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FLORIANÓPOLIS, JULHO DE 1987 Você quer assinar 'esta carta? Se você é contra: /obbies, o monopólio das comunicações, a censura, as concessões clientelistas de canais ... Assine a proposta de dispositivo constitucional dos profissionais de comunicação. A liberdade de expressão agradece Na página dois , , __ �BOG.S. Quatro visões de um problema eterno Na central TomMix inspira combate aos tóxicos Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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FLORIANÓPOLIS, JULHO DE 1987

Você quer•

assinar'esta carta?

Se você é contra: /obbies,o monopólio das comunicações,

a censura, as concessõesclientelistas de canais ...

Assine a proposta de dispositivoconstitucional dos profissionaisde comunicação. A liberdade

de expressão agradeceNa página dois

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__�BOG.S.Quatrovisõesde um

problemaeternoNa central

TomMixinspiracombateaos

tóxicos

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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ZEROJornal laboratório do Cur­

so de Comunicação Socialda Universidade Federal deSanta CatarinaEdição e supervisão:

Professores Henrique Finco,Sonia Maluf e Ricardo Bar­retoTextos: DauroVeras, Ma­

ria Cristina Yoshizato, Moni­que Van Dressen, DeniseBezerra, Caê G. de Castro,Paula Remísio, Carlos Loca­telli, Maria Teresa Cordeiro,Milene Corrêa, FranciscoLins, Clarissa Santos, AnaLavratti, Rubens ChavesVargas e Analú ZidkoFotografia: Carlos Au­

gusto LocatelliIlustração: Frank MaiaDiagramação: Carol Pe­

reira, Monique Van Dressen,Ney Pacheco, Ivan Santos,Marcos Cardoso e SimoneMüllerEdição gráfica: Ricardo

BarretoMontagem: VaurembergComposição e impres­

são: Empresa Editora OESTADOCorrespondência: Caixa

Postal 472, Departamentode Comunicação e Expres­são, Curso de Jornalismo,Florianópolis, SCTelefone: (0482) 33-9215Telex: (0482) 240 BR

Distribuição gratuitaCirculação diriqida

à utilizaçao gratuita da impren­sa, do rádio e da televisão, se­gundo critérios a serem defini­dos por lei.

Art. - É garantido a qualquercidadão ou entidades, o direitode resposta, na forma da lei.Art. - Nos períodos eleitorais

os partidos têm direito a temposde utilização do rádio e da televi­são, regulares equitativos, naforma da lei.

Art. - Todo cidadão tem direi­to, sem restrições de qualquernatureza, inclusive do Estado,à liberdade de opinião e expres­são e este direito inclui a liber­dade de procurar, receber e

transmitir informações e idéiaspor qualquer meio.Art. - Aos cidadãos, através

de instituições r�presentativas éassegurado o direito de partici­par da definição das políticas decomunicação.Art. - A comunicação deve

estar a serviço do desenvolvi­mento integral da Nação, da eli­minação das desigualdades e

injustiças e da independênciaeconômica, política e cultural dopovo brasileiro.Art. - A imprensa, o rádio, a

televisão, os serviços de trans­missão de imagens, sons e da­dos por qualquer meio, serãoregulados por lei, atendendo àssuas funções sociais e tendopor objetivo a consecução de

políticas democráticas de comu­nicação no País.Art. - Fica definido que os ser­

viços de telecomunicações e decomunicação postal são mono­

pólio estatal, tendo como princí­pio o atendimento igual a todos.

II - Da natureza dos Veícu­los de ComunicaçãoArt. - Os veículos de comuni­

cação, inclusive os meios im­

pressos, serão explorados porfundações ou sociedades sem

fins lucrativos.Art. - A administração e a

orientação intelectual ou comer­ciai das pessoas jurídicas men­

cionadas neste artigo são priva­tivas de brasileiros natos.

III - Do Conselho Nacionalde ComunicaçãoArt. - Fica instituído o Conse­

lho Nacional de Comunicação,com competência para estabe­lecer, supervisionar e fiscalizar

políticas nacionais e comunica­

ção, abrangendo as áreas de

imprensa, radio, televisão e ser­

viços de transmissão de ima­

gens, sons e dados por qual­quer meio.Art. - Compete ao Conselho

Nacional de Comunicação a ou­

torga, renovação e revogaçãodas autorizações e concessões

para uso de frequência e canaisde rádio e televisão e serviçosde transmissão de imagens,sons e dados por qualquermeio.Art. - O Conselho Nacional

de Comunicação é compostopor 15 (quinze) brasileiros natosem pleno exercício de seus di-

listas credenciados ao terceiroandar do Palácio do Planalto.As pressões não se limitaramàs estações do governo, mastambém a emissoras privadas,visando principalmente os pro­gramas de debates políticos.

A Federação Nacional dosJornalistas, através de seu pre­sidente Armando Rollemberg, eCarlos Max Torres, presidentedo Sindicato dos JornalistasProfissionais do Distrito Fede­ral, enviaram um telex ao presi­dente Sarney exigindo o fim dacensura. No texto, as entidadesrelatam casos como O do jorna­lista Carlos Chagas, que tevesua participação no programaJornal da Constituinte vetada

reitos civis, sendo 2 (dois) repre­sentantes de entidades empre­sariais, 5 (cinco) representantesde entidades representativas deprofissionais da área de comu­

nicação, 7 (sete) representan­tes de entidades de categoriasprofissionais e de setores popu­lares e 1 (um) representante deinstituição universitária.Art. - As entidades integran­

tes do Conselho Nacional deComunicação serão designa­das pelo Congresso Nacional,para mandato de 2 (dois) anosobservado o previsto em lei.Art. - Os representantes .das

entidades integrantes do Con­selho Nacional de Comunica­ção não poderão exercer maisde um mandato consecutivo.Art. - Para viabilizar o desem­

penho das funções do ConselhoNacional de Comunicação, a

União destinará ao órgão uma

parcela da arrecadação de im­

postos e taxas previstos em lei.

Art. - O Conselho Nacionalde Comunicação poderá fazerrepasses do seu orçamento aos

órgãos de execução e fiscaliza­

ção que, na forma da lei, foremcriados para implementar suasdecisões.

Art. - Ficam criadas as se­

ções estaduais do ConselhoNacional de Comunicação, emcada unidade da Federação, in­tegradas por 15 (quinze) brasi­leiros natos em pleno exercíciode seus direitos civis, indicadospor entidades da mesma natu­reza das integrantes do Conse­lho Nacional, a serem designa­das pelas Assembléias Legisla­tivas para um mandato de doisanos.

Art. - Compete às seções es­

taduais do C. N. de C., a super­visão e fiscalização da execu­

ção das políticas de comunica­

ção em âmbito regional.Art. - A lei regulamentará as

atribuições e o funcionamentodo C. N. de C., bem como os

critérios da função social e éticado rádio e da televisão.

IV - Da Democratização e

Acesso aos Veículos de Co­

municaçãoArt. - Em cada órgão de im­

prensa, rádio e televisão seráconstituído um Conselho Edito­rial, com membros eleitos pelosprofissionais de comunicação,imcumbido de definir a linha de

atuação do veículo.Art. - Os partidos políticos, as

organizações sindicais. profis­sionais e populares, tem direito

pelo presidente da Raiobrás.Sob o tema notleia a favor, osdebates foram proibidos pelaRadiobrás, que, inclusive, res­

cindiu o contrato que mantinhacom a Apoio 'Vídeo, produtorado Jornal da Constituinte. A TVEducativa não foi poupada, e

seu programa de debates 1987,foi suspenso por ordem diretado ministro da Educação, JorgeBornhausen. Outra denúnciarelatada do telex, foi a de queo programa Opinião Pública, daTV Brasília, cancelou uma en­

trevista programada com o ge­neral Andrada Serpa, cedendoa ameaças de corte na publici­dade, feitas diretamente pelo ti­tular da Secretaria de Comuni-

Liberdade de expressão!

V - Dos Serviços de Radio­difusão.Art. - Dependem de conces­

são ou autorização da União,outorgadas em caráter precário,atraves do C. N. de C., atendi­das as condições previstas em

lei:& - O uso de freqüência de

rádio e televisão.§ - A instalação e o funciona­

mento de televisão direcional e

por meio de cabo.§ - A instalação e o funciona­

mento de outros serviços detransmissão de imagens, sonse dados por qualquer meio.§ - A retransmissão pública,

no território nacional, de rádio,televisão e dados via satélite.

Art. - O Conselho Nacionalde Comunicação mandará pu­blicar, anualmente, as freqüên­cias disponíveis em cada unida­de da federaçã e qualquer umpoderá provocar a licitação.Art. - As concessões ou auto­

rizações só poderão ser sus­

pensas por sentença fundadaem infração definida em lei, queregulará o direito à renovação.Art. - Com a finalidade de im­

pedir a concentração de pro­priedade dos meios de comuni­

cação, fica estabelecido que ca­da concessionário poderá ser ti­tular de apenas uma autoriza­

ção ou concessão para execu­

ção de serviço de rádio, televi­são e serviços de transmissãode imagens, sons e dados porqualquer meio.Art. - Os concessionários que

acumularem mais de uma auto­

rização ou concessão para exe­

cução de serviço de radiodifu­são deverão optar pela execu­

ção de um dos serviços objetosde autorização ou concessão,devendo os demais ficar dispo­níveis para redistribuição atra­vés de licitação pública.Art. - Fica vedado o controle

indireto das autorizações e con­cessões para execução de ser­

viços de radiodifusão por tercei­ros e concessão.

cação Social da AdministraçãoFederal. O jornalista Mino Car­ta, da TV Record, numa atitudede coragem e dignidade profis­sional, demitiu-se ao ser infor­mado das pressões feitas porAntonio Carlos Magalhães, mi­nistro das Comunicações, juntoà direção da empresa, para cen­surar o programa Jogo de Car­tas por ele dirigido.O texto finaliza condenando

as atitudes dos falsos jornalistasque se travestem de censorese exige uma total transparênciados atos governamentais, con­dição básica para a democraciaque todos querem ver instaura­da no país.

P 2.

ZERO. ,-- J.U�HO 87

FENAJ protesta contra a censura.

É o que quero País: ampla e

irrestrita

"A democratização dosmeios de comunicação é condi­ção fundamental para a cons­

trução de um regime efetiva­mente democrático no Brasil,em que os diversos segmentosda sociedade, independente desuas convicções políticas, pos­sam livremente se expressar.Queremos garantir o pluralismoe preservar a diversidade cultu­ral. Queremos pôr fim à censu­

ra, inclusive àquela determina­da pelos donos dos jornais, re­vistas, rádios e televisões. Que­remos que a informação deixede ser tratada como se fosseuma mercadoria e passe a serencarada como um bem social.Queremos que a liberdade deexpressão no Brasil não se limi­te à liberdade que os empresá­rios de comunicação têm de de­fender seus próprios pontos devista. Queremos garantir o am­

plo acesso aos veículos de co­

municação e a participação di­reta dos setores organizados dasociedade civil na definição deuma política democrática de co­

rnunicação" .

