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    ONDAS MECNICAS, ELETROMAGNTICAS E TRANSFORMAES

    DE LORENTZ

    Vamos discutir, em primeiro lugar, a propagao de uma onda mecnica, doponto de vista da mecnica de Newton, observada por dois referenciais inerciasem movimento relativo. Estamos interessados em saber qual a relao entre a ve-locidade de propagao medida em um dos referenciais e esta mesma velocidademedida no outro referencial. Se o objeto em movimento fosse uma partcula, aresposta seria bvia: para um dos referenciais, a velocidade do objeto seria asoma vetorial da velocidade que o mesmo possui em relao ao outro referencialcom a velocidade relativa entre os dois referenciais. Como o sinal ondulatriono um ponto material, no bvio que esta regra da relatividade galileana,adotada na mecnica de Newton, continue valendo. Mostraremos que assumir

    a validade da segunda lei de Newton para todos os referenciais inerciais e as-sumir a relatividade galileana, alm da invarincia da massa, implica na regra deadio de velocidades para o sinal ondulatrio. Em segundo lugar, faremos dis-cusso anloga para a onda eletromagntica propagando-se no vcuo assumindoo "princpio da relatividade de Einstein" (PRE), qual seja, o princpio de queas leis da eletrodinmica de Maxwell valem em todos os referenciais inerciais.No faremos nenhuma hiptese a priori acerca das transformaes do espao edo tempo e mostraremos que o fato da velocidade do sinal eletromagntico ser amesma em todos os referenciais inercias decorre daquele princpio. Assumiremosapenas que a permissividade eltrica e a permeabilidade magntica do vcuo (0e 0) so as mesma nestes referenciais.

    1 Onda na corda distendida

    Consideremos uma corda muito longa, de densidade linear homognea, , dis-tendida horizontalmente e submetida a uma trao T. Desprezemos possveisatritos e a ao da gravidade. Consideremos as seguintes hipteses:

    Figure 1: Corda distendida horizontalmente sofrendo uma trao T.

    a) todos os pontos da corda oscilam verticalmente.b) A corda perfeitamenteflexvel, isto , em cada um de seus pontos a

    trao exercida tangente a ela e no h foras transversais entre estes pontos.c) As deformaes sofridas durante o movimento no acarretam mu-

    danas apreciveis no valor de T.d) O movimento da corda suficientemente suave para que possamos

    considerar, em todos os seus pontos e em todos os instantes, suas inclinaes

    1

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    pequenas a ponto de valer a seguinte aproximao: sin = tan (onde o

    ngulo que a linha tangente corda forma com a horizontal - verfi

    g.2).

    Figure 2: Linha tangente corda no ponto P formando um ngulocom a horizontal.

    Consideremos o referencial xy tal que o eixo dos xx coincida com a

    posio de equilbrio da corda e o eixo dos yy seja vertical. Assim, devido a(a), o referencial xy v os pontos da corda subindo e descendo sem sedeslocarem nem para a direita nem para a esquerda. Conseqentemente, cadaum dos referidos pontos possuir uma abscissa, x, invariante no tempo, e umaordenada,y, dependente do tempo. Sendo assim, a posio da corda pode serdescrita por uma funo de duas variveis, y = y(x, t), onde xdefine a posiohorizontal de um ponto particular da corda e y representa a posio verticaldeste ponto no instantet. Consideremos, no instante t, o elemento infinitesimalda corda de massa dm, indicado na figura a seguir. As extremidades, A e B,deste elemento possuem abscissas x dx/2e x + dx/2, respectivamente.

    Em virtude de (d), podemos escrever dm = dx. O vetor posio de dm

    ser

    r = xbx+yby, ondebx eby so os versores nas direes dos eixos dos xx edos yy, respectivamente. Considerando que, conforme dissemos, a abscissa dedmno varia com o tempo, sua acelerao ser, ento:

    a =d2r

    dt2 =

    d2x

    dt2bx + d2y

    dt2by = d2y

    dt2by= d

    dt

    y

    x

    dx

    dt +

    y

    t

    by= ddt

    y

    t

    by =

    2y

    xt

    dx

    dt +

    2y

    t2

    by = 2yt2by. (1)

    Por outro lado, as foras resultantes nas direes

    bx e

    by,

    Fx e

    Fy , serodadas por:

    Fx = (TBcos B TAcos A)bx

    e

    Fy = (TBsin B TAsin A)by,

    onde TA e TB so as traes nos pontos A e B, respectivamente. Baseados em(d), podemos fazercos A = cos B ,sin A = tan Ae sin B= tan B. Assim,as duas equaes anteriores ficam:

    Fx = (TB TA)cos A

    bx

    2

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    Figure 3: Elemento infinitesimal da corda, de massa dm, no instantet.

    e

    Fy = (TBtan B TAtan A)

    by.

