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UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI Programa de Pós-Graduação Multicêntrico em Química Fernando Mota de Oliveira DESENVOLVIMENTO DE METODOLOGIAS PARA DETERMINAÇÃO DE PARÂMETROS CINÉTICOS DE REAÇÕES ELETROQUÍMICAS SIMPLES Diamantina 2019

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fernando_mota_oliveiraPrograma de Pós-Graduação Multicêntrico em Química
Fernando Mota de Oliveira
Diamantina
2019
Multicêntrico em Química de Minas Gerais, da
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e
Mucuri, como requisito parcial para obtenção do
título de Doutor.
Coorientador: Dr. Leonardo Morais da Silva
Diamantina
2019
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos que torceram pelo desenvolvimento deste trabalho. De forma
especial:
Ao meu marido, Thiago, que esteve do meu lado durante este processo. Com ele
compartilhei todas as preocupações que tive.
Aos meus pais, Rosângela e Jorge, irmão, Filipe, tia, Maria José, avós, Raimunda e
Rosa, pelo incentivo.
Karine, pela ajuda e apoio, pela amizade.
Ao professor Wallans, pela orientação e incentivo. Eu não conseguiria seguir no
doutorado sem sua ajuda.
Ao professor Leonardo, pelas importantes contribuições dadas, desde a graduação.
Aos meus amigos do IFMG, principalmente, Silvéria, Marcel, Ligiane e Meiriane, pela
ajuda e incentivo. Foram muito importantes para que continuasse este processo.
Aos amigos desde outra era, Leo, Fabrício e Danilton, deram-me força.
Àqueles que me esqueci, sei que compreendem, conhecem minha memória.
“Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é
só a fazer outras maiores perguntas ”
(Riobaldo, no fascinante livro Grande Sertão:
Veredas de João Guimarães Rosa)
RESUMO
A Cinética de reações eletroquímicas simples pode ser descrita a partir da constante de
velocidade padrão heterogênea (k0) e dos coeficientes de transferência de carga (αc e αa). A
determinação destes parâmetros permite entender quão rápida é a reação e qual processo,
oxidação ou redução, é mais sensível à variação de potencial. Esta informação sobre a reação é
útil em estudos para caracterizar materiais ou superfícies. Este trabalho apresenta duas novas
propostas simples e rápidas para determinação destes parâmetros cinéticos. No primeiro caso,
a aplicação da análise por injeção em batelada acoplado com detecção amperométrica de
múltiplos pulsos (BIA-MPA) é proposta como um método alternativo para obter parâmetros
cinéticos a partir de gráficos de Tafel ou uma relação linear corrente-potencial em baixos
sobrepotenciais. Os estudos cinéticos foram realizados para permitir a caracterização da
superfície de um filme fino de diamante dopado com boro (BDD). Nesses estudos, o potencial
de equilíbrio (Eeq), os parâmetros cinéticos corrente de troca (I0), αc e αa, bem como k0 foram
avaliados. Os valores de k0 obtidos para as diferentes reações redox a partir das análises por
BIA-MPA foram comparados com aqueles obtidos usando a técnica de espectroscopia de
impedância eletroquímica (EIS) e com outros valores obtidos da literatura. Os resultados
mostraram que a determinação dos coeficientes de transferência por gráficos de Tafel usando
BIA-MPA é possível apenas para cinéticas lentas. No segundo caso, uma abordagem mais
simples e rápida para determinar k0, αc e αa de reações quase-reversíveis simples foi
desenvolvida usando a cronoamperometria de pulso duplo (DPC) em tempos curtos e com
baixos sobrepotenciais. Os parâmetros cinéticos foram determinados para as reações faradaicas
envolvendo pares redox de complexos de ferro sobre um eletrodo de carbono vítreo comercial.
Os erros envolvidos neste tipo de análises foram avaliados pelo método de simulação numérica
por diferenças finitas, no qual uma simples estratégia foi proposta para considerar coeficientes
de difusão desiguais. Além de ser simples e rápido, o método proposto baseado em DPC tem a
vantagem de permitir o cálculo de k0 sem influência de α. Uma ótima correspondência foi
observada entre as observações experimentais e as análises teóricas envolvendo as simulações
por diferenças finitas. Além disso, boa concordância foi observada para os valores de k0 obtidos
por DPC em tempos curtos com os valores obtidos por EIS e com dados da literatura. Portanto,
no presente trabalho, duas novas alternativas são apresentadas para calcular parâmetros
cinéticos de reações eletroquímicas que podem viabilizar uma caracterização mais simples e
rápida de eletrodos utilizados para diferentes propósitos.
Palavras-chave: Gráfico de Tafel; Análises por injeção em batelada; Amperometria de
múltiplos pulsos; Parâmetros cinéticos; Impedância; Cronoamperometria de pulso-duplo;
Pulsos em tempos curtos; Simulações numéricas por diferenças finitas.
ABSTRACT
The kinetics of simple electrochemical reaction can be described from standard heterogeneous
rate constant (k0) and the charge-transfer coefficients (αc e αa). The determination of these
parameters allows to understand how fast is the reaction and which process, oxidation or
reduction, is more sensitive to potential variation. This information about the reaction is useful
in studies to characterize materials or surfaces. This work presents two new proposes for simple
and fast determination of these kinetics parameters. In the first case, the application of the batch
injection analysis coupled with multiple-pulse amperometric (BIA-MPA) detection is proposed
as an alternative method to obtain the kinetic parameters from analysis of the Tafel plots or a
linear current-potential relation at low overpotentials. The kinetic studies were performed to
permit the surface characterisation of thin boron-doped diamond (BDD) film. In these studies,
the equilibrium potential (Eeq), the kinetic parameters exchange current (I0), αc and αa, as well
k0 were evaluated. The k0-values obtained for the different redox reactions from analysis by
BIA-MPA were compared with those obtained using the electrochemical impedance
spectroscopy (EIS) technique or values from literature. The results showed that the
determination of charge-transfer coefficients by Tafel plots using BIA-MPA is only possible
for slow kinetics. In the second case, an even simpler and faster approach to determinate k0, αc
and αa of simple quasi-reversible electrochemical reactions was developed using short time
double-pulse chronoamperometry (DPC) at low overpotentials. The kinetic parameters were
determined for the faradaic reactions involving redox couples of iron complexes on a
commercial glassy carbon electrode. The errors involved in this type of analysis were evaluated
by simulation numerical method of finite difference, in which a simple strategy to consider
unequal diffusion coefficients was proposed. In addition to being simple and fast, the proposed
method based on DPC has the advantage of to allow the k0 determination without α influence.
A very good correspondence was observed between the experimental findings and the
theoretical analysis involving the finite difference numerical simulations. Furthermore, a good
agreement was observed for k0-values obtained by DPC at short times with values obtained by
EIS or from literature data. Therefore, in the present work, two new alternatives are presented
to calculate kinetics parameters of electrochemical reactions which can provide a simpler and
fast characterization of electrodes used for different purposes.
