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FICHA TÉCNICA Título original: The Tale of Angelino Brown Autor: David Almond Texto © 2017 by David Almond (UK) Ltd. Ilustrações da capa e miolo © 2017 Alex T. Smith Edição portuguesa publicada por acordo com Walker Books Limited, London SE11 5HJ Tradução © Editorial Presença, Lisboa, 2018 Tradução: Maria José de Figueiredo Revisão: Maria do Carmo Bobone/Editorial Presença Composição, impressão e acabamento: Multitipo — Artes Gráficas, Lda. 1. a edição, Lisboa, março, 2018 Depósito legal n.° 437 860/18 Reservados todos os direitos para a língua portuguesa (exceto Brasil) à EDITORIAL PRESENÇA Estrada das Palmeiras, 59 Queluz de Baixo 2730‑132 Barcarena [email protected] www.presenca.pt Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida sob qualquer forma ou meio, eletrónico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou armazenamento de informação, sem o consentimento prévio, por escrito, do editor.

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FICHA TÉCNICA

Título original: The Tale of Angelino BrownAutor: David AlmondTexto © 2017 by David Almond (UK) Ltd.Ilustrações da capa e miolo © 2017 Alex T. SmithEdição portuguesa publicada por acordo com Walker Books Limited, London SE11 5HJTradução © Editorial Presença, Lisboa, 2018Tradução: Maria José de FigueiredoRevisão: Maria do Carmo Bobone/Editorial PresençaComposição, impressão e acabamento: Multitipo — Artes Gráficas, Lda.1.a edição, Lisboa, março, 2018Depósito legal n.° 437 860/18

Reservados todos os direitospara a língua portuguesa (exceto Brasil) àEDITORIAL PRESENÇAEstrada das Palmeiras, 59Queluz de Baixo2730 ‑132 [email protected]

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida sob qualquer forma ou meio, eletrónico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou armazenamento de informação, sem o consentimento prévio, por escrito, do editor.

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Cá vamos nós. Todos a bordo. Este é o Bert, ao vo‑lante do seu autocarro. O Bert tem condu zido o mesmo autocarro, pela mesma carreira, ao longo dos últimos dez anos, e bem longos que eles foram. Dez anos! Mais do que alguns de nós temos de vida! E antes disto, andou dez anos a fazer outra carreira do outro lado da cidade. Eu sei que há gente que adorava conduzir um autocarro. Tu, se calhar. Se calhar o Bert também gostava, quando começou nesta vida, há muitos anos, quando era novo e cheio de esperanças. Mas agora já não é bem assim. Agora já não é mesmo nada assim! O Sr. Bertram Brown já está farto disto. Mas que maneira de gastar a vida! Para ar‑ranca para arranca para arranca para arranca. Os tra vões a suspirar, as portas a guinchar, o motor a arfar. Semáforos, engarrafa mentos, atrasos, obras na estrada, o sol intenso, o nevoeiro, as poças de água, o gelo e a neve aos magotes.

E as paragens! Qual é o interesse das paragens de auto‑carro? Aquela gente toda à espera, todos com as mãos no ar. «Pare aqui, senhor motorista! Deixe ‑nos entrar no seu auto‑carro quentinho!» Passageiros! Quem é que terá inventado os passageiros? Velhotas de bengala; velhotes mal cheirosos, com as mãos a tremer e a baba a cair ‑lhes pelo queixo; mulheres desaustinadas, com os miúdos a berrar e os bebés a vomitar ‑lhes para cima. Cadeiras de rodas e sacos de compras e cadeirinhas de bebé e encomendas. Cachopos com as suas cachopas e cachopas com os seus cachopos, a fazerem olhi‑nhos uns aos outros e a dizerem segredinhos de mãos dadas.

E miúdos! Miúdos! Não puxem pela língua do Bert! Quem é que terá inventado os miúdos? Criaturas atrevidas,

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sempre a pingar do nariz. «Deixe ‑me pagar só vinte cênti‑mos! Deixei cair o dinheiro na goteira! Eu ainda não tenho quinze anos, tenho oito! Cuidado! Não ande tão depressa! Pare aí, que eu preciso de ir fazer chichi! Pare aí que eu preciso...» Miúdos! Qual será o interesse dos miúdos?

Bolas, cá está ele novamente em S. Mungo. E lá vêm eles, os malandrins todos. «Um de cada vez! Não empur‑rem! Sentem ‑se! Parem com essas gargalhadas! Parem com esses gritos! Parem com esse chinfrim!» Miúdos! Fechem ‑nos num armário e deitem fora a porcaria da chave! Miúdos! «Calem ‑se e sentem ‑se! Sentem ‑se!»

Pelo menos está quase a acabar. O Bert segue em frente. Olhem para ele. Já quase não tem cabelo. Não tarda, está na idade da reforma. Finalmente a liberdade! Acabam ‑se os autocarros. Acabam ‑se as paragens de auto‑carros! Acabam ‑se os passageiros! Acabam ‑se os miúdos! Acabam ‑se de vez os miúdos atrevidos e mal ‑educados!

Mas espera aí... O que é isto? O que é que se passa? Há ali qualquer coisa a mexer dentro do peito do Bert! Ele agita ‑se por todos os lados, encolhe a barriga, estica o peito, encolhe o peito! O casaco está ‑lhe a ficar tão aper‑tado que ele mal consegue respirar. Tem a cabeça completa‑mente a andar à roda e o coração a bater com toda a força, bang, bang, bang! Bang, bang, bang! Não me digas que é um ataque de coração! O Bert está a ter um ataque de coração!

