Fichamento - Said, Orientalism

17
SAID, Edward. Orientalismo. O Oriente como invenção do Ocidente. Tradução Tomás Rosa Bueno. São Paulo: Cia. das Letras, 1990. Introdução Orientalismo, para o autor, é uma tradição predominante na Europa, principalmente na Grã-Bretanha e na França e, em grau menor, em países como Portugal, Itália, Suíça, Espanha. Historicamente, afirma haver uma diferença quantitativa e qualitativa de envolvimento franco- britânico no Oriente. “Portanto, falar de orientalismo é falar principalmente, embora não exclusivamente, de uma empresa cultural francesa e britânica...” (p. 15). É a partir da Segunda Guerra que os Estados Unidos começam a dominar o Oriente, abordando-o do mesmo modo que França e Inglaterra haviam feito até então. O termo define “um modo de resolver o Oriente que está baseado no lugar especial ocupado pelo Oriente na experiência ocidental europeia” (p. 13). “O Oriente não está apenas adjacente à Europa; é também onde estão localizadas as maiores, mais ricas e mais antigas colônias europeias, a fonte das suas civilizações e línguas, seu concorrente cultural e uma de suas mais profundas e recorrentes imagens do Outro.” (p. 13). O termo pode significar, também, nos círculos acadêmicos, a matéria estudada por alguém que analisa o Oriente, este, por sua vez, um orientalista. Fala, também, do orientalismo como estilo de pensamento baseado em uma distinção entre Ocidente e Oriente. E, um terceiro sentido, que data do século XVIII: orientalismo como uma forma de domínio e autoridade sobre o Oriente. Uma espécie de “poder intelectual” (p. 52). Afirma que a noção de discurso, de Foucault, é útil para analisar o orientalismo como um discurso da cultura europeia sobre o Oriente. “A minha alegação é que, sem examinar o orientalismo como um discurso, não se pode entender a disciplina enormemente sistemática por meio da qual a cultura europeia conseguiu administrar – e até produzir – o Oriente política, sociológica, ideológica, científica e imaginativamente durante o período pós- Iluminismo. Além do mais, o orientalismo tinha uma posição de tal autoridade que eu acredito que ninguém que escrevesse, pensasse ou atuasse sobre o Oriente podia fazê-lo sem levar em conta as limitações ao pensamento e à ação impostas pelo orientalismo. Em resumo, por causa do orientalismo, o Oriente não era (e não é) um tema livre de pensamento e de ação. Isso não quer dizer que o

description

Fichamento de Said. Orientalismo.

Transcript of Fichamento - Said, Orientalism

SAID, Edward. Orientalismo. O Oriente como inveno do Ocidente. Traduo Toms Rosa Bueno. So Paulo: Cia. das Letras, 1990.

Introduo Orientalismo, para o autor, uma tradio predominante na Europa, principalmente na Gr-Bretanha e na Frana e, em grau menor, em pases como Portugal, Itlia, Sua, Espanha. Historicamente, afirma haver uma diferena quantitativa e qualitativa de envolvimento franco-britnico no Oriente. Portanto, falar de orientalismo falar principalmente, embora no exclusivamente, de uma empresa cultural francesa e britnica... (p. 15). a partir da Segunda Guerra que os Estados Unidos comeam a dominar o Oriente, abordando-o do mesmo modo que Frana e Inglaterra haviam feito at ento. O termo define um modo de resolver o Oriente que est baseado no lugar especial ocupado pelo Oriente na experincia ocidental europeia (p. 13). O Oriente no est apenas adjacente Europa; tambm onde esto localizadas as maiores, mais ricas e mais antigas colnias europeias, a fonte das suas civilizaes e lnguas, seu concorrente cultural e uma de suas mais profundas e recorrentes imagens do Outro. (p. 13).

O termo pode significar, tambm, nos crculos acadmicos, a matria estudada por algum que analisa o Oriente, este, por sua vez, um orientalista. Fala, tambm, do orientalismo como estilo de pensamento baseado em uma distino entre Ocidente e Oriente. E, um terceiro sentido, que data do sculo XVIII: orientalismo como uma forma de domnio e autoridade sobre o Oriente. Uma espcie de poder intelectual (p. 52). Afirma que a noo de discurso, de Foucault, til para analisar o orientalismo como um discurso da cultura europeia sobre o Oriente. A minha alegao que, sem examinar o orientalismo como um discurso, no se pode entender a disciplina enormemente sistemtica por meio da qual a cultura europeia conseguiu administrar e at produzir o Oriente poltica, sociolgica, ideolgica, cientfica e imaginativamente durante o perodo ps-Iluminismo. Alm do mais, o orientalismo tinha uma posio de tal autoridade que eu acredito que ningum que escrevesse, pensasse ou atuasse sobre o Oriente podia faz-lo sem levar em conta as limitaes ao pensamento e ao impostas pelo orientalismo. Em resumo, por causa do orientalismo, o Oriente no era (e no ) um tema livre de pensamento e de ao. Isso no quer dizer que o orientalismo determine de modo unilateral o que pode ser dito sobre o Oriente, mas que ele toda a rede de interesses que inevitavelmente faz valer seu prestgio (e, portanto, sempre se envolve) toda vez que aquela entidade peculiar, o Oriente, esteja em questo. (p. 15).II