    Como, por hiptese, os pontos da corda movimentam-se verticalmente, afora resultante na direobx nula. Conseqentemente,TB =TA= Te, sendoFa fora resultante sobre dm, podemos escrever:

    F =

    Fy =T(tan B tan A)by = T

    "y

    x

    x+dx

    2

    y

    x

    x dx

    2

    #by. (2)Das eq.s 1, 2 e da segunda lei de Newton, obtemos:

    yx

    x+dx

    2

    yx

    xdx

    2

    dx =

    T

    2y

    t2O primeiro membro desta ltima equao nada mais que a derivada parcial

    de yx relativamente a x. Logo, fazendo u =defq

    T ,

    2y

    x2

    1

    u22y

    t2 = 0 (3)

    Em virtude de (c), a traoT independente do tempo e, conseqentemente,utambm o . Logo, a eq. 3 a equao de D Alembert para uma onda que sepropaga ao longo do eixo dos xx com velocidade constante u ou u, ou seja, assolues de 3 so funes do tipoy = f(x ut)(velocidadeu) ouy = f(x + ut)(velocidade u). Suponhamos que a onda se propague no sentido positivo do

    3

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    eixo dos xx, isto , com velocidade u. Neste caso, as funes de onda, ou seja,

    as solues de 3 tero a forma y = f(x ut). Fazendoz =defx ut, obtemos:y

    x=

    df

    dz

    z

    x =

    df

    dze

    y

    t =

    df

    dz

    z

    t = u

    df

    dz.

    Conseqentemente,

    y

    t = u

    y

    x (4)

    Consideremos, a seguir, um referencial x0y0 movendo-se, relativamente axy ,

    com velocidade vbx, conforme ilustra a fig. 4. Suponhamos que as origens dexye dex0y0 coincidam no istantet = 0e que os eixos dos x0x0 e dosy 0y0 sejam,respectivamente, paralelos aos eixos dos xxe dos yy. Que equao diferencialdescrever o movimento da corda relativamente a x0y0? Sejam

    r = x0bx0 +y0by0 e a o vetor posio e a acelerao do elemento de corda no instante t,

    respectivamente. Observando quebx0 =bxeby0 =by, teremos:

    Figure 4: Elemento infinitesimal da corda observado a partir dos dois referenciais

    a =

    d2r

    dt2 =

    d2x0

    dt2bx + d2y0

    dt2by = d2y0

    dt2by = d

    dt

    y 0

    x0dx0

    dt +

    y0

    t

    by (5)Para obtermos 5, usamos o pressuposto de que o tempo o mesmo para

    ambos os referenciais, o qual faz parte da relatividade galileana. Observemosque o termo d

    2x0

    dt nulo poisdm se move horizontalmente em relao a x0y0 com

    4

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    velocidade constante. Quanto derivada primeira da posio horizontal de dm,

    no caso do referencial xy, ela nula pois, neste referencial, os pontos da cordas posuem movimento vertical. Para x 0y0, no entanto, dx0

    dt =v posto que, nestenovo referencial, cada ponto da corda move-se horizontalmente no sentido debxcom velocidade constante v . Logo 5 fica:

    a =

    d

    dt

    v

    y 0

    x0+

    y0

    t

    by= x0

    v

    y 0

    x0+

    y0

    t

    dx0

    dt +

    t

    v

    y 0

    x0+

    y0

    t

    by =

    v22y0

    x02+ v

    2y0

    x0t+ v

    2y0

    tx0+

    2y0

    t2

    by=

    v2

    2y0

    x02+ 2v

    2y0

    x0t+

    2y0

    t2

    by (6)

    Quanto fora resultante, sua componente horizontal permanece nula poiso movimento horizontal de dm uniforme. Da invarincia do tempo decorrea invarincia da acelerao. Das invarincias desta ltima e da massa decorrea invarincia da fora. Logo, a trao na corda permanece igual a T. Usandoraciocnio semelhante ao utilizado para xy, obtemos, ento, a fora resultanteemx0y0.

