FORTALECIMENTO DAS INSTITUIÇÕES DE GOVERNAÇÃO EM...

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FORTALECIMENTO DAS INSTITUIÇÕES DE GOVERNAÇÃO EM TIMOR-LESTE

Abril de 2006

Este documento foi preparado pelo Banco Mundial a pedido do Governo de Timor-Leste e dos parceiros de desenvolvimento que apoiam o PAT / PAC. O Governo, os agentes no sistema de justiça e um conjunto de organizações da sociedade civil teceram comentários a respeito de uma versão anterior deste documento. Agradecemos a todos esses comentários. O Banco Mundial é o único responsável por esta versão final.

ABREVIATURAS E ACRÓNIMOS

CdM Conselho de Ministros CFJ Centro de Formação Jurídica CNE Comissão Nacional de Eleições CSMJ Conselho Superior dos Magistrados Judiciais CSMP Conselho Superior do Ministério Público DNAJL Direcção Nacional de Assessoria Jurídica e Legislação GIG Gabinete do Inspector-Geral GPG Gabinete do Procurador-Geral INAP Instituto Nacional de Administração Pública ITIE Iniciativa de Transparência das Indústrias Extractivas LDI Liberdade de Informação MI Ministério do Interior MJ Ministério da Justiça MPF Ministério do Plano e das Finanças NdP Normas de Procedimento ONG Organização Não Governamental PAT / PAC Programa de Apoio à Transição / Programa de Apoio à Consolidação PAuC Projecto de Autonomização das Comunidades PDN Plano de Desenvolvimento Nacional PMSJ Programa de Monitorização do Sistema Judicial PNTL Polícia Nacional de Timor-Leste PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento SECdM Secretaria de Estado do Conselho de Ministros STAE Secretariado Técnico de Administração Eleitoral TR Tribunal de Recurso UDEP Unidade de Deontologia e Ética Profissional UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância UNMISET Missão das Nações Unidas de Apoio a Timor-Leste UNOTIL Gabinete das Nações Unidas em Timor-Leste UNTAET Administração Transitória das Nações Unidas em Timor-Leste VBG Violência com Base no Género

Economista Chefe / Director de Sector: Homi Kharas Director para o País: Xian Zhu Gestor de Sector: Helen Sutch/Barbara Nunberg Grupo de Acção: Edith Bowles, Amanda Green, Adrian

Fozzard, Elizabeth Huybens (Líder do Grupo de Acção), Helen Sutch

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“Promover uma boa governação através da participação popular; um governo responsável e atento, incluindo uma função pública eficiente, responsável e transparente, assim como forças de polícia e de defesa eficazes, profissionais e apolíticas; uma administração descentralizada com normas simples e transparentes, de modo que a governação e a administração pública estejam mais próximas das pessoas; um sector privado socialmente responsável e organizações da sociedade civil capazes; e meios de comunicação social responsáveis, independentes e eficazes.” – Plano de Desenvolvimento Nacional de Timor-Leste

Introdução e Sumário Executivo

1. O Plano de Desenvolvimento Nacional de Timor-Leste (PDN) estabelece uma visão de um país democrático onde os recursos do estado são geridos de forma eficaz, transparente e isenta de corrupção, onde o primado do estado de direito é respeitado e onde os titulares de cargos públicos são responsáveis perante aqueles que os elegem ou nomeiam.

2. As realizações de Timor-Leste são notáveis. O ramo executivo do estado, o Governo, tem tido sucesso no estabelecimento de funções base de planeamento e gestão de recursos eficazes, transparentes e assentes no PDN, comparando-se muito favoravelmente com as de outros países com baixos rendimentos. O Governo desenvolveu acordos sólidos e transparentes para a recolha das receitas petrolíferas, salvaguardando o recurso mais importante do país, e garantindo que a riqueza sustentável só será gasta através do orçamento aprovado pelo Parlamento. Embora com um alcance e qualidade variáveis, o Governo também teve sucesso na prestação de serviços nos campos da saúde; educação; infra-estruturas e comunicações; e agricultura, florestas e pescas. Estes resultados foram conseguidos contra condicionalismos significativos, incluindo uma falta geral de qualificações técnicas e de gestão e uma falta de familiaridade com as instituições necessárias para administrar o Estado.

3. Aos quatro anos de existência do país, as instituições do estado fora do executivo começam a desempenhar um papel, embora o executivo continue mais forte que o Parlamento, a Magistratura, as instituições de fiscalização e a Presidência. As organizações dos meios de comunicação social e da sociedade civil também permanecem comparativamente fracas. Apesar de alguns progressos, há ainda muito a fazer para traduzir a arquitectura de governação estabelecida na Constituição em instituições funcionais e totalmente autónomas. Dada a relativa força do executivo, e de modo a garantir as verificações e equilíbrios previstos tanto na Constituição como no Plano de Desenvolvimento Nacional, o Governo poderá desejar considerar quais as medidas necessárias para fortalecer outras instituições. Estas medidas podem incluir a garantia de que instituições independentes têm orçamentos estatutários aprovados pelo Parlamento; a manutenção de canais de comunicação adequados; o respeito da separação de poderes; e a criação de um ambiente propício para os meios de comunicação social, sociedade civil e empresas. Isto fará com que as pessoas confiem que o Governo está a agir de uma forma justa e honesta. Para o fortalecimento da governação, o Governo poderá desejar considerar o uso e a demonstração de quatro princípios orientadores:

• Envio dos sinais adequados através de liderança e integridade nos níveis superiores;

• Relaxamento do controlo de forma a consolidá-lo – tranquilizando os cidadãos deixando as instituições de escrutínio e responsabilidade operarem de forma independente;

• Fortalecimento do estado de direito e dos processos devidos, incluindo um uso restrito e apropriado do monopólio e do poder coercivo do Estado; e

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• Contacto com a população de modo a poder responder melhor às prioridades a nível local.

4. Em qualquer executivo, a liderança é vital para a credibilidade da boa governação e dos esforços de combate à corrupção. Envia um sinal para o sistema como um todo que as pessoas devem seguir o nível estabelecido pelo topo, o que é particularmente importante num contexto onde nem todos os poderes constitucionais independentes estão já totalmente operacionais. A liderança de Timor-Leste declarou um forte empenho no combata à gestão indevida e à corrupção. É importante que esta determinação seja demonstrada por membros do Governo através de decisões isentas de conflitos de interesse e sujeitas aos mesmos níveis de desempenho, comportamento e procedimentos disciplinares aplicados ao resto da administração. O Gabinete do Inspector-Geral demonstrou uma maior capacidade para lidar com investigações internas, inspecções e auditorias, assim como no que diz respeito a colocar resumos dos seus relatórios em portais públicos na Internet. O Decreto-Lei de Aprovisionamento de Timor-Leste contém definições específicas de situações de conflitos de interesse. O Governo tem revelado capacidade nesta área no planeamento de um estudo de opções sobre instrumentos de integridade apropriados que podem incluir declarações de rendimentos e de activos para os principais agentes de estado. A Lei do Fundo Petrolífero já requer a todos os membros da Direcção de Assessoria de Investimento que forneçam declarações com essas características aquando da sua entrada em funções e no momento em que deixam o cargo.

5. Para concluir o conjunto constitucional pleno de verificações e equilíbrios é importante fortalecer a independência e a capacidade do Parlamento, da Magistratura, das instituições de fiscalização e da Presidência. Embora a constituição preveja claramente a separação de poderes, na prática o poder reside principalmente no Executivo. O Gabinete do Provedor de Direitos Humanos e Justiça irá dar aos cidadãos um canal constitucional para reportar e solicitar investigações a alegações de abusos. O Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas é a instituição indicada pela Constituição para desempenhar a função de auditor externo. Dado que a criação deste tribunal não é viável a médio prazo, o Tribunal de Recurso planeia assumir a responsabilidade pela gestão da função de auditoria interna como uma medida interina legítima em termos constitucionais. Todas as instituições independentes terão de ser devidamente financiadas e – reflectindo a sua independência – o ideal será que os seus orçamentos sejam apresentados directamente ao Parlamento ou de outro modo protegidos contra cativações.

6. Será igualmente importante fomentar o desenvolvimento de uma imprensa livre e independente e de uma sociedade civil forte. No estabelecimento de um novo Código Penal para Timor-Leste, o Governo poderá desejar evitar a criminalização da difamação, criando uma lei civil sobre difamação com as devidas sanções. A boa prática internacional sugere que a regulamentação de organizações não governamentais e de outros grupos da sociedade civil deverá encorajar a transparência e a responsabilização, incluindo requisitos de divulgação de informações, gestão financeira apropriada e prevenção de conflitos de interesses. Ao mesmo tempo é importante proteger as liberdades fundamentais, tais como a capacidade para mobilizar financiamentos e a independência em relação a interferências do governo, sem que com isso se criem barreiras pouco razoáveis ao registo.

7. A garantia do primado do estado de direito e o uso apropriado e consistente do poder coercivo são pilares de uma boa governação. É essencial que todos os cidadãos sejam tratados de forma imparcial, independentemente da sua filiação partidária. O emprego de profissionais legais internacionais veio melhorar significativamente o funcionamento do fraco sistema de justiça de Timor-Leste, mas esta só pode ser uma medida interina. Todos os tribunais

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de distrito estão operacionais, embora fortemente dependentes do Gabinete das Nações Unidas em Timor-Leste (UNOTIL) no que se refere a assistência logística.1 É necessária com urgência atenção continuada à formação e ao fortalecimento institucional para que seja possível manter estas melhorias. A independência e a capacidade do Gabinete do Procurador-Geral têm também de ser reforçadas, e o primado do estado de direito será fortalecido através da melhoria das funções administrativas da polícia e exército, assim como da criação de mecanismos eficazes de fiscalização por parte da população civil.

8. O Estatuto da Função Pública de Timor-Leste, aprovado em meados de 2004, fornece um quadro essencial para o desenvolvimento da função pública, mas aguarda a passagem de normas implementadoras, incluindo aquelas necessárias para dar pleno efeito ao código de conduta e ao código disciplinar. Serão necessárias normas e legislação suplementares para especificar procedimentos justos e correctos de recrutamento e administração, definir os limites da actividade política para empregadores e empregados públicos, clarificar acordos institucionais, e estabelecer directivas referentes a actos criminais. Assim que a Lei Orgânica do Gabinete do Inspector-Geral (GIG) tiver sido aprovada, o GIG e os inspectores correspondentes em cada ministério serão capazes de tomar a iniciativa na investigação de casos de más-práticas administrativas, reforçada quando possível por informações de gestão fornecidas pela auditoria interna. Os casos de corrupção aparente à primeira vista poderão ser transmitidos ao Provedor assim que seja estabelecida capacidade suficiente no Gabinete, sendo os casos criminais aparentes transmitidos directamente ao Procurador-Geral. A má-prática criminal e a corrupção deverão ser abrangidas pelo Código Penal, o qual deverá incluir definições de suborno, tráfico de influências e outros crimes de corrupção, juntamente com a provisão das sanções. Antes da implementação plena do Estatuto da Função Pública será aconselhável estabelecer regras de base claras para as sanções administrativas e transmissão judicial, aplicando-as de forma consistente a todos os membros da administração pública.

9. O alcance de vários sectores, dentro e fora do governo, é vital para fomentar o apoio público. A informação e a consulta são as chaves para o desenvolvimento de confiança num governo sábio, tal como ficou demonstrado pela resposta positiva dos meios de comunicação social e da sociedade civil à publicação de relatórios e recomendações do Gabinete do Inspector-Geral no seu portal na Internet, o qual foi lançado em Agosto de 2005 (www.inspeccaogeral.gov.tl). Informações mais acessíveis sobre o orçamento e operações do Governo irão reassegurar o eleitorado e ajudar no desenvolvimento de um debate construtivo. O Governo pode publicar propostas de legislação aquando do seu envio ao Parlamento, de modo a informar o público e a encorajar uma discussão disseminada. Um aspecto importante a ter em conta é que o Gabinete do Provedor identificou a necessidade de estudos sobre corrupção. Em face dos rumores de corrupção e gestão indevida, os estudos para estabelecer uma linha base para o tipo e incidência de corrupção serão úteis na localização de áreas de alto risco, bem como na identificação das instituições que merecem confiança e que são funcionais, podendo assim servir como modelos a partir dos quais outras podem aprender. As informações dos estudos serão um passo importante para dissipar rumores e fornecer uma base factual para alterações em políticas e práticas, necessárias para combater a corrupção. Para lá disto, o Governo poderá desejar explorar mecanismos para incluir comunidades e beneficiários na monitorização da prestação de serviços e, com salvaguardas apropriadas, assumirem responsabilidades na gestão de alguns recursos públicos.

1 A UNOTIL substituiu a Missão das Nações Unidas de Apoio a Timor-Leste (UNMISET) em Maio de 2005, estando previsto que se retire em Maio de 2006.

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10. Em face da redução continuada dos números de assessores internacionais, torna-se cada vez mais vital construir instituições credíveis que os timorenses possam gerir e operar. Embora a capacidade continue a ser um défice óbvio e compreensível, este documento sugere que a boa governação não precisa de esperar pela criação de uma maior capacidade. A boa governação está relacionada com uma liderança forte e credível, com a adesão a normas claras e com a abertura na resposta a escrutínios externos. Caso as funções básicas de orçamento e da função pública estejam a funcionar bem, os serviços irão funcionar, e se o monopólio do Estado sobre o poder coercivo for usado de uma forma restrita e legal, os cidadãos sentirão que podem confiar no Estado. A experiência internacional mostra que regimes honestos e abertos podem ter sucesso mesmo que não sejam tecnologicamente sofisticados ou dotados de pessoas com qualificações elevadas. Esta conclusão é encorajadora para o futuro de Timor-Leste.

11. O restante deste documento discute o Quadro de Governação de Timor-Leste, o Processo de Tomada de Decisões, a Necessidade de uma Administração Pública Responsável e com Capacidade de Resposta, Isenta de Corrupção, o Fortalecimento do Controlo Interno, a Melhoria do Acesso à Justiça, a Criação de Mecanismos de Fiscalização Independentes, e a Garantia do Acesso do Público à Informação. Os quatro princípios orientadores estabelecidos no parágrafo 3 deverão moldar acções em cada um destes domínios da boa governação. Em cada secção, o documento fornece sugestões para novas acções.

Quadro de Governação

12. A Constituição de Timor-Leste prevê as verificações e equilíbrios essenciais, as salvaguardas dos direitos dos cidadãos, e a separação de poderes. O sistema de verificações e equilíbrios começa a tornar-se eficaz. Por exemplo, em 2005 o Presidente vetou uma lei controversa sobre associação e transmitiu a lei ao Tribunal de Recurso para determinar a sua constitucionalidade. O Tribunal concluiu que determinadas provisões eram inconstitucionais, tendo a lei sido devolvida ao Parlamento, o qual subsequentemente passou uma versão emendada. Também em 2005, pela primeira vez, um caso de corrupção na função pública foi objecto de acção criminal. Ainda assim há alguns elementos do quadro de governação por criar, incluindo o Conselho Superior do Ministério Público, o Supremo Tribunal e o Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas.

Caixa 1: Instituições do Estado Previstas na Constituição da RDTL Gabinete do Presidente – estabelecido

Conselho de Estado – estabelecido Conselho Superior de Defesa e Segurança – estabelecido

Governo – estabelecido Parlamento – estabelecido. O Parlamento conta de presente com 88 membros, com base nas eleições para a Assembleia Constituinte, mas este número será eventualmente reduzido, de acordo com a estipulação constitucional de que o Parlamento terá entre 52 e 65 membros. Tribunais e Magistratura – estabelecido

Conselho Superior de Magistratura – estabelecido Supremo Tribunal – ainda não estabelecido

Tribunal de Recurso – estabelecido Tribunais de Distrito de Díli, Baucau, Suai e Oecussi – estabelecidos

Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas – ainda não estabelecido Tribunais Militares – ainda não estabelecidos Tribunais Marítimos e Tribunais de Arbitragem – previstos como possibilidade segundo a Constituição; ainda não estabelecidos

Gabinete do Procurador-Geral Conselho Superior do Ministério Público – em curso

Gabinete do Provedor – Provedor e adjuntos nomeados, Gabinete inaugurado em Março de 2006.