O Oriente no esteve sempre l. Os lugares so entidades geogrficas e culturais, so feitos pelo homem, segundo Vico. Portanto, assim como o prprio Ocidente, o Oriente uma ideia que tem uma histria e uma tradio de pensamento, imagstica e vocabulrio que lhe deram realidade e presena no e para o Ocidente. As duas entidades geogrficas, desse modo, apoiam e, em certa medida, refletem uma outra. (p. 16). No entanto, o autor faz a ressalva de que seria um erro afirmar de que o Oriente apenas uma ideia, sem uma realidade correspondente. A segunda ressalva que faz a seguinte: A relao entre o Ocidente e o Oriente uma relao de poder, de dominao, de graus variados de uma complexa hegemonia... (p. 17). D um exemplo de orientalizao do Oriente: Flaubert, homem, europeu, comparativamente rico, que descreveu em seu livro seu encontro com uma cortes egpcia. Ela nunca falou por si. Ele falou por ela e ele contou aos seus leitores de que forma ela era tipicamente oriental. Avisa que no se trata de assumir que o discurso orientalista no passa de mitos e mentiras sobre o Oriente, mas de compreender este discurso como um sinal do poder europeu sobre o Oriente, de observar suas relaes com as instituies scio-econmicas e polticas e sua durabilidade. Parte dos conceitos de Gramsci sobre uma diviso entre a vida civil (afiliaes voluntrias escolas, sindicatos, etc.) e a vida poltica (instituies estatais). As primeiras exercem influncia a partir de ideias e de consenso, enquanto as ltimas exercem influncia por dominao direta. As ideias que atingem consenso tornam-se hegemnicas e seria a hegemonia que conferiria ao orientalismo a sua durabilidade e fora. O orientalismo nunca est longe daquilo que Denys Hay chamou de ideia da Europa, uma noo coletiva que identifica a ns europeus em contraste com todos aqueles no-europeus, e de fato pode ser argumentado que o principal componente na cultura europeia precisamente o que torna essa cultura hegemnica tanto na Europa quanto fora dela: a ideia da identidade europeia como sendo superior em comparao com todos os povos e culturas no-europeus. (p. 19). Dois temores do autor: a generalidade dogmtica demais e um foco localizado positivista demais (p. 20). Ningum nunca descobriu um mtodo para separar o erudito das circunstncias da vida, do fato do seu envolvimento (consciente ou inconsciente) com uma classe, com um conjunto de crenas, uma posio social, ou da mera atividade de ser um membro da sociedade. (p. 21). Ora, posto que a Inglaterra, a Frana e, mais recentemente, os Estados Unidos so poderes imperiais, suas sociedades polticas transmitem s suas sociedades civis um sentimento de urgncia, como se fosse uma infuso poltica direta, onde e quando quer que questes relativas aos seus interesses imperiais estejam em jogo. Duvido que seja controverso, por exemplo, dizer que um ingls na ndia ou no Egito, no final do sculo XIX, tinha por estes pases um interesse que nunca estava muito afastado da sua condio, na mente dele, de colnias britnicas. (p. 22). A minha ideia que o interesse europeu, e depois americano, pelo Oriente era poltico de acordo com alguns de seus aspectos histricos bvios que descrevi aqui, mas que foi a cultura que criou esse interesse, que agiu dinamicamente em conjunto com as indisfaradas fundamentaes polticas, econmicas e militares para fazer do Oriente o lugar variado e complicado que ele obviamente era no campo que eu chamo de orientalismo. (p. 23). Trata o orientalismo em uma relao de intercmbio desigual com vrios tipos de poder: o poder poltico (como uma ordem colonial ou imperial), com o poder intelectual (como as cincias reinantes da lingustica comparada ou anatomia, ou qualquer uma das modernas cincias ligadas deciso poltica), com o poder cultural (como as ortodoxias e cnones de gosto, textos e valores), com o poder moral (como as ideias sobre o que ns fazemos e o que eles no podem fazer ou entender como ns fazemos). (p. 24). Com efeito, o meu verdadeiro argumento que o orientalismo e no apenas representa uma considervel dimenso da moderna cultura poltico-intelectual, e como tal tem menos a ver com o Oriente que com o nosso mundo. (p. 24). Estudo o orientalismo, portanto, como um intercmbio dinmico entre autores individuais e os grandes interesses polticos moldados pelos trs grandes imprios britnico, francs, americano em cujos territrios intelectuais e imaginativos a escrita foi produzida. (p. 26). O que eu afirmo que cada investigao humanstica deve formular a natureza dessa conexo [entre o conhecimento e a poltica] no contexto especfico do estudo, do tema e das suas circunstncias histricas. (p. 27). Os meus principais dispositivos metodolgicos para o estudo da autoridade so o que se pode chamar de localizao estratgica, que um modo de descrever a posio do autor em um texto com relao ao material oriental sobre o qual ele escreve, e a formao estratgica, que a maneira de analisar a relao entre textos e o modo pelo qual grupos de textos, tipos de textos e at gneros textuais adquirem massa, densidade e poder referencial entre si e depois na cultura mais geral. (p. 31). Qualquer pessoa que escreva sobre o Oriente deve localizar-se com relao ao Oriente; traduzida para o seu texto, essa localizao inclui o tipo de voz narrativa que ela adota, o tipo de estrutura que constri, os tipos de imagens, temas, motivos que circulam no seu texto tudo isso resumindo-se a modos deliberados de dirigir-se ao leitor, de dominar o Oriente e, finalmente, de representa-lo ou de falar no seu lugar. Nada disso acontece no abstrato, todavia. Todo aquele que escreve sobre o Oriente (e isso vale at para Homero) presume algum antecedente oriental, algum conhecimento prvio do Oriente, ao qual ele se refere e no qual ele se baseia. Alm disso, cada trabalho sobre o Oriente se filia a outros trabalhos, audincias, instituies e ao prprio Oriente. O conjunto de relaes entre obras, audincias e alguns aspectos particulares do Oriente, portanto, constitui uma formao analisvel por exemplo, os estudos filolgicos, as antologias de extratos de literatura oriental, de livros de viagens, de fantasias orientais cuja presena no tempo, no discurso e nas instituies (escolas, bibliotecas, servios diplomticos) lhe confere fora e autoridade. (p. 31-32). A minha anlise do texto orientalista, portanto, enfatiza a evidncia, que de modo algum invisvel, de tais representaes como representaes, e no como descries naturais do Oriente. [...] O que se deve procurar so os estilos, figuras de linguagem, os cenrios, mecanismos narrativos, as circunstncias histricas e sociais, e no a correo da representao, nem a sua fidelidade a algum grande original. A exterioridade da representao sempre governada por alguma verso do trusmo segundo o qual se o Oriente pudesse representar a si mesmo, ele o faria; visto que no pode, a representao cumpre a tarefa para o Ocidente e, faut de mieux, para o pobre Oriente. Sie konnen sich nicht vertreten, sie mssen vertreten werden [No podem representar a si mesmos; devem ser presentados], como escreveu Marx em O dezoito Brumrio de Lus Bonaparte. (p. 32). Qualquer pessoa que tenha residido no Ocidente desde os anos 50, particularmente nos Estados Unidos, ter atravessado uma era de extraordinria turbulncia nas relaes entre o Leste e o Oeste. Ningum ter deixado de notar de que modo Leste sempre quis dizer perigo e ameaa durante esse perodo, mesmo que fosse o Oriente tradicional, alm da Rssia. (p. 37). Um aspecto do mundo eletrnico ps-moderno que houve um reforo dos esteretipos pelos quais o Oriente visto. A televiso, os filmes e todos os recursos da mdia foraram a informao para dentro de moldes cada vez mais padronizados. (p. 38).1. O mbito do Orientalismo