Keywords: Tafel plot; Batch injection analysis; Multiple-pulse amperometry; Kinetic
parameters; Impedance; Double-pulse chronoamperometry; Short time pulses; Finite difference
numerical simulations.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Perfis de energia livre em função do progresso da reação: R O + e−. À direita
mostra-se uma região mais próxima ao estado de transição.......................................................40
Figura 2: Efeito da mudança no potencial aplicado com relação às energias livres. Em (A)
torna-se o potencial mais positivo e em (B) torna-se o potencial mais negativo.........................40
Figura 3: Alterações das energias livres se E > E0. Em (B) mostra-se uma região próxima ao
estado de transição de forma que as curvas são consideradas como retas...................................40
Figura 4: Determinação experimental de parâmetros cinéticos utilizando curvas de Tafel.......44
Figura 5: Movimentação de íons devido à migração em uma célula eletroquímica..................45
Figura 6: Movimento por difusão numa célula eletroquímica ocorrendo oxidação..................46
Figura 7: Análise de fluxo unidimensional em um elemento de comprimento “dx”.................47
Figura 8: Aproximação linear para variação na concentração de espécies R com relação à
superfície do eletrodo no qual ocorre R → O + e-.......................................................................49
Figura 9: Conjunto experimental para controle de potencial....................................................50
Figura 10: Modelo matemático para difusão linear e reação eletroquímica simples.................51
Figura 11: Variação do potencial em função do tempo para a voltametria cíclica: (A) sinal
linear; (B) sinal “staircase”.......................................................................................................55
Figura 12: Representação esquemática de (a) um resistor de resistência “R”; (b) um capacitor
de capacitância “C”; (c) um indutor de indutância “L”. Nos três elementos se aplica uma
diferença de potencial “E”.........................................................................................................58
Figura 13: (A) Representação de corrente e potencial com fasores. (B) rotação em −π/2 rad
no plano complexo.....................................................................................................................59
Figura 14: Circuito R-C em paralelo no qual uma corrente alternada se desenvolve................59
Figura 15: Vetor impedância no plano complexo.....................................................................61
Figura 16: Gráfico de Nyquist para o circuito R-C em paralelo. Para os cálculos considerou-se
R = 50 Ω e C = 1 μF. A frequência foi variada de 0,1 mHz até 12 MHz......................................62
Figura 17: Gráfico de log| Z | em função de log(f) para o circuito R-C em paralelo. Para os
cálculos considerou-se R = 50 Ω e C = 1 μF. A frequência foi variada de 0,1 mHz até 12
MHz..........................................................................................................................................63
Figura 18: Gráfico de em função de log(f) para o circuito R-C em paralelo. Para os cálculos
considerou-se R = 50 Ω e C = 1 μF. A frequência foi variada de 0,1 mHz até 12 MHz...............64
Figura 19: Variação do potencial em função do tempo na SWV (C). O sinal em (C) é resultado
da soma dos sinais mostrados em (A) e (B) ...............................................................................66
Figura 20: Perfil comum de corrente em função do potencial para SWV..................................67
Figura 21: Exemplo de célula utilizada no sistema BIA com detector eletroquímico. A célula
contém três eletrodos: (a) auxiliar, (b) referência e (c) eletrodo de trabalho. A ponteira da pipeta
(d) é posicionada próxima à superfície do eletrodo, a solução é agitada utilizando uma barra
magnética (e) e pode ser drenada utilizando a torneira em (f) ...................................................68
Figura 22: Exemplo de variação de potencial utilizando a técnica MPA aplicando dois
potenciais (E1 e E2). O pulso de potencial E1 é sempre aplicado pelo tempo t1. O pulso de
potencial E2 é sempre aplicado pelo tempo (t2 – t1). Os pontos na parte (A) mostram os
momentos de amostragem de corrente (últimos 5 ms). Em (B) observa-se um comportamento
comum de corrente em função do tempo....................................................................................70
Figura 23: Métodos explícito (A) e implícito (B) na grade discreta espaço-temporal aplicados
às concentrações........................................................................................................................73
Figura 24: Esquema para a célula eletroquímica utilizada para análises com BDDE. À direita
observa-se uma imagem aproximada da parte inferior da célula................................................84
Figura 25: Foto do sistema BIA utilizado nas análises. Em (a) está a micropipeta eletrônica,
em (b) a célula eletroquímica e em (c) o motor para possível agitação.......................................84
Figura 26: Célula eletroquímica utilizada para as análises com GCE e
OGCE........................................................................................................................................85
Figura 27: Perfis voltamétricos para os pares (A) [Fe(CN)6]4−/ 3−, (B) [Ru(NH3)6]2+/3+ e (C)
[Fe(H2O)6]2+/3+ 1 mmol dm−3 em KCl 0,1 mol dm−3. Velocidade de varredura igual a 0,050 V
s−1, WE: BDDE..........................................................................................................................87
Figura 28: Voltamogramas cíclicos para os pares: (A) [Fe(CN)6]4−/ 3−, (B) [Ru(NH3)6]2+/3+ e
(C) [Fe(H2O)6]2+/3+ 1 mmol dm−3 em KCl 0,1 mol dm−3 em diferentes velocidades de varredura:
0,075 – 0,145 V s-1 com intervalos de 0,010V s-1, WE: BDDE..................................................88
Figura 29: Parâmetro ψ vs. υ−1/2 para os pares: (A) [Fe(CN)6]4−/ 3−, (B) [Ru(NH3)6]2+/3+. Foram
utilizadas as velocidades de varredura da Figura 28...................................................................90
Figura 30: Circuito equivalente de Randles..............................................................................91
Figura 31: Circuito utilizado para considerar os efeitos de adsorção........................................91
Figura 32: Gráficos de Nyquist obtidos para os pares (A) [Fe(CN)6]4−/3−, OCP = 0,245 V; (B)
[Ru(NH3)6]2+/3+, OCP = −0,137 V e (C) [Fe(H2O)6]2+/3+, OCP = 0,465 V. A frequência foi
variada pelo intervalo 0,01-100.000 Hz. WE: BDDE................................................................92
Figura 33: Amperogramas obtidos por BIA-MPA para o par [Fe(CN)6]4−/3− 1,0 mmol dm−3 em
KCl 0,1 mol dm−3. Distância aproximada da ponteira com relação à superfície do eletrodo: ≈
2,0 mm. Vazão igual a ≈ 85 μL s−1, volume de injeção igual a 100 μL e T ≈ 25 °C. WE:
BDDE........................................................................................................................................93
Figura 34: Em (A) célula “wall jet” convencional e em (B) célula utilizada neste trabalho......94
Figura 35: Relação entre log | I | e E para as correntes da Figura 30 amostradas em ≈ 150 s
após a injeção.............................................................................................................................94
Figura 36: Amperogramas obtidos por BIA-MPA para os pares: (A) [Ru(NH3)6]2+/3+ e (B)
[Fe(H2O)6]2+/3+, 1,0 mmol dm−3 em KCl 0,1 mol dm−3. Condições experimentais iguais às da
Figura 33. WE: BDDE...............................................................................................................96
Figura 37: Relação entre log | I | e E para as correntes da Figura 36, (A) [Ru(NH3)6]2+/3+ e (B)
[Fe(H2O)6]2+/3+, 1,0 mmol dm−3 em KCl 0,1 mol dm−3, amostradas em ≈ 150 s após a
injeção.......................................................................................................................................97
Figura 38: (A) Amperogramas obtidos por BIA-MPA para o par [Fe(H2O)6]2+/3+, 1,0 mmol
dm−3 em KCl 0,1 mol dm−3, em | η | > 100 mV. (B) Relação entre log | I | e E para correntes
amostradas em ≈ 150 s após a injeção. WE: BDDE.................................................................100
Figura 39: (A) Amperogramas obtidos por BIA-MPA para o par [Fe(H2O)6]2+/3+, 1,0 mmol
dm−3 em KCl 0,1 mol dm−3, em | η | > 100 mV e agitando a solução. (B) Relação entre log | I |
e E utilizando as correntes de pico. Potenciais iguais aos mostradas na Figura 38. WE:
BDDE......................................................................................................................................102
Figura 40: Correntes de pico em função do volume de injeção. Potenciais iguais aos da Figura
38. Vazão igual a ≈ 85 μL s−1...................................................................................................103
Figura 41: Correntes de pico em função da vazão. Potenciais iguais aos da Figura 38. Volume
de injeção igual a 300 μL.........................................................................................................103
Figura 42: Amperogramas (A) e relação log | I | vs. E (B) obtidos por BIA-MPA para o par
[Fe(H2O)6]2+/3+, 1,0 mmol dm−3 em KCl 0,1 mol dm−3, em condições ótimas sob agitação. WE:
BDDE......................................................................................................................................104
Figura 43: (A) Amperogramas obtidos por BIA-MPA para o par [Fe(CN)6]4−/3−, 1,0 mmol dm−3
em KCl 0,1 mol dm−3, em | η | ≤ 5mV. (B) Relação entre I e E para correntes amostradas em ≈
150 s após a injeção. Vazão igual a ≈ 85 μL s−1........................................................................105
Figura 44: Comportamento das correntes em função do volume de injeção mantendo a vazão
fixa (≈ 85 μL s−1) (A) e da vazão (B) mantendo o volume de injeção fixo (600 μL) .................107
Figura 45: (A) Perfil de corrente para o par [Fe(CN)6]4−/3−, 1,0 mmol dm−3 em KCl 0,1 mol
dm−3, | η | ≤ 5mV, sob agitação. Volume de injeção igual a 600 μL e vazão igual a ≈ 163 μL s−1.
(B) Relação I-E........................................................................................................................108
Figura 46: ErroJ(%) para as estratégias de simulação 1 (quadrados) e 2 (triângulos) em função
de dR.........................................................................................................................................113
Figura 47: Erros, para diferentes tempos de amostragem de corrente, em função de h.