E assim que a Federação Na­cional dos Jornalistas (Fenaj) in­troduz sua proposta de dispo­sitivo constitucional, apoiadapor diversas entidades repre­sentativas da sociedade, quedispõe sobre "o direito à comu­

nicação, a natureza e o acesso

aos veículos de comunicação e

cria o Conselho Nacional de Co­municação". A proposta intro­duzida em parte, no relato dasubcomissão, necessita agorado apoio da sociedade civil, re­presentada na campanha deassinaturas que lançamos aquipara ser enviada à AssembléiaNacional Constituinte até os pri­meiros dias de agosto. Em Flo­rianópolis você pode procurar alista no Curso de Jornalismo(UFSC). A seguir transcreve­mos a íntegra da proposta dedispositivo constitucional:

1- Do direito à comunicaçãoArt. - A comunicação é um

bem social e um direito funda­mentai da pessoa humana e a

garantia de sua viabilização éuma responsabilidade do Esta­do.

CARLOSLOCATELLI

Utilizando mecanismos da di­tadura militar, o governo federalvem coibindo o trabalho da im­

prensa na cobertura da Assem­bléia Nacional Constituinte. Acensura voltou com força total,impedindo entrevistas, dificul­tando o trânsito de jornalistasno Palácio do Planalto e discri­minando noticiários veiculadospela Radiobrás e Funtevê. Opróprio presidente da Repúblicaengajou-se nessa campanha,proibindo o acesso dos jorna-

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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'IMPRENSA

A imprensa do Rio Grande dosul está atravessando uma crisebastante séria, e corre-se o ris­co do agravamento do mono­

pólio da informação nas mãosda RBS (Rede Brasil Sul de Co­municações), grupo poderosocuja televisão é afiliada à RedeGlobo. Mais de 600 profissio­nais já foram demitidos pelascinco principais empresas gaú­chas - Grupo Caldas Júnior, Re­de Pampa, RBS, Rede Bandei­rantes e TV Educativa. A situa­ção em Porto Alegre é tão graveque os sindicatos dos jornalis­tas, radialistas e administrativos- agora transformados em um

sindicato único - estão apelandoaos empresários e anunciantesdesses veículos para que man­

dem telegramas aos proprietá­rios exigindo a manutenção daqualidade da programação, jáque disso depende a audiênciado público, e a venda de seus

próprios produtos anunciados.

"Só temos liberdade de empresa"Lobby derrubatentativas dosjornalistaspor umaimprensa livre

DAURO VERAS

"O governador de Minas Ge­rais, Newton Cardoso, pressio­nou dois deputados a mudaremo voto, para derrubar o projetode democratização dos meiosde comunicação na Constituin­te", denunciou o presidente daFederação Nacional dos Jorna­listas (Fenaj), Armando Rollem­berg, que esteve em Florianó­polis no dia 2 de junho a convite

. do Movimento de Oposição Sin­dical M.O.S. dos Jornalstas.

Apresentada à subcomissãode comunicação social da As­sembléia Constituinte pela de­putada Cristina Tavares Correia(PMDB-PE), a proposta é ba­seada na seguinte premissa: ainformação deve ser considera­da como um bem público, nãodevendo ser manipulada como

mercadoria. O interesse coleti­vo deve se sobrepor ao intersseparticular. ele foi elaborada pelaFenaj e pela Frente Nacional deLuta por Políticas Democráticasde Comunicação, após amplaconsulta aos vários segmentosda sociedade e à categoria.

"O governador de Minasameçaçou os deputados fede­rais Aloísio Vasconcelos e Ro­berto Vital (ambos do PMDB deMG), dizendo que se eles nãovotassem coma o projeto, ve­

riam rolar cabeças - as suas

mesmo. Com isso modificarama postura anunciada de apoioà proposta, e ela foi derrotada",disse Rollemberg. Ele citou tam­bém quatro constituintes quevotaram' contra, em causa pró­pria, por serem proprietários demeios de comunicação em

massa: José Elias (PTB-MLS),Arnoldo Fioravante (PDS-SP),Rita Furtado (PFL-RO) e JoséCarlos Martinez (PMDB-PR).

ARMA pOLíTICAA proposta que foi rejeitada

pela subcomissão tem basica-'mente cinco pontos. O primeirodeles é a criação do ConselhoNacional de Cominicação So­cial, com 15 integrantes oriun­dos de entidades civis, desig­nados pelo Congresso Nacio­nal. Este Conselho teria o man­

dato de dois anos e a atribuiçãode definir a política para o setor,inclusive passando a ter a prer­rogativa de conceder canais de

Foto/André Dusek/Agil

Rollemberg: mais assinaturas

rádio e televisão - o que atual­mente é privilégio do presidenteda República. "A concessãotem que deixar de ser moedade tráfico político", diz o presi­dente da Fenaj, lembrando queo presidente João Figueiredo,em seu governo, destinou 40%das concessões de rádio e TVdo país a grupos que pouco ou

nada têm a ver com os interes­ses populares. Um exemplo cla­ro é Tarcísio Maia, representan­te da poderosa oligarquia Maia,do Rio Grande do Norte. Ele ga­nhou oito concessões de rádio,como forma de favorecimentopolítico.

Outro ponto é a desconcen­tração da propriedade no cam­

po das comunicações. Nenhu-

ma pessoa física ou jurídica po­deria ter a concessão de maisde uma canal de rádio ou TV.Isto traria uma série de vanta­

gens, como o combate à massi­ficação, e umamaior ênfase aos.valores regionais, também dimi-nuindo o poder de manipulaçãode informações. "Não faz sen­

tido uma pessoa do interior dePernambuco falar com sotaquede Ipanema", acha Rollemberg.Ele ressalta que a intenção nãoé impedir a trasmissão em rede- fato inevitáel em um país dedimensões continentais como o

Brasil - e sim desconcentrara propriedade no setor, favore­cendo as transmissões regio­nais.

Sobre as rádios livres, a Fe­naj não tem posição oficial, masacredita que, dentro de uma po­lítica de democratização, é pre­ciso que a sociedade tenhaacesso a elas. "Isto teria queser regulamentado, é óbvio.Uma rádio livre funcionando aolado de um aeroporto, porexemplo, poderia interferir deforma perigosa com as opera­çõs de vôo".

SATÉLITEO projeto prevê a criação de

conselhos editoriais em todosos meios de comunicaçã demassa, de forma que os profis­sionais da área possam discutire deliberar sobe a linha do veí­culo. "Nõ existe liberdade de im­prensa no Brasil, e sim de em-

presa", diz o jornalista. Essesconselhos editoriais ficariamresponsáveis pelo processo deprodução e difusão de informa­ção, impedindo que a mesmafosse manipulada.Outro item importante: o direi­

to de antena, ou seja, a amplia­ção do direito de resposta a todocidadão que se sinta atingidopor informações divulgadas porveículos de comunicação demassa. A resposta poderta sertransmitida da mesma forma,com o mesmo destaque.O quinto ponto é o monopólio

estatal dos sistemas postais, detelecomunicações e de satéli­tes. Rollemberg chama a aten­ção para o fato de que doisgrandes grupos - a Rede Glo­bo e o Bradesco estão fazendomanobras para conseguir a pri­vatização do uso dos satélitesde comunicação, e isto é umatentado à segurança nacional.

.

O projeto foi derrotado na

subcomissão de comunicação,mas a luta prossegue. A inten­ção da Fenaj e da Frente é levá­lo às ruas o mais rápido possí­vel e recolher assinaturas parareapresentar proposta no plená­rio da Constituinte. Resta agoramobilizar a sociedade, desper­tando as pessoas para a impor­tântica vital da democratizaçãoda comunicação. Vamos torcer

para que os "representares dopovo" não se prostituam mais

uma vez.

Uma das providências maisradicais foi tomada pela direçãoda Caldas Júnior, que edita oCorreio do Povo e detém a Rá­dio e a TV Guaíba. O proprie­tário, Renato Ribeiro, inovou to­talmente, reduzindo o tamanhodo centenário Correio do Povo,que era standard, para um ta­blóide com 16 páginas, três cen­tímetros menor que o tamanhooficial, nas cores azul e preto.Além disso, iniciou a distribui­ção gratuita de 200 mil exem­plares a seus assinantes, e ameta é chegar a um milhão. OCorreio do Povo também estásendo vendido em algumasbancas, pela metade do preçodos outros jornais. Mais de 60jornalistas já foram demitidoscom a mudança, e os progra­mas de produção local da TVGuaíba - inclusive os de jorna­lismo - foram extintos. O tele­jornal agora se limita à leiturade telex vindos de agências de

A crise no RSreduz os

anúncios. Osjornaiscortam as

vagas. Retornao fantasma domonopólio

Correio:agora

tablóide

notícias, e teipes cedidos pelogoverno do estado.A Rede Pampa, que investiu

em programação jornalística hápouco mais de um ano, tantona TV como no rádio, empre­gando cerca de 100 novos pro-

fissionais, simplesmente deci­diu fechar o departamento dejornalismo da rádio. A alega­ção? Prejuízo mensal de Cz$ 1milhão, por causa dos jurosbancários. Somente na redação

do jornal Zero Hora, que é o demaior tiragem e maior númerode leitores, 20 repórteres já fo­ram para a rua. O Diário do Sul,editado pela Editora GazetaMercantil é o único que não de­mitiu ninguém até agora, masos salários vêm sofrendo atra-sos.

.

A crise ameaça se alastrar aSanta Catarina e a outros esta­dos. Promover a alta rotativida­de de jornalistas com um baixopiso salarial de ingresso, esteé o principal objetivo das gran­des empresas. Elas pretendemeconomizar demitindo maisgente, e aproveitando-se dogrande número de desempre­gados para pagar cada vez me­nos a quem estiver entrando.Uma das lutas prioritárias da ca­tegoria, hoje, é pela estabilidadede emprego, concessão que es­tá sendo difícil de arrancar namesa de negociações, e tam­pouco o será na Justiça:

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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MARIA VOSHIZATO

o Curso de ComunicaçãoSocial-, habilitaçãoem Jornalismo, da Universidade Federal de SantaCatarina apresenta carência de equipamentosconforme a Resolução de fevereiro de 84 do Con­selho Federal de Educação que determina janeirode 87 como data limite para que todos os cursos

de Jornalismo estejam totalmente equipados.A necessidade de quipamentos e espaço físico

corresponde à quantidade de alunos por sala deaula. Com a implantação do novo currículo, ésubstancial o aumento das necessidades de ma­

terial e equipamentos. Mas também é significativoao aumento qualificativo no ensino teórico e prá­tico na área de Jornalismo. '

A lista de materiais e equipamentos técnicos

para completar a Resolução de 02/84 é grande.No Laboratório de Fotografia são necessárias 10câmeras fotográficas de 135mm com flash eletrô­nico que custam cerca de Cz$ 22 mil cada. Alémde 10 ampliadores fotográficos com as respec­tivas lanternas e banheiras (Cz$ 7 mil cada con­

junto), uma teleobjetiva de 40mm por Cz$ 6 mile um projetor de diapositivos com sincronizadorde som e imagem por Cz$ 10 mil.