Conhecer o Oriental

Oriental era um termo que permitia que se falasse sobre algo na Europa e fosse compreendido. O termo j fora usado por Chaucer, Shakespeare, Byron, Marx e outros. Analisando um discurso de Balfour na Cmara dos Comuns, em 1910, sobre o domnio britnico no Egito, o autor analisa que a questo sublinhada pelo palestrante no era tanto militar ou econmica, mas de conhecimento. O saber significa erguer-se acima do imediato, ir alm de si mesmo, para o estranho e distante. [...] Ter um tal conhecimento de uma coisa como essa domin-la, ter autoridade sobre ela. E, neste caso, autoridade quer dizer que ns negamos autonomia para ele o pas oriental posto que o conhecemos e que ele existe, em certo sentido, como o conhecemos (p. 42).

Nas pginas seguintes, mostra como dois funcionrios britnicos, Balfour e Cromer, expuseram para seus compatriotas o seu conhecimento do oriental. Ambos os tratavam como raas inferiores, que deviam ser submetidas pelos ocidentais, superiores, para que pudessem ser salvos do declnio. O europeu possuiria qualidades e teria atingido um nvel de civilizao impossvel para os orientais que, caso fossem deixados s suas prprias vontades, acabariam em declnio. As raas submetidas simplesmente no tinham o que era preciso para saber o que era bom para elas. (p. 48). Uma das coisas convenientes sobre os orientais, para Cromer, era que administr-los, embora as circunstncias pudessem variar um pouco aqui e ali, era quase a mesma coisa em quase toda a parte. Isso acontecia porque, claro, os orientais eram em quase todos os lugares quase os mesmos. (p. 48).