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13. Embora o sistema de verificações e equilíbrios esteja cada vez mais eficaz, o Governo continua a ser a instituição mais forte do país. Estabeleceu funções eficazes e transparentes de planeamento básico e de gestão de recursos, que se comparam favoravelmente com as de outros países com baixos rendimentos. Um facto relevante é a adopção por parte de Timor-Leste de um forte quadro regulador para garantir o uso transparente e sustentável das receitas petrolíferas através do orçamento nacional aprovado pelo Parlamento (Caixa 2). Ainda assim, existem fraquezas na capacidade nacional que tornam o sistema vulnerável em face da partida dos assessores internacionais, conforme indicado por uma avaliação recente do Ministério do Plano e das Finanças (MPF). Reconhecendo esta vulnerabilidade, o Governo colaborou com os parceiros de desenvolvimento, incluindo o Banco Mundial, na criação de um Programa de Capacitação de Planeamento e Gestão Financeira a cinco anos, envolvendo vários parceiros de desenvolvimento. Centrado no Ministério do Plano e das Finanças, o programa irá apoiar o planeamento e a gestão financeira também noutros ministérios. O programa visa fortalecer a capacidade de forma sustentável, através da melhoria de qualificações e conhecimentos, sistemas e processos, e atitudes e comportamentos, com um planeamento cuidadoso em termos de recrutamento e de sucessão, de modo a garantir que o desempenho não continua a ser minado por lacunas vitais em termos de funcionários.

Caixa 2: Garantia da Governação Prudente das Receitas do Mar de Timor Ao longo das próximas duas décadas, Timor-Leste deverá receber muitas dezenas de milhares de

milhões de dólares provenientes de receitas do petróleo e do gás do Mar de Timor. Embora esta benesse vá trazer os recursos vitais que permitirão ao Governo financiar investimentos e serviços essenciais para o desenvolvimento, irá também colocar um conjunto importante de desafios à governação.

A experiência internacional sugere que os países ricos em recursos naturais são particularmente susceptíveis ao desperdício e à corrupção, conforme se pode ver pelos desempenhos consistentemente inferiores em termos de crescimento e redução da pobreza comparativamente a nações pobres em recursos. A concentração de recursos num só sector cria oportunidades para pagamentos irregulares e especulativos, retirando assim fundos públicos à prestação de serviços e ao investimento. Rendas altas de recursos naturais tendem a enfraquecer a responsabilização perante os contribuintes, em especial quando a base fiscal é baixa, como é o caso em Timor-Leste, e quando os impostos não petrolíferos são uma pequena parte das receitas. A abundância relativa de recursos financeiros pode encorajar governos a gastar mais do que o devido, e a gastar em áreas que de outro modo seriam consideradas ineficazes. Em resposta a estes potenciais perigos à governação, Timor-Leste deu passos importantes para promover a gestão prudente das suas receitas de recursos naturais.

Apesar da dificuldade política de pôr de lado poupanças, em face das muitas necessidades de desenvolvimento de Timor-Leste, os líderes de Timor-Leste demonstraram empenho em garantir a sustentabilidade do uso das receitas para as gerações futuras. Isto é particularmente importante em Timor-Leste, uma vez que está previsto que as receitas dos actuais campos petrolíferos durem apenas algumas décadas.

Timor-Leste seguiu inicialmente uma política provisória de poupanças, até meados de 2005, altura em que o Parlamento aprovou a Lei Petrolífera, a Lei de Tributação Petrolífera e, unanimemente, a Lei do Fundo Petrolífero. Estas leis garantem o quadro essencial para a produção petrolífera e para a gestão das receitas de forma consistente com a boa prática internacional:

a) Em conformidade com o princípio da equidade entre gerações, todas as receitas petrolíferas e retornos de investimento serão depositados no Fundo Petrolífero e guardados para as gerações futuras. O Governo planeia usar apenas os rendimentos sustentáveis, de modo a preservar o valor real da riqueza petrolífera dispersando as despesas através de um horizonte de tempo infinito, salvaguardando um orçamento sustentável para a perpetuidade. O Fundo Petrolífero foi estabelecido em Setembro de 2005, com USD 204.6 milhões de poupanças acumuladas desde 2000.

b) As despesas do Fundo serão integradas no processo orçamental. As transferências a partir do Fundo só podem ser feitas para uma conta designada do Governo, e o total das transferências num dado ano fiscal não pode exceder um tecto estabelecido pelo Parlamento como parte da aprovação do orçamento regular. As despesas são executadas através do Tesouro e registadas como parte do reporte consolidado do Governo. Os valores das receitas e das despesas estão disponíveis ao público, sendo que a Lei do Orçamento e auditorias externas regulares evitam a apropriação indevida de fundos.

c) Os activos são geridos de forma prudente em investimentos seguros no estrangeiro protegidos dos riscos da economia doméstica. Embora o MPF tenha a responsabilidade global, a gestão operacional

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pertence à Autoridade Bancária e de Pagamentos (ABP). Os investimentos feitos pelo Fundo serão supervisionados por gestores profissionais de investimentos. Em finais de 2005 foi estabelecida uma Direcção de Assessoria de Investimento com o intuito de aconselhar o Governo a respeito de investimentos do Fundo.

d) Foram estabelecidos mecanismos de governação para garantir a transparência e a responsabilização, incluindo a publicação atempada de relatórios trimestrais e de declarações financeiras anuais. O Parlamento deverá nomear um Conselho Consultivo independente para prestar conselhos em matérias relacionadas com o Fundo. Serão levadas a cabo auditorias externas independentes por uma firma de contabilidade reconhecida a nível internacional, e os relatórios de auditoria serão adaptados a um formato acessível ao público. O Governo também criou um portal na Internet para divulgar o regime legal, os acordos de transparência e os relatórios financeiros (www.transparency.gov.tl).

e) Reconhecendo a importância de os cidadãos entenderem o regime de poupanças e as medidas de governação, o Governo levou a cabo uma série de consultas públicas por todo o país a respeito do Fundo Petrolífero. O Parlamento realizou vários seminários para os seus membros a respeito do regime legal e da gestão transparente e sustentável dos recursos petrolíferos do país.

f) O Governo e os parceiros de desenvolvimento estão a trabalhar com vista a garantir o apoio necessário em termos de assessoria internacional, combinado com a capacitação das contrapartes timorenses.

g) Timor-Leste aceitou participar na Iniciativa de Transparência das Indústrias Extractivas (ITIE). O país já estava a gerir as suas receitas petrolíferas de acordo com alguns dos princípios subsequentemente adoptados pela ITIE bem antes do lançamento da ITIE em 2002.

h) O Governo de Timor-Leste estabeleceu medidas para a gestão sustentável e transparente das receitas petrolíferas de Timor-Leste. Em última instância, o seu sucesso irá depender de uma sistema funcional de gestão das despesas públicas e da eficácia de todas as verificações e equilíbrios previstos na Constituição.

14. O fortalecimento da separação de poderes é uma prioridade elevada. Em contraste com as realizações do Executivo, os outros poderes constitucionais são relativamente fracos ou ainda não foram criados. Deste modo, o Governo conseguirá uma confiança alargada através da assistência ao fortalecimento das instituições restantes, incluindo o Parlamento, a Magistratura e a Presidência, ao mesmo tempo que respeita a sua autonomia. Juntamente com a consulta e a partilha de informações, a instituição destes mecanismos constitucionais para escrutínio interno irá fomentar a procura de boa governação. O estabelecimento do Conselho Superior do Ministério Público e, em devido tempo, do Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas, são importantes para concluir a arquitectura de verificações e equilíbrios prevista na Constituição. Os tribunais estabeleceram um acordo interino apropriado através do qual o Tribunal de Recurso assumiu as responsabilidades do Supremo Tribunal. Todas as instituições independentes deverão ser financiadas de forma adequada, incluindo o recém estabelecido Gabinete do Provedor, e – reflectindo a sua independência – será preferível que os seus orçamentos sejam aprovados directamente pelo Parlamento. Será uma prioridade elevada criar contas avançadas para estas instituições, uma vez que de presente estão condicionadas pela falta dos fundos necessários para as suas operações diárias.

15. Em Outubro de 2005 Timor-Leste concluiu com sucesso as suas primeiras eleições desde a restauração da independência, referentes às autoridades locais. Os resultados finais têm ainda de ser autenticados pelo Tribunal de Recurso na maior parte das localidades. Apesar de várias irregularidades menores devidas em grande parte à inexperiência dos funcionários eleitorais, as eleições foram consideradas livres e justas. As eleições são fiscalizadas por um órgão de supervisão eleitoral, conforme estipulado na Constituição. No caso das recentes eleições locais o órgão de supervisão foi a Comissão Nacional de Eleições (CNE), um órgão com 13 membros a ser constituído sempre que há uma eleição. Os membros da CNE são nomeados pelo Presidente, Parlamento, Governo e Magistratura. Um órgão permanente de apoio técnico, o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE), leva a cabo a organização e a administração das eleições. Um aspecto importante a ter presente é que as eleições recentes possibilitaram a aquisição de uma experiência fundamental.

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16. Antes das eleições Parlamentares e Presidenciais de 2007 é necessário fortalecer o sistema eleitoral. De forma a garantir a credibilidade e a legitimidade do processo eleitoral, será necessário decidir várias questões políticas importantes antes da redacção da lei eleitoral para as próximos eleições, as quais idealmente deverão ter lugar após discussões alargadas envolvendo todos os partidos políticos. Em particular, existem várias questões em torno do sistema eleitoral: deverão as eleições Presidencial e Parlamentar ser realizadas no mesmo dia; será que se irá manter a mistura de 2001 de representação proporcional e primeiro-a-passar-o-posto; e quantas constituências haverão? O processo de redacção legislativa e consulta política terá de ter início em breve, visto que os novos cartões de eleitor segundo a lei terão de ser emitidos antes das eleições, e este processo deverá levar muitos meses. De igual modo, para ser eficaz a CNE necessita de mais recursos, mais pessoal e mais formação. Poderá ser útil alargar a CNE para as eleições nacionais, com os membros da comissão a terem licenças sabáticas pagas dos seus empregos normais. Em face da lentidão do sistema judicial, poder-se-á considerar o fortalecimento do poder de tomada de decisões da CNE. Antes das eleições poderá considerar-se a revisão das provisões no novo Código Penal de Timor-Leste relativamente a crimes eleitorais. Por exemplo, de momento o código criminaliza a publicidade eleitoral ilegal, mas não criminaliza o impedimento de uma assembleia legal. Também não criminaliza a violação da imparcialidade por parte dos elementos junto das urnas de voto. Por fim haverá necessidade de pareceres legais continuados, idealmente prestados através de assistência da Divisão de Assistência Eleitoral do Departamento de Assuntos Políticos das Nações Unidas.2

Caixa 3: Acções Sugeridas • Garantir que o Gabinete do Provedor está em pleno funcionamento • Criar o Conselho Superior do Ministério Público • Criar uma função de auditoria externa credível sob o Tribunal de Recurso • Solicitar ao Parlamento que crie o Conselho Consultivo para o Fundo Petrolífero • Garantir o financiamento adequado das instituições constitucionais independentes com orçamentos

aprovados directamente ou protegidos pelo Parlamento, assim como a provisão, pelo menos, de contas de avanço.

• Iniciar discussões políticas amplas em preparação da elaboração da lei para as eleições Presidenciais e Parlamentares de 2007

Melhoria do Processo de Tomada de Decisões

17. Uma consulta ampla a nível político assegura a transparência e o desenvolvimento de políticas apropriadas e implementáveis no contexto de Timor-Leste. O PDN inclui entre as suas metas “Aumentar a participação dos cidadãos na vida pública e nacional.” A consulta durante o processo de desenvolvimento de políticas constitui uma oportunidade importante para a participação dos cidadãos e para o desenvolvimento de políticas sólidas. Em alguns casos será também importante consultar profissionais relevantes, tais como enfermeiros ou professores. A consulta sobre políticas ou legislação que afectam todo o país, bem como as gerações futuras, poderá incluir uma secção transversal ampla da população. Dado o tempo necessário e as complexidades técnicas inerentes à redacção legislativa, os ministérios poderão desejar considerar o uso de instrumentos alternativos de política, de modo a que a implementação não seja atrasada enquanto se aguarda a redacção e a aprovação de legislação (Caixa 4). Poderá também ser importante partir da boa prática, desenvolvimento primeiro procedimentos administrativos e passando depois para a legislação com base na experiência. Por fim, não só a legislação tem origem no Governo, como pode ser introduzida pelo Parlamento ou pela sociedade civil. Até à data já algumas leis tiveram origem ou estão a ser desenvolvidas no 2 Missão de Avaliação de Necessidades: Timor-Leste, Divisão de Assistência Eleitoral, Departamento de Assuntos Políticos, ONU, Dezembro de 2005.

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Parlamento, incluindo a proposta de Estatuto dos Combatentes da Libertação Nacional e a proposta de Estatuto de Advogados Privados. Uma consideração completa e igual das leis propostas por todas as fontes pode aumentar o sentimento de pertença dos cidadãos e a participação destes no processo legal.

Caixa 4: Instrumentos Alternativos para a Legislação Parlamentar Normas de procedimento regendo os passos que os agentes devem dar na condução de processos administrativos específicos Normas práticas indicando as práticas que devem ser seguidas pelos agentes de modo a tornarem um esquema estatutário funcional ou eficaz Instruções (a partir de um nível superior da hierarquia oficial) indicando quem deverá exercer determinados poderes administrativos, e de que modo esses poderes deverão ser exercidos Guias interpretativos indicando de que modo as pessoas afectadas por poderes estatutários podem esperar que esses poderes sejam exercidos Direcções prescritivas indicando as acções que as pessoas afectadas deverão tomar de modo a cumprirem as normas estatutárias Recomendações prestando orientação em relação a acções apropriadas com vista à implementação de objectivos políticos específicos Códigos de Conduta prescrevendo directivas ou padrões de acção ou comportamento em contextos específicos Códigos voluntários (adoptados por órgãos do sector privado) de autoregulação em matérias específicas Fonte: Patchett, Keith. Preparação, Redacção e Gestão de Projectos Legislativos. PNUD, 2003.

18. A experiência internacional mostra que o desenvolvimento de políticas e modalidades de implementação, acompanhado por consultas, é a melhor forma de preceder a legislação, com vista a concretizar as características da “boa” legislação apresentadas na Caixa 5. Até aqui, muitas das leis de Timor-Leste têm sido adoptadas sem referência às circunstâncias e condicionalismos prevalentes, assim como à definição de políticas para os corrigir. Infelizmente isto tem muitas vezes levado à adopção de leis mais ou menos “saídas da prateleira” que vigoram em países com desafios muito distintos daqueles que se colocam a Timor-Leste. Existe ainda o risco de que tal legislação possa pressupor a existência de instituições de implementação cuja criação e manutenção teriam um custo proibitivo para o Governo, ou que requeira um nível de capacidade de que Timor-Leste ainda não dispõe.

Caixa 5: Características da “Boa” Legislação 1. Atinge os seus objectivos 2. Financeiramente viável; acessível; os benefícios justificam os custos 3. Praticável em termos operacionais; eficaz no que toca à gestão e à aplicação 4. Com boas possibilidades de ser aceite e razoavelmente cumprida pelo público 5. Com aplicação previsível e estável; sendo improvável que surjam consequências imprevistas ou

indesejáveis 6. Restrições à comunidade proporcionais aos benefícios pretendidos; justa na sua aplicação e entre

diferentes grupos 7. Sólida em termos legais; consistente com a Constituição, Tratados e leis existentes 8. Redigida de forma clara e fácil de compreender, em especial para os afectados ou interessados 9. Publicada de forma pronta e facilmente acessível Fonte: Patchett, Keith. Preparação, Redacção e Gestão de Projectos Legislativos. PNUD, 2003.