O Bert carrega no pedal do travão com toda a força, e o autocarro faz uma bela travagem, embora não haja por ali paragem nenhuma. «O que é que se passa, Bert?», gritam os passageiros. «Isto não é a paragem. Nós temos de ir para casa. Nós temos de ir para o emprego! As rodas do autocarro deixaram de girar, girar, girar...»

O Bert tem vontade de gritar: Chamem uma ambulân‑cia! Mas nem consegue falar. E a agitação é cada vez mais

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intensa, o coração bate ‑lhe cada vez com mais força, e o casaco está cada vez mais apertado.

Chegou a minha hora!, pensa ele.Desliga o motor. Os passageiros estão todos a gritar,

mas ele não os ouve.Está tudo em silêncio: um silêncio lindo, maravilhoso.Então é assim que isto acaba!, pensa o Bert. Adeusi‑

nho, mundo cruel!Mas... esper’aí um bocadinho. Sim, ele sente uma agi‑

tação intensa no peito e o coração a bater ‑lhe com toda a força. Sim, ele sente a cabeça a andar à roda. Mas não tem uma gotinha que seja de dor. Isto não é um ataque de coração. Não pode ser. Que alívio. Ufa! Mas então o que é? Oh! Ele tem uma coisa no bolso. Tem ali qualquer coisa, ao lado das canetas e dos horários. Uma coisa que se está a mexer. O Bert enfia a mão no bolso e remexe lá dentro. Ora esta! Mas o que é que ele ali tem, a saltar e a agitar ‑se dentro do bolso do casaco?

O Bert tira a coisa cá para fora. Ergue ‑a até ao nível dos olhos. Está viva!

Tem a coisa na mão. Aquilo tem asas. Aquilo tem um ves‑tidinho branco. Não pode ser... Ou poderá?

— O que é isso?Aparece ‑lhe à frente uma

pequena de camisola amarela e calças amarelas. Está mesmo ao lado do com‑partimento do moto‑rista, mesmo por baixo do cartaz onde está escrito:

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É PROIBIDOFALAR COM O MOTORISTA

OU DISTRAÍ ‑LO DA CONDUÇÃO

— O que é que tens aí? — pergunta ela.O Bert franze o sobrolho.— Não é nada — responde.— É sim. É um...— Vai ‑te sentar! — ordena ele.O Bert fica a olhar para a coisa que tem na mão.

A coisa olha para ele. É mesmo! É um anjo.O Bert volta a metê ‑lo no bolso do peito.— O que é que aconteceu, senhor motorista? — grita

alguém do fundo do autocarro.— Foi um problemazito com o motor! — responde

o Bert no mesmo tom. — Mas já passou.Volta a ligar o motor.— Como é que ele se chama? — pergunta a pequena.— Quem?— Ele.E aponta para o bolso do Bert, onde o anjo se remexe

de um lado para o outro.— É o teu menino?— Eu não tenho menino nenhum! — responde o Bert

com brusquidão.— Tens sim! Tens um menino aí no teu bolso!— Senta ‑te imediatamente, senão ponho ‑te fora do

autocarro!A pequena vai ‑se sentar, mas não tira os olhos do Bert.

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O motorista sente o anjo a esvoaçar ao lado do coração. Assim que para num semáforo, espreita para dentro do bolso e vê dois olhinhos muito brilhantes a espreitar cá para fora.

— Vou levar ‑te para casa e mostrar ‑te à Betty — sus‑surra. — Ela que decida o que te havemos de fazer.

— Está verde, senhor motorista! Ande embora! — grita alguém lá de trás.

O semáforo mudou de cor e o Bert arranca, seguindo pela rua fora em direção à central dos autocarros. Os pas‑sageiros entram e saem. Ele vende os bilhetes e dá os trocos. Sem uma queixa. Dizendo sempre «por favor» e «obrigado».

— O que terá ele hoje? — sussurra alguém.— Está ‑se a passar da cabeça — responde ‑lhe a colega,

encostando o indicador à testa e fazendo ‑o rodar, ao mesmo tempo que pisca o olho. — A perder o juízo.

E riem ‑se as duas.— Pobre Bert — comentam.— Tenho de sair aqui — diz a pequena de roupa

amarela.— Então sai — responde Bert.— Toma uma goma — diz ela.— Uma quê?— Para o teu menino.O Bert olha para ela com uma

expressão irritada, e a pequena ri ‑se. De dentro do bolso do motorista sai uma mãozita, e a pequena põe ‑lhe a goma na palma. A mão e a goma desapa‑recem e a pequena volta a rir ‑se.

— Que querido! — exclama.— Desanda! — ralha Bert.

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A pequena sai do autocarro e diz ‑lhe adeus com a mão.— Até breve! Eu sou a Nancy Miller — informa ‑o.O Bert segue caminho, com o bolso em paz e sossego.

Espreita lá para dentro e vê o anjo a lamber a goma. Dá a impressão de estar a cantarolar qualquer coisa, e o Bert dá por si a cantarolar com ele.

Finalmente, o autocarro está quase vazio. Está quase a chegar ao final do dia. Já só resta um jovem, um sujeito vestido de preto, de bigode preto e óculos de sol pretos.

O sujeito está à porta, à espera para sair. O Bert puxa o travão e a porta abre ‑se.

— Última paragem — diz ele.O rapaz nem se mexe.— É o final da linha, amigo — insiste o Bert.— O que é qu’ você tem aí? — pergunta ‑lhe o su‑

jeito, apontando para o bolso de Bert.— Não tenho nada — responde Bert. — Saia.O sujeito sai, mas fica a olhar com atenção, vendo as

portas a fechar e o autocarro a afastar ‑se.— Estes passageiros! — resmunga o Bert.E segue caminho.O rapaz tira o telemóvel do bolso e faz uma chamada.— Sou eu, Chefe — diz. — Acabo de ver uma coisa

que talvez nos interesse, e muito.

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