Na descrio de Cromer, ... os orientais ou rabes so simplrios, desprovidos de energia e de iniciativa e muito dados a adulaes de mau gosto, intriga, simulao e maus tratos aos animais; os orientais so incapazes de andar em uma estrada ou calamento (suas mentes desordenadas no conseguem entender aquilo que o sagaz europeu apreende imediatamente, que estradas e calamentos so feitos para andar); os orientais so mentirosos inveterados, so letrgicos e desconfiados, e em tudo se opem clareza, integridade e nobreza da raa anglo-saxnica. (p. 49).

Cromer no faz nenhum esforo para ocultar que para ele os orientais eram sempre e unicamente o material humano que ele governou nas colnias britnicas. (p. 49).

Qualquer caracterstica que fugisse ao que os europeus acreditavam ser a normalidade do comportamento oriental era visto como antinatural. Assim, o nacionalismo egpcio era visto como uma ideia nova, de razes exticas, e no como criao dos prprios orientais.

A demarcao absoluta entre o Leste e o Oeste, que Balfour e Cromer aceitam com tanta complacncia, tinha demorado anos, at sculos, para ser feita. Houve, claro, inmeras viagens de descobrimentos; houve contatos atravs do comrcio e das guerras. Mais que isso, porm, desde meados do sculo XVIII houvera dois principais elementos na relao entre o Leste e o Oeste. Um era o crescente conhecimento sistemtico na Europa sobre o Oriente, conhecimento reforado pelo encontro colonial, assim como pelo interesse disseminado a respeito do estranho e do incomum, explorado pelas cincias em desenvolvimento da etnologia, anatomia comparada, filologia e histria; e, mais, a esse conhecimento foi acrescentado um considervel corpo de literatura produzida por romancistas, poetas, tradutores e viajantes talentosos. O outro aspecto das relaes orientais-europeias era que a Europa estava sempre em uma posio de fora, para no dizer domnio. [...] Muitos termos foram usados para expressar a relao: Balfour e Cromer, tipicamente, usaram vrios. O oriental irracional, depravado (cado), infantil, diferente; desse modo, o europeu racional, virtuoso, maduro, normal. [...] O conhecimento do Oriente, posto que gerado da fora, em um certo sentido cria o Oriente, o oriental e seu mundo. Na linguagem de Cromer e Balfour, o oriental apresentado como algo que se julga (como em um tribunal), algo que se estuda e se descreve (como em um currculo), algo que se disciplina (como em uma escola ou priso), algo que se ilustra (como em um manual zoolgico). A questo que em cada um desses casos o oriental contido e representado por estruturas dominantes. (p. 50). Nos primeiros anos do sculo XX, os homens como Balfour e Cromer podiam dizer o que diziam, do modo como diziam, porque uma tradio ainda mais antiga de orientalismo que a do sculo XIX, fornecia-lhes vocabulrio, imagstica e retrica, alm de nmeros para ilustrar tudo. (p. 51). Como qualquer conjunto de ideias durveis, porm, as noes orientalistas influenciavam tanto as pessoas que eram chamas de orientais quanto as que eram chamas de ocidentais ou europeias; em resumo, o orientalismo melhor entendido como um conjunto de coaes e limitaes ao pensamento que como simplesmente uma doutrina positiva. (p. 52). O autor toma a invaso napolenica do Egito em 1798 como o prprio modelo de uma apropriao realmente cientfica de uma cultura por outra (p. 53). Com experincias como as de Napoleo, o Oriente, como um corpo de conhecimentos no Ocidente, foi modernizado, e esta a segunda forma sob a qual o orientalismo dos sculos XIX e XX existiu. Desde o incio do perodo que examinarei havia por toda a parte, entre os orientalistas, a ambio de formular suas descobertas, experincias e vises adequadamente em termos modernos, de colocar as ideias sobre o Oriente em ntimo contato com as realidades modernas. As investigaes lingusticas de Renan sobre o semita em 1848, por exemplo, foram rendidas em um estilo que se nutria pesadamente, para a sua autoridade, da gramtica comparada, da anatomia comparada e das teorias raciais contemporneas; estas conferiam prestgio ao orientalismo e o outro lado da moeda tornaram-no vulnervel, como tem sido desde ento, s correntes de pensamento do Ocidente, tanto as de moda quanto as seriamente influentes. (p. 53). At os escritores mais imaginativos de uma poca, homens como Flaubert, Nerval ou Scott, eram coagidos no que podiam experimentar do Oriente, ou no que podiam falar sobre ele. Isso porque, em ltima anlise, o orientalismo era uma viso poltica da realidade cuja estrutura promovia a diferena entre o familiar (Europa, Ocidente, ns) e o estranho (Oriente, Leste, eles). De um certo modo, essa viso criava e depois servia os dois mundos assim concebidos. Os orientais viviam no mundo deles, ns vivamos no nosso. (p. 54). Quando se usam categorias como oriental e ocidental como pontos de partida e finais da anlise, da pesquisa ou das polticas pblicas (tal como as utilizaram Cromer e Balfour), o resultado costuma ser a polarizao da distino o oriental fica mais oriental e o ocidental, mais ocidental e a limitao do encontro humano entre culturas, tradies e sociedades diferentes. (p. 56).A geografia imaginativa e suas representaes. Orientalizar o oriental.