Parâmetros fixos da simulação: K0 = 200, h = 1,0 × 10−5, Δτ = 1×10−10, ω = 1,01, α = 0,5, dR =
1 e | θ | = 0,195.........................................................................................................................114
Figura 48: Correntes exatas (linha) e simuladas (pontos) para os casos: Apenas O em solução
e θ = −0,195 (i); O e R em solução e θ = −0,195 (ii); O e R em solução e θ = 0,195 (iii). h = 1
× 10−6 e demais parâmetros fixos da simulação iguais aos da Figura 47. Para as correntes
simuladas foram omitidos 1500 pontos entre os mostrados.....................................................114
Figura 49: Cronoamperogramas de pulso-duplo simulados em condições de baixo
sobrepotencial (| θ | = 0,195) em função de K0. Parâmetros da simulação iguais aos da Figura
47, exceto para K0....................................................................................................................117
Figura 50: Erros no cálculo de K0 a partir da equação 5.3.1.17 em função de K0 e para diferentes
tempos de amostragem de corrente. Parâmetros da simulação iguais aos da Figura 49............118
Figura 51: Em (A): cronoamperogramas obtidos por simulação com K0 = 10 e variando αc de
0,1 a 0,9. Em (B): comparação entre os erros para cálculo de K0 via equação (5.3.1.17)
(triângulos), equação (5.3.16) utilizando corrente anódica (círculos), ou corrente catódica
(quadrados). Os demais parâmetros da simulação foram iguais aos da Figura 49....................122
Figura 52: Cronoamperogramas obtidos por simulação com K0 = 10 e variando dR. Os demais
parâmetros da simulação foram iguais aos da Figura 47..........................................................124
Figura 53: Erros no cálculo de K0 a partir da equação 5.3.1.17, em função de dB, utilizando as
correntes da Figura 52..............................................................................................................124
Figura 54: Voltamograma cíclico para o par [Fe(CN)6]4−/3− 0,01 mol dm−3 em KCl 1 mol dm−3
no OGCE. A figura inserida mostra o perfil de corrente observado para apenas o eletrólito.
Velocidade de varredura igual a 50 mV s−1 e T ≈ 25 °C............................................................125
Figura 55: Corrente capacitiva observada para KCl 1,0 mol dm−3 em OGCE. Potenciais
aplicados: 250 – 255 – 245 mV. Respectivos tempos de aplicação: 100 – 6 – 6 ms..................126
Figura 56: Cronoamperogramas observados na presença do par [Fe(CN)6]4−/3− 0,01 mol dm−3
em KCl 1,0 mol dm−3. Potenciais aplicados como descrito na Figura 55.................................127
Figura 57: Voltamogramas cíclicos (segundo ciclo) utilizando GCE (preto) ou o OGCE
(vermelho) para: (A) Fe(CN)6 3−/4− (0.03 mol dm−3 + 3.0 mol dm−3 NaCl); (B) Fe(H2O)6
3+/2+
(0.03 mol dm−3 + 3.0 mol dm−3 NaCl); (C) Complexo de ferro e DMSO (0.03 mol dm−3 Fe3+/2+
+ 0.24 mol dm−3 DMSO + 3.0 mol dm−3 KCl); (D) Complexo de ferro e glicerol (0.03 mol dm−3
Fe3+/2+ + 0.24 mol dm−3 Glicerol + 3.0 mol dm−3 KCl). Velocidade de varredura igual a 0.05 V
s1 e T = 24 2C.....................................................................................................................128
Figura 58: Corrente capacitiva observada por DPC em GCE (preto) ou OGCE (vermelho).
Tempo máximo de cada pulso igual a 5 ms, T = 24 2C........................................................129
Figura 59: Cronoamperogramas de pulso-duplo obtidos em GCE (preto) e OGCE (vermelho)
para as mesmas espécies da Figura 54, exceto Fe(CN)6 3−/4− em GCE. Tempo máximo de cada
pulso igual a 5 ms, T = 24 2C...............................................................................................130
Figura 60: Gráficos de Nyquist obtidos em GCE (preto) e OGCE (vermelho) para as mesmas
espécies da Figura 57. T = 24 2C.........................................................................................131
Figura 61: Razão B, dada pela equação (5.2.3.7), em diferentes valores de αc em função de
θ...............................................................................................................................................135
Figura 62: Razão entre αc calculado e o valor utilizado nas simulações para diferentes tempos
de amostragem de corrente mantendo K0 = 10 (A); e para diferentes valores de K0 mantendo τ
= 2 × 10−6 (B). Parâmetros fixos das simulações: h = 1,0 × 10−6, Δτ = 1×10−10, ω = 1,01, dR = 1
e | θ | = 0,195............................................................................................................................136
Figura 63: Razão entre αc calculado e o valor utilizado nas simulações para diferentes tempos
de amostragem de corrente mantendo K0 = 10 (A); e para diferentes valores de K0 mantendo τ
= 2 × 10−6 (B). Parâmetros fixos das simulações: h = 1,0 × 10−6, Δτ = 1×10−10, ω = 1,01, dR = 1
e | θ | = 0,195. Neste caso, inicia-se pela redução.....................................................................138
Figura 64: Erro (%) para αc (pontos preenchidos) e αa (pontos sem preenchimento) médios em
diferentes tempos de amostragem de corrente mantendo K0 = 10 (A); e para diferentes valores
de K0 mantendo τ = 2 × 10−6 (B). Parâmetros fixos das simulações: h = 1,0 × 10−6, Δτ = 1×10−10,
ω = 1,01, dR = 1 e | θ | = 0,195...................................................................................................139
Figura 65: Erro (%) para αc (pontos preenchidos) e αa (pontos sem preenchimento) médios em
função de dB mantendo K0 = 10 e τ = 2 × 10−6. Parâmetros fixos das simulações: h = 1,0 × 10−6,
Δτ = 1×10−10, ω = 1,01 e | θ | = 0,195........................................................................................141
Figura 66: Cronoamperogramas de pulso-duplo obtidos em GCE, oxidação seguida de redução
(verde) e redução seguida de oxidação (azul), para: (A) Fe(H2O)6 3+/2+; (B) Fe3+/2+ e DMSO e
(C) Fe3+/2+ e glicerol. Tempo máximo de cada pulso igual a 5 ms, T = 24 2C.................... 142
Figura 67: Cronoamperogramas de pulso-duplo obtidos em OGCE, oxidação seguida de
redução (verde) e redução seguida de oxidação (azul), para: (A) Fe(CN)6 3−/4−; (B) Fe(H2O)6
3+/2+;
(C) Fe3+/2+ e DMSO e (D) Fe3+/2+ e glicerol. Tempo máximo de cada pulso igual a 5 ms, T = 24
2C.......................................................................................................................................143
Tabela 1: Impedância dos elementos de circuito: resistor, capacitor e indutor..........................60
Tabela 2. Valores dos parâmetros cinéticos obtidos por BIA-MPA para os diferentes pares
redox..........................................................................................................................................98
Tabela 3: Valores k0 dos pares [Fe(CN)6]4−/3−, [Ru(NH3)6]2+/3+ e [Fe(H2O)6]2+/3+, em BDDE,
calculados por diferentes técnicas e mostrados na literatura......................................................99
Tabela 4: ErroK (%) para diferentes valores de K0. Dois potenciais adimensionais foram
aplicados, 0,195 seguido de – 0,195, utilizando diferentes tempos de amostragem. Os
parâmetros fixos da simulação foram: Δτ = 1×10−10, h = 1×10−6, ω = 1,01, dB = 1, CA *
= CB * =
1 e α = 0,5.................................................................................................................................119
Tabela 5: ErroK (%) para diferentes valores de K0. Dois potenciais adimensionais foram
aplicados, 0,117 seguido de – 0,117, utilizando diferentes tempos de amostragem. Os
parâmetros fixos da simulação foram: Δτ = 1×10−10, h = 1×10−6, ω = 1,01, dB = 1, CA *
= CB * =
1 e α = 0,5.................................................................................................................................120
Tabela 6: ErroK (%) para diferentes valores de K0. Dois potenciais adimensionais foram
aplicados, 0,039 seguido de – 0,039, utilizando diferentes tempos de amostragem. Os
parâmetros fixos da simulação foram: Δτ = 1×10−10, h = 1×10−6, ω = 1,01, dB = 1, CA *
= CB * =
1 e α = 0,5.................................................................................................................................121
Tabela 7: Valores máximos de k0 que podem ser determinados por DPC para os pares redox
utilizados considerando t = 5ms...............................................................................................131
Tabela 9: Valores aproximados de αc calculados para diferentes pares redox.........................137
Tabela 10: Valores de k0 e αc determinados por DPC utilizando os resultados das Figuras 66 e
67.............................................................................................................................................143
BIA – Análises por injeção em batelada.
CNLS – Método dos mínimos quadrados complexos não-lineares.