    F =

    Fy =T(tan

    0

    B tan 0

    A)by = T"

    y 0

    x0

    x0+dx

    0

    2

    y 0

    x0

    x0dx

    0

    2

    #by. (7)De 6 , 7 , da invarincia da massa e assumindo a validade da segunda lei deNewton no referencial x0y0, vem:

    T

    "y 0

    x0

    x0+ dx

    0

    2

    y 0

    x0

    x0 dx

    0

    2

    #= dx

    v2

    2y0

    x02 + 2v

    2y0

    x0t+

    2y0

    t2

    Logo,

    2y0

    x02

    1

    u2

    v2

    2y0

    x02+ 2v

    2y0

    x0t+

    2y0

    t2

    = 0 (8)

    Portanto,

    2y0

    x02

    1

    u2

    v2 2v

    2y0

    x0

    t

    +2y0

    t2 = 0 (9)

    Qual o significado fsico desta equao? Para desvenda-lo, procuremos trans-formar o termo com derivadas cruzadas que ali aparece em um termo em queocorrem derivadas relativas a uma nica varivel. Para tanto, devemos encon-trar a relao existente entre y

    0

    x0 e y0

    t. Ora, a eq. 4 nos fornece a relao entreyx e

    yt e a equao x

    0 = x+vt estabelece um vnculo entre x0, x e t. Logo,temos um caminho para procurar a relao desejada.

    Consideremos as variveisw , z , w0 ez0 tais quew = w (w0, z0)ez = z (w0, z0).Sejam f = f(w, z) e f = f0 (w0, z0). Logo, f(w, z) = f0 (w0 (w, z) , z0 (w, z)).Usando as regras de derivao de funes compostas, podemos escrever:

    5

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    f0

    w 0 =f0 (w0, z0)

    w 0 =f(w, z)

    w

    w

    w 0 + f(w, z)

    z

    z

    w 0

    e

    f0

    z 0=

    f0 (w0, z0)

    z 0=

    f(w, z)

    w

    w

    z 0+

    f(w, z)

    z

    z

    z 0

    No nosso caso, identificandow comxez comt, temos quew = w0vz0 ez = z 0.Logo, as duas equaes anteriores ficam:

    f0

    w 0=

    f

    we

    f0

    z 0 = vf

    w +f

    z

    Portanto,

    f0

    x0=

    f

    x (10)

    e

    f0

    t = v

    f

    x+

    f

    t (11)

    Usando 10 e 11, vem:

    2

    y0

    x0t=eq.10

    x0y 0

    t=eq.11

    xv y

    x+ y

    t= v 2y

    x2+

    2

    yxt

    =eq.4

    v

    u22y

    t2

    1

    u

    2y

    t2 =

    u + v

    u22y

    t2 (12)

    Por outro lado,

    2y0

    t2 =eq.11

    t

    v

    y

    x+

    y

    t

    =eq.11 v

    x

    v

    y

    x+

    y

    t

    +

    t

    v

    y

    x+

    y

    t

    v22y

    x2 2v 2y

    xt+2y

    t2 =eq.0s3,4

    v2

    u22y

    t2 2v

    u

    2y

    xt+2y

    t2 =(v+ u)2

    u22y

    t2 (13)

    Comparando as eq.s 12 e 13, obtemos:

    2y0

    x0t=

    1

    u + v

    2y0

    t2 (14)

    Substituindo 14 em 9,

    2y0

    x02

    1

    u2 v2

    2v

    u + v

    2y0

    t2 +

    2y0

    t2

    = 0 (15)

    Logo,

    6

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    2y0

    x02 1

    (u + v)22y0

    t2 = 0 (16)

    Obviamente, esta a equao da onda propagando-se no sentido positivo doeixo dosx 0x0 com velocidade u + v.

    2 Onda eletromagntica no vcuo

    Analisemos, agora, o caso da onda eltromagntica no vcuo. Sem cargas ecorrentes, as equaes de Maxwell assumem a forma:

    E = 0 (17)

    B = 0 (18)

    E =

    B

    t (19)

    B =00

    E

    t (20)

    Calculando-se o rotacional dos dois membros de 20, vem:

    B

    = 00

    t

    E . (21)

    Observemos que, no segundo membro desta ltima equao, invertemos a ordementre os operadores, ou seja, primeiro calculamos o rotacional de

    Ee depoisderivamos em relao ao tempo. Assim, fizemos a troca:

    t

    E

    E

    t . (22)

    Como o rotacional s envolve derivadas espaciais e no temporais, tal inver-so lcita. Continuando, usando a relao

    A

    =

    A

    A , onde

    A um campo vetorial qualquer, e a eq. 19, a eq. 21 fica:

    B

    B =00

    t B

    t ! . (23)Considerando que, devido eq. 18,

    B nulo, a eq. 23 pode ser escrita

    como:

    4B

    1

    (00)1

    2B

    t2 = 0. (24)

    Adotando raciocnio semelhante, obtemos uma equao idntica a 24 para ocampo eltrico.

