FLEXIBILIZAÇÃO DA IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA

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  • 7/22/2019 FLEXIBILIZAO DA IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMLIA

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    PROCESSO-TRT-AP-0143100-13.1995.5.01.0203

    AGRAVO DE PETIO

    A C R D O4 Turma

    FLEXIBILIZAO DA IMPE-NHORABILIDADE DO BEM DEFAMLIA. O Judicirio devebuscar um equilbrio entre odireito ao crdito trabalhista doexequente e o direito moradiado devedor, o que impe aflexibilizao da norma que fixa aimpenhorabilidade do bem de

    famlia, quando o valor do imvelpenhorado for suficiente para opagamento do crdito e aaquisio de nova moradia dignae confortvel para o executado.

    Visto, relatado e discutido o agravo de petio em quefiguram, como agravante, JOS LUIZ DO LAGO, e como agravados, ENGINS.A. ENGENHARIA INDUSTRIAL, JUAREZ DOS SANTOS e GILSONCARVALHO JUNQUEIRA.

    Trata-se de agravo de petio interposto pelo scioexecutado (fls. 640/9) em face da respeitvel sentena da MM. 3 Vara doTrabalho de Duque de Caxias, de lavra do eminente Juiz Gustavo Pusch,que julgou improcedentes os embargos execuo (fls. 632).

    Embargos de declarao opostos pelo scio executado sfls. 635/6, rejeitados s fls. 638.

    O agravante argui preliminar de nulidade por cerceio dedefesa, por no ter tido oportunidade de produzir prova testemunhal.Insurge-se contra o no reconhecimento da qualidade de

    bem de famlia do imvel penhorado.Afirma que o nico bem imvel que possui, e nele reside.Sustenta que h excesso de penhora, j que o valor do bem

    cerca de cinquenta vezes maior que o valor executado.Contraminuta s fls. 652/7, sem preliminares.Os autos no foram remetidos ao Ministrio Pblico do

    Trabalho por no se configurar hiptese de sua interveno. o relatrio.

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    AGRAVO DE PETIO

    V O T O

    CONHECIMENTOConheo do agravo, por preenchidos os pressupostos legais

    de admissibilidade.

    PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEIO DE DEFESAO agravante entende que sofreu cerceio de defesa, j que

    no teve oportunidade de produzir a prova testemunhal requerida.O julgamento dos embargos execuo, na esfera

    trabalhista, obedece aos termos da Seo III, do Captulo V, da C.L.T., sendoinaplicvel a legislao processual civil.

    Nos termos do 2 do art. 884 consolidado, o Magistradopossui a faculdade de marcar audincia para a produo de provas, casojulgue necessrio.

    Se no presente caso no foi designada audincia deinstruo, certamente porque o Juiz da Execuo entendeu ser estadesnecessria, procedendo, ato contnuo, ao julgamento dos embargos, semque isso acarretasse qualquer irregularidade ou cerceamento de defesa.

    Isso porque a matria de fundo dos embargos realmente noexigia a produo de prova, pois restringia-se questo do imvelpenhorado ser ou no bem de famlia.

    Rejeito a preliminar.

    MRITO

    BEM DE FAMLIAO agravante pretende seja reconhecida a qualidade de bem

    de famlia do imvel penhorado.A presente execuo iniciou-se em 28/01/1998, com a

    notificao do reclamante para apresentar clculos (fls. 155).Os clculos foram homologados em 01/08/2000 (fls. 243),tendo sido a r citada para pagamento em 10/08/2000 (fls. 245).

    Naquele momento a execuo se dirigiu empresa-reclamada, Elgin S.A.-Engenharia Industrial.

    A r no quitou a dvida, no tendo sido encontrados benslivres e desembaraados, conforme certificado a fls. 260v.

    O exequente requereu, ento, a fls. 272, fosse a rnotificada para indicar bens que pudessem ser penhorados e,sucessivamente, em caso de omisso, fosse oficiado Receita Federal paraque fornecesse cpias da Declaraes de Renda dos scios.