CV – Voltametria Cíclica.
FIA – Análise por injeção em fluxo.
GCE – Eletrodo de carbono vítreo oxidado.
GCE – Eletrodo de carbono vítreo.
MDF – Método das diferenças finitas.
MPA – Amperometria de múltiplos pulsos.
OCP – Potencial de circuito aberto.
RE – Eletrodo de referência.
WE – Eletrodo de trabalho.
LISTA DE SÍMBOLOS PRINCIPAIS
Símbolo Significado Unidade usual ∗ Concentração de bulk das espécies oxidadas mol cm−3 ∗ Concentração de bulk das espécies reduzidas mol cm−3 Fasor de potencial V Fasor de corrente A 0 Constante de velocidade heterogênea padrão da reação
inversa cm s−1
direta cm s−1
A (a) Área do eletrodo
(b) Fator pré-exponencial
C (a) Capacitância
(b) Concentração adimensional
C* Concentração de bulk adimensional nenhuma
Cdl Capacitância da dupla camada elétrica F
Ci Concentração adimensional do i-ésimo ponto do espaço nenhuma
Ci k
do k-ésimo ponto do tempo nenhuma
Cj Concentração adimensional da espécie j nenhuma
cO Concentração das espécies oxidadas mol cm−3
CO Concentração adimensional da espécie O nenhuma
CO* Concentração de bulk adimensional da espécie O nenhuma
cO,0 Concentração de superfície das espécies oxidadas mol cm−3
cR Concentração das espécies reduzidas mol cm−3
CR Concentração adimensional da espécie R nenhuma
Símbolo Significado Unidade usual
cR,0 Concentração de superfície das espécies reduzidas mol cm−3
D Coeficiente de difusão cm2 s−1
dj Coeficiente de difusão adimensional da espécie j nenhuma
DO Coeficiente de difusão das espécies oxidadas cm2 s−1
dO Coeficiente de difusão adimensional da espécie O nenhuma
DR Coeficiente de difusão das espécies reduzidas cm2 s−1
dR Coeficiente de difusão adimensional da espécie R nenhuma
E Potencial V
Eeq Potencial de equilíbrio V
Ep,a Potencial de pico anódico V
Ep,c Potencial de pico catódico V
F Constante de Faraday C mol−1
f Frequência Hz
I Corrente A
J (a) Fluxo
(b) Corrente adimensional
nenhuma
k Constante de velocidade dependente da
ordem
k0 Constante de velocidade heterogênea padrão cm s−1
K0 Constante de velocidade heterogênea padrão
adimensional nenhuma
K0 calc
Símbolo Significado Unidade usual
kb Constante de velocidade heterogênea da reação inversa cm s−1
kf Constante de velocidade heterogênea da reação direta cm s−1
L Indutância H
n* Número de elétrons da etapa determinante da velocidade nenhuma
nO Número de mols da espécie oxidada mol
nR Número de mols da espécie reduzida mol
O Espécie(s) oxidada(s) nenhuma
C
nenhuma
Qdl Elemento de fase constante para dupla camada elétrica nenhuma
R Espécie(s) reduzida(s) nenhuma
(b) Resistência
Ω
RCT Resistência à transferência de carga Ω
Rs Resistência da solução Ω
t Tempo s
T (a) Temperatura
K
W1/2 Meia largura de meia altura em SWV V
x Distância com relação à superfície do eletrodo cm
X Distância adimensional nenhuma
Z Impedância Ω
α (a) Coeficiente de transferência de carga
(b) Primeiro coeficiente de Thomas
nenhuma
nenhuma
por DPC nenhuma
αc Coeficiente de transferência de carga catódico nenhuma
αc calc Coeficiente de transferência de carga catódico calculado
por DPC nenhuma
(b) Segundo coeficiente de Thomas
nenhuma
nenhuma
γ
(b) Raiz quadrada da razão entre os coeficientes de
difusão (DR/DO)
δ (a) Comprimento da camada de difusão
(b) Quarto coeficiente de Thomas
cm
nenhuma
V
V Variação de potencial de pico V Degrau de potencial V 0‡ Variação de energia livre de Gibbs de ativação J mol−1 a0‡ Variação de energia livre de Gibbs de ativação anódica J mol−1 c0‡ Variação de energia livre de Gibbs de ativação catódica J mol−1 0‡ Variação de entalpia padrão de ativação J mol−1
ΔJ Variação de corrente adimensional nenhuma 0‡ Variação de entropia padrão de ativação J K−1 mol−1
η Sobrepotencial V
νb Velocidade da reação inversa mol s−1 cm−2
νf Velocidade da reação direta mol s−1 cm−2
τ Tempo adimensional nenhuma
Ângulo de fase rad
Símbolo Significado Unidade usual
3.2.1 A camada de difusão ...................................................................................................... 49
3.3 Obtenção de parâmetros cinéticos por meio de técnicas convencionais ..................... 50
3.3.1 Cronoamperometria ....................................................................................................... 52
3.4 Análise por Injeção em Batelada (BIA) ......................................................................... 67
3.4.1 Análises por BIA aplicando a técnica MPA ................................................................. 69
3.5 Simulação por meio de diferenças finitas ...................................................................... 71
3.6 Cronoamperometria em tempos curtos ......................................................................... 81
4. Materiais e Métodos .......................................................................................................... 83
4.1 Reagentes e Soluções ....................................................................................................... 83
4.2 Aparatos ........................................................................................................................... 83
4.3 Metodologia ...................................................................................................................... 86
5.1 Análises por CV e EIS ..................................................................................................... 87
5.2 Análises por BIA-MPA ................................................................................................... 92
5.3 Análises em tempos curtos e baixos sobrepotenciais .................................................. 110
5.3.1 Determinação de k0 ...................................................................................................... 110
5.3.2 Determinação de α ....................................................................................................... 133
5.3.3 Metodologia para determinação de k0 e α .................................................................. 144
6. Conclusões e Perspectivas ............................................................................................... 147
7. Trabalhos publicados referentes à Tese ........................................................................ 149
8. Outros trabalhos publicados durante o doutorado ...................................................... 151
8.1 Trabalhos publicados em anais de eventos .................................................................. 151
8.2 Artigos publicados.......................................................................................................... 151
9. Referências ........................................................................................................................ 153
Apêndice A – Script do programa escrito no SCILAB para simulação da
cronoamperometria. ............................................................................................................ 161
1 Introdução
Em qualquer reação química de interesse busca-se conhecer quais os parâmetros
termodinâmicos determinam se esta irá ocorrer espontaneamente ou não, bem como quais os
parâmetros cinéticos controlam sua velocidade. O mecanismo mais simples para descrever uma
reação química reversível consiste em duas etapas elementares de sentidos contrários
envolvendo um reagente e um produto. Se a reação for eletroquímica, tanto a velocidade da
reação elementar no sentido direto, quanto no inverso dependem do potencial aplicado no
eletrodo onde há transferência eletrônica (1 elétron para reações simples). No estado de
equilíbrio há ausência de corrente líquida e os potenciais seguem a equação de Nernst (1904).
Em condições diferentes do equilíbrio, a corrente líquida observada é uma função do potencial
aplicado. Sendo assim, a partir de observações experimentais, Tafel demonstrou, em 1905,
como a corrente está relacionada ao sobrepotencial (Equação 1).
= + log | | (1.1)
onde “a” e “b” são constantes se a temperatura for constante, η é o sobrepotencial (V) e I é a
corrente (A).
Esta equação empírica de Tafel se aplica a sistemas de baixa corrente com
transporte de massa eficiente. O modelo cinético que primeiro descreveu os sistemas
eletroquímicos permitindo deduzir as equações de Nernst e de Tafel foi o modelo
fenomenológico de Butler-Volmer-Erdey-Gruz. Tal modelo tem tido sucesso em equacionar a
velocidade da reação em termos de dois parâmetros cinéticos, além do parâmetro
termodinâmico potencial padrão (E0), os quais são: a constante padrão heterogênea de
velocidade (k0) e o coeficiente de transferência de carga (α) (Equação 2). Enquanto k0 é uma
medida da velocidade da reação, α permite avaliar qual dos processos eletroquímicos
(oxidação/redução) é mais sensível à variação de potencial.
= 0[(−0)/ − −(−0)/] (1.2)
onde F é a constante de Faraday (96485 C mol−1), αa é o coeficiente de transferência de carga
anódico, αc é o coeficiente de transferência de carga catódico, R é a constante dos gases (8,314
32
J K−1 mol−1), T é a temperatura (K), e c representa as concentrações de superfície das espécies
reduzidas (R) e oxidadas (O). Os significados dos demais parâmetros foram supracitados.