    A eq. 24 a equao de um onda que se move com velocidade c=q

    10

    0.

    Mas, tal velocidade refere-se a que referencial se no explicitamos nenhum em

    7

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    particular a fim de obtermos a eq. de onda? Pode-se objetar dizendo-se que,

    ao nos referiemos aos campos

    E e

    B , estamos falando dele em um ponto doespao e em determinado instante de tempo, isto , estamos adotando implicita-mente algum referencial. certo, porm tal referencial nada tem de especfico;se tivssemos escolhido outro referencial, obteramos a mesma equao. A situ-ao distinta daquela que discutimos para a onda na corda cuja equao foiobtida para um referencial especfico, qual seja, aquele no qual a corda no pos-suia movimento longitudinal.Em resumo, se adotarmos um referencial x0y0z0t0

    movendo-se com velocidade vrelativamente ao referencial no qual os camposforam originalmente medidos, neste novo referencial, a equao 24 aparecer naseguinte forma:

    4B0

    1

    (00)

    1

    2B0

    t02 = 0.

    Esta permanece sendo uma equao de onda para um aonda que se move com ve-locidadec=

    q 1

    0

    0. Obviamente, conforme ressaltamos no primeiro pargrafo

    deste nosso texto, estamos dmitindo que 0 e 0 permanecem com o mesmovalor em todos os referenciais inerciais. Ento, a velocidade com que a onda sepropaga no novo referencial a mesma com que ela se propagava no referencialanterior. No obtivemos, como o fizemos para a onda mecnica na corda, umanova velocidadec0 =c + v.

    Resumindo, somos forados a concluir que, se as equaes de Maxwell rep-resentam leis naturais, isto , se so vlidas em todos os referenciais inerciais,

    ento a velocidade da onda eletromagntica c =q

    10

    0 a mesma em todos

    estes referenciais. (Frisemos que esta velocidade a velocidade da onda eletromag-

    ntica , portanto a velocidade da luz, no vcuo)

    2.1 Relatividade do tempo e do comprimento

    Que implicaes tem o fato da velocidade da luz no vcuo ser independente doreferencial inercial que a mede? Para obtermo-las, consideremos dois exemplossimples. De um ponto A, fixo ao referencial x0y0, emite-se um raio luminosoparalelo ao eixo dosy 0y0 que se reflete no ponto B de um espelho, tambm fixo,e retorna ao ponto A, cf. indica a figura abaixo.

    Figure 5: Raio luminoso oriundo de uma fonte A,fixa ao referencialx0y0, refletindo-seno ponto B de um espelho fixo e retornando fonte.

    O intervalo de tempo, t0, entre a saida e a chegada do sinal luminoso aoponto A ser dado por:

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    t0

    =2L0

    c (25)A situao vista por um referencial xy, movendo-se com velocidade v em

    relao ax0y0 ser bastante diferente. O raio luminoso mover-se- diagonamenteat atingir B e retornar, tambm diagonalmente, a A que se encontrar emoutro local. Isto , o referencial xy "v" o raio luminoso partir de um local (aposio inicial do ponto A) e retornar a outrolocal (a posio final do pontoA). A situao encontra-se ilustrada na fig. 6.

    Figure 6: Raio luminoso visto pelo referencial xy. Entre sua saida e sua chegada aA, este ponto desloca-se de um distncia d no sentido positivo do eixo dos xx.

    A distncia percorrida pelo raio em seu percurso ser medida em xy comosendo:

    s= 2

    sd

    2

    2+ L2.

    Sendo to tempo gasto neste percurso, a distncia, d, percorrida pelo ponto Aneste mesmo tempo ser simplesmente d = vt. Por outro lado, s = ctpostoque o raio continua, em relao a xy, movendo-se com velocidade c. Logo, aequao acima fica:

    ct= 2

    s

    vt

    2 2

    + L2.