    Conforme se verifica na Ata de Assembleia publicada a fls.88, poca da prestao de servios o ora agravante fazia parte do

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    AGRAVO DE PETIO

    Conselho de Administrao da reclamada. bom que se registre que, embora a regra no seja a

    responsabilidade pessoal do administrador de uma sociedade annima,quando comprovada violao lei (no caso, a Consolidao das Leis doTrabalho), os administradores so solidariamente responsveis, nos termosdo 2 do art. 158 da Lei n 6.404/76.

    As declaraes de renda solicitadas vieram aos autos a fls.296 e segs.

    Verificada a indisponibilidade de bens da empresaexecutada, foi requerida a citao para pagamento e a penhora de bens dos

    scios (fls. 468).A 1 tentativa de citao foi feita em face do scio Nassim

    Bukai (fls. 484), mas mostrou-se infrutfera, conforme verifica-se na certidode fls. 485.

    Em despacho proferido a fls. 496, em 01/08/2005, foideterminada a ativao do convnio BACEN-JUD para bloqueio em contascorrentes da empresa executada. Conforme certido de fls. 498, a medidarestou incua.

    O feito foi ento arquivado sem baixa (fls. 499) em12/04/2006.

    O exequente solicitou o desarquivamento, do qual tevecincia em 10/08/2007 (fls. 503).

    s fls. 513 foi proferida deciso, determinando oredirecionamento da execuo para os scios, que deveriam ser intimados.

    H nos autos a certido notificao, expedida em29/09/2010, em nome de dois scios (fls. 518), inclusive o ora agravante.

    No prospera, portanto, a alegao de falta de citao. Muitoembora a Secretaria da Vara no tenha juntado aos autos os SEEDsmencionados na notificao, estas presumem-se vlidas, sendo nus daparte comprovar a ausncia de notificao - o que poderia ter sido feito como requerimento de juntada do SEED.

    A execuo passou a prosseguir em face dos scios JosLuiz do Lago, aqui agravante, e Gilson Carvalho Junqueira, conformeinformaes da JUCERJA (fls. 514/5).

    Surpreendentemente a empresa executada veio aos autosoferecer penhora os bens de fls. 520/1, o que no foi aceito pelo autor (fls.527), que requereu o prosseguimento da execuo em face dos scios,como j determinado pelo Juzo.

    O feito foi includo em pauta de conciliao, tendo sido aempresa executada, bem como os scios agora includos no polo passivo,notificados para comparecimento (fls. 529). Somente o autor compareceu,tendo na oportunidade reiterado o prosseguimento da execuo em face dos

    scios (fls. 523).Tentou-se o bloqueio de valores via BACEN-JUD, o que

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    restou infrutfero, conforme verifica-se a fls. 535/9, j que penhorado o nfimovalor de R$ 95,85 (noventa e cinco reais e oitenta e cinco centavos).

    Tentou-se o bloqueio de bens via RENAJUD, o que tambmno foi bem sucedido (fls. 549/51).

    O longo prembulo, condizente com o longo percurso daexecuo, prestou-se a demonstrar o quo difcil est sendo a tarefa de dar-se efetividade presente execuo.

    Pois bem, em 14/09/2011, o exequente requereu a penhorade imvel de propriedade do scio Jos Luiz Lago (fls. 560).

    O Juzo deferiu, tendo o cuidado de antes verificar se o

    imvel indicado de fato constava no Registro de Imveis, como sendo depropriedade do executado (fls. 565).

    No registro de fls. 570/4 foi confirmada a propriedade dobem, ali tambm se verificando a condio de bem de famlia (fls. 571v.),bem como a existncia de diversas outras penhoras sobre o imvel, queposteriormente foram canceladas.

    A qualidade de bem de famlia do imvel incontroversa, jque tal condio encontra-se consignada no Registro de Imveis.

    Cabe aqui analisar se a garantia de impenhorabilidadeinsculpida no art. 1 da Lei n 8009/90 absoluta ou pode ser relativizada.

    O Judicirio deve buscar um equilbrio entre o direito dotrabalhador e o direito moradia do devedor. Friso que o direito do devedorseria moradia, e, no, propriedade do bem.