19. O desenvolvimento da Lei que cria o Gabinete do Provedor e da política e legislação na área das terras e propriedades fornecem excelentes exemplos de sequenciação e consulta de conteúdos. No caso da primeira, foi levado a cabo um processo de consulta ampla com a comunidade timorense e peritos internacionais quando a legislação estava ainda na fase de desenvolvimento, o que permitiu alterações à redacção e a educação da comunidade a respeito

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do futuro papel do Provedor. No último caso, a Direcção de Terras e Propriedades do Ministério da Justiça desenvolveu políticas básicas, conduziu investigações a nível comunitário sobre a adequação das políticas, e usou estas investigações para informar o conteúdo da política e da legislação. Outros exemplos incluem as consultas disseminadas e minuciosas sobre o Fundo Petrolífero e sobre o Congresso Nacional de Educação, a qual precedeu a redacção da Política Nacional de Educação (Caixa 6). Para lá disto, em 2004 as consultas com a duração de um mês que envolveram mais de 8.000 pessoas levadas a cabo pelas comissões de veteranos forneceram a base para a proposta de Estatuto dos Combatentes da Libertação Nacional. A melhoria dos esforços de consulta na fase de desenvolvimento político não acrescentará muito aos custos do Governo no que toca ao desenvolvimento de políticas e legislação, mas será muito útil em termos da geração de boas leis e do entendimento por parte da população.

Caixa 6: Exemplos de Consultas Bem Sucedidas – O Congresso Nacional de Educação e a Consulta Nacional e Internacional sobre o Regime Petrolífero

Em Outubro de 2003 o Ministério da Educação, Cultura, Juventude e Desporto organizou o Congresso Nacional de Educação como precursor da redacção da Política Nacional de Educação. A preparação do Congresso foi orientada por uma Comissão de Orientação composta pelo Ministério, outros intervenientes nacionais importantes, incluindo a Igreja e o Instituto Nacional de Linguística, e parceiros de desenvolvimento. O Congresso foi preparado de forma meticulosa por 9 grupos de trabalho, incidindo na educação básica; educação secundária e vocacional & técnica; educação superior; educação não formal e alfabetização; currículos; formação de professores; língua de instrução; participação comunitária e envolvimento do sector privado; e financiamento da educação. Os grupos de trabalho incluíram representantes do Governo, da Igreja, ONGs nacionais e internacionais e outros intervenientes da sociedade civil. Cerca de 600 professores, directores, pais e outros intervenientes, representando escolas em todo o território, participaram na conferência de 3 dias em Outubro. Os 9 temas foram discutidos em pequenos grupos, tendo sido formuladas recomendações para o Ministério, as quais foram discutidas em sessões plenárias. As recomendações do Congresso formam a base da Política de Educação que está de presente a ser considerada pelo Conselho de Ministros. Noutro caso de consultas bem sucedidas, o Gabinete do Mar de Timor do Governo de Timor-Leste levou a cabo consultas a nível nacional e internacional sobre a sua proposta de novo regime petrolífero em 2004-2005. O processo teve início em Agosto de 2004 com uma consulta pública intensiva de 3 dias em Díli, com o intuito de explicar de que forma a indústria funcionava, antes de avançar para a proposta do Governo referente à sua regulamentação. A consulta abrangeu a proposta de Lei Petrolífera, a proposta de Contrato de Partilha da Produção e a proposta de Lei de Tributação Petrolífera. Em Outubro foi organizada uma reunião distinta, em Díli, que tratou da proposta de Lei do Fundo Petrolífero. As reuniões de Díli foram presenciadas sobretudo por ONGs e pelos meios de comunicação social. Foram seguidas por comunicações semelhantes em todos os 13 distritos, presenciadas por 50 a 60 líderes comunitários cada uma. O Gabinete iniciou também um programa de realização de comunicações em todos os centros de subdistrito, com incidência nas negociações do Mar de Timor e no Fundo Petrolífero. Muitos dos líderes locais que participaram nestas reuniões caminharam 4 horas ou mais a pé para estarem presentes. As consultas também atraíram empresas e intervenientes internacionais. Todas as propostas de leis foram afixadas no portal do Gabinete do Mar de Timor na Internet (www.timorseaoffice.gov.tl/). Os intervenientes internacionais foram notificados da existência das propostas e convidados a tecer comentários. Por fim, o Governo reuniu-se com empresas para discutir as preocupações e comentários destas. Estas consultas geraram comentários escritos por parte de instituições, ONGs e empresas internacionais, sendo que todos estes foram tornados públicos, com base numa sugestão de ONGs numa das reuniões iniciais. Alguns dos comentários foram levados em conta na finalização das leis.

20. A institucionalização do programa legislativo irá apoiar as prioridades do Conselho de Ministros e promover a consulta. De acordo com as recentemente modificadas Normas de Procedimento (NdP) para o CdM, a Secretaria de Estado do Conselho de Ministros (SECdM) estabelece o programa legislativo anual para cada ano fiscal. No AF de 2006, pela primeira vez, a SECdM estabeleceu uma lista de políticas e de legislação que se espera venha a ser apresentada ao CdM no curso do ano. A lista foi elaborada em consulta com os ministérios operacionais, com a SECdM a desempenhar um papel na prioritização. Este é um passo importante, visto que nos anos anteriores não houve essa coordenação e prioritização, sendo que

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os ministérios operacionais decidiam por omissão quais as políticas e legislação a serem apresentadas. Partindo deste passo, a SECdM poderá desejar desenvolver directivas para informação, consulta e redacção de procedimentos, conforme previsto pelas novas Normas de Procedimento.

21. A institucionalização de mecanismos de redacção e revisão legislativas irão garantir a harmonização no desenvolvimento do corpo de lei. A Direcção Nacional de Assessoria Jurídica e Legislação (DNAJL)3, no seio do Ministério da Justiça (MJ) está legalmente mandatada para redigir legislação, conduzir estudos, emitir opiniões e no geral prestar contribuições técnicas à elaboração de legislação. Na prática, a redacção legislativa em si tem lugar dentro dos ministérios, muitas vezes com a assistência de assessores internacionais. As leis são por norma submetidas à DNAJL para revisão. Reconhecendo a necessidade de outro mecanismo para garantir a consistência legal, o Governo criou também uma Comissão de Harmonização sob a SECdM com a finalidade de rever todas as leis orgânicas de modo a garantir que não se contradizem entre si e que não contradizem a Constituição. Um desafio para esta comissão passa por garantir que a legislação vital, tal como a Lei Orgânica para o GIG, é revista atempadamente e que não é empatada durante longos períodos pelo processo de revisão.

22. Em face da sua dimensão e dos seus parcos recursos legais, Timor-Leste poderá desejar considerar o modo de reforçar a redacção legislativa. De presente tanto a DNAJL como a SECdM desempenham um papel no processo de redacção legal. Pode-se considerar o fortalecimento quer da DNAJL quer da SECdM como a instituição central de redacção legal, ao invés de delegar a preparação da legislação em grande medida nos ministérios operacionais, tal como é prática corrente. Sob um sistema com estas características, o desenvolvimento de políticas poderá ter lugar em ministérios, os quais, quando for necessário um processo legislativo, poderão apresentar a política ao órgão central para redacção. Assim que a proposta de legislação esteja preparada, poderá ser enviada de volta ao ministério relevante para efeitos de revisão técnica. Visto que será necessária assistência técnica internacional para a redacção legislativa durante o futuro possível de ser previsto, esta assistência poderá ser colocada na instituição central, sendo atribuída assistência técnica para o desenvolvimento de políticas a ministérios individuais. Uma diferenciação clara das responsabilidades de desenvolvimento de políticas e de redacção legislativa, assim como a criação de um mecanismo estabelecido para redacção e revisão legislativas, serão importantes para a harmonização entre projectos legislativos.

23. O fortalecimento da revisão legislativa e da capacidade de redacção do Parlamento irá melhorar a qualidade da legislação, ao mesmo tempo que alarga a participação dos cidadãos. Assim que uma lei é aprovada pelo CdM, segue para o Parlamento, onde o Presidente do Parlamento a atribui a uma das sete comissões técnicas para consideração. De acordo com a nova proposta de lei orgânica para o Parlamento, está previsto um gabinete de serviços técnicos para prestar serviços de redacção legislativa, entre outros. Houve algumas melhorias processuais importantes na consideração de leis por parte do Parlamento. De acordo com as Normas de Procedimento do CdM, o Governo tem vindo consistentemente a submeter notas explicativas com as propostas de lei, o que leva a um melhor debate dentro das comissões e por vezes à rejeição de algumas propostas. Uma alteração processual pela qual os relatórios das comissões ao plenário só são escritos após consultas com o Governo e com a sociedade civil levou a maior debate, incluindo a oferta de emendas, tanto a nível de comissões como a nível plenário.

3 Decreto N.º 3/2003, Lei Orgânica do Ministério da Justiça, Parte IV, Sec. 8.

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Caixa 7: Centralização da Redacção Legislativa – Gabinete de Aconselhamento Parlamentar na Nova Zelândia

Em vários países a redacção de legislação é da responsabilidade de uma unidade legal especializada, ao invés de ser tratada directamente por Ministérios ou Departamentos. Esta abordagem junta num só sítio funcionários com as qualificações e os conhecimentos especializados necessários para redigir leis simples, expressas de forma clara, consistentes com outra legislação que esteja já em vigor, e que respeite os fundamentos legais tais como as obrigações constitucionais ou de direitos humanos.

Na Nova Zelândia, por exemplo, o Gabinete de Aconselhamento Parlamentar (GAP) é um gabinete estatutário do Parlamento responsável por redigir legislação. É também responsável por tornar a lei acessível ao público. O GAP redige a legislação do Governo para introdução no Parlamento. Aconselha sobre questões legais e redige emendas aquando do debate e consideração de leis por parte do Parlamento. Também redige propostas de leis de alguns Membros, a pedido do Procurador-Geral, em casos onde haja uma grande probabilidade de a proposta de lei vir a receber apoio suficiente no Parlamento para se tornar lei. O GAP também presta aconselhamento em redacção legislativa aos promotores de propostas de lei privadas e locais.

Para lá disto, o GAP redige leis suplementares tais como as Normas Estatutárias. Na Nova Zelândia as Normas tratam frequentemente da implementação detalhada de Leis do Parlamento, sendo importantes visto que é muitas vezes através delas que as leis são directamente aplicadas a indivíduos e organizações na sociedade. A redacção de normas de elevada qualidade pode ser um desafio tão grande como a redacção de propostas de leis.

24. É possível inserir oportunidades e mecanismos de consulta no processo político, permitindo aos ministérios sectoriais continuarem a ter a liderança no desenvolvimento de políticas, ao mesmo tempo que se estabelecem meios de consulta. Os ministérios da saúde e da educação tiveram um bom desempenho no que se refere à liderança do desenvolvimento de políticas nos seus sectores, tendo sido estabelecidos grupos sectoriais de trabalho em várias áreas. Estes podem ser alargados de forma a incluir a sociedade civil e / ou a tornarem-se fóruns para o lançamento e supervisão do processo político, a realizarem consultas abrangentes conforme apropriado, e a monitorizarem e avaliarem a implementação de políticas. Para lá da sociedade civil, os grupos de trabalho podem consultar especialistas de sector, os elementos particularmente afectados por uma determinada política, e funcionários públicos. As luzes conseguidas através da monitorização e da avaliação por parte destes grupos de trabalho podem geralmente ser introduzidas no processo de desenvolvimento de políticas, ao mesmo tempo que dão uma base para a melhoria da prestação de serviços.

Caixa 8: Acções Sugeridas • Emitir uma directiva a partir do Conselho de Ministros em relação à sequenciação recomendada da

preparação de políticas, incluindo consultas e actualizações regulares das prioridades para a redacção legal

• Criar uma unidade central de redacção legislativa e outros mecanismos apropriados de redacção legal • Disseminar ao público as propostas de legislação submetidas ao Parlamento • Incluir ou consultar a sociedade civil nos grupos sectoriais de trabalho

Desenvolvimento de Capacidade de Resposta e de Responsabilização na Função Pública

25. A construção de uma função pública responsável, capaz, virada para os serviços e isenta de corrupção é um alicerce da boa governação. Aprovado em Junho de 2004, o Estatuto da Função Pública e os seus códigos de ética e procedimentos disciplinares acompanhantes estabelecem o quadro para um serviço público honesto e responsável. São esperadas normas e legislação de apoio para clarificar os direitos e deveres dos funcionários públicos e criar um forte quadro de integridade, proibindo a recepção de presentes e definindo os limites da actividade política aceitável. Igualmente importante será o desenvolvimento de um corpo de funcionários profissional, embutido de um espírito de corpo, determinado a servir o interesse público com diligência. De presente, há relatos consideravelmente disseminados de

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absentismo e de não cumprimento dos níveis de comparência, pontualidade e horas de trabalho. Para lá disto, a administração é altamente centralizada, com muitas decisões a seguirem para nível Ministerial ou mesmo para o Primeiro-Ministro. Embora a centralização seja compreensível em face da capacidade limitada existente e do medo de cometer erros, pode também resultar na inibição da capacitação e da responsabilidade, criando longos atrasos, impedindo os Ministros de desempenharem as suas tarefas específicas e dando azo a uma aparente influência política em decisões administrativas. Menos centralização na tomada de decisões, acompanhada por uma monitorização e salvaguardas eficazes, poderá levar a um melhor desempenho. O Ministério da Saúde fez progressos notáveis na criação de parâmetros de referência e de indicadores de resultados, contra os quais os funcionários em todos os níveis podem ser responsabilizados. Poderá ser útil para o Governo considerar se o modelo orientado para os resultados do Ministério da Saúde pode ser adoptado noutras áreas da administração pública (Caixa 9).

Caixa 9: Responsabilização no Ministério da Saúde O Ministério da Saúde teve sucesso na autonomização e na responsabilização dos seus funcionários

por todo o território, através de um conjunto de instrumentos de gestão relevantes. Em primeiro lugar, o Ministério tem uma política clara que incide na melhoria dos cuidados de saúde maternos e infantis. Em segundo lugar, o planeamento e a orçamentação para atingir estes objectivos começam a nível de subdistrito e avançam até ao nível nacional. Em terceiro lugar, um pequeno conjunto de indicadores (ver em baixo), consistente com os objectivos do Ministério, é medido a cada nível do sistema. Em quarto lugar, o Ministério realiza reuniões administrativas mensais com os representantes de saúde nos distritos, os quais por sua vez se reúnem com o pessoal de subdistrito de modo a monitorizar o progresso e a discutir questões. Estas ferramentas permitem ao Ministério incidir nos resultados importantes e identificar e agir no que toca aos problemas. O Ministério tenciona associar as comunidades mais de perto com este processo.