    Assim, o tempo gasto ser:

    t= 2L/cp

    1 2,

    onde=def vc . Definindo=def

    1 2 1

    2 e comparando esta ltima equaocom a eq. 25, obtemos:

    t= t0L

    L0. (26)

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    Como interpretar a eq. 26? Como > 1 (pois = vc < 1), ento no podem

    valer as duas condies:

    t =

    t0

    e L = L0

    . Ora, de acordo com a mecnicaclssica (MC), a distncia entre dois objetos em repouso relativo (no caso, adistncia entre a fonte e o espelho) bem como o tempo gasto por um sinalondulatrio para ir e voltar de um destes objetos ao outro, tanto aquela distnciaquanto este tempo so absolutos, isto , no dependem do referencial inercialno qual so medidos. Em outras palavras, de acordo com a MC, t = t0 eL= L0. A eq. 26 pode ser escrita como:

    = t

    t0L0

    L. (27)

    Se fizermos t = t0, ento deveremos ter L < L0. E se tivermos L = L0,ento valer t > t0. Vamos assumir a segunda hiptese, o que equivale adizer que o movimento no altera as distncias a ele perpendiculares. Expli-cando melhor, estamos assumindo que a distncia entre dois objetos, medidanum referencial onde ambos esto em repouso, a mesma distncia medidaem outro referencial que se move, em relao ao primeiro, perpendicularmente linha que une os dois objetos. Denotaremos esta hiptese por H. Poste-riormente, investigaremos se H constitui-se numa hiptese adicional ou se amesma decorre, forosamente, do PRE. Finalmente, assumindo aH, a relaoprocurada entre os dois intervalos de tempo fica:

    t= t0. (28)

    Faamos uma breve discusso sobre os conceitos envolvidos neste exemplo. Aeq. 28 nos diz que o mesmo intervalo de tempo possui valores distintos quandomedidos por dois referenciais que se movem, um em relao ao outro. Mas,o que quer dizer "o mesmo intervalo de tempo"? O dado espantoso que o"mesmo" intervalo de tempo possui valores distintos ao serem medidos por doisreferenciais em movimento relativo. Como ter certeza de que ambos referenciaisesto medindo o "mesmo" intervalo de tempo, em vez de um deles medir umcerto intervalo e o outro medir um "outro" intervalo? Para deixarmos claro oque estamos tentando dizer, suponhamos que Joo esteja com um cronmetro,parado em frente a um prdio em construo, medindo o tempo que um tijololeva para cair do alto do edifcio ao solo. Maria encontra-se sentada dentro deum nibus que passa na rua onde Joo est e, com seu prprio cronmetro, medeo tempo que o elevador de cargas da construo gasta para sair do solo e chegarao ltimo andar. No teremos qualquer espanto se as medies de Joo e Mariaapresentarem resultados diferentes pois eles esto medindo intervalos de tempo

    DISTINTOS, intervalos estes que no "tm a obrigao" de estarem relacionadose, muito menos, terem o mesmo valor. Agora, se Joo e Maria estivessemmedindo o mesmo intervalo de tempo, isto , se eles estivessem medindo, porexemplo, o tempo de queda do tijolo, ento deveramos esperar que os doisobtivessem o mesmo resultado pois nossa intuio e nossa experincia dirianos dizem que o MESMO intervalo de tempo no pode ter diferentes valores.Em outras palavras, estamos convictos que o tempo fsico flui para Joo nomesmo ritmo que flui para Maria. O fato deles estarem em movimento relativono interfere na cadncia com que o tempo passa. Voltamos a frisar que nosreferimos ao tempo fisico, ou seja, ao tempo registrado por um relgio e noao tempo psicolgico, isto , noo que cada indivduo pode ter da durao

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    das coisas. Mas no isto que a eq. 28 nos diz. Dela, concluimos o oposto, ou

    seja, que a cadncia do tempo alterada pela velocidade de quem o mede. Doisrelgios em movimento relativo marcam tempos distintos.Perguntemos uma vez mais: como podemos ter certeza de que os dois ref-

    erenciais medem o MESMO intervalo de tempo e no intervalos DISTINTOS?Para resolvermos tal dvida, intoduziremos o coneito de EVENTO. Evento uma ocorrncia qualquer na Natureza; por exemplo, o encontro do tijolo como solo observado por Joo; ou a reflexo do sinal luminoso no ponto B; ou apassagem do sol pelo ponto mais alto da abbada celeste ao meio dia, etc. Ad-mitimos que todo evento ocorre em certo local do espao e em certo instantede tempo. Obviamente, tanto o local do espao quanto o instante de tempodevem ser determinados em relao a um referencial (inercial). No existe umlocal do espao "em si" nem um momento no tempo "em si". Local do espao a posio relativa de um evento em dado referencial; instante no tempo