Estritamente falando, o orientalismo um campo de estudos eruditos. No Ocidente cristo, considera-se que ele comeou a sua existncia formal com a deciso do Conclio de Viena, em 1312, de estabelecer uma srie de ctedras de rabe, grego, hebraico e srio em Paris, Oxford, Bolonha, Avignon e Salamanca. claro que os campos so feitos. Eles adquirem coerncia e integridade com o tempo porque os estudiosos se dedicam, de diversas maneiras, ao que parece ser um tema decidido conjuntamente. (p. 60). Mas o orientalismo um campo que tem uma considervel ambio geogrfica. (p. 60). De maneira geral, at meados do sculo XVIII, os orientalistas eram estudiosos bblicos, estudantes de idiomas semticos, especialistas islmicos ou, visto que os jesutas tinham aberto o novo estudo da China, sinlogos. [...] Por volta de meados do sculo XIX, o orientalismo era um tesouro de erudio to vasto quanto se podia imaginar. (p. 61). O autor afirma que, no sculo XIX, houve uma epidemia de coisas orientais que afetou todos os grandes poetas, ensastas e filsofos da poca (p. 61) e que oriental era sinnimo de asitico, de extico, misterioso, profundo, seminal; essa era uma transposio tardia em direo ao Leste de um entusiasmo semelhante, na Europa, pela Antiguidade grega e latina durante a Alta Renascena. (p. 61). Apesar da distrao de um grande nmero de vagos desejos, impulsos e imagens, a mente parece formular persistentemente o que Claude Lvi-Strauss chamou de uma cincia do concreto. Uma tribo primitiva, por exemplo, atribui lugar, funo e significado definidos para cada espcie folhosa do seu ambiente imediato. Muitas dessas ervas e flores no tm nenhuma aplicao prtica; mas o que Lvi-Strauss quer dizer que a mente precisa de ordem, e a ordem alcanada pela discriminao e registro de tudo, pela colocao de tudo aquilo de que a mente tem conscincia em um lugar seguro e fcil de achar, dando assim s coisas algum papel a cumprir na economia de objetos e identidades que formam um ambiente. (p. 63). O que importa aqui que a sia fala por meio e em virtude da imaginao europeia, que representada como vitoriosa sobre a sia, aquele outro mundo hostil do outro lado dos mares. sia so atribudos os sentimentos de vazio, perda e desastre que desde ento parecem recompensar os desafios orientais ao Ocidente; e, tambm, o lamento de que em algum passado glorioso a sia estava melhor, de que ela era por sua vez vitoriosa sobre a Europa. (p. 66). Desde, pelo menos, o sculo II a.C., nenhum viajante ou potentado ocidental voltado para o Leste e ambicioso deixava de aproveitar-se do fato de que Herdoto historiador, viajante e cronista de inexaurvel curiosidade e Alexandre rei, guerreiro, conquistador cientfico haviam estado no Oriente antes. Este, portanto, foi dividido em domnios previamente conhecidos, visitados e conquistados por Herdoto e Alexandre, assim como por seus epgonos, e em domnios no conhecidos previamente nem visitados ou conquistados. (p. 68). Analisando a obra Bibliothque orientale, faz a seguinte afirmao: O Oriente assim orientalizado, um processo que no apenas o marca como a provncia do orientalista como tambm fora o leitor ocidental no-iniciado a aceitar as codificaes orientalistas (como a Bibliothque em ordem alfabtica de DHerbelot) como o verdadeiro Oriente. (p. 77). Todo esse processo didtico no difcil nem de entender nem de explicar. Temos de lembrar novamente que todas as culturas impem correes realidade crua, transformando-a, de objetos flutuantes, em unidades de conhecimento. Que essa converso acontea no o problema. perfeitamente natural, para a mente humana, resistir ao assalto da estranheza que no tenha sido tratada; portanto, as culturas sempre estiveram inclinadas a impor transformaes completas a outras culturas, recebendo-as no como so, mas, para o benefcio do que recebe, como deveriam ser. (p. 77). Analisando autores como Shakespeare, Guibert de Nogent, Roger Bacon, Lutero, etc., chega a concluso de que o Oriente e o isl sempre so representados como entidades externas com um papel especial a cumprir dentro da Europa. (p. 80). A geografia imaginativa, dos vvidos retratos encontrados no Inferno aos prosaicos nichos da Bibliothque de DHerbelot, legitima um vocabulrio, um universo de discurso representativo que peculiar discusso e ao entendimento do isl e do Oriente. [...] Subjacente a todas as unidades do discurso orientalista e com isso quero dizer apenas o vocabulrio empregado cada vez que se fala ou se escreve sobre o Oriente est um conjunto de figuras representativas, ou tropos. (p. 80). Em outras palavras, no precisamos procurar por uma correspondncia entre a linguagem usada para descrever o Oriente e o prprio Oriente, no porque a linguagem seja imprecisa, mas porque ela no est nem sequer tentando ser precisa. O que ela est tentando fazer, assim como Dante no Inferno, caracterizar o Oriente como estrangeiro e, ao mesmo tempo, incorpor-lo esquematicamente a um palco teatral cujas audincia, administrador e atores so para a Europa, e s para ela. Da a vacilao entre o familiar e o estrangeiro; Maom sempre o impostor (familiar, porque ele pretende ser como o Jesus que conhecemos) e sempre o oriental (estrangeiro, pois, embora ele seja em alguns aspectos como Jesus, no como ele, no final das contas). (p. 81).Projetos