O Laboratório de Radiojornalismo precisa deuma mesa de som com seis canais (no mínimo,Cz$ 10 mil) e dois gravadores de som - Cz$4 mil cada. Para a disciplina de PlanejamentoGráfico são necessárias vinte pranchetas (Cz$1.500) e oito mesas luminosas para visão de

transparências (Cz$ 3 mil cada). Para a aula de

Redação são necessárias 30 máquinas de escre­ver que custam em torno de Cz$ 5.200 a unidade.:O total de verbas previstas para a compra des­

tes equipamentos técnicos situa-se ao redor de5300 OTN (1 milhão 335 mil e 600 cruzados).Cobras-se em OTNs devido à inflação galopantedeste ano.

O Laboratório de Telejornalismo já é outro pro­blema grave do curso pois são necessários maisde US� .119 mil (Cz$ 4.5 milhôes) para compraros equipamentos. Para se equipar um laboratórioé necessário: uma câmera portátil, duas ilhas deedição, um programador de edição, três grava­

do�es p�Jrtáteis, cinco conjuntos de iluminação pa­ra hgaçao em corrente alternada, microfones paragravação externa e interna, monitores para o tra­

b�lho nas ilhas de edição, televisores, tripés paracamera entre outros materiais, o mínimo para ga­rantir o funcionamento. A verba estava aprovadadenro do Programa Nova Universidade mas foisuspensa. Em virtude disto soliciou-se adicionaro valor de US$ 119.500,00 ao Cz$ 1.335.600,00destinados pela Comissão de EspeCialistas doMEC à UFSC para equipar o curso.

Atualmente, os alunos da terceira fase editam

suas reportagens na ACARESC e os da sétima

fase, na produtora independente EVO. Enquantoo laboratório do curso não vem, se é que vem.

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: .',' .... CAMPUS.'

.

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MONIQUE VAN DRESSEN

Está em fase de revisão na Imprensa Universitária "OCinema em Santa Catarina" um dos primeiros livros abor­dando cinematografia do Estado. Feito em co-edição pelaUFSC e Embrafilme, a idéia surgiu de uma pesquisa feita

por alunos do curso de Jornalismo, que em 84 promoverama 1 � Mostra de Cinema Catarinense e lançaram a criaçãode uma Cinemateca. A mostra foi divulgada pelos jornaislocais e, através da revista Lux, que re-publica textos sobrecinema, a Embrafilme tomou conhecimento do trabalho e

interessou-se por sua publicação.Desde o ano passado a pesquisa dos estudantes Andréa

Grossenbacher, Zeca Pires, Maria Nesi, Norberto Depiz­zolatti e Sandra Araújo vem sendo atualizada e o seu texto

adaptado para a edição do livro. Taiana Oliveira, Beth Bie­

ging e Simone Garcia colaboraram na nova versão e final­mente o livro vai sair.

Através de pesquisas em todo o Estado e na Cinemateca

de Curitiba mostrou-se, na primeira parte do livro, uma histó­ria do nosso cinema, desde as primeiras produções ama-

'

doras (principalmente filmes mudos feitos por imigrantesno início do séculO) até produçõesmais recentes. A segundaparte aborda, "O Preço da Ilusão", primeira experiênciacatarinense em longa-metragem. Feito em 1957 pelo GrupoSul, nosso primeiro longa tem valor documental e histórico,porque mostra uma Florianópolis que não existe mais. Suas

cópias foram perdidas restando na Cinemateca Brasileira

de novos professores. os au­tores do documento pro­

põem a extinção do curso deciências sociais (bacharela­do) no período noturno.

A escolha recaiu sobre o

curso noturno pois. conformesua versão "o turno diúrno

é o único utilizado pelos cur­sos sérios".

É conveniente saber o

conceito de "sério" utilizado

pelos professores para fazertal afirmação.Os professores desconen­

tentes esquecem aquela par­cela de estudantes que, porfalta de opções. são obriga­dos a freqüentar cursos paraos quais não possuem a me­

nor vocação. E o fazem porum único motivo: durante o

dia eles trabalham para so­

breviver.E este, se é com certeza

um problema a ser tratado.não nos autoriza a classificaros cursos noturnos de "pou­co sérios".Quando este jornal estiver

circulando, o documento terásido discutido no departa­mento de Ciências Sociais.Mas isto não invalida a im­

portância dessa notícia, pois.a qualquer momento podesurgir da mesma catacumba

de onde partiu a proposta,outra aíndamals aterradora.

� A,TERRADORA ,

, , CATACUMBA

apenas seus quinze minutos finais e toda a banda sonora,

Produzido por Armando Carreirão, "O Preço da Ilusão"não recebeu o certificado de qualidade, que obrigaria a

sua exibição, e acabou dando prejuízo, Para cobri-lo, Carrei­rão teve que produzir cine-jornais e documentários, monta­dos em São Paulo e exibidos em Santa Catarina.

Para agradar os cinéfilos mais bairristas ou recordar os

tempos em que assistir cinema era "o melhor" programa,o livro conta que Paulo Emílio e outros tantos críticos, cineas­tras e artistas conheceram o "Cinema Novo" ali, no cine '

Ritz! A primeira Semana do Cinema Novo foi patrocinadapelo Gabinete de Relações Públicas e pelo extinto GrupoSul.

A terceira parte do livro narra a atuação do Grupo Univer­sitário de Cinema Amador, (Guca) que continuou o trabalhona área de ficção, aberta por "O Preço da Ilusão". O GUCA

produziu cerca de seis curtas, dos quais os mais conhecidossão "O Novelo", "Via Crucis" e "Olaria". A produção atual,dos anos setenta para cá, foi dividida em fases, e a quartaparte do livro contém as sinopses das principais produções:filmes produzidos pelas prefeituras, projetos como "AnitaGaribaldi" e filmes na bitola super-8.

Na última parte o livro fala dos cineastas catarinenses

que alcançaram projeção nacional e internacional, orde­nando as filmografias de Süvio Bach, Rogério Sganzela,Marcos Farias, João Caligaro, Ody Fraga e conclui, quetodos eles tiveram projetos para desenvolver o cinema cata­rinense, mas tiveram que deixá-los de lado e sair do Estado

para atingir seus objetivos. Será que a história do cinemacatarinense termina aí?

Cervejinha depoisda aula só é possível

fora do campus

PI./REMíSIOAh! Uma cerveja gelada de­

pois de uma aula desoastantenuma tarde de calor! Existevontade mais fácil de satisfa­zer? É só ir ao bar da DonaNina, Pois é lá no Centro Tec­

nológico, o único lugar ondeencontramos algum tipo de be­bida alcóolica sendo vendidana UFSC,Temendo que a capacidade

dos alunos da UFSC seja afe­tada, a proibição foi imposta,E a medida foi adotada sem

que a comunidade estudantil ti­vesse sido consultada, justa­mente numa decisão que afetadiretamente, os alunos.Nos demais bares da UFSC,

o bar do Básico, a Cantina doConvivência, o bar da Medici­na e o Natural do Centro deConvivência, a venda não érealizada.O gerente do bar do Básico,

Danilo, confirmou que lá nuncaforam vendidas bebidas alcóo­licas e ele nem têm interesseem vender.JáMaurício, gerente da Can­

tina do Convivência, é contra

apenas a venda de bebidas dealto teor alcóolico, como a ca­

chaça, por exemplo, Mas a

proibição da cerveja é ridícula.

Ali, na cantina foi vendido cer­

veja preta no ·horário do almo­

ço.Um funcionário do bar da

Dona Nina, no Centro Técno­lógico, que não quis se identi­ficar, afirmou que, o bar vende

cervejas, pois é preciso satis­fazer a vontade do freguês,A comunidade estudantil,

que enquanto isso bebe sucos

e refrigerantes, aprovaria, semdúvida, a venda e está cons­

ciente dos' horários de venda,Nilo Andrade, Presidente da

Comissão dos Bares da UFSCe dono da Cantina do Convi­vência e do Bar Natural, afir­mou que se a venda fosse, li­berada os estudantes perma­neceriam dentro da Universi­dade, já que aqueles que vãobebericar nos arredores daUFSC, dificilmente voltam paraas aulas.Se os forrós, coquetéis, reu­

niões e encontros que por aquiocorrem são regados a álcool,como é que fica a proibição,apenas para os bares?No dia 2 de junho às 9 horas,

na Reitoria da UFSC, a Pró-rei­tora de Assistência à Comuni­dade, o Pró-reitor de Adminis­

tração, a Comissão de Baresda UFSC e a Diretoria do DCE,tinham marcada uma reunião,que acabou sendo adiada. Oassunto de pauta seria a libera­ção de vendas de bebidas al­cóolicas após os horários deaulas, nos finais de semana e

feriados,Ao que parece, só "eles".

querem continuar bebendo.

Cinema de SC vira tema de livro

CAÊCASTROCuidado! Se você é um da­

queles jovens, vindos do in­

terior e sem parentes impor­tantes. que tem de trabalhardurante o dia para poder semanter em Florianópolis e ãnoite estuda em algum doscursos da UFSC, prepare­se: estão querendo te expul­sar da escola.Dessa vez não é oministro

da Educação ou o reitor.

Agora quem está propondoesta "jóia" é um grupo de

professores do curso deCiências Sociais.A proposta, enviada em

forma de documento à chefiado Departamento de Ciên­

cias Sociais, é assinada pe­los professores Euduardo

t!OI�c�e��; (l,���e�a�lijOÚII�Guivant. todos eles conside­rados "progressistas".Logo no início de seu do­

cumento, os "mestres" cons­tatam que no curso de ciên­

cias sociais existe "um baixo

nível de aptidão acadêmica

e de vocação sociológica".Acusam as causas: "Inexis­

tências de uma massa crítica

( ... ) e a imagem precária queo curso tem na comunidade.

não atraindo jovens talento­

sos e empreendedores", es­clarece o documento.Para os quatro professo­

res, "60% dos alunos nãotem condições mínimas pararealizar o curso", acrescen­tando que esse pessoal atra­palha o restante.