    um instante marcado por um relgio (que faz parte do referencial). Admitimostambm que um evento um "dado bjetivo da realidade", isto , se um eventoocorre em relao a certo referencial, ele ocorre para todos os referenciais. Se,por exemplo, uma pessoa atropelada por um automvel (tal um evento), oatropelo no relativo, ele ABSOLUTO. Qualquer referencial que observar oautomvel e a pessoa constatar o atropelo. Este ocore para todos os referenci-ais. O que pode mudar de um referencial para outro a localizao do evento noespao e no tempo: dois referenciais podem observar o mesmo evento ocorer emlocais distintos e em instantes distintos, ou seja, os dois referenciais podem dis-cordar quanto a "onde" e a "quando", mas concordaro, forosamente, quanto existncia do fato. Podemos caracterizar um evento por quatro coordenadas:x,y,ze t. As trs primeiras determinam a posio espacial do evento e a ltima

    refere-se ao instante em que ele ocorreu. Reafirmemos que estas quatro corde-nadas so medidas em relao a dado referencial e podem mudar se adotarmosoutro referencial.

    Agora estamos em condies de responder pergunta formulada no incio dopargrafo anterior.Quanto falamos em INTERVALO DE TEMPO, estamos nosreferindo ao intervalo de tempo medido ENTRE DOIS EVENTOS. O evento 1 caracterizado pelas quatro coordenadasx1,y1,z1et1que o localizam no espao eno tempo relativamente ao referencialxyzt. O evento 2, por sua vez, caracteriza-se pelas coordenadas x2, y2, z2e t2 em relao ao mesmo referencial. Como aocorrncia de um evento um dado absoluto (nenhum referencial "tem o direito"de dizer: "no, tal evento a que voc se refere inexiste"), um outro referencial,digamos, x0y0z0t0, tambm observar estes mesmos dois eventos; s que elessero caracterizados por coordenadas de valores, em princpio, distintos daquelesrelativos ao primeiro referencial. Sejam(x01, y

    0

    1, z0

    1, t0

    1)e(x0

    2, y0

    2, z0

    2, t0

    2)estas novascoordenadas dos eventos 1 e 2, respectivamente. Paraxyzt, o intervalo de tempoentre estes dois eventos ser t = t2 t1; para x0y0z0t0, este mesmo intervalode tempo, isto , o intervalo de tempo entre estes mesmos dois eventos sert0 =t02 t

    0

    1. No exemplo que nos conduziu eq. 28, poderamos considerar oevento 1 como sendo a partidado sinal luminoso do ponto A; o evento 2 seriaa chegadado sinal a este mesmo ponto. Em resumo, podemos dizer que doisintervalos de tempo so "O MESMO" se eles so intervalos de tempo medidosentre OS MESMOS dois eventos.

    No exemplo considerado (o do sinal luminoso saindo e retornando a A), existeuma caracterstica peculiar para a medida do intervalo de tempo observado pelo

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    referencialx0y0. Neste referencial, os eventos 1 e 2 ocorrem no MESMO LOCAL

    do espao. E o que vem a ser "MESMO LOCA DO ESPAO"? Poderamosimaginar o espao como como sendo algo com existncia prpria independentedos corpos (da matria) que nele houvesse. Poderamos apontar para um pontode tal espao e dizer: "este o ponto M"; e mais adiante, "aquele o ponto N,aquele outro o ponto P", e assim por diante. Cada ponto teria sua prpriarealidade e poderia ser identificado sem ambigidade. Mas no assim queentendemos o espao. Este s adquire sentido quando visto por um referencial.E, aqui, quando falamos de referencial, estamos nos reportando a um corpo(ou a corpos) material(ais). Cada ponto do espao localizado relativamentea tal referencial. "Dois" pontos do espao sero o MESMO ponto se estiveremna mesma posio relativa ao dado referencial. O referencial x0y0 afirma que ospontos de partida e de chegada do sinal luminoso so o MESMO ponto do espaoporque este pontos possuem a mesma localizao, ou seja, x01 = x