A partir desse modelo estabelecido, diversas metodologias tem sido desenvolvidas
a fim de possibilitar a determinação desses parâmetros cinéticos (k0 e α). Técnicas
eletroquímicas comuns utilizadas para este fim são: cronoamperometria, voltametria cíclica,
voltametria hidrodinâmica utilizando eletrodo de disco rotatório, espectroscopia de impedância
eletroquímica, entre outras. Contudo, para o mesmo modelo cinético e técnica eletroquímica,
tem-se diferentes metodologias dependendo do transporte de massa do sistema e do regime
cinético que se pretende avaliar, geralmente dividido em cinética reversível, quase-reversível e
irreversível. Duas estratégias são comumente empregadas para obtenção de α e k0: (i) fazer com
que no sistema o transporte de massa seja muito mais rápido do que a velocidade da reação,
permitindo considerar ausência dos efeitos de transporte de massa; (ii) descrever
matematicamente o transporte de massa envolvido e avaliar sua consequência sobre o sistema
nos diversos regimes cinéticos. Uma terceira estratégia é realizar as duas anteriores em
conjunto. Os casos limite, cinética reversível ou irreversível, são mais facilmente analisados,
enquanto que a cinética quase-reversível pode demandar um tratamento mais complexo.
De forma geral, a determinação de α e k0, utilizando diferentes técnicas
eletroquímicas e metodologias, envolve um grande número de medições de corrente, regressões
lineares, ajustes entre curvas experimentais e teóricas, condições experimentais ou
equipamentos específicos. Portanto, dependendo do sistema estudado e da metodologia
aplicada, as medidas experimentais podem ser lentas, sendo um grande obstáculo caso a
superfície do eletrodo seja instável com o tempo; e de alto custo, necessitando de equipamentos
específicos como motores e controladores para eletrodos rotatórios ou módulos para análise de
frequência em estudos de impedância.
Uma das mais importantes aplicações desses estudos utilizando reações simples
(transferência de 1 elétron) e os seus respectivos parâmetros termodinâmicos e cinéticos (E0, k0
e α) é caracterizar materiais aplicados em estudos eletroquímicos, como no desenvolvimento
de sensores eletroanalíticos. Contudo, em muitos casos, as reações comumente utilizadas não
são simples. Isto significa uma dependência não apenas com relação ao material (reações de
esfera externa), mas também com a composição química de sua superfície (reações de esfera
interna). Esta informação tem colocado em dúvida a utilização de reações eletroquímicas
comuns como a que diz respeito ao par [Fe(CN)6]4−/3−, mostrada a seguir, para fins de
caracterização de materiais.
[Fe(CN)6]4− [Fe(CN)6]3− + −
Por outro lado, as fortes interação e dependência, com relação à composição
química da superfície do eletrodo, têm possibilitado o desenvolvimento de pesquisas que visam
seu monitoramento. Sendo assim, estudos de superfície têm sido desenvolvidos baseados na
variação de velocidade observada para reações eletroquímicas comuns em função da
composição de superfície (ALESHAHEM et al. 1995; GRANGER et. al. 2000; TEÓFILO et
al. 2007; CHEN, MCCREERY, 1996; CHEN, SWAIN, 1998; RANGANATHAN, KUO,
MCCREERY, 1999). Tal dependência também tem sido explorada na construção de
biossensores (MASHHADIZADEH, TALEMI, 2016; AFKHAMI et al., 2017; NGUY et al.,
2017; MILLS et al., 2018).
Todavia, ao utilizar reações de esfera interna, isto é, sendo a velocidade da reação
significativamente dependente da composição de superfície, o tempo de análise, bem como a
intensidade das medidas realizadas, podem ser obstáculos nesses estudos. Isto porque a variação
observada nos parâmetros cinéticos pode ter contribuição do próprio processo de medição.
Considerando o contexto descrito acima para avaliar os parâmetros cinéticos de
reações eletroquímicas e caracterizar superfícies de materiais, este trabalho busca empregar
duas novas estratégias simples e rápidas para avaliar os parâmetros cinéticos de reações
eletroquímicas e caracterizar superfícies de materiais. Na primeira, a proposta é avaliar a
possibilidade de utilizar o sistema por injeção em batelada (BIA) em conjunto com a técnica de
amperometria de múltiplo pulsos (MPA, do inglês “multiple pulse amperometry”) para
determinar α e k0. A escolha do sistema BIA-MPA se justifica pela sua versatilidade e rapidez
para análises eletroquímicas, o qual tem sido aplicado com sucesso para finalidades
eletroanalíticas como na determinação sensível e seletiva de um ou mais compostos
simultaneamente em diversas amostras (SANTOS et al., 2011; PEREIRA, et al., 2013;
FREITAS et al., 2016), bem como no uso de padrão interno promovendo a precisão e exatidão
das determinações analíticas (GIMENES et al., 2012). Além disso, em análises por BIA-MPA,
pequenos volumes de soluções contendo as espécies eletroativas são utilizados, gerando baixo
consumo de reagentes. Na segunda, a proposta é avaliar a possibilidade de determinar α e k0 em
sistemas com controle de massa difusional (difusão linear) em intervalos de tempo nos quais a
influência da difusão possa ser assumida como não significante.
Dessa forma, as novas abordagens apresentadas neste trabalho para calcular
parâmetros cinéticos são alternativas atrativas para estudos de eletroquímica. Neste sentido,
tendo o sistema eletroquímico alvo em mente, pode-se escolher a metodologia que melhor se
34
encaixa aos estudos cinéticos, considerando tanto as características teóricas, como o regime
cinético que será estudado e a dependência com a superfície do eletrodo; quanto as
experimentais, como os equipamentos disponíveis e adequados (custo, miniaturização) para as
análises.
35
Objetivo geral: desenvolver metodologias simples, de baixo custo e eficientes para
análise de parâmetros cinéticos de reações eletroquímicas simples.
Objetivos específicos:
Avaliar a corrente obtida utilizando o sistema BIA para diferentes pares redox.
Calcular parâmetros cinéticos a partir dos valores de corrente obtidos por BIA e
compará-los com os calculados por outras técnicas e com valores mostrados na
literatura.
massa apenas difusional e utilizando macroeletrodos (difusão planar);
Avaliar o intervalo de tempo para o qual, de acordo com as simulações, a
influência do transporte de massa não é significante para a corrente;
Verificar, experimentalmente, as limitações impostas pela corrente capacitiva;
Comprovar os resultados observados nas simulações por meio de experimentos
e dados da literatura.
O desenvolvimento teórico realizado nesta seção pode ser observado, totalmente ou
parcialmente, em livros-texto de eletroquímica (BRETT, BRETT, 1993; BARD, FAULKNER,
2001; BOCKRIS, REDDY, GAMBOA-ALDECO, 2002; ZANELLO, 2003;
SOUTHAMPTON ELECTROCHEMISTRY GROUP, 2011). Contudo, sendo fundamental,
ele será discutido em uma breve revisão. Para desenvolvimento das equações básicas considera-
se uma reação eletroquímica simples, isto é, de etapa única (elementar) e esfera externa. As
reações eletroquímicas elementares ocorrem com a transferência de um elétron (BARD,
FAULKNER, 2001). Um processo eletródico de esfera externa ocorre de forma que as
interações entre reagente e superfície do eletrodo são negligenciáveis (BARD, FAULKNER,
2001; ZANELLO, 2003). Na reação de oxidação abaixo, “R” é a espécie reduzida, “O” é a
espécie oxidada e “e-” representa os elétrons transferidos para o eletrodo.
R O + e−
onde o subscrito “f” significa direto (do inglês “forward”) e o subscrito “b” significa contrário
(do inglês “backward”), “k” representa a constante de velocidade (cm s-1).
A velocidade da reação (por unidade de área) pode ser escrita como:
= − 1 = 1 = 1− (3.1.1)
onde “v” é a velocidade da reação (mol s−1 cm−2), “dn/dt” é a variação do número de mols das
espécies (mol s-1) e “A” é a área da superfície na qual ocorre a transferência de elétrons.
De acordo com a lei de Faraday
= − × (3.1.2)
= 1(/) = 1 = (3.1.3)
onde “I” é a corrente (em amperes, A) e “F” é a constante de Faraday (96485 C mol-1).
A velocidade descrita até então diz respeito ao resultado, ao líquido, dos dois
processos observados para a reação, o processo direto (oxidação) menos o processo contrário
(redução). As velocidades envolvidas podem ser equacionadas como:
= = (3.1.4)
onde “c” representa a concentração das espécies na superfície do eletrodo (mol cm-3).
