em.

  • 4 Frum Junho 2014

    Kamilla Nunes

    Na tentativa de propor uma discusso sobre a atual situao dos espaos de formao volta-dos para as artes visuais em Florianpolis, fa-rei um breve apanhado histrico da formao

    do circuito artstico na capital. [...] Dos textos que pesquisei, que vo desde os artigos de

    jornal das dcadas de 1950 e 1960 aos textos de catlogos escritos por curadores e artistas, diretores de museus e presidentes de associaes, ou mesmo artigos recentes, como os escritos no livro Construtores das Artes Visuais: 30 artistas de Santa Catarina em 160 anos de expresso, sempre houve uma preocupao em apontar os momentos em que a arte produzida na capital obteve projees nacio-nais e/ou internacionais.

    [...]Houve uma sequncia de fatos marcantes que influen-

    ciaram a construo de espaos de formao e difuso da arte, pblicos e privados, na semirida Desterro. Em 1948 foi criado o MANF, Museu de Arte Moderna de Florian-polis, localizado no centro da cidade. [...] Na sequncia, houve o surgimento da UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, no final dos anos 50; a criao do GAPF, Grupo de Artistas Plsticos de Florianpolis, em 1958; o surgimento do MASC, que substituiu o MANF, em 1968; a destruio do sebo do escritor Salim Miguel durante a ditadura, onde os artistas compravam livros de arte, pol-tica, literatura e que funcionava tambm como um lugar de convivncia e aproximao entre escritores e artistas; a criao da Revista Sul, que fundou o modernismo no Estado; o surgimento de um modesto mercado de arte nos anos 60; o marasmo dos anos 70; a criao das Oficinas do CIC, Centro Integrado de Cultura; o momento em que Harry Laus assu-miu a direo do MASC e dinamizou a produo dos artistas; a fundao da ACAP; a criao do Ceart, Centro de Artes da Udesc em 1985; o Resumo 85, exposio organizada pelo artista plstico Janga, cujo propsito era propor novos olha-res para a produo de arte contempornea que estava sendo experimentada; [...] o ingresso da artista Doraci Girrulat no Ceart, cuja atuao como professora foi fundamental para a disseminao das abordagens contemporneas, a noo de trabalho coletivo e a performance.

    [...] fato que os anos 1980 foram marcados por um superaquecimento na produo de arte, caracterizada pela retomada da pintura. [...] Considero que no houve no Estado uma demarcao de territrio, uma vez que os artistas desenvolveram uma produo artstica indepen-dente, completamente desvinculada do mercado de arte e sem cair no chavo da pintura, aderido de forma quase unnime no mundo.

    As coisAs sAem de Ns Assim como Ns sAmos dAs coisAs

    Significa dizer que houve uma rica pesquisa das diversas linguagens artsticas, entre elas: cermica, tapearia, dese-nho, instalao, performance, gravura, escultura e pintura [...]. Foi a primeira vez na histria de Santa Catarina que se for-maram coletivos de artistas e que a produo no ficava ape-nas restrita aos atelis individuais, j que nesta poca foram criadas as Oficinas de Arte do Centro Integrado de Cultura. [...]

    Muitos dos artistas que tinham uma produo ativa e que fizeram parte das Oficinas de Arte so docentes do Centro de Artes da UDESC, que se tornou, desde os anos 1990, um dos principais responsveis pela formao dos agentes do circuito de artes visuais. Saliento aqui a im-portncia dos diversos circuitos de formao, encontro, difuso e espaos de/para arte. [...] No decorrer dos anos, muitos espaos, como museus, galerias e atelis foram en-cerrando suas atividades, fechando suas portas ou mesmo tornando-se obsoletos e/ou pouco representativos para o circuito artstico local.

    A crtica de arte, que chegou a ter quatro pginas inteiras em cadernos culturais, tambm perdeu seu espao para um jornalismo raso e de carter apenas informativo. Talvez te-

    nhamos voltado a respirar com a sacudida que o grupo Vaca Amarela propiciou cidade nos anos 2000, como uma rea-o ausncia de crtica local. No mesmo esprito de reao, desta vez ausncia de espaos para a arte contempornea, surgiu o 803 e 804, espao idealizado por Regina Melim, Raquel Stolf, Yiftah Peled e Edmilson Vasconcelos, localiza-do no j histrico Edifcio Dias Velho, no centro da cidade.

    [...]Gostaria de sugerir especial ateno a algumas inicia-

    tivas que, de alguma forma, contornaram essa ausncia de equipamentos pblicos para as artes e fizeram de suas casas espaos para contemplar a prtica experimental que surgia como potncia na ilha. Foi o caso do Projeto Contramo, idealizado pelas artistas Adriana Barreto, Bruna Mansani e Tamara Willerding. [...] Roberto Freitas tambm abriu as portas de sua casa com o Espao ARCO. [...] O artista Yiftah Peled, criou o espao Contemporo Es-pao de Performance, localizado na garagem de sua casa.

    Kamilla Nunes artista e curadora. Desenvolve pesquisa sobre

    espaos autnomos de arte contempornea no Brasil.

    A ntegra deste artigo est disponvel no Debate acadmico do Portal

    Unesp, no endereo: .

    Nos ltimos trs anos, j sem poder contar com qual-quer um dos espaos citados acima, podemos perceber que Florianpolis est bastante deficiente de espaos in-formais de formao. Alguns dos aspectos que colabora-ram para esse declnio crescente foram a falta total de in-centivo, por parte do governo e municpio, programao continuada dos espaos de arte privados com finalidades pblicas e, sobretudo, do apoio produo dos artistas atravs de editais pblicos; o encerramento do CIC e a ges-to retrgrada do presidente da Fundao Catarinense de Cultura, Joceli de Souza; a absoluta inexpressividade do Museu de Arte de Santa Catarina e do Museu Histrico de Santa Catarina como os dois principais equipamentos do Estado para as artes visuais.

    [...]Mas declarar a falncia dos espaos de formao no

    implica negligenciar os esforos individuais, e que atuam numa esfera provisria e efmera. Visto que necessrio limitar o nosso assunto de discusso, sugiro especial aten-o a dois projetos que propem exposio, venda, circula-o e formao: a TURN e a Duna. TURN foi um projeto criado por Fabio Morais, Mara Dietrich e Regina Melim que, desde 2012, realiza feiras de arte contempornea im-pressa e publicaes de artistas, por cidades do Brasil. [...]

    A Duna, feira de arte, cumpre um papel mais restri-to com relao a territrio, mas igualmente importante, uma vez que desta feira participam artistas de diversas geraes, alm de estar preocupada em criar ambientes de encontro entre as pessoas [...]. [...]

    [...] Vivemos em um tempo em que o discurso de cen-tro e periferia deixou de ser um paradigma e, at mesmo, uma disparidade, embora exista um sentimento de identi-dade que continua sendo perpassado por questes locais. Quem sabe seja mesmo um corte longitudinal o principal espao de formao do artista hoje. No mais um corte que tenta demarcar uma identidade nacional, um corte que parte do centro para as bordas, mas um corte que transborda e que marca as diferenas e semelhanas em face das relaes entre os indivduos.

    [...]

    Florianpolis est deficiente de espaos informais de formao

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