Distrito

Visitas externas

per capita (GPD)

%

Cobertura de serviços

de maternidade (partos presenciados

por parteiros) %

Cobertura do sarampo

< 1 %

Acesso a instalações de

saúde %

Aileu 1.46 15 32 91 Ainaro .72 19 21 94 Baucau 1.17 18 37 68 Bobonaro .99 15 25 94 Covalima 1.47 33 29 85 Díli 1.97 42 18 100 Ermera .81 13 31 96 Lautem 1.44 20 36 12 Liquiçá .97 20 39 87 Manatutu 1.52 29 56 97 Manufahe 1.19 19 25 93 Oecussi 0.35 3 8 78 Viqueque 1.95 20 23 25 NACIONAL 1.29 22 27 80

Fonte: Ministério da Saúde, Relatório Trimestral de Janeiro a Março de 2005 26. Para lá dos tradicionais mecanismos de responsabilização de cima para baixo, tais como instituições de fiscalização e controlos internos, a qualidade da governação e da prestação de serviços pode ser aumentada de forma significativa através de uma incidência complementar em estruturas de participação e informação de baixo para cima e, em alguns casos, através da responsabilidade pelos serviços. Quando os fundos públicos são mal gastos, são os cidadãos comuns quem mais perde através da deterioração dos serviços públicos e

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de efeitos prejudiciais no crescimento da economia. Quando consultados e informados a respeito de quanto dinheiro está disponível para serviços locais, os utilizadores e grupos interessados podem ajudar o Governo na optimização da afectação e na verificação do uso de fundos públicos. Neste contexto, é louvável que o orçamento de Timor-Leste para o AF de 2006 forneça muito mais detalhes do que no passado sobre a área das despesas de capital. Isto irá facilitar uma monitorização mais precisa e, indirectamente, uma maior responsabilização. É provável que os grupos de cidadãos permaneçam vigilantes na monitorização da comparência dos funcionários e do uso dos fundos, quer através da qualidade das escolas, disponibilidade de cuidados médicos ou segurança do abastecimento de água, visto que a sua própria qualidade de vida está em jogo. A experiência internacional mostra que o encorajamento de reacções por parte das comunidades e a colocação de informações, autoridade para tomada de decisões e mesmo recursos financeiros nas mãos dos cidadãos podem melhorar consideravelmente a eficácia das despesas públicas, desde que sejam mantidas salvaguardas. Por exemplo, em Bangalore, na Índia, bem como em Malawi e nas Filipinas, os cartões de reporte das comunidades vieram aumentar a sensibilização do público a respeito da qualidade dos serviços governamentais, tendo dado aos respectivos Governos reacções específicas no que toca a áreas necessitadas de melhorias. A governação local na Bolívia foi melhorada através de comissões de fiscalização comunitária, através das quais os cidadãos monitorizam o desempenho das despesas públicas e participam na tomada de decisões dos governos locais. Em Porto Alegre, no Brasil, a prestação de serviços públicos melhorou em grande parte devido a uma participação significativa dos cidadãos no processo do orçamento. As ONGs podem também funcionar como intermediários eficazes na melhoria da prestação de serviços por parte do governo.

27. A publicação e a disseminação de informações são vitais para encorajar o investimento público no fomento da responsabilização no serviço público. No Uganda, estudos realizados nos princípios da década de 1990 para acompanhar as despesas com educação desde o governo central até ao nível escolar determinaram que menos de 20 porcento das verbas de capitação por estudante chegavam às escolas a que eram destinadas. Esta informação, disseminada através de emissões públicas de rádio, incentivou as escolas e os pais a exigirem um melhor serviço e mais responsabilidade da parte dos agentes públicos. Também motivou o Governo a abordar os roubos e a fortalecer os procedimentos de desembolso. Em resultado disto, mais de 90 porcento dos fundos afectados passaram a chegar aos alvos. Reconhecendo o valor da transparência, o Governo de Timor-Leste melhorou a sua disseminação de informações através da Internet. De presente o Governo e a maior parte dos ministérios operacionais possuem portais informáticos, assim como o Gabinete do Inspector-Geral, encorajando um público mais informado com mais confiança sobre o que está a ser feito em seu nome e com os seus recursos. Especialmente importantes são os portais da Direcção do Petróleo, Gás e Energia e da Transparência Petrolífera, os quais fornecem actualizações sobre receitas petrolíferas.

28. Timor-Leste poderá desejar continuar os seus esforços no sentido de encontrar formas eficazes de disseminar informações ao público. O uso da rádio comunitária já se revelou um mecanismo de responsabilização de baixo para cima em Timor-Leste. Quando os residentes de uma aldeia descobriram que o tesoureiro de uma comissão de desenvolvimento tinha apropriado indevidamente fundos destinados ao uso público, foram capazes de difundir a sua resposta e o seu pedido de desculpas aos membros da comunidade que havia enganado. Contudo, a eficácia deste sistema está condicionada pelo financiamento limitado para a manutenção de instalações de rádio nas comunidades. Mecanismos adicionais para transparência e monitorização de cidadãos podem incluir a disseminação de quais os serviços públicos disponíveis e de quando são gratuitos, disseminação do comunicado à imprensa da reunião semanal do Conselho de Ministros e da Gazeta Nacional em ambos os idiomas nacionais, disponibilização da Gazeta Nacional, Livros Orçamentais e relatórios trimestrais de Execução

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Orçamental nos distritos, encorajamento dos cidadãos a discutirem as decisões do Governo em fóruns comunitários, e desenvolvimento da capacidade dos cidadãos locais para participarem na monitorização de despesas.

29. A qualidade da governação e a eficiência da prestação de serviços através do envolvimento dos cidadãos pode ser reforçada pela devolução da autoridade de tomada de decisões e de gestão de recursos às comunidades locais. O envolvimento dos cidadãos locais em decisões sobre como gastar recursos públicos pode fazer incidir os gastos de forma mais eficaz nas necessidades e preferências dos cidadãos. A delegação de decisões sobre gastos ao nível de prestação de serviços pode reduzir o risco de captura administrativa. Em Timor-Leste, o Projecto de Autonomização das Comunidades (PAuC) estabeleceu um precedente para a passagem da autoridade responsável pelo uso de verbas de bloco comunitárias para o nível local. Todavia, dificuldades na implementação do programa vieram dar lições a respeito da importância de ligações estreitas entre mecanismos de participação comunitária e sistemas de Governo. Com base nesta experiência pode haver uma boa justificação – da perspectiva da eficiência e responsabilização dos gastos – para dar seguimento ao PAuC com um sistema mais uniformizado de verbas de bloco integrado no orçamento do Governo, no sistema do Tesouro e na administração do governo local. Com esta finalidade, o Governo lançou em 2005 um projecto-piloto no distrito de Bobonaro, fornecendo verbas de desenvolvimento local directamente às comunidades. Foram orçamentados USD 192.000 para esta actividade para os seis subdistritos de Bobonaro no AF de 2006, sendo esperado que a iniciativa seja alargada ao Distrito de Lautem no AF de 2007. De igual modo, uma iniciativa apoiada pela Habitat das Nações Unidas e pelo Banco Mundial está a testar a gestão de pequenas verbas directamente por comunidades urbanas pobres. No sector da educação, a UNICEF e o Ministério da Educação e da Cultura testaram um programa de verbas de bloco em sete escolas. Devido à falta de sistemas de desembolso centralizado, o projecto-piloto não foi continuado; contudo, alguns directores de escolas estão a receber formação em contabilidade básica. O desenvolvimento de um esquema de verbas de bloco é uma prioridade política para a educação primária, sendo esperado que as Associações de Pais e Professores e que os Conselhos Escolares desempenhem um papel na gestão de recursos. Uma capacidade limitada não implica que a autoridade devolvida vá levar a uma diminuição da responsabilização. A experiência internacional indica que a responsabilidade pode ser fortalecida, não enfraquecida, através de um maior envolvimento de órgãos de fiscalização representativa perto do terreno, tais como Associações de Pais e Professores e comissões de gestão da saúde. Ao mesmo tempo, a responsabilidade perante o centro deve ser mantida.

Caixa 10: Acções Sugeridas • Alargar as abordagens de distrito e baseadas nos resultados a todos os sectores • Conduzir estudos de despesa pública e de acompanhamento • Publicar a Gazeta Nacional em tétum • Disponibilizar Livros Orçamentais, Relatórios Trimestrais de Execução Orçamental e a Gazeta

Nacional nos distritos, em ambos os idiomas nacionais • Disseminar a comunicação à imprensa da reunião semanal do Conselho de Ministros em ambos os

idiomas nacionais • Alargar o teste piloto de verbas de desenvolvimento local • Fortalecer mecanismos para disseminar informações e promover o envolvimento dos cidadãos, tais

como associações de pais e professores

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Fortalecimento do Controlo Interno

30. O Gabinete do Inspector-Geral está a fazer uma contribuição significativa para a integridade, transparência e responsabilização. Criado em 2000 sob a administração transitória, o GIG enquadra-se agora no Gabinete do Primeiro-Ministro. O GIG conduz investigações e revisões especiais com vista a detectar situações incorrectas e a promover as melhores práticas nas operações do Governo. Com o consentimento do Primeiro-Ministro, o GIG pode levar a cabo investigações em resposta a solicitações do Parlamento, do Presidente, do Primeiro-Ministro, dos Ministérios e dos cidadãos. O pessoal de 13 inclui inspectores e auditores, o Inspector-Geral e o Sub-Inspector-Geral, um posto que de presente está vago. O GIG investiga alegações e submete relatórios com recomendações para acção administrativa ou acusação ao Primeiro-Ministro, o qual os poderá transmitir à instituição relevante ou ao Procurador-Geral. As investigações do GIG ao uso pessoal de veículos do Governo resultaram em alterações nas normas, passando a haver um controlo mais apertado do uso de veículos e uma redução visível no uso para fins pessoais. Uma investigação ao uso de certificados de combustível e à apropriação indevida de combustível levou a um novo sistema de certificados com controlos mais fortes. Em alguns casos, o GIG achou dados que justificam investigações criminais, tendo o Primeiro-Ministro submetido esses casos ao Gabinete do Procurador-Geral. Um desses está agora a seguir para julgamento. De presente o GIG ainda não monitoriza a implementação das suas recomendações, mas a recente adição de funcionários para a Divisão de Medidas Correctivas poderá ajudar a remediar esta omissão.

31. O Gabinete do Inspector-Geral tem estado activo na promoção de medidas de transparência e de combate à corrupção, através de educação ao público. O GIG tem levado a cabo campanhas de informação ao público nos distritos a respeito da corrupção e da forma como pode ser combatida. As campanhas incluem a distribuição de panfletos com informações sobre corrupção, nepotismo, conluio e suborno, com instruções sobre como fazer uma solicitação ao GIG. Estas campanhas são louváveis, uma vez que ter cidadãos bem informados é essencial para o combate à corrupção. O Inspector-Geral dá também palestras sobre combate à corrupção e conflitos de interesses aos funcionários públicos no Instituto Nacional de Administração Pública (INAP), e realizou duas conferências sobre “Transparência e Responsabilização” em Novembro de 2003 e Maio de 2004. O recente lançamento do portal do GIG na Internet, incluindo a publicação de resumos de relatórios de investigação, é um passo importante no reforço da transparência, tendo aumentado a credibilidade do GIG e do Governo em geral (www.inspeccaogeral.gov.tl).

32. Partindo destas realizações, é possível reforçar a credibilidade e a eficácia do GIG. A aprovação da Lei Orgânica do GIG irá aumentar a independência das suas operações, permitir-lhe levar a cabo inspecções ministeriais e dar continuidade à implementação das suas recomendações. As normas de implementação que irão sustentar a Lei Orgânica permitirão ao GIG criar ligações com inspectores em todos os ministérios, garantindo padrões consistentes de inspecção e investigação por toda a administração. De acordo com a melhor prática, o Gabinete poderá desejar definir o seu programa de trabalho independentemente, embora de tempos a tempos possa ser solicitado ao Gabinete que conduza uma investigação especial sobre questões de particular preocupação para o Primeiro-Ministro ou outros ministérios. Embora seja normal que as recomendações do GIG sejam alvo de acção por parte do Executivo, a existência de normas claras que permitam a transmissão de processos potencialmente criminais directamente ao Procurador-Geral irá aumentar a eficácia do Gabinete. Até à data o Primeiro-Ministro deu permissão para transmissão numa base de caso a caso, mas poderá ser útil formalizar um sistema

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de transmissão directa ao Procurador-Geral. Isto permitirá ao público verificar a consistência de procedimentos e acções, evitando percepções de aplicação selectiva de normas ou de padrões duplos, e confirmando que todos estão sujeitos à lei, independentemente da posição de cada um. Relatórios públicos completos sobre actividades realizadas e recomendações feitas irão enviar uma mensagem forte ao público de que a má-prática, a corrupção e o desperdício administrativos não serão tolerados, ao mesmo tempo que demonstram responsabilização, transparência e capacidade de resposta no processo de investigação.

33. O Ministério do Plano e das Finanças tem uma unidade de auditoria interna que reporta ao Chefe do Tesouro. Esta é uma função de gestão interna que testa a eficácia e a conformidade de sistemas e procedimentos, reportando de seguida à administração. A unidade de auditoria interna tem um plano de trabalho anual e leva a cabo auditorias à vista a pedido do Ministério, sendo que em resultado disto alguns processos foram transmitidos ao ministério público. A unidade lançou também uma auditoria a todos os gabinetes de finanças de distrito do Governo. Uma avaliação recente do Ministério do Plano e das Finanças indica que será importante levar a cabo auditorias internas regulares por todo o Ministério e por toda a administração, começando pela função de aprovisionamento. Em particular, será aconselhável para o Ministério garantir que todas as suas operações estão sujeitas a auditoria interna e que são feitos relatórios a um nível administrativo elevado. Dependendo da extensão em que a auditoria interna tiver sido estabelecida noutros ministérios, esta poderá ajudá-los em especial em áreas de alto risco.

34. Inspectores a nível de instituição com o intuito de garantir a conformidade com as normas administrativas irão fortalecer a gestão e o desempenho. Embora o GIG cubra todas as operações do Governo, a responsabilidade pela gestão interna específica e pelos sistemas de controlo é devolvida a cada ministério. A monitorização da aplicação de normas administrativas e de sistemas de gestão interna pode ser fortalecida através de funções de inspecção interna. Por norma todas as instituições de Governo têm gabinetes de controlo interno, mas devido ao seu pequeno tamanho Timor-Leste poderá desejar criar funções de controlo interno especializado apenas nos grandes ministérios. Em 2004, de acordo com a sua Lei Orgânica, o Ministério do Interior (MI) estabeleceu um Gabinete de Inspecção com mandato para levar a cabo auditorias e inspecções, criar um sistema de queixas por parte do público e propor melhorias nos serviços. A força policial, que se enquadra no MI, já tem o seu próprio mecanismo de queixas, mas o Gabinete de Inspecção funciona como o órgão de revisão disciplinar para a polícia. O Ministério da Saúde tem um inspector para assegurar o controlo interno em matérias de recursos financeiros e humanos, o qual colaborou com o GIG na investigação de um caso de corrupção envolvendo um agente de saúde de distrito que irá agora seguir para julgamento. Foram nomeados inspectores escolares, os quais fazem parte do pessoal nos gabinetes de educação de distrito. Estas inspecções sectoriais podem contribuir para uma função pública responsável e virada para os serviços, bem como para reduzir o absentismo. Podem também ser um veículo para monitorização dos cidadãos, através por exemplo de reuniões mensais em cada capital de distrito de modo a reportar o desempenho sectorial às comunidades.

Caixa 11: Acções Sugeridas • Submeter a Lei Orgânica do Gabinete do Inspector-Geral ao Parlamento • Alargar a função de auditoria interna no Ministério do Plano e das Finanças para lá do Tesouro, sendo

a cobertura do Aprovisionamento a prioridade inicial

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Estabelecimento de uma Fiscalização e Auditoria Independentes

35. O principal mecanismo de supervisão independente de Timor-Leste, o Gabinete do Provedor de Direitos Humanos e Justiça, abriu as suas portas em Março de 2006. No seguimento da promulgação da lei orgânica para o Gabinete do Provedor em Abril de 2004, o Provedor foi eleito pelo Parlamento em princípios de 2005. O Provedor nomeou rapidamente os seus dois adjuntos, respectivamente para os direitos humanos e para o combate à corrupção. O recrutamento dos funcionários para o gabinete está quase concluído, sendo que o Provedor já terminou uma campanha de educação nos distritos e em Díli. De acordo com o Artigo 27º da Constituição de Direitos Humanos, o Gabinete do Provedor irá funcionar como Provedor e Comissão de Direitos Humanos. O mandato do Provedor inclui o combate à corrupção,4 a promoção da boa governação e do primado do estado de direito, a protecção dos direitos humanos e a reparação de violações e de injustiças. O Provedor é nomeado pelo Parlamento e presta contas a este, devendo levar a cabo investigações em resposta a queixas do público ou a pedidos do Governo. O Provedor poderá fazer recomendações por via de relatório à entidade afectada. As recomendações do Provedor não são acompanhadas de sanções legais, mas poderão incluir a transmissão de um determinado assunto ao Procurador-Geral. O Provedor tem também um mandato para fazer a mediação e a conciliação entre o queixoso e a instituição afectada. A legislação estipula que o Provedor deverá manter o público informado, de modo que um componente importante das actividades do Provedor será o alcance do público e a promoção dos direitos humanos e da boa governação.