Então:
= ( − ) (3.1.5)
Até este ponto observa-se a dependência da corrente com relação à área do eletrodo,
às concentrações das espécies envolvidas e à cinética da reação representada pelas constantes
de velocidade. Contudo, experimentalmente, observa-se dependência entre corrente e o
potencial (na verdade diferença de potencial) aplicado na célula eletroquímica. Para obter uma
relação que envolva o potencial é preciso avaliar a constante de velocidade. Para tanto, recorre-
se a uma equação empírica, a equação de Arrhenius:
= −/ (3.1.6)
onde “Ea” é a energia de ativação (J mol−1), neste caso “A” é um fator pré-exponencial (cujas
unidades dependem da ordem da reação, neste caso cm s−1), “R” é a constante dos gases (8,314
J K−1 mol−1) e “T” é a temperatura (K).
39
De forma geral considera-se a energia de ativação como a variação de entalpia
padrão de ativação (0‡, J mol−1) que, por sua vez, é igual à soma entre a variação de energia
livre padrão de ativação (0‡, J mol−1) e o produto da temperatura pela variação de entropia
padrão de ativação (0‡, J K−1 mol−1) (BRETT, BRETT, 1993; BARD, FAULKNER, 2001):
≈ 0‡ = 0‡ + 0‡ ⇒ = −(0‡+0‡)/ = −0‡/−0‡/ ⇒ = ′−0‡ (3.1.7)
onde A’ é o fator modificado pelo termo exponencial que contém a variação de entropia padrão
de ativação dividida pela constante dos gases.
Contudo, é de interesse conhecer esta relação numa condição diferente da condição
padrão. Neste sentido, avalia-se a consequência de uma variação de potencial aplicado sobre as
curvas de energia livre (G) em função do progresso da reação eletroquímica. Assume-se que G
possua perfis parabólicos como os mostrados na Figura 1 à esquerda (BRETT, BRETT, 1993).
Além disso, considera-se que tais barreiras de energia são observadas quando o potencial
aplicado ao eletrodo é E0 (potencial padrão). Na figura 1 à direita, que é uma visão das energias
numa região mais próxima ao estado de transição é possível observar a variação de energia livre
padrão de ativação anódica (a0‡) e a catódica (c0‡). Alterando o potencial aplicado
modifica-se as curvas de energia. Duas possibilidades são mostradas na Figura 2, em (A) o
potencial do eletrodo torna-se mais positivo favorecendo a oxidação, em (B) o potencial do
eletrodo torna-se mais negativo favorecendo a redução. Qualquer uma destas duas situações
pode ser escolhida para continuar este desenvolvimento. As discussões continuarão tomando o
caso (A), ou seja, aplicando E de forma que E > E0. Para tanto observa-se uma região ainda mais
próxima do estado de transição, na qual as curvas de energia livre são aproximadas para retas
(BOCKRIS, REDDY, GAMBOA-ALDECO, 2002) (Figura 3 B).
De acordo com a Figura 3, percebe-se que fazendo o potencial aplicado no eletrodo
mais positivo, a variação de energia livre de ativação anódica (a‡) diminui. Logo, oxidar
nestas condições demanda vencer uma barreira menor de energia. Analisando uma região mais
próxima ao máximo (Figura 3 B), percebe-se que tal diminuição é igual a uma fração da
diferença entre a energia livre, se o potencial for E0, com relação à energia livre se o potencial
for E.
40
Figura 1: Perfis de energia livre em função do progresso da reação: R O + e−. À direita mostra-se uma região mais próxima ao estado de transição.
Fonte: Autor.
Figura 2: Efeito da mudança no potencial aplicado com relação às energias livres. Em (A) torna-se o potencial mais positivo e em (B) torna-se o potencial mais negativo.
Fonte: Autor.
Figura 3: Alterações das energias livres se E > E0. Em (B) mostra-se uma região próxima ao estado de transição de forma que as curvas são consideradas como retas.
Fonte: Autor.
41
A variação de energia livre G causada pela mudança de potencial E pode ser
entendida como o negativo do trabalho de não expansão máximo, que neste caso é elétrico:
= − = −( − 0) (3.1.8)
Para representar apenas uma fração desta quantidade utiliza-se o símbolo “α” ou
“β”. A partir deste comentário será utilizado “αa” (coeficiente de transferência anódico) para
representar a alteração no valor de a0‡ e “αc” (coeficiente de transferência catódico) para
representar a alteração no valor de c0‡, ambas causadas por E. Sendo assim, é possível
escrever (veja figura 3):
Com relação ao termo catódico:
0‡ − ( − 0) = ‡ − ( − 0) ⇒ ‡ = 0‡ + (1 − )( − 0) (3.1.10)
Como αa + αc = 1:
‡ = 0‡ + ( − 0) (3.1.11)
As equações (3.1.9) e (3.1.11) são coerentes com o fato que se E − E0 > 0 há uma
diminuição em a0‡, aumentando a tendência à oxidação. Por outro lado, se E − E0 < 0 há uma
diminuição em Gc0‡, aumentando a tendência à redução.
A partir das equações desenvolvidas é possível escrever as constantes de velocidade
em função do potencial aplicado. Substituindo (3.1.9) e (3.1.11) em (3.1.7) fora do estado
padrão:
= ′ −[(0‡−(−0) ]/ = ′ −0‡/(−0)/ (3.1.12) = ′ −[(0‡+(−0) ]/ = ′ −0‡/−(−0)/ (3.1.13)
42
Os fatores independentes do potencial presentes nas equações (3.1.12) e (3.1.13)
podem ser reduzidos a 0 (reação direta) e a 0 (reação contrária). Na ausência de corrente
líquida se estabelece um equilíbrio na interface eletrodo-solução permitindo a aplicação da
equação de Nernst (SOUTHAMPTON ELECTROCHEMISTRY GROUP, 2001), nestas
condições:
= 0 + ln () ⇒ = 0 ⇒ = 0 = 0;
Se, além de cO = cR, I = 0:
( − ) = 0 ⇒ = = 0 = 0 = 0 (3.1.14)
Então:
Substituindo (3.1.15) e (3.1.16) em (3.1.5):
= 0[(−0)/ − −(−0)/] (3.1.17)
Este desenvolvimento considera a corrente de oxidação como sendo positiva. Como
consequência, a equação (3.1.17) é o negativo da equação comumente encontrada em alguns
dos livros sobre eletroquímica, nos quais, por convenção, considera-se a corrente de redução
como positiva (BRETT, BRETT, 1993; BARD, FAULKNER, 2001; ZANELLO, 2003).
Nas exponenciais da equação (3.1.17) tem-se a diferença entre o potencial aplicado
e o potencial padrão. Uma expressão semelhante pode ser obtida com relação ao potencial de
equilíbrio. Como mencionado anteriormente, no equilíbrio não há corrente líquida, isto é,
corrente catódica e anódica apresentam mesmo módulo e as concentrações são constantes.
Define-se a corrente de troca I0:
43
= 0∗(−0)/ = − = 0∗−(−0)/ = 0 (3.1.18)
onde Eeq (V) é o potencial de equilíbrio, I0 (A) é a corrente de troca, e c* representa as
concentrações das espécies em regiões da solução distantes do eletrodo (“bulk
concentrations”).
Portanto:
Substituindo (3.1.19) em (3.1.17):
onde η = E – Eequi (V).
Sendo c = c*, tem-se a equação de Butler-Volmer:
= 0(/ − −/) (3.1.21)
Em 1905 Tafel apresentou uma relação empírica entre corrente e sobrepotencial
(BARD, FAULKNER, 2001; BOCKRIS, REDDY, GAMBOA-ALDECO, 2002; PETRII et al.,
2007):
= + log | | (3.1.22)
onde “a” e “b” são constantes se a temperatura for constante.
A cinética de Butler-Volmer permite avaliar as constantes “a” e “b”. Para a
aplicação de um sobrepotencial intenso o suficiente, apenas um dos processos, redução ou
oxidação, se torna significativo. Por exemplo, se E >> Eeq:
= 0/ ⇒ ln = ln 0 + ⇒
44
= − ln 0 + ln (3.1.23)
Geralmente, os parâmetros cinéticos αa, αc, e I0 são obtidos plotando-se log I vs. η
(Figura 4).
Figura 4: Determinação experimental de parâmetros cinéticos utilizando curvas de Tafel.
Fonte: Autor.