Outro grave problemaapontado é o de sobrecargahorária enfrentado pelos pro­fessores, que' estão sem

tempo para exercer outras

atividades.Em vez de propor uma am­

pla discussão interna sobreos problemas e indicar uma

profunda reforma curricular

que venha a tornar o curso

mais estimulante. capaz de

desenvolver as aptidões dosalunos, além da contratação

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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JU�HO 87'

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o mago datela fala desua pintura

DENISE BEZERRA

Apesar das demolições dos antigos prédios de Floria­nópolis, que as imobiliárias insistem em subistituir porpredios horrorosos de concreto, existe um mago cha­mado Aldo Seck, que pinta em seus quadros o queestá sendo destruâo e magicamente não deixa quemorra a memória de nossa cidade. Aclamado por mui­tos e ignorado por alguns, Aldo Seck é o único artistano estado que se dedica à preservação iconográficada arquitetura colonial de Florianópolis. Em seus qua­dros podemos ver como foi a cidade antes dos aterrose demolições, que a descaracterizaram muito.Homem simples e sensível, Aldo Seck pinta desde

1947, mas desenha desde criança. Fiel ao impressio­nismo, é autodidata em desenho, óleo, aquarela, xilo­gravura e nanquim. Já fez inúmeras exposições, inclu­sive em São Paulo e Curitiba, mas garante que nãovai expôr mais. O motivo? Fica muito nervoso com

a expectativa.E um mestre da arte; que nasceu e vive em Florianó­

polis, mas que há apenas dois anos recebeu o merecidoreconhecimento. Muitas lições estão contidas nessa

verdadeira demonstração de amor em forma de artecom que Aldo Seck homenageia a Florianópolis atual.

Z - Como começou sua carreira?AS - Nunca entrei em escola de pintura e comecei

a desenhar quando ainda era criança. Como a escolanão dava muito tempo, desenhava nos finais de sema­na. Mais tarde passei para a aquarela. Com a aposen­tadoria é que eu pude me dedicar inteiramente à pin­tura.

Z - Por que a preferência pela arquitetura de

Florianópolis? .

AB - Comecei a observar que os antigos edifíciosestavam desaparecendo e resolvi fazer uma documen­

tação histórica. Com o progresso, a cidade foi um poucoprejudicada e no lugar dos prédios antigos existem sócsixss de cimento, Acho que deviam preservar mais.

Z - Você teve o apoio necessário?AS - Sim. Fiz muitas exposições, até em outros

estados. Apenas uma vez me senti desestimulado e

parei completamente por mais ou menos quatros anos,devido às críticas que recebi. A crítica tanto pode ajudarcomo pode prejudicar e foi o que aconteceu na época.Hoje podem falar o que quiserem, pois eu pinto porprazer.

Z - E quanto aos artistas catarinenses de hoje,qual a sua preferência? ,

AS - Gosto muito do trabalho de Vera Sabino, Atilae Prético.

Z - Santa Catarina tem público para este tipode arte?AS - O meio de cultura evoluiu bastante em todo

o estado. Slumenau, Joinville e até Tubarão já têmseus artistas e seu público.

Z - Hoje, um artista consegue viver da pinturaem Santa Catarina?AS - Já foi pior, mas não em muito apoio. Quem

está começando agora não consegue mesmo. É maisfácil do que antigamente, até para fazer exposições,mas ainda falta apoio.

ALDO BECK

j'

-��

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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FOTOS: CARLOS LOÇôTELLl/ZE,RO

Esther Jean Langdon, antropóloga e professora da

UFSC, conviveu com grupos indígenas na Amazônia, onderealizou inúmeros trabalhos científicos sobre drogas, algunspublicados nos EUA, México e na Europa, Para ela, o

uso de drogas não pode ser excluído do contexto cultural

e, nesse sentido, as atitudes em relação a elas são decisões

de cada sociedade, Jean observa que o uso de alucinógenosse confunde com a história do homem, As religiões arcai­cas, por exemplo, foram baseadas, entre outras coisas,na condição de êxtase que os alucinógenos trazem, Segundoela, o uso de drogas entre os indígenas é sagrado e muito

controlado. Além disso, há assistência de um Xamã, espé­cie de feiticeiro muito experiente no uso dos alucinógenos,que guia as pessoas durante as cerimônias. "Entre eles

não há casos de viciados ou pirados, pois conhecem o queestão usando há centenas de anos", comenta a antropóloga.Os índios com quem ela trabalhou nos Andes usam, além

dos alucinógenos para fins religiosos, a folha da coca, pararealizarem trabalhos físicos e conter a fome.VALORES"As pessoas estão usando drogas para obterem prazer,

e prazer é uma busca constante em nossa sociedade. Os

indivíduos se drogam conforme a sociedade propõe e aca­

bam fazendo experimentos em si próprios", explica Jean.

Ela crê que a propaganda feita sobre as drogas atualmente,que as associam a comportamentos anormais, contribuimuito para que sejam utilizadas de forma absurda. Essa

propaganda é perigosa na medida em que os jovens veêm

na proibição um motivo de rebeldia, fazendo exatamente

o que a sociedade previu como resultado do uso de tóxicos.

Jean não concorda com a idéia de que a repressão vá contero consumo, lembrando a Lei Seca nos EUA durante os

anos 20, que proibiu a fabricação e comercialização de

bebidas alcoólicas, e que gerou o tráfico e o crime organi­zado. "A repressão deve ser repensada, pois esse método

é utilizado em outras áreas problemáticas, sem apresentarbons resultados" , analisa a antropóloga. Ela defende uma

visão mais realista do problema, e cita o exemplo do estado.

do Oregnon nos Estados Unidos, onde uma pessoa apreen-dida com pequena quantidade de maconha ou cocaína,é somente obrigada a pagar uma pesadamulta. Essa, segun­do ela, é uma nova visão, mas a maneira do mundo encarar

a droga não mudou nada. Apenas a preocupação aumen­

tou, com o crescente consumo de cocaína,

"A educação é fundamental para a resolução do proble­ma", diz Jean. "Mas uma educação que não proíba necessa­

riamente e se volte para a informação e pesquisa científica.É preciso dizer a verdade, pois uma realidade pode ser

danosa e outra não, afinal o medo não pode transformar

a educação em mentira", finalisa a antropóloga.Colaborou Marques E. Casara

Polêmico, o temadivide: os quecondenam e os queaprovam. Em quatrodepoimentos, asvisões de cada umdesses elos. E a

da antropólogaJean Langdon

Consumidores: "Polícia deveriase preocupar com a violência"

O.E., 16 anos, e D.C., 18, são dois jovens boa pinta,vindos do interior para cursarem pré-vestibular. Moramnum bom apartamento no centro de Florianópolis e usam

maconha e cocaína regularmente. E a nova face da droga,onde o consumo não se reflete na aparência dos que esco­

lhem esse caminho.Eles recorrem à droga para irem a festas, para dormir,

ou mesmo para ficarem coçando o saco. Geralmente não

usam para estudar, pois ficam viajando o tempo todo. A

curiosidade foi o que os levou a experimentar pela primeiravez, há quatro anos atrás, um velho conhecido de muitas

gerações: o lança-perfume. Depois dele, o fumo e o pó."Quero experimentar tudo que estiver por aí", diz D.c.,"mas isso não significa que uma droga sirva de caminho

para outras mais fortes, é uma questão de estar a fim".

Ele não sabe quando vai parar, mas acredita que seja uma

fase. "Cheiro coca há muito tempo, mas já estou enchendo

o saco, e se quiser parar eu posso. A vontade de continuar

é muito grande, mas dá pra parar". Quando notam queseus hábitos estão mudando, dão um tempo na coisa paranão fissurarem. O.E., não acredita que o uso de tóxicos

gere violência, porque "dá muita paz interior, e quem viajanão está afim de agredir ninguém".

BASEADINHO

"Aqui em Florianópolis é difícil encontrar quem não

fume", dizD.C., pois tudo é mais liberal do que no interior.

Lá, segundo ele, "o uso de coca está em alta, pois dá

status cheirar. f como terum carro novo, coisa da moda".

Aqui eles adquirem a mercadoria com facilidade, pois está

em todo o lugar. Quanto ao medo de serem presos, confes­

sam que existe, mas não é um fator que determine mudançade comportamento. "A polícia deveria se preocupar mais

com outras coisas, como a violência, os assaltos, a corrup­ção no governo e não ficar prendendo quem fuma um

baseadinho por aí", complementa D.C ..

CARLOS

LOCATELLI

Traficante: "Consumo cresceu muito

por causa da angústia generalizada" o xerife: "Política não pára investigação"Bebendo uma gelada na

mesa de um bar, converseicom um dos "pontas" (trafi­cante), que passam a coca

em Florianópolis. Sem

identificar-se, ele esclare­ceu que não se considera um

delinqüente, pois sua filoso­fia difere damaioria dosqueestão no comércio das dro­

gas. Além do lucro, ele cur­te muito as amizades que a

transa lhe trouxe ao longodos doze anos de atividade.Seu grupo é seleto, com

aproximadamente 20 usuá­

rios, de bom nível cultural,a maior parte com curso su­

perior, uma boa posição so­

cial e que encaram a cocaína

como parte de um conjuntode coisas boas que a vidatem. Ele controla a quanti­dade que cada usuário ne­

cessita e geralmente não

fornece doses extras, para"que ninguém se passe". Oscompradores são antigos e

podem pagar o pó quandorecebem seus salários. Parater uma vida normal, elemantém um emprego e não

quer aumentar o negócio,mas já teve oportunidade de .

passar "até tonelada", se .

quisesse.O TRÁFICO

Sem falar muito do siste­ma de tráfico, ele cita os trêselementos que estão no fi­nal do esquema: o "mula

,

(transportador), que trás a

mercadoria e recebe por es-,se trabalho uma cota fixa;o "meio campo", que rece­

be e centraliza a distribui­

ção e finalmente, "o pon­ta", que compra a merca­

doria do "meio campo" e

vende para o usuário. O

"ponta", que geralmentetambém é usuário, é quemmais se arrisca em toda a

transação, já que se expõea um número maior de pes­soas ao mesmo tempo. Afunção do "meio campo" é

a mais segura e mais rentá­

vel do negócio. A coca, que

aparta em Florianópolis po­de vir tanto do Rio Grande

do Sul, quanto do Paraguai,variando conforme se en­

contra o "clima na Ilha",pois é grande a quantidadeque circula e a pressão da

polícia é constante.