36. O estabelecimento do Gabinete do Provedor constitui um compromisso claro e significativo para a garantia da integridade e transparência na governação, mas a sua eficácia estará dependente de vários factores. Muitos países contam actualmente com gabinetes de provedor, comissões de direitos humanos, ou uma combinação de ambos. A experiência tem mostrado que o sucesso de tais entidades depende do apoio político, de recursos adequados, da percepção do público, da competência funcional e do modo como se enquadram no sistema global de regulamentação administrativa.5 O facto de o Provedor ser mandatado constitucionalmente fortalece o cargo; porém, a independência do gabinete será ainda mais reforçada se o seu orçamento for derivado directamente do Parlamento, ou se for de outra forma protegido, e se o gabinete tiver acesso a fundos para as suas operações diárias, pelo menos através de uma conta avançada. Os níveis de pessoal são também um condicionalismo. O Provedor irá necessitar de pessoal bem qualificado em número suficiente para ser capaz de assegurar investigações atempadas e minuciosas, ao mesmo tempo que dissemina informação. Isto será particularmente importante caso o Provedor assuma um papel de relevo por exemplo na fiscalização dos serviços armados. A incidência nos esforços de fiscalização da polícia sob os auspícios do Provedor pode ser mais eficaz do que a adição de um órgão de fiscalização policial distinto, mas irá requerer mais recursos financeiros e humanos para o Provedor. Poderá ser necessário aumentar os níveis de orçamento e pessoal assim que a procura pelos serviços do gabinete se tornar aparente.

4 O Provedor está a planear acordar Memorandos de Entendimento com o Procurador-Geral, o GIG, a Polícia e outras instituições relevantes, com o intuito de estabelecer uma comunicação e coordenação fortes entre eles e de evitar a duplicação de trabalho. Será também útil para definir casos de corrupção como distintos de más-práticas administrativas e de casos puramente criminais que não envolvam corrupção. O GIG e o Procurador-Geral deverão notificar o Provedor sobre todos os casos sob a sua alçada que pareçam envolver corrupção, de modo a que o Provedor possa determinar se os deseja ou não assumir. 5 Banco Mundial, Uso de um Procurador para Fiscalizar os Agentes Públicos, PREM Nota N.º 19, Abril de 1999.

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37. A criação de órgãos de fiscalização independente para garantir o profissionalismo e a responsabilização da parte das forças de segurança continua a ser um desafio importante para a governação. “O desenvolvimento de forças policiais e de defesa eficazes, profissionais e apartidárias …” é uma meta declarada do PDN. A segurança interna e externa continua de forma compreensível a ser uma preocupação a nível comunitário. A disciplina e o profissionalismo da parte dos serviços armados são vitais para a prestação de segurança, defesa do estado de direito, manutenção de boas relações entre exército e polícia e geração de confiança por parte do público em relação às forças armadas. Quaisquer ganhos que possam ser feitos no estabelecimento de melhores relações entre as forças armadas e as comunidades poderão rapidamente ser perdidos caso exista a percepção de impunidade em relação a quem comete ofensas disciplinares ou criminais. A evidência emergente de condutas não profissionais destaca a necessidade de órgãos de fiscalização independentes para as forças de segurança, bem como de desenvolvimento de capacidade adequada para a gestão da força de defesa por parte de civis.

38. Embora tenham havido progressos notáveis na institucionalização de sistemas disciplinares para a polícia, estes podem ser reforçados através de uma articulação mais clara dos papéis. A Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) enquadra-se no Ministério do Interior. Em conformidade com a Lei Orgânica da PNTL, a Unidade de Deontologia e Ética Profissional (UDEP) fornece um mecanismo de queixas para o público e leva a cabo investigações. Quebras menores de disciplina são tratadas nos distritos, enquanto que ofensas graves são transmitidas à UDEP. Nos casos que envolvem revisões disciplinares e apelos, existe alguma ambiguidade, com sobreposição entre a Inspecção, estabelecida pela Lei Orgânica do Ministério do Interior e o Conselho Superior de Polícia, mandatado pela Lei Orgânica da PNTL para ser o órgão determinante sobre queixas policiais. A revisão e a fiscalização disciplinares da PNTL serão fortalecidas através da clarificação dos papéis destes órgãos, idealmente quando as normas de procedimento forem desenvolvidas para ambos. Será também necessário desenvolver os protocolos de interacção com o Gabinete do Provedor. A clarificação das linhas de autoridade operacional entre agentes civis no Ministério e na estrutura de comando da PNTL irá reforçar a independência da força policial. O exército, as Falintil – Forças de Defesa de Timor-Leste, desenvolveu um código disciplinar interno, mas este ainda não foi aprovado pelo Ministério da Defesa. Um aspecto encorajador, contudo, é que houve já inquéritos e audiências a respeito de algumas quebras de disciplina. Entretanto, o Gabinete do Provedor fornece a única fiscalização externa para as forças de segurança. Poderá ser considerada a possibilidade de estabelecer uma comissão de revisão independente para queixas policiais, bem como para fortalecer o papel de fiscalização do Parlamento em relação às forças de segurança.

39. A garantia da independência da auditoria das contas do governo é vital para a melhoria da governação. A Constituição de Timor-Leste atribui a função da auditoria externa ao Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas. Como medida interina, o Ministério do Plano e das Finanças adjudica a tarefa a uma companhia de auditoria privada externa, após o que os relatórios de auditoria e a carta de gestão são submetidos ao Executivo, e de seguida para o Parlamento. Embora a adjudicação seja inevitável no curto a médio prazo, a adjudicação por parte do Ministério tem condicionalismos graves. Cria conflitos de interesses visto que a auditoria é paga pela entidade auditada, e nem tão-pouco existe qualquer verificação independente do âmbito e do rigor da auditoria. Também não contribui para a capacitação institucional local no que se refere a auditorias externas. Reconhecendo que o estabelecimento do Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas pode demorar ainda alguns anos, estão de presente a ser feitos acordos no sentido de transferir a responsabilidade pelo contrato do auditor externo do MPF para o Tribunal de Recurso (TR). Até que seja desenvolvida capacidade de auditoria independente, o TR continuará a necessitar de serviços de apoio para ajudar a gerir e interpretar os resultados das auditorias. Para 2006 está planeado um estudo que visa delinear

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os acordos necessários para a transferência e subsequente capacitação. O TR incorporou as necessidades do futuro Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas no seu planeamento de recursos humanos a longo prazo.

Caixa 12: Acções Sugeridas • Garantir o financiamento adequado do Gabinete do Provedor, com o orçamento aprovado directamente

pelo Parlamento • Publicar e submeter ao Parlamento os Relatórios Anuais do Provedor • Estabelecer uma função credível de auditoria independente sob o Tribunal de Recursos, enquanto se

aguarda a criação do Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas • Estabelecer mecanismos de coordenação entre o Ministério do Interior, a PNTL o Gabinete do

Provedor • Criar uma comissão independente para rever as queixas sobre a polícia

Melhoria do Acesso à Justiça

40. A Constituição de Timor-Leste estabelece a independência dos tribunais e da magistratura, assim como um quadro para a salvaguarda desta independência. Para lá dos tribunais e do ministério público, a Constituição prevê dois órgãos de fiscalização independentes – o Conselho Superior da Magistratura e o Conselho Superior do Ministério Público. A Constituição prevê mais salvaguardas da independência, através da nomeação por parte do Presidente tanto do Procurador-Geral como do Presidente do Supremo Tribunal. Conforme estipulado pela Constituição, o Procurador-Geral tem vindo a fazer relatórios anuais ao Parlamento. O Ministério da Justiça define a orientação política geral para o sector, gere o Centro de Formação Jurídica, tem responsabilidades pela investigação e redacção legislativa, e administra as prisões e o serviço da defesa pública.

41. A Constituição reforça um sistema de tribunais para a prestação da justiça. Os tribunais previstos pela Constituição incluem o Supremo Tribunal de Justiça e outros tribunais judiciais, o Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas, e os Tribunais Militares. A Constituição também prevê o possível estabelecimento de Tribunais Marítimos e de Tribunais de Arbitragem. Até à data foram estabelecidos tribunais de distrito em Díli, Baucau, Suai e no enclave de Oecusse, bem como o Tribunal de Recurso. De acordo com os esquemas de transição previstos na Constituição, o Tribunal de Recurso assumiu as funções do Supremo Tribunal até que exista capacidade nacional suficiente para fazer funcionar um supremo tribunal. O Tribunal de Distrito de Díli incluiu anteriormente o Painel Especial para Crimes Graves, mas este órgão foi dissolvido em 20 de Maio de 2005, com a partida da UNMISET. Muitas das pessoas indiciadas por crimes graves ainda não foram acusadas, mas a detenção recente de vários indivíduos indiciados que regressaram há pouco tempo a Timor-Leste indica que o tribunal continuará a ouvir tais processos.

42. Desde a restauração da independência têm havido progressos em algumas áreas do sistema de justiça. O Gabinete do Procurador-Geral (GPG) e o Serviço de Defesa Pública desenvolveram sistemas básicos de gestão de pessoal e de processos. Os tribunais e o ministério público iniciaram a produção de estatísticas que o Ministério da Justiça (MJ) tenciona publicar. Campanhas de educação legal levadas a cabo pelo MJ e por organizações da sociedade civil contribuíram para um entendimento por parte do público em relação ao sistema de justiça formal, sendo que o Ministério planeia publicar um jornal destinado a uma vasta audiência com actualizações sobre o sistema de justiça. Muitos esforços foram devotados à aprovação de legislação essencial, tais como as Leis Orgânicas do Ministério da Justiça, os tribunais, o

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Gabinete do Procurador-Geral e o Estatuto dos Magistrados Públicos, o qual regula as carreiras judiciais. Falta ainda aprovar a Lei Orgânica da Defesa Pública.

43. Apesar destas melhorias, o sistema de justiça continua a ser o ramo mais fraco da arquitectura de governação de Timor-Leste. Os tribunais de distrito de Baucau, Oecusse e Suai funcionam apenas de forma esporádica. De presente estão a operar, mas os juízes, procuradores e defensores não residem perto e dependem da UNOTIL para de deslocarem para os tribunais aquando das audiências. Tanto os tribunais como principalmente o GPG desenvolveram volumes em atraso imensos. Em Dezembro de 2005 o ministério público tinha aproximadamente 3.000 processos em atraso, sendo que em Outubro de 2005 haviam 474 processos a aguardar julgamento nos tribunais de distrito. As detenções ilegais continuam a ser um problema considerável. A eficácia do sistema de justiça é também dificultada pelo facto de as leis e procedimentos não estarem traduzidos em idiomas que todos os agentes de tribunal entendam, incluindo profissionais legais timorenses, a maioria dos quais foi formada na Indonésia. Os juízes, procuradores e defensores públicos timorenses nomeados pela Administração Transitória das Nações Unidas em Timor-Leste (UNTAET)6 tinham diplomas básicos em direito de universidades indonésias, mas nenhum tinha experiência profissional substancial e a formação profissional que receberam antes da sua nomeação foi parca. Embora muitos tenham levado a cabo os seus deveres com dedicação, em alguns casos a falta de experiência e de fiscalização levou a infracções profissionais que vão desde comparência inconsistente nos tribunais a alegações de corrupção. Todos foram desqualificados em exames profissionais em 2004-05 e têm vindo a receber formação a tempo inteiro desde 2004.

44. As fraquezas do sistema de justiça afectam em particular processos civis. Entre Janeiro e Outubro de 2005 apenas 17 processos civis foram julgados em todos os tribunais de distrito, em contraste com 337 processos criminais. Durante o mesmo período, o volume em atraso de processos criminais a aguardar julgamento foi reduzido em 29 porcento, mas o volume em atraso de processos civis aumentou 39 porcento. Em Outubro de 2005 o Tribunal de Recurso tinha 54 processos civis em atraso, em comparação com apenas 4 processos criminais.7 A lenta resolução dos processos civis afecta a confiança da comunidade e do sector privado no sistema de justiça. O Relatório Fazer Negócio de 2006 concluiu que Timor-Leste tem um mau desempenho em termos de cumprimento de contratos, com um tempo médio de cumprimento de 990 e custos de USD 183 por cada USD 100 recuperados.

45. De presente os tribunais timorenses funcionam na totalidade com juízes, procuradores e defensores públicos internacionais. Foram recrutados mais de 20 profissionais legais a partir de outros países lusófonos, com financiamento da UNOTIL, PNUD ou através de acordos bilaterais, com vista a preencher as vagas deixadas pela desqualificação dos profissionais legais timorenses. É provável que o sistema continue dependente de agentes de tribunal internacionais pelo menos até 2010, e talvez mesmo para lá dessa data. Embora durante a transição inicial de pessoal timorense para pessoal internacional houvesse postos vitais por preencher nos tribunais, o planeamento em todo o sector com vista a melhorar essas lacunas melhorou entretanto. O Conselho de Coordenação, um órgão de coordenação de parceiros de desenvolvimento composto pelo Presidente do Tribunal de Recurso, pelo Procurador-Geral e pelo Ministro da Justiça, tem vindo a trabalhar com o PNUD na criação de um mecanismo de financiamento e na mobilização de fundos dos parceiros de desenvolvimento para cobrir os

6 A UNTAET teve autoridade executiva, legislativa e judicial em Timor-Leste desde Outubro de 1999 até à restauração da independência em Maio de 2002. 7 Tribunal de Recurso, Dados Estatísticos, Novembro de 2005.

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custos do pessoal internacional. O financiamento para estas posições será um elemento essencial do apoio internacional ao sector da justiça durante o futuro possível de prever.

46. A adição de 20 profissionais legais internacionais trouxe melhorias significativas na eficácia dos tribunais e do ministério público. Entre os processos criminais no Tribunal de Distrito de Díli, 242 foram decididos entre Janeiro e Outubro de 2005, em comparação com 11 entre Janeiro e Dezembro de 2004. Os procuradores internacionais concluíram um inventário do volume de trabalho em atraso no ministério público, reviram o sistema de atribuição de processos e aceleraram a resolução dos processos. Partindo de quase 3.000 processos em atraso no Gabinete do Procurador-Geral em Setembro de 2005, o número foi reduzido para 2.730 em Janeiro, havendo uma redução líquida a cada mês pela primeira vez desde a criação do sistema de justiça. Os juízes internacionais também conseguiram melhorias nos sistemas de notificação e na publicação de calendários de processos.

47. Tem havido progresso significativo na formação de profissionais legais timorenses, aspecto este que é uma prioridade do Governo e da Magistratura. Desde meados de 2004 que 27 juízes, procuradores e defensores públicos estagiários têm vindo a receber formação a tempo inteiro no Centro de Formação Jurídica (CFJ) do MJ. No seguimento da conclusão do curso de formação em meados de 2006 os formandos serão sujeitos a um ano de formação prática. Também houve escrivães de tribunal, administradores de tribunal, escrivães do ministério público e assistentes de defensores públicos a iniciarem formação. Alguns dos juízes avançarão directamente para formação especializada de modo a tornarem-se juízes do Tribunal de Recurso ou do Tribunal Superior Administrativo, Fiscal e de Contas. O CFJ do MJ continuará a prestar formação profissional e de pós-graduação, estando de presente a preparar um novo grupo de formandos. A Universidade Nacional de Timor-Leste arrancou recentemente com uma faculdade de direito, em cooperação com instituições de Portugal e do Brasil.