No desenvolvimento teórico anterior não foram considerados os efeitos de força
iônica sobre as concentrações e utilizou-se o potencial padrão (0) nas equações. A fim de
incluir estes efeitos, 0 será substituído pelo potencial formal 0′: 0′ = 0 + ln () (3.1.23)
onde e representam os coeficientes de atividade das espécies O e R, respectivamente.
3.2. Transporte de Massa
Se uma corrente líquida flui através do eletrodo, a reação eletroquímica modifica
as concentrações das espécies envolvidas em sua superfície. Contudo, a alteração da
45
concentração depende, além da velocidade da reação eletroquímica, dos fenômenos de
transporte de massa que ocorrem na solução. Há três possibilidades: migração, difusão e
convecção. Estes três modos determinam o fluxo ( , mol cm−2 s−1 ) , isto é, a quantidade de
espécies (mol) que atravessa uma determinada área (cm2) em um determinado intervalo de
tempo (s).
A migração consiste no movimento de cargas devido a um gradiente de potencial
(que é o negativo do campo elétrico). A figura 5 representa o movimento de íons devido à
migração, percebe-se que o sentido depende do caráter positivo ou negativo do íon. Neste caso
o fluxo de espécies é proporcional a este gradiente (BARD, FAULKNER, 2001):
çã ∝ (3.2.1)
onde ∇ , em coordenadas cartesianas, representa a operação + + . Sendo , , vetores unitários positivos nas direções x, y e z, respectivamente. representa o fluxo.
Se corrente flui no sistema, no circuito externo há movimentação de elétrons e na
solução há movimentação de íons. Em muitas situações, para simplificar a análise, deseja-se
condições nas quais os efeitos de migração sobre as espécies eletroativas possam ser
desconsiderados. Isto significa: corrente iônica estabelecida por outras espécies que não oxidam
nem são reduzidas. Para tanto, utiliza-se eletrólitos inertes com concentração suficientemente
maior do que as espécies eletroativas.
Figura 5: Movimentação de íons devido à migração em uma célula eletroquímica.
Fonte: Autor.
46
A difusão ocorre devido a um gradiente de concentração (equação 3.2.2). O sentido
do movimento é contrário a este gradiente, pois ocorre da região mais concentrada para a menos
concentrada. A Figura 6 ilustra a difusão numa célula eletroquímica, considerando que na
superfície do eletrodo ocorre mais intensamente a reação de oxidação R → O + e-. Logo, aplica-
se um potencial mais positivo do que o potencial de equilíbrio. Numa região próxima ao
eletrodo a concentração de espécies “R” diminui, enquanto que a concentração de espécies “O”
aumenta. A constante de proporcionalidade neste caso é chamada de coeficiente de difusão (D,
cm2 s-1). A equação (3.2.3) é a primeira lei de Fick (BOCKRIS, REDDY, 2002).
ã ∝ − (3.2.2)
Figura 6: Movimento por difusão numa célula eletroquímica ocorrendo oxidação.
Fonte: Autor.
ã = − (3.2.3)
Considerando apenas o fluxo em uma dimensão pode-se reescrever a equação
(3.2.3) como: ã = − () (3.2.4)
A concentração das espécies próximas ao eletrodo depende da distância e do tempo
(c ≡ f (x,t)). Para entender as respostas observadas nos sistemas eletroquímicos é necessário
conhecer esta dependência. Em casos simples, analisa-se apenas a velocidade de transferência
de carga, que gera o gradiente de concentração em uma região próxima à superfície do eletrodo,
e a difusão resultante. Uma expressão que possui a taxa de variação da concentração com
47
relação ao tempo pode ser obtida aplicando a equação (3.2.4) a um elemento de comprimento
“dx” (BRETT, BRETT, 1993) (Figura 7).
Figura 7: Análise de fluxo unidimensional em um elemento de comprimento “dx”.
Fonte: Autor.
Analisando as dimensões do fluxo percebe-se que ao multiplica-lo pela área e pelo
tempo obtém-se a quantidade de matéria (por exemplo em mols). Neste caso, a variação de
quantidade de matéria em termos de número de mols (n) no elemento de comprimento “dx” no
intervalo de tempo “dt” é:
() − ( + ) = ⇒ () − ( + ) = 1 (3.2.5)
O termo J(x+dx) pode ser expandido em uma série de Taylor de acordo com:
( + ) = () + + 12! 22 2 + 13! 33 3 … (3.2.6)
A série pode ser simplificada e escrita como:
( + ) ≈ () + ⇒
( + ) ≈ () + (3.2.7)
Portanto, substituindo (3.2.7) em (3.2.5):
48
Substituindo a primeira lei de Fick:
− [− ()] = ⇒ = (22) (3.2.9)
A equação (3.2.9) é a segunda lei de Fick. Em três dimensões:
= 2 (3.2.10)
onde ∇2, em coordenadas cartesianas, consiste na operação ( 22 + 22 + 22).
Para obtenção da função que mostra a variação de concentração nos sistemas
eletroquímicos em função da distância e do tempo, a equação (3.2.10) tem sido resolvida em
diversas geometrias e condições de contorno (BRETT, BRETT, 1993; BARD, FAULKNER,
2001; BOCKRIS, REDDY, GAMBOA-ALDECO, 2002; SOUTHAMPTON
ELECTROCHEMISTRY GROUP, 2001; BARROSO, BENEDETTI, 2016).
Anteriormente foram definidos os fenômenos: migração e difusão. Dos três modos
mencionados é preciso ainda definir o que é convecção. De forma geral, a convecção consiste
no movimento de espécies, o fluxo, devido a forças mecânicas que agem sobre o fluido
(SOUTHAMPTON ELECTROCHEMISTRY GROUP, 2001). O fluxo de espécies devido à
convecção é proporcional ao vetor que representa a velocidade do fluido ( , cm s−1) (equação
3.2.12) (BARD, FAULKNER, 2001).
çã= (3.2.12)
49
onde = + + . A constante de proporcionalidade é a concentração das espécies (mol cm-3). Neste
caso, as funções que descrevem a velocidade do fluido devem ser obtidas inicialmente.
A corrente gerada pela reação eletroquímica, considerando os processos de
transporte de massa, é obtida considerando que na superfície do eletrodo o fluxo de elétrons é
igual ao fluxo de espécies, isto é:
ô = çã + ã + çã ( = 0) (3.2.13)
Ressalta-se que para obtenção de equações que envolvam a variação da
concentração com relação ao tempo segue-se o mesmo raciocínio mostrado para obtenção da
segunda lei de Fick (veja equação 3.2.8), considerando os fenômenos de transporte de massa
que ocorrem.
3.2.1 A camada de difusão
Para análise da região na qual ocorre o gradiente de concentração e, portanto,
difusão, é feita uma aproximação considerando variação linear da concentração com relação à
distância da superfície do eletrodo (Figura 8). Tal distância é definida como camada de difusão
(δ) (BRETT, BRETT, 1993).
Figura 8: Aproximação linear para variação na concentração de espécies R com relação à superfície do eletrodo
no qual ocorre R → O + e-.
Fonte: Autor.
50
Se espécies reduzidas (R) são convertidas a espécies oxidadas (O) e assumindo
variação linear dentro da distância “δ” pode-se escrever:
= ,0 + (∗ − ,0) (3.2.1.1)
onde cR,0 é a concentração de R na superfície do eletrodo, cR* é a concentração inicial de R e δ
é camada de difusão. A distância com relação à superfície do eletrodo é x.
3.3 Obtenção de parâmetros cinéticos por meio de técnicas convencionais
De acordo com a cinética de Butler-Volmer, a corrente que se desenvolve nos
sistemas eletroquímicos depende do potencial aplicado. Em métodos frequentes utilizados em
estudos eletroquímicos controla-se o potencial entre o eletrodo de trabalho, no qual ocorrem as
reações de interesse, (WE, do inglês “working electrode”) e o eletrodo de referência (RE, do
inglês “reference electrode”), monitorando-se a corrente que flui entre o eletrodo auxiliar (AE,
do inglês “auxiliary electrode”), ou contra-eletrodo, e o WE em função do tempo. Como o
potencial que se aplica é medido a partir do RE, evita-se que nele haja passagem de corrente no
sentido de promover um controle mais preciso de potencial. A Figura 9 é um esquema de uma
célula eletroquímica convencional com três eletrodos (WE, AE e RE), na qual um potenciostato
realiza controle de potencial e medição de corrente.
Figura 9: Célula eletroquímica de três eletrodos ligada ao potenciostato.
Fonte: Autor.
51
Por outro lado, E pode ser aplicado de diversas maneiras e dependendo de como
sua intensidade varia com o tempo tem-se diferentes técnicas eletroquímicas, as quais
apresentam diferentes perfis de corrente em função do tempo ou potencial.