Indagado se a transaçãoda droga não é a causadora

da violência atual, ele res­

pondeu que essa violência

não é fruto dos tóxicos, massim do próprio sistema, no

qual a droga também estáincluída. Para ele, o álcool

e o cigarro matam muito

mais que a cocaína, e todos

sabem disso. Mas a socie­

dade se recusa a enfrentar

o poder político e econômi­

co existente por trás desses

produtos, que é infinita­

mente superior ao poder dadroga. Ele afirmou que o

ELÓI: As cidades com

maiores problemas são Flo­

rianópolis, criciúma, Join­ville e Itajaí. Elas recebem

as drogas através de auto­

móveis que vão buscar fora

do estado, ou recebem co­

mo encomenda pelos ôni­

bus convencionais,

ZERO: Quem distribui as

drogras na i1ba?

ELÓI: OS donos de deter­

minadas docas, como o

Morro do Mocotó, da caixa

d'água, a boca doGil no Es­treito, e outros.ZERO: E por que a polícianão cbega nesses locais?

ELÓI Nós chegams, mas a

falta de pessoal e de um de­

legado só para tóxicos difi­

cultam as operações. Por

enquanto estamos improvi­sando. Outro problema é a

quantidade: tem muita dro­

ga por aí. Florianópolis é

uma das capitais de maior

consumo de tóxicos do país.ZERO: Além do consumo,

Florianópolis não seria pon­

te na distribuição para n res­

to do país?ELÓI: Aí eu não sei. Eu

posso afirmar que é de con­

sumo, agora se é ponte eu

não sei. Florianópolis fica

meio fora de rota para ser

ponte.

tável é que esses indivíduos

nem sempre se recuperam.

A maconha, que dizem ser

fraca, trás seqüelas irrever­síveis e o viciado não volta

mais ao normal.

ZERO: A polícia distingueo usuário do viciado?

ELÓI: O usuário é quemtem mais chances de se re­

cuperar. Ele para de dar

uma "bolinha" quando a

Polícia aperta. Se não aper­

tarmos, ele se transforma

num viciado, e viciados nãoexistem muitos.

ZERO: Reprimir os usuã­

rios tem o efeito esperado?ELÓI: Quando atacamos,

os indivíduos se recolhem,

porque esse tipo de pressãointimida não só quem acaba

preso, mas as pessoas quefazem parte de seu grupo.É uma maneira de se fazer

prevenção. Na prática, sa­

bemos que é isso que ocor­

re.

ZERO: Qual a estratégiautilizada pela polícia?ELÓI: Um policial tenta

comprar a droga para con­

firmar o ponto, e, no mo­

mento apropriado, caímosem cima deles.

ZERO: Quais são os princi­pais centros tráficos e consu­mo no Estado?

Exercendo o cargo dediretor do DepartamentoEspecializado em Investi­

gações Criminais

(DEIC), o delegado Elói

Gonçalves de Azevedo é

também o responsávelpelo combate ao tráficode tóxico em Santa Cata­

rina. Favorável à pena demorte para traficantes,acredita na repressão co­

mo forma de evitar o uso

de drogas, pois, segundoele, o tráfico está entre

os piores crimes cometi­dos contra a sociedade.

Nessa entrevista, o dele­

gado Elói, que confessa

ter entrado na Polícia in­fluenciado pelas históriasde Flash Gordon e Tom

Mix, fala como vê o pro­blema das drogas e como

atua.

ELÓI: No grande traficantenós não chegamos, mas va­

mos chegar. Ele só deixa a

mercadoria aqui e desapa­rece. Então temos de pegá­lo na hora. Esse elemento

que foi preso perto da As­

sembléia é dos grandes, e

com ele foi encontrado,além de cocaína, uma lista

das pessoas que compravamo pó.

Lobão ou mesmo Gilberto

Gil, não são usadas paradesviar a atenção pública doelemento central da ques­

tão, ou seja, o traficante?ELÓI: Nós, como policiais,temos que reprimir todos,sejam eles traficantes, usuá­rios ou viciados. Não pode­mos abrir mão de nenhum

deles.ZERO: Qual seria a soluçãopara o problema?ELÓI: A médio e longoprazo seria através da edu­

cação nas escolas, pois a

criança tomaria consciência

do perigo do tóxico. A curto

prazo seria necessário equi­par a polícia e atacar. Aquiem Florianópolis é precisouma Delegacia Especializa­

� com no mínimo, 50 ho­mens e cinco delegados. Deimediato a única saída é a

respressão. Ela tem que ser

feita em todos os lugares e

sobre todas as pessoas sus­

peitas, sem distinção algu­ma.

ZERO: O poder econômicodas drogas impede ou difi·

culta as investigações?ELÓI: Talvez influencie,mas não é o que nos impedede agir. Essa influência não

existe aqui, talvez em ou­

tros lugares exista.

ZERO: E voces vão chegarnas pessoas, das listas?

ELÓI: Sim, vou checar to­

das. A imprensa deu muito

destaque quando prendiGilberto Gil, mas a verdade

é que já detive todos os ti­

pos de pessoas. A ivestiga­ção que eu estiver condu­

zindo, política não pára.ZERO: Como é pago o dedo­

duro das organizações de

tráfico? Através de favores

ou com parte da mercadoria

apreendida, já que a políciatambém carece de verbas?

ELÓI: Nem com favores,nem com mercadorias. Na

SSP (Secretaria de Seguran­ça Pública) existe uma ver­

ba secreta utilizada para es­

sas coisas. Mas o pagamen­to é efetuado sempre em di­

nheiro.

_,ZERO: Prisões como a do

consumo cresceu muito nos

últimos anos "devido a uma

angústia generalizada das

pessoas em relação ao mun­

do". "Com a cocaína, a pes­soa pode encontrar o equilí­brio desejado, ou desequili­brar-se totalmente". Nesse

caso "a droga revela apenasuma fraqueza já contida nas

pessoas". Para ele, a propa­ganda negativa montada

contra a coca não leva em

consideração o trabalho quemuitos políticos, intelec­tuais, artistas e empresáriosrealizam para a sociedade,movidos pela energia que a

droga trás. Ele acredita quecom sabedoria, tudo podeser utilizado.

ZERO: Por que você entrou

na Polícia?

ELÓI: Eu entrei mais in­

fluenciado por certas revis­

tas, era fã do Tom Mix e

Flash Gordon, e sempre

gostei de investigações.ZERO: Como a Polícia vê

o viciado?

ELÓI: Eu considero o vi­

ciado um doente. O larnen-

Elói: pena capital'

sam aplicar algum golpe.ZERO: Mas, justamente

por estar fora das rotas tra­

dicionais, a cidade não esta­

ria sendo utilzada para co­

nexões?

ELÓI: Talvez. Talvez pos-

ZERO: Pelo visto, a polícialocal sõ prende o distribui­

dor, porque não consegue

prender o traficante?

É'nfase na educação

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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CULTURA

Barreiras da criação em vídeoMARIA T. S. CORDEIRO

A novidade do vídeo já faz parte da rotina dos produ­tores dos grandes centros, mas em Florianópolis, capi­tal do sol e do mar (que com certeza dão "altas cenas",como dizem os mais fissurados por imagem) fazer ví­deo é um grande desafio.

Produzir aqui ainda implica em ter que enfrentar mui­tas dificuldades pois, como em todas as outras ativida­des culturais, o maior problema é a falta de apoio dosórgãos governamentais e eventualmente, de empresasprivadas. Mas estas dificuldades não amedrontamquem realmente está a fim de ver numa fita de VHSsuas idéias.

Na área de vídeo em publicidade, o problema nãopassa só pela falta de apoio, mas principalmente pelo"pão-durismo" das agências de propaganda. Janiseda Veiga, gerente da Cena 1, produtora de vídeo, afirmaque as agências querem um produto final de ótimaqualidade, mas sua preocupação maior se concentrano orçamento. "Elas (as agências) investem muito maisna mídia, porque o retorno financeiro é rápido", dizJanise. A parte que exige mais recursos é a produçãode VT que é a locação do estúdio e equipamento deedição. Tudo isso quem faz são as emissoras de TVque possuem o equipamento, o que torna mais cara

a produção.

Na área de vídeo em cinema, a história é outra: a

intenção maior não é ganhar dinheiro e sim mostraro trabalho. Charles da Silva, um dos novos partici­pantes e produtores de vídeo em Florianópolis explica:

POemaS/Monique Van Dressen

Sem poesia

Não tem mais canoa quebradaNão tem mais ninguém em meu quartoNem bilhete najanela perguntando aonde eu que­ro chegar.Não tem mais poesia no cadernoNem certeza, nem tinta no chão.Não tem mais sonho de valsaNem sonho de sambaNem sonho nenhum.

A busca

Minha mãe me diz que eu sou tão equilibrada ...

E nesta corda que eu vou,

procurando em cada neo ou metao rosto que vai me jogar no chão.E cada vez que eu saio de pretodonão é sérioEstou só brincando de ser desenvolvida ...

"No cinema, o pessoal tá preocupado em mostrar otrabalho. No começo só tem dinheiro para fazer curta­metragem".O pessoal que faz vídeo independente usa material

em VHS. O ideal é usar U-MATIC, mas é muito caro.Entre os trabalhos já realizados na ilha, vários delesaté já participaram de festivais: "Loba", "Duende" (quevai sair ainda), "O Espelho", "Política das Cores" (ro­teiro de Mauro Faccioni, direção de Angelo Sganzerla,feito para o Partido Verde). As produções de vídeotambém estão começando a ser usadas para despertara atenção da população para os problemas e parao folclore de algumas comunidades do interior da ilha,como é o caso de um grupo de Sambaqui que estáfazendo um filme sobre as lendas e magias do lugar.

Charles revela que "todo mundo que trabalha na

área de vídeo e cinema tá junto". E esta união só conta

ponto a favor do pessoal. O que importa mesmo éque tenha bastante gente a fim de fazer vídeo em Flori­pa, só que poucas pessoas têm algum conhecimentotécnico adequado, então a solução é promover um cur­so de cinema para que este grupo possa ter acessoa várias informações e partir com mais conhecimentopara campo", sugere.Mas no fundo, tem uma coisa: tudo é poesia, desde

pintura passando por fotografia até cinema também,por que não?

SISTEMASOs sistemas usados na produção de vídeo são: VHS,

U-Matic e Betamax. As diferenças principais entre elesestão na qualidade da imagem e no custo do equipa­mento.O VHS (Vídeo Home Sistem) é o vídeo caseiro, a

qualidade da imagem é inferior à do U-Matic e ao Beta­max. Porém, o equipamento é mais barato, menor e

a disponibilidade de fitas no mercado das locadorasé mais ampla. Já o equipamento de U-Matic é profis­sional e bem mais caro. A qualidade de imagem, no

entanto, é melhor, a bitola é maior e suas câmarastrabalham, com três tubos de imagem. O Betomax,que é fabricado apenas pela Sony tem menos opçõesde filmes, mas o equipamento é mais barato e tambémé caseiro, como o VHS.