48. Em face dos consideráveis recursos nacionais e internacionais investidos na formação, as avaliações externas periódicas ao programa ajudarão a garantir a qualidade. A formação no CFJ é apoiada por vários parceiros de desenvolvimento através do Programa do PNUD para o Fortalecimento do Sector da Justiça, bem como bilateralmente. Os ensinamentos são dados em grande parte pelos juízes, procuradores e defensores internacionais a trabalharem no sistema de tribunais. A questão dos idiomas tem sido um problema, em particular nas fases iniciais da formação, visto que alunos que receberam a sua formação legal na Indonésia são agora obrigados a estudar direito em português, ao mesmo tempo que aprendem a língua portuguesa. Uma avaliação dos programas de formação ajudará a destacar práticas eficazes e a definir áreas para melhorias.

49. Embora a formação de profissionais legais timorenses seja essencial, é vital fortalecer instituições e sistemas de forma a tornar rotineiras as melhorias trazidas pelos agentes internacionais. Grande parte do progresso desde 2002 tem envolvido formação e a passagem de legislação, com menos atenção à criação de instituições com bom funcionamento. A este respeito as instituições de fiscalização independente têm um papel essencial a desempenhar. O Conselho Superior dos Magistrados Judiciais (CSMJ) supervisiona as carreiras judiciais, incluindo acções disciplinares, oferecendo um mecanismo para evitar que a gestão judicial comprometa a independência judicial. A passagem do Estatuto dos Magistrados Judiciais, publicada em 2002, rege as carreiras judiciais e assenta a base legal para a criação do CSMJ. O CSMJ foi estabelecido em Junho de 2003, mas ainda não funciona devidamente. Continua a carecer de elementos vitais, tais como um juiz inspector, um juiz avaliador e pessoal de secretaria chefiado por um juiz secretário, o qual será responsável pela execução das decisões do CSMJ. As reuniões têm sido esporádicas.

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50. A institucionalização de procedimentos sólidos de selecção, avaliação e disciplina para juízes e outros profissionais legais é vital para garantir a independência e o profissionalismo. É também necessária para fomentar a confiança do público nas instituições do sector da justiça. Criar processos de selecção, avaliação e disciplina robustos abertos ao escrutínio público será algo muito importante. A este respeito, a publicação de deliberações do CSMJ assume uma relevância especial. O Estatuto dos Magistrados Judiciais estipula que as deliberações do CSMJ deverão ser publicadas na Gazeta, mas isto foi emendado de modo a que apenas algumas decisões tenham de ser publicadas. A retomada da prática de publicar todas as deliberações irá ajudar a garantir a responsabilização e a independência na magistratura. O pessoal internacional terá um papel fundamental em termos de modelos a seguir e de acompanhamento de mentor para o fomento de níveis elevados no sistema de justiça timorense, devendo estar sujeito aos mesmos processos de fiscalização, avaliação e disciplina que os seus colegas timorenses. Por fim, a criação de directivas que facilitem o acesso do público a decisões de processos é fundamental para a transparência e para a independência do sistema.

51. Falta ainda criar o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP). A publicação da Lei Orgânica para o Ministério Público em Setembro de 2005 estabeleceu a base legal para a criação do CSMP. O Procurador-Geral iniciou então a criação do CSMP solicitando a nomeação necessária de membros do Governo, Presidente, Parlamento, e membros do ministério público. À semelhança do CSMJ, o Conselho Superior do Ministério Público irá assegurar a fiscalização, regulamentação e disciplina essenciais em relação a carreiras no ministério público, estabelecendo também de forma clara a independência profissional do ministério público. Enquanto isso, o Conselho de Coordenação, estabelecido originalmente como um mecanismo de planeamento e coordenação de parceiros de desenvolvimento, está a tornar-se num órgão de elaboração de políticas. Embora a coordenação seja importante, será necessário manter um equilíbrio cuidadoso de modo a garantir que se não se sobrepõe à independência da magistratura, ministério público e MJ. O estabelecimento atempado do CSMP é vital para o fortalecimento da independência e do profissionalismo do ministério público.

52. A adopção da Lei Orgânica para a Defesa Pública irá concluir o quadro para a regulação de profissionais legais públicos. A Constituição de Timor-Leste garante o direito à defesa. Embora o serviço de defesa seja subordinado ao MJ, terá a sua própria lei orgânica a regular o serviço, a qual está de presente a ser redigida. A proposta de lei orgânica contém provisões para a organização do serviço, a nomeação de um director e a criação de um Conselho Superior para a Defesa Pública.

53. Faltam criar o quadro legal e os níveis de acreditação para advogados privados. Para lá dos advogados no sistema público, existem aproximadamente 30 advogados privados a trabalharem para empresas de direito ou para organizações de assistência judiciária em Timor-Leste. Porém não há um quadro legal para advogados privados, nem tão-pouco uma ordem dos advogados. As organizações de assistência judiciária têm prestado um serviço indispensável, em particular durante as lacunas no pessoal da defesa pública resultantes das acções de formação. Para lá disto as organizações de assistência judiciária prestam serviços de mediação que as partes em processos civis usam frequentemente, em face dos custos e da duração dos processos em tribunal. Todavia alguns advogados e organizações de assistência judiciária têm alegadamente um mau nível profissional, cobrando quantias elevadas por serviços parcos ou nulos. A Associação de Advogados de Timor-Leste produziu uma proposta de Estatuto do Advogado, através da qual seria criada uma ordem dos advogados e um quadro regulador para os advogados. Esta proposta foi submetida ao Parlamento em 2004, mas está ainda a ser considerada por uma comissão parlamentar. O próximo passo será apelar a submissões do público, advogados que exerçam funções e outros grupos profissionais antes da finalização do

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estatuto. Existe também a questão relativamente a mecanismos fiáveis de acreditação, visto que várias universidades, para lá da recém-fundada faculdade de direito da Universidade Nacional, oferecem actualmente cursos de direito.

54. Timor-Leste redigiu um novo Código Penal, o qual poderá ser sujeito a revisão e possíveis emendas. Aprovada pelo CdM como decreto-lei em Dezembro de 2005, a lei ainda não foi promulgada pelo Presidente. A proposta de lei criminaliza a “Negação da Justiça” por parte de juízes, o que permitirá a moção de acções criminais contra juízes relativamente à tomada de decisões por parte destes, com sentenças até oito anos. Este artigo tem potencial para prejudicar a independência dos juízes e é desnecessário, visto que o Estatuto dos Magistrados Judiciais prevê de forma adequada a disciplina transparente de más-condutas e incompetência por parte dos juízes. É também contrário às tendências na maior parte dos outros países de direito civil e países lusófonos. Para lá disto, vários artigos parecem violar o princípio da proporcionalidade entre a gravidade da ofensa e a severidade da sentença, havendo sentenças de dois a quatro anos para transgressões relativamente menores, tais como conduzir sem carta, perturbar uma procissão religiosa, usar pesos e medidas falsos, quebrar selos e marcas, e desobedecer a ordens para dispersar. A criminalização de ofensas deste tipo também irá aumentar a carga do já de si fraco sistema de tribunais. É possível que os castigos possam ser atribuídos de forma mais adequada através de sanções civis. Por fim, a definição de tortura na proposta de código não está devidamente conforme a Convenção Contra a Tortura, a qual Timor-Leste ratificou, sendo assim útil a sua emenda.

55. Apesar de algumas melhorias, a detenção ilegal continua a ser um problema, o que faz com que a criação de um melhor sistema de gestão de processos seja uma prioridade. Em Setembro de 2005 existiam 67 suspeitos, numa população prisional de aproximadamente 270, que estavam detidos há mais de seis meses sem mandato ou julgamento. Mesmo naqueles que não se incluem na detenção ilegal, a detenção pré-julgamento pode demorar meses. Um grupo de acção da UNOTIL dedicado às detenções ilegais resolveu 80 porcento destes casos identificados, mas são necessárias alterações sistemáticas na gestão de processos para impedir que o problema se repita. A institucionalização da gestão padrão de processos é essencial para tornar rotineiras as comunicações entre a polícia, o ministério público, os tribunais e as prisões, assim como para reduzir a incidência de detenções ilegais.

56. O entendimento por parte da polícia no que se refere ao uso da detenção preventiva durante 72 horas aumentou: o ministério público e os tribunais precisam agora de fazer o mesmo. A primeira fase na detenção ilegal tem sido manter os suspeitos em detenção preventiva para lá do limite legal de 72 horas até ao suspeito comparecer perante um juiz. A adesão da polícia a esta norma melhorou, mas o progresso tem sido minado pela lentidão das acusações e dos tribunais em levar os detidos a audiências. Por outro lado, a libertação de suspeitos criminais de detenções preventivas mina a confiança da comunidade no sistema de justiça e na competência da polícia.

57. Os desafios que rodeiam o sistema de justiça condicionam significativamente a capacidade das mulheres no que toca a procurar e receber justiça. “Facilitar o acesso à justiça para as mulheres e desenvolver os meios legais de combater a violência e outros crimes perpetrados contra mulheres …” é uma meta do PDN (9.23). Os processos de violência contra mulheres compõem uma grande parte dos processos de tribunal em Timor-Leste. Por exemplo, um relatório de monitorização de tribunais de Outubro de 2005 revelou que dos 26 casos ouvidos, 14 (53 porcento) envolviam violência contra mulheres.8 Ainda assim, quando os

8 PMSJ Monitorização dos Tribunais para o Mês de Outubro de 2005.

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processos são resolvidos, as sentenças são muitas vezes leves.9 O novo Código Penal de Timor-Leste reforça esta abordagem, com sanções muito ligeiras para a violação, com uma pena básica de dois a dez anos.10 Estes casos não podem ser resolvidos de forma satisfatória no sistema de justiça tradicionais, e o facto de os casos de violência com base no género (VBG) estarem a ser levados a tribunal de todo significa uma melhoria em relação ao que sucedia no período indonésio. Todavia, uma vez que os crimes tais como violação e violência doméstica tendem a ser pouco participados para começar, as sentenças reduzidas e a lenta resolução dos processos envolvendo VBG funcionam como mais elementos dissuasores para as vítimas do sexo feminino que procuram justiça.

58. A melhoria do acesso à justiça por parte das mulheres requer alterações práticas específicas. O novo edifício para o GPG irá incluir uma sala de entrevistas privada para casos de VBG. Pode-se também considerar a possibilidade de recrutar um assistente social e um psicólogo para assistir as vítimas e as testemunhas nestes casos. Em termos mais gerais, a polícia, o ministério público e os tribunais poderão desejar levar a cabo uma análise conjunta de casos graves de VBG, os quais podem servir como base para medidas com vista à prioritização de casos graves. A incorporação de formação sobre a questão dos géneros na formação do CFJ será útil, incluindo formação sobre o tratamento de VBG e de outros crimes que afectem grupos vulneráveis.

59. Melhor planeamento, execução orçamental e administração irão promover melhores serviços judiciais. No AF de 2005 os tribunais assumiram o controlo dos seus próprios orçamentos a partir do MJ, porém a execução orçamental foi pobre, ficando apenas nos 55 porcento. A falta de articulação entre o planeamento e a preparação orçamental, juntamente com a falta de flexibilidade e um elevado grau de centralização na administração financeira, prejudica a prestação de serviços. Os tribunais de distrito deparam-se com a escassez de fornecimentos e equipamentos essenciais, tais como combustível para geradores e veículos, telefones, faxes e materiais de escritório. As avarias nas fotocopiadoras fazem com que os documentos tenham de ser levados para fora dos tribunais para serem fotocopiados em lojas ou nos gabinetes de ONGs. A melhoria do planeamento e da preparação orçamental e dos sistemas financeiros e administrativos do MJ, tribunais e ministério público, bem como uma melhor coordenação com o MPF, poderão levar a um aumento da capacidade de resposta. Um problema continuado para a defesa e para o ministério público diz respeito à falta de fundos para pagar o transporte, alimentação e alojamento de testemunhas e vítimas residentes nos distritos que se desloquem aos tribunais. A criação de uma conta avançada para este efeito é um primeiro passo vital para a melhoria do acesso à justiça e para melhorar a forma como o público vê o sistema de justiça. No futuro será desejável que estas instituições independentes tenham orçamentos estatutários que sejam aprovados directamente pelo Parlamento, ou de outro modo protegidos contra sequestro.

60. Em muitas partes do país são usados mecanismos de justiça consuetudinária, sendo o acesso ao sistema de justiça formal ainda limitado. Contudo não existe qualquer lei ou política que estabeleça um quadro legal para a ligação de práticas consuetudinárias ao sistema de justiça formal. Dada a pressão sobre o sistema de tribunais, o MJ poderá desejar desenvolver uma definição de jurisdição com respeito a mecanismos de arbitragem civil e / ou consuetudinária. A criação de uma hierarquia de mecanismos de resolução de disputadas capazes de produzir decisões com vínculo legal pode levar a que muitos processos civis e

9 PMSJ Monitorização dos Tribunais para o Mês de Outubro de 2005. 10 Fazendo uma comparação, conduzir sem carta ou perturbar um cortejo fúnebre é punido com até dois anos de prisão, enquanto que certas formas de difamação podem ser punidas com até três anos de prisão.

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processos criminais menores sejam resolvidos sem chegarem ao sistema formal de tribunais. Entre as conclusões de um Diálogo Nacional sobre justiça conduzido em Março de 2004 encontrou-se a recomendação de o Governo estabelecer uma comissão independente para criar condições para a integração do direito consuetudinário no sistema formal de justiça, em particular no que se refere a processos civis e a crimes menores. Foi já levado a cabo trabalho analítico considerável nesta área.11 O Programa de Direitos de Terras sob o MJ pode fornecer alguns modelos úteis para abordar estas questões políticas.

61. Partindo da produção de estatísticas por parte de tribunais e da procuradoria, o MJ poderá desejar considerar o desenvolvimento de indicadores básicos de desempenho para o sistema de justiça. Estes indicadores poderão incluir volumes em atraso no ministério público e nos tribunais, tempo necessário para conduzir processos civis e criminais, resolução de processos envolvendo mulheres, total de horas que o tribunal passa em sessão e número de processos que resultam em prisão preventiva. Deve ser considerada a possibilidade de desenvolver formas simples de medir a percepção do público em relação à prestação de serviços no sistema de justiça. A produção de estatísticas desagregadas por género será um passo importante na melhoria do acesso das mulheres à justiça, permitindo que os processos envolvendo mulheres sejam acompanhados através do sistema e processados de forma atempada. Estes indicadores poderão ser publicados na Gazeta ou no boletim trimestral planeado do MJ.

Caixa 13: Acções Sugeridas • Concluir o sistema uniformizado de gestão de processos • Recolher e publicar regularmente estatísticas do sistema de justiça • Fazer os necessários pequenos investimentos em tribunais, incluindo a instalação de telefones e faxes,

e criar contas avançadas para financiar as operações do dia-a-dia • Concluir o preenchimento do CSMJ, incluindo, se necessário, a nomeação de pessoal internacional

para posições importantes; publicar as deliberações do CSMJ na Gazeta • Nomear o Conselho Superior do Ministério Público; desenvolver um sistema de avaliação de

desempenho para os procuradores • Submeter a Lei Orgânica para os Defensores Públicos, incluindo um código de conduta e

procedimentos disciplinares, para o Conselho de Ministros e Parlamento; nomear um Director; desenvolver um sistema de avaliação de desempenho para os defensores públicos

• Criar resumos de leis em tétum para disseminação • Abrir sala de entrevistas privadas para vítimas de violência com base no género no Gabinete do

Procurador-Geral; recrutar um assistente social e um psicólogo para ajudar vítimas e testemunhas nestes casos

• Levar a cabo uma avaliação do acesso das mulheres à justiça e desenvolver uma estratégia para melhorias

• Levar a cabo uma análise dos casos de violência grave com base no género, levando à prioritização destes casos

• Desenvolver plano para a função sustentável de todos os quatro tribunais de distrito nos locais, em particular Suai e Oecusse

• Rever a proposta de Código Penal • Desenvolver definição de jurisdição com relação a mecanismos de justiça formal e consuetudinária

11 Análise Legal da Justiça Tradicional, Internacional de Recursos Legais da Austrália, 2004; Aisling Swaine Justiça Tradicional e Violência com Base no Género, Comissão de Auxílio Internacional, Relatório de investigação de Agosto de 2003; Programa de Monitorização do Sistema Judicial, Conclusões e Recomendações: Sessão de Trabalho sobre Sistemas de Justiça Formal e Local em Timor-Leste, Díli, Julho de 2002; A Fundação Asiática, Justiça Restauradora em Timor-Leste: Uma Avaliação do Processo de Reconciliação Comunitária da CAVR, 2004.