Grande parte dos primeiros orientalistas ingleses na ndia eram, tal como Jones, estudiosos legais ou ento, de maneira bastante interessante, mdicos com fortes inclinaes missionrias. Tanto quanto se pode dizer, a maior parte deles estava imbuda do duplo propsito de investigar as cincias e as artes da sia com a esperana de facilitar os melhoramentos aqui e de avanar e aperfeioar as artes na metrpole: assim foi descrita a meta comum orientalista no Centenary volume da Royal Asiatic Society, fundada em 1823 por Henry Thomas Colebrooke. (p. 88). Sobre a Expedio ao Egito de Napoleo: Restaurar uma regio, da sua barbrie presente, sua antiga grandeza clssica; instruir o Oriente (para o seu prprio benefcio) nas maneiras do moderno Ocidente; subordinar ou diminuir o papel do poder militar de maneira e engrandecer o projeto de conhecimento grandioso adquirido no processo de dominao poltica do Oriente; formular o Oriente, dar-lhe forma, identidade e definio, com pleno reconhecimento do seu lugar na memria, da sua importncia para a estratgia imperial e do seu papel natural como um apndice da Europa. Dignificar todo o conhecimento recolhido durante a ocupao colonial com o ttulo de contribuio erudio moderna, quando os nativos no haviam sido nem consultados nem tratados como qualquer coisa alm de pretextos para um texto cuja utilidade no se dirigia aos nativos; sentir-se como um europeu que estivesse comandando, quase vontade, a histria, o tempo e a geografia orientais; dividir, distribuir, esquematizar, tabular, indexar e registrar tudo o que estiver (ou no) vista; instituir novas reas de especializao; estabelecer novas disciplinas; fazer de cada detalhe observvel uma generalizao e de cada generalizao uma lei imutvel sobre a natureza, temperamento, mentalidade, costume ou tipo orientais; e, acima de tudo, transmutar a realidade viva na matria de que se fazem os textos, possuir (ou acreditar possuir) a realidade, principalmente porque nada no Oriente parece resistir aos nossos poderes: essas so as caractersticas da projeo orientalista inteiramente realizada na Description de lgypte, ela mesma possibilitada e reforada pela absoro totalmente orientalista do Egito feita por Napoleo com os instrumentos do conhecimento e do poder ocidentais. (p. 94).Crise