MERCADOOs produtores independentes em Florianópolis não

vivem apenas de filmes. As opções de trabalho sã inú­meras, como a gravação de festas (casamentos, ani­versários, etc) e trabalhos relaciorados com os depar­tamentos de relações humana: .cl empresas (treina­mentos). Outra opção é a gravação de vídeo-clips degrupos musicais locais.

Existe a alma brasileira?MILENE CORRÊA

Falando em símbolos nacionais,não o selo, o escudo ou a bandeira,mas o samba (que alguns desavi­sados insistem em confundir com

"rurnba", e que o diga Zé Carioca),a feijoada e o candomblé, vem-meà cabeça a questão da legitimidadedos seus significados enquanto ver­

dadeiros símbolos nacionais. Ora, seperguntarmos sobre a origem destes

símbolos, veremos que os seus cria­dores são exatamente os negros,aquela raça desclassificada, base e

braço econômico do nosso Brasil-co­lônia e, atualmente, base subestima­da (aliás, sempre o foram) do nosso

Brasil-ainda-colônia. Se o perigo das

manifestaçôes coletivas dos negrosjá não existe, e se elas já não afetamo sistema político e social do país,devemos isso a mais um tiro certeiroda nossa classe dominante que, aose apropriar da cultura negra e mar­

ginalizada, não o fez por outros moti­vos que não o de mantê-Ia sob con­

trole e, também, pela sua incontes­tável falta de originalidade e raízes,que a impossibilitariam de criar umacultura própria e significativa, mesmoque para isso tivesse um "HorárioCultural Gratuito".

Que todos nós temos, "lá no fundi­nho", um pouco de sangue negro,é verdade. Mas também é verdade

que temos, "lá no fundinho", um pou­co de todos (ou quade todos) os san­gues: o italiano, o alemão, o portu­guês, o índio, o francês. Acaso a po­lenta, a cerveja, o fado, as penas ou

a Estátua da Liberdade seriam sím­bolos dignos da nossa nacionalida­de? Acredito que esse nacionalismobarato, que hoje toma forma alienan­te, mas que tem fundo essencial­mente político, seja mais um escudo

(não símbolo) para que a elite se pro­teja da negritude, do que o líquidomágico da fusão das culturas e ra­

ças.

Se o Brasil é vendável (talvez, umdia, venha a ser viável também), mui­to tem contribuído para isso a expor­tação do "nosso" samba, da "nossa"feijoada, do "nosso" Carvanal e deoutros "nossos" que não são bem

assim, até do "nosso' futebol (quenão é mais aquele). Será que os ne­

gros, "nossos" negros, estariam dis­

postos a vender suas almas (suasarmas), tendo em vista a sua subutili­zaçáo, ou estariam eles, os desapro­priados, rindo de nós, os expropria­dores, ao ver-nos tão felizes por ter­mos comprado as suas armas mas,nunca, as suas almas?

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.�. ':.' ,C', ',.' . ZERO -.', .' JULHO 87.

. .

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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Terra para quem trabalha nelaMultistem50milhõesde hectares

MILENECORRÊA

o Movimento dos Trabalha­dores Rurais Sem Terra é uma

articulação de lavradores dentrodo Movimento Sindical, que têmpor objetivo lutar pela terra e pe­la Reforma Agrária. Ele está or­

ganizado em núcleos, comis­sões municipais e estaduais e

possui uma Coordenação e

uma Executiva Nacional.Reunido em Cascavel, no Pa­

raná, em Janeiro de 1984, numEncontro Nacional, o Movimen­to discutiu e aprovou alguns dosprincípios que delinearam a suaconduta e forma de luta. Entreesses princípios deve-se desta­car a necessidade dos partici­pantes em esclarecer quem sãoos "sem terra" que, afinal, foramdefinidos como "os trabalhado­res rurais que trabalham a terranas seguintes condições: par­ceiros, meeiros, arrendatários,agregados, chacreiros, possei­'ros, ocupantes, assalariadospermanentes e temporários e

os pequenos proprietários commenos de cinco hectares". Foidepois deste encontro na cida-

I Papanduva: conflito que não deve se repetir

de de Cascavel, quando o Movi­mento surge como uma articu­lação nacional de trabalhadoressem terra, que se iniciam as

grandes ocupações e os acom­

panhantes, nos Estados onde oMovimento já está consolidado,como é o caso do Paraná, SantaCatarina, Rio Grande do Sul,São Paulo, Mato Grosso do Sul,Bahia, Maranhão e outros.A luta pela Reforma Agrária

e por uma sociedade justa e

igualitária são alguns dos princí­pios gerais do Movimento, que

se apoiam em compromissospráticos como a sua articulaçãoe seu fortalecimento, a manu­

tenção do movimento como or­

ganização politicamente autô­noma, a sensibilização da opi­nião pública, a união com a lutados trabalhadores urbanos e

dos indígenas, a busca de apoionas entidades, sindicatos e na

Igreja, a divulgação das suas lu­tas e conquistas, a discussãode formas alternativas de possee cultivo da terra e a exigênciade que o assentamento dos

"sem terra" seja feito nos Esta­dos de origem dos lavradores.Um dos tópicos que funda­

mentam o Movimento é o quediz respeito às terras reivindica­das. Dos 850 milhões de hecta­res da superfície total do Brasil, _a área cadastrada pelo InstitutoNacional de Colonização e Re­forma Agrária INCRA é de 570milhões de hectares, dos quais400 milhões repartem-se emimóveis latifúndios. Essas sãoalgumas das terras reivindica­das pelo Movimento, além dasterras de multinacionais, que si­tuam-se entre 30 e 50 milhõesde hectares. Há também a áreade terras devolutas pertencenteao Estado que, somadas, perfa-­zem um total de 250 milhões de

hectares.Bem, terra é o que não falta,

e, como costumam dizer os líde­res do Movimento, "se fosse de­sapropriado apenas um latifún­dio em cada, teríamos um totalde cinco milhões de hectares.Distribuindo em lotes médios de15 hectares, daria para assentar326 mil famílias de trabalhado­res sem terra". Convém lem­brar, no entanto, que os gran­des proprietários e mesmo o Es­tado, não estão dispostos à én­tregar suas terras tão facilmen­te. De 1982 até hoje, conformelevantamento efetuado a partirdos arquivos da Comissão Pas­toral da Terra e do MovimentoPopular, já foram assassinadosquase quatrocentos lavradoresque lutavam pelo direito à terrae, afinal, pelo direito à vida.

Da euforia à miséria em dois anos

CLARISSASANTOS

Dívida externa, moratória, su­perávit comercial, déficit públi­co, são alguns dos vocábulosintegrantes da nomenclaturaatual divulgada através dosmeios de comunicação. O quesignifica essa terminologia, afi­nai?

Há quem diga que o montanteda dívida cresce a cada dia, masquais são suas causas e conse­

qüências? De que maneira istoafeta a vida do brasileiro?

A história da dívida pode ser

analisada através da própriahistoria do país. Ela teve iníciono Império, pois, segundo os li­vros escolares, D. João VI lite­ralmente limpou os cofres brasi­leiros. Transferindo a riqueza tu­piniquim ao tesouro português,o rei obrigou o Brasil a contrairseus primeiros empréstimos,confinando o país ao seu des­tino de devedor.

Desde aquele tempo, a res­

ponsabilidade da dívida vem

sendo administrada com cum­

plicidade pelos sucessores deD. Pedro I. A construção de Bra­sília, Itaipu, Tucuruí, Complexode Urubupungá e as Usinas Nu­cleares de Angra dos Reis, sãoalguns dos exemplos que con­

tribuíram substancialmente pa­ra ampliar a dívida externa.

O Brasil deve hoje ao FMI cer­ca de US$ 1 bilhão referenteaos juros mensais, que deverãoser pagos até o final do ano.

Mas, quem paga? O própriopresidente Sarney afirmou, numdiscurso de 1985, que a dívidaexterna não poderia ser pagacom a "fome do trabalhador".Naquela época, provavelmente,o atual sucessor do ex-Príncipe­Regente estava prevendo a si­

tuação financeira atual, pois o

arrocho salarial, aumento de Im­

posto de Renda e pacotes e

mais pacotes econômicos sãosinônimos de menos dinheirono bolso do trabalhador.

Durante o ano de 1986, o paísvivenciou a euforia causada pe-

lo Plano Cruzado. A partir demarço-abril, a grande maioriada população resplandesceu e

O governo conseguiu estimularas exportações e, atualmente,tenta conter a demanda do mer­

cado interno adotando um arro­cho salarial sem precedentesna história do país.

desatou a comprar. Esse super­aquecimento na economia in­terna refletiu na balança comer­ciaI. Produtos de primeira ne­

cessidade, como gêneros ali­mentícios, começaram a escas­

sear. A solução mais imediatafoi a importação. Ora, isso inter­feriu negativamente nos planosdo governo, onde a ordem sem­

pre foi exportar, já que a cadaano o Brasil batia recordes em

sua balança, fechando-a sem­

pre com superávits comerciais,provocados justamente pelo vo­lume de exportações, e que ti­nham como finalidade únicatentar pagar alguma coisa dos

juros da dívida.

Mas, e quanto ao povo? A ex­

plicação cabível caiu em tornoda palavra ESPECULAÇÃO.Nem sequer cogitou-se falar emrecessão, pois o país estava

passando por uma época de ou­ro, na aparência.

o descongelamento dos pre­ços marcou o fim do sonho cor­

de-rosa, e o monstro da inflaçãovoltou a tormentar a vida dosbrasileiros.

Bulhufas,conservadoramoderada

FRANCISCOLINS

A conclusão do trabalho das 24subcomissões é a primeira etapa doprocesso constituinte, ou seja, o es­boço da nova Constituição, que temo seu desfecho previsto para 15 denovembro.

Se os anteprojetos das subcomis­sões fossem consolidados num tex­to único, ele teria uma parte de gran­des avanços reformistas e outras decentro- direita. Os progressistastriunfariam nas subcomissões quetratam da ordem social, do trabalhoe da participação dos cidadãos. Ocentro e a direita ganhariam nas

questões referentes à ordem eco­nômica.

A esperança dos brasileiros, deter uma carta constitucional com asreformas desejadas, vai diminuindocom o desenrolar dos trabalhos. Adivisão interna do PMDB contribuiupara isso e a palavra de ordem ago­ra é negociação. O líder do PMDBna constituinte, senador Mário Co­vas, diz que ainda é cedo para dizerse a constituição vai ser progres­sista ou conservadora. "Tudo vaidepender da capacidade de nego­ciação", conclui.