A análise teórica de cada técnica necessita da especificação de um modelo
matemático (conjunto de equações) para descrever a célula eletroquímica, e os fenômenos
físicos e químicos que nela existem. Para simplificação, geralmente considera-se os mais
significativos. O contexto mais simples consiste em assumir apenas transporte de massa por
difusão e que a dimensão do eletrodo é muito maior do que a região da solução cujas
concentrações ele modifica (camada de difusão) (COMPTON, LABORDA, WARD, 2014). A
Figura 10 representa este tipo de difusão (linear) e o modelo matemático deste caso.
Figura 10: Modelo matemático para difusão linear e reação eletroquímica simples.
Fonte: Autor.
(cronoamperometria, voltametria cíclica, espectroscopia de impedância eletroquímica e
voltametria de onda quadrada), seus fundamentos e como devem ser aplicadas para
determinação de parâmetros cinéticos para reações simples.
52
3.3.1 Cronoamperometria
A cronoamperometria é uma técnica simples, pois consiste na aplicação de um
potencial fixo (E ≠ f(t)) e no monitoramento da corrente em função do tempo (BRETT, BRETT,
1993; BARD, FAULKNER, 2001; MOLINA, GONZÁLEZ, 2016). Para obtenção de uma
expressão para corrente que dependa do potencial aplicado e do tempo deve-se resolver a
segunda lei de Fick e aplicar à solução geral as condições iniciais e de contorno mostradas na
Figura 10. Para tanto, um método comum consiste na aplicação da transformada de Laplace
(equação (3.3.1.1)) à equação (3.2.9). Portanto:
{()} = () = ∫ ()−∞ 0 ⇒ (3.3.1.1)
{(, ) } = {(2(, )2 )} ⇒
Consultando uma tabela de transformadas (BOAS, 2006):
(, ) − (, 0) = (2(, )2 ) ⇒ 2(, )2 − (, ) + ∗ = 0 (3.3.1.2)
A equação (3.3.1.2) é uma equação diferencial ordinária, linear, não homogênea,
de segunda ordem. A fim de resolvê-la, basta obter as raízes da equação característica para
determinar a solução da equação diferencial homogênea associada e testar uma solução
particular na forma de uma constante. A solução geral consiste na soma destas soluções
(BASSALO, CATTANI, 2010). Seguindo estas etapas é possível escrever, para as espécies R
e O, as seguintes soluções gerais:
(, ) = ∗ + () exp(−√ ) ; (, ) = ∗ + ′() exp(−√ ) (3.3.1.3)
As funções Y (s) e Y’ (s) podem ser relacionadas utilizando a condição de balanço
de fluxo:
( )=0 = − ( )=0 ⇒
( )=0 = − ( )=0 ⇒
−′()√ = ()√ ⇒
() = −′() (3.3.1.4)
onde = √.
A condição c = f (E) apresentada no modelo permite a determinação de Y(s). Para
um sistema reversível aplica-se a equação de Nernst. Para um sistema quase reversível ou
irreversível aplica-se a equação (3.1.5) em conjunto com a equação (3.2.13):
ô = ã ⇒ = − ( )=0 = ( )=0 = (0, ) − (0, ) (3.3.1.5)
As constantes de velocidade e dependem do modelo cinético assumido, por
exemplo, Butler-Volmer ou Marcus-Hush (MOLINA, GONZÁLEZ, 2016). Neste trabalho a
cinética de Marcus-Hush não é discutida. A partir da determinação de Y(s) é necessário tomar
a transformada inversa e utilizar a igualdade em (3.3.1.5) para alcançar uma expressão para
corrente. Abaixo apresenta-se as soluções analíticas em cada caso.
Cinética reversível:
onde = (−0′) .
Cinética quase reversível:
onde = 1/2 + 1/2.
Para o caso reversível, no qual há apenas uma das espécies em solução, e ( − 0′) 0 ou ( − 0′) 0, a equação (3.3.1.6) se reduz à equação de Cottrell.
Em pequenos valores de H1/2 é possível aplicar a seguinte simplificação (BARD,
FAULKNER, 2001):
= (∗ − ∗ ) (1 − 2H1/21/2 ) (3.3.1.8)
Se há apenas uma das espécies em solução é possível construir uma reta de I vs. t1/2
e utilizar o intercepto para cálculo de k. A constante padrão e o coeficiente de transferência
podem ser determinados medindo-se k em diferentes potenciais e utilizando as definições de
Butler-Volmer. Neste caso, é necessário o conhecimento de 0′.
3.3.2 Voltametria Cíclica
A voltametria cíclica (CV, do inglês “cyclic voltammetry”) consiste na variação
linear do potencial em função do tempo até um determinado momento e na posterior inversão
do sentido da variação. A corrente consequente é monitorada em função do potencial aplicado
(BARD, FAULKNER, 2001). Os potenciostatos digitais aplicam esta técnica por meio de
degraus de potenciais como mostrado na Figura 11 B. A equivalência entre as duas formas de
aplicação foi demonstrada para vários tipos de reações (SERALATHAN, OSTERYOUNG,
OSTERYOUNG, 1987).
Sendo assim, o problema de encontrar uma solução analítica para corrente se torna
mais complexo, mesmo para reações simples, devido à variação do potencial com o tempo.
Neste caso, o parâmetro θ também é função do tempo, o que impossibilita a obtenção da
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transformada inversa de Laplace e, portanto, de uma expressão para I por meio deste método
matemático.
Reações eletroquímicas reversíveis e irreversíveis, na ausência e na presença de
reações químicas acopladas, foram avaliadas numericamente por Nicholson e Shain
(NICHOLSON, SHAIN, 1964) assumindo transporte de massa por difusão. Equações
relacionando corrente de pico (Ip) e velocidade de varredura (υ, V s−1) foram obtidas na ausência
de reações químicas acopladas: equação (3.3.2.1) para cinética reversível, inicialmente
alcançada por Randles e Sevcik (BRETT, BRETT, 1993), e equação (3.3.2.3) para cinética
irreversível. De acordo com estas equações, sendo a corrente controlada por difusão, há uma
relação linear entre Ip e υ1/2. Os símbolos utilizados nas equações abaixo, para voltametria, tem
os significados já mencionados no texto. Caso contrário, eles são explicados logo após as
equações.
Figura 11: Variação do potencial em função do tempo para a voltametria cíclica: (A) sinal linear; (B) sinal
“staircase”.
Substituindo os valores constantes e considerando T = 298,15 K:
|| = 2,686 × 1053/21/2∗1/2 (3.3.2.2)
Para reações irreversíveis:
|| = 0,4958 3/2∗1/2(∗)1/21/21/2 1/2 (3.3.2.3)
onde n* é o número de elétrons transferidos na etapa determinante da velocidade.
Substituindo os valores constantes e considerando T = 298,15 K:
|| = 2,985 × 105(∗)1/21/2∗1/2 (3.3.2.4)
Para determinar o parâmetro ∗ utiliza-se o coeficiente angular da reta obtida a
partir do gráfico de potencial de pico (Ep) em função do logaritmo da velocidade de varredura
(equação 3.3.2.5) (NICHOLSON, SHAIN, 1964).
= 0′ − 0,00534 ∗ − ∗ ln [(∗ )1/2 10] − ∗ ln 1/2 (3.3.2.5)
Para calcular 0 de reações reversíveis e quase reversíveis pode-se utilizar o
parâmetro cinético Ψ (equação 3.3.2.6), de acordo com o tratamento de Nicholson
(NICHOLSON, 1965).
= ()/2 0 [ ]−1/2 (3.3.2.6)
Geralmente, considera-se os coeficientes de difusão sendo iguais e a equação
(3.3.2.6) se reduz a:
= 0 [ ]−1/2 (3.3.2.7)
No artigo original, valores de Ψ foram calculados numericamente por Nicholson
para diferentes separações de potencial de pico multiplicadas pelo número de elétrons
envolvidos na reação (isto é × ; = , − ,; o subscrito “a” significa anódico e o
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subscrito “c” catódico). Contudo, essa abordagem é válida para < 200 . De fato, os
efeitos de αc sobre se tornam significativos (> 5%) se > 105 (NICHOLSON,
1965). Logo, trata-se de uma metodologia adequada para cinética rápida.
Se a cinética é mais lenta, ou seja, maiores separações são observadas para os
potenciais de pico, pode-se aplicar a relação obtida por Klingler e Kochi (KLINGLER, KOCHI,
1981):
0 = 2,18 [ ]1/2