Fala sobre o que chama de atitude textual. Duas situaes favorecem uma atitude textual. Uma quando um ser humano enfrenta de perto algo relativamente desconhecido e ameaador, e anteriormente distante. Nesse caso, recorre-se no apenas quilo com que, na experincia anterior da pessoa, a novidade se parece, mas tambm ao que se leu. Livros de viagens ou guias so um tipo de texto quase to natural, to lgicos em sua composio e utilizao, quanto qualquer livro em que possamos pensar, precisamente por causa dessa tendncia humana de recorrer a um texto quando as incertezas de uma viagem a partes estranhas parecem ameaar a equanimidade da pessoa. Muitos viajantes so vistos dizendo, a respeito de uma experincia em um pas novo, que no era o que eles esperavam, querendo dizer que no era como um livro disse que seria. E claro que muitos escritores de livros de viagem compem suas obras de modo a dizerem que um pas assim, ou melhor, que ele colorido, caro, interessante e assim por diante. A ideia, em todos os casos, que as pessoas, lugares e experincias podem sempre ser descritos por um livro, de tal modo que o livro (ou texto) adquire maior autoridade, e uso, que a prpria realidade que descreve. (p. 102). Uma segunda situao que favorece a atitude textual a aparncia de sucesso. Se lemos u livro que afirma que os lees so ferozes e depois encontramos um leo feroz (estou simplificando, claro) provvel que nos sintamos encorajados a ler mais livros do mesmo autor e a acreditar neles. Mas, se, alm disso, o livro do leo nos instrui sobre como lidar com um leo feroz e as instrues funcionam perfeitamente, o seu autor no apenas gozar de grande crdito como ser tambm impelido a tentar a sorte em outros tipos de desempenho escrito. Existe uma dialtica de reforo bastante complexa, pela qual as experincias dos leitores na realidade so determinadas por aquilo que leram, e isso, por sua vez, influencia os escritores a escolherem temas definidos antecipadamente pela experincia dos leitores. (p. 103). O mais importante que tais textos podem criar, no apenas o conhecimento, mas tambm a prpria realidade que parecem descrever. Com o tempo, esse conhecimento e essa realidade produzem uma tradio, ou o que Michel Foucault chama de discurso, cuja presena ou peso material, e no a autoridade de um dado autor, realmente responsvel pelos textos a que d origem. Esse tipo de texto composto por aquelas unidades de informao preexistentes depositadas por Flaubert no catlogo de ides reues. (p. 103). Anteriormente, neste mesmo captulo, chamei essa relao entre a escrita ocidental (e as suas consequncias) e o silncio oriental de resultado e sinal da grande fora cultural do Ocidente, sua vontade de poder sobre o Oriente. (p. 104). Uma vez que comecemos a pensar no orientalismo como um tipo de projeo ocidental sobre o Oriente e vontade de governa-lo, encontraremos poucas surpresas. (p. 104). Generalizaes: Como um sistema de pensamento sobre o Oriente, ele sempre se elevou do detalhe especificamente humano para o detalhe geral, transumano; uma observao sobre um poeta rabe do sculo X multiplicava-se em uma poltica para (e sobre) a mentalidade oriental no Egito, no Iraque ou na Arbia. (p. 105). Na poca da Conferncia de Bandung, em 1955, todo o Oriente conquistara a independncia poltica em relao aos imprios ocidentais e enfrentava uma nova configurao de potncias imperiais, os Estados Unidos e a Unio Sovitica. Incapaz de reconhecer o seu Oriente no novo Terceiro Mundo, o orientalismo fazia face agora a um Oriente desafiador e politicamente armado. Duas alternativas se abriam ao orientalismo. Uma era continuar como se nada tivesse acontecido. A segunda era adaptar as velhas maneiras s novas. Mas para o orientalista, que acredita que o Oriente nunca muda, o novo simplesmente o velho trado por novos e equivocados des-orientais (podemos permitir-nos o neologismo). Uma terceira alternativa, revisionista, desfazer-se do orientalismo como um todo, foi considerada por uma nfima minoria. (p. 113). O autor aponta para dois momentos do orientalismo: o de Balfour e Cromer, pr-Primeira Guerra Mundial e o orientalismo de Gibb, Renan, Bernard Lewis e outros. Diversas revolues, duas guerras mundiais e inmeras mudanas econmicas, polticas e sociais faziam das realidades em 1945 um objeto indiscutivelmente, e at mesmo cataclismicamente, novo. (p. 114).Captulo 2 Estruturas e reestruturas orientalistas

Fronteiras retraadas, questes redefinidas, religio secularizada

Durante o sculo XVIII, contudo, houve alguns elementos novos e interligados que indicavam a fase evanglica que estava por vir, cujas linhas gerais Flaubert recriaria mais tarde. Por um lado, o Oriente estava sendo aberto consideravelmente alm das terras islmicas. Essa mudana quantitativa era em grande parte resultado de uma contnua e sempre crescente explorao europeia do resto do mundo. A influncia cada vez maior da literatura de viagens, das utopias imaginativas, das jornadas morais e das reportagens cientficas focalizaram o Oriente de maneira mais ntida e extensa. Se o orientalismo est em dvida principalmente com as frutferas descobertas orientais de Anquetil e Jones durante o ltimo tero do sculo, estas devem ser consideradas no contexto mais amplo ciado por Cook e Bougainville, pelas viagens de Tournefort e de Adanson, pela Histoire des navigatiosn aux terres australes [Histria das navegaes s terras austrais] do Presidente de Brosses, pelos negociantes franceses no Pacfico, pelos missionrios jesutas na China e nas Amricas, pelas exploraes e relatrios de William Dampier, pelas inmeras especulaes sobre gigantes, patagnios, selvagens, nativos e monstros supostamente habitando o extremo leste, o oeste, o sul e o norte da Europa. Mas todos esses horizontes que se ampliavam mantinham a Europa firmemente no centro privilegiado, como principal observadora ou principalmente observada, como em Citizen of the world [Cidado do Mundo], de Goldsmith. Isso porque, ao mesmo tempo que a Europa deslocava-se para fora, o seu sentido de fora cultural era reforado. Com base em estrias de viajantes, e no apenas com base em grandes instituies como as diversas companhias das ndias, colnias eram criadas e perspectivas etnocentristas eram garantidas. Por outro lado, uma atitude mais instruda em relao ao estranho e ao extico foi favorecida no somente por viajantes e exploradores, mas tambm por historiadores cuja experincia europeia podia ser proveitosamente comparada com outras civilizaes, e mais antigas. (p. 126). Um quarto elemento que prepara o caminho para as estruturas orientalistas modernas foi todo o impulso de classificar a natureza e o homem em tipos. Os maiores nomes so, claro, Lineu e Buffon, mas os processos intelectuais pelos quais a extenso corporal (e logo moral, intelectual e espiritual) a tpica materialidade de um objeto podia ser transformada de mero espetculo em medida precisa de elementos caractersticos estavam muito difundidos. Lineu disse que cada nota feita sobre um tipo natural deveria ser um produto de nmero, de forma, de proporo, de situao, e, de fato, se olharmos para Kant, ou Diderot, ou Johnson, por toda a parte est uma tendncia a dramatizar os traos gerais, a reduzir vastos nmeros de objetos a um nmero menor de tipos ordenveis e descritveis. Na histria natural, na antropologia, na generalizao cultural, um tipo tinha um carter particular, que dava ao observador uma designao e, como diz Foucault, uma derivao controlada. Esses tipos e esses caracteres pertenciam a um sistema, uma rede de generalizao relacionadas. (p. 128). Os quatro elementos que eu descrevi expanso, confronto histrico, solidariedade e classificao so as correntes do pensamento do sculo XVIII de cuja presena dependem as estruturas intelectuais e institucionais especficas do orientalismo moderno. Sem eles o orientalismo, como veremos a seguir, no poderia ter ocorrido. Alm disso, esses elementos tiveram o efeito de libertar o Oriente em geral, e o isl em particular, da viso estreitamente religiosa mediante a qual haviam sido examinados (e julgados) at ento pelo Ocidente cristo. Em outras palavras, o orientalismo moderno deriva de elementos secularizantes da cultura europeia do sculo XVIII. (p. 129). O orientalismo organizou-se sistematicamente como a aquisio de material oriental, e a disseminao regulada desse material como uma forma de conhecimento especializado. Copiavam-se e imprimiam-se obras de gramtica, adquiriam-se textos originais, multiplicava-se o nmero deles e se lhes dava ampla difuso, e at mesmo se dispensava o conhecimento de maneira peridica. (p. 173).