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Garantia do Acesso do Público à Informação e Fortalecimento do Papel da Sociedade Civil

62. As informações são vitais para a construção de um consenso nacional amplo em torno da boa governação. As iniciativas do Governo para prestar informação, juntamente com uma imprensa livre e independente, desempenham papéis vitais e complementares. Para facilitar o acesso à informação e definir os casos excepcionais em que a informação poderá ser retida, será altamente benéfico que o Governo adopte políticas e directivas sobre disseminação de informações e acordos para acesso à informação. Estas directivas irão estabelecer e disseminar boas práticas, ajudando a formar a base para uma eventual lei de liberdade de informação.

63. A comunicação e o acesso à informação desempenham um papel essencial na educação dos cidadãos, no fomento da participação dos cidadãos no processo político, na promoção da boa governação e no incentivo aos esforços de combate à corrupção por parte do Governo. O PDN pede o “Desenvolvimento de programas de informação para a população em geral e para funcionários públicos em relação aos …. serviços que os cidadãos têm direito a esperar das instituições públicas, assim como sobre o que podem fazer em caso de não cumprimento.” O progresso do Governo rumo a esta meta tem sido sólido. Durante algum tempo, o Conselho de Ministros produziu comunicações em português e tétum após cada reunião, sendo entendido que a versão em tétum será restaurada brevemente. A Gazeta Oficial, o Jornal da República, é uma forma vital de disseminar informações, em particular no que diz respeito a nova legislação. De presente a Gazeta é publicada apenas quando existem novas leis a publicar, sendo a sua distribuição errática. A eficácia da Gazeta enquanto ferramenta de informação pode ser fortalecida através da tradução em tétum, de uma distribuição mais sistemática, incluindo distribuição gratuita a gabinetes do Governo, e de uma disponibilização fácil a embaixadas, meios de comunicação social e sociedade civil. A retomada da prática de afixação da Gazeta na Internet irá disseminar ainda mais as informações. Os esforços sustentados do Governo de consulta e informação do público em relação à instalação de contadores de electricidade pré-pagos é um bom exemplo de uma construção eficaz de consenso com o público em torno de uma decisão política difícil (Caixa 14).

64. O Governo deu vários passos importantes rumo ao fortalecimento do alcance e da disseminação de informações. O estabelecimento do Gabinete de Informações do Governo em 2004 para prestar formação a agentes públicos no que toca a ligações com meios de comunicação social é um passo altamente positivo. Até à data, o gabinete levou a cabo formação para agentes em cinco ministérios, incluindo saúde, transportes e comunicações, obras públicas e agricultura. O gabinete também conduziu formação individual especializada para ministros e vice-ministros. A criação de portais informáticos do Governo, em especial do GIG, constitui um passo importante na disseminação de informações. Tem havido progresso considerável no desenvolvimento de outros portais informáticos do Governo, incluindo ministérios operacionais e instituições autónomas (www.timor-leste.gov.tl/). Aqui destacam-se o portal da Direcção de Petróleo, Gás e Energia (www.timor-leste.gov.tl/EMRD/index.asp) e o da Transparência Petrolífera (www.transparency.gov.tl), os quais contêm informações abrangentes sobre os recursos petrolíferos de Timor-Leste e sobre o quadro para a sua gestão. Por fim o Governo levou a cabo uma série de reuniões de “Governo Aberto” em todos os distritos do país, o que permitiu às comunidades levantarem questões de preocupação local directamente com os ministros responsáveis.

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Caixa 14: Um Exemplo de Consulta e Comunicação Bem Sucedidas do Governo – Os Contadores

Eléctricos Pré-Pagos Com vista a melhorar a recuperação de custos de consumo de electricidade e a reduzir os subsídios

altamente regressivos ao sector da electricidade, o Governo decidiu, em Junho de 2003, instalar contadores pré-pagos para os consumidores de electricidade em Díli.

O primeiro conjunto de 10.000 contadores pré-pagos chegou em Julho de 2003, tendo a instalação começado em Agosto. Entre Agosto e Dezembro de 2003 foram instalados apenas cerca de 900 contadores. Os consumidores resistiram à instalação e numa ocasião chegaram a atacar com violência pessoal da Autoridade Energética.

Em princípios de 2004 a Autoridade Energética alterou radicalmente a sua estratégia de instalação. Em primeiro lugar, após uma consulta tornou-se claro que a estratégia da Autoridade Energética de incidir apenas nos maiores consumidores era ineficaz, visto que essa instalação selectiva levantava muitas suspeitas entre os consumidores em relação aos critérios de selecção. Em segundo lugar, tornou-se claro que as reuniões comunitárias lideradas pelas autoridades tradicionais (chefes de suco e chefes de aldeia) seriam um passo essencial para a familiarização do público com a necessidade de contadores e com o respectivo processo de instalação. Em terceiro lugar, a partir de Janeiro de 2004 o Primeiro-Ministro, o Ministro dos Transportes, Comunicações e Obras Públicas e o Secretário de Estado da Água e Electricidade lançaram uma campanha sistemática nos meios de comunicação com uma mensagem consistente: “O fornecimento de electricidade vinte e quatro horas por dia só poderá regressar quando cada consumidor pagar a sua conta, com a ajuda dos contadores pré-pagos.” Como resultado disto o programa acelerou, e entre Janeiro de 2004 e Março de 2004 foram instalados 4,700 contadores.

Este é um feito notável para o Governo. A implementação da recuperação de custos após quase quatro anos de electricidade gratuita é um desafio em quaisquer circunstâncias. No contexto de altos preços de electricidade e de circunstâncias económicas difíceis, incluindo uma taxa de desemprego urbana elevada e a aumentar, poderia ter sido destabilizadora. O uso estratégico de consultas e comunicações por parte do Governo foi vital para facilitar o processo.

65. Meios de comunicação social profissionais, eficazes e independentes são um pilar da boa governação, garantindo o acesso à informação e a liberdade de expressão. Os Artigos 40º e 41º da Constituição de Timor-Leste salvaguardam a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa. Uma meta declarada do PDN é a promoção de meios de comunicação social responsáveis, eficazes e independentes. Os meios de comunicação social de Timor-Leste estão ainda protegidos e regulados pelo direito indonésio12 segundo a Lei N.º 40 de 1999 sobre a Imprensa. Uma ordem executiva emitida pelo Administrador Transitório em 2000 descriminalizou efectivamente a difamação. Até à data, Timor-Leste tem gozado de liberdade dos meios de comunicação, sendo classificado pelo relatório de Liberdade de Imprensa de 2005, da Freedom House, como um dos 39 porcento de países, dos 194 estudados, com uma imprensa livre.13 Contudo, a ordem executiva de 2000 foi anulada por uma directiva do CdM em 2004. Mais importante ainda, o novo Código Penal de Timor-Leste, que deverá entrar em vigor em 2006, criminaliza a difamação. Esta provisão do Código Penal tem-se deparado com oposição da parte dos meios de comunicação social, incluindo a Associação de Jornalistas de Timor-Leste, assim como por parte da sociedade civil. É provável que esta provisão venha a baixar a posição de Timor-Leste em futuras classificações da Freedom House.

66. Os meios de comunicação social de Timor-Leste têm um papel importante a desempenhar nos esforços de combate à corrupção. A importância de meios de comunicação social independentes como um pilar do combate à corrupção está bem documentada. Por exemplo, em 2003 o Centro de Jornalismo de Investigação das Filipinas expôs uma corrupção profunda e disseminada na Direcção de Contribuições e Impostos das Filipinas, ao verificar os

12 O direito indonésio aplica-se em Timor-Leste, excepto nos casos em que foi substituído por novas normas ou em que contradiz os direitos humanos internacionais. 13 Liberdade de Imprensa 2005. Freedom House. Classificação da liberdade de imprensa com base no ambiente legal, influência política e pressão económica.

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activos concretos contra os declarados entre os agentes. Os meios de comunicação social de Timor-Leste têm potencial para contribuir de forma significativa para a monitorização no sector público e no sector privado, expondo más-práticas e casos de corrupção, questões estas que geram um grande nível de interesse da parte do público. Existe também uma necessidade reconhecida entre os meios de comunicação no que toca a formação independente em jornalismo de investigação, e mais concretamente em relação ao modo como reportar responsavelmente casos de corrupção.

67. A criminalização da difamação pode ter um efeito negativo nos meios de comunicação social de Timor-Leste, sendo um obstáculo à capacidade destes no que toca a promover a responsabilização e a servir o interesse público. Desde 1999 Timor-Leste desenvolveu quatro jornais diários, vários semanais, um emissor nacional independente de televisão e rádio, e estações de rádio comunitárias na maior parte dos distritos. Todavia, a qualidade do reporte é fraca e ainda não existe um jornalismo de investigação sério. Para lá disto, os meios de comunicação social são financeiramente frágeis e susceptíveis a autocensura devido à legalidade da supressão dos meios de comunicação social durante o período indonésio. Embora se entenda a frustração relativamente a erros no reporte, as alterações no ambiente dos meios de comunicação social, e em particular a criminalização da difamação, podem facilmente levar a uma autocensura disseminada. Isto irá minar a independência dos meios de comunicação social e o potencial destes para se tornarem um dos pilares das verificações e equilíbrios do estado.

68. Os meios de comunicação de Timor-Leste podem ser fortalecidos através da descriminalização da difamação. Embora muitos países ainda tenham leis que criminalizam a difamação, estas leis muitas vezes já não são usadas ou estão a ser anuladas. A tendência a nível mundial está fortemente a favor de sanções civis por difamação e do fortalecimento da autogovernação dos meios de comunicação social através de conselhos de imprensa. Esta tendência segue o entendimento de que a criminalização da difamação se tem revelado uma ameaça séria à liberdade da imprensa e a uma discussão aberta em muitos países. Órgãos políticos, figuras públicas e governos usaram as leis de difamação para silenciarem críticos. Timor-Leste pode descriminalizar a difamação através da emenda do Código Penal, instituindo sanções civis por difamação. Em alternativa, a criação de uma lei da imprensa, tal como a lei da imprensa indonésia de 1999, pode assegurar padrões e salvaguardas no que toca à liberdade da imprensa, ao mesmo tempo que descriminaliza a difamação.

69. A legislação sobre Liberdade de Informação pode ajudar a consagrar os direitos dos cidadãos à informação. Um número crescente de países tem adoptado leis de Liberdade de Informação (LDI) segundo as quais os cidadãos e a imprensa têm o direito de acesso a documentos do governo, com algumas poucas excepções. As leis de LDI têm muitas variantes e podem ser adaptadas eficazmente a contextos de diferentes países. Qualquer que seja a sua forma, as leis de LDI têm-se revelado capazes de promover uma participação democrática efectiva, controlar a corrupção, melhorar a responsabilização e a boa governação, e apoiar a troca eficaz de informações entre o governo e o público. Os Artigos 40º e 41º da Constituição de Timor-Leste fornecem a base para a aprovação de legislação de LDI. De modo a preparar o terreno para uma Lei com estas características, será útil adquirir experiência através de uma política abrangendo todo o Governo sobre acesso à informação. O Governo poderá desejar considerar a iniciação de discussões com alguns dos principais jornalistas, donos de meios de comunicação social e organizações da sociedade civil a respeito do desenvolvimento de uma política de liberdade de informação. Até lá, o acesso à informação será fortalecido pela revogação ou emenda das provisões secretas no Código Penal da lei subsidiária.

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Caixa 15: Liberdade de Informação na Promoção da Boa Governação Quase 50 países têm actualmente leis sobre liberdade de informação, e outros 15 a 20 estão activamente a

considerar a sua opção. A estas nações junta-se um número crescente de órgãos intergovernamentais – incluindo o Banco Mundial, a União Europeia e o PNUD – os quais estabeleceram políticas de LDI.

O Direito à LDI deriva essencialmente da garantia da liberdade de expressão constante do Artigo 19º da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Prevê que todos os cidadãos deverão gozar dos direitos de liberdade de opinião e expressão, incluindo o direito de “procurar, receber e transmitir informações e ideias,” uma garantia que actualmente se considera incluir no geral uma obrigação de abertura da parte do governo.

A justificação democrática para a legislação de LDI é que os órgãos públicos retêm informações não para eles mesmos mas como guardiães do bem público, e que estas informações devem ser acessíveis ao público, excepto se houver um interesse público superior no seu secretismo. A este respeito, as leis de LDI reflectem a premissa fundamental de que o governo deve servir o povo.

A isto juntam-se muitos benefícios práticos – a promoção da participação democrática efectiva, o controlo da corrupção, a melhoria da responsabilização e da boa governação, e a promoção da troca eficiente de informações entre governo e público, incluindo o sector empresarial. O resultado é um forte argumento a favor da adopção de legislação de LDI.

Fonte: Banco Mundial, “Legislação sobre Liberdade de Informação: Tendências e Padrões,” PREM Nota N.º 93, Outubro de 2004. 70. As organizações da sociedade civil e as comunidades podem desempenhar um papel importante na recolha e disseminação de informações sobre actividades do Governo. A experiência em todo o mundo mostrou que uma sociedade civil robusta é um vigilante importante da elaboração e implementação de políticas.14 As organizações da sociedade civil em Timor-Leste ainda não assumiram um forte papel de vigilância, com a excepção da Associação HAK, da Fokupers, do Programa de Monitorização do Sistema Judicial (PMSJ), da LABEH, da Rede Feto, e da Luta Hamutuk. O PMSJ tem tido um bom desempenho na sua monitorização sistemática do sistema de justiça, prestando relatórios e actualizações minuciosos e regulares. A experiência mostrou também que parcerias fortes entre o Governo e a sociedade civil podem ser a base para esforços eficazes no combate à corrupção.15 O papel da sociedade civil na melhoria da governação em Timor-Leste pode ser fortalecido através de ligações mais próximas entre organizações não governamentais e os meios de comunicação social.

71. É necessário regular e proteger a sociedade civil. Com esta meta, foi publicado em meados de 2005 o Decreto-Lei sobre Órgãos Corporativos Não Lucrativos. A lei fornece um quadro essencial para a criação e registo de organizações da sociedade civil, em particular fundações e associações. Contudo este quadro pode ser fortalecido, caso seja emendado em consulta com a sociedade civil, de modo a reflectir muito melhor as condições em Timor-Leste. Por exemplo, o requisito de as fundações não possuírem menos de USD 50.000 em activos pode ser visto como irrealista, em particular para fundações de distrito. Também deverá ser possível fortalecer a lei através de requisitos relativos à divulgação de informações, em especial no que toca a questões financeiras, bem como de provisões para a salvaguarda da independência dos recursos contra decisões de anulação de registo.

72. Timor-Leste acedeu a todos os sete tratados básicos internacionais de direitos humanos, prestando garantias legais adicionais de direitos humanos e liberdades civis. É de louvar que o país esteja a reportar de acordo com estes tratados, uma obrigação que muitos países não cumprem, tendo sido pioneiro num processo uniformizado de reporte sobre tratados.