    0

    2 e y0

    1 = y0

    2

    (a coordenada z0 foi tomada nula neste exemplo). Para o referencial xy, noentanto, o ponto de partida tem localizao distinta daquele de chegada e so,em conseqncia, pontos do espao DISTINTOS. Retomando o que dizamos,os eventos 1 e 2 ocorrem, parax0y0, no mesmo ponto do espao; a medida do in-tervalo de tempo entre eles (relativa ax0y0) denominada MEDIDA PRPRIAdo intervalo de tempo. Assim t0 a medida prpria enquanto que tno o . comum, tambm, dizer-se que t0 o INTERVALO DE TEMPO PRPRIOentre os dois eventos. Em resumo, intervalo de tempo prprio entre dois even-tos o intervalo de tempo entre os eventos medido por um referencial que osobserva ocorrerem no mesmo local do espao. Podemos, ento, dizer que otempo prprio entre dois eventos o tempo medido por um relgio,

    fixo ao referencial, colocado no local onde os dois eventos ocorrem (e

    no caso do outro referencial, no qual os eventos ocorrem em locais distintos, como sepode medir o intervalo de tempo? - posteriormente, discutiremos esta questo). A eq.28 nos mostra que o intervalo de tempo prprio o menorintervalo de tempopossvel entre dois eventos (posto que >1).

    Passemos a considerar o segundo exemplo. Um basto de comprimento Lencontra-se em repouso relativo a um referencial x0y0, cf. indica a figura aseguir. Outro referencial, xy, move-se para a erquerda com velocidade v,tal qual ocorreu no exemplo anterior. O ponto A fixo a xy (tal ponto podeser obtido pintando-se, por exemplo, de amarelo, um certo local do eixo dosxx). Quando A passa pela extremidade direita do basto (evento 1), comea-se a contar o tempo. Quando A passa pela extremidade esquerda (evento 2),finda-se a contagem. Para xy, o intervelo de tempo entre os eventos 1 e 2 o tempo prprio visto que os eventos ocorrem no mesmo local do espao (namarca amarela). Podemos fazer:

    L0 =vt0 (escrito por x0y0)

    L= vt (escrito por xy).

    Logo,

    L

    L0= t

    t0

    Como j dissemos, t o tempo prprio podendo, portanto, ser escrito como

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    t=t0

    .

    Observemos que, em 28, t0 era o tempo prprio. Aqui, o tempo prprio t; isto explica o fator dividindo t0 em vez de estar multiplicando comoaparecia em 28. Dividindo as duas ltimas equaes membro a membro, obte-mos:

    L= L0

    . (29)

    A eq. 29 nos diz que o basto encurta com o movimento ao longo de seucomprimento. Com efeito, no referencial no qual o basto est em repouso(x0y0), seu comprimento L0; para o outro referencial (no qual o basto est em

    movimento ao logo de seu comprimento), o comprimento no mais L0

    e simL. Como >1 (ou igual, caso v = 0), conclumos que L L0. O comprimentode um corpo medido por um referencial no qual ele est em repouso ditocomprimento prprio(no caso, L0).

    Figure 7: Basto em repouso relativo ao referencial x0y0.

    2.2 A transformao da velocidade

    Na subseo anterior, vimos como o tempo medido por um relgio e o compri-

    mento de um corpo se tranformam por mudana de referencial. Agora, discu-tiremos como a velocidade de um objeto se transforma, ou seja, responderemosa seguinte questo: para o referencial x0y0, uma partcula move-se com veloci-dade v0bx0; com que velocidade a partcula mover-se- em relao ao referencialxy, supondo que a velocidade de x0y0, relativa a xy , Vbx?

    Consideremos a fig. abaixo que retrata a situao descrita acima.

    Sejam:a) A e B pontos fixos sobre o eixo dos xx.b)P a partcula mvel.b) Evento 1 a passagem de P por A.

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    Figure 8: A partcula P move-se com velocidade v relativa ax0y0 o qual, por sua vez,desloca-se com velocidade V em relao a xy .

    c) Evento 2 a passagem de P por B.d) t tempo decorrido entre os eventos relativamente a xy.e) t0 tempo decorrido entre os eventos relativamente a x0y0.f) t0 tempo decorrido entre os eventos relativamente a P.g) xAB distncia AB medida porxy.h) x0AB distncia AB medida por x

    0y0.i) x0 distncia percorrida por P, medida por x 0y0 durante o tempo t0.