O quadro demonstra que, para a

esquerda conseguir vitórias em al­gumas áreas, terá que ceder espa­ço para a direita em outras, princi­palmente na Comissão da OrdemEconômica. O líder do PCB, Rober­to Freire, resume a questão: "Elesganham no capital e nós no traba­lho".

Consenso, conciliação, negocia­ção: palavras tão pronunciadas naAssembléia Constituinte, levam o

povo a temer pelo resultado finaldos trabalhos. As reformas deseja­das pela maioria dos brasileiros, da­rá lugar ao espírito conciliador, de­fendido por Tancredo Neves ou fica­rão restritas ao "Iobbysmo" indisfar­çado e conservadorismo imobilista?

-_

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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Contorcionismo

cerebral

A verdade é que há vá­rias concepções enga­nosas para esclarecer ocontorcionismo cerebral.Partindo do direciona­mento do acúmulo, en­

volvendo-se em um cu­

nho teórico incipiente, avisão que se vê não ébem por aí. Com o ad­vento do potencial revo­lucionário e da heteroge­neidade, a questão deequívocos ampliou-se.Hoje já se estabelece es­

sa mediação, graças aum acúmulo histórico. Omecanismo filosóficoaliado a questiona­mentos e interpenetra­ções, trouxe à questãodo símbolo uma vertentepara clarear. Esta ver­

tente nada mais é do queo motor histórico, o avi­var das contradições quecapotava para o rural.

Justamente dentrodeste impasse, sob os

auspícios da identidadesimbólica, a construçãoé super delicada em doisaspectos: o patati-patatáe o esforço unilateral. Anível imeditato, o racio­cínio lógico da sociedadefuncional jogou os ele­mentos na panela. Qualo gancho? O ponto de

evolução e o de ficçãomostraram que a polari­zação das forças perdeucom mais produtividade.Os aliados naturais exis­tem, não se podê negar.Neste vai-e-vem tão dis­tinto quanto parece, a

questão da viabilidade éde um todo uniforme. Abarreira do telegráficonos mostrou uma visãoapocalíptica do incons­ciente coletivo.Com esta sedimenta­

ção do ponto de vistaapocalíptico, surge umarazão olhística para uma

coisa que parecia sermeio feudal. O momentode baixar o cacete, a sís­tole e a diástole, per­meiam-se e leviatãs nos

apoiam numa escalaaxiológica de raças.Neste axiologismo, o

monolítico faz com quelaços sejam desenlaça­dos em cima do estereó­tipo. Contudo as raízeshistóricas do contextoatual da realidade con­

juntural fizeram do bempossível um mal neces-

. sário. E aí que o valor deuso tanto quanto o valorde troca têm revelado oeu histórico social, crian­do o potencial de lucro.(R.C.V.)

U)I----- B

ualquer semelhança não é mera coincidência

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Enquanto isso no rádio doônibus que vai para UFSC ...

'FAç.OJ'ORNAJ.isNto...

MJ\S 50\1li"".. SOl. PE.�OI\)

,..: ?

Pára-choqueA vida e o jogo de xa­

drez: grandes batalhasonde os reis nunca mor­

rem e os peões dos exér­citos lutam na linha defrente, como marionetes,destruindo-se LIns aos

outros. O xadrez e a vidaestão cheios de "quadra-dos", que inutilmente al­ternam suas cores na

tentativa de não parece­rem tão iguais. No jogo,as peças brancas têm o

privilégio de iniciar a par-tida, em detrimento daspretas num flagrante"apartheid". A dama,

o

j

Camisinhas TrindadeNos mas de hoje cuide-seEvite apromiscuidadeCamisinhas Trindade

operigo se alastraNo campo e na CidadeCamisinhas Trindade

Não tira oprazerNão afasta o casalRelacionamento normal

Viva com Camisinhas TrindadePodegozar à vontade

....

apesar de sua força, éescrava do rei e está su­

jeita a ser comida por to­das as peças, indiscrimi­nadamente. E um verda­deiro estupro. Até mes­

mo os representanteseclesiásticos - os bis­pos - tomam parte des­sa orgia, na qual tambémentram garanhões insa­ciáveis, os cavalos. A vi­da não é fácil ... Estásempre nos pondo em

xeque. Mas o gostoso éque também temos tor­res para encastelar nos­sos sonhos, temos rock,e mate com limão. (D.V.)

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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CULTURA

A música não é a vida real e nem

sequer seu reflexo. A música é, porsi só, criadora, cria sua própria vida,plena de beleza em sua abstração,ultrapassando os limites do tempoe do espaço.Você já imaginou a vida sem mú­

sica? Não? Mas esta proposta nãoé inviável. Está cada vez mais difíclfreqüentar uma escola de músicaou sobreviver dessa arte no Brasil.Em Florianópolis há escolas ca­

pacitadas para a formação de pro­fissionais, como é o caso da Univer­sidade para o Desenvolvimento doEstado de Santa Catarina (UDESC)e da OPUS. A UDESC tem como

proposta, na área de artes, estimu­lar, apoiar e promover o acesso aos

bens culturais, e preservar seus va­tores através de manifestações ar­

tísticas. A Escola de Música do Cen­tro de Artes da UDESC, com nove

pianos e 220 alunos, tem sempresuas vagas preenchidas, geralmen­te com um ano de antecedência. Omotivo dessa procura é o excelentenível dos professores e a mensa­

lidade de apenas Cz$ 183,90 com

a possibilidade de 80% de descontocaso o aluno não possa pagar.A UDESC oferece cursos de violi­

no, flauta, piano, violão, oboé, sax,clarinete, flauta transversa, violon­celo, canto, coral, todos acompa­nhados de teoria musical. A profes­sora de iniciação à música, Diva Be­sen, acredita que os alunos que nãotêm interesse gradualmente vão de­sistindo. Durante o mês de maio,a UDESC promoveu quatro encon­

tros denominados Momentos de Vi­lia-Lobos, em comemoração ao

centenário de nascimento do com­

positor. Os alunos se apresentarame a participação foi aberta ao pú­blico.As escolas particulares têm como

pior adversário a crise financeira. AOPUS, por exemplo, esse ano ap­tau por um "saneamento". Está tra­balhando com um menor número deprofessores, porém, com mais altonível de ensino. Um de seus direto­res, Luiz Ekke Moukarzel, afirmaque a OPUS não tem fins lucrativos.Amensalidade da escola, que é Cz$600, fica dividida em 70% para os

professores e 30% para a escolà- pagamento de funcionários, alu­guei do prédio, etc. Um fator quegera desistência dos alunos é o ele­vado preço da mensalidade. Devidoà conjuntura do país, o ensino 'demúsica não recebe subsídios o queimpede a concessão de bolsas deestudos, mesmo para os alunos es­forçados e talentosos.A OPUS oferece cursos de piano,

técnica vocal, dicção e violão popu­lar, todos com certificado registradona Secretaria de Educação. Men­salmente, a OPUS promove uma

semana de aulas coletivas, onde os

alunos apresentam sua música jun­to com filmes e slides. No primeiroencontro que realizou-se dia 26 demaio, foram feitas homenagens a

Villa-Lobos pelos alunos de cantoda professora Terezinha SimasAguiar. Esses encontros são impor­tantes para a conscientização dosalunos de que um bom músico ne­

cessita de muito investimento, tem-

o difícil aprendizado de músicaANA LAVRATIl

Aqui, as opções de ensino para uma

profissão desvalorizada, Situaçãoque alguns músicos querem mudar.

Músicos querem público mas também sua carta sindical

po e técnica, todos requisitos queas escolas de música particularesnem sempre têm condições depreencher em razão de suas limita­ções e propostas. Na opinião da

professora Terezinha, que estudoumúsica na Europa durante seteanos e está entre as melhores mes­tras de canto do sul do país: "talentoé imprescindível, mas sem muito es­

forço não se forma um bom profis­sional". Uma frustração de Terezi­nha é ver seus alunos com ambi­

ções profissionais, serem desestru­turados quando se defrontam com

a realidade do músico no país.A música no Brasil é um grande

negócio, menos para o músico, noque se refere à remuneração. Ge­ralmente são oferecidas "gorjetas"para a apresentação de um músico

que, por sua vez, tem que trabalharmuito para sobreviver e fica sem

tempo para praticar sua própria téc­nica. Terezinha sugere a organiza­ção de encontros musicais em Flo­rianópolis para valorizar o potencialartístico-cultural dos músicos catari­nenses e proporcionar a troca de

experiências.

A Escola de Música Hélio Amaral,dirijida por Maria Luíza Amaral, con­ta com aproximadamente 80 alunosde sete à 62 anos. Para aperfeiçoaros alunos de piano, a escola traz

mensalmente, do Rio de Janeiro, opianista Luiz Henrique Senise, quedá aulas de técnica e interpretaçãopianística.Na opinião dos diretores das es­

colas, a música tem muita procura,mas a rotatividade nas escolas émuito grande. Damesma forma queentra, muita gente abandona as au­las por diversas razões - estudos,vestibular, proibição dos pais, em­prego e outros motivos.A existência de professores que

ministram aulas em suas casas ou

nas casas dos alunos deve-se a

dois motivos: professores que não

querem dividir a mensalidade doaluno com a escola, ou professoresnão capacitados que não conse­

guem emprego nos conservatórios.As vezes os professores fazem cur­

sos nas escolas, que não oferecemcurrículo completo, e já saem dandoaulas. Assim, são professores sempreparo que enfrentam alunos

igualmente despreparados. Estes,por sua vez, dificilmente encaram

a música clássica como o básicopara se tocar qualquer tipo de músi­ca, escolhendo na maioria das ve­zes o processo contrário. Queremtocar jazz, popular, menos músicaerudita que exige maior rigor técni­co. O ideal, porém, seria que os alu­nos procurassem conservatóriosque têm papel importante na divul­gação da música. Existem escolasna cidade que já tem condições debuscar um maior profissionalismomas isso esbarra na falta de apoioe de pessoas especializadas.Há também a ausêmcia de insti­

tuições que levem a sério a divulga­ção da música erudita. Existem pe­quenos grupos de pessoas interes­sadas, que freqüentam concertosou assistem a apres�ações de co­ros, mas o público atingido é pe­queno.Além disso, a profissão de músicoé pouco reconhecida. Muitos achamque música não é profissão porqueos músicos gostam do que fazem,porém esquecem que o ideal é to­dos trabalharem com o que gostam.

É urgente que os músicos tomemconsciência da força de sua perso­nalidade cultural.