    Explica-se: De um lado h o direito do exequente ao crditotrabalhista, de natureza alimentar, fundado no Princpio da Primazia doCredor Trabalhista. Do outro, tem-se o direito do executado moradia,embasado no Princpio da Dignidade da Pessoa Humana. Um direito nopode inviabilizar o outro, o que impe a ponderao entre os dois Princpioscitados. A ideia seria buscar uma forma justa de resguardar o direito deambas as partes.

    No dizer do Desembargador Ney Jos de Freitas, do TRT-

    PR: No justo assegurar como bem de famlia um imvel que vale milhes,enquanto o que se est devendo uma pequena frao. preciso encontraruma soluo para isso, para que o trabalhador no tenha apenas um quadroemoldurado da Justia dizendo que tem direito, mas no recebe o que lhe foiassegurado" (notcia publicada no stio Jornal Jurid,http://jornal.jurid.com.br/materias/noticias/penhora-bens-familia-no-processo-execucao-trabalhista em 25/11/2011).

    No caso sob exame, a venda do imvel penhorado permitirque se quite a dvida trabalhista e, ao mesmo tempo, ser garantido o direitodo executado de uma moradia digna e confortvel. Isso porque o imvel foiavaliado em R$ 4.000.000,00 (quatro milhes de reais) e o valor executado

    de R$ 77.373,16 (setenta e sete mil, trezentos e setenta e trs reais edezesseis centavos).

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    A jurisprudncia j vem, timidamente, admitindo aflexibilizao da impenhorabilidade do bem de famlia, conforme se verificana seguinte ementa:

    IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMLIA. A garantiaconstitucional do direito moradia no exclui ponderaesconcernentes ao seu valor econmico se em causa asatisfao de direito com idntica dignidade jusfundamentalsocial. Natureza alimentcia do crdito do exequente elonga durao da execuo sem satisfao que atentacontra o primado da dignidade da pessoa humana (art. 1o,III, da CF/88). Ponderao dos direitos fundamentais

    envolvidos que autoriza a relativizao da garantia legal impenhorabilidade do bem de famlia. Precedente doTribunal. Recurso do exequente provido. (TRT-RSProcesso n 0087800-72.1992.5.04.0014 - 1 Turma -Redator Designado: Desembargador Jos Felipe Ledur -Publicado em 30/04/2012 no DEJT).

    Diante de todo o percurso executrio acima relatado, combase nos fundamentos aqui expostos e no esteio da jurisprudncia citada,entendo cabvel a flexibilizao da norma contida no art. 1 da Lei n 8009/90.

    Mantenho, desse modo, a penhora realizada sobre o imvelde propriedade do agravante.

    Nego provimento.

    EXCESSO DE PENHORAO agravante entende que h excesso de penhora, eis que o

    valor do bem penhorado aproximadamente cinquenta vezes maior que oda execuo.

    No lhe assiste razo, j que justamente pelo fato de ovalor do bem penhorado ser muito superior ao valor da dvida que entendo apenhora cabvel.

    O valor da dvida constante no Mandado de Penhora eAvaliao de fls. 588 R$ 77.373,16 (setenta e sete mil, trezentos e setentae trs reais e dezesseis centavos). O imvel foi avaliado emR$ 4.000.000,00 (quatro milhes de reais).

    Como j dito na deciso agravada, o valor excedente serdevolvido ao executado, que tem ainda a opo de pagar o valor da dvidacom outros recursos, garantindo o pagamento do crdito alimentar epreservando seu bem de famlia.

    Por todos os motivos aqui j expostos, entendo justificado ovalor da penhora, reafirmando que o valor excedente do crdito trabalhistadever ser devolvido ao executado.

    Nego provimento.

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    AGRAVO DE PETIO

    CONCLUSOPelo exposto, conheo e nego provimento ao agravo de

    petio.

    A C O R D A M os Desembargadores da 4 Turma doTribunal Regional do Trabalho da 1 Regio, por maioria, conhecer e negarprovimento ao agravo de petio, nos termos da fundamentao do voto daExcelentssima Juza Relatora.

    Rio de Janeiro, 21 de Maio de 2013.

    MNICA BATISTA VIEIRA PUGLIAJuza Convocada

    Relatora

    /jzmf