    Observemos que t o tempo prprio entre os dois eventos pois o tempomedido por um referencial (P) onde eles ocorrem no mesmo local do espao.Sendo assim, segue de 28:

    t= t0q

    1 v2

    c2

    ,

    t0 = t0q

    1 v2

    c2

    Logo, sendo a tt0 ,

    a2

    =1 v02/c2

    1 v2/c2 (30)

    Por outro lado, sendo

    1 V2/c21/2

    ,

    v=xAB

    t =

    x0ABt

    =x0 + Vt0

    t =

    (v0 + V)

    a (31)

    Substuindo-se esta ltima expresso em 30, vem:

    a2 = 1 v02/c2

    1 (v0+V)2

    1V2/c21

    a2c2

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    a2 (v

    0

    + V)

    2

    c2 (1 V2/c2) = 1 v02/c2

    a2 =c2

    1 v2/c2

    1 v02/c2

    + (v0 + V)2

    c2 (1 V2/c2) =

    1 + V v

    0

    c2

    21 V2/c2

    Logo,

    a= 1 + V v

    0

    c2p1 V2/c2

    (32)

    Substituindo em 31,

    v= v0 + V

    1 + V v0

    c2(33)

    A eq. 33 nos mostra que a velocidade da partcula no novo referencial, aocontrrio da relatividade galileana, no a soma da velocidade dela no velhoreferencial com a velocidade entre os referenciais. Se, em vez da partcula,considerarmos um sinal luminoso no vcuo, sua velocidade em xy ser:

    v= c + V

    1 + cV/c2 =c,

    resultado este compatvel com a invarincia da velocidade da luz por transfor-mao de referencial.

    Usando as eq.s 32,33 e H, obtemos a separao espacial, x, entre os dois

    eventos em relao a xy :

    x= vt= v0 + V

    1 + V v0

    c2

    1 +

    V v0

    c2

    t = (v0t + Vt)

    Ou seja,

    x = (x0 + Vt0) (34)

    y = y0

    z = z0

    A separao temporal, por sua vez, ser dada por:

    t=

    1 +V v0

    c2

    t0 =

    1 +

    V v0t0

    c2

    Ou seja,

    t=

    1 + x0V /c2

    (35)

    As equaes 34 e 35 so conhecidas como astransformaes de Lorentzparao espao e o tempo.

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    2.3 Sobre os referenciais

    Resta-nos esclarecer um ponto o qual, mantido obscuro, pode ser a origemde muitas confuses. Trata-se da questo da "localidade" quando se efetuaa medida do espao e do tempo. Como j dissemos, o intevalo de tempo ointervalo de tempo entre dois eventos. Consideremos um evento e certo refrencial(inercial),xy . O tempo em que o evento ocorre deve ser medido por um relgioem repouso relativo a xy colocado no local da ocorrncia. O tempo emque outro evento ocorre deve ser medido por outro relgio posicionado (fixo)no local desto novo evento (obviamente, podemos usar o mesmo relgio casoo segundo evento ocorra no mesmo local do primeiro). No se pode registraro tempo em que algo ocorre "l" mediante um relgio que se encontra "aqui".Assim sendo, como garantir o sincronismo entre os dois relgios? Obviamente,se os relgios no estiverem sincronizados e o tempo medido por um deles for,

    digamos, duas horas mais que o tempo medido pelo outro, no podemos afirmarque um dos eventos ocorreu duas horas aps o outro pois um dos relgios podeestar atrasado (ou adiantado) em relao ao outro relgio. Claro est, portanto,que a sincronizao dos relgios crucial. Uma forma de faz-lo seria colocaros relgios lado a lado, acerta-los e levar cada um para o seu lugar. Mas jvimos que o movimento relativo entre os relgios altera o tempo que um medeem relao ao tempo que o outro mede. Assim o processo de sincronizao devese dar com ambos os relgios em repouso (relativo a xy) j colocados em seusdevidos lugares. Como a velocidade da luz no vcuo absoluta, ou seja, amesma em todos os referenciais inerciais, sendo co seu valor, ento o referidoprocesso pose ser efetivado da seguinte maneira: da posio em que um dosrelgios se encontra, emite-se um sinal luminoso em direo ao outro relgio. Oinstante de tempo que este ltimo deve marcar no momento em que o sinal oatinge corresponde soma do instante marcado pelo outro no momento em queo sinal dele partiu com a razo entre a distncia que os separa e velocidade daluz.

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