Peregrinos e peregrinaes, ingleses e franceses

Todo viajante ou residente europeu no Oriente teve de proteger-se contra as suas perturbadoras influncias. [...] Na maioria dos casos, o Oriente parece ter ofendido a decncia sexual; tudo sobre ele pelo menos o Oriente-no-Egito de Lane porejava o perigoso sexo, ameaava a higiene e o decoro domstico com uma excessiva liberdade de relaes sexuais, tal como Lane disse, mais irreprimivelmente que de costume. Mas havia outros tipos de ameaa alm do sexo. Todas desgastavam a discrio e racionalidade europeias do tempo, espao e identidade pessoal. No Oriente, ramos subitamente confrontados com a Antiguidade inimaginvel, a beleza desumana, a distncia sem limites. (p. 174). A escrita deles deveria ser um novo repositrio de experincia oriental mas, como veremos, at mesmo esse projeto costumava transformar-se (mas no sempre) no reducionismo das coisas orientalsticas. As razes para isso so complexas, e tm muito a ver com a natureza do peregrino, com o seu modo de escrever e com a forma intencional da sua obra. (p. 177). O que foi o Oriente para o viajante individual do sculo XIX? Consideremos primeiro as diferenas entre um anglfono e um francfono. Para o primeiro, o Oriente era a ndia, claro, uma possesso britnica de fato; passar pelo Oriente Prximo era, portanto, passar a caminho de uma importante colnia. [...] Escrever sobre o Egito, a Sria ou a Turquia, bem como viajar por esses pases, era uma questo de passear pelos domnios da vontade, da administrao e da definio polticas. [...] Em compensao, o peregrino francs estava imbudo de um sentido agudo de perda no Oriente. Ele ia para l como se fosse para um lugar em que a Frana, ao contrrio da Inglaterra, no tinha uma presena soberana. O Mediterrneo ecoava os sons de derrotas francesas, das Cruzadas a Napoleo. Aquilo que ficou conhecido como la mission civilisatrice comeara no sculo XIX como um sucedneo poltico da presena britnica. (p. 177). QUESTO: O QUE ERA O BRASIL PARA UM VIAJANTE INGLS?

O crescimento do conhecimento, particularmente do conhecimento especializado, um processo muito lento. Longe de ser meramente somatrio ou cumulativo, um processo de acumulao seletiva, deslocamento, cancelamento, redisposio e insistncia dentro daquilo que foi chamado de consenso de pesquisa. A legitimidade de um conhecimento como o orientalismo, durante o sculo XIX, no tinha origem na autoridade religiosas, como fora o caso antes do Iluminismo, mas no que podemos chamar de citao restauradora da autoridade precedente. (p. 184). Poderamos muito bem reconhecer que para a Europa do sculo XIX, com o seu crescente embourgeoisement, o sexo fora institucionalizado de modo bastante considervel. Por um lado, no existia nada parecido com sexo livre e, pelo outro, o sexo em sociedade implicava uma trama de obrigaes legais, morais e at mesmo polticas e econmicas de uma espcie detalhada e certamente embaraosa. Do mesmo modo que as vrias possesses coloniais muito alm do benefcio econmico que proporcionavam s metrpoles europeias eram teis como lugares para onde mandar filhos desobedientes, populaes excedentes de criminosos, pobres e outros indesejveis, o Oriente era um lugar onde se podia procurar por experincias sexuais impossveis de se obter na Europa. (p. 197).