14 Banco Mundial, Fomento de Instituições para Conter a Corrupção, PREM Nota N.º 24, Junho de 1999. 15 PNUD, Lições de Países em Vias de Desenvolvimento: Iniciativas do PNUD para Combate à Corrupção na Governação Democrática, Apresentação, Conferência Internacional sobre Transparência e Responsabilização na Administração Pública, 13 e 14 de Novembro, Díli, Timor-Leste.

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Caixa 16: Acções Sugeridas

• Submeter uma Lei de Difamação Civil ao Parlamento, evitando a criminalização da difamação • Continuar campanhas de informação activa sobre programas do Governo • Disponibilizar Livros Orçamentais, Relatórios Trimestrais de Execução Orçamental e a Gazeta

Nacional nos distritos, em ambos os idiomas nacionais • Disseminar a comunicação à imprensa da reunião semanal do Conselho de Ministros em ambos os

idiomas nacionais • Desenvolver uma política de Liberdade de Informação, levando em última instância a uma Lei de

Liberdade de Informação

Redução do Risco de Corrupção

73. Existem muitos dados não oficiais sobre o âmbito e a incidência da corrupção em Timor-Leste, mas ainda não há dados sistemáticos. De qualquer modo, é possível identificar riscos. Em cada país existem determinados sectores e áreas mais vulneráveis à corrupção do que outros; por norma, as áreas indicadas na Caixa 17 são as principais candidatas à corrupção. Para gerar as informações necessárias para apoiar acções visadas contra a corrupção em Timor-Leste existe uma gama de ferramentas de diagnóstico que permite o fornecimento de dados e a localização exacta das áreas problemáticas. Estas ferramentas incluem estudos de negócios, famílias e agentes públicos, permitindo assim a triangulação dos resultados. Em alternativa os diagnósticos podem incidir em instituições específicas, tais como a Alfândega. A introdução da Fase I do software de acompanhamento de receitas ASYCUDA na Alfândega resultou numa maior transparência e no crescimento das receitas, devendo ser seguida pela Fase II, através da qual a Alfândega planeia introduzir um manifesto de carga e uma avaliação de riscos automatizados. Irá também procurar adoptar a declaração Arusha e elevar os padrões éticos de conduta, o que se espera venha a reduzir a corrupção. A Alfândega é uma instituição particularmente importante, dada a necessidade de investimento e a dependência que a economia tem em relação às importações. Timor-Leste não pode correr o risco de ter custos e impedimentos adicionais à facilitação do comércio e ao desenvolvimento do sector privado. O relatório Fazer Negócio incluiu Timor-Leste pela primeira vez em 2005 e classificou o país em 142º entre os 155 países considerados. Para a promoção do crescimento económico será importante fomentar uma relação favorável ao cliente e isenta de corrupção entre Governo e empresas, incluindo nas áreas do aprovisionamento, registo e licenciamento, alfândega, impostos e resolução de disputas. É sabido que o Provedor está a planear um estudo das percepções de corrupção, o que ajudará a criar uma linha base a partir da qual poderão ser medidos novos desenvolvimentos.

Caixa 17: Áreas onde Por Norma se dá a Corrupção • Alfândega • Administração Fiscal / de Receitas • Aprovisionamento (contratos do governo) • Magistratura / Tribunais • Polícia • Forças Armadas • Serviços Públicos (electricidade, água, telefones) • Licenciamento e Registo de Autoridades • Recursos Naturais (florestas, petróleo) • Governo Local

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74. Timor-Leste levou a cabo várias investigações a alegações de uso indevido de fundos públicos e de corrupção. Até o Provedor estar totalmente operacional, o Gabinete do Inspector-Geral continua a ser a principal instituição capaz de investigar alegações de corrupção. Em Dezembro de 2005 o GIG havia concluído 73 investigações desde o seu estabelecimento em 2000, das quais 42 foram concluídas desde a restauração da independência em 2002. As investigações abrangeram irregularidades de recrutamento e nos processos de aprovisionamento, bem como a gestão indevida de fundos públicos e inventários (Figura 3). O Ministério da Administração Estatal, o Ministério da Justiça, o Ministério da Educação e o Ministério dos Transportes e Comunicações representaram 34 investigações (Figura 4). Vários casos de más condutas criminais investigados pelo GIG ou pela Unidade de Auditoria Interna da Direcção do Tesouro do Ministério do Plano e das Finanças foram transmitidos ao Gabinete do Procurador-Geral. Um caso de corrupção vai seguir para julgamento.

Figura 3: Tipos de Corrupção Investigada, 2000-2005

Casos Criminais (Suborno, Falsificação e

Roubo)7%

Abuso de Autoridade11%

Uso Indevido / Pouco Económico de

Dinheiros21%

Auditoria Externa CAVR

6%

Má Administração e Irregularidades Administrativas

51%

Conflito Social (4 Dez 2002)

4%

Fonte: Gabinete do Inspector-Geral

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Figura 4: Investigações por Instituição até à Data, 2000-2005

Fonte: Gabinete do Inspector-Geral

75. Num novo país como Timor-Leste, as más-práticas podem derivar da falta de conhecimentos. A falta de clareza em torno de procedimentos, a falta de formação e algumas irregularidades administrativas podem muitas vezes ser as razões de uma gestão indevida, ao invés de má-fé. A incapacidade em seguir os procedimentos adequados é um problema central e resulta de os funcionários públicos seguirem normas anteriores (como por exemplo procederem a compras em vez de fazerem o aprovisionamento), não conhecerem as novas normas, procurarem contornar normas morosas e trabalharem com capacidade limitada para implementar as normas (por exemplo especificações escritas de forma inadequada relativamente a concursos para propostas). Um relatório do Gabinete do Inspector-Geral nota que na maior parte dos casos os mecanismos de controlo interno ineficazes foram responsáveis pela não detecção de irregularidades administrativas, o que indica a necessidade de fortalecer os mecanismos de controlo interno.16

76. Uma fraca execução orçamental poderá contribuir para percepções de corrupção. Por exemplo, com despesas concretas e compromissos na ordem de 84 porcento das afectações orçamentais, a execução orçamental no AF de 2004 no sector da educação esteve consideravelmente aquém do alvo, enquanto que ao mesmo tempo os pais faziam contribuições voluntárias para o funcionamento das escolas.17 Estes casos podem dever-se a sistemas ineficazes, mas contribuem para percepções públicas de gestão indevida e de corrupção. Porém, acontece também que muitos dos funcionários públicos de Timor-Leste trabalharam como empregados públicos sob a ocupação indonésia, um regime onde a corrupção estava espalhada a todos os níveis da administração pública, magistratura, polícia e forças armadas, não sendo por isso de todo improvável que estas práticas perdurem. Em face deste ponto de partida, será um desafio demonstrar com sucesso que são possíveis e desejáveis outros modos de operação. 16 Mariano Lopes da Cruz, ‘Definição do Problema no Contexto Nacional: Tipos de Corrupção registados na Administração Pública em Timor-Leste’. Apresentação, Conferência Internacional sobre Transparência e Responsabilização na Administração Pública, 13 e 14 de Novembro, Díli, Timor-Leste. 17 O sistema de caixa escolar foi abolido em todo o país em finais de 2005.

11 99

77

64

333

22

1111

0 2 4 6 8 10 12 Ministério Administração Estatal

Ministério do Plano e das Finanças

Ministério dos Transportes e Comunicações Ministério da Educação e Cultura

Ministério Justiça Ministério da Saúde

Audit. Externa CAVR Administração Distrito

Minist. Desenvolvimento Conflito Social (4 Dez. 2002)

Electricidade de Timor-Leste Sec. Estado do Comércio e Indústria

Polícia Nacional

Gabinete do Presidente Ministério da Defesa

Número de Investigações e de Auditorias

Ministério da Agricultura, Florestas e Pescas

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77. Será que Timor-Leste precisa desenvolver um plano de acção de combate à corrupção? Qualquer que seja o actual nível de corrupção, existem duas razões para o Governo assumir uma postura dinâmica no seu combate. Em primeiro lugar, sendo um país jovem, Timor-Leste tem uma janela de oportunidade estreita para “fazer as coisas bem feitas” e construir instituições nas quais a população possa confiar. Assim que a corrupção se instalar, será muito difícil combatê-la, o que resultará na frustração de muitos dos objectivos do PDN. Em segundo lugar, bem ou mal existe uma percepção disseminada entre a população timorense de que a corrupção está a aumentar. Estas percepções são importantes visto poderem minar a credibilidade do Governo aos olhos do eleitorado. Timor-Leste poderá assim desejar desenvolver e implementar um plano de acção coordenado de combate à corrupção para apoiar a concretização do PDN.

78. Há vários elementos que podem ser incluídos num plano de acção de combate à corrupção com estas características. O aumento do entendimento do âmbito e da incidência do problema irá dar uma base para a substituição de rumores por factos, incidindo na mitigação de riscos e no fortalecimento dos sistemas actuais. Uma gama de estudos de diagnóstico pode ajudar na identificação da corrupção. Os estudos ajudarão a estabelecer uma linha base para o tipo e incidência da corrupção actual, possibilitando assim a medição dos progressos no futuro. Servirão também para localizar com precisão onde os problemas são mais relevantes, identificando as instituições com melhor desempenho, com as quais as outras poderão aprender. Este tipo de informações irá dispersar rumores e permitir ao Governo marcar uma posição em termos morais, ao ser suficientemente corajoso para procurar dados empíricos e ao estar disposto a agir. Os estudos poderão ser seguidos por consultas com o Governo e funcionários públicos, comunidades, empresas e sociedade civil, de modo a estabelecer um consenso nacional sobre os resultados, bem como para determinar a melhor forma de reduzir os riscos e minimizar as oportunidades. O desenvolvimento de uma função pública profissional, juntamente com uma administração pública transparente e responsável, será um baluarte contra a corrupção, mas não chegará para eliminar todos os riscos ou para lidar com todos os casos.

79. São necessárias definições claras e abrangentes dos diferentes tipos de corrupção e de tráfico de influências para sustentar a luta contra a corrupção e dar uma base para a acusação. Infelizmente a definição de corrupção no novo Código Penal não é consistente com a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção. Por exemplo, a definição de corrupção criminosa parece aplicar-se apenas a indivíduos e não a pessoas colectivas, tais como empresas. O código pode ser útil para proibir ganhos ilegais em nome de indivíduos e partidos políticos. Será também importante definir e explicar o conceito de conflito de interesses, o que significa um conflito entre os interesses privados e o interesse público. Agir no interesse privado e contra o interesse público é um abuso de poder. Dentro da categoria geral de conflitos de interesses, o Decreto-Lei de Aprovisionamento de Timor-Leste define de forma clara duas situações específicas de conflitos de interesses para funcionários públicos, uma envolvendo familiares até segundo grau que tenham interesses comerciais com os candidatos; e funcionários públicos que tenham tido interesses comerciais com candidatos durante os últimos três anos. Esta definição cruza-se com a definição de conflito de interesses fornecida no Estatuto da Função Pública. Decisões sujeitas a interesse privado deverão ser declaradas nulas, e os funcionários públicos associados deverão ser sujeitos a acção disciplinar. Campanhas de informação pública e formação da função pública ajudarão a garantir que as pessoas entendem de forma clara os vários tipos de práticas ilegais. As lições de outros países mostram que ter cidadãos informados e envolvidos é indispensável para o fomento de uma cultura de integridade e de responsabilização.

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80. O Governo, o Parlamento e o Presidente expressaram apoio à criação de instrumentos de integridade, tais como a declaração de rendimentos e activos da parte de agentes públicos, o que se enquadra bem num plano de acção de combate à corrupção. Um estudo de opções sobre instrumentos de integridade, planeado para o AF de 2006, pode incluir recomendações sobre a criação de um registo de rendimentos e activos, assim como das instituições para o administrar e fiscalizar. A legislação do Fundo Petrolífero já requer que os membros da Direcção de Assessoria de Investimento preencham uma declaração aquando da entrada em funções e outra quando abandonam o cargo. No seguimento do estudo será desenvolvido um plano de implementação.

81. A liderança de Timor-Leste declarou um compromisso forte e consistente para eliminar a gestão indevida e a corrupção. É importante que esta resolução seja sustentada por via da demonstração que os membros do Governo tomam decisões isentas de conflitos de interesses e que estão sujeitos aos mesmos padrões de desempenho e procedimentos disciplinares que são aplicados ao resto da administração. Declarações de rendimentos e activos da parte do Conselho de Ministros, outros políticos de topo e funcionários públicos relevantes servirão para reassegurar o público de que os agentes do Estado não estão sujeitos a conflitos de interesses e que não poderão beneficiar indevidamente dos cargos que ocupam. As futuras regulamentações sob o Estatuto da Função Pública terão de clarificar os direitos e deveres dos funcionários públicos, assim como criar um forte quadro de integridade, proibindo incondicionalmente a recepção de prendas (em alguns países os funcionários públicos nem sequer podem aceitar convites para refeições) e definindo os limites da actividade política apropriada. Será também importante o estabelecimento de normas de implementação para o código de conduta e para o código disciplinar; o estabelecimento de procedimentos claros e abertos de recrutamento, nomeação e promoção; e a manutenção de registos escritos para que as decisões possam ser disponibilizadas para revisão. Ao mesmo tempo, a prontidão nas investigações a acusações em relação a más-práticas administrativas e a corrupção terão um efeito importante de demonstração e dissuasão.

82. A assinatura por parte de Timor-Leste em Dezembro de 2003 da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção é uma forte declaração pública de compromisso no combate contra a corrupção. Ainda se está a aguardar a ratificação por parte do Parlamento. A Convenção foi redigida com os países de direito civil em mente, sendo assim que não apresenta dificuldades técnicas. É importante que a Convenção seja ratificada pelo Parlamento de forma atempada, uma vez que se pode tornar o guia para o desenvolvimento de muitas das medidas de combate à corrupção de que o país necessita. O Governo poderá desejar considerar a adopção de provisões opcionais na Constituição que tornem as acusações mais fáceis, sem prejuízo da justeza dos procedimentos criminais intentados contra um suspeito.

83. Na sua qualidade de economia petrolífera emergente, o apoio de Timor-Leste à Iniciativa de Transparência das Indústrias Extractivas é um passo altamente positivo. Isto é particularmente verdade dado que o Governo já estava a seguir o que se veio a tornar os princípios de transparência da ITIE antes da própria iniciativa ser estabelecida. O Governo viu com bons olhos a oportunidade de participar na Iniciativa, na sua Declaração na Conferência de Londres em 17 de Junho de 2003. Em Março de 2005 o Primeiro-Ministro discursou na Conferência da ITIE em Londres, delineando o registo de transparência de Timor-Leste.

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Caixa 18: Acções Sugeridas • Conduzir estudos de combate à corrupção, seguidos por consultas • Definir tipos de suborno no Código Penal, e tornar a corrupção um crime tanto para pessoas singulares como

para pessoas colectivas • Prestar Normas de Implementação para o Estatuto da Função Pública em relação ao código de conduta e ao

código disciplinar, incluindo uma proibição de receber presentes e a definição dos limites da actividade política apropriada

• Clarificar procedimentos para investigação de más-práticas com base no Estatuto da Função Pública • Lançar estudo de opções sobre instrumentos de integridade, incluindo o desenvolvimento de um registo de

rendimentos e activos e de instituições de implementação • Submeter legislação a exigir declarações de rendimentos e activos para o Conselho de Ministros, outros

políticos de topo e funcionários públicos importantes • Apresentar o orçamento para o Gabinete do Provedor directamente ao Parlamento • Publicar e submeter ao Parlamento os Relatórios Anuais do Provedor • Realizar campanhas de informação ao público • Solicitar ao Parlamento a ratificação da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção • Emitir relatório de situação sobre a participação de Timor-Leste na ITIE