LUTA PELA ASSOCIAÇÃOA Ordem dos Músicos do Brasil,

'com 35 delegacias em Santa Cata­rina é uma entidade governamentalpara fornecer carteira profissional etem caráter essencialmente fiscali­zador. Em Santa Catarina há11.528 músicos registrados entreos quais 3200 estão na capital. AOMB funciona em Florianópolisdesde 1962 e é vinculada ao Minis­tério do Trabalho. Ano passado fo­ram feitas 455 provas para se filia­rem à OMB, e 253 foram reprova­dos. Como a ordem só oferece aos

seus filiados um advogado para so­

lucionar questões jurídicas, os mú­sicos de Florianópolis movimenta­ram-se novamente e estão bata­lhando para requerer a carta sindi­cal junto ao Ministério do Trabalho,para transformar a Associação Pro­fissional dos Músicos da GrandeFlorianópolis em sindicato. Houveuma nova eleição da diretoria e parapresidente foi eleito Luiz Moukarzel,que quer a adesão domaior númerode participantes possíveis na Asso­ciação, para que ela se torne cadavez mais forte.

ESCOLA GRATUITAUma opção para quem quer

aprender música é o Centro Suzukide Florianópolis que apoia o ProjetoEspiral, um programa de INM/FU­NARTE que se destina à formaçãode instrumentistas de cordas. EmSanta Catarina o Projeto Espiral émantido pelo Governo do Estadoatravés da Fundação Catarinensede Cultura. Totalmente gratuito, ométodo Suzuki desenvolve uma filo­sofia de educação através da mú­sica e quer ser um fator de integra­ção familiar. É uma atividade ultra­moderna trazida do Japão pelomaestro e professor Carlos AlbertoAngioletti Vieira e já conta com trêsorquestras, divididas por níveis.Carlos Alberto recebe da FundaçãoCatarinense de Cultura uma peque­na quantia mensal para ministraraulas aos 80 participantes da Or­questra Espiral Suzuki e é auxiliadopor seis monitores que ele mesmo

formou.A maioria dos alunos de música

de Florianópolis não tem ambiçãoprofissional. Estudam por "hobby".Os poucos que preocupam-se com

a profissionalização apresentamsuas frustrações: falta de garantiaque justifique toda a dedicação ne­

cessária e o futuro incerto do mú­sico profissional. Estudar música no

Brasil ainda é uma questão de amorà arte.Lia Rejane, musicoterapeuta do

Rio de Janeiro, acredita que ativida­des musicais ou uma educaçãomu­sicai bem feita deveriam ser partedo ensino básico de todas as crian­ças, porque a música é altamenteterapêutica.

ESCOLA DE ARTES NA UFSCA hipótese de formação de uma

escola de artes na UFSC é facil­mente descartada. Os motivos sãosimples: falta de espaço físico, faltade verbas, falta de professores gra­duados e falta de apoio do Reitor

que acredita que a UDESC é sufi­ciente para suprir a procura na área.

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Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina

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"Economiamatamais que polícia"Os 12 anos de exílio nãosilenciaram o intelectual

CARLOS LOCATELLI

,

EDUARDO GAlEANO

Galeano: "Medo é inimigo da liberdade"

ANALÚ ZIDKO

"Devemos resgatar cultura indígena, quenos dá chaves muito importantes para cons­truir um mundo diferente desse mundo, cadavez mais parecido com um campo de concen­tração ...

"

a frase é do escritor e jornalistauruguaio, Eduardo Galeano, que conversoumais de duas horas com o público que se..

aglomerou no Plenário da Assembléia Legis­lativa, dia 9 de junho passado. Galeano, queé autor do livro "As Veias Abertas da AméricaLatina", veio a Florianópolis atendendo con­vite do Centro Acadêmico Livre de Letras(CALL) e do Núcleo de Estudos Latino-Ame­ricanos (NELA).

-

Não houve a tradicional exposição iniciale o escritor propôs-se a um bate-papo como público. Lembrou que as preleções "invaria­velmente são chatas ... ''.

COLONIALISMOQuestionado quanto a capitalismo é socia­

lismo na América Latina, declarou que "o so­cialismo já é praticado em nosso continente:as perdas são socializadas e os lucros prlvatl­zados". Quanto ao capitalismo, comentou serele "um' produto de importação", pais nãofoi criado pelos índios e sim trazido pelos colo­nizadores, que o implantaram aqui na Amé­rica, sendo portanto, um sistema estranho anós. Um estrangeiro.

Separar um homem de sua terra natal, deseus laços culturais, políticos e humanos éum castigo duro, talvez pior que a própriaprisão. O escritor e jornalista uruguaio Eduar­do Galeano viveu essa experiência durantedoze longos anos. Primeiro foi a expulsãode seu país, depois da Argentina onde haviasido recebido. Nos dois casos pelas ditadurasmilitares. Sua atuação destacada no combateà opressão, através de sua atuação jorna­lística, fez dele um alvo-constante dos ditado­res. Galeano foi perseguido por defender averdade.Aos 14 anos ele desenhava para o sema­

nário EI Sol, do Partido Socialista. Depois,foi bancário. Aos 20 anos, abandona o empre­go e vai para Buenos Aires trabalhar na revis­ta Che. A experiência durou pouco, pois a

polícia argentina fechou a revista porque eleapoiou uma manifestação de ferroviários gre­vistas. De volta ao Uruguai, ele participou dojornal Epoca, que também lutava pela liber­dade de expressão. Nesse período, era co­mum ele e os outros editores do jornal ama­nhecerem presos. No iníco de 73, a convitede Fico Vogelius, Galeano retorna a BuenosAires para dirigir a revista Crisis, recém funda­da. Crisis foi o motivo que levou o govermomilitar argentino a repetir, em 1976, a atitudedos comandantes uruguaios em 73: Galeanoestava novamente exilado. Da Argentina paraa Espanha, de onde retornou, há dois anos

para Montevidéu, beneficiado pela anistia dogoverno atual.

CrisisA revista Crisis, fundada em fevereiro de

73, queria devolver as palavras às pessoas.Uma palavra que havia sido tirada por um

sistema que desprezava os indivíduos. Elapublicava poemas, contos, desenhos, relató-� rios e reportagens sobre os mais diversosassuntos que interessassem à coletividade.Do petróleo às comunicações, do ensinomentiroso de História nas escolas, até as de­núncias de multinacionais, que vendiam pro­dutos e ideologias. Logo após o golpe militarde 76, o governo publicou o novo Código deCensura, Estavam proibidas as reportagens,as entrevistas e as opiniões não especiali­zadas. Para Crisis era o fim. Depois de poucomais de três anos e muito sucesso, a revistafecha em julho no mesmo ano de golpe. Masfoi enterrada em pé, como sempre viveu, se­gundo seus editores.

Veias AbertasAntes de escrever o seu principal livro: As

VeiasAbertas daAméica Latina, Galeano ha­via percorrido muitos países do continente.Esteve no Chile, na Nicarágua, e presencioua pior crise da revolução cubana, no fim dosanos 60. Ele estudou muito, baseou-se emdados reais e conseguiu escrever um livrobrilhante. A pobreza dos homens, o colonia­lismo, o capitalismo, o problema da terra, emuitos outros são abordados de forma C1ii8e objetiva. Curiosamente, o livro foi traduziãoprimeiro para o espanhol, italiano, holandêse até para o turco, para depois ser traduzidopara o português, apesar dos problemas es-

.

truturais brasileiros também serem tratadosna obra.

Galeano foi enfático quando falou da cultu­ra da América Latina, afirmando que "fomosprogramados para copiar" e que no nossomeio há uma total submissão à cópia e a

criação é alienada. Para ilustrar suas coloca­ções, ele citou como exemplo os nossos artis­tas continentais, que não são valorizados emseus países de origem por serem do povoe retratarem esse povo, ao invés de se sujei­tarem às regras estéticas do primeiro mundo.Para o escritor, existe um esquecimento qua­se compulsório da cultura popular: é que nóssomos "ecos de outras vozes e sombras deoutros corpos". Essa cultura importada, adi­cionada ao medo - que permanece mesmo

depois do fim das grandes ditaduras, sob a

capa da censura, e os sonhos que são as

constituições -, impedem a libertação dagrande massa latino-americana.

PALAVRA E PODER"Quem tem o poder tem a palavra, senão

não teria o poder" assim Galeano definiu im­prensa, imprensa alternativa e sua função n?América Latina. Criticou os meios de comuni­cação que mentem "não só pelo que falammas pelo que caiam", e ressaltou a impor­tância de um mercado alternativo que rachas­se o muro e, se infiltrando através dele, pu­desse revelar o que nos é omitido pela grandeimprensa. Deixa claro, porém, que as possibi­lidades de mudanças no campo social, atra­vés de um jornalismo independente e contes­tador, são muito pequenas. A imprensa es­

querdista, por ser muito "difícil de ser engo­lida", é sempre muito censurada. A censura

invisível, na sua opinião é a pior, pois elanão é imposta por nenhum regime: existe "pe­lo próprio peso das coisas". Estamos acostu­mados à uma sociedade que marginaliza a

maioria de seu povo no acesso à cultura.

ALERTAPara Galeano é preciso haver um equilí­

brio, nos países que se dizem democratas,entre a economia e o sistema de relação entrepessoas. Alertou que a "economia na Amé­rica Latina mata mais que a polícia, que jámata muito". Quanto ao Brasil, Galeano ocoloca entre os países onde ainda persisteum sistema escravocrata, e compara a situa­ção de multidões de trabalhadores marginais,submetidos à um regime capitalista, à.situa­ção do escravo. Para ele, a realidade surrea­lista do país retrata o que acontece no restodaAmérica Latina. Uma América tomada pelomedo, um temor que existe dentro de cadaum, de agir, de ser, de transformar, de setransformar. "O medo é inimigo da liberdadee parente muito próximo da morte".Ao final do encontro, Galeano relatou o tris­

te fim de muitos livros e jornais existentesno Brasil, todos convertidos industrialmenteem .papel higiênico: "Isto é o que a Américafaz pela sua memória".

Além de "As Veias Abertas da América Latina", suaobra smais famosa, foram publicados outros seis livrosde Eduardo Galeano no Brasil: A Caça de Nossa Gen­te, Dias e Noites de Amor e de Guerra, Memóriasdo Fogo, Nascimentos e Vagamundo, pela EditoraPaz e Terra; As Caras e as Máscaras pela Nova Fron­

teira; e A Pedra Arde pela Loyola. A Biblioteca Centralda Universidade Federal de Santa Catarina dispõe so­

mente de quatro títulos: A Pedra Arde, e As Carase as Máscaras, Dias e Noites de Amor e de Guerrae As Veias Abertas da América Latina. (C.t._:)

Acervo: Biblioteca Pública de Santa Catarina